Tribunal de Contas da União Número do documento: DC-0126-08/01-P Identidade do documento: Decisão 126/2001 - Plenário Ementa: Denúncia. Possíveis irregularidades praticadas pelo TRE MS. Nomeação de parentes de desembargadores do TJ MS para ocupar cargos em comissão. Ofensa à legislação e ao princípio da moralidade. Requisição irregular de servidores estaduais ocupantes de cargo temporário na origem. Procedência parcial. Prazo para desfazimento dos atos de nomeação de parentes. Prazo para devolução de servidores requisitados irregularmente. Determinação. Juntada às contas. - Nomeação de cônjuge, companheiro ou parente até terceiro grau, no âmbito do Poder Judiciário, para cargos em comissão e funções comissionadas. Considerações. Grupo/Classe/Colegiado: Grupo I - CLASSE VII - Plenário Processo: 003.814/2000-3 Natureza: Denúncia Entidade: Órgão de Origem: Tribunal Regional Eleitoral de Mato Grosso do Sul TRE/MS Interessado (a): Identidade preservada (art. 55, § 1º da Lei nº 8.443/92) Interessados: Responsáveis: Desembargador José Augusto de Souza, Presidente, Desembargador Nelson Mendes Fontoura, ex-Presidente, Desembargador Rêmolo Letteriello, ex-Presidente e Desembargador Rubens Bergonzi Bossay, Vice-Presidente e Corregedor Dados materiais: ATA 08/2001 DOU de 26/03/2001 INDEXAÇÃO Denúncia; TRE; MS; Nomeação de Pessoal; Provimento do Cargo; Parente; Poder Judiciário; Quadro Permanente; Cessão de Pessoal; Cargo em Comissão; Função Comissionada; Magistrado; Proibição; Cargo Público; Cargo Efetivo; Jurisprudência do TCU; Sumário: Denúncia. Presentes os requisitos de admissibilidade insculpidos no art. 213 do Regimento Interno. Conhecimento. Nomeação de parentes, cônjuges e/ou companheiros de desembargadores do Tribunal de Justiça do Estado do Mato Grosso do Sul para ocupar cargos em comissão no Tribunal Regional Eleitoral do Mato Grosso do Sul. Burla à Lei nº 9.421/96 e ao princípio da moralidade. Requisições irregulares de servidores estaduais ocupantes de cargo temporário na origem. Determinações ao Órgão. Remessa de cópia do processo ao Tribunal de Contas estadual. Juntada do feito às contas do Órgão. Relatório: Trata o presente feito de denúncia endereçada a esta Corte de Contas, a respeito de eventuais irregularidades ocorridas no Tribunal Regional Eleitoral de Mato Grosso do Sul ¿ TRE/MS, notadamente em relação à nomeação de servidores para o exercício de funções comissionadas e cargos em comissão. 2.Em síntese, os fatos denunciados foram os seguintes: a) nomeação de parentes de magistrados para o exercício de cargos em comissão no TRE/MS; b) nomeação irregular de servidores estranhos aos quadros do TRE/MS para ocupar funções comissionadas; c) requisição ilegal de servidores de outros órgãos/entidades para exercer funções comissionadas. 3.O denunciante fez juntar, ainda, cópias de ação civil pública interposta pelo Ministério Público Federal, por meio da qual se questionam vários atos de nomeação de servidores para o exercício de funções comissionadas e cargos em comissão no âmbito do TRE/MS. 4.A MM. Juíza Federal Janete Lima Miguel, ao conceder liminar requerida pelo Ministério Público Federal, na ação civil acima indicada, determinou ao TRE/MS que procedesse à exoneração dos servidores ocupantes de funções comissionadas e que não ocupassem cargo efetivo, bem como dos parentes de membros ou juízes do TRE/MS ou do Tribunal de Justiça do Estado do Mato Grosso do Sul que exercessem funções comissionadas naquela Corte Eleitoral. Foi determinado, ainda, que fossem exonerados todos os servidores cedidos, que não fossem efetivos junto aos órgãos de origem ou que não estivessem ocupando funções comissionadas no TRE/MS. 5.Mediante despacho de fl. 107, autorizei a realização de inspeção junto ao Tribunal Eleitoral sob comento, a fim de verificar se efetivamente houve a nomeação para o exercícios de cargos em comissão, no âmbito do TRE/MS, de parentes de Desembargadores do Tribunal de Justiça ou de membros da própria Corte Eleitoral. 6.Realizados os trabalhos in loco, a equipe de inspeção esclareceu que houve a nomeação de parentes de magistrados da Justiça Estadual, que não ocupavam cargo efetivo na administração pública federal, para exercer cargos em comissão no Tribunal Regional Eleitoral. Foi verificado, ainda, que houve requisição de servidores que não ocupavam cargo efetivo na administração pública ou que estivessem em estágio probatório no órgão/entidade de origem. Foi proposta, por fim, a realização de audiência prévia dos responsáveis pelos fatos acima. 7.Por meio do despacho de fl. 211, autorizei o chamamento dos responsáveis pela nomeação de parentes de magistrados para ocupar cargos em comissão no TRE/MS e por requisições de pessoas que não ocupassem cargo efetivo nos órgãos de origem. Entendi desnecessária a oitiva dos desembargadores pelas requisições de servidores estaduais e municipais em estágio probatório. 8.Os dirigentes da citada Corte Eleitoral responsáveis pelas nomeações questionadas apresentaram razões de justificativa às fls. 1/27 do Volume 1. O Desembargador José Augusto de Souza argumentou, em síntese, que o TRE/MS vem cumprindo o disposto no art. 10 da Lei nº 9.421/96, uma vez que "não existe um só parente, até o terceiro grau, de Membro deste Tribunal ou Juiz Eleitoral do Estado, nomeado para ocupar cargo em comissão ou designado para exercer função de confiança, em qualquer dos níveis das Funções Comissionadas." 9.Reproduziu, ainda, o responsável argumentação formulada nos autos da ação civil pública proposta pelo Ministério Público Federal. Sustentou que a Lei nº 9.421/96 não tem aplicação à Justiça Estadual, razão pela qual não infringiria o art. 10 acima indicado o fato de parentes de membros do Poder Judiciário Estadual ocuparem cargos em comissão no TRE/MS. Encaminha, ainda, cópias das Portarias de nomeação dos servidores referidos pela equipe de inspeção. 10.O Sr. Desembargador Nelson Mendes Fontoura apresentou, às fls. 10/12 do Volume 1, suas razões de justificativa. Afirmou que a servidora Maria Socorro de Sena, supostamente requisitada para o TRE/MS e que era contratada temporariamente pela Assembléia Legislativa do Estado, foi colocada à disposição daquele Tribunal. Informou que a referida servidora foi posta à disposição da Justiça Eleitoral porque os cartórios eleitorais não dispunham de quadro funcional próprio, necessitando de servidores "emprestados" e que, face à informatização das eleições, deveriam ter um mínimo de qualificação. Alega, ainda, que não tem responsabilidade pela contratação por tempo determinado da servidora pela Assembléia Legislativa do Estado. Por fim, colocou que, segundo consta dos registros do TRE/MS, a referida servidora pertence ao quadro efetivo do órgão legislativo estadual. 11.O Sr. Desembargador Rêmollo Letteriello, indagado a respeito de eventuais requisições irregulares, apresentou suas razões de justificativa às fls. 15/16 do Vol. 1. Sustentou que os servidores indicados no ofício de audiência prévia não foram requisitados, mas colocados à disposição do TRE/MS e devolvidos aos órgãos de origem, conforme ofício nº 83/00-PRE/TRE/MS, de 22.3.00. Posteriormente, foram novamente lotados nos cartórios eleitorais, mediante convênio firmado com a Assembléia Legislativa Estadual, tendo em vista a inexistência de quadro funcional próprio no Tribunal. 12.O Sr. Desembargador Rubens Bergonzi Bossay apresentou suas justificativas (fls. 17/20 do Vol. 1) quanto ao fato relacionado no ofício de audiência prévia (nomeação de parente de membro do TJ/MS para ocupar cargo em comissão no TRE/MS). Sustentou, preliminarmente, sua ilegitimidade para integrar o feito, visto que a portaria de nomeação impugnada teria sido de autoria do Desembargador José Augusto de Souza. Em relação ao mérito, afirmou que não houve irregularidade na nomeação em tela. Alegou que o Desembargador Rêmolo Letteriello não é mais membro do TRE/MA e que sua filha somente passou a ocupar o cargo após o afastamento definitivo de seu pai. 13.Examinou, ainda, o aspecto da moralidade do mencionado ato. Aduziu que a Lei nº 9.421/96, ao regular a nomeação de parentes de magistrados pelos órgãos do Poder Judiciário, apenas vedou o ingresso de parentes de magistrados nos quadros dos Tribunais em que estes exercessem suas funções jurisdicionais. Ao analisar o caso concreto da servidora questionada, afirmou, in verbis: "é evidente que, mesmo obedecidos os limites de grau de parentesco impostos pela lei, podem ocorrer, em tese, fatos caracterizadores de imoralidade, mas não é o caso, à toda evidência, da nomeação da indigitada servidora. Foi ela nomeada para ocupar a FC-08 de Assessora Jurídica, e apresenta qualificação profissional para tanto, detentora do título de Bacharel em Direito, é assídua e pontual, e não raro ultrapassa o horário normal de expediente; apresenta produtividade além da média, o que poderá ser constatado pelos inúmeros pareceres que diuturnamente elabora, o que poderá ser verificado em eventual inspeção dessa Egrégia Corte de Contas. (...omissis...) imaginar que na hipótese de escolha de ocupante de cargo em comissão a análise da observância do princípio da moralidade fique ao sabor da interpretação mais ou menos subjetiva de qualquer instância julgadora, seria a admissão de critério que extravasa o poder discricionário, para admitir o arbítrio. Na esteira desse raciocínio, anular-se-ia a faculdade que tem o administrador de prover os cargos em comissão com pessoas de sua estrita confiança. É que esta, como é óbvio, nasce de relações próximas entre o administrador e a pessoa escolhida. Levado a extremos o princípio da moralidade terminaria por somente permitir que viesse a escolher como de 'confiança' pessoas desconhecidas..." 14.O Sr. Analista, por meio da instrução de fls. 28/37, apreciou as razões de justificativa apresentadas pelos responsáveis. Transcrevo, a seguir, o exame efetuado pela Unidade Técnica: "Dada a similitude dos questionamentos levados a Audiência, torna-se mais racional a análise conjunta das justificativas apresentadas pelos responsáveis. Os referidos questionamentos dividem-se em dois grupos: das nomeações para cargos em comissão em desacordo com o princípio da moralidade (art. 37, caput, da Constituição Federal) e das requisições de servidores contratados por período determinado pela Assembléia Legislativa do Estado do Mato Grosso do Sul em desacordo com o art. 37, inciso IX, da Constituição Federal. Das nomeações para cargos em comissão em desacordo com o princípio da moralidade (art. 37, caput, da Constituição Federal) Preliminarmente, salutar se faz trazer à colação o disposto no art. 120 da Constituição Federal, que trata da composição dos Tribunais Regionais Eleitorais: 'Art. 120. Haverá um Tribunal Regional Eleitoral na capital de cada Estado e no Distrito Federal. § 1º - Os Tribunais Regionais Eleitorais compor-se-ão: I ¿ mediante eleição, pelo voto secreto: a) de dois juízes, dentre desembargadores do Tribunal de Justiça; b) de dois juízes, dentre juízes de direito, escolhidos pelo Tribunal de Justiça; II ¿ de um juiz do Tribunal Regional Federal com sede na capital do Estado, ou no Distrito Federal, ou, não havendo, de juiz federal, escolhido em qualquer caso, pelo Tribunal Regional Federal respectivo; III ¿ por nomeação, pelo Presidente da República, de dois juízes dentre seis advogados de notável saber jurídico e idoneidade moral, indicados pelo Tribunal de Justiça. § 2º - O Tribunal Regional Eleitoral elegerá seu Presidente e o Vice-Presidente dentre os desembargadores.' Como se observa da leitura do texto constitucional, maioria dos membros dos Tribunais Regionais Eleitorais são oriundos da justiça estadual (quatro dos sete juízes), este fato, aliado à transitoriedade na ocupação dos cargos (art. 121, § 2º, da CF/88), confere a justiça eleitoral uma singularidade ímpar, ou seja, uma forte relação com os Tribunais de Justiça dos Estados e do Distrito Federal, que não pode ser olvidada, quando da análise de assuntos pertinentes àqueles tribunais. É de conhecimento público, no Estado de Mato Grosso do Sul, o emprego de parentes de desembargadores no Tribunal de Justiça ¿ TJ/MS, fato este que pode ser comprovado na análise dos documentos acostados às fls. 37/64. Apesar do TJ/MS não se encontrar sob a jurisdição desta Corte de Contas, veremos adiante como essa prática administrativa influencia na nomeação de cargos em comissão e funções comissionadas no âmbito da Justiça Eleitoral. No que concerne especificamente ao TRE/MS, o expediente usado ao longo da sua existência, é a nomeação de parentes dos desembargadores ou juízes do Judiciário Estadual não membros da Justiça Eleitoral. Tal procedimento não fere, em uma análise literal, os dispositivos legais disciplinados no art. 12 da Lei 8.868/94, revogado pelo art. 10 da Lei nº 9.421/96, que reza, ipsis litteris: 'Art. 10. No âmbito da jurisdição de cada Tribunal ou Juízo é vedada a nomeação ou designação, para Cargos em Comissão e para Funções Comissionadas de que trata o art. 9º, de cônjuge, companheiro ou parente até o terceiro grau, inclusive, dos respectivos membros ou juízes vinculados, salvo se o servidores ocupante de cargo de provimento efetivo das Carreiras Judiciários, caso em que a vedação é restrita à nomeação ou designação para servir junto ao Magistrado determinante da incompatibilidade.' A finalidade do referido dispositivo é clara: evitar o nepotismo no âmbito do Judiciário Federal. Contudo, tal desiderato é prejudicado nas cortes eleitorais em decorrência de suas mencionadas peculiaridades. O cumprimento apenas literal da lei em exame, e não em seus aspectos teleológicos, impede a eficácia plena da norma quanto a estes tribunais. Questiona-se: Será que a nomeação rotineira dos parentes de seus pares da justiça estadual estaria alinhada à finalidade da lei? Entendemos que não, pois o que se verifica no âmbito do TRE/MS é uma espécie de revezamento da nomeação dos cargos em Comissão, ou seja, não há nomeação de parentes até o terceiro grau dos juízes enquanto são membros efetivos do Tribunal, mas, tão logo que deixem os cargos, muitos de seus parentes são nomeados para Cargos em Comissão pelos novos dirigentes (seus pares do Tribunal de Justiça), o que claramente evidencia uma burla à lei. Se considerarmos que tais nomeações não possuem nenhum vício de ordem infraconstitucional, indagar-se-ia se estariam respaldadas pelo princípio da moralidade administrativa insculpido no art. 37, caput, da Constituição Federal. Já dizia o saudoso Hely Lopes Mairelles (in Direito Administrativo Brasileiro, 23ª Edição, pg. 86) a respeito dos princípios da legalidade e da moralidade: "Além de atender à legalidade, o ato do administrador público deve conformar-se com a moralidade e a finalidade administrativas para dar plena legitimidade à sua atuação. Administração legítima só é aquela que se reveste de legalidade e probidade administrativas, no sentido de que tanto atende às exigências da lei como se conforma com os preceitos da instituição pública. Cumprir simplesmente a frieza do seu texto não é o mesmo que atendê-la na sua letra e no seu espírito. A administração, por isso, deve ser orientada pelos princípios do Direito e da Moral, para que ao legal se ajunte o honesto e o conveniente aos interesses sociais." (grifamos). Diz ainda o douto administrativista na mesma obra: "O certo é que a moralidade do ato administrativo juntamente com sua legalidade e finalidade constituem pressupostos de validade sem os quais toda a atividade pública será ilegítima". O jurista Celso Antônio Bandeira de Mello, sob a mesma ótica, arremata, a respeito do princípio da moralidade administrativa: "De acordo com ele a Administração e seus agentes têm de atuar na conformidade de princípios éticos. Violá-los implicará violação ao próprio direito, configurando ilicitude que assujeita a conduta viciada a invalidação, porquanto tal princípio assumiu foros de pauta jurídica, na conformidade do art. 37 da Constituição Federal" (grifamos). Vê-se, portanto, que o ato administrativo não deve-se ater exclusivamente em seu aspecto legal, haja vista que a moralidade e a finalidade administrativa integram também os pressupostos de validade do ato. No caso em testilha, os justificantes apenas se referem à questão legal das nomeações, alegando com isso, estarem cumprindo o mínimo ético traçado pelo legislador. Outro ponto que merece análise é a faculdade estabelecida no art. 9, parágrafo único, da Lei nº 9.421/96 ¿ que dispõe sobre as Carreiras do Judiciário Federal ¿ que reza: "as FC-06 a FC-10 serão consideradas como cargo em comissão, quando seus ocupantes não tiverem vínculo efetivo com a Administração Pública". Com isso, o preenchimento dos mencionados cargos, na referida hipótese, é ato discricionário dos dirigentes dos tribunais. A discricionariedade facultada ao administrador nas nomeações dos cargos em comissão deve, contudo, ter em conta os princípios da legalidade e da finalidade e moralidade administrativas. Com isso, o administrador pode nomear pessoas de sua confiança, porém, não pode se ater apenas a esse critério, haja vista que a escolha deve recair sobre aquelas que detêm as melhores qualidades ao exercício do munus público, pois os interesses da sociedade, e não os pessoais do administrador, devem nortear os atos administrativos, sob pena de desvio de finalidade. O que se observa, no âmbito do TRE/MS, é a escolha dos cargos em comissão, quase que exclusivamente, dos parentes dos desembargadores do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul. Ora, não se pode prejulgar a competência profissional de tais servidores. Contudo, da forma como são realizadas as nomeações, leva-se a crer que os critérios utilizados pelos dirigentes da Corte Eleitoral são de natureza pessoal, relegando o interesse público a segundo plano. Convém salientar, quanto ao princípio da moralidade administrativa, a existência de julgados decidindo que, pela infringência de tal princípio, é possível a anulação de ato administrativo (RJTJSP 135/31) ¿ "o controle jurisdicional se restringe ao exame da legalidade do ato administrativo; mas por legalidade ou legitimidade se entende não só a conformação do ato com a lei. Como também com a moral administrativa e com o interesse coletivo". No que concerne ao âmbito administrativo, o art. 45 da Lei nº 8.443/92 disciplina a competência desta Corte de Contas para invalidação ou sustação de atos administrativos eivados de ilegalidade. Desta forma, entendemos que as nomeações rotineiras de parentes de desembargadores do TJ/MS, realizadas pelos seus pares - responsáveis pelo TRE/MS - ouvidos em audiência, afrontam os princípios da moralidade e finalidade administrativas, pela ausência de tais pressupostos, o que as tornam carentes de legalidade ou legitimidade, sujeitas, pois, a invalidação. Das requisições de servidores contratados por período determinado pela Assembléia Legislativa do Estado de Mato Grosso do Sul em desacordo com o art. 37, inciso IX, da Constituição Federal. O Tribunal Regional Eleitoral do Estado de Mato Grosso do Sul vem requisitando servidores que, em alguns casos, não são efetivos nos órgãos de origem. Esse fato é demonstrado pelo próprio controle interno do TRE/MS no ofício de fls. 178/9, em que se constata que 10 (dez) dos 11 (onze) servidores requisitados da Assembléia Legislativa do Estado de Mato Grosso do Sul, não são servidores efetivos, mas sim contratados temporariamente. Há casos curiosos, como da servidora Adozinha Ferreira Viegas, que foi contratada pela Assembléia Legislativa /MS em 01.01.98 e cedida ao TRE/MS na mesma data ¿ fl. 89. Não é necessário um esforço exegético para entender que a requisição de servidores públicos pela Justiça Eleitoral, de que dispõe a Lei 6.999/82, refere-se apenas a servidores efetivos. Ademais, é um contra-senso servidores contratados de forma temporária estarem prestando serviços a Justiça Eleitoral, haja vista que, em tese, foram contratados pelos órgãos de origem em caráter excepcional, para a execução de atividades específicas previstas em lei. A Constituição Federal, em seu art. 37, inciso IX, estabelece: "a lei estabelecerá os casos de contratação por tempo determinado para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público". Com isso, não faz sentido determinado órgão contratar servidores sob esse regime jurídico, e, em seguida, cedê-los à Justiça Eleitoral. No caso vertente, em especial das contratações efetuadas pela Assembléia Legislativa, leva-se a supor que as mesmas são preordenadas com a finalidade única de servirem de trampolim para que os contratados prestem serviços ao TRE/MS. Assim, dada a ilegalidade patente nas referidas requisições, salutar se faz a devolução dos servidores que se encontram nessa situação ao órgão de origem. IV - CONCLUSÃO Ante o exposto, submetemos os autos à consideração superior com as seguintes propostas: a ¿ determinar ao Presidente do Tribunal Regional Eleitoral do Estado de Mato Grosso do Sul, com fulcro no art. 45 da Lei 8.443/92 c/c o art. 195 do RI/TCU, para que, no prazo de 15 (quinze) dias, torne sem efeito os atos que ensejaram as nomeações dos servidores em Cargos em Comissão / Funções Comissionadas: Nélida Cristina Xavier Letteriello, Nildo de Carvalho Filho, Rodrigo Bossay Correa, Mauro Alberto Lenharo, Patrícia Balter de Carvalho Faracco e Sandra Waleska Dias de Oliveira Carvalho, por infringência ao princípio da moralidade insculpido no art. 37, caput, da Constituição Federal ¿ subitem 3.2 desta instrução; b - determinar ao Presidente do Tribunal Regional Eleitoral do Estado de Mato Grosso do Sul, com fulcro no art. 45 da Lei 8.443/92 c/c o art. 195 do RI/TCU, para que, no prazo de 15 (quinze) dias, promova a devolução de servidores não efetivos nos órgãos de origem, requisitados pelo TRE/MS, por infringência aos dispositivos da Lei nº 6.999/82 c/c com o art. 37, inciso IX, da Constituição Federal.- subitem 3.3 desta instrução; c ¿ determinar à Coordenação de Controle Interno do Tribunal Regional Eleitoral do Estado de Mato Grosso do Sul que informe, no prazo de 15 (quinze) dias, a esta Corte de Contas, do cumprimento, ou não, das determinações supramencionadas." 15.O Sr. Secretário de Controle Externo manifestou-se de acordo com as considerações supra, conforme despacho de fl. 37 do Vol. 1. É o Relatório. Voto: PROPOSTA DE DECISÃO Preliminarmente, devo registrar que a peça inicial contém todos os requisitos estabelecidos pelo art. 213 do Regimento Interno para que sejam admitidas denúncias endereçadas a esta Corte. Por esta razão, entendo que a presente denúncia deve ser conhecida 2.A inspeção promovida pela Unidade Técnica confirmou a existência dos fatos arrolados na exordial. Esclareço, apenas, que, ao determinar a realização de audiência prévia dos responsáveis, entendi que não deveriam ser ouvidos a respeito da requisição de servidores em estágio probatório em órgãos municipais ou estaduais. O fato de ter havido irregularidade, na origem, em relação à cessão dos referidos servidores é matéria de exclusiva competência dos órgãos de controle municipal e estadual. Não cabe a este Tribunal exercer juízo de valor a respeito da conduta dos servidores municipais e estaduais que autorizaram a cessão sob comento. 3.Os dirigentes do TRE/MS, ademais, não têm ingerência sobre servidores de outros órgão. Se as requisições por eles formuladas não poderiam ser aceitas, caberia aos dirigentes municipais ou estaduais negá-las. Ao concordarem com os pedidos, firmaram a presunção de legitimidade de seus atos. Não seria razoável, por conseguinte, exigir que os dirigentes do TRE/MS verificassem a regularidade da cessão em face de legislação estadual ou local. Diferente é a situação quando a própria requisição afronta norma federal ou o texto constitucional, como é o caso da contratação temporária de que trata o inciso IX da Constituição Federal. Nesta hipótese, a aplicação normativa é direta sobre os órgãos cessionários federais, surgindo, de imediato, a responsabilidade das respectivas autoridades por eventual impropriedade destes atos. 4.Analiso, a seguir, as justificativas apresentadas pelos responsáveis. a) Desembargador José Augusto de Souza 5.O eminente Magistrado, indagado a respeito de nomeações de parentes de membros do Tribunal de Justiça do Estado do Mato Grosso do Sul para o exercício de cargos em comissão no âmbito do TRE/MS, apresentou suas justificativas. Sustentou que não há nenhum parente de membro da Corte Eleitoral exercendo cargo em comissão ou função comissionada naquele TRE. Aduziu, ainda, que a Lei nº 9.421/96 não se aplica à Justiça Estadual. 6.De fato, a equipe de inspeção verificou que nenhum servidor, não ocupante de cargo efetivo e parente de membro do TRE/MS, ocupa cargo em comissão ou função comissionada naquele Tribunal. Também deve-se reconhecer que a Lei que instituiu o Plano de Carreira dos servidores do Poder Judiciário da União não se aplica aos órgãos do Poder Judiciário dos Estados. 7.Contudo, não se está a analisar, neste feito, nomeações de servidores do Tribunal de Justiça do Estado do Mato Grosso do Sul. Examina-se a juricididade das nomeações de parentes de magistrados da Corte Estadual de Justiça para cargos em comissão no âmbito do TRE/MS. Não se discute a respeito da aplicação da Lei nº 9.421/96 aos Tribunais Eleitorais. Seu alcance é imediato e decorre do próprio comando normativo. 8.Referida Norma, com o objetivo claro de, se não impedir, ao menos reduzir o âmbito de discricionariedade do administrador dos Tribunais Federais, estabeleceu regras definidas para a nomeação de servidores para cargo em comissão. Dispõe o art. 10, in verbis: "Art. 10. No âmbito da jurisdição de cada Tribunal ou Juízo é vedada a nomeação ou designação, para os Cargos em Comissão e para as Funções Comissionadas de que trata o art. 9º, de cônjuge, companheiro ou parente até o terceiro grau, inclusive, dos respectivos membros ou juízes vinculados, salvo a de servidor ocupante de cargo de provimento efetivo das Carreiras Judiciárias, caso em que a vedação é restrita à nomeação ou designação para servir junto ao Magistrado determinante da incompatibilidade." 9.Evidente que a intenção da Lei é evitar o nepotismo no âmbito do Poder Judiciário. Vedou o ingresso nos quadros administrativos dos Tribunais de parentes de magistrados apenas e tão-somente pelo fato de serem parentes de juízes. Permitiu, entretanto, a ocupação de cargo em comissão ou função comissionada por parentes de magistrados, desde que ocupantes de cargo de provimento efetivo, ressalvando a impossibilidade de exercício das funções junto ao membro da magistratura determinante da incompatibilidade. 10.No caso concreto, não se verificou a nomeação de parentes, cônjuges ou companheiros de magistrados que atuam na Justiça Eleitoral do Mato Grosso do Sul para cargos em comissão ou função comissionada. Todavia, a inspeção deixou evidenciado que diversos parentes de desembargadores do Tribunal de Justiça do Estado, não detentores de cargos de provimento efetivo no âmbito do TRE/MS, foram nomeados para ocupar cargo em comissão naquela Corte. 11.Como bem destacou a Unidade Técnica, há estreito vínculo entre os membros dos Tribunais Eleitorais, notadamente seus dirigentes principais, e os membros do Tribunal de Justiça. A Constituição Federal estabelece que os Tribunais Regionais Eleitorais compor-se-ão de dois juízes, dentre desembargadores do Tribunal de Justiça, que serão eleitos para a Presidência e Vice-Presidência. 12.O Desembargador José Augusto de Souza autorizou a nomeação de quatro servidores para ocupar cargo em comissão no TRE/MS, todos parentes de membros do TJ/MS e que estariam abrangidos pela proibição constante do art. 10 da Lei nº 9.421/96 acima transcrito. A título de ilustração, cite-se o caso do Sr. Mauro Alberto Lenharo, genro do Desembargador Rêmolo Letteriello, nomeado no dia 26.3.99, menos de dois meses após o Magistrado ter deixado a Presidência do TRE/MS. 13.Verifica-se, por conseguinte, que há evidente contradição entre os atos administrativos impugnados e o espírito da Lei. Evitou-se afronta direta ao comando da Norma, porém, violou-se a intenção moralizadora da Lei. Razão pela qual entendo deve ser efetuada determinação ao Órgão para que regularize a situação. Deixo, contudo, de aplicar sanção ao responsável por conta deste fato, tendo em vista que a interpretação dada ao dispositivo legal sob comento pelo dirigente do TRE/MS não é desarrazoada, apesar de ferir a intenção da norma. b) Desembargador Rubens Bergonzi Bossay 14.O magistrado foi ouvido em razão de ter nomeado a filha do antigo Presidente do TRE/MS, Desembargador Rêmollo Letteriello, apenas uma semana após o Desembargador ter deixado a Corte Eleitoral. Alegou, em preliminar, sua ilegitimidade passiva, visto que não teria assinado a nomeação da servidora em tela. 15.Assiste razão ao responsável supra. De fato, a Portaria nº 29/99-PRE, que nomeou a Sra. Nélida Cristina Xavier Letteriello para o cargo de Assessora Jurídica da Presidência (FC-08), não foi assinada pelo Magistrado acima, mas é da lavra do Desembargador José Augusto de Souza. Razão pela qual devem ser acatadas as justificativas apresentadas pelo responsável. c) Desembargadores Nelson Mendes Fontoura e Rêmollo Letteriello 16.Os Magistrados em questão foram chamados ao feito para apresentarem justificativas a respeito de requisições de servidores que não detinham cargo efetivo na administração pública, mas eram contratados temporariamente pela Assembléia Legislativa do Estado. 17.Afirmaram os Desembargadores supra que não requisitaram os servidores, mas que estes foram colocados à disposição da Justiça Eleitoral. Afirmaram, ainda, não terem responsabilidade pelas contratações temporárias. 18.Reconheça-se que não há responsabilidade dos dirigentes do TRE/MS pela contratação temporária dos servidores pela Assembléia Legislativa. Contudo, não se está, in casu, questionando a respeito da referida contratação. Indaga-se a respeito da regularidade de requisição de servidores que ocupam cargo temporário na Administração Pública. 19.A leitura integrada do dispositivo constitucional que trata da possibilidade de a Administração Pública contratar temporariamente com a norma legal que permite aos órgãos da Justiça Eleitoral requisitar servidores públicos demonstra a incompatibilidade lógica de serem requisitados servidores contratados temporariamente. 20.Dispõe o art. 37, inciso IX, da Constituição Federal que lei estabelecerá os casos de contratação por tempo determinado para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público. Nesse sentido, o Estado do Mato Grosso do Sul regulamentou o dispositivo constitucional por meio da Lei Estadual nº 1.689/96. Nos termos do comando constitucional supra, verifica-se que, em determinadas situações excepcionalíssimas, a Carta Política possibilitou ao administrador público contratar servidores sem a necessidade de prévio concurso público. 21.Por se tratar de norma excepcional, somente nas hipóteses restritas ressalvadas pela Constituição poderá ser utilizado este meio de contratação. Visa tal instituto possibilitar que, em determinadas situações de natureza urgente e de relevante interesse público, disciplinadas por lei, possa o administrador rapidamente contratar pessoal para fazer frente às situações excepcionais. 22.Assim, se determinado órgão público utiliza o referido expediente, presume-se que há situação excepcional de interesse público relevante, a demandar pessoal para superar as dificuldades inerentes à hipótese e que, devido à urgência do caso concreto, não poderia esperar e tempo necessário para a realização de concurso público. Não faria sentido, nestes casos, contratar temporariamente e, logo a seguir, ceder o pessoal contratado. Ocorrendo isso, evidente se mostra que não havia a situação excepcional a demandar pessoal em regime de urgência, apta a justificar o afastamento do concurso. 23.Ademais, a Lei nº 6.999/82 que regulamenta as requisições de servidores por parte da Justiça Eleitoral estabelece que os servidores públicos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios podem ser cedidos para prestar serviços à Justiça Eleitoral. Pressupõe a norma que tais servidores sejam ocupantes de cargo efetivo ou emprego de natureza permanente. Tanto que, ao delimitar o prazo da cessão, determina que o prazo da requisição será de, no máximo, um ano, podendo ser prorrogado. Estabelece, ainda, que, nos casos de acúmulo ocasional de serviços, poder-se-á requisitar mais de um servidor por dez mil habitantes, no prazo de seis meses. Nestas situações, dispõe a lei que, somente após um ano, poderá haver nova requisição do mesmo servidor. 24.Se a Lei prevê hipóteses de prorrogação da requisição ou a possibilidade de, apenas após decorrido determinado prazo, realizar-se nova requisição, é lícito inferir que a norma, ao citar a requisição de servidor, pressupôs a ocupação de cargo ou emprego de natureza permanente. 25.No caso concreto, entendo que as cessões de servidores da Assembléia Legislativa Estadual foram efetuadas de forma irregular. Todavia, importa reconhecer que não restou evidenciada conduta culposa dos dirigentes, apesar de reconhecer que não haveria dificuldade em estabelecer nos ofícios de requisição que somente poderão ser cedidos servidores ocupantes de cargo ou emprego de natureza permanente. 26.Por conseguinte, entendo que não se deve aplicar sanção aos responsáveis pelo fato em exame. Não obstante, deve ser endereçada determinação ao Órgão para que se abstenha de requisitar servidores ocupantes de cargo ou emprego temporário, bem como que adote providências para que sejam devolvidos, caso já não tenham sido adotadas, os servidores requisitados na situação ora tratada. 27.Por fim, tendo em vista que os fatos apurados neste processo podem ter reflexo também em órgãos estaduais, reputo necessária a remessa de cópias dos autos ao Tribunal de Contas do Estado. Ante o exposto, acolho em parte os pareceres uniformes da Unidade Técnica e proponho que o Tribunal adote a deliberação que ora submeto à apreciação deste E. Plenário. TCU, Sala das Sessões, em 14 de março de 2001. BENJAMIN ZYMLER Relator Assunto: VII - Denúncia Relator: BENJAMIN ZYMLER Unidade técnica: SECEX-MS Quórum: Ministros presentes: Humberto Guimarães Souto (Presidente), Marcos Vinicios Rodrigues Vilaça, Iram Saraiva, Bento José Bugarin, Valmir Campelo, Adylson Motta, Walton Alencar Rodrigues, Guilherme Palmeira e o Ministro-Substituto José Antonio Barreto de Macedo. Sessão: T.C.U., Sala de Sessões, em 14 de março de 2001 Decisão: Os Ministros do Tribunal de Contas da União, reunidos em Sessão Plenária, ante as razões expostas pelo Relator, DECIDEM em: 8.1. conhecer da denúncia, uma vez preenchidos os requisitos de admissibilidade previstos no art. 213 do RI/TCU, para considerá-la parcialmente procedente; 8.2. determinar ao Tribunal Regional Eleitoral do Mato Grosso do Sul que: 8.2.1. no prazo de quinze dias, adote providências no sentido de tornar sem efeito os atos de nomeação dos servidores ocupantes de cargo em comissão/função comissionada que detenham vínculo de parentesco até o terceiro grau, inclusive, ou que sejam cônjuges ou companheiros, de membros do Tribunal de Justiça do Estado do Mato Grosso do Sul e que não ocupem cargo efetivo no TRE/MS; 8.2.2. abstenha-se de nomear as pessoas indicadas no subitem acima para o exercício de cargo em comissão ou função comissionada no TRE/MS; 8.2.3. providencie, no prazo de quinze dias, as medidas necessárias para a devolução de servidores requisitados ocupantes de cargo ou emprego temporário no órgão de origem; 8.2.4. abstenha-se de requisitar servidores de outros órgãos que ocupem cargo ou emprego temporário. 8.3. remeter cópia dos presentes autos ao Tribunal de Contas do Estado do Mato Grosso do Sul, ressalvando o sigilo da identidade dos denunciante; 8.4. determinar a juntada do presente feito às contas do TRE/MS, relativas ao exercício de 2000; 8.5. levantar a chancela de "sigiloso" que recai sobre estes autos, mantendo preservada a identidade do (a) denunciante, nos termos do art. 215, § 1º, do Regimento Interno.