VIII Seminario Regional (Cono Sur) ALAIC
“POLÍTICAS, ACTORES Y PRÁCTICAS DE LA COMUNICACIÓN:
ENCRUCIJADAS DE LA INVESTIGACIÓN EN AMÉRICA LATINA”
27 y 28 de agosto 2015 | Córdoba, Argentina
A MULHER NA CAPA DA TPM: UMA ANÁLISE DA
IMAGEM DO CORPO
THE WOMEN IN TPM COVER: AN ANALYSIS OF THE BODY IMAGE
LA MUJER EN TPM : UN ANÁLISIS DE LA IMAGEN CORPORAL
Ana Carolina de Assis Marinho da Silva
Pós-graduanda. Unochapecó (Brasil)
[email protected]
Angélica Luersen
Mestre. Unochapecó (Brasil)
[email protected]
Resumo
Este trabalho apresenta uma análise das imagens publicadas na Revista TPM. O objetivo foi
identificar o discurso de gênero nas imagens de capa, no período de fevereiro de 2013 a
agosto de 2014. A disseminação de estereótipos, conceitos e ideias demarcados pela
construção social e presentes como unidade na comercialização e midiatização dos corpos
femininos entra neste processo como alicerce, ou estratégia de sedução, para atingir o
público pretendido. Neste sentido, se faz a análise das imagens fundamentada nos autores
Vilches (1987), Verón (2005), Coutinho (2012) e Peruzzolo (1998).
O discurso textual das chamadas de capa também foi considerado na análise como elemento
essencial para o entendimento da relação existente entre imagem e texto na construção do
conteúdo. A compreensão acerca dos conceitos de sexo e gênero e os reflexos na
sociedade, se deu a partir de autores como Bourdieu (2014), Stolke (2004), Haraway (2004)
e Baudrillard (2002).
No processo de interpretação, compreendemos que os textos da TPM visam quebrar
paradigmas e gerar reflexão. Já as imagens usadas nas capas ainda apelam para sentidos
de exploração e subordinação do corpo feminino. Como citou Stolke (2004), representações
simbólicas ou ideológicas podem ocultar relações de desigualdades e exploração. Há um
atravessamento nas imagens de capa da TPM ressonante, que se repete de diversas
formas. O jogo com o irônico para representar o dissonante, incentiva ainda mais a
permanência e proliferação da exaltação da beleza. Apesar de em seu discurso textual
encontrarmos abordagens que questionam o senso comum, esse, é atrelado a imagens que
só reafirmam o estereótipo de mulher. TPM demonstra assim uma dissonância entre os
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discursos visuais e textuais. Enquanto as imagens perpetuam valores naturalizados para
ambos os sexos, os textos postulam uma reflexão sobre o pensamento estereotipado.
Palavras-chave: Gênero, Imagem, Estereótipo, Revista TPM.
Abstract
This paper presents an analysis of published images in TPM Magazine. The goal was to
identify the gender discourse in the cover images, from February 2013 to August 2014. The
spread of stereotypes, concepts and ideas, marked by social construction and as unit in the
commercialization and mediatization of women's bodies, enter this process as a foundation,
or seduction strategy to achieve the intended audience. In this point, the analysis of images
based on the authors Vilches (1987), Veron (2005), Coutinho (2012) and Peruzzolo (1998).
The textual discourse of the covers were also considered in the analysis as an essential
element for understanding the relationship between image and text in the construction of
content. The understanding of the concepts of sex and gender and reflections on society, took
place from authors such as Bourdieu (2014), Stolke (2004), Haraway (2004) and Baudrillard
(2002).
In the process of interpretation, we understand that the TPM texts aim to break paradigms
and generate reflection. Though the images used on the covers still appeal to the senses of
exploitation and subordination of the female body. As quoted Stolke (2004), symbolic or
ideological representations can hide relationships inequalities and exploitation. There is a
crossing in the resonant TPM cover images, which is repeated in various ways. The game
with ironic to represent the jarring, even encourages the persistence and proliferation of the
exaltation of beauty. Although in its textual discourse find approaches that challenge common
sense, this is linked to images that only reaffirm woman stereotype. TPM thus demonstrates a
dissonance between the visual and textual discourse. While the images perpetuate
naturalized values for both sexes, the texts postulate a reflection about the stereotypical
thinking.
Key Words: Gender, Image, Stereotypical, TPM Magazine.
1. INTRODUÇÃO
A mensagem criada para divulgação de um conteúdo também dissemina uma ideia, um
conceito, uma imagem, mesmo sendo através de uma projeção, como se dá nas capas de
revistas. Assim, este artigo busca analisar o conteúdo discursivo desencadeado no contrato
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de leitura (VERÓN, 2005) constituído entre veículo informativo e leitor, considerado aqui
também como um consumidor do conteúdo midiático. Esta apropriação das enunciações por
ambas as partes contribui para o processo de identificação ou repulsa da informação
circulante e na elaboração ideológica do veículo.
A disseminação de estereótipos demarcados pela construção social e presentes como
unidade na comercialização e midiatização dos corpos femininos entra neste processo como
alicerce, ou estratégia de sedução, para atingir o público pretendido. Foi buscado então,
através da análise das imagens com base nos estudos semiológicos, desconstruir as
imagens de capa da revista TPM, no intuito de verificar as mensagens veladas no discurso e
o tratamento do gênero nela inserido. Foi considerada também, no processo de análise, a
conjuntura entre texto (manchete) e imagem, usando como suporte a análise de discurso de
linha francesa, estudada especificamente através dos autores Pechêux (1990), Orlandi
(2007) e Foucault (2006). Além da compreensão acerca dos conceitos de sexo e gênero.
O recorte para a análise totalizou 18 exemplares da revista. Destes, quatro capas foram
consideradas neste artigo. O processo de escolha se deu de forma empírica. Uma
observação geral auxiliou no apontamento de duas capas em específico, sendo elas das
edições de número 141 e 142, que por consequência se aglomeraram a outras duas.
As imagens de capa foram escolhidas para análise por representarem um dos pontos
cruciais no qual o leitor/consumidor é capturado. Os veículos de comunicação em geral,
precisam destes artifícios para a comercialização de seus produtos midiáticos. Os indivíduos
assim consomem bens materiais e conceitos, apropriando-se deles. Segundo Lippmann
([1922], 2010), os estereótipos são imagens construídas pelo indivíduo vindas das influências
que o envolve e fortalecidas pela mídia, no intuito de auxiliar no reconhecimento imediato
pelo receptor ao ler ou ouvir uma palavra, ao ponto de excluir a necessidade de explicação
do objeto em questão. Estes artifícios são utilizados e difundidos nas mensagens
transmitidas pelos meios de comunicação chegando à medida de também serem
consumidos como produtos. A problemática está no formato de construção do discurso a
partir destes estereótipos, na proporção de gerar o consumo por meio da disseminação dos
pré-conceitos.
Consciente ou inconscientemente, o consumo destes conceitos está atrelado ao processo
constitutivo do indivíduo. Ao consumir, nos postulamos diante da sociedade como quem
somos e o que podemos. É necessário questionar, constantemente, se o que é consumido é
capaz de “constituir uma nova maneira de sermos cidadãos” (CANCLINI, 2006, p. 42). E
entender quem consome como um ser racional, que faz escolhas, e que não consome
somente por ideologia.
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2. SEXO, GÊNERO E REVISTA: UMA RELAÇÃO HISTÓRICA
O início do feminismo que busca uma nova construção social entre homens e mulheres
nasce em 1960, no denominado “Novo Feminismo”. No entanto, “as lutas das mulheres por
direitos iguais” surge “cem anos antes, na segunda metade do século XIX, com as
campanhas pela concessão do voto feminino” (SIFUENTES, 2010, p. 40). Porém, bem antes
da conquista do sufrágio, a publicação do livro O Segundo Sexo, de Simone de Bevouir, em
1949, e os estudos de Margareth Mead, em 1935, foram desencadeadores do nascimento
deste Novo Feminismo. Nesta perspectiva, as organizações feministas buscavam uma nova
forma de construir e estudar a sociedade a partir das igualdades sociais entre homens e
mulheres.
A partir de então a diferenciação dos conceitos de sexo e gênero torna-se necessidade no
universo feminista. O conceito de sexo está intrinsecamente ligado à natureza do corpo
humano, ao ser biológico. No entanto, sua carga histórica e a utilização do corpo físico, pelos
homens como arma de dominação, e pelas mulheres como objeto de opressão, levam-nos
às discussões das terminologias e constante construção do ideário de gênero. Este, por sua
vez, é compreendido como a separação do corpo estético ou biológico, naturalizado como tal
para uma contextualização histórico-cultural. Segundo Haraway (2004, p. 209), “gênero é
central para as construções e classificações de sistemas de diferença. A diferenciação
complexa e a mistura de termos para ‘sexo’ e ‘gênero’ são parte da história política das
palavras”.
Este determinismo biológico propõe que, ao encontrar em seu corpo o conceito da sua
sexualidade, o indivíduo adquiriria naturalmente a carga histórica ao qual pertence seu sexo.
Se homem, de dominação, se mulher, de submissão. No entanto, ao nascermos somos
considerados seres neutros e a identidade sexual pode ser contrária ao determinismo físico.
Tudo dependerá do processo pessoal de construção da identidade.
Para Bourdie, “a divisão entre os sexos parece estar ‘na ordem das coisas’, como se diz por
vezes para falar do que é normal, natural, a ponto de ser inevitável (...) funcionando como
sistemas de esquemas de percepção, de pensamento e de ação” (BOURDIEU, 2014, p. 21).
Este fato torna a constituição identitária de posições masculinas e femininas tão inerentes ao
ser humano que se transforma em um “habitus” social e natural.
Assim, a reinvindicação por igualdade faz relação com a ascensão do individualismo,
compreendido aqui na sua configuração pós-revolução industrial, quando o indivíduo passa a
ter necessidade de múltiplas identidades. É a partir desta época, com ascensão na pós-
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modernidade, que as identidades se tornam questionadas e questionadoras do ser humano.
É preciso assumir quem somos1. As identidades estão conectadas às constituições de
gênero e sexo, por que são elas quem influenciarão, individual ou generalizadamente, no
processo de absorção dos conceitos produzidos pela nossa cultura e estimulados pelas
mídias, através das identificações.
As representações e projeções das imagens femininas merecem um olhar crítico pelo fato de
os meios de comunicação juntarem-se às instituições de poder como Igreja, escola e família,
produtores e reprodutores dos estereótipos de gênero. De acordo com Sifuentes (2010,
p.56), “apesar de uma aparência de liberdade feminina e de uma ilusória igualdade de
gêneros (...) os modos de representar a mulher na mídia não tiveram mudanças reais nas
últimas décadas, e reproduzem modelos conservadores de comportamento feminino”.
Neste contexto, as revistas são consideradas pelos autores Scalzo (2008) e Villas-Boas
(1996), como sendo uma mescla de jornalismo e entretenimento. Elas também configuram
uma ligação entre produtor midiático e leitor “que une um grupo de pessoas e, nesse sentido,
ajuda a construir identidade, ou seja, cria identificações, dá sensação de pertencer a um
determinado grupo” (SCALZO, 2008, p. 12). Quem lê determinada revista é diferente de
quem não lê. Segundo Scalzo (2008), as revistas podem determinar os integrantes de uma
tribo. “O fato de ler a revista transforma as meninas num grupo que tem interesses em
comum e que, por isso, comporta-se de determinada forma” (SCALZO, 2008, p. 12). Para a
autora, as revistas determinam comportamentos sociais, trabalhados para determinadas
épocas e leitores, customizando as cargas históricas inseridas nos processos sociais.
As revistas direcionadas para o público feminino sempre existiram e geralmente eram
escritas por homens.2 Elas estiveram presente desde as primeiras segmentações, com o
sentido de reafirmar o que já era considerado padrão nas constituições identitárias entre
homens e mulheres. Fora isso, copiavam os modelos europeus de representação feminina.
Só a partir de 1970, com a presença da mulher no mercado de trabalho, passa-se a discutir
assuntos antes nunca debatidos nas revistas, como sexo e gênero, apesar de ainda não
configurarem um novo tipo de jornalismo, amenizador das cargas históricas e naturalizadas
dos conceitos distribuídos na sociedade.
Lançada em 1986, a editora TRIP iniciou seus passos na comunicação pelo rádio, migrando
para revista e adaptando-se às multiplataformas, ramificando também para TV e site. A
editora e revista provedora da TPM (Trip para Mulheres) nasceu como uma publicação para
1
2
A Identidade Cultural na Pós-Modernidade. Stuart Hall, 2001.
No caso da revista TPM há uma diversificação no expediente do veículo, no entanto o editor e diretor editorial
são homens.
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o público surfista. Hoje, a revista-irmã da TPM, TRIP, é destinada para o público masculino
jovem e busca conteúdos que giram em torno da estética da revista Playboy.
Já a Revista TPM nasceu em maio de 2001, após a editora responsável pela publicação
realizar uma pesquisa de mercado e perceber que boa parte do público de um veículo
direcionado para homens era de mulheres. Com isso, a TPM entra no mercado consumidor
com o objetivo de atender às demandas deste “novo” leitor.
Com o intuito de abarcar um novo mercado consumidor, as mulheres, a Trip Para Mulheres
busca questionar o pensamento padrão sobre as customizações femininas e masculinas. A
Revista trata de assuntos que perpassam desde política até maquiagem. Com periodicidade
mensal, exceto no mês de janeiro ao qual não tem publicação, a TPM circula 36 mil
exemplares por mês e foi a revista feminina com mais indicações ao Prêmio Esso de
Jornalismo3.
Por ser uma ramificação de uma revista destinada aos homens, verificamos alguns tons
ressonantes que se perpetuam na TPM. Das 18 capas selecionadas para análise, publicadas
no período entre fevereiro de 2013 e agosto de 2014, foi percebida a presença, quase que
constante, da mulher como personagem principal na atuação do contrato de leitura. Além
disso, todas as capas são representadas por uma personalidade. A única capa com a
personificação do masculino, neste período de análise, foi a do mês de maio de 2014, com o
ator Wagner Moura, na qual a chamada principal não faz relação com a imagem de capa (ver
imagem 1). A constância de mulheres brancas também é predominante. A única capa que
busca argumentar sobre o preconceito contra a mulher negra no Brasil foi do mês de abril de
2014 (ver imagem 2). Já as mulheres brancas, na revista TPM, são representadas de formas
variadas. Do mesmo modo que aparecem em estado de apelação do corpo (ver imagem 3),
também têm a projeção de um corpo vestido, podendo ser analisado sob um conceito
fechado (ver imagem 4).
3Disponíveis
no site www.tripeditora.com.br, acesso em 15.09.2014.
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Imagem 1
Fonte: www.revistatpm.uol.com.br
Imagem 3
Fonte: www.revistatpm.uol.com.br
Imagem 2
Fonte: www.revistatpm.uol.com.br
Imagem 4
Fonte: www.revistatpm.uol.com.br
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3. O DISCURSO E O CORPO COMO ARTIFÍCIO DE LINGUAGEM E ENUNCIAÇÃO
Nas capas de revista, o texto e a imagem entrelaçados compõem o cenário no qual a
mensagem passeia. Para Vilches, “la foto, por si mesma, és noticia sólo en ciertas
circunstancias y aun entoces viene siempre contextualizada por un texto o pie de foto”
(VILCHES, 1987, p. 91). A fotografia foi incorporada inicialmente aos conteúdos dos
periódicos no intuito de ilustrar, contudo atualmente percebe-se outra relação entre texto e
imagem. A foto por si só comunica, tem força para dizer. As imagens são extremamente
fortes, persuasivas e representam, mas quando alocadas no jornalismo estes dois elementos
(texto e foto) se complementam. A imagem embasa o texto que, por sua vez, ancora o que a
foto já diz. Ao olhar uma imagem, percebemos determinados elementos visíveis de acordo
com nossa cultura, afinal, “la percepción es un proceso creativo y por él nos relacionamos
con nuestro entorno material y social” (VILCHES, 1987, p.20). Mas, é no texto, em sua
complementariedade com a imagem, que, geralmente, compreenderemos o porquê das
ações registradas na fotografia.
Para Vilches (1987), os indivíduos só encontram significados nas imagens já conhecidas,
pertencentes de alguma forma à memória, estereotipada no seu sentido epistemológico. Ao
depararmos com uma imagem somente dialogaremos com ela, a perceberemos como
processo, se tivermos algum conhecimento prévio sobre ela, se já tivermos a encontrado em
algum momento da nossa experiência perceptiva.
As imagens midiatizadas incrementam as associações perceptivas do leitor sobre
determinados assuntos. Por exemplo, quando um veículo de comunicação retrata a mulher
brasileira, é a partir deste momento, que passamos a incrementar à nossa experiência
perceptiva informações sobre como devem ser ou são as mulheres brasileiras. Percebemos
então que elas devem ter corpos exuberantes, coxas e ancas torneadas, ser de cor morena
com tendência ao mulato, saber sambar, etc. Desta forma, para Verón (2005, p. 227 e 228)
“a imagem funciona, portanto, como materialização de um modo de vida”.
Aqui as capas são vistas como o estabelecimento de contratos de leitura (VÉRON, 2005)
entre receptor e transmissor, ou seja, o que faz comprarmos e/ou aderirmos as ideias
apresentadas pelo meio. O discurso é estruturado de acordo com uma pedagogia que
formula este contrato de leitura aceito por ambas as partes (veículo – consumidor). Os dois
estão de comum acordo, o primeiro em produzir o desejável ao consumo do leitor, e o
segundo em dar continuidade ao que deve ser construído. É uma relação mútua.
A enunciação da imagem trabalhada no contrato de leitura concretiza seu discurso na
alteridade, ou seja, é a imagem produzida através do “reconhecimento” do leitor, advindo do
enunciado, que se torna real. Este reconhecimento está baseado no conteúdo individual e
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social dos seres, nas suas percepções e informações sobre a revista e as discussões
propostas por ela, além da visão do seu cotidiano. São os dispositivos de enunciação que
realizam o contrato de leitura e eles são formados pelos modos de dizer do discurso. Se do
lugar ou posição de quem fala (enunciador), para quem se fala (público-alvo e público
idealizado), ou da “relação entre o enunciador e o destinatário, que é proposta no e pelo
discurso”, assim, “emissor e destinatário são entidades discursivas” (VERÓN, 2005, p. 218).
A configuração dos elementos, ou seja, as escolhas tomadas para construção da capa de
uma revista constituem o contrato de leitura. Este processo se transforma em um lugar, lugar
de discurso sugerido pelo enunciador através dos modos de enunciação, onde o destinatário
será convidado a consumir determinado assunto. As enunciações buscam fazer real o dizer,
a ponto de torná-lo possível ao consumo.
Percebemos então que os discursos midiáticos embarcam em um processo de padronização
do consumo destinado a exaltação do corpo, de uma maneira em que a linguagem se torna
essencialmente e simplesmente referencial atrelado à globalização das formas estéticas no
processo de sociabilidade dos corpos. Tanto o discurso textual quanto o discurso imagético
na mídia seguem uma pedagogia discursiva. O tratamento discursivo das formas corpóreas
padroniza-se assim como o corpo estético. Por exemplo, o excesso da espetacularização
dos corpos atléticos - não só dos esportistas, mas principalmente deles - na mídia e
disseminados pelo mundo em seu sistema de globalização dos objetos, padronizando-os,
levam os indivíduos, quase em sua totalidade consumidores destas imagens, a aderirem esta
experiência corpórea. Pois, até mesmo a geração saúde só demonstra que o corpo deve ser
exibido dentro dos padrões naturalmente aceitos. “O nosso corpo não existe diante de nós”
(RODRIGUES, 1990, p. 29). Existe diante da visão dos outros. Nós não existimos para nós,
mas para o alheio.
Para Baudrillard (2005), o estímulo ao consumo do corpo e da beleza, foi o instante marcado
no tempo e no espaço que trouxe a libertação dos corpos. Baudrillard trata o corpo aqui
como um estatuto comercial e coloca em questionamento o real processo de reconhecimento
das mulheres diante da espetacularização dos corpos femininos na mídia. Apesar de o autor
tratar o diferencial entre o corpo feminino atualmente liberto, e este mesmo corpo na idade
média, na qual a religião profanava as curvas femininas como um pecado, ainda assim,
permanece neste suposto corpo liberto atual, considerado aqui em uma visão empírica, o
mesmo estereótipo de algo profano, e ou secundário, que é dirigido para determinadas
classes pela mídia, como algo que estimula o prazer e a diversão, símbolos da transgressão,
compreendido como outrora em um pecado medieval.
Para Peruzzolo (1998), a sociabilidade é quem modela o corpo cada qual em seu período
histórico e geográfico. O corpo, quando disseminado pela cultura e potencializado pela mídia,
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deixa de ser simplesmente uma entidade física e passa a representar um “objeto simbólico”
através das conjunções da linguagem. Ao definir o corpo alheio, eu também defino e espelho
meu próprio corpo, seja em categorias semelhantes ou dissonantes, mas me represento
diante do outro. “Enquanto objetos, os corpos pressupõem, por conseguinte, inevitavelmente
a experiência da subjetivação, tal como os enunciados pressupõem a sua enunciação”
(RODRIGUES, 1990, p. 29).
A enunciação dos corpos nas capas de revistas estimulam a compra e o consumo do corpo.
Como menciona Baudrillard (2002), o incentivo do mundo mágico do crédito torna possível
adquirir o corpo escultural exibido a livre comércio nas revistas4. A mulher é vista neste
processo como modo e produto de consumo. Assim, “o corpo ajuda a vender”
(BAUDRILLARD, 2005, p. 143), ainda mais se for feminino.
O fundamental é compreender o sentido e não a leitura superficial dos produtos midiáticos,
que se localiza em plano secundário. A linguagem só é assim caracterizada por que se torna
sentido. Tudo representa uma conexão histórica e ideológica com o discurso seja ele
imagético ou textual. As relações que temos com o já-dito é que vão contribuir para a
percepção, ou não, do que o discurso quer transmitir, explícita ou implicitamente. É o que
está subjetivado ao nosso pensamento. É a ligação aos estereótipos. As coisas já estão préditas. Como afirmou Vilches (1987) anteriormente em relação às imagens, estas só fazem
sentido se são remotamente conhecidas, instaladas, ao menos, nos lugares mais longínquos
da memória, da mesma forma as palavras também se constituem, carregam consigo suas
conotações, elas só fazem sentido se dizem algo através da historicidade, do contrário, são
inteligíveis. A nossa memória é o que constitui o interdiscurso, o já dito. “O interdiscurso é
todo o conjunto de formulações feitas e já esquecidas que determinam o que dizemos. Para
que minhas palavras tenham sentido é preciso que elas já façam sentido” (ORLANDI, 2007,
p. 33).
O discurso pode ser considerado como um ‘objeto’ de consumo. Ao consumirmos nos
projetamos como quem somos e o que pretendemos diante da sociedade, ou como afirma
Maffesoli (2007), através das nossas associações às tribos e/ou instituições. É preciso assim
“escutar o não-dito naquilo que é dito” (ORLANDI, 2007, p. 34). Dessa forma, “quando
nascemos os discursos já estão em processo e nós é que entramos nesse processo. Eles
não se originam em nós. Isso não significa que não haja singularidade na maneira como a
língua e a história nos afetam” (ORLANDI, 2007, p. 35). Um discurso pode se tornar um
esquecimento e assim fazer parte de uma memória social futuramente (estereótipo).
Podemos verificar isso na moda dos corpos e da forma “natural” com a qual eles passam a
ser tratados pela mídia e recepcionados pelos indivíduos.
4
O Sistema dos Objetos. Jean Baudrillard, 2002.
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O leitor consciente do processo de construção discursiva deve atravessar o discurso para
além do linear dito, como missão de desvendar os efeitos produzidos e encontrar as
maneiras de organização dos discursos.
4. UMA PERCEPÇÃO DO GÊNERO FEMININO NAS CAPAS DA REVISTA TPM
Tratando sobre o tema: “Ser negra no Brasil é (muito) f*da”5, a capa do mês de abril de 2014
traz a representação da mulher negra através da atriz Juliana Alves (ver imagem 6). Por não
ser uma grande personalidade no universo televisivo como a Taís Araújo, por exemplo, e
consequentemente não ser intensamente popular, a atenção ao assunto na capa desta
edição, advinda da projeção da imagem, não é fortemente chamativa. Ou seja, a captação do
leitor se dá mais pelo tema, do que pela personalidade que representa o tema. Ter como
critério de noticiabilidade o tema e não sua personificação é um indício positivo de mudança
discursiva.
Em relação a imagem, cada enquadramento possui uma função narrativa (COUTINHO,
2005). Nesta capa, há um apontamento, a pouca luz que esconde parte do rosto da atriz e o
fundo negro para uma fotografia em tons preto e cinza acabam não ressaltando a imagem da
Juliana Alves, além disso, a utilização de uma postura lateral transmitem uma certa
subjetividade, incrementando ao conceito de universalidade do tema, ao invés de
personificação, como retratado anteriormente.
Com os cabelos presos, pouca ornamentação, e com uma camisa fechada, o corpo de
Juliana Alves é exposto somente pelo seu rosto e olhar forte. Em uma rápida observação
pode-se traçar um comparativo de semelhança e relações entre as imagens 5 e 6.
5
Chamada principal da capa nº141 da Revista TPM, abril 2014.
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Imagem 5
Fonte: www.portaldascuriosidades.com
Imagem 6
Fonte: www.revistatpm.uol.com.br
Em análise, a imagem 56 demonstra o corpo de forma ainda mais explícita se comparada à
imagem 6. O decote incitando o busto e os braços aparentes, para a época da escravidão no
Brasil, eram considerados uma extrema exposição do corpo. Além disso, fotografias iguais a
da imagem 6 só eram feitas pelas elites brancas, não era comum aos negros possuir retratos
desta forma, a maioria era fotografado em seu cotidiano de escravidão, nas senzalas ou,
para as mulheres, como amas de leite7.
Na revista TPM, a representação da mulher negra pode ser comparada à representação da
mulher negra na época da escravidão. Minimizando a exposição de partes do corpo que não
fossem o rosto. A mulher negra na TPM é representada de forma adversa da mulher branca.
Identifica-se assim, através das comparações feitas entre as demais capas desta análise, e
6
Foto feita em 1870 por Alberto Henschel. O fotógrafo foi um grande empresário do ramo no século XIX, com
estúdios em Recife, Salvador, Rio de Janeiro e São Paulo. Considerado o melhor retratista da época, Alberto
Henschel fotografou desde o imperador Dom Pedro II e sua família, até os negros, livres ou escravos. Fonte: A
Fotografia Imperial de Albert Henschel. Claudia Beatriz Heynemann, 2012.
7 A Fotografia Imperial de Albert Henschel. Claudia Beatriz Heynemann, 2012.
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também pelas contextualizações históricas sobre a divisão racial existente dentro do próprio
feminismo, ou seja, entre as próprias mulheres, que a experiência corpórea da negra ainda
está vinculada a opressão classista, racial, sexista e da própria mulher branca, apresentada
com mais liberdade diante do seu corpo.
Como há esta perceptiva dissonância racial no trabalho fotográfico feito pela TPM, Stolke
(2004) explica que “representaciones simbólicas o ideologías pueden ocultar relaciones de
desigualdad y explotación” (STOLKE, 2004, p. 91), seja ela inclusive racial.
Para Haraway:
As mulheres negras não foram constituídas como ‘mulher’, como o foram as
mulheres brancas. As mulheres negras foram simultaneamente constituídas,
racial e sexualmente – como fêmea marcada (animal, sexualizada, e sem
direitos), mas não como mulher (humana, esposa potencial, conduto para o
nome do pai) – numa instituição específica, a escravidão, que as excluía da
‘cultura’ definida como a circulação de signos através do sistema de
casamento (...) Os escravos não tinham posição, não estavam fixados, num
sistema de nomes; eles eram, especificamente, não alocados e portanto
disponíveis. Nesses quadros discursivos, as mulheres brancas não eram, legal
ou simbolicamente, inteiramente humanas; os escravos não eram humanos,
nem legal, nem simbolicamente. (HARAWAY, 2004, p. 240 e 242).
Voltando-se para o discurso textual, a manchete-legenda que a imagem carrega – “Ser negra
no Brasil é (muito) f*da” - destaca a palavra (muito) com o uso do parêntese. TPM quer
destacar com este dispositivo de fala – o texto discursado na chamada principal da revista as diferenças enfrentadas nas questões raciais pela mulher negra, (muito) mais expressiva,
em relação ao homem negro, por exemplo. Apesar disso, este artifício de linguagem,
continua em seu plano não-dito (silenciado). Pois, mesmo possibilitando a interpretação, ele
só será percebido com este sentido, quando analisado historicamente.
Analisando também o uso do asterisco na colocação do termo f*da e a sua apresentação
gráfica, esse remete a uma censura ou “silenciamento” de um certo registro de fala não
aceito pela norma culta. Tal qual o negro é um “registro” de raça não aceito pelo “registro”
padrão, ou seja, pelo branco. A oração “ser negra no Brasil é (muito) f*da” é uma oração
definidora, conceitual, que busca ir à essência do negro e dessa forma defini-la. Contudo, a
oração é constituída por um termo censurado, o “f*da”, simbolizando que ser negro no Brasil
ainda é censurado.
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4.1 O homem da TPM
Em um recorte de 18 capas, somente uma é representada pela figura masculina (ver imagem
1). Nesta edição de maio de 2014, a representação do tema não está atrelada à chamada
principal da revista, intitulada “Perigo: veneno. Está na sua comida, no ar que você respira,
nas redes sociais, na sua mente”. O assunto Wagner Moura (personagem da capa) é uma
chamada secundária, na qual aborda a história do ator, carreira e vida pessoal, sem qualquer
ligação com a manchete principal.
Segundo Verón (2005), o discurso em um contrato de leitura pode obedecer a uma
linearidade, uma “pedagogia da classificação”, ou por contrário, pode expor a desordem
dentro de uma estratégia, sendo intencional a desorganização das informações. Essa
pedagogia nas capas constrói o vínculo com o leitor. Pois, este já espera da revista certa
continuidade, ele conhece o que consome. O surgimento de uma capa, dentro de uma
obediência da uniformidade, na qual a maioria é retratada por mulheres, nos remete à
dúvida, a uma quebra educacional. Para Vilches (1987), este processo de ensinamento do
leitor por parte do veículo está ligado mais às características culturais do receptor do que a
uma imposição propriamente dita. De acordo com o autor, “si existe un proceso pedagógico
en el mirar una imagen, éste se debe al resultado de la vinculación entre propiedades
sensibles captadas por las fotografías y la naturaleza cultural y perceptiva del lector”
(VILCHES, 1987, p. 28).
Em relação à fotografia, o personagem é retratado de uma forma bem diferente da capa
anterior analisada. Apesar de se tratar do mesmo estilo de retrato (mugshot) e da mesma
tonalidade (preto e branco), Wagner Moura, aparece em plano frontal, considerado mais
informativo. Além disto, seu rosto (informação) está parcialmente exposto à luz, mas
deixando perceber todos os seus traços. Esta conjuntura fotográfica expõe aqui mais
informação do que em relação à capa da atriz Juliana Alves, embora com propostas
discursivas semelhantes, se comparadas às demais capas.
Percebemos nesta capa também a ausência de uma intenção da exposição do corpo
masculino como objeto de consumo. Isso demonstra a diferença no tratamento dado à
imagem masculina e à imagem feminina no veículo. Aqui, TPM foge do conceito de
masculinidade hegemônica (CONNELL 2005) e não se apropria da representação dionisíaca
do homem, mas não exclui a personificação do masculino através de quem o representa; do
jogo de luz e da exposição fotográfica.
Assim como o mercado da moda e da beleza oprime o universo feminino, ele também se faz
presente, visivelmente, a partir do final do século XX, no mundo masculino. Isso passa a ser
evidenciado devido à exposição das lutas feministas que consequentemente questionam
também os conceitos de ser homem. É nesta época que a representação do homem na
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mídia se transforma e se associa cada vez mais ao modelo perfeito e escultural, semelhante
aos deuses greco-romanos, incentivando a associação da imagem à ideia de força e
virilidade do homem moderno8, sem feminilizar o posicionamento masculino de consumidor
da beleza. Desta forma, os esquemas de percepção de identidade são universalmente
partilhados (BOURDIEU, 2014). Tanto os homens se reconhecem como dominadores,
quanto as mulheres se reconhecem como dominadas, estigmas naturalmente aceitos, por
ambos os sexos, pela transmissão de conceitos através da nossa cultura.
É no final da década de 90, início do século XXI que conceitos de sensibilidade passam a ser
associados à imagem masculina. Anteriormente a isso, pensava-se que o corpo masculino
não era erotizável, mas sim sensual, referindo-se à masculinidade. “A publicidade do mundo
contemporâneo rende-se a um novo tipo de representação masculina que agora preza
virilidade e sensibilidade ao mesmo tempo” (BARRETO JANUÁRIO, 2014, p. 7). Percebemos
na elaboração destes novos ícones de homem consumível a persistência da constituição
masculina (virilidade) por medo do feminino. “A virilidade, como se vê, é uma noção
eminentemente relacional, construída diante dos outros homens, para os outros homens e
contra a feminilidade, por uma espécie de medo do feminino” (BOURDIEU, 2014, p. 79). Esta
virilidade é ressonante e tende a ser continuada no futuro. No entanto, este processo da
moda da sensibilidade masculina, dá ao homem certa liberdade do estigma de dominador,
ele passa a ser visto como participante e não como ordenador.
Nesta imagem de capa, Wagner Moura não aparece despido. Não só no sentido do nu,
exibindo seu corpo, mas o ator não se apresenta, principalmente, despido dos estereótipos
que acompanham o sexo masculino. De acordo com Perin (1995), o desenvolvimento do
corpo masculino na mídia, pontua historicamente uma mudança social nas relações dos usos
dos corpos, tanto masculinos quanto femininos, uma mudança aparentemente democrática.
O nu do homem quando exibido, apesar de geralmente ser apresentado na categoria
dionisíaca, assim também como a mulher perfeita, quebra com a customização das posições
de poder relativas ao masculino, já que este se demonstra exposto, acessível, frágil, tocável,
um não-deus. Neste caso analisado, o ator se apresenta distante, não atingível.
4.1. A mulher branca e sua representação em TPM
Retratadas na maioria das 18 capas recortadas para este estudo, as mulheres brancas
aparecem de maneiras diversificadas. Ora vestidas, ora seminuas, elas são representadas
8
Homens em revista: gênero, cultura e imagem nas representações masculinas na Publicidade. Soraya Barreto
Januário, 2014.
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de acordo com o tema principal, ou a matéria secundária que envolve a história da
personagem.
Nas capas de fevereiro e abril de 2013 podemos perceber esta adaptação do corpo
nitidamente (imagens 3 e 4). Na primeira imagem temos a atriz Luana Piovani coberta
somente nas partes íntimas, enquanto Clarice Falcão está completamente vestida. Na
imagem 3, a personagem está vinculada a chamada principal da capa – “Menos pudor, mais
poder”. Placas cobrem os seios e a pubis da atriz com os dizeres “Propriedade/Particular”. A
revista propõe, nesta edição, uma discussão sobre a exposição do corpo feminino e sua
relação com a sociedade (machista), além das questões de libertação do corpo.
Na análise da primeira capa percebemos que apesar do discurso textual tratar de um
assunto importante nas questões relacionadas à libertação da mulher, a representação do
tema, utiliza do corpo seminu, já intensamente trabalhado pelas mídias. “O apelo erótico é a
utilização do corpo, ou partes dele, com uma conotação sexual que tem a intenção de
produzir efeitos de sentido não sexuais, mas de consumo” (PERIN, 1995, p. 63). O erotismo
“tem muito mais poder de linguagem, de sedução e de produção de sentidos que qualquer
outro instrumento, por que já vem densamente investido na cotidianidade social e cultural”
(PERIN, 1995, p. 64), assim também como as mulheres.
A imagem de Luana Piovani, fotografada de baixo para cima, apresenta certo sentido de
superioridade e remete a quem visualiza uma posição inferior, que se coloca abaixo desta
projeção. Assim, o ângulo da fotografia confere poder à personagem impondo uma
padronização do que é ser belo na nossa atual sociedade. É necessário que todas lutem
para atingir o padrão da magra, alta e loira. Esta propriedade é realmente particular e
abrange uma pequena fatia da diversificação feminina, dando a elas padrões para se alocar.
Em comparação com a imagem 3, na imagem 4, percebemos que a artista Clarice Falcão
está quase por completa vestida, além de se assemelhar às vestimentas representadas pela
sociedade como pertencentes a de um homem. Ao ler a chamada principal, verificamos uma
aproximação da imagem com o texto. O desenho do bigode na caneca também nos sugere
uma representação masculina, e assim a revista concretiza: “Pra que trabalhar que nem
homem?”. Esta imagem estigmatiza a separação do que é direcionado para mulher e para o
homem. Nesta capa, há um aprisionamento corpóreo, pois a vontade de se vestir da maneira
desejada está presa ao direcionamento do discurso textual. A atriz, repleta de sua liberdade,
poderia se vestir tal qual a projeção representada, no entanto, ao colocar-se diante do
discurso textual, percebe-se o direcionamento da roupa atrelado à fala. Desta forma, TPM
reafirma o padrão estético usual e governante da beleza quando se ironiza o oposto. Para
Matos e Lopes (2007 p. 68) “a ironia destinada à apresentação destas acaba reforçando o
ideal de beleza presente na revista”.
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Clarice Falcão está disposta de uma forma totalmente frontal, prevalecendo a informação,
mas também a padronização, o duro, o estático, ela está centralizada. A mão esquerda da
personagem se posta junto ao corpo, sem movimento, como um militar em seu posto, por
exemplo. Assim, aparece em oposição à capa da Luana Piovani, na qual demonstra uma
sensação de movimentação corporal.
Aqui, a personagem se destaca do fundo, de maneira bem diferente da primeira revista
analisada da atriz Juliana Alves, e deixa, assim, bem claro a relação fundo/figura. Toda a
roupa da Clarice Falcão é de tom azul e preto, em contraponto ao fundo, rosa. Pelas leis
regentes da designação do que é masculino e do que é feminino estão também as cores
rosa para mulheres, e azuis para os homens. A capa número 130 da revista TPM traz, assim,
uma dualidade, o que é para o homem (Clarice Falcão), e o que é para a mulher (TPM).
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este artigo resulta de uma pesquisa que buscou compreender a presença do gênero
feminino nas imagens e chamadas de capa da Revista TPM e a relação delas com a
sociedade, a partir dos conceitos circulantes. A desconstrução das imagens se baseou nos
conteúdos estudados sobre a análise de imagens e principalmente na compreensão de
corpo, sexo e gênero.
Este trabalho de análise demonstrou inúmeras possibilidades de estudo do mesmo material
esmiuçado, como por exemplo, uma análise aprofundada de todas as capas no período
selecionado. Além disso, abre a possibilidade de um estudo sobre o conteúdo da revista,
principalmente, nas matérias relacionadas à capa. Ainda, de compreender os tipos de
mulheres silenciados nas edições recortadas, exemplo disso, são as mulheres trans, não
vistas nesse espaço.
No processo de interpretação compreendemos que a Revista TPM demonstra uma mudança
comportamental da sociedade em seu discurso. Os textos de TPM visam quebrar
paradigmas e questionar o pensamento, são geradores da reflexão. O veículo trata de temas
ainda considerados espinhosos para a ética e a moral cultural da sociedade no século XXI e
podemos considerar isso uma mudança discursiva positiva.
No entanto, as imagens usadas nas capas ainda apelam para sentidos da exploração e
subordinação do corpo feminino. Há um atravessamento nas imagens de capa da TPM
ressonante, que se repete de diversas formas. O jogo com o irônico para representar o
dissonante, incentiva ainda mais a permanência e proliferação da exaltação da beleza.
Apesar de em seu discurso textual encontrarmos assuntos que pretendem questionar o
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pensamento estereotipado, esse é atrelado a imagens que só potencializam a
industrialização da mulher.
Existem aqueles que operam dentro da normalidade, como também os que a resignam e
adquirem novas concepções. No entanto, por apresentar um discurso diferente,
possivelmente dito como revolucionário, a Revista TPM acaba abarcando um mercado
consumidor que busca o diferente, e novas idealizações do real. Porém, quando assimilado
ao texto uma pedagogia de imagens que remetem ao belo e estético pregado socialmente,
pode-se, desta maneira, direcionar o olhar de quem buscaria o oposto.
Uma pesquisa intitulada: Corpo e gênero: uma análise da revista TRIP Para Mulher,
publicada em 2007, na Revista Estudos Feministas, analisou as imagens e matérias da
Revista TPM publicadas no primeiro ano de veiculação do periódico, 2001. Esse estudo
demonstrou que existe uma “ruptura” entre imagens e textos publicados já naquela época.
Desta maneira, considera-se que treze anos após o surgimento da revista, as dissonâncias
entre imagem e texto, isto é, entre discurso visual e discurso textual permanecem as
mesmas.
Intensifica-se assim, a incidência da necessidade de conteúdos imagéticos midiáticos que
promovam a diferença e tanja aos conceitos binários já estatizados aos arquétipos
natureza/cultura, do contrário, sempre regrediremos a um único ser viril e potente.
6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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