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4-ESTADO DA PARAÍBA
PODER JUDICIÁRIO
GABINETE DO EXMO. DES. MÁRCIO MURII,0 DA CUNHA RAMOS
ACÓRDÃO
APELAÇÃO CÍVEL N° 200.2010.022482-9/001 — 12' Vara Cível da Comarca da
Capital
RELATOR: Des. Márcio Murilo da Cunha Ramos
APELANTE: UNIMED João Pessoa – Cooperativa de Irabalho Médico Ltda.
ADVOGADOS: Paulo Guedes Pereira e outros
APELADO: Florisval Lúcio Pereira
ADVOGADO: Lúcio de Queiroz
APELAÇÃO CÍVEL — AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE
FAZER — PROCEDÊNCIA — IRRESIGNAÇÃO —
PLANO DE SAÚDE — ALEGAÇÃO DE NÃO
COBERTURA AO FORNECIMENTO DE PRÓTESES
CARDIOVASCULARES E VÁLVULAS — CONTRATO
QUE NÃO VEDA
A
REALIZAÇÃO DE
PROCEDIMENTOS CARDIOVASCULARES —
IMPLANTAÇÃO DE VÁLVULA COMO CONDUTA
INERENTE AO PROCEDIMENTO CIRÚRGICO —
ABUSIVIDADE MANIFESTA DA CLÁUSULA
RESTRITIVA DE DIREITO — APLICABILIDADE DO
CDC — DECORRÊNCIA DO PRINCÍPIO DA BOA-FÉ
OBJETIVA— DESPROVIMENTO.
— "Entretanto, se a colocação de próteses é necessária para o
tratamento cirúrgico autorizado pela seguradora, é abusiva a
cláusula que prevê sua exclusão da cobertura."(REsp
811.867/SP, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, TERCEIRA
TURMA, julgado em 13/04/2010, RIe 22/04/2010)
— "Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos contratos
de plano de saúde". (Súmula 469 (lo STJ)
VISTOS, RELATADOS E DISCUT • OS os resentes autos
acima identificados.
ACORDA a Egrégia Terceira âmara Cível do Colendo
Tribunal de Justiça da Paraíba, à unanimidade, c 1 desprover o apelo. Fez
sustentação oral, pelo apelante o Bel. Felipe Ribeiro Coutinho, com instrumento de
substabelecimento deferido e juntado nesta sessão de julgamento.
RELATÓRIO
Trata-se de apelação cível interposta pela UNIMED João
Pessoa — Cooperativa de Trabalho Médico Ltda. contra a sentença (fls. 96/105)
proferida pelo MM. Juiz de Direito da 12' Vara Cível da Comarca da Capital que, nos
autos da ação ordinária de obrigação de fazer ajuizada por Florisval Lúcio Pereira,
julgou procedente o pedido para, "confirmando a tutela antecipada, reconhecer a
obrigação de fazer e determinar à ré em custear o procedimento cirúrgico e materiais,
inclusive prótese, na forma solicitada pelo médico assistente do autor". Ao final,
condenou a promovida ao pagamento de custas e honorários, estes fixados no importe
de R$ 1.000,00 (hum mil reais), conforme inteligência do art. 20, §§ 3° e 4°, do CPC.
A apelante, em suas razões recursais de fls. 106/120, aduz que: o
contrato celebrado não apresenta irregularidades, uma vez que não houve pactuação
acerca do fornecimento de válvula para• o custeio de procedimento cirúrgico, o que
decorre da cláusula 4.1 do contrato firrhado pelas partes: tal previsão não se revela em
confronto com o Código de Defesa do Cónsumidor, pois este não veda a estipulação de
cláusulas restritivas cardiovascular; o procedimento cirúrgico era inexistente à época da
contratação do plano; é possível a estipulação de cláusulas restritivas.
O apelado, nas . contrarrazões de fls. 125/128, pugnou pela
manutenção da sentença vergastada.
A Procuradoria de. Justiça, no parecer de fls. 134/137, opinou
pelo desprovimento do curso.
É o relatório.
VOTO:
Da análise dos au. tos, infere-se que o autor, usuário do plano de
saúde, após a realização de exames, diagnosticado quadro de Hidrocefalia, motivo
pelo qual foi indicado, em regime de urgência, a realização de procedimento cirúrgico
para implantação de válvula auto-regulável, conforme revelam os documentos de fls.14/
16.
Ao procurar a Unimed para obter a autorização para a realização
da cirurgia, o apelada obteve resposta negativa, razão pela qual manejou a presente ação
com intuito de realizar do procedimento cirúrgico, tendo sido a pretensão julgada
procedente.
Ab initio, cumpre .frisar que a atividade de prestação de plano de
saúde objeto dos autos está abrangida pelo Código de Defesa do Consumidor, haja vista
egras dispostas
a inteligência do artigo 3°, § 2°, devendo suas cláusulas obedece
tre as partes,
na legislação consumerista, modo a evitar eventuais des uilibrios
especialmente em virtude da hipossuficiência do consumidor em relação o fornecedor.
Nesse sentido, destaco a rece e simula 469 do STJ, ve rbis:
Súmula 469 do STJ - "Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos
contratos de plano de saúde".
In casu, a apelante alega a necessidade de reforma do decisum
guerreado, essencialmente, sob o argumento de que o procedimento solicitado pela
apelada não tem respaldo no instrumento de contrato firmado entre as partes.
Sem razão, todavia.
É que, realmente, restou demonstrado que o apelado padecia de
grave problema cardíaco, sendo comprovada a imperiwza necessidade de ser submetida
a tratamento cirúrgico, sendo abusivo o comportamento da recorrente ao não autorizar a
realização do procedimento.
Ademais, gize-se que o contrato (doc. de fls. 49) firmado entre
os litigantes não exclui a possibilidade de realização de cirurgias ligadas a problemas
cardiovasculares. Além disso, a ré/apelante, em sua peça de defesa (doc. de fls. ), não
nega a cobertura de procedimentos relativos à problemas cardíacos, mas sim o
fornecimento de prótese cardiovascular e válvulas.
Ora, não há como negar que o comportamento desenvolvido pela
suplicada mostra-se desarrazoável, já que não pode esta negar a cirurgia por conta dos
materiais necessários à sua realização e, concomitantemente, dispor-se a prestar
assistência médica e hospitalar, na parte clínica e cirúrgica, o que configura
posicionamento contraditório, devendo a cláusula ser interpretada do modo mais
favorável a parte mais fraca, qual seja, o consumidor.
Desta feita, a partir do exame dos dispositivos contratuais
anteriormente aludidos, bem como pelo fato de a recorrente não ter se insurgido contra a
doença e o tratamento cirúrgico postulados pela recon ida, entendo que o deslinde da
questão mostra-se facilitada. Frise-se, também, que a apelante não contesta o
procedimento relativo à implantação de válvula auto-regulável (fls. 14/16), tendo, tãosorriente, afirmado que o plano não o cobria.
Ora, sendo o tratamento cirúrgico autorizado pela operadora do
plano de saúde, resta induvidoso que o comportamento da ré/apelante, ao negar o
procedimento cirúrgico, revela-se nitidamente abusivo, já que não é crível a operadora
de plano de saúde prever a cobertura para determinado tratamento e, de outro lado,
restringir o fornecimento dos materiais necessários pala realização do procedimento
médico.
A boa-fé objetiva, dever anexo aos contratos, baseia-se no dever
de lealdade e transparência que devem nortear as relações de consumo, encontrando
respaldo no art. 422 do CC, verbis:
"Art. 422. Os contratantes são obrigadov a guardar, assim na conclusão do
contrato, como em sua execuçõo, os priocípios de probidade e boa-fé."
Sabe-se, ainda, que é cediço que. nos termos do art. 51, IV, da
•sulas c ntratuais que estabeleçam
Lei 8.078/90, são nulas, de pleno direito, as
obrigações consideradas iníquas, abusivas, em como ccloquem o consumidor em
eis com a b°a - f e a equidade. Senão, vejadesvantagem exagerada ou sejam incomp
se:
"Art. 51. Sõo nulas de pleno direito, cifre outras, as cláusulas contratuais
relativas ao fornecimento de produtos e serviços que:
(.)
IV- estabeleçam obrigações considerados iníquas, abusivas, que coloquem o
consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boafé ou a eqüidade;"
É importante, também, frisar que a jurisprudência firmou o
entendimento de que, malgrado seja permitida a pactuação de cláusula restritiva em
contrato de plano de saúde, tal limitação não terá validade se o material é indispensável
para o tratamento cirúrgico autorizado pela recorrente.
Nesse sentido, aponta a jurisprudência:
"DIREITO CIVIL. PLANO DE 51 ÜDE. CIRURGIA AUTORIZADA.
AUSÊNCIA DE COBERTURA DÁ COLOCAÇÃO DE PRÓTESES
INDISPENSÁVEIS PARA O SUCESSO DO PROCEDIMENTO.
I - É legal em contrato de plano de sai;, le a cláusula que limite os. direitos do
consumidor; desde que redigida com Plç cautelas exigidas pelo Código de
Defesa do Consumidor.
2 - Entretanto, se a colocação de prátcses é necessária para o tratamento
cirúrgico autorizado pela seguradora, é abusiva a cláusula que prevê sua
exclusão da cobertura.
Recurso Especial provido,"
(REsp 811.867/5P, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA,
julgado em 13/04/2010, DJe 22/04/2010)
RECURSO ESPECIAL - PLANO DE SAÚDE - EXCLUSÃO DA
COBERTURA O CUSTEIO OU O RESSARCIMENTO DE
IMPLANTAÇÃO DE PRÓTESE IMPORTADA IMPRESCINDÍVEL PARA
O ÊXITO DA INTERVENÇÃO CIR1 RGICA COBERTA PELO PLANO INADMISSILIDADE ABUSIVIDAVE MANIFESTA DA CLÁUSULA
RESTRITIVA DE DIREITOS - RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
I - Ainda que se admita a possibilidade do contrato de plano de saúde
conter cláusulas que limitem direitos do consumidor, desde que estas
estejam redigidas com destaque, pemitindo sua imediata e fácil
compreensão, nos termos do § 4 0 do artigo 54 do CDC, mostra-se
abusiva a cláusula restritiva de direito que prevê o não custeio de
prótese, imprescindível para o êxito do procedimento cirúrgico coberto
pelo plano, sendo indiferente, para tanto, se referido material é ou não
importado;
II - Recurso provido.
(REsp 1046355/RJ, Rel. Ministro MASSAMI UYEDA, TERCEIRA
TURMA, julgado em 15/05/2008, DJe n5/08/2008)
No mesmo tom:
"PLANO DE SAÚDE - ANGIOPLASTIA CORONARIANA COLOCAÇÃO DE STENT - POSSIBIl IDADE.
É abusiva a cláusula contratual que exclui de cobertura a colocação de
-
stent, quando este é necessário ao bom êxito do procedimento cirúrgico
coberto pelo plano de saúde."
(REsp 896.2471RJ, Rel. Ministro)MBERTÇ GOMES DE BARROS,
TERCEIRA TURMA, julgado e 1/11'2006, DJ 18/12/2006, p. 399)
No mesmo sentido, j decidiu o Ugrégio Tribunal de Justiça da
Paraíba. Confira-se:
"APELAÇÃO CI EL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS
MORAIS E MATERIAIS. PLANO DE SAÚDE. COBERTURA DE
DESPESAS. RESTRIÇÃO CONTRATUAL. CIRURGIA CARDÍACA.
IMPLANTAÇÃO DE PRÓTESE. STENT FARMACOLÓGICO.
CLÁUSULA ABUSIVA. LEI NQ 9.65( , /98 - ANEXO RN NQ 82. ROL DE
PROCEDIMENTOS DE OBRIGATÓRIA COBERTURA PELOS
PLANOS DE SAÚDE. INFRAÇÃO AO CDC. PREVALÊNCIA DO
PRINCIPIO CONSTITUCIONAL DA DIGNIDADE DA PESSOA
HUMANA. ABALO À SAÚDE, ATO ILÍCITO. REQUISITOS DA
RESPONSABILIDADE CIVIL DF isiONSTRADOS. DANOS MORAIS
CONFIGURADOS. OBRIGAÇÃO INDENIZATÓRIA DEVIDA.
DESPROVIMENTO DO APELO. - É abusiva a cláusula contratual que
exclui da cobertura determinado procedimento médico necessário, pois
restringe direitos inerentes à natureza do contrato, a ponto de tornar
impraticável a realização de seu objeto. nos exatos termos do artigo 51, §1Q,
inciso II, do CDC. - Ademais, as cláusulas restritivas, que impeçam o
restabelecimento da saúde em virtude de doença sofrida atentam contra a
expectativa legítima do consumidor quanto ao plano de saúde contratado. - O
reconhecimento da fundamentalidarle do princípio constitucional da
dignidade da pessoa humana impõe uma nova postura dos operadores do
direito que devem, na aplicação das normas, assegurar a vida humana de
forma integral e prioritária. - O dano moral pode ser definido como lesão
diminuição ou destruição que, devido a um certo evento, sofre uma pessoa,
contra sua vontade em qualquer bem ou interesse jurídico, patrimonial ou
moral. - A indenização tem o condão de compensar o dano moral sofrido,
bem como desiderato punitivo e pedagógico, impondo-se cautela na
quantificação indenizatória, de modo a evitar perspectiva de lucro fácil e
generoso, enfim, o locupletamento indevido.
TJPB - Acórdão do processo n° 00120070229537001 - Órgão (4' câmara
civel) - Relator DR. RODRIGO MARQUES SILVA LIMA - JUIZ
CONVOCADO -j. em 19/01/2010"
Destarte, a requerida tinha resmnsabilidade de providenciar o
implante da válvula auto-regulável indicado pelo profissional capacitado, pois, à ré não
assiste o direito de autorizar o procedimento cirúrgico a ser realizado, restringindo, no
entanto, o fornecimento dos materiais necessários para n sucesso da cirurgia, razão pela
qual não merece retoque a decisão vergastada.
Ante o exposto, NEGO PROVI .N IENTO AO RECURSO.
É como voto.
Presidiu a Sessão o Exmo. Si Des. Genésio Gomes Pereira
Filho. Participaram do julgamento o Exmo. Des, Márcio Murilo da Cunha Ramos, o
Exmo. Des. Saulo Henriques de Sá e Benevides e o Exnio. Des. Genésio Gomes Pereira
Filho.
Presente ao julgamento o Exmo. Dr. Marcos Vilar Souto Maior,
Procurador de Justiça.
João Pess
2012.
cio Murilo da Cunha Ramos
Desembargador
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