Investigações e Conexões Matemáticas Paulo Afonso: Escola Superior de Educação do Instituto Politécnico de Castelo Branco e Centro de Investigação em Promoção da Literacia e Bem-Estar da Criança (LIBEC) Introdução Tendo em consideração que a OCDE define o conceito de literacia matemática como sendo “a capacidade de um indivíduo identificar e compreender o papel que a matemática desempenha no mundo, de fazer julgamentos bem fundamentados e de usar e se envolver na resolução matemática das necessidades da sua vida, enquanto cidadão construtivo, preocupado e reflexivo” (ME, 2004, p. 11), não devemos ficar indiferentes relativamente ao baixo nível de literacia matemática alcançado pela maioria dos 4608 alunos portugueses, nascidos no ano de 1987, afectos a 153 escolas, que participaram no Programme For International Student Assessment – PISA 2003. De facto, tal como refere o relatório produzido pelo Gabinete de Avaliação Educacional do Ministério da Educação, “Portugal tem ainda um elevado número de estudantes com níveis muito baixos de literacia matemática: cerca de 30% dos nossos alunos têm um nível de literacia matemática, no PISA, igual ou inferior a 1, quando entre os países da OCDE esse valor é de 21%. Isto significa que quase um terço dos nossos jovens de 15 anos se limita a responder correctamente a questões que envolvem contextos familiares, em que toda a informação relevante para a resolução está presente, e só consegue identificar informação e levar a cabo procedimentos de rotina de acordo com instruções, em situações explícitas. Esses jovens obtêm sucesso em acções que se podem considerar óbvias e que decorrem directamente dos estímulos apresentados” (ME, 2004, p. 16). Por sua vez, ao analisarem-se os resultados em literacia matemática dos melhores alunos portugueses com os resultados dos restantes melhores alunos dos países da OCDE, constata-se que “15% dos alunos do espaço da OCDE 1 estão nos níveis de proficiência 5 ou 6 do PISA e apenas 5% dos alunos do nosso país se encontram na mesma situação” (ME, 2004, p. 16). Este dado revela que são poucos os alunos portugueses “capazes de conceptualizar, generalizar e utilizar informação, com base nas suas investigações e na modulação de situações problemáticas complexas [ou] estabelecer a ligação entre diferentes fontes de informação e diferentes representações e fazer transferências entre elas, com flexibilidade [...]”(ME, 2004, p. 11). Quando comparados os alunos portugueses que obtiveram resultados muito baixos em termos de literacia matemática com os alunos que obtiveram resultados mais elevados, constata-se, entre outros aspectos, que estes últimos utilizam estratégias de “controlo e de elaboração”, e os outros utilizam “mais estratégias de memorização” (ME, 2004, p. 41). No que concerne especificamente à resolução de problemas, um quarto dos alunos portugueses apenas atingiu o mais baixo nível de proficiência - nível 1, o que corresponde ao seguinte perfil de resolvedor: “Os estudantes proficientes no Nível 1 resolvem problemas quando têm de lidar com uma única fonte de dados que contenha informação distinta e bem definida. Compreendem a natureza de um problema e localizam o extraem, consistentemente, informação relacionada com as características relevantes do problema. Os estudantes de Nível 1 podem conseguir transformar a informação do problema para apresentarem o problema de modo diferente, como por exemplo, retirar informação de uma tabela para criar um desenho ou um gráfico. Os estudantes também serão capazes de aplicar a informação para verificarem um número limitado de condições bem definidas no âmbito do problema. Contudo, estes estudantes, em geral, não são capazes de lidar com problemas multifacetados, que envolvam mais do que uma fonte de dados ou que requeiram que estes argumentem a partir da informação fornecida” (ME, 2004, pp. 61-62). Este cenário merece, pois, alguma reflexão, até porque, a título de exemplo, quando escolhemos para análise um dos itens do questionário pertencente a este estudo, verificamos que no mesmo, apesar de simples, os nossos alunos obtiveram menor taxa de sucesso de resolução do que os alunos da OCDE: 2 PADRÃO EM ESCADA O Roberto constrói um padrão em escada, utilizando quadrados. Aqui estão as etapas que ele segue: Etapa 1 Etapa 2 Etapa 3 Como pode ver, o Roberto utiliza um quadrado na etapa 1, três na Etapa 2 e seis na Etapa 3. Quantos quadrados deverá utilizar na quarta etapa? In: ME, 2004, p. 89. Ao reflectirmos sobre as dificuldades manifestadas perante situações semelhantes a esta, muitas perguntas nos invadem o pensamento: (a) porque será que esta actividade gera dificuldades?; (b) será por se tratar de uma situação, aparentemente, relacionada com a área da Geometria?; (c) será pelo facto de os alunos não estarem habituados a reflectir perante situações que não são passíveis de resolução através dos conhecimentos que têm imediatamente ao seu dispor? Estas e outras questões também nos levam a reflectir acerca do modo como a matemática é “vista” pelos docentes, bem como acerca da forma como a matemática é “levada” para a sala de aula. Porventura, será uma matemática conceptualizada como a ciência das certezas absolutas, onde o erro não pode existir e onde o professor continua a desempenhar o papel de transmissor do saber, marcando a sua actuação com base na exercitação memorística da matéria. Contrariando a tendência acabada de referir, esta comunicação pretende enfatizar a importância que as actividades de investigação, e as conexões que daí resultam, podem assumir na sala de aula desta disciplina. Assim, recorrendo ao tipo de números envolvidos no item do PISA 2003, acima 3 transcrito, (números triangulares) pretende-se avançar com algumas tarefas de investigação com eles relacionadas. Actividades de investigação conectadas com o tipo de números envolvidos nesta situação Apesar de simples, a situação anterior, envolvendo números triangulares, pode permitir que se proponham várias actividades de investigação aos alunos. Actividade A: Sabendo que o quadrado inicial pretende representar o número de apertos de mão que duas pessoas dão ao cumprimentar-se, que os três quadrados seguintes representam o número de apertos de mão dados por três pessoas e que os seis quadrados representam o número de apertos de mão dados por quatro pessoas, quantas seriam as pessoas a cumprimentarem-se por este meio, de modo a obterem-se 45 quadrados, isto é, 45 apertos de mão? Possível resolução: Esta tarefa pode suscitar, da parte do resolvedores, a proposição de várias conjecturas ou hipóteses de resolução. Desde logo, uma delas passa por se descobrir a regularidade ou padrão que relaciona o número de quadrados existentes nas figuras com o número de pessoas a cumprimentarem-se através de apertos de mãos. Nº de 1 3 6 10 15 ... 21 Quadrados Nº de Pessoas +2 +3 +4 +5 +6 +7 4 Prolongando esta tabela, facilmente se descobre que os 45 quadrados estão relacionados com 10 pessoas. Por outro lado, relacionando as duas colunas pode-se constatar que o produto do número de pessoas (P) pelo número de pessoas menos uma (P - 1) é sempre igual ao dobro do número de quadrados (2Q) que se obtêm: P x (P - 1) = 2Q Logo, para o caso dos 45 quadrados, conseguimos encontrar o número de pessoas envolvidas, efectuando os cálculos seguintes: P x (P - 1) = 2 x 45 ⇔ P 2 − P = 90 ⇔ P 2 − P − 90 = 0 ⇒ P = 10 Confirmam-se, pois, as 10 pessoas. Esta relação algébrica permite agora um novo desafio : Quantos quadrados se obteriam no caso de estarem presentes 20 pessoas? De facto, a equação anterior, resolvida em ordem a Q, permite que se conclua que o número de quadrados seja obtido pela metade do produto do número de pessoas envolvidas (P) pelo número de pessoas envolvidas menos uma unidade (P –1): Q= P x (P - 1) 2 Logo, para o caso das 20 pessoas, conseguimos encontrar o número de quadrados com elas relacionados (190), efectuando os cálculos seguintes: Q= 20 x (20 - 1) 20 x 19 ⇔Q= ⇔ Q = 190 2 2 Contudo, se não se conhecer esta relação algébrica, poder-se-á resolver o desafio anterior através da elaboração de esquemas ou figuras, associadas à estratégia da decomposição do problema em problemas mais simples: 5 2 pessoas 3 pessoas 4 pessoas A A A A B B A B • B C 1 A B C B • 3 C • • A D A B C D A • • • B • • C • C D B 6 Através da análise da tabela anterior, constata-se que o número de quadrados assinalados pode ser obtido através do somatório do número de pessoas envolvidas menos uma com o número de pessoas envolvidas menos duas e assim sucessivamente até ao número de pessoas envolvidas menos o número de pessoas envolvidas menos uma, isto é: Q= P −1 ∑ (P − i) = (P − 1) + (P − 2) + ... + [P − (P − 1)] i =1 Logo, para 20 pessoas, resultaria que: Q= P −1 ∑ (P − i) = (20 − 1) + (20 − 2) + ... + (20 − 19) = 190 i =1 Actividade B: Tendo à disposição os números naturais, do 1 ao 9, inclusive, escolhe apenas seis e coloca-os nos círculos existentes no triângulo seguinte, sem os repetires, de modo que a soma em cada lado seja sempre 10 (número de quadrados solicitado para a quarta etapa do item seleccionado anteriormente da prova referente ao PISA 2003). Averigua se haverá apenas uma possibilidade de resposta: 6 Possível resolução: Esta situação pode levar a que os resolvedores recorram à estratégia da tentativa e erro e consigam obter todas as soluções possíveis. Contudo, tendo em conta alguma morosidade inerente à estratégia acabada de referir, é desejável que equacionem uma estratégia mais estruturada para resolução da actividade, que passa pela identificação de todas as somas 10 possíveis, resultantes da adição de três parcelas diferentes, cujos valores estão compreendidos entre o 1 e o 9, inclusive. Assim, surgem as seguintes possibilidades: a) 7 + 2 + 1 b) 6 + 3 + 1 c) 5 + 4 + 1 d) 5 + 3 + 2 Estas quatro possibilidades, combinadas três a três, permitem a testagem de quatro casos. O cálculo combinatório atesta este número, pois: C34 = 4! 4 x 3! = =4 (4 − 3)! 3! 3! Eis as várias combinações possíveis: A – a); b); c) B – a); b); d) C – a); c); d) D – b); c); d) Tendo em conta que o caso A envolve três adições em que o 1 é comum a todas elas, impossibilita que se possa originar qualquer tipo de soma mágica num triângulo deste tipo. Contudo, os outros três casos permitem a obtenção da soma pretendida: 7 a) 7 + 2 + 1 Caso B Caso C b) 6 + 3 + 1 b) 6 + 3 + 1 Caso D c) 5 + 4 + 1 c) 5 + 4 + 1 d) 5 + 3 + 2 d) 5 + 3 + 2 d) 5 + 3 + 2 1 1 1 6 3 a) 7 + 2 + 1 4 7 2 5 5 4 7 3 2 5 6 2 3 De facto, no caso B, os números a colocar nos vértices do triângulo são o 1, o 2 e o 3, pois são os únicos números comuns a cada duas somas a usar. Por sua vez, no caso C, os números comuns são o 1, o 2 e 5 e, no caso D, os números comuns são o 1, o 3 e o 5. Tirando partido desta soma mágica, que coincide com o quarto número triangular, poder-se-ia pedir aos alunos para procederem a um estudo idêntico para o próximo número triangular (15). Trata-se de uma soma que resulta das seguintes oito adições: A) 1 + 9 + 5 B) 1 + 8 + 6 C) 2 + 9 + 4 D) 2 + 8 + 5 E) 2 + 7 + 6 F) 3 + 8 + 4 G) 3 + 7 + 5 H) 4 + 6 + 5 Procedendo-se ao estudo das combinações possíveis, resultariam cinquenta e seis, conforme atestam os seguintes cálculos: C38 = 8! 8 x 7 x 6 x 5! = = 56 (8 − 3)! 3! 5! x 6 Uma forma de se identificarem as cinquenta e seis combinações pode ser o que está patente nas tabelas seguintes: 8 Iniciando com a adição A ABC ACD ADE AEF AFG ABD ACE ADF AEG AFH ABE ACF ADG AEH ABF ACG ADH ABG ACH AGH ABH Iniciando com a adição B BCD BDE BEF BFG BCE BDF BEG BFH BCF BDG BEH BCG BDH BGH BCH Iniciando com a adição C CDE CEF CFG CDF CEG CFH CDG CEH Iniciando com a adição D CGH DEF DFG DEG DFH DGH DEH CDH Iniciando com a adição E EFG Iniciando com a adição F EGH FGH EFH Não deixa de ser curioso constatar que os números triangulares voltam a estar envolvidos no estudo destas cinquenta e seis combinações, pois este número subdivide-se em 21 casos a iniciar pela letra A, 15 casos a iniciar pela letra B, 10 casos a iniciar pela letra C, 6 casos a iniciar pela letra D, 3 casos a iniciar pela letra E e ainda 1 último caso a iniciar pela letra F. Começando-se pela análise dos 21 casos iniciados pela letra A, verificase a existência de apenas quatro casos em que a soma resultante é 15: 9 A+B+C A+B+D A+B+E A+B+F A+B+G 1+9+5 1+9+5 1+9+5 1+9+5 1+9+5 1+8+6 1+8+6 1+8+6 1+8+6 1+8+6 2+9+4 2+8+5 2+7+6 3+8+4 3+7+5 1 9 5 6 8 2 A+B+H A+C+D A+C+E A+C+F 1+9+5 1+9+5 1+9+5 1+9+5 1+8+6 2+9+4 2+9+4 2+9+4 4+6+5 2+8+5 2+7+6 3+8+4 2 1 9 5 4 8 6 4 8 9 5 1 A+C+G A+C+H A+D+E A+D+F 1+9+5 1+9+5 1+9+5 1+9+5 2+9+4 2+9+4 2+8+5 2+8+5 3+7+5 4+6+5 2+7+6 3+8+4 9 2 4 1 6 5 10 A+D+G A+D+H A+E+F A+E+G A+E+H 1+9+5 1+9+5 1+9+5 1+9+5 1+9+5 2+8+5 2+8+5 2+7+6 2+7+6 2+7+6 3+7+5 4+6+5 3+8+4 3+7+5 4+6+5 A+F+G A+F+H A+G+H 1+9+5 1+9+5 1+9+5 3+8+4 3+8+4 3+7+5 3+7+5 4+6+5 4+6+5 Por sua vez, a análise dos 15 casos iniciados pela letra B, permite verificar a existência de mais três casos em que a soma resultante é 15: B+C+D B+C+E B+C+F 1+8+6 1+8+6 1+8+6 2+9+4 2+9+4 2+9+4 2+8+5 2+7+6 3+8+4 B+C+G B+C+H B+D+E 1+8+6 1+8+6 1+8+6 2+9+4 2+9+4 2+8+5 3+7+5 4+6+5 2+7+6 2 5 8 7 1 B+D+F B+D+G B+D+H B+E+F B+E+G 1+8+6 1+8+6 1+8+6 1+8+6 1+8+6 2+8+5 2+8+5 2+8+5 2+7+6 2+7+6 3+8+4 3+7+5 4+6+5 3+8+4 3+7+5 6 5 4 6 2 1 8 11 B+E+H B+F+G B+F+H B+G+H 1+8+6 1+8+6 1+8+6 1+8+6 2+7+6 3+8+4 3+8+4 3+7+5 4+6+5 3+7+5 4+6+5 4+6+5 4 5 6 3 8 1 Analisando-se agora os 10 casos iniciados pela letra C, constata-se a existência de mais três casos em que a soma resultante é 15: Adições “C”, “D” e “E” Adições “C”, “D” e “F” Adições “C”, “D” e “G” Adições “C”, “D” e “H” 2+9+4 2+9+4 2+9+4 2+9+4 2+8+5 2+8+5 2+8+5 2+8+5 2+7+6 3+8+4 3+7+5 4+6+5 2 4 3 8 9 9 5 2 4 8 6 5 12 Adições “C”, “E” e “F” Adições “C”, “E” e “G” Adições “C”, “E” e “H” Adições “C”, “F” e “G” 2+9+4 2+9+4 2+9+4 2+9+4 2+7+6 2+7+6 2+7+6 3+8+4 3+8+4 3+7+5 4+6+5 3+7+5 2 9 7 4 Adições “C”, “F” e “H” Adições “C”, “G” e “H” 2+9+4 2+9+4 3+8+4 3+7+5 4+6+5 4+6+5 6 5 Com início na letra D, as 6 combinações permitem a obtenção de mais quatro casos em que a soma resultante é 15: Adições “D”, “E” e “F” Adições “D”, “E” e “G” 2+8+5 2+8+5 2+7+6 2+7+6 3+8+4 3+7+5 2 8 5 6 3 7 13 Adições “D”, “E” e “H” Adições “D”, “F” e “G” Adições “D”, “F” e “H” Adições “D”, “G” e “H” 2+8+5 2+8+5 2+8+5 2+8+5 2+7+6 3+8+4 3+8+4 3+7+5 4+6+5 3+7+5 4+6+5 4+6+5 2 3 4 8 5 7 7 4 6 4 5 6 8 2 5 3 8 2 Com início na letra E, as 3 combinações permitiram a obtenção de mais um caso cuja soma é 15: E+F+G E+F+H E+G+H 2+7+6 2+7+6 2+7+6 3+8+4 3+8+4 3+7+5 3+7+5 4+6+5 4+6+5 5 4 6 3 2 7 Por ultimo, o restante caso, iniciado pela letra F, também permite a obtenção da soma mágica 15: Adições “F”, “G” e “H” 3+8+4 3+7+5 4+6+5 3 8 4 7 6 5 14 Em síntese, esta tarefa de investigação permite concluir que das 56 possíveis combinações, 16 originam a soma mágica pretendida (15). Um estudo semelhante poderia ser feito para o próximo número triangular (21). Curiosamente, tendo em conta o aumento do número de combinações ocorridas na passagem da soma mágica correspondente ao terceiro número triangular (10) para a soma mágica relativa ao quarto número triangular (15), os resolvedores poderiam ser levados a pensar que o número de combinações possíveis continuaria a aumentar para este novo caso. Contudo, a realização desta nova investigação iria contrariar essa tendência, pois, como veremos a seguir, apenas há um caso que permite a obtenção da soma 21: A) 9 + 8 + 4 B) 9 + 7 + 5 C) 8 + 7 + 6 9 4 8 5 6 7 Actividade C: Continuando a ter à disposição os números naturais, do 1 ao 9, inclusive, coloca-os em todos os quadrados existentes na figura seguinte, de modo que se obtenha sempre uma soma mágica (15) em todas as direcções: vertical, horizontal e oblíqua: 15 Possível resolução: Esta situação pode ser resolvida por tentativa e erro, desde que os resolvedores não conheçam o algoritmo adequado à sua resolução. Uma possível solução é a seguinte, pois obedece à condição de a soma ser sempre igual ao quinto número triangular (15): 2 9 4 7 5 3 6 1 8 De imediato podem-se desafiar os alunos a descobrir a próxima soma mágica, que tem que ser coincidente com o valor do próximo número triangular (21). Contudo, deve dizer-se-lhes que os números a usar passariam a ser os naturais consecutivos deste o 3 até ao 11, inclusive. O mais natural é que por tentativas os alunos consigam dar resposta à situação, que pode ser a seguinte: 4 11 6 9 7 5 8 3 10 A partir deste momento, os alunos podem ser desafiados a investigar eventuais analogias existentes em ambas as resoluções. Uma possível analogia é que ambas as somas mágicas coincidem com o facto de serem dois números triangulares: 16 SOMA 15 SOMA 21 Outra possível analogia é que ambas as somas são múltiplos do número três. Por sua vez, também se pode concluir que a posição dos números nos quadrados obedece a uma certa ordem, pois quer os menores, quer os maiores, ou os restantes, estão a ocupar espaços semelhantes, o que poderá levar a pensar-se que os nove números usados se podem distribuir de acordo com o seguinte critério: 2º 9º 4º 7º 5º 3º 6º 1º 8º No sentido de se testar esta conjectura, pode-se propor uma nova tarefa que consiste na obtenção do próximo número triangular, múltiplo de três, que é o 36. Para tal apenas deverá ser revelada a pista de que o menor número a usar será o 8. Claro que facilmente se confirma a conjectura anterior, pois o resultado é o seguinte: 1º 2º 3º 4º 5º 6º 7º 8º 9º 8 9 10 11 12 13 14 15 16 9 16 11 14 12 10 13 8 15 17 Analisadas as somas obtidas nestes três quadrados mágicos, somas essas, coincidentes com três números triangulares (15, 21 e 36), pode-se desafiar os alunos a investigar a relação existente ente o aumento dessas somas e o aumento do valor numérico de cada número existente em cada quadrado mágico, quando comparado com o respectivo número do quadrado mágico anterior. Esta situação sugere que os alunos comparem os três casos em simultâneo: 2 9 4 4 11 6 9 16 11 7 5 3 9 7 5 14 12 10 6 1 8 8 3 10 13 8 15 Soma 15 Soma 21 Soma 36 É desejável que os alunos concluam que da primeira para a segunda soma há um aumento de seis valores, que é precisamente o triplo do aumento de cada número envolvido no segundo caso relativamente ao respectivo número envolvido no primeiro. De facto, do primeiro quadrado para o segundo quadrado mágico os números aumentaram dois valores, o que implicou que a soma do segundo passasse a ser maior do que a do primeiro caso em seis valores. Esta conclusão continua a verificar-se quando se comparam os valores dos números envolvidos no segundo quadrado mágico e no terceiro, bem como quando se comparam as respectivas somas. De facto, cada valor do último quadrado mágico tem cinco unidades a mais que o respectivo valor do segundo quadrado mágico. Por seu turno, a soma do terceiro quadrado é o triplo deste valor, pois é maior que a primeira soma em quinze unidades. Testada esta conjectura, será interessante desafiar os alunos para a estenderem aos três próximos números triangulares, múltiplos de três, que são o 45, o 66 e 105. 18 Se os alunos tiverem percebido o padrão descoberto anteriormente, serlhes-á fácil chegar à soma 45 a partir da soma anterior (36). Para tal, basta verificarem que há um aumento de nove unidades nesta nova soma mágica, o que é sinal que cada número envolvido no novo quadrado mágico terá que ser maior em três unidades do que os respectivos números existentes no quadrado anterior. Aplicando, uma vez mais este padrão, surge o seguinte quadrado mágico, de soma 45: 12 19 14 17 15 13 16 11 18 Por sua vez, do valor 45 para o valor 66 vão vinte e uma unidades. Isto significa que os valores do próximo quadrado mágico têm mais sete unidades que os respectivos valores do quadrado mágico de soma 45: 19 26 21 24 22 20 23 18 25 Por último, do valor 66 para o valor 105 vão trinta e nove unidades. Isto significa que os valores do próximo quadrado mágico têm mais treze unidades que os respectivos valores do quadrado mágico de soma 66: 32 39 34 37 35 33 36 31 38 Após observação de todos estes casos, uma novo desafio pode ser colocado aos estudantes, que é o de analisarem cada valor central em cada caso e a respectiva soma, bem como os respectivos valores existentes nas 19 células afectas aos vértices de cada quadrado mágico. Para tal, será indispensável a comparação dos seis casos em simultâneo: 2 9 4 4 11 6 9 16 11 7 5 3 9 7 5 14 12 10 6 1 8 8 3 10 13 8 15 Soma 15 Soma 21 Soma 36 12 19 14 19 26 21 32 39 34 17 15 13 24 22 20 37 35 33 16 11 18 23 18 25 36 31 38 Soma 45 Soma 66 Soma 105 Naturalmente que uma primeira conclusão a retirar é que o número do meio em cada quadrado mágico coincide com a terça parte da soma mágica desse quadrado. Por outro lado, poder-se-á observar que o valor existente na célula do canto superior esquerdo de cada quadrado é menor em três unidades, comparativamente com o valor central do respectivo quadrado mágico. Constata-se ainda que esse valor tanto pode ser par como ímpar, mas sendo par, todos os restantes valores das células afectas aos vértices do quadrado mágico serão pares e se for ímpar, estes mesmos valores agora acabados de referir também serão ímpares. Quer num caso, que no outro, são sempre quatro números pares ou quatro números ímpares consecutivos, de acordo com o seguinte esquema: 1º 2º 3º 4º 20 Percebida esta nova lei de formação de quadrados mágicos, pode-se desafiar os alunos a aplicá-la para o caso do próximo número triangular, múltiplo de três, que é o 120. Aplicando este novo algoritmo, encontra-se em primeiro lugar o número a usar no centro do quadrado mágico, que será a terça parte de 120, isto é, 40: 40 De seguida, subtraindo-se três unidades a este valor, obtém-se o valor 37, que irá ocupar a quadrícula existente no canto superior esquerdo do quadrado: 37 40 Devido ao facto de este valor ser ímpar, sê-lo-á o próximo valor a ocupar a quadrícula do canto superior direito do quadrado mágico, que será o valor 39: 37 39 40 Descobertos estes três números e sabendo-se que a soma a obter é 120, já é fácil descobrir todos os restantes números a inserir no quadrado: 37 44 39 42 40 38 41 36 43 21 Actividade D: Pensa num número, adiciona-lhe 5 unidades. Ao valor agora obtido encontra o seu dobro. Retira 4 unidades. Encontra metade do valor com que ficaste depois de teres retirado as 4 unidades. Por último subtrai o número que pensaste inicialmente e verifica se obténs um número triangular. Possível resolução: Esta situação pode ser resolvida em termos algébricos através dos seguintes cálculos: 2 (x + 5 ) − 4 2 x + 10 − 4 2x+ 6 −x= −x = −x =x +3−x= 3 2 2 2 Dessa resolução conclui-se que, independentemente do número pensado inicialmente, o valor final é o número 3. Contudo, a utilização destes cálculos não é imprescindível para a resolução correcta da tarefa, pois um esquema por etapas também pode constituir uma excelente estratégia de resolução, levando à mesma resposta numérica 3: Pensar num Adicionar 5 Encontrar o Retirar 4 Encontrar Subtrair o número unidades dobro unidades metade número inicial • • ⎥⎥⎥⎥⎥ • ⎥⎥⎥⎥⎥ • ⎥⎥⎥⎥⎥ • ⎥⎥⎥ ⎥⎥⎥ • ⎥⎥⎥⎥⎥ • ⎥ No sentido de se preparar uma nova tarefa de investigação, a propor posteriormente, ainda se poderia, de momento, desafiar os alunos a descobrir o próximo número triangular. Para tal usar-se-á um enunciado semelhante ao anterior: Pensa num número, adiciona-lhe 5 unidades. Ao valor agora obtido encontra o seu quádruplo. Retira 8 unidades. Encontra metade do valor com que ficaste depois de teres retirado as 8 unidades. Por último subtrai o dobro 22 do número que pensaste inicialmente e verifica se obténs um novo número triangular. Algebricamente ter-se-á a seguinte resolução: 4 (x + 5 ) − 8 4 x + 20 − 8 4 x + 12 − 2x = − 2x = 2x + 6 − 2x = 6 − 2x = 2 2 2 Perante a descoberta destes dois números triangulares, os alunos podem ser solicitados a investigar qual terá que ser o enunciado para se obter no final o próximo número triangular (10). Espera-se que a proposição de enunciado e a respectiva resolução possam ser as seguintes: Pensa num número, adiciona-lhe 5 unidades. Ao valor agora obtido encontra o seu sêxtuplo. Retira 10 unidades. Encontra metade do valor com que ficaste depois de teres retirado as 10 unidades. Por último subtrai o triplo do número que pensaste inicialmente e verifica se obténs um novo número triangular. 6 (x + 5 ) − 10 6 x + 30 − 10 6 x + 20 − 3x = − 3x = − 3 x = 3 x + 10 − 3 x = 10 2 2 2 Esta mesma expressão numérica, que permite a resolução da tarefa, também pode ser adaptada para nova obtenção da soma 6: Pensa num número, adiciona-lhe 5 unidades. Ao valor agora obtido encontra o seu sêxtuplo. Retira 18 unidades. Encontra metade do valor com que ficaste depois de teres retirado as 18 unidades. Por último subtrai o triplo do número que pensaste inicialmente e verifica que obténs o número triangular inferior ao anteriormente obtido. Eis a nova resolução: 6 (x + 5 ) − 18 6 x + 30 − 18 6 x + 12 − 3x = − 3x = − 3x = 3x + 6 − 3x = 6 2 2 2 23 Aproveitando o enunciado anterior, o professor pode continuar a desafiar os alunos para a obtenção do número triangular imediatamente anterior ao valor 6, isto é, o 3, através da seguinte proposição: Pensa num número, adiciona-lhe 5 unidades. Ao valor agora obtido encontra o seu sêxtuplo. Retira 24 unidades. Encontra metade do valor com que ficaste depois de teres retirado as 24 unidades. Por último subtrai o triplo do número que pensaste inicialmente e verifica que obténs o número triangular inferior ao obtido há pouco. Eis a resolução: 6x+6 6 x + 30 − 24 6 (x + 5 ) − 24 − 3x = − 3x = − 3x = 3x + 3 − 3x = 3 2 2 2 A partir deste momento, o professor tem todas as condições para pedir aos alunos para continuarem a adaptar a fórmula de modo a obter-se o primeiro número triangular, isto é, o número 1. Espera-se que os alunos, ao compararem estas três últimas resoluções: 6 x + 20 6 x + 30 − 10 6 (x + 5 ) − 10 − 3x = − 3x = − 3 x = 3 x + 10 − 3 x = 10 2 2 2 Soma 10 Soma 6 6 x + 12 6 x + 30 − 18 6 (x + 5 ) − 18 − 3x = − 3x = − 3x = 3x + 6 − 3x = 6 2 2 2 Soma 3 6x+6 6 x + 30 − 24 6 (x + 5 ) − 24 − 3x = − 3x = − 3x = 3x + 3 − 3x = 3 2 2 2 possam constatar que o único número da expressão que vai sendo modificado é o subtractivo, pois passa de 10, para o caso do 10, para 18 no caso do 6 e para 24 no caso do 3. Seria interessante que os alunos descobrissem que há um padrão ou regularidade nessa modificação de números, pois do 1º para o 2º caso, aumenta oito valores e, depois, do 2º para o 3º caso já só aumenta seis 24 valores. Uma hipótese a testar é a de que será que o próximo aumento é de apenas quatro valores? Testando esta conjectura, confirma-se a obtenção do valor 1, esperado: 6x+2 6 x + 30 − 28 6 (x + 5 ) − 28 − 3x = − 3x = − 3x = 3x + 1− 3x = 1 2 2 2 Conclusão: Estas tarefas de investigação explanadas neste texto não são mais do que um de muitos exemplos que poderão ser concebidos pelo professor, de modo a evidenciar o lado interligado da Matemática, onde os conceitos evidenciam ter relação entre si. Estou convicto que se o professor envolver os seus alunos em ambientes de pesquisa, tendo por base esta concepção de Matemática conectada, estará a proporcionar-lhes momentos de aprendizagem verdadeiramente significativa e pode contribuir para o desenvolvimento da literacia matemática, isto é, para aumentar a capacidade de os alunos “aplicarem os seus conhecimentos e analisarem, raciocinarem e comunicarem com eficiência, à medida que colocam, resolvem e interpretam problemas numa variedade de situações” (ME, 2004, p. 8). Além disto, estará a proporcionar que os alunos desenvolvam várias competências essenciais para o seu “amadurecimento” matemático, ao propiciar momentos de indagação, de questionamento, de conjectura e estimação, de validação de raciocínios, que no fundo são igualmente essenciais para o seu “amadurecimento” enquanto estudantes de outras áreas importantes do saber. A terminar gostava de referir que muitas outras investigações poderiam ser feitas a partir deste simples conjunto de números triangulares, com eventuais conexões matemáticas a outras matérias, como sejam a sequência de números de Fibonacci, o triângulo de Pascal, ou até mesmo as potências de base dois, entre outras. Certamente são muitos os exemplos que podem contribuir para que os alunos concebam a matemática como algo harmonioso, desafiante e onde os conceitos podem ter múltiplas conexões entre si. 25 Bibliografia: Ministério da Educação (2004). Resultados do Estudo Internacional PISA 2003. Lisboa: Gabinete de avaliação educacional do Ministério da Educação. 26