XVII CONGRESSO DE PÓS-GRADUAÇÃO DA UFLA I ENCONTRO DE ENGENHARIA DE SISTEMAS IV WORKSHOP DE LASER E ÓPTICA NA AGRICULTURA 27 a 31 de outubro de 2008 PRESSÕES EM TREMONHAS CÔNICAS EXCÊNTRICAS LUCIANO HENRIQUE DE SOUZA VIEIRA1, FRANCISCO CARLOS GOMES2, EWERTON FELIPE DO PRADO MACHADO3 RESUMO Em projetos de silos nos quais estão presentes as tremonhas é essencial o correto conhecimento das pressões atuantes na mesma para que o projeto seja considerado bem sucedido. Entretanto, para tremonhas excêntricas, estudos e recomendações são ainda escassos necessitando de especial atenção pelos projetistas. Neste trabalho foram determinadas as pressões em tremonhas cônicas excêntricas baseadas na Norma Australiana. Para tal, foram avaliados três tipos de materiais de parede de tremonhas e cinco tipos de produtos armazenados. Os resultados permitem concluir que as pressões em tremonhas cônicas excêntricas são inversamente proporcionais ao aumento de rugosidade da parede da tremonha, independente do produto armazenado. Palavras-chave: Tremonhas, pressões, excêntricas, propriedades físicas dos produtos armazenados. INTRODUÇÃO Tremonhas são estruturas muito importantes em projetos de silos uma vez que são responsáveis pelo tipo de fluxo que irá ocorrer na descarga do produto. Assim sendo, o ângulo de inclinação da tremonha aliado as propriedades físicas dos produtos armazenados (peso específico, ângulo estático de atrito interno, efetivo ângulo de atrito interno, ângulo cinemático de atrito entre o produto e a parede, função fluxo e fator fluxo) irão determinar a ocorrência de fluxo de massa ou fluxo de funil. O tipo de fluxo determina as características de descarga do produto, tipo de segregação, formação ou não de zonas estáticas e se o silo pode ser esvaziado completamente. A determinação do tipo de fluxo deve ser feita enquanto o silo está sendo projetado ou selecionado, ou quando são previstas mudanças em sua estrutura ou ainda na manipulação de materiais a serem armazenados (CALIL Jr. et al. 1997). Para a escolha da seção da tremonha, primeiramente, determina-se a seção do silo. Posteriormente será determinado o ângulo de inclinação da tremonha em relação a vertical e as dimensões da boca de descarga, estas devem possuir dimensões suficientes para prevenir obstruções de fluxo causadas por formações de arcos (arching), cúpulas (doming) e tubos (piping). As pressões em tremonhas podem ser calculadas segundo diversas teorias e normas estando a cargo do projetista a escolha do método a ser adotado para o cálculo. No entanto, para tremonhas excêntricas, estudos e recomendações são escassos causando erros em projetos estruturais devido ao não conhecimento das pressões de excentricidade. O objetivo deste trabalho foi comparar as pressões em tremonhas cônicas excêntricas para três tipos de material de parede de tremonhas (polido, liso e rugoso) e cinco tipos de produtos armazenados (farinha de trigo, milho, areia grossa seca, soja e trigo) baseado na Norma Australiana AS3774:1996. 1 Mestrando, UFLA/DEG, [email protected] Professor, UFLA/DEG, [email protected] 3 Graduando, UFLA/DEG, [email protected] 2 731 XVII CONGRESSO DE PÓS-GRADUAÇÃO DA UFLA I ENCONTRO DE ENGENHARIA DE SISTEMAS IV WORKSHOP DE LASER E ÓPTICA NA AGRICULTURA 27 a 31 de outubro de 2008 MATERIAL E MÉTODOS Material As propriedades físicas dos produtos armazenados são determinadas utilizando-se a máquina de cisalhamento de Jenike mundialmente conhecida como “Jenike Shear Cell” e o teste padrão “Standard Shear Testing Technique for Paticulate Solids Using the Jenike Shear Cell” (SSTT,1989) proposto pela Federação Européia de Engenheiros Químicos. Para tal, realizou-se um estágio na USP/SET/LaMEM com o intuito de conhecer a máquina de cisalhamento de Jenike e o teste padrão para determinação das propriedades físicas dos produtos armazenados. Porém, optou-se por utilizar os valores de propriedades fornecidos pela Norma Australiana AS3774-1996 por serem estes valores reconhecidos e aceitos mundialmente. Realizou-se, também, um estudo minucioso da norma referida e seu suplemento 1 de 1997 objetivando o correto cálculo das pressões de excentricidade para tremonhas cônicas excêntricas. Realizou-se, também, a montagem de uma planilha eletrônica que possibilitou o cálculo das pressões para diferentes produtos e tipos de parede da tremonha. Métodos No ensaio de cisalhamento feito a partir da Máquina de cisalhamento de Jenike (“Jenike Shear Cell”) são determinados os ângulos de atrito entre produto e a parede do material, ângulo de atrito interno e efetivo ângulo de atrito interno. Para tal, na primeira fase, a amostra é preparada para obtenção do fluxo de estado estável e do pré-cisalhamento para a definição do lugar geométrico de deslizamento. Na segunda fase do teste, a determinação real das tensões de cisalhamento é realizada com diferentes valores de tensões normais, menores que os utilizados na primeira fase, determinando as tensões de cisalhamento necessárias para o deslizamento (ruptura) do produto (PALMA, 2005) (Figura 1). Figura 1 – Ensaio para a determinação das propriedades internas do produto. Adaptado de Schwedes (2002). Substituindo-se o anel inferior da Máquina de cisalhamento por uma amostra da parede do material a ser avaliado determina-se o ângulo de atrito entre o produto e a parede. Neste caso, as forças (tensão) de cisalhamento τw, que são necessárias para mover a célula com o produto armazenado através do material da parede são medidas sob diferentes níveis de 732 XVII CONGRESSO DE PÓS-GRADUAÇÃO DA UFLA I ENCONTRO DE ENGENHARIA DE SISTEMAS IV WORKSHOP DE LASER E ÓPTICA NA AGRICULTURA 27 a 31 de outubro de 2008 tensões normais σw. Plotando-se os pares de valores τw x σw a média dos resultados da união dos pontos com a origem fornece o envoltório de deslizamento com a parede. O ângulo de atrito com a parede øw resulta do envoltório de deslizamento com a parede e o eixo σ (Figura 2). O coeficiente de atrito interno, utilizado como parâmetro de projeto em muitas normas pode ser cálculo segundo equação abaixo: Figura 2 – Ensaio para determinação das propriedades do produto com a parede. Adaptado de Jenike (1964). τw σw µ = tan φw φw = arctan (1) (2) A relação entre as pressões verticais e horizontais é definida por uma constante K. Segundo recomendação da Norma Australiana AS3774:1996, o parâmetro K deve ser determinado a partir da equação de Walker e limitado a ser maior ou igual a 0,35, ou seja: K= 1 + sen 2φe − 2 ( sen φ 2 e − µ 2 cos 2 φe ) 4 µ 2 + cos 2 φe ≥ 0,35 (3) Para a determinação do tipo de fluxo que irá ocorrer em silos, a norma em questão apresenta dois gráficos. Neles, o tipo de fluxo é dado em função do coeficiente de atrito interno e do ângulo de inclinação da tremonha (Figura 3). Figura 3 – Determinação gráfica do tipo de fluxo. Adaptado de AS 3774:1996. 733 XVII CONGRESSO DE PÓS-GRADUAÇÃO DA UFLA I ENCONTRO DE ENGENHARIA DE SISTEMAS IV WORKSHOP DE LASER E ÓPTICA NA AGRICULTURA 27 a 31 de outubro de 2008 As pressões em tremonhas excêntricas podem ser calculadas segundo critérios da AS3774:1996 considerando as pressões normais em paredes verticais. As pressões de projeto dependerão da excentricidade de saída (eo) relativa a dimensão da tremonha (dc). Excentricidades menores que 0,1dc não serão consideradas como excentricidade efetiva. Na superfície da parede mais afastada (diametralmente oposta a saída) será considerado um aumento de pressão a uma altura (hD) sobre a saída e se estendendo além da altura (dc). A altura hD pode ser obtida segundo a equação: (4) hD = (0,5d c + eo ) tan φi O máximo aumento de pressão (Pef,max) pode ser determinado segundo a equação: e Pef ,max = Pnf o − 0.1 ≥ 0 dc (5) Próximo a superfície da parede lateral (perto da saída) será considerado uma redução de pressão começando no nível da boca de descarga e se estendendo a uma altura dc (Figura 4). Para tremonhas cônicas, a redução de pressão será constante e se estenderá ao redor da circunferência a uma distância de/2 no lado próximo ao eixo de excentricidade, sendo de: e d e = 1,83d c 1 − 1, 43 o dc (6) A redução de pressão (Pef,red) pode ser determinada segundo a equação: e Pef ,red = 1,5 Pnf o − 0,1 dc (7) Para tremonhas cônicas, a origem da coordenada circunferencial (β) será tomada no eixo de excentricidade próximo ao lado da menor parede da tremonha. A região de redução de pressão definida na equação 7 pode ser redefinida em termos de sua extensão angular. Para tal, determina-se um novo ângulo circunferencial a partir do eixo central em direção ao eixo de excentricidade próximo ao menor lado da tremonha (Figura 4). O valor de βe é determinado segundo a equação: eo dc β e = 105 − 150 Zona morta Segunda zona de fluxo Figure 4. Distribuição das pressões de excentricidade. 734 (8) Primeira zona de fluxo XVII CONGRESSO DE PÓS-GRADUAÇÃO DA UFLA I ENCONTRO DE ENGENHARIA DE SISTEMAS IV WORKSHOP DE LASER E ÓPTICA NA AGRICULTURA 27 a 31 de outubro de 2008 RESULTADOS E DISCUSSÃO O cálculo das pressões em tremonhas cônicas foi feito utilizando-se os valores de propriedades físicas sugeridos pela Norma Australiana AS3774:1996 (Tabela 1). TABELA 1. Valores característicos das propriedades físicas dos produtos armazenados. Tipo de produto Efetivo ângulo de atrito interno (øi), em graus (º) Ângulo de atrito com a parede (øw), em graus (º) Tipo D1* Inferior Superior Tipo D2* Tipo D3* Peso específico ()ץ, KN/m³ Médio Superior Inferior Superior Inferior Superior Inferior Superior Farinha de trigo Milho Areia (Grossa, seca) Soja Trigo 23 28 30 25 26 30 33 40 32 32 15 15 15 10 15 23 25 25 15 25 25 20 22 12 18 28 30 28 18 30 25 25 25 14 25 35 32 35 20 32 6,5 7 14 7 7,5 7,5 8,5 17 8 9 * Os valores descritos para o Tipo D1 é polido, Tipo D2 é liso e Tipo D3 é rugoso. Seguindo uma tendência mundial de projetos, a Norma AS3774:1996 adota os estados limites como critério de dimensionamento, sendo assim, os valores de K serão calculados para um limite inferior e superior como mostrado na tabela 2. TABELA 2. Valores para os estados limites de K em relação aos três tipos de materiais analisados. Tipo de produto Farinha de trigo Milho Areia (Grossa, seca) Soja Trigo Relação entre pressões (k), Tipo D1 Relação entre pressões (k), Relação entre pressões Tipo D2 (k), Tipo D3 Inferior Superior Inferior Superior Inferior Superior 0,40 0,35 0,35 0,35 0,37 0,54 0,50 0,39 0,37 0,52 0,57 0,43 0,35 0,35 0,41 0,96 0,72 0,62 0,57 0,81 0,41 0,35 0,35 0,35 0,36 0,35 0,76 0,72 0,61 0,86 Considerando uma excentricidade (eo) de 0,3m, profundidade efetiva (z) de 6m, diâmetro da tremonha (dc) de 1m e coordenada circunferencial (β) de 90º, os valores de projeto para os diversos produtos e paredes de tremonha analisados pode ser visto na Tabela 3. A partir da análise da tabela acima, observou-se que os valores de Pef,max e Pef,red decrescem com o aumento da rugosidade da parede. Uma possível justificativa para este fato deve-se a diminuição da área de contato entre o produto com o aumento de rugosidade. Sendo assim, o produto em uma superfície polida terá maior contato com a parede do que um produto em uma superfície rugosa. Esse maior contato entre o produto armazenado e a parede da tremonha acarretaria uma maior pressão nas paredes. Observou-se também, que para o valor de coordenada circunferencial adotado (90º), o aumento de pressão normal causado pelo fluxo excêntrico foi zero não sendo necessária a soma destas pressões normais no projeto em questão. 735 XVII CONGRESSO DE PÓS-GRADUAÇÃO DA UFLA I ENCONTRO DE ENGENHARIA DE SISTEMAS IV WORKSHOP DE LASER E ÓPTICA NA AGRICULTURA 27 a 31 de outubro de 2008 TABLE 3. Parâmetros e pressões de projeto para dimensionamento de tremonhas. Tipo de produto hD(m) de(m) βe(º) Pni(kPa) Pnf(kPa) Pef,max(kPa) Pef(kPa) Pef,red(kPa) Farinha de trigo - Tipo D1 Farinha de trigo - Tipo D2 Farinha de trigo - Tipo D3 Milho - Tipo D1 Milho - Tipo D2 Milho - Tipo D3 Areia(Grossa, seca) - Tipo D1 Areia(Grossa, seca) - Tipo D2 Areia(Grossa, seca) - Tipo D3 Soja - Tipo D1 Soja - Tipo D2 Soja - Tipo D3 Trigo - Tipo D1 Trigo - Tipo D2 Trigo - Tipo D3 0,46 0,46 0,46 0,52 0,52 0,52 0,67 0,67 0,67 0,50 0,50 0,50 0,50 0,50 0,50 1,04 1,04 1,04 1,04 1,04 1,04 1,04 1,04 1,04 1,04 1,04 1,04 1,04 1,04 1,04 60 60 60 60 60 60 60 60 60 60 60 60 60 60 60 6,46 4,01 3,98 7,10 5,70 4,47 14,19 10,17 8,93 8,76 7,83 7,03 7,60 6,65 4,74 7,75 4,82 4,77 8,51 6,84 5,36 17,03 12,21 10,72 10,52 9,40 8,44 9,12 7,98 5,69 1,55 0,96 0,95 1,70 1,37 1,07 3,41 2,44 2,14 2,10 1,88 1,69 1,82 1,60 1,14 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 2,33 1,45 1,43 2,55 2,05 1,61 5,11 3,66 3,22 3,15 2,82 2,53 2,73 2,39 1,71 CONCLUSÃO Pressões em tremonhas cônicas excêntricas são inversamente proporcionais ao aumento da rugosidade da parede da tremonha para todos os produtos analisados. Apesar de a Norma Australiana ser uma das mais completas para o cálculo das pressões de excentricidade, nota-se que estes cálculos obedecem a relações matemáticas e não as características dos produtos armazenados. Sendo assim, conclui-se que estudos e recomendações relacionados às pressões de excentricidade são escassos, requerendo novas pesquisas para a melhoria das metodologias utilizadas ou mesmo para a validação das existentes. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS AUSTRALIAN STANDARD. AS 3774: Loads on Bulk containers. Sydney, 1996. AUSTRALIAN STANDARD. AS 3774 Supplement 1: Loads on Bulk containers. Sydney, 1997. CALIL Jr., C. Recomendações de Fluxo e de Cargas para o Projeto de Silos Verticais. 1990. Tese de Livre Docência em Engenharia de Estruturas – Escola de Engenharia de São Carlos, Universidade de São Paulo, 1990, 198p. CALIL Jr., C; NASCIMENTO, J. W.B; ARAÚJO, E. C. Silos Metálicos Multicelulares. Serviço Gráfico – EESC/USP – São Carlos – SP, 1997, 175p. CALIL Jr.; C; CHEUNG, A. B. 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