Esta revista forma parte del acervo de la Biblioteca Jurídica Virtual del Instituto de Investigaciones Jurídicas de la UNAM
www.juridicas.unam.mx
http://biblio.juridicas.unam.mx
O SERVIQO PÚBLICO DE TRANSPORTE
COLETIVO URBANO NO BRASIL COMO
UMA ATIVIDADE ESSENCIAL DE
CORRESPONSABILIDADE FEDERATIVA
EMERSON GABARDO
Sumário:
l. O regime jurídico dos servi¡;os
públicos num Estado social-interventor;
2. O caráter essencial dos servi¡;os
públicos de transporte coletiuo de
passageiros; 3. Os servi¡;os públicos
de transporte coletiuo rodoviário em
face do meio ambiente urbano; 4.
Referencias.
l. O REGIME JURÍDICO DOS SERVI<;:OS
PÚBLICOS NUM ESTADO SOCIALINTERVENTOR
Diferente do regime de explora<;ao da atividade
económica em sentido estrito, o caso dos servi<;:os
públicos implica o reconhecimento de um regime
muito mais complexo.! Trata-se de urna importante
no.;ao histórica ligada ao Estado e, assim sendo,
retrata um instituto dinamico por essencia. Sua
defini<;:ao popular raramente coincide com o
entendimento que o pensamento oficial tem dele.
E, ainda, é comum que o próprio posicionamento
1 Sobre a complexidade da conceituac;áo de serviyo
público e as diferentes possibilidades de seu entendimento,
ver: VALLE, Vivian Cristina Lima López. O novo conceito de
servi90 público. In: GUIMARAES. Edgar (Coord.). Cenarios do
Direito Administrativo: estudos em homenagem ao professor
Romeu Felipe Bacellar Filho. Belo Horizonte: Fórum, 2004, p.
511-552.
-57DR © 2014. Asociación Internacional de Derecho Administrativo
Esta revista forma parte del acervo de la Biblioteca Jurídica Virtual del Instituto de Investigaciones Jurídicas de la UNAM
www.juridicas.unam.mx
http://biblio.juridicas.unam.mx
AIDA- ÜPERA PRIMA DE DERECHo ADMINISTRATivo- OPus No.
15
doutrinário a respeito do seu conceito retrate
varia<;;óes quando nao fortes divergencias,
considerando que os sistemas jurídicos nem
sempre trazem elementos suficientes para um
fechamento conceitual.2 Ademais, como já
asseverado, a ideia que se tem da própria ontología
dos servi<;;os públicos varia conforme o modelo
de Estado instituido pelo ordenamento jurídicopolítico, além do que, depende dos diferentes
critérios distintivos, ainda que existam "aspectos
consolidados" da sua no<;;ao.3
De pronto é preciso reafirmar que o servi<;;o
público nada mais é do que urna atividade
económica em sentido estrito que teve seu regime
jurídico alterado, mediante urna a<;;ao imperativa
do Estado ao torná-lo típico. Como urna atividade
económicaqualquer, submetia-se ao re gime jurídico
de Direito privado, caracterizado pela autonomía
da vontade, capacidade universal, vincula<;;ao
negativa ao Direito, disponibilidade de direitos e
interesses e igualdade das partes. Diferentemente,
como servi<;;o público propriamente dito, será
conduzido pelo regime jurídico de Direito público,
cujos adjetivos fundamentais, além da submissao
ao principio da supremacía do interesse público,4
sao, mutatis mutandi, a heteronomia, a capacidade
por atribui<;;ao legal, a vincula<;;ao positiva ao
Direito, a indisponibilidade de direitos e interesses
e a designaldade entre as partes.5
2
Sobre as diferenr;as de interpretay6es da
expressao service public no Brasil, ver: BACELLAR FILHO,
Romeu Felipe. Refiex6es sobre Direito Administrativo. Belo
Horizonte: Fórum, 2009, 45 e ss.
3
JUSTEN, Monica Spezia. A nor;ao de servir;o
público no Direito Europeu. Sao Paulo: Dialética, 2003, p. 59
e
SS.
4
HACHEM,
Daniel
Wunder.
Princípio
constitucional da supremacia do interesse publico. Belo
Horizonte: Fórum, 2011.
5
ALFONSO, Luciano Parejo. Eficacia y
-58DR © 2014. Asociación Internacional de Derecho Administrativo
Esta revista forma parte del acervo de la Biblioteca Jurídica Virtual del Instituto de Investigaciones Jurídicas de la UNAM
www.juridicas.unam.mx
http://biblio.juridicas.unam.mx
É realmente paradoxal imaginar a presta<;ao
de um servi<;o público no regime jurídico de Direito
privado. Ocorre que por intermédio do processo de
reformas gerenciais da década de 1990 romperamse os limites estabelecidos originalmente entre
o público e o privado, tornando-se comum a
promo<;ao de alternativas jurídicas até entao
inexistentes, e em rela<;ao as quais parte dos
juristas apresentou fortes resisténcias.6 Vé-se
que a questao é polémica e, no mínimo, justifica
o seguinte questionamento: se for possível prestar
servi<;o público sob o regime privado, entao cabe
sustentar que o regime de Direito público (sentido
formal) ainda é apto a caracterizá-lo? Nao seria
mais razoável supor que nao se está mais diante
de um servi<;o público? Caso se mantenha o
entendimento de que a atividade é realmente
servi<;o público, nao seria inconstitucional (e
logicamente incongruente) aplicar a ele um
regime de Direito privado? Ainda, se o regime for
desimportante para a caracteriza<;ao ou nao de um
servi<;o público, entao nao seria o caso de assumir
o critério material como exclusivo, abandonandose a tese de um "regime geral" e reconhecendo-se a
setorializa<;ao como característica da ontología dos
servi<;os públicos no Brasil? 7
administración- tres estUdios. Madrid: Instituto Nacional de
Administración Pública, 1995, p. 117.
6
Como é o caso de Weida Zancaner. Cf.:
ZANCANER, Weida. Limites e confrontay6es entre o pUblico
e o privado. In: BACELLAR FILHO, Romeu Felipe (Coord.).
Direito Administrativo Contemporaneo. Belo Horizonte:
Fórum, 2004, p. 339-346. E também: BACELLAR FILHO,
Romeu Felipe. O poder normativo dos entes reguladores e a
participat;ao dos cidadaos nesta atividade. Serviyos públicos e
direitos fundamentais: os de safios da regulayao na experiencia
brasileira. AeDP - Actualidad em el Derecho Público. Buenos
Aires: Ad-Hoc, no 18/20, 2002, p. 68.
7
Estas perguntas bem como a tratativa do
assunto que envolve a questao foi extraída do texto sobre
-59DR © 2014. Asociación Internacional de Derecho Administrativo
Esta revista forma parte del acervo de la Biblioteca Jurídica Virtual del Instituto de Investigaciones Jurídicas de la UNAM
www.juridicas.unam.mx
http://biblio.juridicas.unam.mx
AIDA- ÜPERA PRIMA DE DERECHO ADMINISTRATIVO - OPus
No. 15
Urna resposta interessante é
aqueJa
desenvolvida por Joao Batista Gomes Moreira, ao
proporoabandonodadicotomiaderegimesmediante
o reconhecimento de que o Direito administrativo
nao seria público nem privado, situando-se fora
das antigas categorias para prestigiar a aloca<,;ao
da no<,;ao de "finalidade pública administrativa" no
seu "centro de gravita<,;ao".8 Trata-se de urna ideia
ousada ·e talvez inapropriada para a realidade
brasileira, mas nao deixa de indicar urna reflexao
necessiiria.
No caso das atividades económicas privadas
exploradas pelo Estado, parece fácil a atribui<,;ao
genérica e abstrata de urna predominancia do
regime privado parcialmente derrogado pelo Direito
público, afinal, a situa<,;iio nao requer a existencia
de um regime especial que caracterize a atividade.
A atividade já será privada, independentemente
de urna especial recorréncia ao Direito. Além
do que, sua explora<,;ao pelo Estado é definida,
constitucionalmente, a partir de critérios de
natureza material (relevante interesse coletivo
o u seguran<,;a nacional). O mesmo nao acorre
com os servi<,;os públicos, que nao possuem esta
delimita<,;ao em sede constitucional. Todos estes
elementos dificultam sobremaneira a proposi<,;ao de
urna res posta definitiva sobre os questionamentos
incidentes.
Mas o fato é que nao basta o exercício da
a matéria publicado no livro do autor intitulado "lnteresse
Público e Subsidiariedade", no tópico 3 (Os se!"Vir;:os públicos
e os servir;:os sociais como atividades económicas) do Capítulo
111 (Os processos atuais de descentralizac;ao no l3rasil e seus
pontos fnigeis). Cf.: GABARDO, Emerson. Inte]fesse PUblico
e Subsidiariedade: o Estado e a sociedade civil para além do
bem e do mal. Belo Horizonte: Fórum, 2009.
·
8
MOREIRA, Joao Batista Gomes. Direito
Administrativo: da rigidez autoritária a fl.exibilidade
democrática. Belo Horizonte: Fórum, 2005, p. 168.
-60DR © 2014. Asociación Internacional de Derecho Administrativo
Esta revista forma parte del acervo de la Biblioteca Jurídica Virtual del Instituto de Investigaciones Jurídicas de la UNAM
www.juridicas.unam.mx
http://biblio.juridicas.unam.mx
publicatio para que urna atividade económica em
sentido estrito transforme-se em servi<;:o público.
Os elementos políticos, sociológicos e filosóficos
que se traduzem em determinada historia da
utilizat;:ii.o de institutos como o servi<;:o público sii.o
relevantes para a sua própria definit;:ii.o. Sii.o fatores
que delineiam, a partir da mentalidade vigente, o
carii.ter material imprescindível para a legitima<;:ii.o
de qualquer tentativa formal de reconhecimento
de um servi<;:o como público. Os modelos de
delega<;:ii.o dependem de várias questóes e nii.o
somente de urna questii.o jurídica (reduzida a
discricionariedade estatal). Embora seja essencial
o reconhecimento do legislador, "somente é válido
transformar em servi<;:o público urna atividade que
preencha certos requisitos". Nestes, termos, como
bem ressalta Mar<;:al Justen Filho, "o núcleo dos
servit;:os públicos reside no aspecto material". 9
Ademaís, conforme continua o autor, nem todo o
elenco constitucional de servi<;:os públicos (como
aqueles atribuidos a Uniii.o Federal) consistem,
obrigatoriamente e em qualquer caso, servi<;:o
público. lsso acorre porque podem existir exemplos
de alguns servi<;:os específicamente considerados
que ao nii.o se vincularem axiologicamente as
finalidades essenciais ou a dignidade, restringemse a natureza de atividade económica em sentido
estrito. Por exemplo, parece restar pacífico que
nem todas as atividades de radiodifusii.o sii.o
servi<;:o público. E vai maís longe ainda o autor,
ao afirmar que a expressii.o "autorizat;:ii.o" prevista
no artigo 21 da Constitui<;:ii.o é incompatível com a
existéncia de servio;o público.! O
9
JUSTEN FILHO, Mar~al. Teoria geral das
concessóes de serviyo público. Sao Paulo: Dialética, 2003, p.
15e21.
10
JUSTEN FILHO, Mar~al. Teoria geral das
concessóes de servi<;o público. Op.cit., p. 44 e ss.
-61DR © 2014. Asociación Internacional de Derecho Administrativo
Esta revista forma parte del acervo de la Biblioteca Jurídica Virtual del Instituto de Investigaciones Jurídicas de la UNAM
www.juridicas.unam.mx
http://biblio.juridicas.unam.mx
AIDA - ÜPERA PRIMA DE DERECHO ADMINISTRATivo - OPus No. 15
Buscar-se evitar, com o reconhecimento
destes limites ao legislador, o entendimento de
parte da tradicional doutrina de que "tuda seria
servic;o público em potencial". Nao e.ll Ou seja,
excluidos dais campos: o que e servic;o público
obrigatoriamente e o que obrigatoriamente nao e,
o legislador infraconstitucional pode determinar
outras atividades como servi<;o público (senda,
porem, tal atividade sujeita a limita<;6es materiais
e requisitos positivos extraídos do ordenamento).
Assim, nao seria possivel, portanto, "transformar
em servic;o público urna atividade consistente,
por exemplo, na fabricac;ao de cachimbos ou de
perucas". 12
De fato, nao ha um regime jurídico extenso
e bem estabelecido dos servic;os públicos previsto
expressamente na Constituic;ao Federal. O artigo
175 assevera somente que serao prestados p~lo
Estado direta ou indiretamente (neste último
caso, mediante o respeito ao re gime licitatório).
Decorrencia inafastável desta disposic;ao e a
exclusao do servic;o público da garantía inerente
a livre iniciativa. Os particulares, a contrário
senso, estilo proibidos de prestar atividade que
teve seu regime publicizado pela Constituic;ao ou
pela lei. Todavia, caso o Estado tome a decisao
política de novamente repassá-lo aos particulares,
poderá faze-lo mediante a utilizac;ao do instituto
da delegac;ao. As concess6es e as permissóes de
servic;o público implicam o repasse da gestao ou
execuc;ao do servic;o (precedido ou nao de obra
pública). A primeira acorre mediante contrato, cujo
11
Nesse sentido, vale a pena consultar a obra
de Cesar A. Guimaraes PEREIRA sobre o assunto: PEREIRA,
Cesar A. Guimanies. Usuários de servi~os públicos: usuários,
consumidores e os aspectos económicos dos seiVi~os
públicos. Sao Paulo: Saraiva, 2006, p. 263 e ss.
12
JUSTEN FILHO, Maryal. Teoria geral das
concessóes de servi-;;o público. Op. cit., p. 48 e 21.
-62DR © 2014. Asociación Internacional de Derecho Administrativo
Esta revista forma parte del acervo de la Biblioteca Jurídica Virtual del Instituto de Investigaciones Jurídicas de la UNAM
www.juridicas.unam.mx
http://biblio.juridicas.unam.mx
caráter é bilateral e o regime é especial, ainda que
o contrato seja urna categoría que náo pertenc;:a
nem ao Direito público, nem ao Direito privado.
A segunda consiste em um ato administrativo,
embora seja cada vez mais discutível a sua
natureza (que irá depender do caso concreto e das
cláusulas regentes da relac;:áo).13
Se nao entender necessária a delegac;:ao,
deve o Estado prestar o servic;:o diretamente,
criando para tanto as propaladas empresas
públicas e sociedades de economía mista, que
atuarao em um regime misto - público, porém
parcialmente derrogado pelo Direito privado (pois
suas personalidades serao de Direito privado).
Obviamente a opc;:ao por urna ou outra forma de
descentralizac;:ao produz conseqüéncias no plano
normativo.
Contudo, nao termina aqui a questao
dos servic;:os públicos. Há situac;:óes em que
determinadas atividades económicas em sentido
estrito serao declaradas como de titularidade
estatal (como um dever público típico), mas nao
receberao a publicatío, ou seja, nao serao excluidas
da incidéncia do principio da livre iniciativa. Tratase de urna forte excec;:ao, que pode ser interpretada
de duas formas. Na primeira, adotada por Carlos
Ari Sundfeld, em tal situac;:ao nao se estará diante
de um servic;:o público propriamente dito, mas do
que pode ser denominado de um "servic;:o social"
(terceira modalidade que nao se confundiría com
a atividade económica em sentido estrito nem
com o servic;:o público). lsso porque seu status
constitucional nao é enquadrável no artigo 173
13
BACELLAR FILHO, Romeu Felipe. As
concessóes, permiss6es e autorizac;óes de servic;o público_ In:
CARDO SO, José Eduardo Martins et aL (Org). Curso de Direito
Administrativo Económico. Sao Paulo: Malheiros, 2006, p.
408 e SS.
-63DR © 2014. Asociación Internacional de Derecho Administrativo
Esta revista forma parte del acervo de la Biblioteca Jurídica Virtual del Instituto de Investigaciones Jurídicas de la UNAM
www.juridicas.unam.mx
http://biblio.juridicas.unam.mx
AIDA - ÜPERA PRIMA DE DERECHO ADMINISTRATIVO - OPus
No. 15
nem no caput do artigo 175. 14
Entretanto há a segunda interpretar;:ao,
desenvolvida por Eros Roberto Grau. Como
materialmente é urna atividade essencial que,
inclusive, foi juridicamente reconhecida como um
dever típico do Estado (portanto de sua titularidade)
seu enquadramento é realizado como sendo um
efetivo servir;:o público, só que nao· privativo do
Estado, pois poderá ser prestado livremente pelos
particulares no regime juridico de Direito privado
(ainda que parcialmente derrogado pelo Direito
público).l5 Nao se trata aqui, obviamente, de
nenhum tipo de delegar;:ao. E nem o será quando
o Estado resolver prestar, ele mesmo, o servir;:o.
Neste caso cabem duas alternativas, que nao sao
escolhidas discricionariamente, mas dependem
da peculiaridade do caso. Em regra o ente
estatal deverá descentralizar a atividade a urna
autarquía ou fundar;:ao pública. Esta talvez seja
a única excer;:ao a regra de vedar;:ao a explorar;:ao
de atividade económica pelas pessoas juridicas de
Direito público (o que é plenamente justificável),
pelo que, o regime de prestar;:ao será igualmente
público. Excepcionalmente, vem-se difundindo a
ampliar;:iio da possibilidade de prestar;:ao do servir;:o
público nao privativo do Estado mediante a simples
firmar;:iio de convenio, consórcio, contrato de gestiio
ou termo de parceria. Institutos que fazem as vezes
da delegar;:iio, ainda que com ela nao se confundam,
pois implicam apenas o estabelecimento contratual
de urna parceria, considerando que a atividade é
livre e, portanto, seria incongruente pensar em
atribuir ao particular urna prerrogativa que já !he
14
SUNDFELD, Carlos Ari. Fundamentos de
Direito público. 4. ed., Sao Paulo: Malheiros, 2002, p. 83.
15
GRAU, Eros Roberto. A ordem económica na
Constitui~iío de 1988. 13. ed., Sao Paulo: Malheiros, 2008, p.
145 e SS.
-64DR © 2014. Asociación Internacional de Derecho Administrativo
Esta revista forma parte del acervo de la Biblioteca Jurídica Virtual del Instituto de Investigaciones Jurídicas de la UNAM
www.juridicas.unam.mx
http://biblio.juridicas.unam.mx
é própria.l6 O que mlo impede que, comumente,
os governos acabem por promover, na prática, tal
impropriedade jurídica.
É importante destacar que há urna distin.;ao
teleológica no tocante á inten.;ao do prestador
privado do servi.;o vinculado ao Estado. No caso
dos servi.;os públicos privativos do Estado, há
urna pretensao de lucro por parte do chamado
"colaborador" que, na realidade, nao tem inten.;ao
nenhuma de colaborar, mas de obter o maior
núcleo de vantagens económicas possível. No caso
dos servi<;os públicos nao privativos do Estado,
em tese, a solu<;ao nao pode ser a mesma, pois os
agentes devem ter a inten.;ao de colaborar, sem a
preocupa.;ao coma obten.;ao de lucros. Afina!, se o
objetivo for a obten.;ao de lucros, o agente privado
pode se dedicar a esta atividade livremente, sem a
necessidade de urna vinculac;ao formal com o ente
público.
Saliente-se que o repasse dos servi.;os
públicos nao privativos do Estado para o mercado
ou para o terceiro setor exige como contrapartida
urna amplia.;ao da atua<;ao do Estado na área da
regula.;ao e da fiscaliza.;ao. Esta advertencia é
importante em face de algumas posi.;óes radicais
como a de Luis Cabral de Moneada quando as severa
que na área de servi.;os públicos como a saúde,
com a privatiza.;ao e a concorréncia entre o setor
público e o setor privado nao poderá nem mesmo
o Estado atuar como regulador, sob pena de urna
"grosseira distor.;ao da concorréncia". Sugere o
autor que o controle adequado deve ser realizado
por urna "entidade reguladora independente do
Estado".l7
16
Sobre o assunto ver: OLIVEIRA, Gustavo
Henrique Justino de. Contrato de gesUío. Sáo Paulo: RT,
2008.
17
MONCADA, Luis Cabral de. A subsidiariedade
-65DR © 2014. Asociación Internacional de Derecho Administrativo
Esta revista forma parte del acervo de la Biblioteca Jurídica Virtual del Instituto de Investigaciones Jurídicas de la UNAM
www.juridicas.unam.mx
http://biblio.juridicas.unam.mx
AIDA - OPERA PRIMA DE DERECHO AoMTNISTRATivo - OPus
No. 15
No Brasil tais entidades reguladoras
independentes do Estado nao existem, pois no
mii.ximo há alguns entes análogos criados no bojo
do projeto de reforma do Estado da década de
1990, mas que, na realidade, nada mais sao do que
autarquías especiais. Talvez o autor quisesse se
referir as agéncias norte-americanas, cujo grau de
autonomía é realmente grande. De qualquer modo,
seu entendimento nao é apropriado seja para o
ordenamento portugués seja para o brasileiro
(pois no tocante ao modelo de Estado interventor
os dois sistemas constitucionais sao parecidos).
O fato é que mesmo as entidades
independentes, sejam as agéncias americanas,
sejam as autoridades européias, nao sao externas
ao Estado, apenas compondo um local especial na
estrutura administrativa. lB E parece ser bastante
adequado que assim seja, pois a proposi<;ao de
que a atua<;ao como agente económico conduziria
a necessidade de absten<;ao de sua atua<;ao como
regulador nao merece crédito nem mesmo no caso
de explora<;ao de atividade económica em sentido
estrito, que se dirá en tao na realizac:;ao de atividades
que !he sao típicas, tais como os servi<;os públicos
nao privativos do Estado. Nao há que se contrapar,
como faz o autor, duas formas de atua<;ao estatais
diferentes (a sempre necessaria regulac:;ao e as
vezes opcional intervenc:;ao). Tais atividades nao
se misturam nem se atrapalham se realizadas nos
contornos constitucionais.
Reitere-se, ainda, que em face do dever
nas relayóes do Estado com a economia e a revisao
constitucional. In: MIRANDA, Jorge. (Coord.). Estudos em
homenagem ao pro!. Doutor Joaquim Moreira da Silva Cunha.
Lisboa: Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa,
2005, p. 51.
18
JUSTEN FILHO, Mar9al. O direito das
agéncias reguladoras independentes. Sao Paulo: Dialética,
2002, p. 51.
-66DR © 2014. Asociación Internacional de Derecho Administrativo
Esta revista forma parte del acervo de la Biblioteca Jurídica Virtual del Instituto de Investigaciones Jurídicas de la UNAM
www.juridicas.unam.mx
http://biblio.juridicas.unam.mx
administrativo previsto no artigo 175, inciso IV, da
Constituiyao Federal, a doutrina administrativista
brasileira chega a identificar um verdadeiro "direito
fundamental ao serviyo público adequado".l9
Talvez esta conclusao possa ser entendida como
exagerada, pois embora a prestayao do serviyo
público seja um dever constitucional inerente ao
próprio modelo de Estado, sua realizayao possui
carater eminentemente instrumental, visando
garantir o rol de direitos fundamentais previstos
na Constituiyao, estes sim, cujo caráter é material
e finalístico. De qualquer modo, a importancia
da prestayao de um servi9o público adequado
nao pode ser diminuida, ainda que nao seja
reconhecido o seu caráter de fundamentalidade.
E isso ocorre devido á sua vincula<;ao material
aos direitos humanos. Nesse sentido, a no<;ao de
servi<;o público é progressiva e histórica, sendo
imperioso seu caráter mutável para que disponha
de instrumentos tanto de eficiéncia operativa
(consecu~;ao de um bom planejamento e urna
boa formula~;ao de metas) quanto adaptativa
(adequada capacidade de reformula<;ao das
metas).20 Características estas que devem estar
presentes sem que isso signifique um desligamento
do "modelo-base" que !he condiciona.
As formas de presta~;ao dos servi~;os públicos
possuem limites nao só expressos, mas implícitos,
que impedem, inclusive, a altera<;ao do regime
jurídico de sua presta<;ao. Tais limites podem
ser mais ou menos abrangentes, dependendo da
estabilidade institucional e mental da sociedade.
19
BACELLAR FILHO, Romeu Felipe. O poder
normativo dos entes reguladores e a participa~ao dos cidad:ios
nesta atividade. Servii!;OS públicos e direitos fundamentais ...
Op. cit., p. 64.
20
GABARDO, Emerson. Principio constitucional
da eficiencia administrativa. Sao Paulo: Dialética, 2002, p. 30.
-67DR © 2014. Asociación Internacional de Derecho Administrativo
Esta revista forma parte del acervo de la Biblioteca Jurídica Virtual del Instituto de Investigaciones Jurídicas de la UNAM
www.juridicas.unam.mx
http://biblio.juridicas.unam.mx
AlOA- ÜPERA PRIMA DE DERECHO ADMINISTRATNO-
Opus
No. 15
Ademais, podem variar os mecanismos de sua
realizao;ao em face das opo;óes políticas legítimas
de prestao;ao díreta ou indireta. Todavía, a
referencia inerente ao modelo constitucional
instituí um caráter próprio que tende a permanecer
no tempo como urna garantía contra qualquer
tentativa de retrocesso social. No caso brasileiro
a Constituío;ao Federal de 1988 e clara ao retratar
jurídicamente a imposio;ao de um regime típico
do Estado social que, por ser "parte nuclear" do
sistema e emblematicamente estável. Como afirma
Celso Antonio Bandeira de Mello, "os direitos
sociais fazem parte do acervo histórico, jurídico,
ético e cultural dos povos civilizados. Integram o
patrimonio cultural do povo brasileiro."21
2 O CARÁTER ESSENCIAL DOS SERVI<;OS
PÚBLICOS DE TRANSPORTE COLETIVO DE
PASSAGEIROS
A partir deste pano de fundo conceitual, toma-se
mais fácil a compreensao do contexto específico
referente ao transporte coletivo. Nos termos da
Constituio;ao Federal de 1988, nao há urna única
competencia para a prestao;ao dos servio;os de
transporte coletivo de passageiros no Brasil. Todos
os entes federativos possuem competencia própria
para a atividade, dependendo do seu nivel de
abrangencia territorial. A Uniao é responsável pelos
servio;os de transporte internacional e interestadual,
os Estados prestam os servio;os intra-estaduais e
os municipios o típicamente urbano. Tais servio;os,
nos termos do artígo 175 da Constituio;ao podem
ser descentralizados mediante a utilizao;ao da
21
MELLO, Celso Antonio Bandeira de. Eficácia
das normas constitucionais e direitos sociais. Sao Paulo:
Malheiros, 2009, p. 57.
-68DR © 2014. Asociación Internacional de Derecho Administrativo
Esta revista forma parte del acervo de la Biblioteca Jurídica Virtual del Instituto de Investigaciones Jurídicas de la UNAM
www.juridicas.unam.mx
http://biblio.juridicas.unam.mx
"outorga" a entidade administrativa estatal ou por
intermédio da delegar;iio propriamente dita (com
atribuir;iio da execur;ao do servir;o ao particular e
resguardo da titularidade ao ente político).22 Se
prestada diretamente, precisará de lei autorizativa
de iniciativa do chefe do Poder Executivo; se
indiretamente, além da respectiva lei, também de
licitar;iio promovida pela mesma autoridade.
E aqui se está tratando, obviamente, somente
da competencia de prestar;iio, pois a "competencia
regulatória" é muito mais abrangente, podendo
mesclar vários ámbitos legislativos e diversas
áreas jurídicas (com clara predominancia da
Uniiio nesta seara, seja no tocante a regular;iio do
transito, seja quando estabelece normas gerais de
!icitac;:iio e contratar;iio, ou mesmo, das próprias
concessóes e permissóes de servir;o público). Do
ponto de vista regulatório, o artigo 21, inciso XX,
da Constituir;ilo Federal estabelece competencia
para a Uniilo instituir diretrizes sobre transporte
urbano. Já o artigo 22, inciso XI, da Constituic;:ilo
Federal estabelece competencia para a Uniiio
Federal legislar sobre transito e transportes. Desse
modo, os municipios (no caso de interesse local) e
os Estados (no caso de interesse comum) devem
atender a normas gerais federais também relativas
a estas matérias.23
Apesar das opr;óes juridicas pela prestar;iio
direta ou indireta dos servir;os públicos,
historicamente, o transporte coletivo em geral
sempre foi entregue a execur;ao da iniciativa
privada no Brasil. Aliás, esta é urna tendencia
também verificada nos ordenamentos comparados.
22
SOUTO,
Marcos
Juruena
Villela.
Desestatiza~ao: privatiza¡yao, concessóes, terceiriza¡;6es e
regula~iío. 4. ed., Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2001, p. 310.
23
A
titulo
exemplificativo
mencionadas as Leis 10.233/01 e 11.518/07.
-69-
devem
DR © 2014. Asociación Internacional de Derecho Administrativo
ser
Esta revista forma parte del acervo de la Biblioteca Jurídica Virtual del Instituto de Investigaciones Jurídicas de la UNAM
www.juridicas.unam.mx
http://biblio.juridicas.unam.mx
AlOA- OPERA PRIMA DE
DERECHo ADMINISTRATIVO- OPus No. 15
Jean Franc;ois Janin relata que a tradic;ao de
delegac;ao dos transportes coletivos deriva de
urna iniciativa do próprio setor privado. Blaise
Pascal, no século XVII teria sido o primeiro que
teve a idéia de colocar juntas para viajar pessoas
que nao se conheciam. Eram as chamadas
"carrosses a cin sols". Mas é importante res saltar
que desde o inicio (ao menos na Franca) o Poder
Público interveio mediante a concessao de cartas
de patentes e de urna regulamentar;:ao de acesso
ao servir;:o.24 Desse modo, ainda que atribuida
a execuc;ao para os particulares, por outro lado,
o tema sempre foi, e continua a ser, fortemente
regulado, desde o próprio nivel constitucional.
Veja-se que a Constituir;:ao trata dos transportes
em várias oportunidades, tais como no artigo 178,
quando prevé a ordenacao económica do transporte
terrestre ou no artigo 230, parágrafo 2", quando
confere gratuidade aos maiores de sessenta e
cinco anos quando usuários de transporte coletivo
urbano.
Dentro desta caracteristica de elevada
densidade regulatória, um dos pontos de relevancia
em relacao aos transportes coletivos urbanos referese ii adjetivao;:ao normativa deste servir;:o público
como "essencial" contida no artigo 30, inciso V da
Constituicao.25 Para Horácio A. Mendes de Souza
"a noc;ao de essencíalidade é tao variante quanto
a de senri<;o público". Ademais, esclarece o autor
24
JANIN,
Jean Franyois.
Os
sistemas de
transportes coletivos. In: PERROT, Jean-Yves e CHATELUS,
Gautier (Orgs.). Financiamento de infraestruturas e dos services
coletivos: o recurso a parceria púbico~privado. Os exemplos da
experiencia francesa no mundo. Tradw;ao de Nádia Dalla Déa.
Paris: Ministére de 1'equipement, des transports et du logement -
Direction des affaires économiques et internationals, [199?), p. 185.
25
"Art. 30. Compete aos Municípios: (... ) V organizar e prestar, diretamente ou sob regime de concessao
ou permissao, os serviyos públicos de interesse local, incluído
o de transporte coletivo, que tem caráter essencial."
-70-
DR © 2014. Asociación Internacional de Derecho Administrativo
Esta revista forma parte del acervo de la Biblioteca Jurídica Virtual del Instituto de Investigaciones Jurídicas de la UNAM
www.juridicas.unam.mx
http://biblio.juridicas.unam.mx
que o fato de somente o transporte coletivo ter
sido elencado como essencial nao significa que o
interestadual, o intermunicipal e o internacional
também nao o sejam. 26
E Adilson Dallari vai além, propondo que
"todo servic;o público é essencial, no sentido de
corresponder a urna necessidade da coletividade,
como algo indispensavel ao convívio, ao
desenvolvimento normal das atividades dos
integrantes de urna coletividade, nos días atuais."
E cita como exemp!o justamente o servic;o de
transporte coletivo, asseverando que "pode nao ser
utilizado por urna parcela da populac;ao, mas ele
é indispensável para o funcionamento da cidade
e o Poder PUblico tem o dever de proporciona~
lo".27 Sao procedentes as colocac;óes dos autores,
principalmente quando em foco o "principiO da
continuidade dos servic;os públicos", haja vista
que ao principal atributo da essencialidade sáo
as garantías e restric;óes em face da possibi!idade
de paralisac;áo. Ou seja, para alguns intérpretes,
todos os servic;os públicos sao essenciais, pela sua
própria natureza de satisfac;ao de urna necessidade
de atendimento perene. Nesse sentido ponderam,
por exemplo, Ana Maria Golffi e Flaquer Scartezzini,
quando afirmam: "como o servic;o público antes
de um conceito juridico é um fato, urna de suas
características essenciais é a continuidade, que
está ligada é eficiéncia da prestac;ao, pois só assim
será oportuna. A sua prestac;ao nao deve ser
interrompida, sob pena de prejudicar justamente
o beneficiário, o destinatario para o qua! o servic;o
26
SOUZA, Horácio Augusto Mendes de.
jurídica do transporte rodoviário de passageiros.
Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2003, p. 46-47.
Regula~;iio
27
DALLAR!.
Adilson
Abreu.
Tarifa
remuneratória dos servic;::os concedidos. In: TORRES, Heleno
Taveira (Coord.). Servi~os públicos e Direito tributário. Rio de
Janeiro: Lumen Juris, 2005, p. 216.
~ 71~
DR © 2014. Asociación Internacional de Derecho Administrativo
Esta revista forma parte del acervo de la Biblioteca Jurídica Virtual del Instituto de Investigaciones Jurídicas de la UNAM
www.juridicas.unam.mx
http://biblio.juridicas.unam.mx
AIDA - ÜPERA PRIMA DE DERECHO ADMINISTRATIVO -
OPus No. 15
foi criado." 28
Finalmente, o parágrafo 1 o do artigo go da
Constituic;:ao Federal prescreve que "a 1ei definirá
os servic;:os ou atividades essenciais e disporá sobre
o atendimento das necessidades inadiáveis da
comunidade." Senda assim, parece razoável supor
que a vinculac;;áo dos transportes coletivos como
essenciais é meramente exemplificativa, podendo
o legislador infra-constitucional ampliar os casos.
Neste sentido, segue a regra do artigo 22 do
Código de Defesa do Consumidor, que estabelece:
"os órgaos públicos, por si ou suas empresas,
concessionárias, permissionárias ou sob qualquer
outra forma de empreendimento, sao abrigados a
fornecer servic;:os adequados, eficientes, seguros e,
quanto aos essenciais, continuos." Norma esta que
deve ser interpretada de acordo com o elenco dos
servic;;os essenciais (que nao sao necessariamente
os tidos como públicos) da Lei no 7.783/89, que
assim os identifica, em cada um dos incisos do seu
artigo 10: "!- tratamento e abastecimento de água;
produc;:ao e distribuic;:ao de energia elétrica, gás e
combustíveis; 11- assisténciamédicae hospitalar; III
- distribuic;:ao e comercializac;:ao de medicamentos
e alimentos; IV - funerários; V- transporte coletivo;
VI - captac;:ao e tratamento de esgoto e lixo; VII telecomunicac;:oes; VIII - guarda, uso e controle de
substancias radioativas, equipamentos e materiais
nucleares; IX - processamento de dados ligados a
servic;:os essenciais; X - controle de tráfego aéreo;
XI - compensac;;ao bancária." Vé-se, pois, que este
rol contempla atividades económicas em sentido
estrito, ao lado de alguns servic;;os públicos (nao
todos). Veja-se que em alguns casos, reportase a expressoes genéricas, que nao traduzem
28
GOLFFI, Ana Maria e SCARTEZZINI, Flaquer.
O principio da continuidade do servi~o público. Sáo Paulo:
Malheiros, 2006, p. 94.
-72-
DR © 2014. Asociación Internacional de Derecho Administrativo
Esta revista forma parte del acervo de la Biblioteca Jurídica Virtual del Instituto de Investigaciones Jurídicas de la UNAM
www.juridicas.unam.mx
http://biblio.juridicas.unam.mx
diretamente o servi<;o em questao (caso das
telecomunica<;6es). Razao pela qua!, a questao
nao pode ser definida apenas pelo texto formal da
lei em sentido estrito, mas sim do ordenamento
como um todo e da sua interpreta<;ao sistemática,
notadamente mediante a imposi<;ao dos principios
como condicionantes do regime jurídico aplicável.
E, como já asseverado, o principio da
continuidade é um dos principios de maior destaque
nesta questao, impondo a todos os servi<;os
públicos, inclusive aqueles objetos de concessao,
alguns condicionamentos. E isso tem especial relevo
quando os servi<;os sao concedidos ou permitidos,
como é o caso do transporte coletivo, pois dele
decorrem prerrogativas para a Administra<;ao, tais
como a capacidade de interven<;ao na empresa
delegatária no caso de inadequa<;ao na execu<;ao,
a imposi<;ao de prazos de moderniza<;ao, e o poder
de utiliza<;ao de equipamentos e também pessoal
da empresa, em casos excepcionais, garantindo
assim a regularidade.29 Des se modo, as empresas
nao tém o direito de cessar a presta<;ao, mesmo em
situa<;oes nas quais, normalmente teriam (como
nos contratos de direito privado), permissao legal
para a recusa da sua contrapartida obrigacional.
Ou seja, resta afastada a exceptio non adimplenti
contractus. Obviamente que esta regra nao é
absoluta. Como explica Mar<;al Justen Filho,
em caso de ser caracterizada urna "situa<;ao de
sacrificio acima do razoável, é perfeitamente
admissível a suspensao da atividade". Contudo,
em geral, aplica-se a possibilidade apenas de
suspensao do servi<;o nos termos do artigo 6',
parágrafo 2', da Lei n' 8.987 j95: motivos de ordem
técnica ou de seguran<;a e o inadimplemento do
29
GOLFFI, Ana Maria e SCARTEZZINI. Flaquer.
O principio da continuidade do servi~o público. Op. cit. p. 99.
-73DR © 2014. Asociación Internacional de Derecho Administrativo
Esta revista forma parte del acervo de la Biblioteca Jurídica Virtual del Instituto de Investigaciones Jurídicas de la UNAM
www.juridicas.unam.mx
http://biblio.juridicas.unam.mx
AIDA -
OPERA PRIMA DE DERECHO ADMINISTRATivo - OPus
No. 15
usuano. Sendo o segundo caso interpretado de
forma relativa, pois, conforme aduz o autor, esta
hipótese legal nao autoriza "a suspensao dos
servi~:os obrigatórios, cuja presta~:ao de faz no
interesse público ou é essencial a dignidade da
pessoa humana (normalmente servio;os ligados a
saúde pública).30
E aqui é que aquestao torna-se bastante dificil
de ser compreendida. Afina!, se a essencialidade é
ligada a dignidade, implicando a impossibilidade
de cessao;ao da disponibilizao;ao ao usuário, como
fica entao o caso dos transportes coletivos, cujas
empresas embora tratando também de atividade
constitucional e legalmente essencial, somente
prestam-na aqueJes que efetivamente pagam a
tarifa (com as devidas exceo;oes do ordenamento).
Em que termos pode ser essencial urna atividade
que, por defini~:ao, é negada a quem nao pode
efetuar o respectivo pagamento?
Parece que, implicitamente, o sistema jurídico
brasileiro faz urna distino;ao entre os servio;os cuja
essencialidade é de carater singular e aqueJes em
que o carater essencial acorre justamente pelo seu
carater coletivo. Ou seja, a priori, do ponto de vista
formal nossos legisladores (bem como a doutrina e
a jurisprudéncia patrias) nao parecem considerar
urna afronta a dignidade humana a recusa
individualizada de presta~:ao dos servi~:os, mas
sim sua paralisao;ao completa, cujo prejuízo acaba
sendo suportado por toda a sociedade, gerando um
problema social de grandes propor~:óes. Daí o foco
da aplicao;ao da. essencialidade residir no controle
da atuao;ao das empresas e na limita~:ao do direito
de greve, quando em relevo o transporte coletivo.
30
JUSTEN FILHO, Mar9al. Teoria geral das
concess6es de servü;;o pUblico. Op.cit., p. 309-310.
-74DR © 2014. Asociación Internacional de Derecho Administrativo
Esta revista forma parte del acervo de la Biblioteca Jurídica Virtual del Instituto de Investigaciones Jurídicas de la UNAM
www.juridicas.unam.mx
http://biblio.juridicas.unam.mx
3 OS SERVI<";OS PÚBLICOS DE TRANSPORTE
COLETIVO RODOVIÁRIO EM FACE DO MEIO
AMBIENTE URBANO
Costuma-se a identificar a década de 1920 como a
inicial em termos de transporte rodoviário no Brasil,
especialmente em face da constrw;;iio da Rodovia
Rio-Siio Paulo (única pavimentada até 1940).31
Foi com o colapso do modelo economico entiio até
en tao vigente na década de 1930 que se propiciou,
no Brasil, o retorno da tendéncia de centraliza\;iiO
das atividades administrativa. Tal fato, por sua vez,
fomentou a implantayiio de urna infraestrutura
rodoviária, principalmente no periodo posterior á
Segunda Guerra. De maneira sem precedentes na
historia nacional, silo ampliados os investimentos
nao somente nas rodovias, como também em
ferrovias, portas, energia e telecomunica\;éíes
(por meio de empresas estatais que substituem,
paulatinamente, as empresas privadas entiio
concessionárias dos servi\;OS). A forte lideran ya
da Uniiio Federal no periodo de. industrializayiio
intensa acorrido das décadas de 1930 a 1980
propiciou a unifica9iio do mercado interno e,
finalmente, o desenvolvimento industrial que
incrementou a urbanizayiio e o desenvolvimento
(como todas as externalidades decorrentes deste
processo- em geral nao planejado).32
A partir da década de 1980 os problemas
inerentes á mobilidade urbana, em relar;iio á
qual o transporte coletivo rodoviário é atividade
essencial ii qualidade de vida geral da sociedade,
31
RODRIGUES, Pau!o Roberto Ambrósio.
lntrodw;:ao aos sistemas de transportes no Brasil e a logistica
internacional. 4. ed., Sao Paulo; Aduaneiras, 2008, p. 47.
32
BARAT, Josef. Logística, transporte e
desenvolvimento económico: a visao institucional. sao Paulo:
Cla, v. 11, 2007, p. 7 e ss.
-75DR © 2014. Asociación Internacional de Derecho Administrativo
Esta revista forma parte del acervo de la Biblioteca Jurídica Virtual del Instituto de Investigaciones Jurídicas de la UNAM
www.juridicas.unam.mx
http://biblio.juridicas.unam.mx
AlOA- OPERA PRIMA DE DERECHo ADMINISTRATIVO - Qpus No.
15
somente se agravaram. A incrementa<;il.o da
densidade populacional sobrecarrega cada vez
mais o servi<;o de transporte, cujas dificuldades
decorrem tambem da ausencia de políticas públicas
adequadas, do aumento do transporte individual,
da precariedade do sistema fiscalizatório e do
recorrente pessimo planejamento urbano das
cidades e da malha viária do país.33 O govemo
passa a fomentar de maneira intensa o transporte
de passageiros interestadual e internacional por
vias exclusivamente rodoviárias, esquecendo-se
da ausencia de condi<;óes financeiras adequadas
a sua manuten<;il.o e, tambem, de que este meio
consistente no transporte rodoviário e indicado
para as transferencias em pequenas distancias, ou
seja, que nil.o ultrapassem o raía de 500 Km. Acima
disso, afeta-se progressivamente aeconomicidade,
pelo elevado consumo energético verificado.
Conforme esclarece Paulo Roberto Rodrigues,
baseado em dados da Associa<;il.o Brasileira de
Logística, "por sua elevada flexibilidade, este
modal [o rodoviário] e indicado para a distribui<;il.o
urbana, cujas transferencias sil.o de pequenas
distancias, além das inevitáveis conexóes com os
demais modaís." 34
Neste fim da primeira década do século
XXI, as cidades tem sido acometidas de urna
série de situa<;óes adversas, como a degrada<;il.o
das condi<;óes ambientais, a convivencia com
congestionamentos cromcos, os altos índices
de acidentes e, paradoxalmente, a ausencia
33
COSTA, Paolo Henrique Spilotros. O princípio
da eficiencia e a competitividade nos servil;os públicos de
transporte coletivo. In: SOUTO, Marcos Juruena Villela e
MARSCHALL. Carla C. Direito Empresarial Público. Rio de
Janeiro: Lumen Juris, 2002, p. 559.
34
RODRIGUES, Paulo Roberto Ambrósio.
lntrodu!;áO aos sistemas de transportes no Brasil e á logística
internacional. Op. cit., p. 49.
-76DR © 2014. Asociación Internacional de Derecho Administrativo
Esta revista forma parte del acervo de la Biblioteca Jurídica Virtual del Instituto de Investigaciones Jurídicas de la UNAM
www.juridicas.unam.mx
http://biblio.juridicas.unam.mx
de mecanismos institucionais adequados que
possibilitem o uso racional dos espac;os urbanos.
Resta claro o prestigio que o automóvel possui
em termos de fomento estatal (vejam-se as
comuns isenc;oes tributárias concedidas no
Brasil como meio de fomento económico). Para as
forc;as especulativas do mercado, a produc;iio de
combustíveis, de automóveis, de pec;as, acessórios
e pneus tém sido urna fonte lucrativa de recursos,
ocasionando a reduc;iio das calc;adas e das áreas
verdes, o aumento dos espac;os necessários ao
estacionamento e a transformac;iio das prac;as
em rotatórias, além de outras externalidades
negativas.35
Um dos mais relevantes efeitos adversos do
prestigio do transporte individual em detrimento
do coletivo nas cidades brasileiras é justamente o
ambiental. Os efeitos do transporte automotor na
qualidade do ar tém sido devastadores no mundo
todo, o que implicou a criac;áo de formas de
controle que viio da imposic;ao de limitac;óes para
a emissiio de gases (específicamente impostas aos
fabricantes) a cobranc;a pelo direito de circular
(road pricing).36
Os automóveis sao os principais emissores
de monóxido de carbono, hidrocarbonetos e óxidos
de nitrogénio, numa proporc;iio por volume anual
em toneladas de 97,8% para CO, 96,1% para HC,
e 67,4% para NOx (enquanto os ónibus emitem
2%, 3,4% e 28,5%, respectivamente). A titulo
comparativo é interessante observar que em um
trecho de 7Km no eixo Rebouc;as/Consolac;iio, na
35
LIMA, Iéda Maria de Olivera. A crise do
transporte urbano: o que o govemo federal tem a ver com
isso. In: Revista dos Transportes Públicos. Scio Paulo: ANP, n"
81, ano 21, 1998, p. 31 e ss.
36
VASCONCELLOS, Eduardo A. Transporte
urbano nos países em desenvolvimento: retlexóes e propostas.
3. ed., Sao Paulo: Annablume, 2000, p. 37.
-77DR © 2014. Asociación Internacional de Derecho Administrativo
Esta revista forma parte del acervo de la Biblioteca Jurídica Virtual del Instituto de Investigaciones Jurídicas de la UNAM
www.juridicas.unam.mx
http://biblio.juridicas.unam.mx
AlOA - ÜPERA PRIMA DE DERECHO ADMINISTRATIVO - ÜPUS
No. 15
cidade de Sao Paulo, 94% dos veículos circulantes
sao automóveis, que respondem por 44% dos
passageiros e 5% sao ónibus, que respondem por
55'% dos passageiros.37 Ademais, a acessibilidade
esta distribuida de forma desigual. Asseverar
que a utiliza<;ao de determinado modal de
transporte é urna op<;iio do individuo que poderia
escolher entre o transporte público ou o privado
é urna visiio simplista do fenómeno urbano que
Eduardo Vasconcelos denomina de "iniqüidade
de acessibilidade", cujo conteúdo compreende
as rela<;óes nao isonómicas em termos de tempo
de acesso, velocidade, conforto, uso do espa<;o,
seguran<;a e prote<;ao ambiental.38
Caminhando em sentido contrario ao da
globaliza<;iio dos problemas locais, cada vez mais
a Uniao e os Estado parecem querer eximir-se da
questao (no máximo, legislando genericamente
sobre matérias pelas quais a Constitui<;iio !hes
reputa responsáveis, mas sem a preocupa<;ao direta
com o problema). Obviamente é dificil imaginar
qual seria a solu<;iio para os problemas atualmente
vivenciados, mas parece condi<;iio imprescindível
ii sua resolu<;iio que as tres esferas da federa<;iio
responsabilizem-se por medidas tanto preventivas
e compensatórias. Nao é possível mais imaginar
que se tratam de problemas exclusivamente locais
ou mesmo regionais, sob o controle apenas do
municipio ou do Estado. Afina!, a competéncia
geral para a prote<;iio do meio ambiente é das
tres esferas da federa<;iio, mesmo que algumas
atividades sejam realizadas em um ecossistema
37
VASCONCELLOS, Eduardo A. Transporte
urbano nos países em desenvolvimento: reflexOes e propostas.
Op.cit., p. 41.
38
VASCONCELLOS, Eduardo A. Transporte
urbano nos países em desenvolvimento: reflexóes e propostas.
Op. cit., p. 43.
-78DR © 2014. Asociación Internacional de Derecho Administrativo
Esta revista forma parte del acervo de la Biblioteca Jurídica Virtual del Instituto de Investigaciones Jurídicas de la UNAM
www.juridicas.unam.mx
http://biblio.juridicas.unam.mx
urbano localizado. Entretanto, na prática, ainda
pode ser verificada urna série de conflitos e
auséncias institucionais.
Em nível federal, devido a dificuldade
de coordenac;:ao entre as diferentes instancias
competentes: transportes, minas e energia,
ciéncia e tecnologia, fazenda e meio ambiente).
Já no nível estadual sao reproduzidos vários dos
conflitos federais, ainda que em menor grau,
mas seu maior problema tem sido encontrar
os meios mais adequados para a gestao das
regióes metropolitanas, cujas disputas de poder
político, incrementadas pelo confronto entre o
interesse público e os interesses económicos
privados reduzem a possibilidade de urna soluc;:ao
realmente consensual e eficiente. E, finalmente,
na esfera municipal, a precariedade das suas
disponibilidades orc;:amentárias, sornada a falta de
adesiio a o Sistema Nacional de Transito e a auséncia
de políticas locais de urbanismo e transporte,
tornam crónica a dificuldade de construc;:ao de um
meio ambiente urbano equilibrado.39
A soluc;:ao para os problemas concernentes
ao servic;:o público de transporte (e inerentes
a mobilidade no ambiente urbano em geral)
parece residir no desenvolvimento de um sistema
interfederativo que permita resultados com
eficiéncia, seguranc;:a e acessibilidade aos usuários,
sem deixar de ser atrativo para as empresas
delegatiirias. Neste contexto, o poder concedente
deve estipular critérios e modos de prestac;:iio
visando: a ampliac;:iio progressiva da qualidade
dos servic;:os, a preocupac;:ao com a criac;:iio de
empregos, a adequac;:iio entre a ampliac;:iio dos
39
Sobre o assunto ver: VASCONCELLOS,
Eduardo A. Desvendando a política brasileira da mobilidade
urbana. In: Revista dos Transportes Públicos. Sao Paulo: ANP,
no 108, ano 28, IV Trimestre, 2005, p. 15.
-79DR © 2014. Asociación Internacional de Derecho Administrativo
Esta revista forma parte del acervo de la Biblioteca Jurídica Virtual del Instituto de Investigaciones Jurídicas de la UNAM
www.juridicas.unam.mx
http://biblio.juridicas.unam.mx
AlOA - ÜPERA PRIMA DE DERECHO ADMINISTRATIVO -
Qpus No. 15
usuários e o consumo dos combustíveis, a justi<;a
social com isonomia de atendimento, a estipula¡;:ao
de metas, objetivos e condi¡;:óes claras e seguras,
pautadas pela confian¡;:a entre contratante e
contratados.40 Conforme define Paolo Henrique
S. da Costa: "a eficiencia da presta¡;:ao de servi<;:os
públicos decorre da qualidade da execu¡;:ao
dos servi<;os outorgados a concessionária no
cumprimento das metas estabelecidas no contrato
de concessao, que, a rigor, deve refletir o interesse
da coletividade naquela determinada epoca, e com
o nivel de tecnología permitido e conhecido."41
Este raciocinio leva a conclusao de que a
comum delega¡;:ao dos servi<;:os de transporte
coletivo urbano, no Brasil, por intermedio do
instituto da permissao também consiste em
um sério problema. Obviamente a atividade de
transporte, pela sua própria natureza, nao admite
ser pactuada por meio da permissao. Trata-se
de um caso típico a ser regido pela concessao.
Mas nao é isso que em geral ocorreu no Brasil,
cuja Administra¡;:ao Pública demorou muito para
verificar que, para ambas as partes, é imprescindível
a prote¡;:ao típica do contrato. Como bem coloca
Romeu Felipe Bacellar Filho, a permissao, quando
firmada a termo e em condi¡;:óes de bilateralidade,
nao admite a precariedade, nema revogabilidadetrata-se, pois, de um efetivo contrato. Desse modo,
e mediante a incidéncia recíproca dos deveres
de coeréncia, lealdade e transparencia, toma-se
segura a rela~;ao entre a Administra~;ao e o parceiro
particular, além de mais promissora a realiza~;ao
40
COSTA, Paolo Henrique Spilotros. O principio
da eficiencia e a competitividade nos servi~os públicos de
transporte coletivo. Op. cit., p. 560 e ss.
41
COSTA, Paolo Henrique Spilotros. O principio
da eficiencia e a competitividad& nos servi~os públicos de
transporte coletivo. Op. cit., p. 572.
-80DR © 2014. Asociación Internacional de Derecho Administrativo
Esta revista forma parte del acervo de la Biblioteca Jurídica Virtual del Instituto de Investigaciones Jurídicas de la UNAM
www.juridicas.unam.mx
http://biblio.juridicas.unam.mx
eficiente do servio;:o.42
Embora os servio;:os de transporte
rodoviário em geral sejam atribuidos a um umco
concessionário a busca de competitividade no setor
tem levado o Poder Público a constituir situao;:óes
de "transporte multimodal". Nestes casos, se a
Administrao;:áo baíxa a tarifa do ónibus, isso afeta
a barca que perde clientes. Ou entáo, se o servio;:o
de transporte por veículo metropolitano (metró) é
subsidiado diretamente e nao o rodovíário, este
perde competitividade. As variáveis destes casos
precisam ser analisadas com cautela, embora
a jurisprudéncia tenha sido bastante simplista,
atribuindo apenas as concessionárias o ónus
de tal atividade administrativa, que Paolo Costa
entende consistir em auténtico "fato do príncipe",
o que implicaría um reequilíbrio dos contratos
cujos concessionários foram prejudicados.43
Parece ser um caso auténtico de deslealdade
quando a Administrao;:ao pretende, após firmado
o contrato, alterar as condio;:óes inerentes ao
sistema (ainda que nao específicamente ao modal
rodoviário) sem se preocupar com o equilíbrio
económico-financeiro da relao;:ao pactuada em
condio;:óes pretéritas diversas.
Mas a questao nao se restringe aos vínculos
contratuais específicos de cada caso. As delegao;:óes
de servío;:o público devem ser acompanhadas de
politicas públicas, especialmente de financiamento,
que fomentem os transportes públicos (e nao o
inverso, que tem sido o comumente observado no
Brasil, como no caso da recente reduo;:ao do Imposto
42
BACELLAR FILHO, Romeu Felipe. As
concessOes, permissOes e autorizac;Oes de servi~o público.
Op. cit., p. 416 e ss.
43
COSTA, Paolo Henrique Spilotros. O principio
da eficiéncia e a competitividad& nos servi~os públicos de
transporte coletivo. Op. cit., p. 585.
-81DR © 2014. Asociación Internacional de Derecho Administrativo
Esta revista forma parte del acervo de la Biblioteca Jurídica Virtual del Instituto de Investigaciones Jurídicas de la UNAM
www.juridicas.unam.mx
http://biblio.juridicas.unam.mx
AIDA -
OPERA PRIMA DE
DEREcHo
ADMINISTRATIVO -
Oeus No. 15
sobre Produtos Industrializados dos automóveis).
A implantao:;ao de subsidios para a reduo:;ao do
valor da tarifa seria urna destas medidas. Além,
é claro, de outras relativas ao urbanismo e ao
meio ambiente (que certamente ultrapassam as
fronteiras intramunicipais). Conforme lembra Iéda
de Oliveira Lima, muitas vezes as autoridades
administrativas esquecem que as externalidades
negativas típicas da ausencia dos mecanismos
institucionais adequados acabam tendo forte
impacto no valor da tarifa (algo em torno de 10%
nos grandes centros). Veja-se que a area ocupada
por quem é transportado por automóvel é muito
maior do que aqueJa ocupada por quem transita
em ónibus (em Sao Paulo, quase 15 vezes mais
espa<;o).44
Daí a necessidade de normas de interveno:;ao
do Estado que compreendam tres planos
estruturantes: o planejamento urbano (que define
como os locais urbanos devem ser ocupados, além
de delimitar uso da propriedade privada nestes
espao:;os), o planejamento de circulao:;ao (que
implica o estabelecimento de regras de transito
e de trafego, além de fiscalizao:;ao e até mesmo
educao:;ao social), e, finalmente, o planejamento
de transportes (que regula a infraestrutura de
circula<;ao de mercadorias e pessoas, tamanho das
ruas e calo:;adas, vías férreas, terminais, estrutura
das linhas de transporte público, freqüéncia das
viagens, etc) .45 A inteno:;ao des tes instrumentos
deve ser a de reduzir os elementos de piara
progressiva das condio:;oes de prestao:;ao do servi<;o,
44
LIMA, leda Maria de Oliveira. A crise do
transporte urbano: o que o governo federal tem a ver com
isso. In: Revista dos Transportes Públicos. Op. cit., p. 35.
45
VASCONCELLOS, Eduardo A. Transporte
urbano nos países em desenvolvimento: reflexóes e propostas.
Op. cit., p. 49.
-82DR © 2014. Asociación Internacional de Derecho Administrativo
Esta revista forma parte del acervo de la Biblioteca Jurídica Virtual del Instituto de Investigaciones Jurídicas de la UNAM
www.juridicas.unam.mx
http://biblio.juridicas.unam.mx
tais como: a dificuldade de financiamento, o
crescimento do transporte informal (kombis,
vans, taxis-lotao;:ao, microónibus), a queda de
produtividade das empresas de transporte por
ónibus (principalmente após a década de 90),
a precariedade da fiscalizao;:ao de tránsito e
transporte em geral, e a evoluo;:áo desequilibrada
das tarifas em face dos custos operacionais.
Custos estes que sao suportados especialmente
pelos usuarios de baixa renda (clientes cativos do
sistema público).46
Se o servio;:o público de transporte coletivo
urbano é realmente urna atividade essencial, a
interveno;:ao do Estado nesta realidade é prioritaria
nao somente para a entidade diretamente
incumbida da prestao;:ao (no Brasil, o municipio).
Esta atuao;:áo deve acorrer de diferentes formas,
seja mediante instrumentos de regulao;:ao e
fiscalizat;;ao, seja por meio direto de ampliao;:ao
dos investimentos (o que pode ser realizado em
parceria coma iniciativa privada).
Nesse sentido, o governo federal deve
procurar resistir ao "lobby conservador" que insiste
na descentralizat;;ao respaldada pelo malfadado
principio da subsidiariedade como meio de
desresponsabilizao;:ao e omissáo da Uniáo Federal
(que tem se recusado a ampliar os recursos para
investimentos no transporte urbano). Deve-se
res saltar que nos últimos anos, coma forte reduo;:ao
do déficit público no país, tem acorrido muitos
investimentos diretos para outras espécies de
servi~;os públicos concedidos, tais como os da área
de saneamento. Ou mesmo, há fartos recursos para
setores como o da habitao;:ao (que é urna atividade
económica em sentido estrito). Todavía, quando
46
LIMA, Iéda Maria de Oliveira. A crise do
transporte urbano: o que o governo federal tema ver com isso.
Op. cit., p. 37.
-83DR © 2014. Asociación Internacional de Derecho Administrativo
Esta revista forma parte del acervo de la Biblioteca Jurídica Virtual del Instituto de Investigaciones Jurídicas de la UNAM
www.juridicas.unam.mx
http://biblio.juridicas.unam.mx
AlOA- ÜPERA PRIMA DE DERECHO ADMINISTRATIVO - ÜPUS
No. 15
pensado o transporte coletivo, permanece forte
resistencia em relac;;ao a utilizac;;ao mecanismos
de compensac;;ao que nao os financiados
exclusivamente pela própria tarifa.4 7 Em geral,
os empresários do setor sao sempre considerados
os culpados pela elevac;;ao das tarifas perante a
comunidade, pois isso é confortável aos agentes
políticos, que se exoneram da responsabilidade
sempre que a medida e impopular. Esta atitude
em regra desleal com o setor privado desfavorece
a existencia de urna real competic;;ao no setor, por
meio da reduc;;ao dos interessados em desenvolver
tal atividade económica.
Ignora-se, assim, que os transportes
retratam um locus sócio-ambiental em que a
parceria com os agentes privados pode trazer
grandes beneficios para a eficácia e a qualidade
no servic;;o (sempre mantendo-se a tradic;;ao de
urna forte regulac;;ao em beneficio dos usuários).
Defendendo esta propos1c;;ao, Jean Franc;;ois
Janin ressalta que por intermedio de urna
política público-privada bem conduzida torna-se
possível nao somente contornar as conseqüencias
negativas da atividade de transporte, como
produzir externalidades efetivamente positivas,
como, por exemplo, consolidando-se na prática o
conceito de "mobilidade durável". Contudo, o éxito
destes servic;;os em parceria depende de urna "boa
regulac;;ao das necessidades de servic;;os públicos",
além de urna "fiscalizac;;ao de qualidade", inclusive,
se necessário, com o Poder Público participando
do financiamento das infraestruturas a fim de
permitir as empresas a rentabilidade necessária.48
47
LIMA, leda Maria de Oliveira. A crise do
transporte urbano: o que o governo federal tema ver com isso.
Op. cit., p. 38.
48
JANIN, Jean Francois. Os sistemas de
transportes coletivos. Op. cit., p. 185 e ss.
-84DR © 2014. Asociación Internacional de Derecho Administrativo
Esta revista forma parte del acervo de la Biblioteca Jurídica Virtual del Instituto de Investigaciones Jurídicas de la UNAM
www.juridicas.unam.mx
http://biblio.juridicas.unam.mx
Ademais, a participa<;;iio ativa do governo
federal na busca tanto por empréstimos extemos
quanto por investimentos diretos, "na composi<;;iio
de fontes de financiamento e cria<;;iio de programas
estruturadores para o setor, incluindo a
moderniza<;;iio tecnológica, a melhoria da qualidade
e da produtividade dos servi<;;os e a reorganiza<;;iio
das fun<;;óes do setor público e da iniciativa privada
na presta<;;ao dos servi<;;os de transporte público
urbano, se faz tao necessária quanto nos setores
da saúde, educa<;;iio, saneamento e habita<;;iio".49
O que nao toma menos importante a atua<;;iio dos
Estados e municipios na concretiza<;;iio dos servi<;;os
públicos, nos termos dos principios estabelecidos
constitucionalmente, tais como o da prote<;;iio ao
meio ambiente e o da dignidade humana.
Segundo Marcos Juruena V. Souto, tal
atividade regulatória, para que seja realizada de
forma ótima, deverá propor regras objetivas sobre
os meios adequados, a elimina<;;iio da concorrencia
desleal modal, a coordena<;;iio e o planejamento,
a eficiencia na presta<;;iio, a preocupa<;;iio com
os portadores de deficiencia, a fiscaliza<;;iio pelo
Poder Público, a aten<;;iio ao usuário, a realiza<;;iio
de cálculos tarifários e o respectivo controle
das tarifas, além da promo<;;iio da seguran<;;a
(mediante, por exemplo, a verifica<;;iio perene da
atualidade da frota).SO Um modelo institucional
ótimo de regula<;;iio jurídica das atividades de
transporte urbano a partir da considera<;;ao de sua
potencial aglutina<;;ao metropolitana certamente
que implicará a existencia de urna intera<;;iio
construtiva entre os diferentes agentes públicos
49
LIMA, leda Maria de Oliveira. A crise do
transporte urbano: o que o governo federal tema ver com isso.
Op. cit., p. 38.
50
SOUTO,
Marcos
Juruena
Villela.
Desestatiza!;aO ... Op. cit., p. 305.
-85DR © 2014. Asociación Internacional de Derecho Administrativo
Esta revista forma parte del acervo de la Biblioteca Jurídica Virtual del Instituto de Investigaciones Jurídicas de la UNAM
www.juridicas.unam.mx
http://biblio.juridicas.unam.mx
AlOA -
ÜPERA
PRIMA DE
DERECHO
ADMINISTRATivo - Oeus No. 15
e privados (o que nao é tarefa fácil), bem como
exige a atuao;ao governamental prioritariamente
preventiva a fim de garantir a qualidade de vida
dos individuos. Assuntos em geral dissociados,
o desenvolvimento social, a habitao;ao, a defesa
do meio ambiente, devem ser relevados no
planejamento do transporte coletivo (e também no
rodoviário).
Todos estes indicativos que precisam ser
considerados pelos Poderes Públicos implicam, a
identificao;ao de cinco orientao;oes fundamentais
para o transporte coletivo urbano contidas no
ordenamento positivo brasileiro: prioridade ao
transporte público, limitao;ao do acesso e uso
do automovel nos centros urbanos, privilégio de
acesso a ciclistas e pedestres, gestao unificada
do transporte entre as entidades federativas, e
coparticipao;ao entre o setor público e privado
na execuo;ao de tais servio;os públicos.Sl Estas
orientac;oes nao podem ser destinadas somente aos
municipios e sima todas as entidades federativas,
bem como aos seus respectivos parceiros privados.
4 REFERENCIAS
ALFONSO, Luciano Parejo. Eficacia y
administración - trés estúdios. Madrid: Instituto
Nacional de Administración Pública, 1995.
BACELLAR FILHO, Romeu Felipe. As
concessoes, permissoes e autorizao;oes de servio;o
público. In: CARDOSO, José Eduardo Martins et al.
(Org). Curso de Direito Administrativo Económico.
Sao Paulo: Malheiros, 2006.
51
LIMA, Iéda Maria de Oliveira. A crise do
transporte urbano: o que o governo federal tema ver com isso.
Op. cit., p. 40.
-86DR © 2014. Asociación Internacional de Derecho Administrativo
Esta revista forma parte del acervo de la Biblioteca Jurídica Virtual del Instituto de Investigaciones Jurídicas de la UNAM
www.juridicas.unam.mx
http://biblio.juridicas.unam.mx
BACELLAR FILHO, Romeu Felipe. O poder
normativo dos entes reguladores e a participa.;iio
dos cidadiios nesta atividade. Servi.;os públicos e
direitos fundamentais: os desafios da regula.;iio
na experiencia brasileira. AeDP- Actualidad em el
Derecho Público. Buenos Aires: Ad-Hoc, no 18/20,
2002.
BACELLAR FILHO, Romeu Felipe. Reflexóes
sobre Direito Administrativo. Belo Horizonte:
Fórum, 2009.
BARAT, Josef. Logística, transporte e
desenvolvimento económico: a visa.o institucional.
Sao Paulo: Cla, v. II, 2007.
COSTA, Paolo Henrique Spilotros. O principio
da eficiencia e a competitividade nos servi.;os
públicos de transporte coletivo. In: SOUTO, Marcos
Juruena Villela e MARSCHALL. Carla C. Direito
Empresarial Público. Rio de Janeiro: Lumen Juris,
2002.
DALLAR!, AdilsonAbreu. Tarifaremuneratória
dos servi.;os concedidos. In: TORRES, Heleno
Taveira (Coord.). Servi.;os públicos e Direito
tributário. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005.
GABARDO, Emerson. lnteresse Público e
Subsidiariedade: o Estado e a sociedade civil para
alem do bem e do mal. Belo Horizonte: Fórum,
2009.
GABARDO, Emerson. Principio constitucional
da eficiencia administrativa. Sao Paulo: Dialetica,
2002.
GOLFFI, Ana Maria e SCARTEZZINI, Flaquer.
O principio da continuidade do servi.;o público.
Sao Paulo: Malheiros, 2006.
GRAU, Eros Roberto. A ordem económica
na Constitui.;iio de 1988. 13. ed., Sao Paulo:
Malheiros, 2008.
-87DR © 2014. Asociación Internacional de Derecho Administrativo
Esta revista forma parte del acervo de la Biblioteca Jurídica Virtual del Instituto de Investigaciones Jurídicas de la UNAM
www.juridicas.unam.mx
http://biblio.juridicas.unam.mx
AIDA- ÜPERA PRIMA DE DERECHO ADMINISTRATivo -
OPus No. 15
Daniel
Wunder.
Principio
HACHEM,
constitucional da supremacía do interesse publico.
Belo Horizonte: Fórum, 2011.
JANIN, Jean Fran<;ois. Os sistemas de
transportes coletivos. In: PERROT, Jean-Yves
e CHATELUS, Gautier (Orgs.). Financiamento
de infraestruturas e dos services coletivos: o
recurso a parceria púbico-privado. Os exemplos
da experiencia francesa no mundo. Tradu<;aD de
Nadia Dalla Déa. Paris: Ministere de requipement,
des transports et du logement - Direction des
affaires économiques et internationals, 1997.
JUSTEN FILHO, Mar<;al. O direito das
agencias reguladoras independentes. Sao Paulo:
Dialetica, 2002.
JUSTEN FILHO, Mar<;al. Teoria geral das
concessóes de servi<;o público. Sao Pauto: Dialética,
2003.
JUSTEN, Monica Spezia. A no<;ao de servi<;o
público no Direito Europeu. Sao Paulo: Dialética,
2003.
LIMA, leda Maria de Olivera. A crise do
transporte urbano: o que o governo federal tem a
ver com isso. In: Revista dos Transportes Públicos.
Sao Paulo: ANP, no 81, ano 21, 1998.
MELLO, Celso Antonio Bandeira de. Eficacia
das normas constitucionais e direitos sociais. Sao
Paulo: Malheiros, 2009.
MONCADA, Luis Cabra! de. A subsidiariedade
nas rela<;óes do Estado com a economia e a revisao
constitucional. In: MIRANDA, Jorge. (Coord.).
Estudos em homenagem ao prof. Doutor Joaquim
Moreira da Silva Cunha. Lisboa: Faculdade de
Direito da Universidade de Lisboa, 2005.
MOREIRA, Joao Batista Gomes. Direito
Administrativo: da rigidez autoritária a fiexibilidade
democratica. Belo Horizonte: Fórum, 2005.
-88DR © 2014. Asociación Internacional de Derecho Administrativo
Esta revista forma parte del acervo de la Biblioteca Jurídica Virtual del Instituto de Investigaciones Jurídicas de la UNAM
www.juridicas.unam.mx
http://biblio.juridicas.unam.mx
OLIVEIRA, Gustavo Henrique Justino de.
Contrato de gestao. Sao Paulo: RT, 2008.
PEREIRA, Cesar A. Guimaraes. Usuarios de
servio;os públicos: usuários, consumidores e os
aspectos económicos dos servio;os públicos. Sao
Paulo: Saraiva, 2006.
RODRIGUES, Paulo Roberto Ambrosio.
Introdw;ao aos sistemas de transportes no Brasil
e a logística internacional. 4. ed., Sao Paulo:
Aduaneiras, 2008.
RODRIGUES, Paulo Roberto Ambrósio.
Introduo;ao aos sistemas de transportes no Brasil
e a logística internacional. 4. ed., Sao Paulo:
Aduaneiras, 2008.
SOUTO,
Marcos
Juruena
Villela.
Desestatiza<;ao:
privatizao;ao,
concess6es,
terceirizao;6es e regulao;ao. 4. ed., Rio de Janeiro:
Lumen Juris, 200 l.
SOUZA, Horácio Augusto Mendes de.
Regulao;:ao jurídica do transporte rodoviário de
passageiros. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2003.
SUNDFELD, Carlos Ari. Fundamentos de
Direito público. 4. ed., Sao Paulo: Malheiros, 2002.
VALLE, Vivian Cristina Lima López. O novo
conceito de servio;o público. In: GUIMARAES,
Edgar (Coord.). Cenários do Direito Administrativo:
estudos em homenagem ao professor Romeu Felipe
Bacellar Filho. Belo Horizonte: Fórum, 2004.
VASCONCELLOS, Eduardo A. Desvendando
a política brasileira da mobilidade urbana. In:
Revista dos Transportes Públicos. Sao Paulo: ANP,
n" 108, ano 28, IV Trimestre, 2005.
VASCONCELLOS, Eduardo A. Transporte
urbano nos países em desenvolvimento: refiex6es
e propostas. 3. ed., Sao Paulo: Annablume, 2000.
ZANCANER, Weida. Limites e confrontao;6es
entre o público e o privado. In: BACELLAR FILHO,
-89DR © 2014. Asociación Internacional de Derecho Administrativo
Esta revista forma parte del acervo de la Biblioteca Jurídica Virtual del Instituto de Investigaciones Jurídicas de la UNAM
www.juridicas.unam.mx
http://biblio.juridicas.unam.mx
AlOA - OPERA PRIMA DE DERECHO ADMINISTRATIVO - OPus
No. 15
Romeu Felipe (Coord.). Direito Administrativo
Contemporii.neo. Belo Horizonte: Fórum, 2004.
-90DR © 2014. Asociación Internacional de Derecho Administrativo
Download

O SERVIQO PÚBLICO DE TRANSPORTE COLETIVO URBANO NO