III Congresso Consad de Gestão Pública
SISTEMA DE AVALIAÇÃO: PROGRAMA DE
QUALIFICAÇÃO PROFISSIONAL DO ESTADO DE
SÃO PAULO
Ana Lavos
Isabel da Costa M. Nabuco de Araújo
José Lucas Cordeiro
Painel 42/166
Sistema de avaliação das políticas de inserção no mercado de trabalho:
resultados e opções metodológicas
SISTEMA DE AVALIAÇÃO: PROGRAMA DE QUALIFICAÇÃO PROFISSIONAL DO
ESTADO DE SÃO PAULO
Ana Lavos
Isabel da Costa M. Nabuco de Araújo
José Lucas Cordeiro
RESUMO
Este artigo apresenta os resultados de duas pesquisas realizadas pela Fundap, por
solicitação da Secretaria do Emprego e Relações do Trabalho, junto aos egressos
dos cursos de qualificação profissional do Programa Estadual de Qualificação
Profissional (PEQ). Uma das pesquisas, de caráter quantitativo, foi realizada junto
aos egressos dos cursos de 2008; outra pesquisa, de caráter qualitativo, entrevistou
trabalhadores com contrato suspenso – modalidade com amparo na Consolidação
das Leis do Trabalho (CLT) – de uma usina do setor sucroalcooleiro do noroeste
paulista. Ambas guardam objetivos comuns, quais sejam: avaliar o programa
estadual de qualificação profissional pela ótica dos alunos, abarcando aspectos
relativos ao processo de aprendizagem e colocação no mercado de trabalho. Os
resultados da pesquisa com os egressos dos cursos, realizados em 2008,apontam
resultados importantes logrados pela política tanto em relação à satisfação dos
trabalhadores com o Programa, quanto expresso pelos níveis de inserção no
mercado de trabalho. A pesquisa com os trabalhadores, com contrato suspenso,
indica acertos e dificuldades dessa intervenção.
SUMÁRIO
PARTE I – PROGRAMA ESTADUAL DE QUALIFICAÇÃO: DINAMIZAÇÃO
BIOGRÁFICA E INSERÇÃO NO MERCADO DE TRABALHO.................................. 03
Introdução.................................................................................................................. 03
Metodologia................................................................................................................ 05
Quem são os alunos do PEQ?................................................................................... 06
Avaliação do Programa pelos alunos......................................................................... 08
Avaliação do módulo de conhecimentos gerais......................................................... 10
Avaliação do módulo de conhecimentos específicos................................................. 14
Transformações nas trajetórias pessoais dos alunos................................................ 16
O Programa Estadual de Qualificação e a obtenção de emprego............................. 17
Ganhos de autonomia................................................................................................ 20
Projetos sociais e ou de distribuição de renda........................................................... 21
Convívio social e familiar............................................................................................ 21
A retomada dos estudos formais e ou de qualificação profissional........................... 22
Sugestões ao PEQ..................................................................................................... 23
Considerações finais.................................................................................................. 24
PARTE II – PESQUISA DE AVALIAÇÃO DA INTERVENÇÃO DA SERT JUNTO
AO SETOR SUCROALCOOLEIRO POR MEIO DA QUALIFICAÇÃO
PROFISSIONAL DE TRABALHADORES EM PROCESSO DE LAY-OFF................ 27
O processo de lay-off na perspectiva da gerência da Usina...................................... 28
Caracterização dos trabalhadores do corte da cana..................................................28
A percepção dos trabalhadores sobre o processo de lay-off..................................... 30
Referências................................................................................................................ 32
3
PARTE I – PROGRAMA ESTADUAL DE QUALIFICAÇÃO: DINAMIZAÇÃO
BIOGRÁFICA E INSERÇÃO NO MERCADO DE TRABALHO
Introdução
Este artigo tem como objetivo apresentar o resultado de pesquisas
realizadas, pela Fundação do Desenvolvimento Administrativo – FUNDAP, junto aos
alunos participantes do Programa Estadual de Qualificação (PEQ), política pública
da Secretaria do Emprego e Relações do Trabalho do estado de São Paulo,
concebida em 1994 e reformulada a partir do ano de 20071.
O Programa Estadual de Qualificação Profissional, coordenado pela
SERT, tem o objetivo de promover cursos de qualificação profissional de nível
básico para a população do estado de São Paulo em situação de desemprego e de
vulnerabilidade social. São cursos que pretendem, para além da inserção no
mercado de trabalho, contribuir para uma formação integral do trabalhador.
Além do PEQ regular, cujos alunos são trabalhadores desempregados
oriundos do banco de dados do sistema público de intermediação de mão-de-obra,
no caso do estado de São Paulo, outras intervenções pontuais são desenvolvidas
com o objetivo de atender demandas específicas de setores da economia que se
encontram em crise e ou com falta de trabalhadores qualificados para o
preenchimento de postos de trabalho.
Nestas situações particulares, foi firmada, em 2009, parceria entre a
SERT e uma usina do setor sucroalcooleiro no Noroeste Paulista, com o objetivo de
promover a qualificação profissional de trabalhadores em vias de perder o emprego
devido à mecanização das lavouras e que tiveram seus contratos suspensos no
modelo lay off2.
1
Sobre essa reformulação ver texto apresentado no III Congresso CONSAD: CORDEIRO, Lucas,
ABUD, Bruno e TRIZI, Ivan Amorim. Inovações na gestão do Programa Estadual de Qualificação
Profissional do Estado de São Paulo. In CONSAD, 2009
2
Trata-se da suspensão temporária do contrato de trabalho, prevista pela CLT. O empregado recebe
pelo prazo previsto (no caso, dois meses) parcelas de bolsa-qualificação, com recursos oriundos do
FGTS, e a empresa obriga-se a fornecer qualificação profissional aos funcionários que estiverem com
o contrato suspenso pelo prazo determinado. Os empregos estão garantidos durante determinado
período, garantido no acordo com a participação dos sindicatos das categorias profissionais.
4
Objetivando avaliar as ações de qualificação do PEQ, a SERT
desenvolveu no ano de 2009 duas pesquisas: a primeira que avaliou o impacto do
programa junto aos egressos dos cursos de qualificação profissional implementados
no ano de 20083 e a segunda que trouxe os resultados da parceria com a Usina
Ruette. Ressalta-se que o PEQ prevê a execução de um sistema de
acompanhamento de egressos do Programa de Qualificação Profissional, com a
realização de pesquisas periódicas, de natureza quantitativa e qualitativa4.
Os resultados dessas pesquisas são apresentados na sequência.
3
No ano de 2008 a Sert qualificou aproximadamente 27 mil trabalhadores desempregados.
A concepção desse sistema pode ser conhecida por meio do Artigo “Sistema de Acompanhamento
de Egressos: avaliando a efetividade do Programa de Qualificação Profissional no estado de São
Paulo” apresentado no II CONSAD, de autoria de Lavos, Ana; Silva, Cibele e Venco, Selma.
4
5
Metodologia
Este tópico apresenta o resultado da pesquisa realizada junto aos
egressos dos cursos do PEQ realizados no ano de 2008.5
Ressalta-se que a concepção e o desafio do Programa residem na
superação da oferta de cursos concentrados em saberes técnicos, focalizando,
portanto, fundamentalmente a formação integral dos indivíduos. A opção por esse
desenho pauta-se na compreensão que essa via possibilita aos trabalhadores
ampliar sua capacidade reflexiva, sua participação efetiva na sociedade e, como
veremos, o abandono de sua situação de desalento na busca pelo emprego, bem
como a retomada dos estudos formais.
O planejamento do Programa contemplou um sistema de avaliação de
forma a coadunar diversos aspectos nele envolvidos, bem como e, particularmente,
a perspectiva do próprio educando. Neste contexto, foi delineado um sistema de
acompanhamento de egressos composto por duas pesquisas de caráter
quantitativo6, de forma a lograr principalmente dois objetivos: a avaliação do
Programa em sua amplitude e a (re) inserção no mercado de trabalho formal ou
informal dos alunos.
Contudo, as questões que se inscrevem nesse processo são de solução
complexa. Em primeiro lugar, a definição do intervalo compreendido entre o término
do curso e a aplicação dos questionários. É usual na literatura a indicação da
aplicação de pesquisas após seis meses a partir da conclusão do programa de
qualificação. Todavia, esse período seria longo em demasia para obter índices
precisos sobre a avaliação do curso, sua metodologia, as aulas, entre outros
aspectos que compunham o Programa.
Frente a estas indagações optou-se pela realização de uma pesquisa três
meses após o término do curso, cujo objetivo era identificar a inserção deste
segmento no mercado de trabalho, mas, especialmente, nesse momento, submeter
o Programa à avaliação do seu público-alvo.
5
Foram qualificados aproximadamente 27 mil trabalhadores, em cerca de 170 municípios no Estado
de São Paulo.
6
A primeira realizada em março de 2009, cujos resultados são apresentados nesse artigo e uma
segunda cujo campo será realizado em março de 2010.
6
Nesse sentido, foi elaborada uma amostra7 capaz de contemplar a opinião
de alunos tanto do interior paulista quanto da Região Metropolitana de São Paulo,
com aplicação de um questionário padronizado abordando aspectos do Programa
distribuídos em 4 blocos: caracterização socioeconômica; avaliação do programa
pelos alunos; obtenção de emprego; e benefícios intrínsecos ao PEQ.
Os dados ora apresentados fornecerão um panorama dos cursos8 pela
perspectiva dos alunos, e de sua percepção acerca da qualidade da qualificação
profissional oferecida pelo Estado. A política pública contempla, dessa forma, uma
esfera frequentemente afastada da avaliação sobre a implantação de determinados
programas de cunho público: os próprios cidadãos.
Quem são os alunos do PEQ?
O João de antes era apático, desanimado...
esse curso mexeu com a minha auto-estima, elevou.
(aluno PEQ)
A análise relativa à caracterização socioeconômica dos participantes do
Programa Estadual de Qualificação (PEQ) indica frequência massiva das mulheres: 7
em cada grupo de 10 alunos são do sexo feminino, conforme observa-se no Gráfico 1.
Gráfico 1: Distribuição dos alunos do PEQ por sexo (em %)
7
A pesquisa utilizou uma amostra de 2194 pessoas distribuídas entre Região Metropolitana e interior
de são Paulo.
8
Os cursos do PEQ são realizados pelo SENAI, SENAC e CENTRO PAULA SOUZA. Eles tem, em
média, 200 horas de carga horária, distribuídas entre Conteúdos Gerais (60%) e Conteúdos
Específicos (40%)
7
Se os alunos eram predominantemente mulheres, pouco mais da metade
(55%) tinha idade acima de 30 anos; os quais atendiam às indicações do diagnóstico
socioeconômico elaborado para auxiliar no processo de priorização das vagas.
Gráfico 2: Distribuição dos alunos, por intervalos etários (em %)
Já em relação a formação o público participante do Programa apresentou
escolaridade elevada: cerca de 6 em cada 10 alunos declararam ter ensino médio.
O planejamento inicial do Programa bem como o diagnóstico do público
preferencial a ser atendido pelo PEQ apontaram a premência de priorizar a
população com menor escolaridade. Contudo aqueles com ensino fundamental
completo
ou
incompleto
participaram
em
menor
número
nos
cursos
profissionalizantes: 21%. Tal fato levou a SERT a repensar, a partir de 2009, o
processo de convocação dos candidatos aos cursos de forma a contemplar
efetivamente a população de escolaridade mais baixa.
8
Tabela 1: Distribuição dos alunos PEQ por grau de escolaridade (em %)
Grau de Escolaridade
%
EJA – Alfabetização de Adultos (incompleto)
*
o
a
a
4
o
a
a
*
o
a
a
9
o
a
a
8
1 Grau / Ensino Fundamental – 1 a 4 (completo)
1 Grau / Ensino Fundamental – 1 a 4 (incompleto)
1 Grau / Ensino Fundamental – 5 a 8 (completo)
1 Grau / Ensino Fundamental – 5 a 8 (incompleto)
o
58
o
12
o
3
o
3 Grau / Ensino Superior (incompleto)
6
Pós-Graduação (completo)
*
Pós-Graduação (incompleto)
*
2 Grau / Ensino Médio (completo)
2 Grau / Ensino Médio (incompleto)
3 Grau / Ensino Superior (completo)
Total
100
* valores inferiores a 1%
Demandados sobre as dificuldades que encontram ao preencher uma
ficha de emprego, mais de 7 em cada 10 alunos responderam não encontrar esse
tipo de dificuldade. Tal fato pode ser analisado devido a própria ação do curso, ou
seja, a provisão de módulo específico sobre ‘como se preparar para o mercado de
trabalho’, associado às atividades de interpretação e elaboração de texto, podem ter
contribuído para esse resultado.
Avaliação do Programa pelos alunos
Eu fiquei mais crítico em relação à capacidade do Estado
em oferecer um trabalho sério, em melhorar as condições
de trabalho e dos direitos constitucionais
(aluno PEQ)
Os cursos do Programa Estadual de Qualificação são compostos de duas
etapas que podem, preferencialmente, serem trabalhadas de forma articulada: uma
delas, voltada aos conhecimentos gerais e outra, aos conhecimentos específicos
relativos ao estudo dos elementos da profissão em questão.
9
Durante o acompanhamento do curso, já se notava, pelos relatos de
alunos, monitores e supervisores, uma demanda dos participantes por uma maior
concentração nos conhecimentos específicos. É importante salientar que o objetivo
das aulas de conhecimentos gerais no curso diz respeito à metodologia de ensino
concebida pelo programa, buscando uma formação integral desse segmento da
população que, em geral, vivenciou processos superficiais ou, muitas vezes,
inexistentes de escolarização formal. Nessa concepção, o aluno adulto, é
compreendido como um sujeito portador de saberes acumulados nas trajetórias
pessoais e profissionais e traz uma gama de expectativas de aprendizado que seja
capaz de (re) inseri-lo no mercado de trabalho. Reconhece-se, a premência desse
público por saber pragmático em relação aos cursos, no sentido de dominarem
especificamente os aspectos relativos à profissão. Contudo, a perspectiva, como já
salientada, é aportar conhecimentos que o fortaleçam na busca de emprego e ou
geração de renda, aspectos esses que, certamente, eles não terão consciência
imediata do processo.
A partir dessas ponderações, considera-se que a pesquisa apresenta
dados inesperados. A pesquisa revelou que os alunos concluintes do curso
aceitaram a proposta que fortalece os conteúdos gerais e os avaliaram de forma
extremamente positiva. Os índices de avaliação foram elevados em relação às aulas
de
conhecimentos gerais,
aos
monitores
deste
módulo e
aos materiais
desenvolvidos nestas aulas (apostilas e vídeos) logrando percentuais próximos à
totalidade, ou seja, 95%. Uma das hipóteses que podem ser aventadas e que podem
elucidar tais índices de satisfação com o módulo, reside na qualidade do material
produzido, tanto do ponto de vista de conteúdo, quanto do ponto de vista editorial,
pouco usual nos cursos de qualificação profissional básica e gratuita. De fato, os
vídeos e os cadernos, que tratam de temas como a compreensão acerca do mundo
do trabalho, do exercício da cidadania, além do estudo de temáticas de
comunicação e raciocínio lógico, foram produzidos de maneira lúdica e buscando a
identificação e a participação dos alunos.
10
Avaliação do módulo de conhecimentos gerais
Como é destacado no Gráfico 3, o módulo de conhecimentos gerais foi
bem avaliado pelos cursistas: 53% dos egressos consideraram o módulo muito bom
e 42% o consideraram bom, totalizando uma avaliação positiva por parte de 95%
dos egressos entrevistados.
Gráfico 3: Avaliação dos alunos do PEQ sobre a modalidade de conhecimentos
gerais (em %)
Considerando o agrupamento entre as opiniões dos alunos que
consideraram as aulas de conhecimentos gerais muito boas e boas, tem-se que 1/3
indicou que estas auxiliam na preparação para o mercado de trabalho, por meio de
simulações de entrevistas e de elaboração do currículo; 16% atribuíram sua opinião
à aquisição de conhecimentos gerais; e, na mesma proporção, ou seja, 15% por
propiciar a lembrança de conhecimentos anteriormente adquiridos.
A qualidade das aulas, especialmente as de matemática, língua
portuguesa, informática e cidadania, foi lembrada por 14% dos alunos, conforme
pode ser observado na Tabela 2.
11
Tabela 2: Distribuição dos alunos PEQ, segundo os motivos que os
fizeram avaliar de forma positiva o módulo de conhecimentos gerais
(em%)
Motivação para as Avaliações Positivas
%
Preparação para o mercado de trabalho
31
Aquisição de novos conhecimentos
16
Relembrar conhecimentos adquiridos
15
Aulas de matemática, informática e português
14
Incentivo para mudar de postura
5
Outros motivos
19
Total
100
Estas respostas reiteram o delineamento do Programa que valoriza a
construção
dos
conhecimentos
gerais
como
complemento da
qualificação
profissional básica para adultos. A modalidade possibilita uma leitura reflexiva da
realidade, permitindo que os cidadãos se tornem melhor preparados para o mundo
do trabalho.
Além disso, é importante destacar que 14% dos egressos entrevistados
sentiram sua rede de relacionamentos ampliada por meio do curso, o que é um dado
positivo do ponto de vista não apenas da expansão das relações de sociabilidade,
mas também no sentido das possibilidades de atuação cidadã e profissional a partir
da ampliação dos grupos sociais.
Dentre os egressos que avaliaram o módulo de conhecimentos gerais de
forma neutra ou negativa (nem bom nem ruim, ruim e muito ruim) e que perfazem
5% do total, as principais críticas foram em relação à aquisição de conhecimentos,
esta foi aquém do esperado (25%); baixa qualidade dos monitores (25%),
insuficiente preparação para o mercado de trabalho (13%). As aulas de matemática
e português também foram alvo de crítica entre 13% desses alunos.
Tal constatação aporta elementos importantes para o delineamento do
Programa para 2009 e 2010, cuja nova ênfase deve ser dada à formação dos
professores, os quais, em algumas situações não estão devidamente preparados
para ministrar conteúdos distantes de sua formação original. Nesse sentido, há de
se verificar, por um lado, junto às executoras novas estratégias metodológicas a fim
de contornar tais problemas e, por outro, praticar uma nova proposta de capacitação
dos professores, visando suprir determinadas lacunas.
12
Uma vez demandados a avaliarem o material didático dos conhecimentos
gerais, produzidos pela SERT, em colaboração com a FUNDAP e Fundação Padre
Anchieta, praticamente a totalidade dos egressos (98%) o considerou muito bom ou
bom, como se observa no Gráfico 4.
31
67
1
Muito boa
Boa
Nem boa nem ruim
1
Ruim
Gráfico 4: Avaliação do material de conhecimentos gerais (em%)
Como mencionado anteriormente, este dado vem ao encontro dos dados
coletados de forma qualitativa, os quais já indicavam satisfação e, mesmo
admiração, em relação ao material recebido exaltando com frequência sua
qualidade.
É
necessário
adicionar a
informação
que
tal expressão
era,
invariavelmente, acompanhada de observações vinculadas ao fato do material ser
ofertado pelo poder público, o que sugere que, para os participantes do curso, a
imagem das políticas públicas, seja via educação, saúde entre outras, são atreladas
à baixa qualidade dos serviços.
A análise do material didático destinado à formação dos conhecimentos
gerais foi aspecto central da presente pesquisa, tendo em vista a importância em
avaliar sua adequação e abrangência em relação aos alunos. Tal ponderação
permite desdobramentos qualitativos para os próximos anos do Programa, sendo
possível realizar uma revisão dos conteúdos anteriormente propostos. O referido
material é composto de 4 livros didáticos (compostos por onze temas, a saber:
cidadania, história do trabalho, como se preparar para o mercado de trabalho,
13
relações de cooperação e de competição no ambiente do trabalho, resolução de
problemas, matemática, informação, comunicação, trabalho por conta própria,
informática e aprendendo a aprender), 14 pequenos filmes com enredos de ficção
relacionados aos mesmos temas acima arrolados e, ainda um vídeo-jogo, que
permite a interatividade junto aos participantes.
Solicitados a dar uma nota ao material de 0 a 5, sendo zero a pior
avaliação e 5 a maior, apreende-se que 8 em cada 10 pessoas atribuíram nota
máxima aos livros.
Somadas as maiores notas, quais sejam 4 e 5, estas abrangem
praticamente a totalidade: 97% dos alunos egressos. O número de egressos que
deu notas 1 e 2 foi residual.
19
78
3
Nota 5
Nota 4
Nota 3
Gráfico 5: Atribuição de notas ao material didático de conhecimentos
gerais (em %)
Os 14 vídeos, citados acima, relacionados aos temas de conhecimentos
gerais trabalhados no Programa, apresentam situações vivenciadas por um
protagonista: um jovem em busca de emprego. O escopo é questionar a dinâmica do
mundo do trabalho e perceber, por exemplo, os saberes relacionados ao exercício
das profissões, ou o caráter processual das conquistas dos direitos da cidadania.
A proposta do Programa é que estes vídeos sejam trabalhados em
conjunto aos temas dos livros, introduzindo as questões e envolvendo os alunos
para a participação nos exercícios.
14
Notou-se durante o acompanhamento qualitativo dos cursos um
significativo entusiasmo dos cursistas, que se identificam com o personagem e são
atraídos pelas histórias.
A avaliação quantitativa dos vídeos foi, igualmente, bastante positiva por
parte dos egressos: 79% deram a nota máxima para este material (5) e o percentual
para a nota 3 (regular) foi de apenas 3%. O percentual de egressos que atribuiu
notas 1 e 2 aos vídeos foi residual.
3
79
18
Nota 3
Nota 4
Nota 5
Gráfico 6: Notas atribuídas aos vídeos (em %)
Avaliação do módulo de conhecimentos específicos
O módulo de conhecimentos específicos foi também bem avaliado pelos
egressos: 91% consideraram os conteúdos abordados como muito bons ou bons.
60
50
52
40
39
30
20
6
10
2
1
0
Muito boa
Boa
Nem boa
nem ruim
Ruim
Gráfico 7: Avaliação dos cursos
conhecimentos específicos (em %)
na
Muito ruim
modalidade
de
15
Entre os 52% que consideraram essa modalidade do curso muito boa,
62% valorizaram especificamente as aprendizagens práticas associadas ao estudo
da profissão; 14% as informações que receberam sobre postura no ambiente de
trabalho; e outros 10% referiram-se a subsídios que ampliaram o seu repertório
comunicacional de uma maneira geral.
Tabela 3: Distribuição dos alunos PEQ, segundo as motivações que nortearam a avaliação da
modalidade de conhecimentos específicos (em%)
Muito
Nem boa
Muito
Categorias
Boa
Ruim
boa
nem ruim
ruim
Aprendizagem
de
conhecimentos
específicos (parte técnica / prática do
62
58
60
42
38
curso)
Aprendizagem de postura no trabalho
14
16
3
0
6
(horário, ética, elaboração de CV)
Método do curso (dinâmicas, teatro,
7
6
2
10
0
atividades extracurriculares)
Pouco tempo de duração (pouca carga
0
1
12
15
6
horária)
Professor/monitor
1
1
0
2
6
Comunicação com pessoas
10
11
12
5
19
2
4
0
0
0
1
1
2
10
6
Infraestrutura
0
0
2
2
6
Apostila (qualidade, atraso na entrega etc.)
0
0
4
12
13
Outros
3
2
3
2
0
Total
100
100
100
100
100
Aprendizagem de como trabalhar por
conta própria
Recursos das aulas práticas (laboratórios,
equipamentos)
As apostilas de conhecimentos específicos foram bem avaliadas pelos
egressos do PEQ: 95% dos cursistas as consideraram muito boas e boas. O
percentual de egressos que deram conceito ruim às apostilas foi de 2% e o
percentual de avaliações muito ruins foi estatisticamente residual.
16
42
53
2
Muito boa
Boa
Nem boa nem ruim
3
Ruim
Gráfico 8: Avaliação das apostilas de conhecimentos específicos
Os egressos valorizam a apresentação dos conteúdos e clareza na
expressão dos conceitos como razões principais para a valorização das apostilas.
Transformações nas trajetórias pessoais dos alunos
Os alunos concluintes do PEQ foram também solicitados a responder sobre
quais as diferenças entre a pessoa que ele era antes e depois de realizar o curso.
Mais da metade (52%) dos alunos citaram aspectos vinculados ao modo
de ser, como melhorias na comunicação (diminuição da timidez), maior
autoconfiança e melhoria dos relacionamentos pessoais, de um modo geral. Outros
36% apontaram alterações de postura relacionadas à busca pelo emprego e ou a
posse de uma maior gama de informações sobre o mundo do trabalho, tendo sido
citada a ampliação da qualificação e dos conhecimentos em geral e a aquisição de
conhecimentos, especificamente, sobre o mundo do trabalho.
17
O Programa Estadual de Qualificação e a obtenção de emprego
Antes eu não tinha expectativa de nenhum
crescimento profissional por não acreditar em mim
(Aluna PEQ)
Considerando-se que no momento da inscrição para o Programa Estadual
de Qualificação a condição prioritária era estar desempregado, a pesquisa revela um
dado significativo: após três meses da conclusão do Programa – isto é, no momento
da pesquisa – 50% dos egressos estavam trabalhando e cerca de 31% declararam
que o Programa contribuiu diretamente na obtenção de emprego.
50% estavam trabalhando após 3 meses de curso;
31% consideram que o Programa contribuiu diretamente para isso.
Observa-se que a inserção dos homens no mercado de trabalho foi mais
expressiva do que a das mulheres: 6 em cada 10 homens obtiveram um posto de
trabalho ou geraram renda mais rapidamente que as pessoas do sexo feminino.
Os jovens entre 16 e 24 anos se inseriram no mercado na ordem de 26%.
Já aqueles com idades entre 30 e 59 anos, público prioritário do programa, tiveram
um percentual de inserção de 57% conforme Tabela 29.
Gráfico 9: Inserção no mercado de trabalho pós-PEQ, por intervalos etários (em %)
Os cursos na área da indústria foram mais contributivos, aparentemente,
para que o participante viesse a conseguir um emprego, já que nesta área as
respostas afirmativas chegaram a 56%, enquanto os na do comércio e serviços
ficaram ao redor de 48%.
18
Praticamente metade dos formandos que não estavam trabalhando no
momento da pesquisa (49,6%), quase 80% não o faziam por não haver conseguido
emprego e estava procurando obtê-lo. Os demais não estavam procurando em
função de motivos diversos, sendo o principal deles a existência de questões
pessoais impeditivas, tais como doenças ou a realização de outras atividades.
Tabela 4: Razões por não estar trabalhando (em %)
Razões
%
Estou procurando emprego
78
Desisti de procurar, porque não encontrava vaga/não tenho
escolaridade
2
Recebo benefícios (aposentadoria, bolsa-família)
1
Não preciso trabalhar
1
Não posso trabalhar no momento (doente, tem outra atividade)
6
Outro motivo
12
Total
100
A qualificação constituiu condição suficiente e necessária para a obtenção
de emprego, na mesma área do curso, para 23% dos participantes, ou 46% das
pessoas trabalhando no momento da pesquisa.
Ou seja, o Programa logrou efetividade plena para cerca de 1/4 da
população beneficiada, cuja obtenção de empregos está diretamente relacionada
com a formação obtida. O programa também apresenta resultados eficazes, embora
indiretos ou parciais, para 3/4 da população, em termos de aproveitamento de seus
conteúdos em outras atividades laborais que não as diretamente relacionadas à
formação proporcionada.
Se por um lado a formação contribuiu diretamente para a obtenção de
emprego de 1/3, dos concluintes, por outro, ela também foi altamente eficiente ao
proporcionar motivação para a procura do emprego a praticamente todos os
formandos. Considerando que a população atingida apresenta expressivo grau de
desemprego por desalento, ou seja, pessoas que já haviam desistido de buscar
19
emprego seja por considerarem que suas qualificações não atendem mais ao
mercado de trabalho, ou pela faixa etária entre outras razões, o Programa, enquanto
política pública, logrou êxito com praticamente a totalidade dos participantes.
Outro aspecto que reafirma os propósitos iniciais dessa política pública de
formação é a constatação de que a totalidade dos formandos considerou que a
qualificação contribuiu para aumentar a autoconfiança em relação à procura de um
emprego, com os índices de respostas oscilando entre 97 e 98% em todas as
situações – sejam as regiões, sejam as áreas da formação ou em ambas.
Quanto a forma de inserção no mercado de trabalho, perto de 6 pessoas
de cada 10 que estavam trabalhando o faziam de modo informal, à margem dos
benefícios legais segundo a legislação que regula as relações de trabalho –
condição esta que beneficiava menos de 4 pessoas no mesmo grupo de 10.
Este quadro mostra um grau de precariedade do trabalho ainda
superior às estimativas nacionais largamente utilizadas que apontam número
superior a 4 pessoas protegidas pela legislação trabalhista em cada grupo de 10
trabalhadores (IBGE).
Tabela 5: Vínculo empregatício, pós-PEQ (em %)
Vínculo empregatício
%
Emprego com carteira assinada
36
Trabalhador por conta própria para a população em
geral
Empregado assalariado sem carteira assinada
25
Trabalhador por conta própria para empresa
6
Empregado doméstico sem carteira assinada
5
Outro
4
Empregado do setor público
1
Empregado doméstico com carteira assinada
1
Total
22
100
Entre os que estavam trabalhando no momento de realização da pesquisa
36% declararam receber salários maiores do que os que percebiam em seus últimos
empregos; pouco mais de 1/3 recebia remuneração equivalente à anterior e 29%
ganhavam menos.
20
Ganhos de autonomia
Alguns aspectos pesquisados indicam um ganho de autonomia da
população participante dos cursos: 9 a cada 10 pessoas consideraram que o
Programa de qualificação profissional contribuiu para que alcançassem uma
situação de se sentirem aptos a, sozinhos, elaborarem seus próprios currículos.
Ainda no que diz respeito aos ganhos de autonomia na preparação para a
busca de um emprego, apreendeu-se a aquisição de um grau adicional de confiança
em razão da qualificação obtida, presente também na eventual prontidão para a
participação em entrevistas de recrutamento e seleção, na mesma medida.
Assim, também a quase totalidade das pessoas, 98%, se consideraram
melhor preparadas para uma entrevista de emprego. Esta taxa apresentou variações
pouco expressivas em função de regiões geográficas ou áreas de formação.
O Programa alcançou resultados também próximos a 100% na
construção dos conhecimentos referentes aos direitos da cidadania. A taxa de
respostas afirmativas para essa avaliação foi de 97%, percentual que esteve um
pouco abaixo deste patamar apenas na formação levada a efeito no interior, na área
da indústria, onde registrou 95% de respostas positivas, diferença estatisticamente
irrelevante.
Se o Programa contribui para a ampliação da compreensão da dimensão
cidadã entre os alunos, não os motivou a participar de forma organizada na
sociedade civil. Apenas 1/3 dos participantes respondeu afirmativamente à questão
sobre o efeito do curso em provocar motivação para a participação de cunho
associativo em instituições e entidades não-governamentais.
Há de se ponderar, no entanto, que o grau de associativismo no país é
reconhecidamente baixo. Assim, índices desta natureza indicam a necessidade de
estudos bastante específicos para que se possa aferir de forma mais lúcida
quaisquer resultados em torno deste fenômeno.
21
Projetos sociais e ou de distribuição de renda
O objetivo de motivar as pessoas a buscarem outros programas ou
projetos sociais públicos se mostrou realidade para 8 em cada 10 alunos, após a
realização do curso.
Quando se observam os dados por região, verifica-se que os números no
interior são menores face aos da região metropolitana, onde, supostamente, existem
mais programas, maior divulgação e, supostamente, maior interesse e ou
necessidade de informação em relação aos mesmos em virtude de ser mais elevada
a concorrência por empregos.
Outra hipótese é que os programas sociais são destinados a pessoas
com baixa renda per capita, fator que pode ter sido alterado, de alguma maneira,
com a conclusão do Programa de Qualificação.
Na região metropolitana o interesse por outros programas foi manifestado
por 92% dos egressos, caindo para 80% no interior.
Convívio social e familiar
As situações de desemprego, particularmente os de ampla duração, são,
quase que invariavelmente, acompanhadas de desorganização familiar, incidência de
alcoolismo etc. Nesse sentido, buscou-se na pesquisa abordar se ações que
recuperem o estímulo à busca ao trabalho vieram, ou não, a interferir nesses aspectos
da vida dos participantes. A constatação é que em cada quatro pessoas, três
consideraram que a formação propiciou um movimento de aproximação em relação
aos familiares ou proporcionou elementos ou situações que favoreceram tal fato.
Na mesma perspectiva, as pessoas, numa proporção elevada, de 80%,
julgaram que a partir da formação recebida passaram a estabelecer relacionamentos
interpessoais extra-familiares de melhor qualidade.
São resultados que em certa medida consagram a oportunidade da
inserção de conteúdos voltados às relações humanas no Programa oferecido – seja
no âmbito familiar como no dos círculos de relações de vizinhança ou outros nãofamiliares – à medida que retratam mudanças efetivamente percebidas de postura e
ou informação a partir dos conteúdos apropriados pelos participantes.
22
Considerando que tanto as relações familiares como as de vizinhança,
são fenômenos que envolvem conceitos e comportamentos que pressupõem
subjetividade em graus variados, estudos sobre relacionamentos devem ser muito
específicos e especializados para a obtenção de resultados melhor qualificáveis ou
mesmo quantificáveis.
A retomada dos estudos formais e ou de qualificação profissional
Segundo parte dos entrevistados (43%), participar do Programa teve o
efeito de contribuir para a retomada, ou para que se estabelecesse a intenção de
retomada, da escolarização formal.
Gráfico 10: Intenção em retomada dos estudos formais (em %)
Este é um fenômeno que é mais acentuado entre participantes da região
metropolitana que entre os do interior; assim como está mais presente entre os que
participaram da formação voltada à área de comércio e serviços do que entre os
participaram da formação na área industrial, o que pode ser conseqüência tanto das
demandas efetivas de ambas as áreas como das demandas pressupostas pelos
interessados ou, ainda, estar associado ao perfil dos participantes em cada área.
Na região metropolitana 58% dos participantes da formação em comércio
e serviços apontaram o interesse ou a iniciativa de retomar os estudos, diante de
51% entre os entrevistados que fizeram cursos da área da indústria. No caso dos
participantes do interior, as porcentagens foram 41% na área de comércio e serviços
e 28% na da indústria, índice bastante defasado dos demais.
23
Sugestões ao PEQ
Eu fiquei mais responsável, eu era ignorante antes.
Agora eu sinto e discuto o assunto coloco ponto final no assunto
(aluno PEQ)
Ouvidos a respeito de sugestões sobre como melhorar o programa de
qualificação, os participantes apontaram como principais itens aumentar a carga
horária ou duração do curso, bem como aumentar a quantidade de aulas práticas
diminuindo a dos conhecimentos gerais. Ambas as sugestões obtiveram
praticamente o mesmo percentual de citações, bem distante das demais.
Como as segundas sugestões mais propostas, já num patamar de
frequência de citações bem inferiores, foram apontadas: a diversificação de cursos
oferecidos e a melhoraria da estrutura, organização e locais dos cursos, ambas com
pontuações muito próximas uma da outra.
Uma terceira sugestão foi a de encaminhamento dos participantes para
empregos ou estágios.
Tabela 6: Distribuição dos egressos do PEQ, segundo principais sugestões para
aperfeiçoamento do Programa (em %)
Sugestões
%
Aumentar carga horária/duração do curso
23
Aumentar tempo das aulas práticas, diminuir o tempo das aulas
21
Diversificar opções de curso
9
Melhorar estrutura e/ou organização e/ou local do curso
9
Encaminhar para trabalho/empregou ou estágio
6
Diversificar opções de horário
4
Melhorar "método de passe" e/ou melhorar o lanche
3
Melhorar e/ou motivar professores
3
Organizar cursos por idade e/ou por conhecimentos/nível ed.
3
Diminuir carga horária do curso e/ou de apostilas e vídeos
1
*Respostas múltiplas
24
Considerações finais
Estou mais confiante por ter aprendido mais uma nova profissão
(aluno PEQ)
Os resultados obtidos quantificam e confirmam, com segurança
estatística, percepções apreendidas ao longo do processo, observadas por meio de
entrevistas realizadas pela equipe de supervisão, junto aos alunos e professores
durante o Programa, quais sejam: enorme satisfação em relação ao curso, seja pela
qualidade do material recebido, pela infraestrutura disponibilizada, pelos benefícios
intrínsecos ao Programa e pela categoria das aulas.
A procura e a realização dos cursos foram efetivamente concluídas por
pessoas com escolaridade acima da prevista no planejamento do Programa: 60%
declararam ter o ensino médio completo. Este fato revela a dinâmica do mercado de
trabalho que exige escolarização e profissionalização em níveis cada vez mais
elevados, levando a pessoas com essa escolaridade a participar de cursos de
qualificação básica. Por outro lado, pode-se, ainda, aventar, que os processos de
escolarização vivenciados por esse segmento da população, não sejam marcados
pela excelência e qualidade de ensino, fragilizando-os em momentos de
concorrência para um posto de trabalho. É possível, também, aventar a
possibilidade de que a participação de 40% de pessoas com escolaridade inferior ao
ensino médio esteja relacionada ao acesso à informação de políticas oferecidas pelo
poder público por parte dessa parcela da população, o que leva o Programa a
pensar novas estratégias de comunicação junto ao público prioritário de políticas de
qualificação profissional.
Os índices de satisfação com os cursos entre os egressos extrapolam as
previsões e até mesmo as percepções durante a supervisão das unidades. Pelo
menos 9 em cada 10 alunos consideraram tanto o módulo de conhecimentos gerais
quanto o módulo de conhecimentos específicos como muito bons ou bons.
As avaliações dos monitores de conhecimentos gerais e também de
conhecimentos
específicos
foram
bastante
positivas,
demonstrando
ampla
satisfação em relação à atuação destes profissionais. Complementando o quadro, a
visão acerca dos materiais de conhecimentos gerais produzidos pelo Programa e
dos materiais de conhecimentos específicos tradicionalmente utilizados pelas
25
executoras revela a sua boa inserção na qualificação profissional básica. Ratificando
a demanda por formação profissional básica identificada pelo diagnóstico, os alunos
revelaram significativo entusiasmo e interesse em relação aos conhecimentos
específicos apreendidos durante as aulas.
A avaliação positiva do módulo de conhecimentos gerais possibilita
reforçar a sua significação na formação profissional básica. A valorização da forma
de expressão dos conteúdos, ao mesmo tempo, enfatiza as características
singulares associadas à formação de adultos. Tal aquilatação evidencia-se,
especialmente, quando apresentam aspectos positivos no que concerne à avaliação
do material didático de conhecimentos gerais e aos vídeos elaborados para o
desenvolvimento dos temas, cuja linguagem corrobora uma real aproximação à
realidade do aluno e à valorização de seus saberes.
Os resultados da pesquisa em relação à avaliação do curso pelos
egressos, bem como o aprofundamento dos dados relativos a cada executora
propiciam, ademais, importantes elementos para o planejamento das próximas
etapas do PEQ, tanto quanto para o planejamento de futuros programas de
qualificação profissional de adultos.
É possível afirmar que o Programa obteve resultados bastante favoráveis
em relação à obtenção do emprego, especialmente considerando alguns fatores
conjunturais: a crise mundial deflagrada em outubro de 2008, ceifando empregos em
praticamente todas as áreas da economia; e o período compreendido no primeiro
trimestre do ano que as séries históricas indicam baixos índices de contratação.
Metade dos alunos estava trabalhando três meses após a realização do
curso de qualificação e 1/3 considera que o Programa contribuiu diretamente para isso.
Aspecto também relevante diz respeito à relação entre a formação
realizada e o emprego obtido: 68% declararam que o trabalho atualmente exercido é
na mesma área de formação oferecida pelo PEQ. E, ainda: três em cada quatro
afirmaram estar utilizando os conteúdos da programação oferecida na sua prática
laboral hoje.
Se, de um lado, as pessoas obtiveram alguma colocação no mercado de
trabalho, ressalta-se que entre essa parcela 60% encontram-se no mercado
informal, revelando certa disseminação da precariedade nas relações de trabalho no
mercado de trabalho paulista, superiores às médias nacionais.
26
Além dos resultados relacionados à inserção profissional, os resultados
da pesquisa indicam que a participação no Programa promoveu alterações
consistentes e relevantes em relação ao modo de ser (como ampliação da autoconfiança, melhorias relacionadas à comunicação e relativas aos relacionamentos,
declaradas por 52% dos egressos) e em relação à preparação para o mercado de
trabalho e ampliação das informações relacionadas ao mundo do trabalho
(declaradas por 36% dos egressos).
A política pública empreendida pela SERT superou a relação binária
formação versus inserção no mercado e pode-se afirmar que contribuiu para a
construção de uma nova trajetória social aos participantes, abrindo possibilidades de
dinamização biográfica para um segmento da população, muitas vezes, apartado
dos sistemas educacionais, de emprego e de formação profissional.
27
PARTE II – PESQUISA DE AVALIAÇÃO DA INTERVENÇÃO DA SERT JUNTO AO
SETOR SUCROALCOOLEIRO POR MEIO DA QUALIFICAÇÃO PROFISSIONAL
DE TRABALHADORES EM PROCESSO DE LAY-OFF
Em 2009 uma usina do setor sucroalcooleiro do noroeste paulista
procurou a SERT demandando cursos de qualificação profissional a 480 de seus
trabalhadores, cujos contratos de trabalho seriam suspensos por dois meses,
suspensão esta justificada pela crise econômica que o setor atravessava.
A intervenção estava no âmbito da atuação da SERT, de qualificação de
trabalhadores em via de perder o emprego, e também representava uma atuação
junto ao setor, que sofrerá importante transformação do ponto de vista do seu
desenho de atuação com a mecanização do processo do corte da cana, prevista
para acontecer em sua totalidade até 2014, segundo o Protocolo de Intenção das
Usinas junto ao Governo do Estado de São Paulo. Até esta data, todos os
trabalhadores do corte manual terão seus empregos extintos, o que demandará
ações específicas de qualificação para esta parcela da população.
Por esta importância estratégica, a SERT e a FUNDAP optaram por
realizar uma pesquisa qualitativa do processo, analisando em profundidade o
impacto do processo para os trabalhadores.
Optou-se pela pesquisa qualitativa pois esta privilegia a análise de
microprocessos, através do estudo de ações sociais individuais e grupais, realizando
um exame intensivo dos dados (MARTINS, 2004). Este é o modelo de análise
proposta para essa pesquisa, considerando-se a qualificação profissional promovida
pela SERT como um microprocesso que se insere dentro de um universo mais
amplo, que abarca diversos outros processos e agentes, como as relações de
trabalho nesse contexto, por exemplo.
Pensando na relação do processo com as condições de trabalho do
trabalhador, o desenho da pesquisa contemplou entrevistas com gerentes de RH
das duas usinas, outros profissionais da usina (como supervisores), pessoas dos
sindicatos que estiveram envolvidos nos projetos de qualificação, diretores dos
PATs, professores do Centro Paula Souza que ministraram as aulas e
trabalhadores que fizeram o curso do PEQ. No caso dos trabalhadores que
participaram do layoff, entrevistou-se uma amostra dos que mantiveram seus
empregos e alguns que foram desligados, para comparar a percepção deles do
processo de layoff e a avaliação do curso.
28
O processo de lay-off na perspectiva da gerência da Usina
Do ponto de vista da gerência da Usina o processo foi um verdadeiro
“ganha-ganha” em virtude das seguintes condições:
Segundo esta concepção:
a usina, com problemas financeiros resultantes da crise econômica,
não teve que arcar com os custos relativos a demissão de
trabalhadores e despesas decorrentes do pagamento dos direitos
trabalhistas, (procedimento normal da entressafra), nem com os gastos
referentes à recontratação para trabalhar na safra seguinte;
os trabalhadores não perderam seus empregos e puderam contar com
um curso de qualificação em áreas relacionadas às atividades que
desempenham na usina e ou para as quais poderiam ascender
profissionalmente;
a Secretaria, pode exercer sua função precípua de garantir empregos.
Caracterização dos trabalhadores do corte da cana
A caracterização dos trabalhadores da cana baseia-se, neste artigo, em
nossas entrevistas qualitativas, dada a ausência de dados estatísticos sobre o
público por parte da Usina.
Na usina de açúcar trabalham grupos de profissionais com qualificações
diversas, desde a colheita e plantação, transporte da cana aos testes laboratoriais,
engenharia de produção e atividades administrativas. A pesquisa concentrou-se em
conhecer as trajetórias de vida dos trabalhadores que participaram do PEQ e do
layoff, e de sua chefia imediata.
Os trabalhadores que participaram do layoff eram trabalhadores em geral
do corte da cana, em suas frentes manual e mecanizada. A frente manual é
composta por cortadores de cana, fiscais, motorista de trator e de caminhão e o
corte mecanizado é composto por bituqueiros, tratoristas, operadores de colhedora,
motoristas de trator e de caminhão, engatadores e fiscais.
29
São trabalhadores cujas atividades diminuem sensivelmente no período
da entressafra. Em relação ao contrato de trabalho, eles se dividem em safristas
(contratados em regime de CLT por tempo determinado, que pode ser de oito a dez
meses) e em efetivados (contratados em regime de CLT por tempo indeterminado).
Os primeiros geralmente realizam, no período da entressafra, pequenos serviços em
fazendas e sítios da região, ou de suas terras natais e os segundos permanecem na
usina realizando também serviços de manutenção.
Via de regra, mesmo os trabalhadores da coleta mecanizada tem suas
trajetórias intrinsecamente ligadas ao campo, seja em atividades de colheita e
plantio de culturas diversas, seja na realização de pequenos serviços gerais no
campo (carpir, montar, cuidar de porcos, galinhas, bois e vacas, cavalos, etc, realizar
serviços de manutenção com madeira). As atividades relacionadas à vida no campo
são aprendidas desde cedo, e configuram um conjunto de saberes que está
intimamente relacionado ao valor do trabalho.
É usual que um trabalhador do campo e uma trabalhadora do campo
conheçam mais de uma atividade citada, pois elas configuram um conjunto de
saberes “da roça” que são aprendidos desde a infância e que são moeda de troca
para a sobrevivência. Saber dirigir um trator, um caminhão, uma colhedora, são,
para a primeira geração de trabalhadores rurais, saberes que se conquistam além
daqueles da roça, e não em lugar deles. Para as mulheres, entretanto, o acesso a
estes saberes é menos “natural”, seja pela dificuldade de acesso à instrução
propriamente dita, em função de uma concepção de senso comum de que este não
é um trabalho para mulheres, seja em função da dificuldade de conseguir a carteira
de habilitação, que requer recursos financeiros.
Sejam trabalhadores da coleta mecanizada, sejam trabalhadores da
coleta manual, alguns aspectos da vida no campo são bastante semelhantes para
estes trabalhadores adultos, que estamos chamando de “primeira geração”. Poucos
anos de estudo formal, trabalho na “roça” desde a infância, percursos em diversas
colheitas (laranja, café, cana), o que os diferencia em geral são os recursos que
obtiveram para a conquista da instrução relacionada à operação das máquinas e
tratores e para a conquista da habilitação.
30
A percepção dos trabalhadores sobre o processo de lay-off
As funções na usina são separadas entre o trabalhador rural (cortador de
cana, bituqueiro, engate), e os trabalhadores da usina (que trabalham com trator,
operador de máquinas). O salário de um trabalhador da usina na entressafra é de
1.100 a 1.200 reais (que já é menos do que durante a safra)9 já o piso salarial do
trabalhador rural é de 585,00 reais (e que durante a entressafra não recebem nada
além pela produção). Durante o processo de layoff, recebendo parcelas do seguro
desemprego somado ao vale-refeição oferecido pela usina, eles alcançaram uma
média de 950 reais, valor pouco diferente do que eles ganhariam na entressafra,
com a vantagem de que não teriam que trabalhar, apenas fazer o curso e melhorar
sua qualificação.
Desta perspectiva, a suspensão do contrato de trabalho em princípio não
representaria uma perda para os trabalhadores. De fato, para a maior parte dos
trabalhadores entrevistados, o processo não representou uma perda, embora a
percepção acerca dos ganhos não seja tão clara.
O processo representou uma perda para parte dos trabalhadores que
foram demitidos após o curso. Embora represente uma parte residual dos
trabalhadores (menos de 10 no universo de 339), a demissão destes trabalhadores
ilumina alguns aspectos delicados no universo do setor, como a não aceitação, por
parte da empresa, de envolvimento dos trabalhadores com o sindicato. Por meio das
entrevistas, foi possível perceber algumas permanências deletérias do trabalho no
campo, como a figura do capataz no campo ainda permanece mantendo os
trabalhadores sobre constante vigilância e a figura do empreiteiro, cujos ganhos
estão relacionados à exploração do trabalho sem regulamentação. Outra
permanência reside no fato de alguns trabalhadores serem registrados em funções
diferentes daquelas que realizam, como motoristas há muitos anos, registrados
como trabalhadores rurais.
Do ponto de vista dos trabalhadores que tiveram seus empregos
mantidos, boa parte deles perceberam o curso de maneira positiva. É importante
anotar, entretanto, que os trabalhadores enviados para os cursos de operadores de
9
O salário na entressafra é menor, pois não há os ganhos com produtividade que caracterizam os
períodos de safra.
31
colhedora, tratoristas e motoristas em sua grande maioria já realizavam estas
atividades, não tendo havido ascensão profissional dos trabalhadores do corte
manual da cana, como foi declarado pela usina. A promoção destes trabalhadores
corresponde a critérios subjetivos, como os comportamentais, adicionados ao fato
de o trabalhador possuir carteira de habilitação para dirigir tratores e ou máquinas
pesadas, e manter-se em funções como bituqueiro e engatador (ocupações que não
têm os ganhos de produtividade do corte manual) por ao menos um ano.
Isto posto, o curso foi bem avaliado pela maior parte dos trabalhadores.
Seus principais ganhos relacionaram-se aos saberes específicos, que, embora eles
já conhecessem, foram sistematizados, e aos conteúdos gerais, que os fizeram
transformar comportamentos, a aquisição de novos conhecimentos e a valorização
da cooperação:
A mudou, mudou. Viche! A gente tem mais conhecimento, a gente da mais
valor a família, da valor mais ao emprego.
Como diz o outro a gente tem hora que estoura perde o controle.
Mas teve muito exercício que a gente fez lá que tinha que ser em equipe,
então você tinha que ouvir os outros a dar opinião então é mais conviver em
grupo. Não é? Porque quando a gente estudava, isso para a gente era uma
coisa desconhecida, e quando a gente foi fazer o curso então a gente ficou
assim, por dentro tendo conhecimento das coisas, como que era
antigamente o serviço, e como se desenvolveu agora, como que eram
esses cuidados antes, agora melhor depois que desenvolveu mais.
Para mim foi muito bom, eu aprendi muitas coisas que eu não sabia, então
para mim foi muito bom. (Bituqueiro – aluno PEQ).
A pesquisa indicou, portanto, fatos positivos sobre o processo de lay-off,
mas não se pode dizer que esta intervenção contribuiu para a promoção de
trabalhadores do corte da cana em funções da coleta mecanizada.
32
Referências
CORDEIRO, José Lucas, ABUD, Bruno; TRIZI, Ivan Amorim. Inovações na gestão
do Programa Estadual de Qualificação Profissional do Estado de São Paulo. In:
CONSAD, 2009.
VENCO, Selma; LAVOS, Ana; SILVA, Cibele. Sistema de acompanhamento de
egressos: avaliando a efetividade do Programa de Qualificação Profissional no
Estado de São Paulo. In: CONSAD, 2009.
33
___________________________________________________________________
AUTORIA
Ana Lavos – Mestre em arquitetura e urbanismo pela Escola de Engenharia de São Carlos.
Funcionária da Secretaria de Emprego e Relações de Trabalho de São Paulo. Fundação do
Desenvolvimento Administrativo.
Endereço eletrônico: [email protected]
Isabel da Costa M. Nabuco de Araújo – Socióloga, consultora da Fundação do Desenvolvimento
Administrativo (FUNDAP).
Endereço eletrônico: [email protected]
José Lucas Cordeiro – Economista, doutor em Serviço Social pela Pontifícia Universidade Católica
(PUC/SP). Coordenador do Projeto de Assessoria da Fundação do Desenvolvimento Administrativo
(FUNDAP) à Secretaria do Emprego e Relações do Trabalho na Implantação do Programa Estadual
de Qualificação Profissional.
Endereço eletrônico: [email protected]
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programa de qualificação profissional do estado de são paulo