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AS BOMBAS ATÔMICAS E O BRASIL
Fernando de Souza Barros (Julho de 2001)
PORQUE ESTA PREOCUPAÇÃO POR BOMBAS ATÔMICAS?
Dez anos após o fim da Guerra Fria ainda existem 30.000 armas nucleares. Nenhuma
negociação de peso ocorreu após 1995, todas as conferências de desarmamento das
Nações Unidas não apresentaram qualquer progresso. O parlamento da Rússia,
temendo a expansão da OTAN, uma organização militar nuclear de nações ocidentais
liderada pelos Estados Unidos, não ratifica novos tratados para redução dos arsenais
nucleares das duas grandes potências nucleares. Mesmo com a ratificação dos dois
tratados propostos, existiriam 10.000 armas nucleares no ano 2007, e os arsenais se
estabilizariam com 2.000 armas cada um, após esta data ! A posição atual brasileira
pelo desarmamento, é respaldada por um veto constitucional às armas nucleares de
1988, e por ter o Congresso Nacional, ao ratificar no ano passado o Tratado de Não
Proliferação Nuclear, condicionado esse endosso a atuação do país em iniciativas que
levem à eliminação global das bombas atômicas. A participação da América Latina
em iniciativas dessa natureza data do início da década de 1980, quando Argentina
contribuiu para uma iniciativa de seis países para colocar a União Soviética e os
Estados Unidos na mesa de negociações, no auge da Guerra Fria. Indira Gandhi, da
Índia, foi o primeiro chefe de governo a participar dessa iniciativa. Recentemente, o
Brasil está participando, com outros seis paises, da coalizão denominada “Nova
Agenda”, que tornou-se uma liderança diplomática e política para o desarmamento
nuclear durante a Conferência de Revisão do TNP no ano passado, graças à sua
determinação e habilidade de negociação do documento final da Conferência, junto às
cinco grandes potências nucleares (P5). Esta realização dos países membros da Nova
Agenda foi consolidada na Resolução da Assembléia Geral das Nações Unidas
(UNGA) de novembro de 2000. Embora tenha conseguido o reconhecimento nesta
Assembléia, incluindo dos EUA e de todos seus aliados excluindo a França, a adoção
daquele documento ainda não está assegurada. Isto ocorre porque certos membros do
P5 demonstraram, por palavras ou ações, que não haviam negociado de boa fé – o que
também se verificou logo após a Conferência de Revisão e Extensão do Tratado de
Não Proliferação (NPT), em 1995.
1
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INTRODUÇÃO SOBRE A QUESTÃO DAS ARMAS NUCLEARES
O inédito poder de destruição das bombas atômicas lançadas em 1945 pelos norteamericanos sobre as cidades japonesas de Hiroshima e Nagasaki,
provocou o
interesse militar-industrial mundial pelos explosivos nucleares1. As expectativas super
otimistas daquela época, de utilização ilimitada de energia nuclear num futuro
próximo, também contribuíram para aumentar este interesse pelo “nuclear”. Em 1950,
praticamente todos os países industrializados e muitos paises do “terceiro mundo” já
possuíam seus “projetos nucleares”. As Nações Unidas, por iniciativa das potências
do ocidente, criou então um programa nuclear-guarda-chuva “Átomos para a Paz”, na
tentativa de incentivar aplicações pacíficas de energia nuclear, criando a Agência
Internacional de Energia Atômica, AIEA, para tal propósito. No Brasil, o CNPq, que
acaba de completar seus cinqüenta anos, foi instituído com esta finalidade. Após
alguns anos, por questões políticas, a responsabilidade do programa nuclear foi
retirado do CNPq, sendo criada a Comissão Nacional de Energia Nuclear, CNEN.
Por outro lado, instalava-se a Guerra Fria entre os blocos de nações liderados pela
União Soviética e pelos Estados Unidos. Os arsenais nucleares atingiram proporções
alarmantes durante a década de 1960. No início da década de 1970 foi negociado o
primeiro tratado internacional para controle de materiais físseis, o Tratado de Não
Proliferação, TNP, que tem a Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA)
como seu órgão executor. Pelo TNP, são reconhecidos os arsenais nucleares de cinco
paises (Estados Unidos, União Soviética(agora Rússia), China, Inglaterra e França).
Estes cinco paises assumiram o compromisso de, eventualmente, eliminarem seus
arsenais nucleares. Todos os demais paises signatários aceitam o compromisso de não
desenvolverem armas nucleares. O Brasil só assinou o TNP em 1996. Atualmente
somente quatro paises não assinaram o TNP: Índia, Paquistão e Israel (com domínio
de tecnologia nuclear para montagem de bombas atômicas) e Cuba, que condiciona
sua assinatura à questão da base norte-americana na ilha.).
Desde 1970, por acordos internacionais, foram criadas ZONAS LIVRES DE ARMAS
NUCLEARES em várias regiões do planeta. O Brasil participa da Zona Livre da
América Latina, instituída através do Tratado de Tlatelolco. Atualmente, por iniciativa
1
Os termos técnicos principais são definidos no GLOSSÁRIO, ao final do texto.
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do Brasil e da Nova Zelândia, todo o Hemisfério Sul está sendo proposto como Zona
Livre de armas nucleares.
OS EXPLOSIVOS NUCLEARES2
Os principais explosivos nucleares utilizados em armas nucleares, tecnicamente
denominados de “materiais físseis”, são o plutônio (um elemento que não existe
naturalmente, tendo que ser fabricado) e o urânio altamente enriquecido (acima de
80%) do isótopo 235. Existem mais de 3200 (três mil) toneladas de materiais físseis
estocados atualmente em vários paises, suficiente para mais de 230.000 (duzentos e
trinta mil) bombas nucleares. Tem sido bastante difícil a montagem de um sistema
internacional para levantamento e controle deste material. As possibilidades de venda
clandestina de material físsil vem aumentando, principalmente após o colapso da
União Soviética. Existem outros materiais físseis, e a Agência Internacional de
Energia Atômica está considerando o monitoramento de dois possíveis materiais:
neptúnio 237 e amerício.
Um tratado internacional para suspensão da produção de materiais físseis está sendo
negociado há vários anos, mas não há qualquer previsão de quando será
implementado. Os princípios gerais deste tratado seria: Universalidade (todos os
estoques seriam identificados e controlados por órgão internacional);Transparência
(todos os paises signatários apresentariam declarações periódicas e padronizadas
sobre os respectivos estoques); Irreversibilidade (os materiais físseis retirados de
bombas atômicas desmontadas não podendo voltar a ser armazenados); Acessibilidade
( as agências internacionais para inspeção desses estoques teriam acesso aos silos de
estoques e a outras instalações relacionadas com a produção de matérias nucleares
físseis). É necessário notar que os grandes reatores nucleares para produção de energia
elétrica são fontes de materiais físseis.
Em 1998,
uma estimativa3 dos estoques mundiais de materiais físseis foi a
seguinte:
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Para uma introdução elementar ao tema, veja “Radiação: Princípios básicos, aplicações e riscos”
Odair Dias Gonçalves, CADERNOS DIDÄTICOS UFRJ , 1994.
3
The Challenges of Fissile Material Control, David Albright e Kevin O’Neill, editors, ISIS Report
1999.
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ESTOQUES DE MATERIAIS FÍSSEIS
NATUREZA
Urânio enriquecido (acima de 80%)
Plutônio
(toneladas)
(toneladas)
Militar
1.700
250
Civil
20
1.100
Total
1.720
1.350
OS PROJETOS NUCLEARES BRASILEIROS
A primeira tentativa brasileira no início da década de 1950 de domínio da tecnologia
nuclear foi liderada pelo Almirante Álvaro Alberto, o primeiro presidente do CNPq.
Por pressão norte-americana, o equipamento comprado na Alemanha para
enriquecimento de urânio natural (centrífugas) teve seu embarque sustado e o projeto
foi suspenso.
Após o malogro de 1950, todas as demais tentativas brasileiras para aquisição de
tecnologias nucleares ocorreram durante os governos militares de 1964-1985. No final
da década de 1960 foi comprado da Westinghouse o primeiro reator para geração de
energia elétrica. Entretanto, o recebimento previsto na negociação deste reator de
equipamento para enriquecimento isotópico, não ocorreu face a alegação norteamericana de que o Brasil não pretendia participar do acordo TNP.
A segunda tentativa de montagem de um programa de grande porte para aquisição de
tecnologia nuclear ocorreu somente em 1975, no bojo de um acordo com a Alemanha
Ocidental. Neste acordo, o Brasil compraria além de oito grande reatores nucleares,
até o ano 2000, uma instalação para enriquecimento de urânio e montagem de barras
de combustível nuclear, alem de uma instalação para reprocessamento do combustível
queimado. Embora os alemães tenham desconsiderado o fato de que o Brasil não era
signatário do TNP, todas as instalações importadas estariam sob o regime de inspeção
da agência internacional AIEA. As pressões internacionais, e a crise econômica
brasileira da década de 1980, afetaram este acordo com graves perdas financeiras para
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o Brasil. O primeiro reator do acordo foi finalizado apenas no ano 2000, Angra II, e,
se for iniciado em 2002 a montagem do segundo e último reator alemão, Angra III
estaria operando apenas em 2005. Nesta aventura foram gastos vários bilhões de
dollars, sem qualquer geração de energia nos primeiros 25 anos de vigência do acordo
com a Alemanha.
A terceira tentativa do regime militar foi um programa iniciado secretamente pela
Marinha brasileira no final da década de 1970. Pormenores desses programas só
foram revelados após o final do regime militar, quando seus organizadores
começaram a participar de eventos públicos para debate das questões nucleares, tais
como as ocorridas durante as décadas de 1970-1980 nas reuniões anuais da Sociedade
Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC). Em um desses eventos, para
depoimentos de seus coordenadores, o Almirante Othon Luiz Pinheiro da Silva,
justificou o programa da Marinha, denominado “Programa Paralelo”, face à
constatação de que o acordo com a Alemanha não transferiria qualquer tecnologia
significativa para o Brasil, tais como o a do ciclo completo de combustível nuclear, ou
de reprocessamento de barras de combustível nuclear após sua utilização no reator de
potência. Até o anúncio dos seus primeiros sucessos, este Programa Paralelo operou
fora de qualquer sistema de inspeção, tanto nacional como internacional. O programa
estava vinculado a Comissão Nacional de Energia Nuclear e, além das instalações de
pesquisa e desenvolvimento da Marinha, contava com a colaboração do IPEN
(Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares). Este conjunto se transformou
rapidamente em um centro de pesquisa de enriquecimento de urânio 235 pela técnica
de bombas centrífugas a gás, da fabricação de combustível nuclear, além de pequenos
reatores nucleares.
Em 1988, já no regime democrático, foi inaugurado a Planta de Enriquecimento de
Urânio-235 em Aramar, uma instalação da Marinha perto da cidade de Iperó, no
interior de São Paulo. O próposito oficial da planta foi declarado ser de prover
combustível nuclear para sistema de propulsão naval, em particular, de submarinos, os
quais são denominados nucleares quando são movidos com energia gerada por reator
nuclear. A coordenação de todo programa estava nas mãos do Almirante Othon
Pinheiro da Silva, Diretor da COPESP, um centro de projetos especiais da marinha de
guerra brasileira.
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Entretanto, o Programa Paralelo não foi o único projeto nuclear secreto montado
durante o regime militar de 1964 a 1985. Em 1990, Fernando Collor de Mello, então
recém eleito presidente, revelou a existência de um outro projeto secreto, o Projeto
Solimões, um programa difuso desenvolvido pelos centros técnicos do Exército e,
novamente, fora de qualquer controle civil ou de sistemas de inspeção nacional ou
internacional. Em uma iniciativa muito notada no exterior, Collor com seus Ministro
de Ciência e Tecnologia, o físico nuclear José Goldenberg, e seu Ministro das
Relações Exteriores, Celso Lafer, hoje novamente ministro,
participaram
pessoalmente do ato de fechamento de um poço identificado para testes nucleares,
localizado nos terrenos de uma base aérea militar na Serra de Cachimbo, no Pará.
Depoimentos posteriores, principalmente do Prof. José Goldenberg, revelaram que
este programa não tinha o nível tecnológico do programa nuclear da Marinha. Um dos
itens mais evidentes da relação entre o Projeto Solimões e a fabricação de explosivos
nucleares foi a existência da montagem de um reator nuclear sub-crítico, moderado a
grafite, para aquisição de informações que permitissem a construção de um reator a
gás-grafite de 20 megawatts térmicos para produção de plutônio, um explosivo
nuclear.
Finalmente as Forças Aéreas brasileiras também desenvolveram um projeto nuclear
naquela época. O propósito deste projeto era de enriquecimento a laser de Urânio-235,
e o destino oficial do material físsil produzido seria sua utilização para o fornecimento
de energia para os sistemas de controle de satélites artificiais.
Todos os projetos mencionados acima foram desativados ou substancialmente
reduzidos após a queda do regime militar. A história destes projetos ainda tem vários
furos, mas, considera-se que o Projeto Solimões foi concebido com o propósito de
produção de explosivo nuclear; a única finalidade prática do plutônio até a presente
data.
Atualmente somente o projeto da Marinha continua em operação em escala
significativa. Com base em tecnologia alemã, a Marinha pretende construir o primeiro
submarino brasileiro com propulsão nuclear. Em 1995 ocorreu uma grande mudança
na coordenação dos projetos nucleares da Marinha brasileira. A coordenação é hoje
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realizada no Centro de Tecnologia da Marinha (desapareceu a COPESP), que
coordena os contratos com aproximadamente 150 indústrias e vários grupos de
pesquisa universitários. A imprensa informou em 1996 que a Marinha tinha
suspendido temporariamente o seu projeto do submarino nuclear por falta de verbas.
Aproximadamente 700 milhões de dólares já tinham sido gastos, mas faltariam um
bilhão de dólares para sua conclusão. Somente o reator nuclear para o submarino
estava estimado em 500 milhões de dólares, contrastando com um orçamento de
apenas 200 milhões que a Marinha teria recebido em 1996. Em 2000 o governo
federal decidiu reiniciar este projeto mas a perspectiva é que o submarino nuclear só
esteja concluído em dez anos.
O outro projeto da Marinha, a planta para enriquecimento de Urânio-235, pretende ser
comercializada e todas as atividades são oficialmente reconhecidas e inspecionadas
por agências nacionais e internacionais. Em 2000, a Marinha anunciou que havia
vendido a planta de enriquecimento de Urânio-235 à empresa estatal “Indústrias
Nucleares do Brasil (UNB), sediada em Resende. O tamanho da planta é de uma
produção de 100.000 SWU/ano4, mais que suficiente para alimentação semestral de
combustível nuclear para o reator Angra II. O preço da planta é de US$130 milhões e
seu primeiro módulo de 20,000 SWU/ano deve estar concluído no final deste ano.
A POLÍTICA NUCLEAR BRASILEIRA APÓS O REGIME MILITAR
As discussões decisivas, a partir de 1989, para os acordos nucleares entre os governos
da Argentina e do Brasil, que evitaram a possibilidade de uma corrida armamentista
no Cone Sul, só foram possíveis pois estavam assentadas em esforços diplomáticos
realizados na década de 1980. Mas as outras iniciativas que na época facilitaram esses
esforços, foram os debates, as consultas e as declarações conjuntas realizadas por
pesquisadores e professores argentinos e brasileiros, no marco das suas sociedades.
Seria muito difícil dimensionar a importância dessas sociedades para os acordos entre
os dois países, pois, na maioria das oportunidades elas foram apenas palcos para
manifestações de caráter ético ou pacifista, consideradas por alguns como ingênuas
por ignorar as dificuldades técnicas para a implementação dos acordos que envolviam
aspectos de segurança nacional.
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Ver definições no GLOSSÁRIO.
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Essas manifestações, entretanto, ajudaram a levar a questão nuclear para um público
maior, através da mídia; permitindo uma concientização que abriu o caminho para as
ações futuras dos governos civis dos dois países.
Durante 25 anos a Argentina e o Brasil recusaram-se a assinar o Tratado de Tlatelolco
de Proibição de Armas Nucleares na América Latina, opondo-se a qualquer tipo de
inspeção internacional às suas instalações nucleares. Em 1991, entretanto, esses dois
países concordaram em estabelecer um sistema bilateral de inspeções, com a
intervenção da Agência Internacional de Energia Atômica (IAEA). Essa iniciativa
abriu o caminho para a homologação argentina e brasileira do Tratado de Tlatelolco, e
do Tratado de Não Proliferação, TNP, em 1995 pela Argentina e mais recentemente,
em 1998, pelo Brasil.
Foi portanto muito singular o caminho adotado por esses dois países para implantar
salvaguardas internacionais contra armas nucleares em seus territórios. Não existe
outro exemplo de países que adotaram as salvaguardas internacionais mantendo-se
fora do Tratado de Não Proliferação, TNP, o tratado que legalizou os arsenais
nucleares dos primeiros cinco países que se nuclearizaram. O TNP tem sido
duramente criticado por outro países -- por exemplo a Índia e o bloco dos países não
alinhados – mas são somente esses dois países, com nível tecnológico suficiente para
fabricação de bombas atômicas, que mantiveram por vários anos a coerência de serem
críticos ao TNP mas permitindo inspeções internacionais de suas instalações nucleares
através de tratados alternativos.
Por vários anos, Argentina e Brasil utilizaram a possibilidade de aplicações pacíficas
de explosões nucleares para não homologarem o Tratado de Tlatelolco. Foi a
necessidade da inserção dos dois países na dinâmica das relações comerciais globais
que motivou, em 1990, a declaração conjunta de Foz do Iguaçu, assinada pelos
presidentes Fernando Collor de Mello e Carlos Menem, que possibilitou o processo de
criação de salvaguardas internacionais contra armas nucleares.
Esta cooperação nuclear entre a Argentina e o Brasil demonstrou para o mundo que
projetos nucleares rivais de natureza altamente nacionalista podem ser controlados
através de iniciativas transparentes entre as nações envolvidas. Esses acordos,
8
9
entretanto, tiveram que esperar o fim dos regimes militares dos dois países, na
Argentina em 1983 e no Brasil em 1988, e o início dos entendimentos entre seus
governos civis. Na época, sabia-se que ambos países possuíam programas de
enriquecimento de urânio. Existia então um clima de desconfiança gerado pela
possível utilização de instalações nucleares em projetos secretos, um ingrediente
necessário em qualquer corrida armamentista, que necessitava ser eliminado.
Foram portanto providenciais as intervenções dos primeiros presidentes civis nesse
processo de abertura. Em 1987, a Argentina convida o presidente José Sarney –
sucessor de Tancredo Neves—para visitar as instalações nucleares de Pilcaniyeu,
perto de Bariloche, para enriquecimento de urânio. Em 1988, o presidente Raul
Alfonsin visita a planta de Aramar, no estado de São Paulo. Foram essas as iniciativas
transparentes que deram a tônica para todas deliberações posteriores entre os dois
países. A real necessidade dessas iniciativas foi demonstrada em setembro de 1990,
quando o presidente Fernando Collor de Mello revelou a existência de um programa
nuclear secreto. Collor garantiu entretanto que nenhum dispositivo nuclear tinha sido
construído no Brasil.
O processo democrático iniciado nos dois países durante a década de 1980, permitiu
aos seus legisladores e às organizações não governamentais como as sociedades
científicas, a promoção aberta da necessidade de mecanismos para o controle civil dos
programas nucleares. Essas campanhas certamente criaram um ambiente para
implementação dos acordos de inspeção mútua entre a Argentina e o Brasil.
O acordo Argentina-Brasil foi estabelecido em julho de 1991 em Guadalajara,
México, e ratificado pelos dois países em 12 de dezembro de 1991. Esse acordo é a
base legal para criação da agência ABACC de salvaguardas bilaterais . ABACC foi
instalada oficialmente no Rio de Janeiro em 9 de dezembro de 1992, iniciando-se
imediatamente a montagem das instalações necessárias para as inspeções. ABACC é
reconhecida internacionalmente como uma iniciativa bem sucedida. Seu corpo técnico
é formado de igual números de argentinos e brasileiros. Suas missões de inspeção são
realizadas por técnicos que pertencem às agências nucleares dos dois países, tendo
sido formado um “pool” da ordem de 60 técnicos que podem eventualmente ser
chamados para as inspeções; os brasileiros inspecionam as instalações argentinas e
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10
argentinos inspecionam as brasileiras. Problemas técnicos específicos são resolvidos
com a participação de laboratórios externos aos da ABACC. As atividades gerais da
ABACC (incluindo estatísticas e naturezas das inspeções) são divulgadas anualmente
ao público, em relatórios bem elaborados.
AS QUESTÕES NUCLEARES CONTEMPORÂNEAS:
Em dezembro de 1999 comemorou-se o décimo aniversário da queda do Muro de
Berlim. Em 1989, com o início da desintegração da União Soviética e do Pacto de
Varsóvia, a OTAN previa a perda de seus inimigos históricos! Em julho de 1991 o
presidente George Bush dos EEUU visita a União Soviética e, com Mikhail
Gorbachev, assina o primeiro tratado estratégico para redução mútua de armas
nucleares (START I), fruto de negociações iniciadas em 1983. Mas apenas três meses
depois, um golpe de estado fracassado em Moscou reacende os temores da Guerra
Fria: durante três dias, a potencial autorização para início de uma guerra nuclear
passou de Gorbachev para o ministro de defesa, e daí para o chefe do comando das
forças armadas!
Em 1995 a Conferência para Revisão e Extensão do Tratado de Não Proliferação,
TNP, foi concluída sem uma expressão clara de consenso. O TNP foi renovado
indefinidamente, mas a fragilidade de sua negociação minou efetivamente sua
legitimidade. Alguns dias após a extensão do TNP, a China reiniciava testes
nucleares, seguida imediatamente por testes franceses no Pacifico Sul que geraram
uma reação mundial de repúdio. A resposta das potências nucleares às denuncias
desse
comportamento
incoerente,
principalmente
por
organizações
não
governamentais de países do primeiro mundo, foi a de concluir rapidamente, em 1996,
o Tratado para Eliminação de Testes Nucleares. Esse tratado, que deveria ter sido
aprovado 42 anos antes quando foi proposto pela Índia, foi homologado no mesmo
ano de 1996 na Assembléia Geral das Nações Unidas, mas não se pode prever quando
entrará em vigor, e há fortes evidências de que ele não será efetivo para impedir a
modernização dos arsenais dos paises tecnologicamente avançados
A partir de 1997 todas as negociações para eliminação dos arsenais nucleares
perderam força. Nos últimos anos, as conferências de desarmamento ocorridas em
10
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Genebra fracassaram. Também fracassaram as conferências preparatórias para a
Conferência de Revisão do TNP, que será realizada no ano 2000. A conferência
preparatória de maio de 1998 foi encerrada sem qualquer conclusão consensual, e, na
de maio de 1999, o único consenso alcançado foi o de que era permitido discordar !
Apenas a Corte Internacional de Justiça deu ao mundo uma contribuição significativa
nesses últimos anos quando, em 8 de julho de 1996, divulgou parecer solicitado pelas
Nações Unidas confirmando “que tanto a ameaça como a utilização das armas
nucleares são contrárias às regras de conduta dos países”, e que a “as negociações
para o desarmamento nuclear global são obrigações legais dos signatários do TNP”.
Os riscos de ataques acidentais não apenas permaneceram como cresceram com o
envelhecimento dos arsenais e as dificuldades econômicas de países nucleares,
principalmente da Rússia. Um relatório do ”New England Journal of Medicine” de
abril de 1998 [”Accidental Nuclear War - A Post-Cold War Assessment” [The New
England Journal of Medicine, The Massachusetts Medical Society, April 1998],
pp1326-1331.] concluiu que esse perigo está também presente nos arsenais norteamericanos: o relatório mostra um quadro impressionante de militares dos Estados
Unidos afastados de suas funções de operação e de manutenção de armas nucleares
por desvios comportamentais. Tem ocorrido também uma variedade alarmante de
acidentes ou incidentes nas instalações nucleares militares dos EEUU. [General Lee
Butler USAF (Ret), discurso proferido no National Press Club, Washington DC, 4 de
dezembro de 1996. General Butler comandou as forças nucleares norte-americanas].
AS QUESTÕES NUCLEARES INTERNACIONAIS E A AMÉRICA LATINA
Para surpresa de muitos, a América Latina ocupa uma liderança mundial em acordos
que superam os impasses atuais do Tratado de Não Proliferação (TNP). Existem hoje
no continente três acordos de não proliferação independentes do TNP, todos
homologados pelos signatários e de alcance abrangente quanto às salvaguardas contra
bombas atômicas. Por ordem cronológica, eles são: a) o Tratado de Tlatelelco (mais
antigo que o próprio TNP); b) o Acordo Bilateral Brasil-Argentina; e c) o Acordo
Quadripartite que envolve a Argentina, o Brasil, a Agência Internacional de Energia
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Atômica (AIAE) e a Agência Brasileiro-Argentina de Contabilidade e Controle de
Materiais Nucleares (ABACC).
O Tratado de Tlatelolco, iniciado em 1967, após a confrontação entre a União
Soviética e os Estados Unidos com a instalação de mísseis soviéticos em Cuba, foi a
primeira iniciativa mundial de criação de uma zona livre de armas nucleares.
(Exemplo adotado atualmente por, praticamente, todas as nações do Hemisfério Sul.)
Os acordos latino-americanos vêm atraindo o interesse de muitos países. A agência
ABACC está sendo examinada como protótipo de agências de inspeção que poderiam
reduzir as tensões entre países do Oriente Médio, da região sul da Ásia e da península
da Coréia. Nessas regiões, o estabelecimento de acordos semelhantes permitiria uma
maior liberdade de escolha das instalações que seriam inspecionadas. No Oriente
Médio, por exemplo, tal acordo permitiria inspeções em instalações nucleares de
Israel e em instalações químicas ou bioquímicas de países árabes. E na península da
Coréia, poderiam ser negociadas inspeções de instalações nucleares da Coréia do
Norte e de bases militares da Coréia do Sul que possam abrigar armas nucleares dos
Estados Unidos.
O AGRAVAMENTO RECENTE DAS QUESTÕES NUCLEARES E A
ATUAÇÃO BRASILEIRA
Os testes nucleares da Índia e do Paquistão, em maio de 1998, despertaram a opinião
pública mundial, especialmente, os governos dos cinco países nucleares membros
permanentes do Conselho de Segurança das Nações Unidas– China, Estados Unidos,
França, Reino Unido e Rússia. Esses testes demonstraram que somente após a decisão
firme destes países de banir seus próprios arsenais nucleares será possível interromper
o processo gradual da nuclearização mundial. A “Coalizão para uma Nova Agenda”,
entre o Brasil e outros seis países, representa o surgimento de uma nova liderança de
países denominados “potências intermediárias”, que entendem que as negociações
para o cumprimento das obrigações expressas no Artigo VI do TNP, para o eventual
desarmamento nuclear total, não podem depender apenas dos países nucleares. A
proposta desta coalizão é realista e prática, baseada na necessidade de negociações
multilaterais para se chegar ao último estagio de uma Convenção Mundial de Armas
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Nucleares (ver artigo em Ciência Hoje de janeiro-fevereiro de 1996). A Nova Agenda
propõe medidas concretas tais como: a retirada negociada do estado de alerta das
forças nucleares
das potências nucleares chaves; remoção negociada das ogivas
nucleares dos seus mísseis estratégicos; formalizar as iniciativas unilaterais já
implementadas de desmonte das plataformas de lançamento de mísseis estratégicos;
iniciar as negociações para o registro internacional dos atuais arsenais e dos estoques
de explosivos nucleares; colocar esses arsenais sob um regime de inspeção
internacional;
ampliar
essas
inspeções
para
as
instalações
de
pesquisa,
desenvolvimento e testes de componentes dessas armas; ampliar as atuais zonas livres
de armas nucleares; e desenvolver finalmente o processo de verificação necessário
para garantir um mundo livre de armas nucleares.
Em 13 de novembro de 1998, a Assembléia Geral das Nações Unidas aprovou a
proposta da Nova Agenda por 97 votos a favor, 19 contra e 32 abstenções. Os Estados
Unidas lideraram os opositores, mas, surpreendentemente, 12 membros da OTAN não
acompanharam os EEUU e se abstiveram. Desde então, membros importantes da
OTAN, como Alemanha e Canadá, passaram a reconhecer a necessidade de reexame
da
“solução TNP” para o desarmamento total global. Abriu-se também a
possibilidade de discussão interna, entre os membros da OTAN, da real necessidade
de se manter a “opção nuclear” como pedra angular de sua estratégia militar.
O fim da divisão polar do mundo não eliminou os arsenais nucleares, não cancelou o
risco de seu uso deliberado e talvez tenha aumentado o risco de destruição em massa
acidental. Grupos de cientistas da América Latina, conscientes dos atuais impasses
das negociações pró desarmamento, continuam dedicados a campanhas, algumas com
mais de duas décadas de existência, pela eliminação de armas nucleares, químicas e
biológicas. Após 55 anos de armas nucleares, os depoimentos de embaixadores,
generais e especialistas de todas as partes do planeta, salientam o perigo de armas
nucleares para os grandes centros populacionais e a fragilidade dos atuais sistemas de
segurança contra “acidentes nucleares” nos equipamentos militares nucleares de
grandes e médias potências nucleares; devendo-se incluir dentre esses, até a eventual
posse dessas armas por grupos terroristas. Continuam assim necessárias as campanhas
para exigir mudanças radicais das posturas das grandes potências. Uma solução plena
13
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às essas ameaças só poderá ocorrer através do controle internacional, redução e
eliminação final dos atuais arsenais nucleares.
Face à situação atual, governos de paises não nucleares e organizações não
governamentais começaram a considerar a alternativa das vias diplomáticas informais
para contornar o impasse descrito acima sobre as questões nucleares. Com este
propósito foi criado a organização não-governamental MPI (Middle Powers Initiative)
em agosto de 1999. A proposta da “Iniciativa das Potências (Estados) Intermediárias”
(MPI) é a campanha coordenada por várias organizações internacionais (não
governamentais) para promover o reconhecimento,
pelas lideranças das grandes
potências, da necessidade de se libertarem da “lógica” da Guerra Fria, assumindo
iniciativas práticas e objetivas que reduzam os perigos das armas nucleares, iniciando
as negociações necessárias para sua eliminação definitiva.
O DILEMA ATUAL
Num recente encontro do MPI nas Nações Unidas (em abril de 2001)foram ouvidos
vários diplomatas e representantes de países preocupados com recentes decisões das
grandes potências,principalmente dos Estados Unidos. Jayantha Dhanapala, SubSecretário-Geral para Assuntos de Desarmamento da ONU, abriu formalmente este
encontro, considerando as armas nucleares “como um vírus que contamina
progressivamente o corpo político mundial”. Dhanapala observou que existem “sinais
inquietantes“ advindos de iniciativas tais como a possibilidade de que algumas
potências estejam desenvolvendo novas armas nucleares, em aparente confronto ao
acordado no TNP, isto é, “de uma gradual diminuição da função dessas armas”. O
Embaixador Abdallah Baali de Argélia, que foi o Presidente da Conferência de
Revisão do TNP do ano 2000, preocupado com as políticas da administração de Bush
que não aparentam demonstrar interesse por compromissos multilaterais, enfatizou
que o fruto da Conferência de Revisão TNP do ano 2000 é o compromisso público
junto a ONU de “uma ação inequívoca, não ambígua“ pró eliminação das armas
nucleares. Conclui afirmando que compromissos devem ser respeitados. O
Embaixador Henrik Salander de Suécia, representante de um governo da Nova
Agenda, observa que nada indica que as 13 Etapas tenham vida além da própria
Conferência de Revisão do ano passado. Recorda que quando a Nova Agenda
apresentou o desenho de sua resolução na Assembléia Geral das Nações Unidas, no
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15
outono de 2000, “nossa meta era fortalecer o Tratado de Não Proliferação“. Esta era
uma decisão arriscada, continua, “por que expôs o TNP a riscos imprevisíveis… a
fim de se ampliar seus compromissos além do próprio mecanismo do Tratado“. A
impressionante aprovação da resolução (apoiada por 154 países membros das Nações
Unidas, recebendo três votos contra e oito abstenções) validou esta abordagem.
Registrando sua preocupação que a “ação inequívoca” aprovada pode ser interpretado
apenas "como palavras", Salander afirma entretanto que “há um ano atrás nós não
tínhamos nem mesmo essas palavras, agora podemos usá-las”.
Quatro peritos não-governamentais apresentaram avaliações sobre atuais posições de
capitais chaves (Washington, Moscou, Ottawa)
e de outros estados de OTAN.
Embaixador Thomas Graham, Jr., Presidente dos Aliança dos Advogados para
Segurança Mundial, nos Estados Unidos, considera algumas negociações como
essenciais para o fortalecimento do TNP: (a) acordo para o término da produção de
material nuclear fissionável; (b) implementação dos Tratados START; (c) vigência
do Tratado CTBT; e (d) continuidade do Tratado ABM. Graham acentua que a
situação de desarmamento é “realmente sombria“, conceituando como “pobre” a
atuação das potências nucleares para implementação das 13 Etapas. Sua conclusão,
face ao fato de que os EUA não apresentam condições de liderança para a nãoproliferação, é que o futuro do planeta repousa agora na habilidade dos seus aliados,
da Nova Agenda e de alguns outros Estados. Alexander Pikayev, Pesquisador em
Residência no Centro Carnegie em Moscou, afirma que o governo de Putin decidiu
que a verdadeira ameaça para a Rússia “vem da sua fronteira ao sul, onde as armas
nucleares são inúteis“. Portanto, o esforço russo de renovação militar foi transferido
das armas nucleares para forças convencionais. Pikayev pondera que a União
Soviética e a Rússia fizeram “enormes concessões unilaterais“ nos últimos 15 anos,
mas que face às atuais metas dos EUA de dominar a terra, os oceanos, os espaços
aéreo e interplanetário, além da informação, “a era das concessões unilaterais russas
terminou”. Embora os possíveis cortes unilaterais armas nucleares pela administração
de Bush não “sejam uma idéia ruim“, tais cortes não seriam verificáveis nem
irreversíveis. Face às presentes circunstâncias Pikayev considera que não haverá
condições para continuidade de verificação de instalações nucleares US/Rússia após o
término do Tratado START I, em 2009. O Embaixador Christopher Westdal, do
Canadá, concorda que a perspectiva do desarmamento nuclear é “crescentemente
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sombria“ e afirma que a liderança dos EUA é “absolutamente indispensável“ para se
superar os retrocessos atuais. Rebecca Johnson, Diretor Executivo do Instituto
Acronym em Londres, avaliou o impacto dos compromissos do TNP2000 na
Conferência de Revisão da OTAN. Com base no relatório do encontro de dezembro
2000 da OTAN, que reitera o papel essencial de armas nucleares no futuro previsível,
Rebecca Johnson concluiu que o impacto do acordo na Conferência de Revisão do
TNP é “nenhum“. Ela argumenta que a OTAN está aparentemente tentando
“administrar” a atual função das armas nucleares nos seus planos militares, e sugere
uma estratégia com cinco pontos principais para pressionar a Aliança. Esses pontos
seriam: (1) tentar obter uma resposta da OTAN às 13 Etapas; (2) levantar a questão
da retirada das armas nucleares táticas da Europa; (3) induzir um aumento de
transparência para os próprios membros da OTAN; (4) fortalecer as garantias de
segurança, desafiando a insistente ambigüidade da OTAN sobre quando seu arsenal
nuclear poderia ser utilizado; e (5) contestar o compartilhamento de armas nucleares,
inerente aos países da
Aliança. Richard Butler, ex-Embaixador da Austrália e
Diplomata em Residência no Conselho de Relações Estrangeiras, participou da Mesa
Redonda da Cerimônia de Instalação da Consulta, na noite de 29 de abril. Ele acentua
que as implicações profundas das armas nucleares para paz internacional devem ser
entendidas no contexto básico de que “o problema das armas nucleares é as próprias
armas nucleares”. Butler enfatiza que as políticas das potências nucleares
reconhecidas pelo TNP, dos países fora do Tratado armados com armas nucleares e
dos membros não-nucleares do TNP obstinados em obtê-las, apontam para o fato de
que essas armas “têm um futuro assegurado”. Reconhecendo o papel central dos
Estados Unidos nessas questões, Butler afirma que qualquer mudança só será possível
após mudanças da opinião pública nos EUA e nos aliados ocidentais.
Com o advento da administração de George W. Bush, surgiram mensagens que
sinalizam incertezas para todo o processo de desarmamento, em particular para o
processo de aprimoramento do Tratado de Não Proliferação, TNP. O pronunciamento
de 10 maio de 2001 do Presidente Bush, que coincidiu com o fim da Consulta de
Estratégia do MPI, afirma que o atual regime legal de contenção do uso de armas
nucleares (nuclear deterrence) não seria efetivo contra terroristas que eventualmente
adquiram essas armas de destruição em massa (weapons of mass destruction, WMD).
Bush acredita que o desenvolvimento de escudos contra mísseis balísticos é
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necessário para conter eventuais ataques terroristas. Este é a razão por que os EUA
estão revisando fundamentalmente sua postura sobre armas nucleares, incluindo aí a
função do sistema de aniquilação mútua assegurada (mutual assured destrucion,
MAD) com milhares de ogivas militares nucleares estratégicas mantidas em estado de
alerta. Um corte unilateral do arsenal nuclear norte-americano está sendo considerado
também. Mas sua motivação talvez seja a de facilitar a aceitação, pela sociedade civil,
de um sistema múltiplo de defesas contra mísseis balísticos, além de possíveis
desenvolvimentos de “pequenas” armas nucleares para neutralizar arsenais enterrados
profundamente em abrigos subterrâneos. O discurso de Bush foi ampliado pelo
Secretário de Defesa Rumsfeld quem, em seu pronunciamento de 8 maio último,
considerou a possibilidade de militarização do espaço para defesa de interesses norteamericanos e anunciou uma nova estrutura de comando dos EUA para controlar
programas espaciais.
A intenção de Bush de modificar, e talvez até rejeitar, o Tratado Contra Mísseis
Balísticos (ABM) não só ameaça o processo de aperfeiçoamento do TNP, como
enfraquece a base dos tratados internacionais para o desarmamento. É de importância
fundamental reafirmar a primazia dos diplomas legais (the rule of law), resistir aos
planos da nova administração dos EUA mais firmemente do que se pode esperar dos
seus aliados, e enfatizar a urgência da crise do desarmamento nuclear; iniciativa esta
que não deve ser menosprezada junto aos próprios cidadãos norte-americanos.
Estes desenvolvimentos requerem uma reformulação do debate em termos
estratégicos, consistente com a liderança comprovadamente responsável que vem
sendo exercitada pelos países da Nova Agenda. As 13 Etapas aprovadas no
documento final da Conferência de Revisão do TNP, em 2000, integram um processo
multilateral, cooperativo, de ações embasadas em leis internacionais que passo a passo
levam à eliminação das armas nucleares. Contrastando com esta expectativa, em
menos de um ano da aprovação das 13 Etapas, uma facção influente da nova
administração de EUA está propondo uma ordem “global“ unilateral, a ser mantida
por ameaças crescentes, e que atentam à confiança e ao respeito ao regime de tratados
internacionais (rule of law), possibilitando uma nova corrida armamentista nuclear.
Certamente, o processo proposto pela Nova Agenda – selado no documento da
Conferência de Revisão do TNP de 2000 – oferece maior estabilidade, por ser
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diploma legal internacional, enquanto as propostas de EUA vão estimular novas
incertezas e uma perigosa corrosão da ordem internacional.
Uma estratégia para enfrentar a crise atual foi delineada neste recente encontro do
MPI nas Nações Unidas. Seus pontos principais são:
1. FIM DO ESTADO DE ALERTA (DE-ALERTING): A permanência do estado de
alerta para o pronto lançamento de mísseis estratégicos
com ogivas nucleares
(diretamente ativado por eventual detecção de ação inimiga), e que abrange 5,000
ogivas dos EUA e da Rússia, é irresponsável e inaceitável, especialmente agora, com a
afirmativa do Presidente Bush no seu pronunciamento de 1 de maio de 2001, de que
“nós não somos e nem pretendemos ser adversários estratégicos”. A meta deveria ser
a eliminação global deste estado de alerta. Os EUA deveriam adotar esta meta como
elemento central de sua Revisão de Postura Nuclear, estando preparado para levar em
consideração a natureza assimétrica das respectivas forças nucleares estratégicas
(russas e norte-americanas) e oferecendo propostas significativas para a remoção
dessas ogivas de combates nucleares estratégicos do estado caracterizado pelo próprio
Presidente Bush como “prontidão com o dedo no gatilho”
2. PRESERVAÇÃO DO TRATADO ABM: O Tratado de ABM deve ser preservado e
fortalecido, por que são potencialmente sérias as conseqüências do seu cancelamento
para todo o regime de não-proliferação nuclear e desarmamento, assim como para
segurança global. Esta Etapa torna-se mais urgente após o pronunciamento do
Presidente Bush de 1 de maio último. É evidente a intenção de Bush de construir um
sistema com opções múltiplas de defesa contra mísseis balísticos, arriscando um
reinício da corrida armamentista e estimulando a militarização espacial. Na Consulta
do MPI, ficou patente a necessidade de que países com interesses políticos afins
organizem uma conferência (fora do âmbito da Conferência para o Desarmamento,
CD,) cujo mandato seria o de iniciar negociações para um Tratado para Prevenção de
Conflitos Armados Espaciais.
3. UNILATERALISMO
VERSUS
DIPLOMAS
LEGAIS:
A
abordagem
desarmamento nuclear em tratados internacionais deve ser continuada e
do
reforçada,
jamais negligenciada. A recente resistência dos EUA a este princípio, comprovada pela
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rejeição do senado norte-americano do CTBT e reforçada pela atual tendência de
renúncia ao Tratado ABM , caso for necessário para os interesses da atual
administração, deve ser revertida, especialmente no contexto mais amplo da falta de
cooperação em outros compromissos internacionais, tais como o Protocolo de Kyoto
de Mudanças Climáticas. Entretanto, um desarmamento unilateral pode ser produtivo
se levado a cabo para apoiar, não enfraquecer, diplomas legais. A intenção de cortes
unilaterais, declarada no pronunciamento do Presidente Bush em 1 de maio próximo
passado, é bem vinda e lembra os cortes unilaterais mútuos, de 1991, promovidos por
seu pai e Gorbachev. Porém, cortes unilaterais de armas nucleares fora do âmbito de
tratados internacionais, podem ser revertidos por falta de transparência e de
verificação. Esses cortes só serão significativos se acompanhados por iniciativas que
os tornem transparentes e verificáveis, medidas que deveriam ser codificadas como
parte do processo do desarmamento.
4. IRREVERSIBILIDADE: Os estados signatários deveriam insistir que o compromisso
inequívoco assumido pelas potências nucleares reconhecidas no TNP (Etapa 6),
garanta os ganhos já alcançados no desarmamento nuclear e que não podem ser
revertidos pela possível alienação do regime de não-proliferação, conseqüência
provável da implantação pelos EUA de um sistema de defesa contra mísseis. Por outro
lado, o princípio de irreversibilidade deveria ser aplicado a todos os cortes já
realizados, incluindo, em particular, as reduções unilaterais de 1991 dos EUA e da
Rússia, o desmantelamento de armas nucleares não-estratégicas viabilizado pelos
tratados START, bem como as armas
nucleares desmontadas pelo Reino Unido e
pela França. Seria parte deste processo, o re-direcionamento das atividades dos
laboratórios de armas nucleares, os quais deveriam ser acessíveis à verificação da
eliminação dessas atividades.
5.ARMAS NUCLEARES NÃO-ESTRATÉGICAS: A questão das armas nucleares
não-estratégicas necessita ser enfrentada urgentemente, já que estas seriam as
primeiras a serem utilizadas em conflitos. As sugestões consideradas foram: (1)
apoio a uma resolução de ONU sobre esta questão; (2) atuar para que estas armas
sejam localizadas nos territórios nacionais dos respectivos detentores; (3) criação
de um diploma legal com base nas declarações de 1991 de Bush e Gorbachev; (4)
formação de sistema de registro, com ampla transparência para verificação de
19
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dados; e (5) inclusão dessas proposições ou no START III ou num novo tratado
global.
6. RATIFICAÇÃO DO CTBT SEM TESTES DURANTE TODO O PROCESSO:
Todos os signatários do TNP estão politicamente comprometidos com o Documento
Final da Conferência de Revisão de 2000, no qual se conclama a moratória de testes
nucleares até a completa ratificação do tratado para prevenção global de testes
nucleares CTBT (Comprehensive Test Ban Treaty). Este compromisso foi enfatizado
durante a Consulta, considerando-se necessária uma atuação direta de ministros –
especialmente dos países da Nova Agenda e dos países da OTAN reconhecidos como
“OTAN-5” – na conferência sobre a Ratificação do CTBT a ser realizada em Nova
Iorque de 25 a 27 de setembro de 2001. Considera-se necessária esta participação
ministerial a fim de se obter o apoio dos EUA, sem o qual não se prevê grande
progresso. Enquanto isso, deveria ser aumentada a pressão para fechar locais de testes
nos EUA, na Rússia e China (a França fechou seu local de provas no Pacífico Sul).
7. INVENTÁRIO DE MATERIAIS FÍSSEIS: O estabelecimento de um inventário
(registro e banco de dados) de todos os materiais físseis utilizáveis para fabricação de
bombas (mais o elemento trício) é proposto para se progredir durante o impasse atual
das negociações do acordo para o término da produção de material nuclear fissionável
(Fissile Materials Cut-off Treaty). Recomenda-se o apoio ao estabelecimento de um
inventário de materiais físseis utilizáveis em artefatos militares nucleares (mais o
elemento trício), possibilitando registro e banco de dados. Este empreendimento
deveria ser conduzido por organizações não-governamentais especializadas, tais como
ISIS e VERTIC, que proveriam liderança e perícias para começar a iniciativa. Foi
observado que o Departamento de Assuntos de Desarmamento da ONU, com
orçamento para um banco de dados sobre armas de destruição em massa, poderia
considerar sua participação. É proposto que reuniões informais
entre NGOs e
governos solidários sejam organizadas o mais cedo possível, com a perspectiva de
preparação de mensagem para Assembléia Geral das Nações Unidas, em setembro
de 2001.
8. PADRONIZAÇÃO DE INFORMAÇÕES: Os relatórios das potências nucleares para
as conferências preparatórias do TNP deveriam ter formato com base em critérios. Esta
padronização deveria ser implementada o mais cedo possível (talvez, com o apoio do
Departamento de Assuntos de Desarmamento da ONU e participação de NGOs). Os
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relatórios deveriam ser anuais, com informações específicas (por exemplo, número de
ogivas destruídas ou desmontadas, orçamentos, estagio do processo de término de
prontidão de mísseis nucleares), que abrangessem tanto as metas como as realizações.
Estes relatórios deveriam estar vinculados ao seguintes critérios: (1) do compromisso
de “ação inequívoca (Etapa 6), que não pode ser indefinidamente adiado; (2) da Etapa
9F, que os poderes nucleares se empenhem apropriadamente nesta etapa; e (3) do subparágrafo unânime 105f da Recomendação de 1996 do Tribunal Mundial. Relatórios
semelhantes devem também ser exigidos, nacionalmente, recomendando-se sua
apresentação aos respectivos parlamentos.
9. URGÊNCIA : É imperioso o reconhecimento da urgência do processo de
desarmamento nuclear. A ênfase devendo ser a conscientização do problema central
das armas nucleares: a inflexibilidade dos países que as possuem. Face aos informes
desta Consulta, revelando que nada mudou desde o acordo da Conferência de Revisão
do TNP do ano 2000, as sugestões propostas que receberam o maior apoio foram: (1)
Encorajar a proposta do Secretário-Geral de ONU para uma conferência internacional
sobre os riscos das armas nucleares. Conferência a ser considerada se a Conferência
Preparatória do TNP do ano 2002 terminar num completo impasse. A conferência
deveria ser concebida para apoiar, não atropelar, o TNP; (2) A Nova Agenda deveria
intensificar sua atuação junto aos Presidentes e Ministros; (3) A liderança da Nova
Agenda deveria levar à opinião pública o processo de desarmamento, empenhando-se
especialmente junto ao público dos EUA. (Como exemplo, foi lembrado que o
Ministro da Suécia Olof Palme fez exatamente isto na questão do Vietnã, o que
possibilitou, então, a Iniciativa das Seis Nações.) Tanto os governos como a
sociedade civil devem colaborar no atual esforço das Nações Unidas para educação
sobre desarmamento e não-proliferação.
10. NOVAS CONFERÊNCIAS: Contribuindo para o fomento da urgência do
desarmamento nuclear, a Consulta recomenda outras conferências além das
estabelecidas para o TNP e a Conferência de Desarmamento. São sugeridas: (1)
Utilizar a Conferência de Cúpula (G8) para salientar a crise de desarmamento nuclear;
(2) realização de macro
conferência entre os signatários de Zonas Livre, mais
Mongólia, para fortalecer essas zonas e prover um forum para novas iniciativas; (3)
Realizar reuniões de trabalho paralelas à Conferência de Desarmamento sobre aspectos
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22
técnicos pendentes que são necessários para o embasamento subsidiário do
desarmamento nuclear.
GLOSSÁRIO
ABACC: O acordo bilateral entre a Argentina e o Brasil gerou a agência ABACC,
sendo complementado pelo Acordo Quadripartite, assinado em 1991. Este último
acordo possibilitou à AIEA realizar inspeções independentes nos dois países e
estabeleceu na prática um sistema de salvaguardas tecnicamente equivalente ao
exigido pelo TNP. O próprio TNP, está atualmente homologado por todos países
latino-americanos, com a exceção de Cuba.
A importância dos acordos de origem latino-americana manifesta-se nos seguintes
pontos: a) tornam as inspeções muito mais robustas, por admitir uma dupla
verificação em áreas sensíveis de instalações nucleares; b) oferecem maior
confiabilidade a todo o processo de inspeção, já que inspetores dos próprios países
participam independentemente de todo o sistema de salvaguardas; c) permitem aos
governos desses países o acesso mútuo às informações sobre as instalações do país
vizinho, o que não é previsto no TNP; e d) elimina o contexto político “Norte versus
Sul” das inspeções, já que as duas agências atuam em um mesmo plano hierárquico.
Actinídio: Elemento pesado e radioativo com número atômico maior que 89 (actínio)
e menor do que 103 (lawrêncio). A sério dos actinídios inclui o urânio (número
atômico 92), neptúnio (93), plutônio (94), e amerício (95).
Amerício: Elemento artificial fissionável que pode ser usado na produção de
explosivos nucleares. O principal isótopo, amerício-241, é gerado pelo decaimento de
plutônio-241.
Combustível nuclear de mistura de óxidos (MOX em inglês): Material composto da
mistura de óxidos de urânio e de plutônio, o que inviabiliza a utilização deste material
como explosivo nuclear.
Enriquecimento: Qualquer processo físico-químico que aumenta a concentração de
um isótopo de uma dado elemento. (No caso de urânio, trata-se do aumento percentual
do seu isótopo 235.)
Instalação declarada: Se a instalação foi notificada a agência de inspeção (no caso dos
signatários do TNP, a agência será a Agência Internacional de Energia Atômica
22
23
(AIEA) e se está disponível à inspeção sem prévia autorização, de acordo com as
obrigações estabelecidas pelo tratado. Para os países que não possuem bombas
atômicas, as obrigações do tratado determinam que todas as instalações com
atividades nucleares devem ser declaradas. Para os cinco paises que possuíam bombas
na data da homologação desse acordo, as inspeções ocorrem apenas naquelas
instalações determinadas pelos mesmos.
Instalação não-declarada: A descoberta pela Agência Internacional de uma instalação
nuclear não declarada é considerada uma violação do TNP.
Isótopo: Os núcleos dos átomos de um mesmo elemento têm o mesmo número de
prótons mas a quantidade de nêutrons pode variar, resultando em diferentes isótopos
para o mesmo elemento. Urânio-235 e Plutônio-238 são exemplos de isótopos de
elementos diferentes.
Massa crítica: É a massa mínima necessária para manter uma reação nuclear em
cadeia. Esta massa varia com vários fatores, tais como: o tipo de isótopo utilizado, sua
concentração, forma química e, principalmente, pelo arranjo geométrico do material.
Material físsil: Material composto de átomos com núcleos atômicos que se
fragmentam quando são irradiados por nêutrons com baixa energia cinética (lentos).
Os materiais físseis mais comuns são urânio-235 e plutônio-239. O termo é
empregado para indicar plutônio e urânio altamente enriquecido do isótopo 235.
Entretanto, o urânio 233 é também físsil, assim como o amerício-241 e o neptúnio237.
MPI: A organização não-governamental MPI trabalha na mobilização dos interesses
políticos de “paises (poderes) intermediários”, influentes no cenário internacional, na
campanha para eliminação de armas de poder massivo de destruição. O MPI tem um
programa de esclarecimento com seminários, publicações e consultas junto aos
governos e organizações civis. Atualmente a coordenação do MPI é presidida pelo
Senador Douglas Roche, O.C., que já atuou como embaixador canadense em
conferências de desarmamento das Nações Unidas, e conta com representações em
todos continentes.
Neptúnio-237: Um isótopo artificial que pode ser utilizado como explosivo nuclear.
Neptúnio-237 é formado pela irradiação de U-235 ou U-238 dentro de um reator
nuclear.
Nova Agenda: Em 1998, uma iniciativa que aponta claramente nessa direção, isto é,
evitar a nuclearização do planeta, foi adotada por oito países. Em 9 de junho de 1988,
23
24
os ministros das relações exteriores
da África do Sul, Brasil, Egito, Eslovênia,
Irlanda, México, Nova Zelândia e Suécia, divulgaram uma declaração conjunta
denominada “A Necessidade de uma Nova Agenda para Liberar o Planeta das Armas
Nucleares” (Towards A Nuclear Weapon-Free World: The Need For A New Agenda).
Essa declaração, reconhecida atualmente como a “Coalizão para Nova Agenda”,
critica a atual postura das nações nucleares, e da Índia, Israel e Paquistão. A
declaração conclama esses países a dar início imediato às iniciativas práticas e às
negociações efetivas para a eliminação de seus arsenais nucleares: “Temos a certeza
de que as nações rejeitariam esses arsenais nucleares se estivessem devidamente
informadas dos seus perigos inerentes e das conseqüências de seu uso, e não
permitiriam que seus governos as mantivessem em nome de uma pretensa
autodefesa.”
País não-nuclear: Um país que assinou o tratado TNP, isto é, um país que permite
inspeções que confirmam a inexistência de atividades (ou utilizações de material
nuclear) não declaradas.
País nuclear: Um país que possuía arsenal de armas nucleares antes de 10 de janeiro de
1967, data da implementação do TNP. Esses paises, pela quantidade de estoques de
armas na época, foram: Estados Unidos, União Soviética (Rússia), Reino Unido,
França e China.
Paises nucleares “de facto”: Qualquer país não-signatário do TNP com instalações
nucleares não declaradas. Atualmente, são Índia, Israel e Paquistão.
Plutônio com padrão combustível: Plutônio contendo 6 a 18 % do isótopo Pu-240.
Plutônio explosivo padrão: Plutônio contendo mais de 18% de Pu-240.
Plutônio-239: Produto artificial físsil, formado no interior das barras de combustíveis
dos reatores nucleares, quando U-238 do material combustível é irradiado e captura
neutros térmicos. Este é um dos principais matérias para produção de bombas
atômicas, o que justifica a proteção e o controle dos depósitos de combustível nuclear
“queimado”, isto é, material retirado dos reatores nucleares após sua utilização para
geração de energia.
Plutônio-240: Outro material nuclear produzido durante a “queima” do combustível
nuclear. Pu-240 não é um explosivo nuclear, entretanto, o que “complica” a utilização
do combustível nuclear queimado na fabricação de bombas atômicas.
24
25
Quadripartite: O acordo Quadripartite foi assinado em 21 de dezembro por Argentina,
Brasil, ABACC e AIEA. Esse acordo permite uma atuação independente da Agência
Internacional baseado em normas internacionais (INFCIRC/153). O Acordo
Quadripartite foi ratificado pela Argentina em dezembro de 1992 e pelo Brasil em 9
de fevereiro de 1994.
Queima de material físsil: desintegração nuclear controlada por núcleos atômicos para
geração de calor.
Quantidades significativas: quantidades mínimas para produção de uma bomba
atômica. A Agência Internacional de Energia Atômica considera que o desvio ou
desaparecimento de um estoque posto no regime de salvaguardas de quantidades de 8
kg de Plutônio ou de 25 kg de urânio enriquecidos, são quantidades significativas que
merecem providências especiais dos seus inspetores.
Reator nuclear de pesquisa: um reator construído para ser utilizado como uma fonte
de nêutrons oriundos da desintegração de núcleos atômicos.
Reator nuclear de potência: um reator nuclear construído para produção de energia
elétrica. É um reator estruturalmente diferente daqueles para produção de isótopos ou
que são utilizados como fontes de nêutrons.
Reator nuclear para propulsão naval: um reator construído para movimentar navios ou
submarinos.
Reprocessamento: tratamento químico do combustível “queimado” para separa um ou
mais isótopos (na maioria das vezes, isótopos de urânio e de plutônio).
Salvaguardas: providências ou ações definidas por tratados internacionais que
permitem que equipes de inspetores localizem, identifiquem e determinem as
quantidades existentes de materiais nucleares explosivos em qualquer país signatário
do TNP. O propósito das salvaguardas é o de evitar o desvio desses matérias para
finalidades militares.
TNP: no início da década de 1970 foi negociado o primeiro tratado internacional para
controle de materiais físseis, o Tratado de Não-Proliferação, TNP, que tem a AIEA
como seu órgão executor. Pelo TNP, são reconhecidos os arsenais nucleares de cinco
paises [Estados Unidos, União Soviética (agora Rússia), China, Inglaterra e França].
Estes cinco paises assumiram o compromisso de, eventualmente, eliminar seus
arsenais nucleares. Todos os demais paises signatários aceitam o compromisso de não
desenvolverem armas nucleares. O Brasil só assinou o TNP em 1998. Atualmente
somente quatro paises não assinaram o TNP: Índia, Paquistão e Israel (todos com
25
26
domínio de tecnologia nuclear para montagem de bombas atômicas) e Cuba, que
condiciona sua assinatura à questão da base norte-americana na ilha.).
Unidade de trabalho de separação (do inglês Separation Work Unit): medida da
energia utilizada para separação e acúmulo de urânio ou plutônio enriquecido. Uma
grande instalação de separação atinge várias centenas de milhares de SWU. A
instalação brasileira (sob responsabilidade da Marinha), que ainda está em fase de
testes, atingirá 20.000 SWU e deveria estar pronta ainda em 2001.
Urânio altamente enriquecido: urânio no qual o percentual do isótopo 235 é
artificialmente aumentado de 0,71% (teor natural) para além de 20% -- usualmente as
bombas são feitas com 90% de U-235. A montagem de uma bomba com baixo teor de
U-235, por exemplo 20%, requer uma grande quantidade de material, quando
comparado com ~25 kg necessários para uma bomba com 90% de urânio-235.
Urânio empobrecido: uma quantidade de urânio com menos de 0,71% de urânio-235,
o percentual deste isótopo no urânio natural. Este tipo de material é um produto do
próprio processo de enriquecimento de urânio-235.
Urânio fracamente enriquecido: material urânio com teor de U-235 entre 0,71% e
20%. A maioria dos reatores nucleares utilizam urânio fracamente enriquecido, entre
3-5%.
Urânio natural: urânio contendo um teor de 0,71% de U-235.
Urânio-233: material físsil formado a partir da irradiação de tório-232 por neutros.
Urânio-235: único material (isótopo) encontrado na natureza que pode ser utilizado
para fabricação de bombas atômicas.
Urânio-238: o principal isótopo (99,3%) do urânio natural.
Zona Livre: desde 1970, por acordos internacionais, foram criadas ZONAS LIVRES
DE ARMAS NUCLEARES em várias regiões do planeta. O Brasil participa da Zona
Livre da América Latina, instituída através do Tratado de Tlatelolco. Atualmente, por
iniciativa do Brasil e da Nova Zelândia, todo o Hemisfério Sul está sendo proposto
como Zona Livre de armas nucleares.
REFERÊNCIAS
•
F. Souza Barros e L.Pinguelli Rosa, “Latin-American nuclear questions: The
Brazilian case”, International Symposium on Scientists, Peace and Disarmament,
26
27
Buenos Aires (April 11 to 15 1988), Proc. Editor World Scientific Publishing
Co., .
•
F. Souza Barros, A. R. de Castro e Luiz Pinguelli Rosa, “Brazil’s nuclear shakeup:
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As bombas atômicas e o Brasil