FAMAT em Revista - Número 12 - Abril de 2009 25 Continuidade e Compacidade no Rn Giselle Moraes Resende Pereira∗ , Luciana Yoshie Tsuchiya∗ e Geraldo Márcio de Azevedo Botelho† Abril de 2009 1 Introdução A topologia emergiu no século vinte como um tema que unifica grande parte da matemática, de certa forma como a filosofia procura coordenar todo o conhecimento. É um ramo da matemática no qual são estudadas, com grande generalidade, as noções de limite, de continuidade, de proximidade e as idéias relacionadas. Para que se tenha sentido determinar o limite ou indagar sobre a continuidade de uma função, o domı́nio e o contradomı́nio da mesma devem possuir certo tipo de estrutura que permita de alguma forma expressar a noção de proximidade. É esse tipo de estrutura que torna um conjunto um espaço topológico. Em outras palavras, espaços topológicos são conjuntos equipados com estruturas tais que entre eles tem sentido falar em proximidade, e portanto faz sentido falar em limites de sequências e limites e continuidade de funções. Com a noção de distância induzida pelo valor absoluto, o corpo ordenado completo dos números reais é o espaço topológico mais frequentemente usado e por isso é utilizado como modelo para ambientes mais gerais. No contexto da reta introduz-se os conceitos topológicos básicos: ponto interior, conjunto aberto, ponto de aderência, ponto de acumulação, conjunto fechado, sequência convergente, função contı́nua, conjunto compacto, etc. O próximo passo é considerar os espaços euclidianos Rn com n ∈ N. O objetivo deste trabalho é explorar a topologia dos espaços Rn e mostrar, em particular, que nesse contexto os conceitos de função contı́nua e de conjunto compacto gozam das mesmas equivalências que são tão úteis no caso da reta. Essas equivalências, além de conferirem flexibilidade aos respectivos conceitos e de servirem para provar diversos resultados importantes, abrem a porta para a generalização desses conceitos no âmbito de espaços topológicos, onde nem sempre a noção de distância se encontra disponı́vel. ∗ † Alunas do PET-FAMAT Orientador 26 FAMAT em Revista - Número 12 - Abril de 2009 Topologia no Rn 2 Definição 2.1 Seja n ∈ N. O espaço euclidiano n-dimensional Rn é o produto cartesiano (n) de n fatores iguais a R : Rn = R× · · · ×R. Então todo elemento x ∈ Rn é da forma x = (x1 , . . . , xn ), onde para cada i = 1, . . . , n o número xi ∈ R é chamado de i-ésima coordenada de x. Se x = (x1 , . . . , xn ) e y = (y1 , . . . , yn ) temos x = y se e somente se x1 = y1 , . . . , xn = yn . Exemplo 2.2 R1 = R é o corpo ordenado completo dos números reais. Exemplo 2.3 R2 é o plano. Exemplo 2.4 R3 é o espaço euclidiano tridimensional. Chamaremos x ∈ Rn de ponto ou vetor x. Para os vetores x = (x1 , . . . , xn ) e y = (y1 , . . . , yn ) e α ∈ R, o conjunto Rn se torna um espaço vetorial real com as operações x + y = (x1 + y1 , . . . , xn + yn ) e α · x = (αx1 , . . . , αxn ). p Se x = (x1 , ..., xn ) então, o número não-negativo kxk = x21 + . . . + x2n chama-se a norma euclidiana (ou comprimento) do vetor x. 2.1 Propriedades da norma 1- kxk > 0 para todo x ∈ Rn e kxk = 0 ⇐⇒ x = 0 = (0, . . . , 0); 2- kαxk = |α| kxk para todos x ∈ Rn e α ∈ R; 3- kx + yk ≤ kxk + kyk para todos x, y ∈ Rn (desigualdade triangular). 2.2 Bolas Definição 2.5 (i) A bola aberta de centro a ∈ Rn e raio r > 0 é o conjunto B(a; r) = {x ∈ Rn : kx − ak < r}. (ii) A bola fechada de centro a ∈ Rn e raio r > 0 é o conjunto B[a; r] = {x ∈ Rn : kx − ak 6 r}. (iii) A esfera de centro a ∈ Rn e raio r > 0 é o conjunto S[a; r] = {x ∈ Rn : kx − ak = r}. Note que B[a; r] = B(a; r) ∪ S[a; r]. FAMAT em Revista - Número 12 - Abril de 2009 2.3 27 Conjuntos limitados Definição 2.6 (i) Dizemos que um conjunto X ⊂ Rn é limitado quando existe k > 0 tal que X está contido na bola B[0; k], ou seja kxk 6 k para todo x ∈ X. (ii) Uma aplicação f : X −→ Rn diz-se limitada no conjunto X ⊂ Rn quando f (X) ⊂ Rn é um conjunto limitado, isto é, quando existe c > 0 tal que kf (x)k 6 c para todo x ∈ X. 2.4 Conjuntos abertos Definição 2.7 (i) Seja a ∈ X ⊂ Rn . Dizemos que o ponto a é interior ao conjunto X quando para algum r > 0 tem-se B(a; r) ⊂ X. Isso siginifica que todos os pontos suficientementes próximos de a também pertencem a X. (ii) O conjunto int X de todos os pontos interiores a X chama-se interior do conjunto X. Quando a ∈ intX, dizemos que X é uma vizinhança de a. (iii) Um conjunto A ⊂ Rn chama-se aberto quando todos os seus pontos são pontos interiores, isto é quando A = intA. Exemplo 2.8 Toda bola aberta B = B(a; r) é um conjunto aberto. De fato: para todo x ∈ B temos que kx − ak < r. Temos que mostrar que existe um s > 0 tal que B(x; s) ⊂ B. Escolhendo s = r − kx − ak > 0, vejamos que B(x; s) ⊂ B. De fato, para todo y ∈ B(x; s) temos que ky − xk < s = r − kx − ak =⇒ ky − xk + kx − ak < s = r − kx − ak + kx − ak =⇒ k(y − x) + (x − a)k + ≤ ky − xk + kx − ak < r =⇒ ky − ak < r. Disso segue que y ∈ B(a; r), donde concluı́mos que B(x; s) ⊂ B. Teorema 2.9 (a) O Rn e o conjunto vazio são abertos. (b) Se A1, A2 , . . . , An são abertos em Rn , então a intersecção A = A1 ∩ A2 ∩ · · · ∩ An é um conjunto aberto. (c) Se (Aλ )λ∈L é uma famı́lia arbitrária de conjuntos abertos Aλ ⊂ Rn , então a união S A= Aλ é um conjunto aberto. λ∈L 28 FAMAT em Revista - Número 12 - Abril de 2009 Demonstração. (a) É imediato que o Rn é aberto. Que o vazio é aberto decorre do fato de que um conjunto só pode deixar de ser aberto se existir nele algum ponto que não seja interior. Como não existe ponto algum em ∅, concluı́mos que ele é aberto. (b) Seja a ∈ A1 ∩ A2 . Então a ∈ A1 e a ∈ A2 . Como A1 e A2 são abertos, existem ε1 > 0 e ε2 > 0 tais que B(a; ε1 ) ⊂ A1 e B(a; ε2 ) ⊂ A2 . Seja ε = mı́n{ε1 , ε2 }. Segue então que B(a; ε) ⊂ A1 e B(a; ε) ⊂ A2 , logo B(a; ε) ⊂ A1 ∩ A2 . Assim, todo ponto a ∈ A1 ∩ A2 é interior. Portanto o conjunto A1 ∩ A2 é um conjunto aberto. Agora seja A = A1 ∩ · · · ∩ Ak , onde Ak ⊂ Rn é aberto para k = 1, . . . , n. Do que vimos logo acima segue que A é um conjunto aberto. Basta fazermos (A1 ∩ A2 ) ∩ A3 e assim sucessivamente, obtemos que interseções finitas de conjuntos abertos são abertos. S (c) Seja x ∈ A = λ∈L Aλ . Então existe um λ ∈ L tal que x ∈ Aλ . Como Aλ é aberto, existe um ε > 0 tal quer B(x; ε) ⊂ Aλ ⊂ A. Logo todo ponto x ∈ A é um ponto interior. S Portanto A = Aλ é aberto. λ∈L Observação 2.10 Seja X ⊂ Rn . Dizemos que um subconjunto A ⊂ X é aberto em X quando cada ponto a ∈ A é centro de uma bola aberta B(a; r) tal que B(a; r) ∩ X ⊂ A. Ou seja, os pontos de X que estão sufcientemente próximos de cada a ∈ A pertencem a A. É fácil ver que um conjunto A ⊂ X é aberto em X se e somente se existe um aberto U em Rn tal que A = U ∩ X. 2.5 Sequências em Rn Definição 2.11 Uma sequência em Rn é uma função x : N −→ Rn que associa a cada número natural k um ponto xk ∈ Rn . Usaremos a notação (xk ) para indicar uma sequência cujo k-ésimo termo é xk . Para cada i = 1, . . . , n, denotamos por xik a i -ésima coordenada do termo xk , isto é xk = (x1k , x2k , . . . , xnk ). Então dar uma sequência em Rn equivale a dar as n sequências de números reais (x1k ), . . . , (xnk ). Definição 2.12 (i) A sequência (xk ) é limitada se existe uma bola em Rn que contém todos os termos xk , ou seja se existe c > 0 tal que kxk k ≤ c para todo k ∈ N. (ii) Uma subsequência de uma sequência x = (xk ), é a restrição da função x a um subconjunto infinito N0 = {k1 < k2 < · · · < km < · · · } de N. FAMAT em Revista - Número 12 - Abril de 2009 29 (ii) Dizemos que a é o limite da sequência (xk ) de Rn se para qualquer número real ε > 0, existe um k0 ∈ N tal que para todo k > k0 temos a condição kxk − ak < ε, ou seja, xk ∈ B(a; ε) sempre que k > k0 . Usaremos a seguinte notação: a = lim xk . Pode-se também usar a notação: xk → a. (iv) Dizemos que uma sequência é convergente quando ela possui limite. 1 1 , vista como uma sequência R. Temos que limn→∞ = Exemplo 2.13 Seja (xn ) = n n 1 0, ou seja, (xn ) = converge para 0. De fato, dado ε > 0, podemos obter n0 ∈ N tal n 1 1 1 1 que n0 > . Então n > n0 =⇒ < < ε, ou seja, n > n0 =⇒ − 0 < ε. ε n n0 n 2.6 Conjuntos fechados Definição 2.14 (i) Dizemos que o ponto a é aderente ao conjunto X ⊂ Rn quando existe uma sequência de pontos xk ∈ X tais que lim xk = a. (ii) Chamamos de fecho do conjunto X ⊂ Rn ao conjunto X formado por todos os pontos aderentes a X. Portanto a ∈ X ⇐⇒ a = lim xk com xk ∈ X. (iii) Um conjunto F ⊂ Rn é fechado quando F = F, ou seja, quando o limite de toda sequência convergente de pontos de F é ainda um ponto de F. Todo ponto x ∈ X é aderente a X pois é limite da sequência constante (x, x, . . .). Assim X ⊂ X qualquer que seja X ⊂ Rn . Definição 2.15 Dizemos que a ∈ Rn é ponto de acumulação do conjunto X ⊂ Rn quando toda bola de centro a contém uma infinidade de pontos de X. Teorema 2.16 O conjunto F ⊂ Rn é fechado se, e somente se, F c = Rn − F é aberto. Demonstração. F é fechado ⇐⇒ Todo ponto aderente a F pertence a F ⇐⇒ Se a ∈ Rn − F então a não é aderente a F ⇐⇒ Se a ∈ Rn − F então existe uma bola aberta B centrada em a tal que B ∩ F = ∅ ⇐⇒ Se a ∈ Rn − F então existe uma bola aberta B centrada em a tal que B ⊂ Rn − F ⇐⇒ Todo ponto a ∈ Rn − F é interior a Rn − F ⇐⇒ Rn − F = F c é aberto. 30 3 FAMAT em Revista - Número 12 - Abril de 2009 Continuidade Definição 3.1 (i) Uma aplicação f : X → Rn , definida no conjunto X ⊂ Rm , associa a cada ponto x ∈ X sua imagem f (x) = (f1 (x), . . . , fn (x)). (ii) Uma função f : X −→ Rn diz-se contı́nua no ponto a ∈ X quando para cada ε > 0 pode-se obter um δ > 0 tal que kf (x) − f (a)k < ε sempre que kx − ak < δ e x ∈ X. Observação 3.2 Equivalentemente, f é contı́nua no ponto a ∈ X se para cada ε > 0 dado, existe um δ > 0 tal que f (B(a; δ) ∩ X) ⊂ B(f (a); ε). Definição 3.3 Dizemos que f é contı́nua quando é contı́nua em todos os pontos do seu domı́nio. Notação. Se A e B são conjuntos arbitrários, f : A −→ B é um função e C ⊂ B, escrevemos f −1 (C) = {x ∈ A : f (x) ∈ C} e dizemos que f −1 (C) é a imagem inversa de C pela função f . Teorema 3.4 Seja X ⊂ Rm . Uma aplicação f : X −→ Rn é contı́nua se e somente se a imagem inversa f −1 (A) de todo conjunto aberto A ⊂ Rn for um subcojunto aberto em X. Demonstração. Suponha que f seja contı́nua e que A ⊂ Rn seja aberto. Devemos mostrar que f −1 (A) = {x ∈ X : f (x) ∈ A} é aberto em X. Para isso seja x0 ∈ f −1 (A). Então f (x0 ) ∈ A. Como A é aberto, existe ε > 0 tal que B(f (x0 ), ε) ⊆ A. Como f é contı́nua em x0, existe δ > 0 tal que kf (x) − f (x0 )k < ε sempre que kx − x0 k < δ e x ∈ X. Então f (B(x0 , δ) ∩ X) ⊆ B(f (x0 ), ε) ⊆ A e portanto B(x0 , δ) ∩ X ⊆ f −1 (A). Segue que x0 é ponto interior de f −1 (A). Logo f −1 (A) é aberto em X. Reciprocamente, suponha que f −1 (A) = {x ∈ X : f (x) ∈ A} é aberto em Rm para qualquer A ⊆ Rn aberto. Então para todo aberto A em Rn existe U aberto em Rm tal f −1 (A) = X ∩ U . Mostremos que f é contı́nua. Sejam a ∈ X um ponto qualquer e ε > 0 dado. Como a bola B(f (a), ε) é um aberto, existe um aberto U em Rm tal que X ∩ U = f −1 (B(f (a), ε)) . Por hipótese f −1 (B(f (a), ε)) é aberto em X. Como f (a) ∈ B(f (a), ε) então a ∈ f −1 (B(f (a), ε)) = X ∩ U . Logo a ∈ U , e como U é aberto, existe δ > 0 tal que B(a, δ) ⊂ U. Disso segue que f (B(a, δ) ∩ X) ⊆ f (U ∩ X) = f (f −1 (B(f (a), ε))) = B(f (a), ε). Logo f é contı́nua em a. Como a é arbitrário temos que f é contı́nua. FAMAT em Revista - Número 12 - Abril de 2009 31 Conclusão. Segue do teorema acima que, para definir continuidade, não é imprescindı́vel a noção de distância. Se soubermos quem são os abertos dos espaços envolvidos, a caracterização acima ensina como definir continuidade. E a coleção de abertos de um espaço pode ser dada usando-se o Teorema 2.9. 4 Compacidade Definimos compacidade em Rn da mesma maneira que o fazemos na reta: Definição 4.1 Um subconjunto K do Rn é dito compacto se K for fechado e limitado. A compacidade, entre outras utilidades, garante que funções definidas em compactos apresentam um comportamento mais regular e conveniente. Para demonstrar várias dessas boas propriedades garantidas pela compacidade, a definição não é suficiente, tornando necessária uma investigação das consequências da compacidade. Duas dessas consequências têm interesse especial, pois, além de flexibilizar a utilização da compacidade, são também caracterizações desse importante conceito. Descreveremos sob forma de equivalências essas duas caracterizações. A primeira caracterização afirma que K é compacto se e somente se toda cobertura aberta de K admite subcobertura finita. Pelo Teorema de Bolzano-Weierstrass, toda sequência em um compacto K admite subsequência convergente em K. A segunda caracterização garante a recı́proca desse resultado, isto é: K é compacto se e somente se toda sequência em K admite subsequência convergente em K. Definição 4.2 (i) Seja K um subconjunto do Rn . Uma cobertura aberta de Ké uma coleção A de conjuntos abertos cuja união contém K. (ii) Uma subcobertura finita de A, se existir, é uma sub-coleção finita desses conjuntos que continua contendo A. 9 Exemplo 4.3 Na reta R, os intervalos C1 = 0, 32 , C2 = 31 , 1 e C3 = 12 , 10 con1 3 1 3 stituem uma cobertura C = (C1 , C2 , C3 ) do intervalo 4 , 4 . De fato, 4 , 4 ⊂ C1 ∪C2 ∪C3 = (0, 1) . Tomando C 0 = {C1 , C3 }, temos que C 0 é uma subcobertura de C, pois ainda vale 1 3 9 , ⊂ C1 ∪ C3 = 0, 10 . 4 4 Teorema 4.4 (Bolzano-Weierstrass) Toda sequência limitada em Rn admite subsequência convergente. 32 FAMAT em Revista - Número 12 - Abril de 2009 Demonstração. Seja (xk ) uma sequência limitada em Rn . As primeiras coordenadas dos seus termos formam uma sequência limitada (xk1 )k1 ∈N de números reais, a qual, pelo teorema de Bolzano-Weierstrass na reta, possui uma subsequência convergente. Isto é, existem um subconjunto infinito N1 ⊂ N e um número real a1 tais que lim x1k1 = a1 . k1 ∈N1 Por sua vez, a sequência (x2k2 )k2 ∈N1 , formada pelas segundas coordenadas dos vetores (xk )k∈N1 , é limitada em R e portanto possui subsequência convergente. Assim existem um subconjunto infinito N2 ⊂ N1 e um número real a2 tais que lim x2k2 = a2 . Repetimos k2 ∈N2 o procedimento até obtermos n conjuntos infinitos N ⊃ N1 ⊃ · · · ⊃ Nn e números reais a1 , a2 , . . . , an tais que lim xiki = ai para i = 1, 2, . . . , n. Tomando a = (a1 , a2 , . . . , an ) ki ∈Ni segue imediatamente que lim xkn = a, o que completa a demonstração do teorema. kn ∈Nn Teorema 4.5 (Cantor): Seja K1 ⊃ · · · ⊃ Kk ⊃ · · · uma subsequência decrescente de compactos não vazios em Rn . Existe pelo menos um ponto a ∈ Rn que pertence a todos ∞ \ os Kk , ou seja, Kk 6= ∅. k=1 Demonstração. Para cada k ∈ N escolhamos um ponto xk ∈ Kk . A sequência (xk ) é portanto limitada, logo possui uma subsequência (xr )r∈N0 que converge para a = lim0 xr . r∈N Mostremos que a ∈ Kk para todo k ∈ N. De fato, dado k, temos Kr ⊂ Kk sempre que r ∈ N0 e r > k. Assim, r ∈ N0 , r > k ⇒ xr ∈ Kk . Segue-se que a = lim0 xr pertence ao r∈N conjunto fechado Kk . Provaremos agora as caracterizações de compacidade citadas acima: Teorema 4.6 As seguintes afirmações sobre um conjunto K ⊂ Rn são equivalentes: 1- K é compacto. 2- Toda cobertura aberta de K admite subcobertura finita. 3- Todo subconjunto infinito de pontos de K possui um ponto de acumulação pertencente a K. 4- Toda sequência de pontos (xk ) de K possui uma subsequência que converge para um ponto de K. Demonstração. (1) =⇒ (2) (Teorema de Borel Lebesgue) Sabemos por hipótese que K ⊂ Rn é compacto. Suponhamos, por absurdo, que exista uma cobertura aberta (Aλ ) de K que não admite subcobertura finita. Como K é limitado, K pode ser escrito como uma união finita de compactos todos eles FAMAT em Revista - Número 12 - Abril de 2009 33 de diâmetro menor que 1. Segue então que pelo menos um deles, o qual chamaremos de K1 , é tal que K1 ⊂ ∪Aλ e não admite subcobertura finita. Da mesma forma podemos 1 escrever K1 como união finita de compactos todos eles de diâmetro menor que . Segue S 2 que pelo menos um deles, o qual chamaremos de K2 , é tal que K2 ⊂ K1 ⊂ λ Aλ e não admite subcobertura finita. Prosseguindo assim, obtemos uma sequência decrescente de 1 compactos K1 ⊃ K2 ⊃ · · · ⊃ Kk ⊃ · · · tal que cada Kk tem diâmetro menor que e tal k que nenhum deles está contido numa união finita de conjuntos Aλ . ∞ \ Em particular, todos os Kk são não vazios. Pelo teorema de Cantor, existe a ∈ Kk . k=1 1 ) k ⊂ Aλ para algum k. 1 Como a ∈ Kk e o diâmetro de Kk é menor que , concluimos que Kk ⊂ B(a, k1 ), donde k Kk ⊂ Aλ . Mas isso é uma contradição, pois nenhum Kk admite subcobertura finita. Logo toda subcobertura aberta de K admite subcobertura finita. Para algum λ, tem-se B(a, (2) =⇒ (3) Seja X ⊆ K um subconjunto de K sem pontos de acumulação em K. Então para todo x ∈ K, x não é ponto de acumulação de X. Portanto para cada x ∈ X existe [ Ax = B(x, δx ), δx > 0, tal que B(x, δ) ∩ X = {x} ou ∅. É claro que K ⊆ B(x, δx ), x∈X logo por (2) podemos extrair uma subcobertura finita, isto é, existem x1 , x2 , . . . , xk ∈ K tais que K ⊆ Ax1 ∪ Ax2 ∪ · · · ∪ Axk . Em particular, essa subcobertura cobre X. Assim, X = (X ∩ Ax1 ) ∪ (X ∩ Ax2 ) ∪ · · · ∪ (X ∩ Axk ). Logo X = ∅ ou X possui no máximo k elementos, e portanto X é finito. Logo subconjuntos infinitos de K possuem pontos de acumulação. (3) =⇒ (4) Seja (xk ) uma sequência em K. Existem duas possibilidades para o conjunto X = {x1 , . . . , xk , . . .}: X é finito ou infinito. Suponhamos primeiramente que X é finito. Então existe pelo menos um xk que se repete uma infinidade de vezes, logo temos uma subsequência constante e portanto convergente. Suponhamos agora que X é infinito. Por (3) existe a ∈ K ponto de acumulação de X. Então para todo δ > 0 a bola B(a, δ) contém uma infinidade de pontos de X. Portanto contém termos xk com ı́ndices arbitrariamente grandes. Podemos então formar uma subsequência (xk )k∈N0 que converge para a ∈ K. Logo toda sequência de pontos de K possui uma subsequência que converge para um ponto de K. 34 FAMAT em Revista - Número 12 - Abril de 2009 (4) =⇒ (1) Valendo (4) segue que K é limitado, pois do contrário existiria para cada k ∈ N um ponto xk ∈ K tal que kxk k > k. Daı́ a sequência (xk ) assim obtida não possuiria subsequência limitada, logo nenhuma das suas subsequências seria convergente. Além disso, K é fechado pois se a = lim xk com xk ∈ K para todo k ∈ N, então por (4), uma subsequência de (xk ) convirgiria para um ponto de K. Mas toda subsequência de (xk ) converge para a. Logo a ∈ K. Conclusão. Temos do teorema acima que a condição de ser fechado e limitado é equivalente a todas as outras condições que se deseja para um conjunto compacto. Como ser fechado e limitado é, dentre todas elas, a mais fácil de ser verificada caso a caso, justificase assim a definição de compacto por essa propriedade. Além disso, o conceito de limitado exige a presença da noção distância, ou seja, em ambientes mais gerais pode não fazer sentido falar em conjunto limitado. Assim as caracterizações acima servem de alternativas para a definição de conjunto compacto. Referência Bibliográficas [1] [2] [3] [4] LIMA, LIMA, LIMA, LIMA, E. E. E. E. L. L. L. L. Análise Real. vol. 1 10th ed. IMPA, Rio de Janeiro, 2008 Análise Real. vol. 2 7th ed. 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