Labor e Educare: Um novo olhar para a categoria
Trabalho e Educação no século XXI
Willame Carvalho e Silva1
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RESUMO
As transformações que ocorrem no mundo do trabalho influenciam diretamente o campo educacional,
promovendo a qualificação de uma pequena parcela da classe trabalhadora, instrumentalizando-a para
essa nova realidade do campo produtivo. A categoria “trabalho” vem sofrendo grandes impactos, levando o
ser-que-vive-do-trabalho a uma precarização crescente e permanente. O capital assume uma importância
a cada instante, em todos os campos do saber e do existir humano. Desaparece hoje qualquer proposta de
reação ao sistema implementado mundialmente pós-muro de Berlim. Não há nenhuma reação a médio ou
longo prazo sendo gestado por parte de discordantes do atual sistema capitalista vigente. O que se vê é
uma crescente busca pela qualificação, através da polivalência, que significa um trabalho mais variado, com
certa abertura quanto à possibilidade de administração do tempo pelo trabalhador, e da politecnia, que
representa o domínio da técnica a nível intelectual e à possibilidade de um trabalho flexível, a idéia da
implementação de concepções pedagógicas que enveredam diretamente pelo lado assistencialista, com a
promoção de cursos básicos, funcionais, voltados para um mercado instável, em transição, mutável, que
tem objetivos de inserir no mercado informal o maior número de trabalhadores, promovidos por programas
governamentais e empresariais. Ou seja, uma acomodação à nova regra mundial por parte de todos.
Palavras-chave: educação e trabalho, qualificação, politecnia.
SUMMARY
The transformations that occur in the world of the work influence the educational field directly, promoting the
qualification of a small parcel of the diligent classroom, instrumentalizando it for this new reality of the
productive field. The category "work" comes suffering to great impacts, leading the be-that-live-do-work to an
increasing and permanent precariza . The capital assumes an importance at every moment, in all the fields
of knowing and human existing. After-wall of Berlin today disappears any proposal of reaction to the
implemented system world-wide. The medium or long gestado stated period does not have no reaction
being on the part of opponents of the current effective capitalist system. What if it sees is an increasing
search for the qualification, through the polyvalence, that more means a work varied, with certain opening
how much to the possibility of administration of the time for the worker, and of the politecnia, that represents
the domain of the technique the intellectual level and to the possibility of a flexible work, the idea of the
implementation of pedagogical conceptions that the basic courses promotion of, functionary, directed toward
an unstable market enveredam directly for the assistencialista side, with, in transistion, changeable, that it
has objective of inserting in the informal market the greater number of workers, promoted for governmental
and enterprise programs. Or either, a room to the new world-wide rule on the part of all.
Key-word: education and work, qualification, politecnia.
1
Mestre em Educação, Professor de Filosofia, Ética e Metodologia na FAETE.
INTRODUÇÃO
No século XXI, a sociedade atual convive com grandes transformações no campo do
trabalho humano, relacionadas às inovações nas áreas produtivas, à centralidade e à globalização da
economia. Os avanços tecnológicos, através da utilização da microeletrônica e microinformática, estão
desenhando uma nova face no campo produtivo, usando uma parcela cada vez mais reduzida de mão-deobra disponível, implementando uma situação de sub-emprego, desemprego, rotatividade da mão-de-obra,
redução de salário, aumento da jornada de trabalho para o ser-que-vive-do-trabalho, no dizer de Ricardo
Antunes.
As transformações que ocorrem no mundo do trabalho influenciam diretamente o campo
educacional, promovendo a qualificação de uma pequena parcela da classe trabalhadora,
instrumentalizando-a para essa nova realidade do campo produtivo. Por outro lado, promove a
desqualificação, por conta da base técnica da automação, presente nos grandes centros industriais, que
utilizam a microeletrônica e a robótica como suporte de suas investidas produtivas.
Também no campo sindical, observa-se tais transformações. As atuais lideranças sindicais
observam atônitas essas mudanças que se processam no campo econômico e educacional. O movimento
sindical brasileiro encontra-se atordoado e atado diante de uma série de transformações que interferem
diretamente no modo de ser e pensar do ser-que-vive-do-trabalho, a partir da implantação das idéias
denominadas Tayotismo, oriundas das empresas japonesas, aplicadas principalmente pelas empresas
transnacionais, que buscam novos mercados, com farta mão-de-obra barata e um sindicalismo pouco
articulado.
Essa crise de identidade do movimento sindical passa pela preocupação com a
qualificação, por não poder vislumbrar nenhuma mudança no campo produtivo sem uma revisão no modo
de ver e promover a qualificação para o trabalho.
A CATEGORIA TRABALHO NO CONTEXTO ATUAL
A categoria “trabalho” vem sofrendo grandes impactos, levando o ser-que-vive-do-trabalho
a uma precarização crescente e permanente. O capital assume uma importância a cada instante, em todos
os campos do saber e do existir humano. Desaparece hoje qualquer proposta de reação ao sistema
implementado mundialmente pós-muro de Berlim. Não há nenhuma reação a médio ou longo prazo sendo
gestado por parte de discordantes do atual sistema capitalista vigente. As entidades laborais estão atônitas
ante a este estado de coisas.
O que se vê é uma crescente busca pela qualificação, através da polivalência, que significa
um trabalho mais variado, com certa abertura quanto à possibilidade de administração do tempo pelo
trabalhador, e da politecnia, que representa o domínio da técnica a nível intelectual e á possibilidade de um
trabalho flexível, a idéia da implementação de concepções pedagógicas que enveredam diretamente pelo
lado assistencialista, com a promoção de cursos básicos, funcionais, voltados para um mercado instável,
em transição, mutável, que tem objetivos de inserir no mercado informal o maior número de trabalhadores,
promovidos por programas governamentais e empresariais. Ou seja, uma acomodação à nova regra
mundial por parte de todos.
A relevância de tal tema surge principalmente por conta de uma crescente mudança no
modo de ser e atuar do trabalhador e da trabalhadora no contexto atual. Professores, operários,
comerciários, médicos, advogados, engenheiros estão assumindo o novo discurso de qualificação
permanente, qualidade total e produção enxuta. O paradigma “trabalho humano” vem sendo estudado por
pesquisadores das mais diversas áreas do conhecimento.
Estudos de Karl Marx, Robert Kurz, Gramsci, Werner Markert, Ricardo Antunes e Paul
Lafargue permitem uma análise mais aprofundada sobre as transformações no campo do trabalho
humano e suas implicações no campo sindical. Tais teóricos enfatizam que tanto a história como as
relações de produção são elementos fundamentais para a compreensão da realidade, vistas como
relações sociais e históricas. E que para compreender a realidade é preciso compreender como funciona
tais relações sociais.
As análises sobre qualificação profissional visam compreender na ótica do materialismo
histórico e dialético como ocorrem as transformações que ocorrem no campo do trabalho humano, por
entender a história como instrumento imprescindível para a compreensão da realidade, e ser as relações
sociais de produção a base para a investigação científica.
Desenvolver estudos a partir das categorias trabalho, qualificação profissional, educação
sindical, novas tecnologias e sindicalismo não apresenta ser uma tarefa das mais fáceis. Exige um
aprofundamento no campo da sociologia do trabalho, avaliação educacional e sociologia política.
Tais expressões, bastante conhecidas no contexto acadêmico e social, constituem uma
preocupação de diversos pesquisadores que estão acompanhando as mudanças que estão ocorrendo no
campo do trabalho humano.
Os saberes e competências da classe trabalhadora é uma preocupação constante,
influenciando diversos estudos e despertando interesses das mais diversas áreas no âmbito das Ciências
Sociais, Educação, Filosofia e demais ciências, necessitando, de constantes estudos e aprofundamentos
sistemáticos.
No Brasil são várias as pesquisas que tratam da questão das transformações no campo do
trabalho humano, propiciando uma certa compreensão de tal fenômeno. O advento da “nova forma
produtiva”, que se apresenta com a junção de características distintas, como o desenvolvimento
tecnológico de um lado e pela desconcentração, terceirização do outro, mostra que há uma gestação de
algo novo, denominado por alguns de "Terceira Revolução Industrial", justapondo uma nova realidade,
impondo um modelo “arrojado” e “dinâmico”, capaz de mobilizar uma estrutura econômica, propondo uma
nova roupagem para a chamada neoliberalização da economia.
O modelo gestado apresenta um projeto próprio para o campo educacional, influindo
diretamente na implementação de cursos e projetos nas áreas de seu interesse, como a microeletrônica,
informática, robótica, qualidade, gerenciamento, gestão etc., reanimando assim os cursos técnicos e
profissionalizantes impostos pelo Governo na década de 1970, além de incentivar empresas a investirem
na qualificação de seus empregados, gestando uma educação voltada quase que exclusivamente para os
interesses destas empresas.
A flexibilidade do mercado de trabalho, decorrente do processo de modernização
produtiva, está promovendo uma precarização do emprego, através da terceirização, sub-emprego,
aumento da jornada de trabalho, redução de salários, perda dos benefícios sociais, impossibilidade de
aperfeiçoamento profissional e, consequentemente, distanciamento do mercado de forma de trabalho.
A simples melhora do nível de escolaridade de setores populares da sociedade não é a
garantia para se aumentar e distribuir de modo mais justo a renda de um país.
Estudo realizado por Rosalinda Pimentel (1994 ) demonstra que no Nordeste os
indicadores de escolaridade da força de trabalho no setor de trabalho no setor industrial evidenciaram um
crescimento relativo de contingente com 1.º e 2.º graus completo (31%) em 1994 com relação a 1987, com
uma redução de 22,2 % de postos de trabalho (mais de 200 mil empregos assalariados entre 1987 e 1994).
A EDUCAÇÃO E SUA CONTRIBUIÇÃO PARA O TRABALHO
Em relação a qualificação para o trabalho, alcançado por contínuo processo de educação
tecnológica e aprendizagem, no caso brasileiro este conceito permite uma inversão. Ao trabalhador é
cobrado aumento de produtividade e aumento de intensidade de trabalhos, restando-lhe pouco tempo para
aperfeiçoamento. A perversidade deste fato consiste em que o mesmo trabalhador que responde a estas
exigências, rapidamente se torna obsoleto para os padrões requeridos, sendo substituído por outro melhor
qualificado, que se propõe a receber menor salário.
Ricardo Antunes (1995) analisa que a atual tendência do mercado de trabalho é reduzir o
número de “trabalhadores centrais” e empregar cada vez mais uma força de trabalho que entre facilmente e
é demitida sem custos.
André Gorz (1990) acrescenta que 35 a 50 % da população trabalhadora britânica,
francesa, alemã e norte americana encontra-se desempregada ou desenvolvendo trabalhos precários,
pós-industrial. No Brasil o percentual de trabalhadores que trabalham no mercado informal chega a 60%
(sessenta por cento).
O projeto de flexibilização da economia, denominado no Brasil de “Qualidade Total”, tem
com objetivo a conquista de novos mercados, aumento da produtividade e lucratividade, implantação da
“produção enxuta” e desperdício zero. Porém há uma tendência a um certo antagonismo: se por um lado,
por conta do atraso industrial, promoveu-se a possibilidade de redução de desperdício, incentivo à
produtividade, por outro lado corria-se um risco de não obter êxito por conta do grande atraso tecnológico
em relação aos países industrializados e um índice de escolarização dos trabalhadores da indústria,
contribuindo para a carência de mão-de-obra especializada.
Werner Market aborda a questão das transformações no mundo do trabalho, quando
teoriza sobre a "Lean Prodution" (produção enxuta) como uma nova roupagem do capitalismo em mutação,
afirmando que somente com uma reforma efetiva na educação será possível promover uma transformação
qualitativa na qualificação para o trabalho, com a participação dos trabalhadores promovendo uma
revolução de fato, priorizando a qualidade de vida do trabalhador.
Segundo Thompsom (1987), é o fazer que identifica a classe, com homens reais, vivendo
suas experiências cotidianas . E essas experiências, absolutamente, não podem ser todas elas traduzidas
apenas através de movimentos políticos, ou no partido, associação ou sindicatos etc. O seu movimento no
cotidiano, de se fazer historicamente, está presente em todas as suas ações, considerando que o
movimento social é mais amplo que o operário.
André Gorz enfatiza que o esforço dos trabalhadores para terem poder sobre o processo
de trabalho esbarra com a rápida obsolescência do saber técnico e com a insuficiência dos conhecimentos
obtidos. Donde, conclui o autor, a necessidade que tem o movimento operário de recuperar e transformar a
função de escola e da ciência.
CONCLUSÃO
Como produtores de cultura que somos, por profissão, temos que construir estratégias
questionadoras e transformadoras do próprio processo de produção no qual estamos inseridos. Em
qualquer circunstância sabemos que a resposta só pode ser global, de modo a unificar o que o capitalismo
procurou dividir: os operários entre si, mundo da produção e da cultura, escola e fábrica, estudantes e
trabalhadores. Em seus estudos sobre a “scholé”, Antônio Gramsci insere a idéia do trabalho como
princípio educativo. Ele concebe a escola como suspensão do trabalho produtivo, não representando
contudo uma fuga, negação ou esquecimento do trabalho. A escola, para Gramsci se estrutura ao redor do
conceito trabalho, entendido como processo de desenvolvimento científico, criativo e ético de história dos
homens. O instrumento do trabalho para a escola unitária de Gramsci é um feixo de relações políticas,
sociais e produtivas. É sobretudo a possibilidade concreta de liberdade universal. Ao referir-se à escola,
diz: “Nossa idéia central era: como podemos nos tornar livres?".
Eis o nosso desafio.
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