2 Regional AÇORIANO ORIENTAL TERÇA-FEIRA, 17 DE MARÇO DE 2015 Quando o papel é mais do que um suporte para a tinta EDUARDO RESENDES RODRIGO CABRITA/DN O papel é também o suporte de transístores criados em Portugal que poderão ser usados em ecrãs de papel e pacotes inteligentes ANA CARVALHO MELO [email protected] A equipa de investigação do CENIMAT/I3N da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa desenvolveu os primeiros transístores em papel provando que “o papel é muito mais do que um suporte para tinta”. Esta inovação anunciada em 2008 tem diversas aplicações que já estão a ser trabalhadas com empresas nacionais e estrangeiras, como referiu ao Açoriano Oriental Elvira Fortunato que liderou a equipa responsável por esta inovação e esteve em Ponta Delgada a participar em conferência promovida pelo Instituto da Defesa Nacional (IDN). “Os transístores de papel podem ser aplicados em embalagens inteligentes em que a própria embalagem em papel ou cartão já tem uma componente eletrónica”, explicou, frisando que estes transístores garantem aplicações que hoje em dia são caras. Estes transístores em papel podem ser usados, por exemplo, em sensores de temperatura ou humidade que podem estar presentes em produtos que necessitem de uma monitorização constante como o transporte de vacinas. mas também em ecrãs de papel, etiquetas, chips de identificação ou aplicações médicas. O Departamento de Ciência dos Materiais (CENIMAT/I3N) da Universidade Nova de Lisboa está atualmente a trabalhar na aplicação desta tecnologia com empresas como a Portucel, estando ainda ligada a projetos europeus com empresas da Suécia e Finlândia. Mas o que é um transístor de pa- Laboratório da equipa do CENIMAT/IN da Faculdade de Ciências e Tecnologia também conhecido pelo resto da população. “Eu viajo pelo país inteiro e vou a escolas que me convidam para falar de ciência mas isso ainda é pouco”, disse Elvira Fortunato, apelando: “Temos de fazer mais para levar a ciência aos professores e aos alunos”. Já sobre a relação entre a ciência e as empresas, a professora catedrática afirmou que ainda “há um longo caminho a percorrer” mas que a ideia de divórcio entre investigação e indústria “está ultrapassada”. Elvira Fortunato liderou a equipa responsável por esta inovação pel? Como explicou Elvira Fortunato todos os transístores são formados por três componentes: metais, materiais isolantes como o vidro e materiais semicondutores como o silício. No caso do transístor de papel, aproveitaram-se as propriedades isolantes do papel para integrar o transístor. Refira-se que um transístor é um dos blocos fundamentais da eletrónica moderna, sendo os equipamentos que vieram substituir as válvulas nos anos 40. Estão hoje presentes nos circuitos integrados da maioria dos dispositivos eletrónicos que usamos todos os dias. Assim os transístores podem realizar todas as funções das válvulas eletrónicas: amplificadores, detetores, retificadores, osciladores, entre outros, com a vantagem de apresentarem um consumo desprezível, melhor fiabilidade, ausência de aquecimento, dimensões incomparavelmente menores, custos de produção muito baixos e, nas suas versões especiais, uma capacidade interna semelhante à das válvulas para correntes de muito alta frequência. Esta inovação desenvolvida pela equipa de investigação do CENIMAT/I3N tem sido amplamente reconhecida pela comunidade científica, faltando um trabalho de divulgação científica para que seja CENIMAT/I3N está a trabalhar na aplicação desta tecnologia com empresas como a Portucel Mesmo assim refere que há barreiras a ultrapassar. “Ainda existe muito a ideia de que as universidades são umas torres de marfim e que os investigadores estão a estudar umas coisas que não têm muito a ver com a realidade ou que são coisas que não interessam pelo menos no imediato”, disse, acrescentando que “hoje em dia essa barreira não existe e nós trabalhamos muito com empresas porque temos de prestar um bom serviço à sociedade em vários níveis”. Por outro lado e enquanto investigadora, Elvira Fortunato revela a sua preocupação com a falta de investimento em ciência no nosso país. “É evidente que eu sou sensível ao facto que tivemos uma troika e que o investimento diminuiu e que áreas como a Educação e a Saúde são prioritárias, mas tem de haver uma base para a Investigação porque senão em termos futuros vamos pagar uma fatura muito elevada”, disse. Neste contexto, frisando que tem de haver um patamar base, destacou que é preciso “ser mais competitivos” e “apostar mais em diversificar as nossas fontes de financiamento na investigação” “No passado muitos de nós estávamos dependentes praticamente só dos dinheiros públicos. Hoje em dia isso deixou de ser possível”, declarou. Mesmo assim e revelando ser uma pessoa positiva diz que a diminuição do financiamento pode trazer consequências positivas. “O facto de diversificarmos as nossas fontes de financiamento, permite fazermos contratos com empresas que ficam a conhecer o nosso trabalho. Ou quando temos que concorrer a projetos internacionais, ficamos a conhecer parceiros de outros países o que garante um enriquecimento muito grande”, exemplificou, frisando: “O financiamento caiu imenso mas não podemos ficar parados”. PUB