RESSOCIALIZAÇÃO NO BRASIL: A UTOPIA ATUAL E A EXPECTATIVA DE UMA REFORMA
PENITENCIÁRIA
SMANIOTTO, Camila Nava1
CARDOSO, Gabriella Mioto Pontual2
BEAL, Jéssica Marina3
DIAS, Anderson4
RESUMO
O presente artigo busca explorar as maneiras de ressocialização dos detentos utilizadas atualmente nas penitenciárias brasileiras, em especial a
remição pela leitura, tendo como pioneira a Lei Estadual nº 17.329/2012, que foi criada com amparo no artigo 126, “caput”, da Lei de Execução Penal
– Lei 7.210/84. É facilmente perceptível que a simples privação de liberdade de um delinquente não contribui em nada para sua reinclusão social nem
reabilitação, sendo necessários, desta forma, veículos que possam propiciar a reflexão social, assim como oficinas que estimulem a criatividade ou
subsídios necessários para uma futura profissionalização. Sabe-se que as alternativas subjetivas como a psicologia, religião e filosofia representam os
mais fortes caminhos de reabilitação dentro das penitenciárias, no entanto, é necessário investir em métodos como arte, produção de resenhas e no
ensino técnico de modo que possa abarcar os mais variados grupos de encarcerados.
PALAVRAS-CHAVE: Ressocialização, remição, leitura, reinclusão, reflexão.
RESOCIALIZATION IN BRAZIL: THE CURRENT UTOPIA AND THE EXPECTATION OF A NITENTIARY REFORM.
ABSTRACT
This article is intended to explorer the commonly ressocialization’s ways of inmates used nowadays in the Brazilian’s penitentiaries, specially the
redemption for reading, having pioneered by the state law nº 17.329/2012, it was created with support of the article 19, “head”, of the criminal law
enforcement – Law 7.210/84. It’s easily perceptible that simple offender’s deprivation of freedom does not contribute to the social reintegration or to
rehabilitation, it’s necessary, therefore, vehicles that may provide social reflection, as well as workshops that encourage creativity or necessary
subsidies for a professional qualification in the future. It’s known that subjective alternatives like psychology, religion and philosophy represent the
strongest rehabilitation’s paths in prisons, however, it’s required to invest in methods like art, review production and technical education that it may
embrace the most various groups of prisoners.
KEYWORDS: Resocialization, remission, reading, reintegration, reflexion.
INTRODUÇÃO
O artigo consiste em um estudo sobre as formas e benefícios da ressocialização para o presidiário, fazendo um
resgate histórico sobre a evolução das penas e do sistema penitenciário. A escolha por este tema se deu pelos vários
questionamentos feitos através do estudo de livros como Vigiar e Punir, de Michel Foucault, e Dos delitos e das penas,
de Cesare Beccaria; através deles, acompanhamos a diminuição de penas severas e uma mudança na função do sistema
penitenciário, que além de punir os indivíduos que cometessem um crime, caracterizado por ato ilícito, típico e
culpável, passou a preveni-los. Mas com essa mudança na finalidade das penas e método do sistema carcerário, como a
reincidência criminal é tão grande ainda?
Verificamos em nosso país, por exemplo, que os indivíduos encarcerados vivem em condições extremamente
precárias e desumanas, com falta de estrutura para abrigar tantos delinquentes e uma higiene de péssimas condições. Por
mais que um indivíduo tenha cometido um delito e desrespeitado nosso ordenamento jurídico, ele não deve ser visto
como um inimigo do Estado, já que nosso art. 5ª da Constituição Federal garante que
Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros
residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade.
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Acadêmica – Faculdade Assis Gurgacz
Acadêmica – Faculdade Assis Gurgacz
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Acadêmica – Faculdade Assis Gurgacz
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Docente orientador – Faculdade Assis Gurgacz
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DESENVOLVIMENTO
FINALIDADE DAS PENAS
Para retratar a finalidade da pena, antes de tudo, faz-se necessário buscar o sentido etimológico da palavra. O
significado da palavra pena (do latim poena), pode ser definida como " Castigo, punição; modo de repressão, pelo poder
público, à violação da ordem social." (MICHAELIS, 2004). Todavia, no direito penal pena é a “a sanção aflitiva
imposta pelo Estado, mediante ação penal, ao autor de uma infração (penal), como retribuição de seu ato ilícito,
consistente na diminuição de um bem jurídico, e cujo fim é evitar novos delitos.", como citado por Damásio de Jesus
(2013).
Contudo, não se deve confundir pena e medida de segurança: ambas são espécies de sanção penal, porém a pena
é prevista aos imputáveis, enquanto a medida de segurança é aplicada aos inimputáveis (citados no art. 27 e 28 do
Código Penal).
A origem das penas tem-se ainda no período primitivo do direito penal, onde os homens viviam em tribos e as
regras não eram escritas, apenas baseadas nos costumes e crenças da sociedade até então não organizada. Atribuíam a
pena um caráter divino, não existindo proporcionalidade entre elas e à agressão, predominando prática de pena de morte
e tortura. A pena era vista como modo de defesa social e um meio de vingança; desconhecia-se o princípio da
culpabilidade, portanto o único requisito para haver punição era existência de um nexo de causalidade entre a conduta e
o resultado. Em um estado de natureza onde até então os homens viviam isolados e em seu estado natural, as leis (e
consequentemente as penas) surgiram o intuito de criar um estado civil onde os homens conseguiriam viver em
sociedade graças à elas. Contudo, com o passar do tempo, a pena foi perdendo seu caráter de castigo com a prática de
punições severas; o filósofo Michel Foucault, em obra Vigiar e Punir, afirma que houve uma pacificação das forças
jurídicas, já que a partir de então o corpo não é mais punido através do uso de violência, mas sim com a privação de sua
liberdade, seu maior bem, pois como cita Cesare Beccaria, autor de Dos delitos e das penas:
É melhor prevenir os crimes do que ter de puni-los; e todo legislador sábio deve procurar antes impedir o mal do
que repará-lo, pois uma boa legislação não é senão a arte de proporcionar aos homens o maior bem estar possível e
preservá-los de todos os sofrimentos que se lhes possam causar, segundo o cálculo dos bens e dos males da vida.
(BECCARIA)
Com a intenção de conceituar os fins da pena, a doutrina adotou três teorias. A teoria absoluta, que impõe um
castigo como forma de retribuição pelo crime realizado; a teoria utilitária ou relativa, onde pune-se como modo de
prevenção; e teoria mista, em que pune-se porque pecou e para que não. Nosso ordenamento jurídico a partir de 1984
adotou a pena como de natureza mista: tanto retributiva como preventiva, conforme apresenta o art. 58, caput, Código
Penal.
A EVOLUÇÃO DAS PENAS
Desde os primórdios, o homem infringe as regras de convivência, sendo que, para garantir a paz e a tranquilidade
em sociedade surgem as punições contra os atos ilícitos. Assim, o direito penal vem com esse intuito de proteção dos
bens mais importantes e necessários para a própria sobrevivência da sociedade, através da prevenção por intimidação e
ressocialização, seguindo o princípio da intervenção mínima, visando, assim,
No período da chamada Vingança Privada não havia proporcionalidade entre a pena e a agressão, e o quesito da
culpabilidade ainda não era levado em conta. As penas eram como uma reação do instinto, imperando a vingança de
sangue e, mais tarde, a lei de Talião "olho por olho, dente por dente", fazendo com que o crime cometido e a sanção
destinada ao infrator passassem a ser na mesma medida. No Direito Canônico, a igreja e o poder estão interligados,
surgindo a santa inquisição, onde valia usufruir de todos os meios (inclusive a tortura )para extrair a confissão.
Na segunda fase de vingança penal, a vingança divina, o castigo era aplicado pelo sacerdote que recebia uma
delegação divina, e a pena era vista como um castigo. As legislações típicas dessa fase eram o Código de Manu
(Babilônia), Cinco Livros (Egito), Livro das Cinco Penas (China) e por fim Avesta (Pérsia).
A Vingança Pública é marcada pela perda do caráter sacro da pena, e transformou-se em sanção imposta em
nome da autoridade pública, devido a separação de Estado e Igreja. A pena de morte era o principal instrumento de
dominação, e o acusado não tinha o direito de saber do que estava sendo acusado e não existia o direito de defesa.
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Com a chegada da República Romana, o Estado passa a exercer o poder de punir. Já no direito germânico há a
utilização das ordálias (onde o acusado submetido a provas, tais como, caminhar no fogo, caso ele sobrevivesse era
considerado inocente) No inicio do Iluminismo com os pensamentos de Montesquieu, Beccaria, Voltaire entre outros
surge a preocupação da racionalização na aplicação das penas. A pena passa a ser usada para prevenir delitos e não
apenas castigar. Estes pensamentos iluministas se concretizaram em 1789 com a Declaração dos Direitos do Homem e
do Cidadão.
Após a Revolução Francesa, estabelece-se no mundo todo, a pena privativa de liberdade. A partir do sistema
idealizado por Guilherme Penn, fundador da colônia da Pensilvânia, as penas privativas de liberdade surgiram como
formas de buscar a ressocialização.
EVOLUÇÃO DAS PENAS NO BRASIL
Os portugueses aos descobrirem o Brasil encontraram uma terra habitada por índios, sem um direito penal
organizado e civilizado. Inspirados na vingança privada, as penas eram aleatórias e cruéis.
As legislações portuguesas foram instaladas no Brasil, sendo a mais longa delas as Ordenações Filipinas, que
previam penas cruéis e desproporcionais. O Código Criminal do Império em 1830 configurou uma legislação mais
humanizada, criando institutos (como, por exemplo, o dia-multa) até hoje utilizados pelo direito brasileiro.
Na redação de nossa Constituição Federal, percebemos a proibição de uma série de penas (citadas no artigo 5º,
XLVII) por ferirem a dignidade da pessoa humana e fugir de sua função preventiva, já que o Estado deve encontrar um
limite na sua função de punir e evitar penas cruéis como são retratados no livro “Vigiar e Punir” de Michel Foucault,
onde as pessoas assistiam aos suplícios. Assim as penas adotadas pelo nosso ordenamento jurídico estão descritos no
mesmo artigo, e divididas em três espécies de regimes penitenciários, conforme o art 33, caput, do Código Penal:
regime fechado, regime semiaberto ou regime aberto.
A EVOLUÇÃO DO SISTEMA PENITENCIÁRIO
A maior parte das sociedades ocidentais até o período renascentista não possuía nenhuma preocupação com
algum tratamento para a reabilitação de um criminoso. Mesmo porque geralmente o infrator era visto como
irrecuperável, sendo mais coerente, assim, condená-lo à morte ou privá-lo de sua liberdade – que era considerada um
castigo pior que a morte, já que uma execução na guilhotina provocava menos tempo de sofrimento que ser trancafiado
em um calabouço, sem direito nem mesmo às necessidades básicas como alimentação e higiene. O sistema prisional
provém de uma série de reformas, discussões e mudanças de pensamentos ao longo do tempo. Seu apogeu se deu no
século XIX e, a partir do século XX, surgiram as primeiras preocupações em ressocializar os criminosos, passando a ter
uma visão mais crítica quanto aos direitos dos presos e os benefícios que a reabilitação poderia trazê-los – ainda que até
nos dias atuais as discussões sobre a melhor forma de executar projetos de ressocialização permanecerem repletas de
falhas.
A EVOLUÇÃO DO SISTEMA PENITENCIÁRIO NO BRASIL
A base adotada pelo Brasil quanto ao sistema seguido na organização penitenciária é conhecido como sistema
progressivo ou irlandês. Nele, há três pilares que devem ser seguidos: isolamento, trabalho em conjunto e livramento
condicional. Historicamente, o sistema penitenciário nacional se origina da exclusão social, que, apesar de atualmente
ter sido teoricamente derrubada, continua na prática.
A partir do século XIX surgiram prisões que continham celas individuais, oficinas de trabalho e um modelo
próprio para a pena de prisão. Quando o Código Penal de 1890 foi estabelecido, tornou-se possível afirmar novos
modos prisionais, junto com reformas quanto ao máximo tempo de condenação e o trabalho obrigatório. Por fim,
começaram a aparecer pavilhões isoladas com um determinado número máximo de presos a cada unidade, dependendo
da área estabelecida.
Existem no Brasil três tipos de regimes penais, sendo eles o fechado, semi-aberto e aberto. No tocante da ideia
de ressocialização dentro do sistema privativo de liberdade, o que mais se enquadra e apresenta plausível para esse tipo
de atividade é o semi-aberto, justamente por ter a preocupação de reintegrar ao longo do tempo o condenado dentro da
própria cadeia e prevenir futuras ações criminosas. Essa modalidade geralmente é denominada Colônia Agrícola,
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Industrial ou Similar, e o condenado ganha o direito de visitar e participar de cursos educacionais e profissionalizantes
dentro do estabelecimento. Essa permissão é embasada no art. 1º da Lei de Execução Penal, que afirma: “Efetivar as
disposições da sentença ou decisão criminal e proporcionar condições para a harmônica integração do condenado e do
internado”.
Com a facilitação do acesso à justiça e aumento do número de processos, o número de presos triplicou e foi
necessário ampliar o número de unidades prisionais no Brasil, mas ainda assim a superlotação, revoltas e rebeliões
persistem. Inclusive porque há um descompasso quanto à procura da justiça: a população passou a compreender melhor
como fazer uso dela, mas o acesso dos presos a assistência judiciária é mínima, gerando mais tempo na prisão e
consequente superlotação. De acordo com uma investigação de agressão aos direitos humanos dentro das prisões,
realizada pela Anistia Internacional, foram alegados diversos casos de maus tratos e péssimas condições de
sobrevivência dentro das prisões. Além disso, uma das maiores dificuldades são a rejeição dos próprios presos com os
outros que praticaram crimes contra crianças, crimes sexuais e matricídios, causando uma hostilidade intensa e
dificultando a sociabilidade desse tipo de detento. Também existe a discriminação aos travestis e homossexuais, e não
há nenhum tipo de tentativa de mudar essa mentalidade, uma vez que a “lei da cadeia” é tolerada mesmo pelas
autoridades. Na maior parte dos presídios também não há uma política estabelecida para a assistência médica dos
detentos, fazendo fácil o contágio de moléstias. Por mais que o sistema prisional tenha evoluído, ainda existem vários
pontos a serem revistos e melhorados.
A PRISÃO E AS CONSEQUÊNCIAS PARA O ENCARCERADO
A pena privativa de liberdade no ocidente existe desde a Idade Média, no entanto, não era utilizada como
principal artifício de controle social e proteção aos bens jurídicos tutelados pelo Estado. Eram geralmente destinadas à
detenção de inimigos da Igreja, e possuíam uma conotação distinta por geralmente deixar o condenado à míngua, sem
nenhuma garantia de sobrevivência ou direito de defesa. Conforme a evolução do Direito Penal, grande parte das
sociedades ocidentais foi aos poucos abrindo mão dos castigos corporais e pena de morte e seguindo a proposta
defendida por Foucault: a criação das prisões, agora não mais para isolar apenas os inimigos da Igreja, mas também
aqueles que ameaçavam a paz e a segurança da sociedade. Pela prevenção especial negativa existe uma neutralização
daquele que praticou a infração penal, neutralização que ocorre com a sua segregação no cárcere (GRECO, 2009, p.
490).
Ainda que seja o modelo mais aceitável de acordo com o princípio da dignidade da pessoa humana, as
consequências psicológicas e sociais do encarceramento são graves, o que necessita de uma intensa discussão e cuidado.
Já dizia Foucault que “Castigos como trabalhos forçados ou prisão – privação pura e simples da liberdade nunca
funcionou sem certos complementos punitivos referentes ao corpo: redução alimentar, privação sexual, expiação física,
masmorra” (FOUCAULT, 1975, p. 18), sendo assim, pela lógica do poder punitivo, ao passo que é mais efetivo para o
controle do detento submetê-lo a condições de perda, também é mais difícil trabalhar com a sua reabilitação e
ressocialização, já que intensificam o medo, a sensação de perigo e a tensão dos encarcerados. Ao longo do tempo do
cumprimento da pena, o sistema prisional cria uma dependência entre o pensamento dos encarcerados com a realidade
presente, os impossibilitando de obter uma visão ampla da sociedade a qual anteriormente viviam e restringindo suas
reflexões – o que causa um sentimento de desconfiança e distorção da realidade no momento em que se tornam livres
novamente. Quando se tratam dos presídios de segurança máxima, os danos são ainda maiores, com a chance de
provocar uma deterioração psicológica grave e despreparando o condenado para a vida social – o que pode se converter
na potencialização da vontade de executar novos atos criminosos e comportamentos antissociais mais graves que antes
da privação da liberdade.
Um exemplo clássico de ilustração dos maus efeitos psicológicos a partir da privação da liberdade foi o do
experimento de aprisionamento de Stanford, em 1971. Esse experimento, liderado pelo professor Philip Zimbardo, da
Universidade Stanford, tinha como objetivo criar uma simulação de uma prisão com voluntários, que se dividiam com
papéis fictícios de guardas e prisioneiros. Ainda que essa privação de liberdade tenha sido puramente experimental e
fantasiosa, os resultados se mostraram tão dramáticos e catastróficos que a pesquisa necessitou ser encerrada antes do
seu prazo de término. Pessoas que nunca haviam demonstrado nenhum desvio de conduta passaram a ter um
comportamento autodestrutivo, violento e antissocial extremo, o que provocou a falta de controle do grupo pesquisador.
E esses resultados vieram de ambos os lados: os voluntários que aceitaram o papel de guardas começaram a mostrar um
comportamento sádico de humilhação e tortura aos falsos prisioneiros. Sabe-se que o preso perde direitos básicos que
possui desde o nascimento, como a liberdade, interação familiar, direito de ir e vir e inclusive da autoimagem – é
também é válido ter a consciência que quando uma pessoa é detida, passa a ter um uniforme próprio e um número de
registro, como se perdesse a sua individualidade e se igualasse aos demais. No Brasil ainda há as complicações da
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superlotação, péssimas condições de sobrevivência, falta de atendimento médico e diversos outros pontos que afrontam
as garantias da Lei de Execução Penal, em seu artigo 10º: “A assistência ao preso e ao internado é dever do Estado,
objetivando prevenir o crime e orientar o retorno à convivência em sociedade”.
Gustave Le Bon por meio da teoria da desindividualização argumentou que os indivíduos de um grupo coeso,
quando possuem o caráter de multidão, têm a tendência de perder a sua identidade pessoal, consciência, senso de
responsabilidade e outros sintomas, dando força para aumentar as condutas antissociais. Logo, torna-se imprescindível o
acompanhamento psicológico voltado a maior interação social e consciência individual para evitar que a prisão,
originalmente destinada à potencial recuperação do indivíduo, se torne a mola propulsora para o agravamento de
comportamentos potencialmente lesivos à sociedade.
FORMAS DE REMIÇÃO
A Remição penal é um benefício concedido ao apenado que cumpre a pena em regime fechado ou semiaberto,
diminuindo o tempo de permanência do condenado na instituição prisional, desde que cumpra os requisitos estipulados.
No Brasil o direito de remição de penas está assegurado na Lei 7.210 de 11 de julho de 1984, conhecida como Lei de
Execução Penal – LEP, regulamentada pelos artigos 126 a 130.
A remição deve ser decretada pelo juiz, ouvindo o representante do Ministério Público e a autoridade
administrativa do presídio onde o condenado cumpre a pena e, por isso, deve ser conduzido ao Juízo das Execuções um
relatório mensal relatando os dias trabalhados pelo preso.
O intuito da remição é ressocializar o individuo, que um dia viveu em sociedade porém, cometeu uma atitude
ilícita (crime), para que este no cumprimento de sua pena, seja reintegrado na sociedade, sem reincidência de delitos . A
mais conhecida forma de remição é a que, a cada 3 (três) dias trabalhados o condenado diminui 1 (um) dia de pena ,com
jornada de seis a oito horas, trata-se de um pagamento, segundo afirma Fernando Capez (2004, p. 111), e não um perdão
ou indulgência. Detalhes como período da sua jornada de trabalho e em que regime será aceito o trabalho externo estão
elencados na seção I, II e III da Lei de Execução Penal.
O artigo 6º da Constituição Federal de 1988 determina que o trabalho seja um direito social fundamental de todo
ser humano. Fundamentado neste artigo as penitenciarias brasileiras, incluíram o trabalho como forma, de reabilitar os
condenados.
[...] o trabalho acaba com a promiscuidade carcerária, com os malefícios da contaminação dos primários, pelos
veteranos delinquentes, e dá ao condenado à sensação de que a vida não parou e ele continua a ser útil e produtivo,
além de evitar a solidão, que gera neuroses, estas por sua vez, fator de perturbação nos estabelecimentos penais e
fermento de novos atos delituosos. (MEDEIROS, 1985, p. 61).
O encarcerado que trabalha não está amparado pelo regime da Consolidação das Leis do Trabalho. Porém, terá
direito a remuneração em forma de pecúlio, conforme dispõe o artigo 29 da Lei de Execuções Penais:
Art. 29. O trabalho do preso será remunerado, mediante prévia tabela, não podendo ser inferior a 3/4 (três
quartos) do salário mínimo.
§ 1° O produto da remuneração pelo trabalho deverá atender:
a) à indenização dos danos causados pelo crime, desde que determinados judicialmente e não reparados por outros
meios;
b) à assistência à família;
c) a pequenas despesas pessoais;
d) ao ressarcimento ao Estado das despesas realizadas com a manutenção do condenado, em proporção a ser fixada e
sem prejuízo da destinação prevista nas letras anteriores.
§ 2º Ressalvadas outras aplicações legais, será depositada a parte restante para constituição do pecúlio, em Caderneta de
Poupança, que será entregue ao condenado quando posto em liberdade.
O apenado pode cumprir trabalho interno ou externo da unidade, dependendo do regime prisional em que estiver
cumprindo pena.
Em abril de 2013, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, anunciou ser possível conceder aos presos a
remição de pena pela leitura. No Estado do Paraná, com a publicação da Lei Estadual nº 17.329/2012, que foi criada
com amparo no artigo 126, “caput”, da Lei de Execução Penal – Lei 7.210/84. A remição da pena por estudo, através da
leitura disponibiliza 01 (um) exemplar de obra por mês, com um prazo de 20 (vinte) dias para a leitura do livro, ao final
deste período o preso deve entregar uma resenha a respeito da obra lida. As resenhas serão orientadas e avaliadas por
equipe de docentes de Língua Portuguesa, e levará em conta a estética, dignidade e a moral do texto. Ao fim se a
resenha for aprovada, o apenado terá 4 (quatro) dias de redução de pena. O argumento é a de que a leitura tem função de
construir conhecimento, além de diminuir consideravelmente a ociosidade dos presos e possuir caráter ressocializador.
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Segundo Foucault, a maior parte dos condenados no mundo possui um nível educacional mais baixo se
comparado a media nacional do país. Com isso verificamos que a educação é uma parte extremamente necessária no
sistema penitenciário, e também vem sendo uma maneira de ressocialização adotada pelos Estados brasileiros. Assim, o
sistema carcerário oferece assistência educacional para seus detentos, cujos detalhe estão especificados na Seção V da
LEP.
O estudo é atividade essencial para o ser humano se desenvolver intelectualmente, especialmente para o detento
que precisa de um bom preparo que o ajude a se reinserir na sociedade e no mercado de trabalho, A medida reduz um
dia de privação de liberdade a cada 12 horas de frequência escolar, e apesar da LEP não prever a remissão pelo estudo,
vemos que esta remissão traz bons resultados.
Viabilizar o estudo do preso é seguramente uma das formas mais importantes de aproveitar seu tempo ocioso com
possibilidade de efetivo trabalho ressocializador. Muitas vezes, inclusive, suprindo uma carência que ele traz
consigo da vida livre. (MICHELS)
A penitenciaria industrial de Cascavel (PIC) – PR encontrou na música um meio de ressocializar os presos,
através do projeto “A música como instrumento de reinserção sociocultural e humanização da pena”. Os presos têm
duas horas de aula por dia, de segunda a sexta-feira.
A Penitenciária de Três Corações-MG em 2012, usou uma maneira de contribuir com a área cultural da cidade,
inserindo a mão de obra de dez detentos, na construção de uma réplica da casa onde nasceu o maior jogador de futebol
do mundo, o Pelé. Pelo trabalho, os detentos recebem ¾ do salário mínimo, e a cada três dias trabalhados, eles
diminuem a pena em um dia. Dionatã Gouvêa cumpre pena por roubo há seis anos, e é um dos detentos que trabalha na
construção da casa do Pelé ele diz: “É uma forma digna de mostrar para a sociedade que nós erramos, mas somos
capazes de nos recuperar. Nunca vou me esquecer, fiz parte dessa história”.
Através deste depoimento vemos a importância da remissão para o psicológico de um detento, afinal mesmo
estando encarcerado ele se sente parte da sociedade. A ressocialização foi à maneira encontrada pelo direito penal de
garantir a paz e a tranquilidade em sociedade; o objetivo é garantir uma reestruturação psicossocial no infrator, para que
ele não venha a reincidir no crime.
O PAPEL E O BENEFÍCIO DA RESSOCIALIZAÇÃO
A Lei de Execução Penal apresenta em sua redação uma grande diversidade de formas de recuperação do
carcerário, apresentando em seu art. 11 suas formas de assistência, como: material (alimentação, vestuário e estrutura
higiênica), saúde (atendimento médico, farmacêutico e odontológico), jurídica (para os presos sem condições
financeiras para constituir advogado), educacional, social e religiosa, contribuindo para que uma rotina agradável na
prisão e um egresso harmonioso. Além de facilitar a ressocialização do indivíduo, Foucault escreve que a rotina no
sistema penitenciário é boa para o mesmo se ocupar e se exaustar até o final do dia, não sobrando muito tempo para
pensar e, consequentemente, planejar crimes.
Mais de 90% dos presos no Brasil são analfabetos ou semianalfabetos, e o restante, na sua maioria, não tiveram
oportunidades de concluir seus estudos. Tais dados nos comprovam que a baixa escolaridade está intimamente ligada à
criminalidade, fazendo-se necessário, assim, levar a educação para dentro do sistema penitenciário. O indivíduo que não
estuda não tem a oportunidade de amadurecimento, desenvolvimento da reflexão, pensamento crítico e
responsabilidade, e consequentemente terá dificuldades no mercado de trabalho competitivo que enfrentamos hoje, onde
só os que se destacam obtém sucesso em sua carreira. Com a preocupação da ressocialização do encarcerado, é
importante não só o desenvolvimento do estudo para eles, mas também do trabalho. Este desperta o sentimento de
competitividade no indivíduo, evita o ócio, de se sentir útil para o sustento familiar; ao sentir essa auto realização, a
tendência dele à crescer profissionalmente é muito maior que a reincidir criminalmente. O Prof. Zacarias (2006, p. 61)
ressalta que:
O trabalho é importante na conquista de valores morais e materiais, a instalação de cursos profissionalizantes
possibilita a resolução de dois problemas, um cultural e outro profissional. Muda o cenário de que a grande
maioria dos presos não possui formação e acabam por enveredar, por falta de opção, na criminalidade e facilitam a
sua inserção no mercado de trabalho, uma vez cumprida a pena. (ZACARIAS)
Além de tais assistências, é direito do preso o exercício de atividades artísticas também (lamentavelmente pouco
usadas em nosso país). Por meio de tais atividades o preso encontra uma forma de recuperar sua autoestima e
desenvolver talentos até então não explorados. A diretora de atendimento do Centro Cultura de Ipatinga ressalta como
essa forma de ressocialização é positiva para o encarcerado: “percebemos uma melhora no comportamento dos que
apresentavam problemas de disciplina, eles sentem-se mais confiantes em relação ao futuro e felizes por aprenderem
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uma nova atividade”. O trabalho é tão importante para eles, que alguns mesmo após receber seu alvará de soltura
continuaram com o mesmo, sendo até usado como uma forma de geração de renda para a família.
A assistência social e o trabalho de psicólogos vêm com o papel de conhecer e ajudar o preso, reconhecendo os
problemas enfrentados por ele no seu meio familiar, social e pessoal, examinando sua personalidade e motivos que
dificultem seu egresso a sociedade. Esse atendimento ao preso é dado em particular - onde é analisado sua situação e
comportamento no estabelecimento - bem como em grupo, na busca de uma interação positiva entre os detentos. Um
dos principais papeis da assistência é fortalecer os vínculos familiares, já que a família tem extrema importância na
ressocialização do sentenciado; é a primeira sociedade que o indivíduo participa, auxiliando no seu processo de
formação psíquica bem como de seus valores. Com esse mesmo intuito de recuperar valores, a Pastoral Carcerária vem
para ajudar os presos que encontram na fé um caminho para a mudança e reintegração a sociedade. Por meio de seu
objetivo de “anunciar o Evangelho de Jesus Cristo às pessoas privadas de liberdade e zelar para que os direitos e a
dignidade humana sejam garantidos no sistema prisional.”, realiza atividades como visitas aos presos, sensibilização e
diálogo com a comunidade sobre os problemas dos presos e conscientizá-la, além de intermediar relações entre os
presos e seus familiares.
Com o objetivo de reintegrar o egresso do sistema penitenciário através da participação da comunidade, a
FAESP (Fundação de Apoio ao Egresso do Sistema Penitenciário) foi criada no Rio Grande do Sul com a justificativa
de diminuição da violência e reincidência por meio da solidariedade. Sua missão concentra-se em reintegração social
oferecendo suporte de saúde, educação e retorno ao mercado de trabalho, entre outros.
O que é preciso que todos tomem consciência é de que o preso não é um problema somente do governo. O preso é
um problema também da sociedade. Ele vai cumprir a pena e depois de cumpri-la vai sair. A sociedade tem de
estar preparada para recebê-lo de volta e recolocá-lo em seu meio. Enquanto estivermos tratando o preso como um
problema dos outros, e não nosso como sociedade, estaremos enfrentando esses índices alarmantes de reincidência
e criminalidade que ninguém dá conta. (BITTENCOURT)
É de conhecimento que o hábito da leitura traz muitos benefícios ao leitor: seu exercício trabalha a capacidade de
raciocínio e solução de estratégias no dia a dia, estimula a memória e a análise crítica, nos aproxima do mundo e do
autoconhecimento, além de ser um importante fator de socialização. Henry Thoreau diz que “Muitos homens iniciaram
uma nova era na sua vida a partir da leitura de um livro.”, e suas palavras aplicam-se perfeitamente a ressocialização do
encarcerado através da remição pela leitura. Além de diminuir quatro dias de pena do detento para cada trinta dias de
leitura, essa prática ajuda o indivíduo quando fora do sistema penitenciário, permitindo-lhe uma maior segurança quanto
ao falar e redigir.
Possuidor de diferentes visões e análises as quais a leitura o proporciona, o ex-encarcerado estará preparado para
situações às quais antigamente não estaria, nem sabia como agir. Desta forma, terá maior facilidade para adaptação e
tomada de decisões, por exemplo, devido ao conhecimento de mundo que a leitura proporciona. Quanto mais
houver praticado o hábito da leitura, maior facilidade encontrará em combater as dificuldades que vierem a
aparecer.
Tendo como premissa a dignidade humana como qualidade inerente a qualquer ser humano, podemos direcionar
nosso pensamento de modo que mesmo aquele que desconhece tal dignidade, merece tê-la preservada. Desta forma, o
ato de discriminar outrem, por si só, fere esse princípio, tendo em vista que todos são iguais perante a lei; não podendo
ocorrer distinções. A sociedade, ao praticar ato de recriminação contra aquele que saiu da prisão, pratica conduta cruel e
contra um direito fundamental. Desse modo, temos a reabilitação criminal como um direito que deve ser respeitado e
garantido. Assim, a ressocialização acontecerá gradativamente, a medida que a sociedade cede oportunidades para
aqueles que possuem o desejo de recomeçar.
Uma vez que o Poder Público não possui forças para agir sozinho em favor dos indivíduos que estão saindo da
prisão e voltando para seu lar, é dever da sociedade agir. A primeira mudança a ocorrer se resume na desvinculação de
ideias preconceituosas dentre as quais, a de que um condenado não possa ser um bom cidadão. Faz-se necessário apagar
o passado criminoso da pessoa, não devendo esta ser rotulada com má-índole.
CONCLUSÃO
É de conhecimento geral a realidade precária do sistema prisional brasileiro, que vai contra o princípio da
dignidade da pessoa humana tratado em nossa Constituição Federal, bem como o art. 1º da lei de execução penal "A
execução penal tem por objetivo efetivar as disposições de sentença ou decisão criminal e proporcionar condições para
a harmônica integração social do condenado e do internado.", que a princípio asseguraria o cumprimento da pena pelo
indivíduo que cometeu o ato ilícito, bem como sua recuperação e retorno a sociedade.
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Anais do 11º Encontro Científico Cultural Interinstitucional – 2013
ISSN 1980-7406
O maior obstáculo para uma real concretização da lei imposta, é acabar com a política repressiva do Estado; é
inconsciente a atitude de abarrotar os presídios que não possuem condições para tantos detentos, o que prejudica o
processo de recuperação dos mesmos e fere sua dignidade. A ideia de mostrar um Estado atuante por meio da privação
de liberdade de muitos detentos que poderiam cumprir penas alternativas é arcaica, bem como fazer com que a
sociedade veja o sofrimento do delinquente. A maior preocupação do sistema penitenciário deve ser para incorporar as
diferentes políticas aqui apresentadas com o devido acompanhamento psicológico, que não são efetivadas por serem
deixadas em segundo plano.
Como exemplificado no final do filme “Laranja Mecânica”, de nada adiantou o personagem Alex passar por um
tratamento denominado método Ludovico - um doloroso e sofrido modo de ressocialização do criminoso, feito através
da manipulação do cérebro através de drogas e vídeos – quando a mudança precisa ser implantada e ao mesmo tempo
ansiada pelo autor do crime. Como cita Rubem Alves “Quem tenta ajudar uma borboleta a sair do casulo a mata. Quem
tenta ajudar um broto a sair da semente o destrói. Há certas coisas que não podem ser ajudadas. Tem que acontecer de
dentro para fora.”
REFERÊNCIAS
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