O Acidente do Trabalho e a
Responsabilidade Civil do
Empregador
1ª edição — 2003
2ª edição — 2005
3ª edição — 2006
4ª edição — 2008
5ª edição — 2009
6ª edição — 2013
7ª edição — 2014
8ª edição — 2015
JOSÉ CAIRO JÚNIOR
Graduado em Direito e pós-graduado em Direito Processual Civil pela Universidade Estadual
de Santa Cruz — UESC. Mestre em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco — UFPE.
Doutorando pela Universidade Castilla La Mancha (Espanha). Juiz do Trabalho do TRT da 5ª
Região, titular da 3ª Vara do Trabalho de Ilhéus. Professor de Direito e Processo do Trabalho da
Universidade Estadual de Santa Cruz — UESC.
O Acidente do Trabalho e a
Responsabilidade Civil do
Empregador
8ª Edição
R
EDITORA LTDA.
 Todos os direitos reservados
Rua Jaguaribe, 571
CEP 01224-001
São Paulo, SP — Brasil
Fone (11) 2167-1101
www.ltr.com.br
Novembro, 2015
Versão impressa — LTr 5361.3 — ISBN 978-85-361-8633-7
Versão digital
— LTr 8822.8 — ISBN 978-85-361-8625-2
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)
Cairo Júnior, José
O acidente do trabalho e a responsabilidade civil do empregador / José
Cairo Júnior. — 8. ed. — São Paulo : LTr, 2015.
Bibliografia.
1. Acidentes do trabalho — Brasil 2. Empregadores — Responsabilidade
— Brasil I. Título.
15-08653 CDU-347.51:331.823(81)
Índice para catálogo sistemático:
1. Brasil : Acidentes do trabalho : Responsabilidade civil do empregador :
Direito do trabalho 347.51:331.823(81)
2. Brasil : Responsabilidade civil do empregador : Acidentes do trabalho :
Direito do trabalho 347.51:331.823(81)
Dedico este livro
A Waldete Góes Brito, mãe querida, por ter me ensinado a aprender.
A José Cairo dos Santos, pelo amor e compreensão dispensados
a mim durante toda a minha existência.
A Mateus Lutfi Viana Cairo, filho querido e fonte de inspiração.
A Indra Lutfi Viana Cairo, pela sua meiguice e carinho.
A Keyla Karina Ferrari Barbosa (in memoriam), companheira,
amiga e incentivadora, pelos momentos em que teve de ficar
longe de mim por conta do tempo dedicado a esta obra e
por tudo que aconteceu entre nós até aqui.
Agradeço
Primeiramente a Deus, porque sem Ele nada somos e nada podemos.
A Raildes Santos, Gislianne Couto e Manuela Mendonça Lima.
À professora Eneida Melo, pela ajuda, atenção, incentivo e liberdade que
me dispensou durante a elaboração deste trabalho.
Às minhas colegas e amigas Ana Paola Diniz,
Fernanda Viana e Ana Karena.
E, finalmente, ao professor e colega Rodolfo Pamplona Filho.
Sumário
Lista de Siglas..........................................................................................................15
Prefácio — Rodolfo Pamplona Filho.......................................................................17
Nota do Autor à Oitava Edição..............................................................................19
Nota do Autor à Sétima Edição.............................................................................21
Nota do Autor à Sexta Edição................................................................................23
Nota do Autor à Quinta Edição..............................................................................25
Nota do Autor à Quarta Edição.............................................................................27
Nota do Autor à Terceira Edição............................................................................29
Nota do Autor à Segunda Edição..........................................................................31
Nota do Autor à Primeira Edição...........................................................................33
Capítulo I — Responsabilidade Civil.......................................................................35
1 — Escorço Histórico.................................................................................................37
1.1 — Direito antigo...........................................................................................37
1.2 — Direito moderno.......................................................................................41
1.3 — Responsabilidade civil no Brasil.................................................................41
1.4 — Teoria do risco .........................................................................................42
2 — Classificações .....................................................................................................45
2.1 — Responsabilidade civil contratual e extracontratual...................................46
2.2 — Responsabilidade civil e penal...................................................................47
3 — Elementos ..........................................................................................................47
3.1 — Ação ou omissão......................................................................................48
3.2 — Culpa........................................................................................................49
9
3.3 — Dano........................................................................................................50
3.4 — Nexo causal..............................................................................................52
4 — Causas excludentes da responsabilidade ............................................................53
Capítulo II — Acidente do Trabalho ......................................................................55
1 — Conceito ............................................................................................................55
2 — Ampliação legal do conceito de acidente do trabalho.........................................57
2.1 — Doença ocupacional.................................................................................58
2.2 — Acidente de trajeto...................................................................................62
3 — Estatísticas .........................................................................................................63
4 — Efeitos do acidente do trabalho...........................................................................65
4.1 — Lesão corporal e perturbação funcional....................................................66
4.2 — Consequências da lesão ou da disfunção..................................................66
4.2.1 — Morte .........................................................................................66
4.2.2 — Incapacidade ...............................................................................67
5 — Trabalho preventivo dos órgãos estatais..............................................................69
Capítulo III — Responsabilidade Acidentária.........................................................71
1 — Características.....................................................................................................72
2 — Escorço histórico-legislativo.................................................................................73
2.1 — Constituições............................................................................................73
2.2 — Legislação ordinária..................................................................................75
3 — Benefícios previdenciários acidentários................................................................78
4 — Fator Acidentário de Prevenção e Nexo Técnico Epidemiológico Previdenciário...80
4.1 — Fator Acidentário de Prevenção — FAP......................................................82
4.1.1 — Definição do FAP.................................................................................83
4.1.2 — Contestação do FAP.....................................................................84
4.1.3 — Benefícios do FAP..................................................................... 84
4.2 — Nexo Técnico Epidemiológico Previdenciário — NTEP.................................85
5 — Impugnação à perícia do INSS.............................................................................87
5.1 — Impugnação ao NTP, ao NTT e ao NTDEAT...............................................88
5.2 — Impugnação ao NTEP...............................................................................88
6 — Ação regressiva do INSS......................................................................................89
10
Capítulo IV — Responsabilidade civil do empregador .........................................92
1 — Cláusula de incolumidade — dever de segurança.................................................93
2 — Conteúdo mínimo legal do contrato de trabalho.................................................97
3 — Fatores que aumentam o risco de acidente.........................................................99
3.1 — Macrofatores ...........................................................................................100
3.2 — Microfatores ............................................................................................101
3.2.1 — A questão do meio ambiente do trabalho ...................................101
3.2.2 — Higiene do trabalho.....................................................................104
3.2.3 — Segurança do trabalho ................................................................104
3.2.4 — Normas de medicina e segurança do trabalho ............................105
3.2.5 — Jornada de trabalho.....................................................................106
3.2.6 — Adicionais para o trabalho em condições anormais......................108
4 — Responsabilidade contratual................................................................................108
5 — Elementos da responsabilidade civil do empregador ...........................................111
5.1 — Ação ou omissão......................................................................................111
5.2 — Culpa........................................................................................................112
5.3 — Nexo causal..............................................................................................114
5.4 — Dano........................................................................................................116
5.4.1 — Dano material..............................................................................116
5.4.2 — Dano moral..................................................................................117
5.4.3 — Dano estético ou morfológico......................................................118
6 — Responsabilidade civil objetiva do empregador....................................................120
7 — Indenização.........................................................................................................124
7.1 — Indenização por danos materiais...............................................................124
7.2 — Indenização por danos morais..................................................................127
7.3 — Cumulação de indenizações .....................................................................130
7.4 — Compensação de indenizações ................................................................132
8 — Questões correlatas.............................................................................................136
8.1 — Validade do contrato de trabalho.............................................................136
8.2 — Hipóteses de exclusão da responsabilidade...............................................139
8.3 — Responsabilidade em caso de terceirização...............................................140
8.4 — Prescrição.................................................................................................141
8.4.1 — Início do prazo prescricional.........................................................147
8.4.2 — Suspensão do prazo prescricional.................................................149
11
8.5 — Efeitos da sentença criminal no processo cível..........................................150
8.6 — Efeitos sobre o contrato de trabalho.........................................................152
8.6.1 — Suspensão do contrato de trabalho.............................................152
8.6.2 — Aposentadoria por invalidez.........................................................154
8.6.3 — Estabilidade no emprego.............................................................155
8.6.4 — Planos de saúde...........................................................................157
8.6.5 — Férias...........................................................................................159
CAPÍTULO V — Sistema de indícios da responsabilidade do empregador..........162
1 — Exame médico ocupacional.................................................................................164
1.1 — Espécies....................................................................................................164
1.2 — Importância..............................................................................................165
1.3 — Ato discriminatório...................................................................................165
1.4 — Meio de prova..........................................................................................166
2 — Comunicação de acidente do trabalho................................................................166
2.1 — Conceito...................................................................................................167
2.2 — Espécies....................................................................................................167
2.3 — Competência para emissão.......................................................................167
2.4 — Constatação e suspeita de doença ocupacional........................................167
2.5 — Consequências da omissão da empresa....................................................168
2.6 — A CAT e o Nexo Técnico Epidemiológico Previdenciário............................168
3 — Concessão do benefício previdenciário acidentário..............................................169
3.1 — Objetivo da perícia do INSS.......................................................................169
3.2 — Presunção do nexo de causalidade...........................................................170
3.3 — Efeitos da concessão do benefício previdenciário acidentário....................170
4 — Perfil Profissiográfico Previdenciário.....................................................................171
4.1 — Conceito e conteúdo................................................................................171
4.2 — O PPP e o dever de sigilo profissional........................................................172
4.3 — Meio de prova..........................................................................................173
5 — Programa de Prevenção de Riscos Ambientais.....................................................173
5.1 — Fatores de risco e estrutura do PPRA........................................................173
5.2 — Avaliação de desenvolvimento do PPRA....................................................174
5.3 — Meio de prova..........................................................................................174
6 — Programa de Controle Médico e de Saúde Ocupacional......................................175
12
6.1 — Objetivos..................................................................................................175
6.2 — O profissional médico responsável pelo PCMSO .......................................176
6.3 — Etapas de elaboração...............................................................................176
6.4 — Relatório do PCMSO.................................................................................177
6.5 — Meio de prova..........................................................................................177
7 — Gravidade do dano: capacidade de recuperação.................................................178
7.1 — O problema da cura..................................................................................178
7.2 — Fixação do valor da indenização...............................................................179
8 — Exclusão do nexo de causalidade.........................................................................180
8.1 — Doenças não ocupacionais........................................................................180
8.2 — Fatores não laborais.................................................................................182
8.3 — Concausalidade........................................................................................183
8.4 — Nexo etiológico dos distúrbios dolorosos da coluna vertebral....................184
Capítulo VI — Competência Jurisdicional...............................................................191
1 — Introdução..........................................................................................................197
2 — Análise histórica da competência .......................................................................199
3 — Competência em razão da pessoa.......................................................................200
4 — Direito comum e causa de pedir..........................................................................201
5 — Competência residual da justiça comum..............................................................202
6 — Interpretação sistemática da Constituição...........................................................203
7 — Responsabilidade contratual do empregador.......................................................203
8 — Orientação Doutrinária e Jurisprudencial.............................................................205
9 — Competência atribuída pela legislação ordinária..................................................209
10 — Reforma do Poder Judiciário..............................................................................210
11 — Competência em caso de morte do empregado................................................211
Bibliografia citada e consultada.............................................................................215
13
LISTA DE SIGLAS
AI
Agravo de Instrumento
ART
Agência Regional do Trabalho
ASO
Atestado de Saúde Ocupacional
APS
Agência da Previdência Social
BEAT
Boletim Estatístico sobre Acidentes de Trabalho
CAT
Comunicação de Acidente de Trabalho
CF
Constituição Federal
CFM
Conselho Federal de Medicina
CID
Código Internacional de Doenças
CIF
Classificação Internacional de Funcionalidade
CIPA
Comissão Interna de Prevenção de Acidentes
CLT
Consolidação das Leis do Trabalho
CNAE
Código Nacional de Atividade Econômica
CNPS
Conselho Nacional de Previdência Social
CP
Código Penal
CPC
Código de Processo Civil
DJ
Diário da Justiça
DORT
Distúrbios Osteomusculares Relacionados com o Trabalho
DOU
Diário Oficial da União
DRT
Delegacia Regional do Trabalho
EC
Emenda Constitucional
EPI
Equipamento de Proteção Individual
FAP
Fator Acidentário de Prevenção
FGTS
Fundo de Garantia do Tempo de Serviço
GFIP
Guia de Recolhimento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço
e Informações à Previdência Social
IBGE
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
INSS
Instituto Nacional de Seguridade Social
15
LER
Lesão por Esforço Repetitivo
MP
Medida Provisória
MPAS
Ministério da Previdência e Assistência Social
MPPS
Médico Perito da Previdência Social
NR
Norma Regulamentadora
NTEP
Nexo Técnico Epidemiológico Previdenciário
NTI
Nexo Técnico Individual
NTP
Nexo Técnico Previdenciário
OIT
Organização Internacional do Trabalho
OJ
Orientação Jurisprudencial
PCMSO
Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional
PEC
Proposta de Emenda à Constituição
PIB
Produto Interno Bruto
PIS/PASEP
Programa de Integração Social/Programa de Assistência ao Servidor
Público
PP
Pedido de Prorrogação
PPP
Perfil Profissiográfico Previdenciário
PPRA
Programa de Prevenção de Riscos Ambientais
PR
Pedido de Revisão
R Região
RO
Recurso Ordinário
RPS
Regulamento da Previdência Social
RR
Recurso de Revista
SAT
Seguro Acidente do Trabalho
SDI
Seção Especializada em Dissídios Individuais
SESMT
Serviços Especializados em Engenharia de Segurança e Medicina
do Trabalho
SSST
Secretaria de Segurança e Saúde no Trabalho
STJ
Superior Tribunal de Justiça
STF
Supremo Tribunal Federal
SUS
Sistema Único de Saúde
TRT
Tribunal Regional do Trabalho
TST
Tribunal Superior do Trabalho
16
Prefácio
Esta obra, de autoria do Juiz do Trabalho José Cairo Júnior, tem tudo para se
tornar uma referência no estudo da matéria.
De fato, fruto da sua dissertação de Mestrado — que tive a honra de avaliar, em
banca composta ainda pelos Professores Doutores Eduardo Rabenhorst Ramalho
e Raymundo Juliano do Rego Feitosa, da Faculdade de Direito da Universidade
Federal de Pernambuco —, enfrenta um dos temas mais tormentosos da atualidade
laboral, a saber, o acidente do trabalho e a responsabilidade civil do empregador.
Tal circunstância acadêmica respalda o caráter científico da investigação
realizada, avalizando sua importância perante o exigente público leitor.
Todavia, a propriedade e atualidade da temática escolhida revelam também
a profunda preocupação do autor com aspectos pragmáticos das ações de
responsabilidade civil decorrentes de acidente do trabalho, notadamente quanto
ao terrível problema da prova e seu ônus.
Perfilando o entendimento de que a responsabilidade civil do empregador
tem natureza contratual, acaba-se por concluir que há uma inversão do ônus da
prova, em função de uma cláusula de incolumidade que deve conter toda avença
de natureza trabalhista.
Trata-se de conclusão que, se prosperar nos pretórios laborais especializados,
poderá constituir-se em uma verdadeira revolução na tutela reparatória dos danos
causados pelos infortúnios trabalhistas, o que não deixa de ser uma medida
relevante em um país que ostenta o lamentável título de campeão mundial em
número de acidentes de trabalho.
Ainda que, eventualmente, não se concorde com suas conclusões, não há
como se deixar de louvar a iniciativa de José Cairo Júnior, que, mesmo atarefado
em suas funções judicantes (que desempenha com denodo e simpatia), não se
acomodou com a enorme carga de trabalho a que é submetido diuturnamente e
produziu uma obra de tal magnitude, honrando a estirpe jurídica grapiúna.
Partilhando da sua amizade pessoal e da inestimável honra de ser seu colega
nesta labuta, recomendo a leitura deste livro, que se constitui em uma contribuição
de monta à altura da tradição trabalhista da escola baiana de pensamento jurídico.
Rodolfo Pamplona Filho
Juiz do Trabalho da 5ª Região. Professor Universitário.
Mestre e Doutor em Direito pela PUC/SP.
17
Nota do Autor à OITAVA Edição
Algumas alterações legislativas ocorridas desde o lançamento da última
edição desta obra implicaram a necessidade de promover a sua atualização.
Cita-se, em primeiro lugar, a Lei n. 13.105, de 16 de março de 2015, que
aprovou o texto no novo Código de Processo Civil, em substituição ao Diploma
processual anterior. Como a vacatio legis dessa norma jurídica é de um ano, optouse por inserir na obra os dispositivos do CPC de 1973 e o correspondente ao do
novo CPC.
Foi editada, também, a Lei Complementar n. 150/2015, que regulamentou
a Emenda Constitucional n. 72 e, finalmente, inseriu o empregado doméstico no
âmbito do seguro acidentário da previdência social.
De igual importância, o início da vigência da Lei n. 13.135/2015 promoveu
mudanças em vários dispositivos das duas normas que formam o Estatuto básico
da previdência social brasileira, qual sejam, as Leis ns. 8.212/91 e 8.213/91.
Por fim, esta oitava edição já contempla as alterações legais promovidas
pelas Portarias MPAS/MF n. 438/2014, que estabeleceu o fator acidentário
previdenciário — FAP para o ano de 2015; e MPS/MF n. 13/2015, que reajustou
os valores dos benefícios previdenciários.
19
Nota do Autor à Sétima Edição
O núcleo desta obra, que consiste na defesa da contratualidade da responsabilidade civil do empregador decorrente do acidente do trabalho, permanece
incólume.
Todavia, a modificação na legislação, que não é fato raro de ocorrer no ordenamento jurídico nacional, acompanhada da alteração da tendência interpretativa
dos Tribunais, ensejou a necessidade de atualização deste trabalho monográfico.
Assim, esta sétima edição já está adaptada à nova ordem legal, notadamente
aquela decorrente da promulgação Emenda Constitucional n. 72, que ampliou
os direitos dos empregados domésticos; da edição da Portaria MPAS/MF n.
413/2013, que estabeleceu o fator acidentário previdenciário — FAP para o ano
de 2014; da aprovação da Portaria MPS/MF n. 15/2013, que reajustou os valores
dos benefícios previdenciários; e da Resolução n. 2015/13, do Conselho Federal
de Medicina — CFM, que alterou a redação do art. 12 da Resolução n. 1488, para
permitir que o médico da empresa possa desempenhar a função de assistente
técnico em perícias judiciais.
Além da revisão do texto, também foi incorporada à obra as informações
contidas na nova tábua de mortalidade brasileira, para o ano de 2011, divulgada
pelo IBGE; bem como a modificação na redação da Súmula n. 378 do TST, que
passou a admitir a estabilidade do trabalhador decorrente de acidente de trabalho
mesmo na hipótese de contratação por tempo determinado.
Por fim, foi feita a substituição de alguns acórdãos citados nas edições
anteriores por outros mais recentes, inclusive publicados em 2013, permitindo ao
leitor ter ciência do entendimento dos Tribunais trabalhistas em relação a temas
que ainda não foram objeto de súmulas ou orientações jurisprudenciais do TST.
21
Nota do Autor à Sexta Edição
Depois de decorridos quase dez anos do lançamento desta obra, chega-se à
sexta edição. Em 2003, quando da primeira edição, o cenário observado na doutrina
e na jurisprudência era totalmente diverso daquele que se apresenta atualmente, no
que diz respeito às questões relacionadas com a responsabilidade civil do empregador
em decorrência do acidente de trabalho.
Primeiramente, no âmbito processual, predominava o entendimento que
atribuía à Justiça Comum a competência para analisar litígios envolvendo a matéria
acidentária, ainda que a demanda fosse proposta contra o empregador. Hoje não
há mais qualquer dúvida sobre o alcance da competência da Justiça do Trabalho
nesse particular. Pelo contrário, continuam avançando as teses progressistas de
ampliação de competência, para abarcar, por exemplo, ação regressiva proposta
pelo INSS em face do empregador negligente no cumprimento das obrigações
relativas à segurança e higiene do trabalho.
No âmbito do Direito material, também se consolidou a principal tese
defendida neste trabalho, que é teoria da responsabilidade contratual do
empregador em decorrência de danos provocados por acidente do trabalho, para
contrapor a teoria da responsabilidade aquiliana, defendida pela doutrina e pela
jurisprudência até então.
A obra tornou-se referência para o estudo da responsabilidade civil acidentária,
sendo utilizada no meio acadêmico, bem como para fundamentar as decisões
proferidas pelos Juízes do Trabalho, Tribunais Regionais do Trabalho e pelo TST.
A atualização da sexta edição observou as mudanças legislativas ocorridas
desde 2009, mais precisamente por conta da vigência das seguintes normas legais:
Lei n. 12.470/2011, que modificou a redação do art. 16 da Lei n. 8.213/1991;
Decretos ns. 7.331/2010, 7.126/2010, 6.957/2009 e 6.945/2009, que alteraram o
Regulamento da Previdência Social; Decreto n. 6.577/2008, que adiou a implantação
do FAP para 1º de janeiro de 2010; Resolução normativa n. 279/2011 da ANS, que
regulamentou a Lei n. 9.656/1998; Portaria interministerial MPS/MF n. 2, de
1º.1.2012, que reajustou o valor do teto salário de contribuição e do salário
de benefício; e Portaria MPAS/MF n. 579/2011, que divulgou o FAP do ano
de 2011, com vigência para o ano de 2012.
23
As mudanças na jurisprudência dos Tribunais ficaram por conta da edição
da Súmula n. 386 do STJ, da alteração da redação da Súmula n. 291 do TST e da
mudança no texto da OJ de n. 375 da SDI-1 do TST.
Além disso, diversos acórdãos transcritos nas edições anteriores foram
substituídos por outros mais recentes, inclusive alguns publicados em 2012,
permitindo ao leitor ter ciência do entendimento dos Tribunais trabalhistas
em relação a temas que ainda não foram objeto de súmulas ou orientações
jurisprudenciais do TST.
24
Nota do Autor à Quinta Edição
Nesta quinta edição, permanece a preocupação em aprofundar a análise
das questões envolvendo as doenças ocupacionais, em seu sentido amplo, que
abrange os conceitos de transtorno de saúde, distúrbio, disfunção e síndrome
relacionados com o meio ambiente laboral.
A obra foi atualizada com informações recentes das estatísticas sobre agravos
ocupacionais, principalmente depois da adoção do nexo técnico epidemiológico
previdenciário — NTEP, que propiciou a diminuição do número de subnotificação,
bem como sobre a expectativa de vida do brasileiro referente ao ano de 2007.
Novos temas mereceram abordagem específica, principalmente aqueles
decorrentes da interpretação da Instrução Normativa do INSS/PRES n. 31/2008,
que revogou a IN do INSS n. 16/2007. Para tanto, foi necessária a inserção de dois
novos itens no Capítulo III, para tratar do processo administrativo de impugnação
à perícia do INSS, e outro analisando as questões relativas à ação regressiva dessa
autarquia em face das empresas negligentes no que pertine à adoção de medidas
visando prevenir a ocorrência de acidentes laborais.
Por fim, foram adicionados recentes julgados sobre as matérias mais polêmicas,
inclusive as Súmulas ns. 362 e 366 do STJ, além da inserção das alterações
normativas relacionadas com as questões tratadas na obra, principalmente o
Decreto n. 6.722/2008 e a Portaria Interministerial MPS/MF n. 48/2009.
Espera-se que esse conjunto de modificações sirva para melhorar o auxílio aos
leitores interessados nos diversos pontos da temática do acidente laboral.
25
Nota do Autor à Quarta Edição
Com o advento da quarta edição, esta obra atinge os objetivos inicialmente
propostos, consolidando-se as teses formuladas, através da sua ampla utilização,
tanto na doutrina quanto na jurisprudência pátria. Agora, a atenção volta-se para
as questões envolvendo as doenças ocupacionais, uma vez constatada a dificuldade
de identificar-se o nexo de causalidade entre essas espécies de enfermidades e o
meio ambiente de trabalho.
Apresenta-se como principal novidade desta edição os comentários à
inovação legislativa (Lei n. 10.666/2003, Lei n. 11.430/2006 e Decreto n.
6.042/2007), que foi responsável pela instituição do Nexo Técnico Epidemiológico
Previdenciário — NTEP e do Fator Acidentário de Prevenção — FAP, tratados no
item 4 do capítulo III.
Especial destaque também foi conferido às questões relativas à prescrição,
mormente no que se refere ao prazo aplicável, já que ainda não se consolidou o
entendimento quanto à incidência daquele previsto na Constituição Federal de
1988 ou daquele que consta no Código Civil, bem como no que diz respeito à
possibilidade de suspensão do referido prazo, quando for constatada a incapacidade
do obreiro para o trabalho.
Foi feita uma ampliação da obra, acrescentando-se comentários aos seguintes
temas: a) efeitos da suspensão do contrato de trabalho sobre as férias, por conta
do acidente do trabalho (capítulo IV, item 8.6.5); b) relação entre a emissão da
CAT e a identificação do nexo técnico previdenciário através do NTEP (capítulo V,
item 2.6); c) efeitos da concessão do benefício previdenciário acidentário (capítulo
V, item 3.3); d) nexo etiológico dos distúrbios dolorosos da coluna vertebral
(capítulo V, item 8.4); e e) competência da Justiça do Trabalho em caso de morte do
empregado (capítulo VI, item 11).
Após a realização de pesquisa jurisprudencial, foram inseridas, no bojo
desta obra, decisões recentes abordando os temas aqui tratados, principalmente
os mais controvertidos constantes dos capítulos IV (responsabilidade civil do
empregador) e V (sistema de indícios da responsabilidade do empregador).
Finalmente, as atualizações procedidas dizem respeito às estatísticas de
acidentes e doenças ocupacionais; aos valores dos benefícios previdenciários, e à
tábua de mortalidade fornecida pelo IBGE.
27
Nota do Autor à Terceira Edição
Nesta terceira edição, o Autor teve a satisfação de transcrever o acórdão
do STF que, por unanimidade, em sede de conflito de competência, reconheceu a
competência da Justiça do Trabalho para apreciar e julgar conflitos envolvendo
pedidos de indenização por danos morais decorrentes de acidente do trabalho,
acolhendo a tese aqui defendida desde a primeira edição.
Além disso, procedeu-se com a revisão e atualização do texto e procurouse ampliar a obra no sentido de dotá-la de fundamentos necessários à atuação
dos profissionais do Direito, quando se encontram em juízo, na identificação das
doenças ocupacionais e do seu nexo etiológico, aclarando, também, os demais
elementos da responsabilidade civil do empregador.
Justifica-se essa especial atenção às aludidas questões em face de existir, não
raro, divergência no que se refere às provas técnicas produzidas em processos
judiciais em que o empregado acometido de doença do trabalho postula
indenização por danos morais e materiais.
Para atingir esse objetivo, foi introduzido um novo capítulo intitulado “Sistema
de Indícios da Responsabilidade do Empregador”.
No capítulo IV, que trata da responsabilidade civil do empregador, aprofundouse os comentários acerca da prescrição da pretensão do empregado acidentado,
sobretudo no que diz respeito ao prazo respectivo e à possibilidade de sua suspensão;
análise das teorias que defendem a imprescritibilidade das ações dessa natureza, e
os efeitos do infortúnio laboral sobre o contrato de trabalho.
Por fim, as atualizações foram efetivadas inserindo-se recentes decisões
abordando temas relativos ao prazo prescricional da ação de indenização por
danos materiais e morais, competência da Justiça do Trabalho para apreciar essas
espécies de litígios, responsabilidade objetiva do empregador etc. Também foram
inseridos novos dados relativos aos valores dos benefícios previdenciários, tábua
de mortalidade fornecida pelo IBGE, identificação legal da LER/DORT, estatísticas
de acidente do trabalho etc.
29
Nota do Autor à Segunda Edição
Nesta segunda edição, procedeu-se a atualização, ampliação e revisão da
obra.
Foi mantido o texto básico da edição anterior, acrescendo-se comentários
sobre a responsabilidade civil objetiva do empregador quando a sua atividade
implicar risco para o empregado, em face da importância do tema e do conflito
aparente com a norma constitucional que exige o elemento subjetivo para
caracterização da responsabilidade civil, bem como em relação à Proposta de
Emenda Constitucional em tramitação no Congresso Nacional que amplia a
competência da Justiça Laboral.
Também foram inseridas decisões mais recentes sobre a problemática da
responsabilidade civil, principalmente no que se refere à competência da Justiça
do Trabalho para examinar as ações decorrentes de acidente do trabalho em
que o empregador figure como Reclamado, e aquelas concernentes ao prazo
prescricional dessas ações.
Ressalte-se que o tema deste trabalho é relativamente novo e continua a
provocar debates entre os juristas que se dedicam ao seu estudo, fato que
justificou a execução de uma atualização, ampliação e revisão cuidadosa, de forma
que pudesse conter pronunciamentos e observações dos diversos pontos de vista
existentes, já que a primeira edição ocorreu logo após a vigência do novo Código
Civil, que introduziu dispositivos legais importantes para regulamentar toda a
matéria.
31
Nota do Autor à Primeira Edição
O presente trabalho tem por escopo aprofundar o estudo sobre a responsabilidade civil do empregador derivada do acidente do trabalho e a questão da
competência jurisdicional para julgar essa espécie de litígio.
Esta obra representa, com algumas alterações, a dissertação defendida
perante a Banca Examinadora da Faculdade de Direito da Universidade Federal de
Pernambuco — UFPE, como condição à obtenção do título de Mestre em Direito,
formada pelos Professores Doutores Rodolfo Mário Veiga Pamplona Filho, Eduardo
Rabenhorst Ramalho e Raymundo Juliano do Rego Feitosa.
Foram analisados, detidamente, os fatores que determinam a responsabilidade
civil direta do empregador, na hipótese em que o acidente do trabalho provoque
danos ao patrimônio econômico e moral do empregado.
Como consequência direta, examinou-se, também, além de outras questões, a autonomia da responsabilidade acidentária em face da responsabilidade
civil do empregador; a compensação da indenização derivada do direito comum
e a indenização acidentária; a natureza jurídica objetiva ou subjetiva da responsabilidade de direito comum, identificando o detentor do ônus da prova em relação
à configuração da culpa; e a delimitação e eliminação dos equívocos que cercam o
entendimento segundo o qual a competência para o julgamento das ações envolvendo acidente do trabalho pertence à Justiça Estadual, à luz dos procedimentos
de interpretação da norma constitucional vigente.
Foi feita, inicialmente, uma abordagem geral sobre o instituto da responsabilidade civil, visto por diversos ângulos (objetivo, subjetivo, contratual,
extracontratual, penal, civil etc.), inclusive em sua evolução histórica, passando
pelo campo da infortunística laboral, coberta pelo seguro obrigatório, para depois
ser analisada a responsabilidade civil direta do empregador, e, por fim, definir
com precisão a competência do órgão jurisdicional incumbido de dirimir eventuais
conflitos dessa natureza.
Para completar, procedeu-se à utilização e interpretação de dispositivos
constitucionais e legais que regulamentam a matéria, notadamente o Código
Civil de 1916 e a Lei n. 10.406, de 10.1.2002, que instituiu o novo Código Civil, por
meio de um estudo comparativo entre as duas normas estatais, sem esquecer dos
dispositivos do Código de Napoleão, concernentes à responsabilidade civil, que
grande influência teve na elaboração dos referidos diplomas legais.
33
O contrato de trabalho tem o seu conteúdo mínimo formado por cláusulas
obrigatórias legais que, dentre outras determinações, impõem ao empregador
zelar pela incolumidade psicofisiológica dos seus empregados.
Vista sob esta ótica, percebe-se que, em caso de dano sofrido pelo empregado,
vítima de acidente do trabalho, a responsabilidade tem nítida natureza contratual,
posto que decorrente de um inadimplemento contratual.
A questão social impulsionou o surgimento de uma denominada “responsabilidade acidentária”, de natureza objetiva, transferida por imposição legal ao
próprio Estado que, mediante contribuições periódicas do empregador, ficaria
responsável pelo pagamento das indenizações devidas em caso de acidente do
trabalho.
Ocorre, porém, que a referida indenização acidentária não cobre, integralmente, o dano sofrido pelo operário, e por esta razão este se encontra autorizado
a ingressar em juízo para pleitear o complemento indenizatório, desde que tenha
agido o empregador com culpa ou dolo.
A principal consequência do reconhecimento da natureza contratual da
responsabilidade civil do empregador, negada pela maioria daqueles que se
dedicam ao estudo da matéria, é a questão do ônus da prova da culpa, que passa
a ser deste último, livrando o empregado, hipossuficiente na relação empregatícia,
do grave encargo processual que lhe cabia e que, na maioria dos casos, lhe privava
da indenização necessária para reparar os prejuízos sofridos com o acidente do
trabalho.
Em resumo, pretendeu-se demonstrar, com o presente trabalho, que: a) a
responsabilidade de direito comum do empregador tem natureza contratual; b)
são cumuláveis as ações acidentárias e de indenização; c) são compensáveis as
indenizações de direito comum e acidentária; d) a responsabilidade civil é, via
de regra, de natureza subjetiva, mas com a inversão do ônus da prova para o
empregador; e) a responsabilidade civil do empregador, em decorrência do
acidente do trabalho, é objetiva quando sua atividade for de natureza insalubre ou
perigosa; f) a Justiça do Trabalho é órgão judicial competente para o julgamento
dos litígios originados pelo acidente do trabalho.
34
CAPÍTULO I
RESPONSABILIDADE CIVIL
O estudo do instituto da responsabilidade civil é de vital importância, não só
para o Direito Civil, mas para qualquer ramo do Direito, pois todo ele encontra-se
permeado pela ideia de manutenção da ordem pública e de proteção daqueles
que sofrem os efeitos dos fatos danosos.
O estudo preliminar do instituto da responsabilidade civil é relevante, posto
constituir o fundamento teórico deste trabalho, base para a definição, natureza
e limites do dever de indenizar do empregador, em virtude de dano sofrido pelo
empregado, vítima de acidente do trabalho.
Registre-se, inicialmente, que a tarefa de se enunciar o conceito de
responsabilidade civil não é fácil. Muito pelo contrário, a falta de consenso no
que se refere à adoção de uma definição semelhante pelos estudiosos da matéria
evidencia a dificuldade dessa tarefa.
A expressão “responsabilidade”, pelo senso comum, revela uma ideia de
ressarcimento, de reparação, o que induz, logicamente, admitir a existência de
algo antecedente.
Evidentemente que, para se reparar algo, é necessário que esse algo exista
incólume antes da ocorrência de algum evento que altere sua essência.
Essa situação anterior constitui o bem da vida sobre o qual incide a tutela
jurídica. Não se pode falar em reparação sem a preexistência de um bem ou
relação juridicamente tutelado de forma que mantenha o equilíbrio do homem
inserido na sociedade. Destruído esse equilíbrio, mediante a ação ou omissão de
alguém, caberá ao autor do ato contrário ao direito, na forma de norma estatal ou
de convenção prévia, restabelecer a situação inicial, configurando-se, desse modo,
a responsabilidade civil.
Nota-se, assim, que a responsabilidade civil pressupõe a liberdade do homem.
Por ser livre, o homem tem a faculdade de agir em conformidade ou contra o
ordenamento jurídico. Mas, nesse último caso, deve arcar com as consequências
de seu ato ilícito, por meio do comprometimento do seu patrimônio.
Em algumas hipóteses, entretanto, em razão da natureza não econômica
do bem atingido, será impossível recompor o status quo ante. Ainda assim, o
ordenamento jurídico protege a vítima no sentido de responsabilizar o ofensor,
no sentido de determinar o pagamento de uma indenização que possibilitará a
35
aquisição de um bem material e, por via de consequência, compensará a dor
suportada pela vítima, além de representar uma punição para o ofensor.
A responsabilidade civil representa o dever de ressarcir ou de compensar,
imposto àquele que, por ação ou omissão, por fato próprio, de terceiro ou de
coisas dele dependentes, provoque a diminuição ou alteração no patrimônio
material ou moral de alguém.
Bastante simples, porém abrangente, pois abarca as espécies objetiva
e subjetiva, é a definição de responsabilidade civil proposta por Caio Mario: “a
responsabilidade civil representa a efetivação da reparabilidade abstrata do dano
em relação àquele que sofre o prejuízo”.(1)
Para que se configure a responsabilidade civil, é necessário que haja
inobservância de um dever legal, genérico ou específico, ou a inexecução de uma
obrigação estabelecida previamente entre o ofensor e a vítima.
Compreendida dessa forma, a responsabilidade civil não pode ser resultado
do exercício regular de um direito, mas, se houver abuso, com a consequente
provocação de dano a outrem, o dever de indenizar restará configurado.
Essa teoria foi acolhida pelo Código Civil em seu art. 187: “Também comete
ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os
limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons
costumes”.
Sobre o tema, manifesta-se Orlando Gomes:
Apesar da dificuldade de sua caracterização e das vacilações a propósito
de sua configuração como instituto, a verdade é que o exercício anormal
de um direito pode criar para o prejudicado uma pretensão contra
quem praticou o ato abusivo, ficando este obrigado a indenizar o dano
causado ou a abster-se da prática do ato abusivo.(2)
O direito pode ser concebido como o conjunto de normas destinadas a regular
a vida em sociedade, estabelecendo os limites da liberdade de cada pessoa.
O ideal seria que todos agissem conforme as prescrições legais, evitando-se,
assim, as consequências da ação ou omissão que importassem em violação do
direito de outrem.
Por isso é que a responsabilidade civil está calcada basicamente na máxima
neminem leadere, ou seja, o dever de não prejudicar ninguém, regra fundamental
do Direito natural.
(1) PEREIRA, Caio Mario da Silva. Responsabilidade civil. 9. ed. rev. Rio de Janeiro: Forense, 2000.
p. 11.
(2) GOMES, Orlando. Obrigações. 8. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1988. p. 39.
36
1 — Escorço Histórico
O Direito é um fenômeno cultural que varia inexoravelmente no tempo e
no espaço. Encontra suas raízes no passado. Assim considerado, entende-se que,
para ser completo, qualquer estudo nessa área do conhecimento científico deve
contemplar os horizontes históricos.
Saliente-se, entretanto, que não se pode, em nenhum momento, entender
o estudo do direito como um processo evolutivo, ou seja, considerar que hoje
esse ramo da ciência ocupa uma posição de maior desenvolvimento cultural em
comparação com o Direito antigo.
A análise histórica de qualquer instituto jurídico serve apenas como paradigma,
pois a questão de ser avaliado como mais evoluído ou não irá depender das demais
características culturais de cada povo.
A história serve, como diz Paulo Dourado de Gusmão, para evidenciar os erros
cometidos do passado, apontando para o jurista e para o legislador o caminho que
não deve ser seguido.(3)
1.1 — Direito antigo
A responsabilidade civil relaciona-se profundamente com as formas de
composição dos conflitos de interesses, pois representa um dos reflexos da violação
de um dever legal ou de uma obrigação criada por declaração de vontade.
A inobservância das determinações fixadas por uma norma individual e
concreta ou pela lei, instituídas com o objetivo de possibilitar a vida do homem
em sociedade, gera o conflito de interesses e, na hipótese de dano, origina a
responsabilidade civil.
Justifica-se, assim, no estudo histórico do instituto da responsabilidade civil,
a sua análise concomitantemente com a evolução das espécies de solução dos
conflitos.
Sendo o Direito pátrio de tradição romanista, qualquer estudo sobre a história
da responsabilidade civil passa inevitavelmente pela história do Direito Romano,
mesmo porque seus institutos atingiram uma perfeição jurídica que influenciou
diretamente grande parte dos ordenamentos jurídicos modernos.
Com efeito, nenhuma civilização ocidental antiga alcançou o desenvolvimento
organizacional atingido pelos romanos no que se refere ao Direito, pelo que o seu
estudo contribuirá também para demonstrar cientificamente a tese aqui exposta.
(3) GUSMÃO, Paulo Dourado de. Introdução ao estudo do direito. 27. ed. rev. Rio de Janeiro:
Forense, 2000. p. 24.
37
Antes de existir uma sociedade organizada e mesmo nos primórdios desta,
prevalecia o princípio da vingança coletiva, ou seja, a ação ou omissão provocava
uma reação imediata e desmedida do ofendido, por meio de violência física
ou moral não só ao ofensor, mas também à sua família, tribo ou grupo social,
característica do Direito arcaico em que não só a responsabilidade era coletiva,
mas também a propriedade.
Nesse primeiro estágio, ainda não se podia falar em reparação, posto que
inexistia a intenção de reparar a ofensa com a restituição do estado anterior. Muito
pelo contrário, após a vingança, passavam a existir duas vítimas e dois ofensores.
Dourado de Gusmão relata as características da responsabilidade civil nesse
momento histórico:
Para ser responsável, bastava viver. Nessa sociedade, a idade, a sanidade
mental, a culpa, o desenvolvimento mental e a própria vida não influíam
na responsabilidade. Predominava o nexo de causalidade material,
podendo ser responsável por uma ofensa tanto o animal, a criança, o
adulto, a coisa, como o louco ou o cadáver.(4)
Ainda numa fase primitiva, aparece a vingança privada, momento em que a
reação da vítima passa a ser proporcional à ação do autor do dano. Utilizava-se a
regra do olho por olho, dente por dente (Lei de Talião).
A regulamentação da vingança privada deu-se por intermédio da consagração
legal do uso da pena de Talião, dando origem à intransmissibilidade pessoal da
pena e sua proporção ao dano sofrido.
Segue-se a fase da composição voluntária, em que o ofendido ainda poderia
optar pela vingança privada. Entretanto, não perceberia qualquer indenização
(compensação material), denominada poena, com a qual se obtinha o perdão do
ofendido, qualidade da composição.
Da mesma forma como aconteceu com a pena de Talião, a lei consagrou o uso
da composição voluntária, transformando-a em composição legal. Caracterizava-se
pela obrigatoriedade e pela fixação casuística, por uma autoridade competente,
de uma indenização para cada espécie de delito, sendo vedada a utilização da
autodefesa.
Ressalte-se, entretanto, que não havia uma prefixação legal de composição
para todos os delitos, situação esta, aliás, que ainda se verifica atualmente.
A Lei das XII Tábuas que, segundo Júlio Bernardo do Carmo,(5) surgiu sob a
égide de Terentilo Arsa, um tribuno do povo, após uma árdua luta de dez anos
(303-304 d.C.), previa as hipóteses de composição obrigatória e voluntária.
(4) GUSMÃO, Paulo Dourado de. Op. cit., p. 315.
(5) CARMO, Júlio Bernardo do. O dano moral e sua reparação no âmbito do direito civil e do trabalho.
Revista LTr, São Paulo, v. 60, n. 3, p. 295-321, mar. 1996.
38
Até então, não havia no Direito Romano a distinção entre responsabilidade
civil e responsabilidade penal. Isso porque, apesar de os institutos da pena de
Talião e da compensação estarem consagrados, a execução respectiva ainda
ficava, legalmente, a cargo do ofendido.
Mais tarde, quando o Estado percebeu que certos delitos, indiretamente,
lhe atingiam, e não só a vítima individualmente considerada, passou a não só
definir a reparação, mas também a executá-la. Com efeito, determinadas condutas
ilícitas representavam uma subversão à ordem pública e não mera infração de
direito privado, colocando em risco a própria existência da sociedade politicamente
organizada.
Posteriormente, foi retirada do particular a possibilidade de “fazer justiça com
as próprias mãos”. O Estado atraiu para si a função de dizer o direito, jurisdictio,
criando, concomitantemente, a obrigação de prestar a tutela jurisdicional toda vez
que nesse sentido fosse acionado.
Surge a jurisdição, forma de composição dos conflitos por um terceiro
desinteressado.
O cumprimento da decisão não é mais voluntário, mas sim obrigatório, dispondo o Estado de meios coativos para fazer valer sua vontade.
Observa-se, contudo, que, nas decisões, impondo aos agressores a obrigação
de indenizar, não se cogitava da existência de culpa. Bastavam a ação, a lesão e o
nexo de causalidade para determinar a responsabilidade do agente, ainda que fosse
incapaz.
Somente com o advento da Lei Aquilia (formada por três capítulos, sendo que
o último era dedicado ao damnum injuria datum) é que se cogitou, pela primeira
vez, mas de forma nebulosa, sobre o aspecto subjetivo da responsabilidade civil.
Assim, passou-se a levar em consideração não só o dano em si mesmo considerado,
mas a vontade deliberada ou não do ofensor em causar dano a outrem.
De qualquer forma, foi a primeira regra a estabelecer um princípio geral
sobre a responsabilidade civil, sem as características, obviamente, da forma como
o Direito contemporâneo se apresenta.
Cretella Jr.(6) explica que a Lei Aquilia foi o resultado de um plebiscito votado
no final do quinto século, por iniciativa de um tribuno da plebe chamado Aquilio.
Era uma lei circunstancial que beneficiava os plebeus, pois ficaram protegidos
contra os prejuízos causados pelos patrícios nos limites de sua propriedade.
Informa o mencionado autor que a Lei Aquilia significou mais uma sistematização de normas esparsas do que uma inovação. Todavia, além de compilar leis
(6) CRETELLA JÚNIOR, José. Direito romano moderno. 3. ed. rev. e aum. Rio de Janeiro: Forense,
1986. p. 209.
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existentes, definiu mais um delito civil, o damnum injuria datum, qual seja, o dano
provocado a uma coisa alheia que empobrecia a vítima sem enriquecer o autor.
Antes de instituir a culpa como elemento da responsabilidade civil, a Lei
Aquilia serviu para alicerçar a teoria da responsabilidade decorrente do ato ilícito,
de forma mais ou menos genérica, já que as previsões legais anteriores eram
caracterizadas pelo casuísmo.
Carlos Gonçalves sustenta que o mérito da Lei Aquilia encontra-se na
sua interpretação imprimida pelos pretores e pela jurisprudência, justificando,
inclusive, a passagem famosa de Ulpiano, in lege Aquilia et levissima culpa venit,
ou seja, basta que a culpa seja considerada levíssima para caracterização da
responsabilidade aquiliana.(7)
No mesmo sentido, Aguiar Dias, quando revela que a ação inicialmente só
beneficiava o cidadão romano, proprietário da coisa destruída ou deteriorada,
sendo ampliada posteriormente para os cidadãos de outras nacionalidades, quais
sejam, os peregrinos.(8)
O alargamento do objetivo deu-se no sentido de abarcar a hipótese de
ferimentos e qualquer dano causado às coisas.
Após indagar se a Lei Aquilia teria introduzido a culpa como elemento
essencial ao direito de reparação pelo dano causado, responde Alvino Lima que
existem defensores de posicionamentos contrários, sendo que os que sustentam
a presença do elemento subjetivo entendem ser esse indispensável para a
caracterização do delito, como Girard, Gaston May, Edouard Cuq, Pirson et Villé,
Contardo Ferrini, Ihering, Leonardo Colombo etc. Em sentido oposto, Emilio Betti
e Mario Cozzi, quando afirmam que a culpa foi sendo introduzida lentamente por
meio da interpretação, em virtude das pressões sociais que exigiam a alteração no
entendimento anterior.(9)
De modo geral, pode-se afirmar que os ordenamentos jurídicos foram
modificados, a partir de então, no sentido de inserir como elemento integrante da
responsabilidade civil o aspecto subjetivo, ou seja, a culpa do agente.
Isso porque os sistemas primitivos fixavam a responsabilidade do agente pela
simples relação entre a ação ou omissão e o dano.
Kelsen denomina essa espécie de responsabilidade de absoluta, contrapondose à responsabilidade baseada na culpa:
(7) GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 1995. p. 5.
(8) DIAS, José de Aguiar. Da responsabilidade civil. 7. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1983. v. 1, p. 22.
(9) LIMA, Alvino. Da culpa ao risco. Revisão e atualização: Ovídio Rocha Barros Sandoval. 2. ed. 2ª
tir. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999. p. 23.
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O Acidente do Trabalho e a responsabilidade civil do