HISTÓRIA, ENSINO E EDUCAÇÃO PROFISSIONAL Francinne Calegari de Souza Cristiano Gustavo Biazzo Simon Mestrado em História Social (UEL) Palavras-chave: Legislação Educacional, Educação Profissional e Ensino de História. A sociedade, no limiar do século XXI, engendra profundas transformações; a educação e o mercado de trabalho são setores diretamente atingidos e, nesse processo, é necessário adaptar objetivos e estratégias para atender as novas exigências, sem esquecer, contudo, da reflexão de Silva e Fonseca: A chegada de um novo século não produz, automaticamente, alterações nas atividades humanas. Serve, entretanto, como referência simbólica para que se façam balanços sobre as diferentes áreas, pensando em seu estado atual e nas tendências que se configuram para sua existência. 1 Assim, sendo, a relação passado, presente e expectativa de futuro num mundo de constantes transformações nos faz questionar o papel do ensino de História e repensar como ele pode contribuir significativamente para a formação humana do aluno para o trabalho, utilizando-se, num primeiro momento, da análise da legislação educacional e, num segundo momento, das contribuições da literatura especializada na tentativa de desvendar como o ensino de História pode promover subsídios para uma educação mais integrada ao ambiente social. A presente pesquisa relaciona os termos “educação” e “trabalho”, em busca de compreendê-los e integrá-los ao ensino de História. Para tanto, é necessário investigar os conceitos inseridos nos termos e identificar os caminhos da pesquisa. Sobre “educação” argumenta Brandão: Ninguém escapa da educação. Em casa, na rua, na igreja ou na escola, de um modo, ou de muitos todos nós envolvemos pedaços da vida com ela: para aprender, para ensinar, para aprender-e-ensinar. Para saber, para fazer, para ser ou para conviver, todos os dias misturamos a vida com a educação.2 1 SILVA, Marcos; FONSECA, Selva Guimarães. Ensinar História no Século XXI: em busca do tempo entendido. Campinas, SP: Papirus, 2007 (Coleção Magistério: Formação e Trabalho Pedagógico), p.7. 2 BRANDÃO, Carlos Rodrigues. O que é educação. 33 ed. São Paulo: Brasiliense, 1995 (col. Primeiros Passos). O autor acima observa a educação em seus vários aspectos, mas não se refere diretamente à educação voltada para o trabalho, pois esta relação (educação/trabalho) parece ser pouco explorada, ou mesmo não reconhecida, uma vez que reúne teoria e prática, termos que, muitas vezes, são entendidos como antagônicos. Se “ninguém escapa da educação”, como sugere Brandão, devemos refletir sobre o que podemos fazer para que ela se torne mais presente em nossas vidas, não apenas no sentido de formação intelectual, mas também na formação profissional, uma vez que, independente de nossa classe econômica, iremos manter contato com o mercado de trabalho. Atualmente, a forma predominante de se “obter” educação é por meio da escola, mas nem sempre foi assim, como pondera Varela e Alvarez-Uria: “A escola nem sempre existiu, daí a necessidade de determinar suas condições históricas de existência no interior de nossa formação social [...]”3. Assim, o objetivo principal desta pesquisa é compreender não somente o sentido da escola, mas principalmente os jovens que chegam a ela. Compreendê-los, como revela Dayrell (p.5), como sujeitos sócio-culturais, enfatizando que: A educação, portanto, ocorre nos mais diferentes espaços e situações sociais, num complexo de experiências, relações e atividades, cujos limites estão fixados pela estrutura material e simbólica da sociedade, num determinado momento histórico. Nesse campo educativo amplo, estão incluídas as instituições (família, escola, igreja, etc...) assim como também o cotidiano difuso do trabalho, do bairro, do lazer, etc.4 Neste sentido, Dayrell nos aponta a importância de se considerar os diversos fatores envolvidos na educação e na diversidade de experiências dos elementos sociais, salientando que a escola é “parte do projeto dos alunos”5. No que se refere ao termo “trabalho”, Manfredi revela que ele geralmente vem associado à idéia de emprego, ou seja, atividade remunerada e as relações entre trabalho e escola expressam visões ambíguas e idealizadas, tendo de um lado representações que subestimam a importância da escola, supervalorizando a experiência e dos saberes envolvidos ao mundo do trabalho e de outro lado visões que 3 VARELLA, Julia; ALVAREZ-URIA, Fernando. A Maquinaria Escolar. Teoria & Educação. Porto Alegre, n.6, 1992, pp.68-69. 4 DAYRELL, Juarez Tarcisio. A escola como espaço sócio-cultural. Disponível em: <WWW.fae.ufmg.br/objuventude/textos/ESCOLA%20ESPAÇO%SOCIOCULTURAL. pdf>,p. 05. 5 DAYRELL, J.T., op. cit. p.09. superestimam a importância da escola na formação profissional e de ingresso no mercado6. Na atualidade, o mundo do trabalho vem sofrendo mudanças rápidas e o desafio da escola é compreender como ela deve realizar a difícil tarefa de produzir conhecimento e que seja possível relacioná-lo com a vida produtiva, como argumenta Manfredi: Na sociedade contemporânea, as rápidas transformações do mundo do trabalho, o avanço tecnológico configurando a sociedade virtual e os meios de comunicação incidem fortemente na escola, aumentando os desafios para torná-la uma conquista democrática efetiva. Transformar práticas e culturas tradicionais e burocráticas das escolas que, por meio da retenção e da evasão, acentuam a exclusão social, não é uma tarefa simples nem para poucos. O desafio é educar as crianças e os jovens, proporcionando-lhes um desenvolvimento humano, cultural, científico e tecnológico, de modo que adquiram condições para enfrentar as exigências do mundo contemporâneo.7 O trecho acima citado revela que a sociedade está em transformação e a escola enquanto instituição social está diretamente envolvida nestas mudanças. Assim, o ensino de História também deve perceber as transformações e se integrar ao novo contexto, promovendo a produção do conhecimento e, se possível, associando-o ao mundo produtivo. No que se refere à produção de conhecimento em sala de aula, Kátia Abud afirma que o tema vem sendo discutido desde a década de 1970, período em que se pretendia tornar a escola de primeiro e segundo graus locais de produção de conhecimento, fundamentando a negação da fragmentação entre o saber e o fazer, que dividia professores universitários de professores do ensino fundamental e médio8. A autora salienta ainda que a contribuição de André Chervel na década de 1980 foi de suma importância, uma vez que este autor discute a configuração de um saber próprio da escola, criticando a concepção de que a escola é local de reprodução, enfatizando a concepção do “saber escolar”9. Produzir uma educação significativa para os alunos, que possa ir além das paredes da escola e produzir significado na vida social do educando e de sua 6 MANFREDI, Silvia Maria. Educação Profissional no Brasil. São Paulo: Cortez, 2002 (col. Docência em Formação – Educação Profissional), p. 31-32. 7 MANFREDI, S.M. op. cit., p.12. 8 ABUD, Kátia Maria. O conhecimento histórico e ensino de História: a produção de conhecimento histórico escolar In: SCHMIDT, Maria Auxiliadora; CAINELLI, M.R. (orgs.) III Encontro Perspectivas do Ensino de História. Curitiba, Aos QuatrosVentos, 1995, p. 149. 9 ABUD, K. M., op. cit., p. 149. comunidade é um grande desafio para os educadores, principalmente com o advento do século XXI, como argumenta Ciampi: As inúmeras mudanças ocorridas antes mesmo da passagem do século 20 para o 21, tais como a nova ordem mundial, a revolução tecnológica, o esfacelamento de instituições, práticas e paradigmas de análise, colocaram novas exigências para a educação. As questões de vida e morte, as histórias vividas, invadiram o nosso cotidiano, e a escola nem sempre os enfrenta em seu trabalho pedagógico. 10 As mudanças ocorridas na sociedade brasileira nos fazem refletir sobre qual o papel da escola na vida dos alunos, bem como sobre as dificuldades que professores e os próprios alunos encontram para dar significado a sua existência intelectual e material. Para seguir adiante na reflexão, contudo, é importante que se identifique o público alvo da pesquisa que se inicia, ou seja, jovens e adultos que procuram a formação profissional. A autora Maria Ciavatta Franco, pesquisando sobre os fins da educação profissional e tecnológica, reúne dados sobre a educação no Brasil e aponta o perfil dos alunos brasileiros. Assim se manifesta a autora: Não tratamos aqui dos fins da educação definidos formalmente, como nos antigos manuais pedagógicos. Queremos pensar sobre os fins da educação em função daqueles a quem a educação se destina. Neste sentido, cabe perguntar quem são os nossos alunos em potencial? São os jovens e, também, adultos com escolaridade incompleta ou em busca da formação para o trabalho. Dados do INEP / MEC revelam que menos da metade dos jovens brasileiros de 15 a 17 anos está cursando o ensino médio e apenas 50% chegam a concluí-lo e 60% estão em cursos noturnos, o que indicam que estão fora da idade prevista para a escolaridade média diurna ou trabalham durante o dia [...]11 De acordo com os apontamentos da autora, percebemos que existem muitos alunos que necessitam conciliar, através da escola, educação e trabalho e, nesse sentido, a presente pesquisa visa a desvendar os meandros da relação escola, trabalho e ensino de História, a fim de contribuir com uma educação mais próxima da realidade dos alunos e mais integrada ao seu contexto econômico, na tentativa de integrar a disciplina História em sua dimensão escolar com as atividades sociais dos jovens e adultos que se formam nas escolas brasileiras. 10 CIAMPI, Helenice. O processo de conhecimento/pesquisa no ensino de história. In: História e Ensino – Revista do Laboratório de Ensino de História/UEL. Londrina, v.9, out. 2003, p.113. 11 FRANCO, Maria Ciavatta. Formação de professores para a educação profissional e tecnológica: perspectivas históricas In: INSTITUTO NACIONAL DE ESTUDOS E PESQUISAS EDUCACIONAIS ANÍSIO TEIXEIRA. Formação de Professores para a Educação Profissional e Tecnológica. Vol 8. Brasília: INEP/MEC, 2008. (col. Educação Superior em Debate), p.44. Para atingir seu objetivo, a pesquisa se iniciará com um breve histórico da educação profissional nas leis educacionais brasileiras para, posteriormente, se relacionarem à literatura especializada e por fim serem articuladas ao ensino de História, em específico. A questão da educação profissional sempre esteve presente na legislação brasileira. Segundo Domingos Leite Lima Filho12, desde a década de 1940 já se identificava a valorização ao ensino técnico e, ao longo dos anos 1960, houve um aumento nas matrículas nas escolas técnicas federais, sustentado também pelo ideário de desenvolvimento propagado pela ditadura militar no país. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional de 1961 (Lei n° 4.024) trouxe uma conquista para o ensino técnico industrial no Brasil, pois garantiu a este o estatuto de equivalência aos demais cursos secundários, permitindo inclusive acesso ao ensino superior13, mas apesar de haver uma preocupação em inserir o aluno no mercado de trabalho, sua formação seria tarefa das escolas técnicas, diferentemente do aluno que não tinha a intenção de inserir-se de maneira imediata ao mercado. Sendo assim, a lei manteve uma dualidade entre educação profissional e geral e, conseqüentemente, uma distinção entre o aluno menos favorecido materialmente que precisava trabalhar para seu sustento e o aluno mais favorecido, que não tinha pretensão imediata de inserção ao mercado de trabalho. A LDBEN 5.692 de 1971 apresenta a qualificação do aluno para o trabalho como uma de suas principais preocupações, como cita o art. 1°: O ensino de 1º e 2º graus tem por objetivo geral proporcionar ao educando a formação necessária ao desenvolvimento de suas potencialidades como elemento de auto-realização, qualificação para o trabalho e preparo para o exercício consciente da cidadania. 14 Nesta lei, o ensino médio está voltado para o ensino profissionalizante, designando à escola a tarefa de formar uma mão-de-obra qualificada para atender as necessidades e exigências do mercado de trabalho e, segundo Bressan, a 12 FILHO, Domingos Leite Lima. Desafios para a expansão e democratização da educação profissional e sua relação com a educação básica no contexto atual In: GOVERNO DO ESTADO DO PARANÁ; SECRETARIA DE ESTADO DA EDUCAÇÃO; SUPERINTENDÊNCIA DE EDUCAÇÃO – DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO PROFISSIONAL. Textos: Semana Pedagógica: 1 a 4 de fevereiro de 2005. Paraná: Secretaria de Estado da Educação, 2005, p.06. 13 FILHO, op. cit., p.6. 14 BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Lei 5.692 de 11 de agosto de 1971. Disponível em <http://www2.camara.gov.br/legislação/publicacoes/republica> Acesso em: 21 agosto de 2006, p.01. obrigatoriedade da habilitação profissional tinha como objetivo implícito a contenção da demanda de estudantes secundaristas ao Ensino Superior15. Nesse sentido, a LDBEN de 1971 contribuiu para a desvalorização do ensino profissional vinculado a educação, a utilizar enquanto justificativa o desenvolvimento econômico e atendendo o modelo político-econômico da Ditadura Militar. A LDBEN 7.044 de 1982 alterou alguns dispositivos da 5.692/71 principalmente no que se refere à obrigatoriedade da educação profissionalizante, pois esta lei extingue sua obrigatoriedade no 2° grau, ficando a critério do estabelecimento de ensino optar ou não pela habilitação profissional, evidenciando, segundo Carmo, o “reconhecimento legal do fracasso da profissionalização compulsória” 16. A partir da década de 1990, as reformas na educação estiveram fortemente influenciadas pelos avanços tecnológicos e, sobretudo, no governo de Fernando Henrique Cardoso (1995 a 2002) as políticas educacionais se adequaram mais fortemente às regras do mundo do trabalho, como reflete Lima Filho: Sob os paradigmas da flexibilização, da privatização e da desregulamentação buscou-se a implementação de políticas educacionais funcionais ao projeto de inserção da sociedade brasileira na dinâmica da globalização em associação subalterna ao capital internacional.17 Nesse contexto do final da década de 1980 até finais de 1990, dois documentos se destacaram com diferentes abordagens no que se refere à educação profissional: o Substitutivo Jorge Hage, de 1990, que modifica elementos do projeto inicial do deputado Octávio Elísio, de 1988, e o texto final da LDBEN de 1996, proposto pelo então senador Darcy Ribeiro. Incentivado pela promulgação da Constituição de 1998, o deputado Octavio Elísio apresentou à Câmara Federal, no dia 05-10-1988, o projeto de Lei (n° 1.158-A/88), inserido nas discussões já iniciadas em diversos setores educacionais, mas já em dezembro do mesmo ano, o autor apresenta uma emenda, seguida de uma segunda e uma terceira. O projeto foi submetido à Comissão de Constituição, Justiça e Redação e foi aprovado em junho de 1989. 15 BRESSAN, Vera. Educação Geral e Profissional: ensino médio integrado e as possibilidades da formação unitária e politécnica. Curitiba:UFPR, 2006 (Mestrado em Economia Política da Educação), p.19-20. 16 CARMO, Jefferson Carrielo do. Educação Profissional e o Estado Intervencionista: velhos problemas ou “novas” soluções? Disponível em: <http://www.uepg.br/emancipacao/pdfs/revista%206/Artigo%208.pdf> p.150. 17 FILHO, op.cit. p.08. Em 1989 o deputado cearense Ubiratan Aguiar, presidente da Comissão de Educação, Cultura e Desporto da Câmara constituiu um Grupo de Trabalho para discutir assuntos pertinentes à LDB, que foi coordenado por Florestan Fernandes e foi indicado como relator Jorge Hage18. Segundo Saviani, muitos projetos foram anexados ao original, assim como diversas emendas, mas além de propostas formalmente registradas houve também inúmeras sugestões, que chegaram ao conhecimento do relator, que inclusive declara ser um dos mais democráticos métodos de elaboração de uma lei que já se teve notícia 19. Como relator, Jorge Hage manteve-se atento às sugestões e participando de audiências públicas em diversos locais do país, Hage vinha construindo um Substitutivo, que em 28 de junho de 1990 teve aprovação unânime da Comissão. Porém, o Substitutivo de Jorge Hage teria ainda um longo caminho a percorrer na Câmara de Deputados e enquanto tramitava surgiram iniciativas paralelas no Senado e, em maio de 1992, o senador Darcy Ribeiro apresentou um projeto de LDB, assinado pelos senadores Marco Maciel e Maurício Correa, tendo como relator o senador Fernando Henrique Cardoso: [...] diferentemente do projeto da Câmara que se formulou sobre uma concepção de democracia participativa, compartilhando-se as decisões entre as autoridades governamentais e comunidade educacional organizada, através de Conselhos de caráter deliberativo, o projeto do Senador tem por base uma concepção de democracia representativa na qual a participação da sociedade, se limita ao momento do voto através do qual se dá a escolha dos governantes. Uma vez escolhida, eles são legitimados para tomar decisões em nome de toda a sociedade não necessitando mais sequer consultá-la.20 No sistema parlamentar brasileiro, um projeto de lei pode ser apresentado e iniciar tramitação em qualquer uma das casas do Congresso. Se começa na Câmara, ao ser aprovado, deverá ir ao Senado, uma vez aprovado deve retornar à Câmara para a deliberação final e depois é enviado ao Presidente, que detém o poder de veto, se houver, volta à Câmara que pode manter ou derrubá-lo, só depois a lei é promulgada 21. O senador Darcy Ribeiro se beneficiou do novo Regimento Interno do Senado, isto quer dizer que uma vez aprovado na Comissão de Educação, o projeto de 18 SAVIANI, Dermeval. A Nova Lei da Educação: LDB trajetórias limites e perspectivas. 2 ed. Campinas, SP: Autores Associados, 1997 (Coleção educação contemporânea), p.57. 19 SAVIANI, op. cit., p. 57. 20 SAVIANI, op. cit., p.129. 21 SAVIANI, op. cit., p.91. LDB estaria automaticamente aprovado no Senado, seguindo para a apreciação da Câmara dos Deputados, diferentemente do projeto de Hage, que é decorrente do projeto de 1988, nesse período vigorava o antigo regulamento e deveria ser apreciado pelo Plenário da Casa. Contudo, com o afastamento de Collor, Itamar Franco assume a presidência e indica Murilo Hingel para o Ministério da Educação. Hingel se manifestou a favor do projeto da Câmara e articula para que o projeto de Darcy Ribeiro volte à Comissão de Educação22. No entanto, a situação política era mais favorável ao senador Darcy Ribeiro, que foi apresentando sucessivas versões de seu projeto, tornando seu texto mais conveniente, diminuindo possíveis resistências. A última versão foi aprovada em 08 de fevereiro de 1996 e possui algumas alterações de acordo com o projeto da Câmara e, ao mesmo tempo, adequa-se ao ideário de governo de Fernando Henrique Cardoso 23. Depois de aprovado no Senado, o projeto de Ribeiro foi a Câmara de Deputados tendo como relator o deputado José Jorge. Sem vetos a lei foi promulgada em 20 de dezembro de 1996. Tendo em mente o processo de aprovação da Lei Darcy Ribeiro e sua ligação com o projeto de Jorge Hage, apresentamos, em primeira instância, a questão da educação profissional nos dois documentos a fim de perceber divergências e convergências a respeito da questão. Vejamos um trecho do texto produzido principalmente por Jorge Hage, sobre a formação técnico-profissional: Art. 56 – O aluno matriculado ou egresso do ensino fundamental e médio, bem como o trabalhador em geral, jovem e adulto, além da garantia de educação básica comum, e das ofertas de educação profissional no ensino médio regular, deverá contar com a possibilidade de acesso a uma formação técnicoprofissional específica, que não substitua a educação regular e contribua para o seu desenvolvimento como cidadão produtivo, proporcionando-lhe meios para prover sua existência material.24 O artigo acima citado mostra os objetivos do ensino técnicoprofissional, que inclui alunos e trabalhadores, dando uma educação básica comum, mas oferecendo uma oportunidade de ter uma formação técnica para que possam sustentar-se materialmente. Tal artigo se vincula ao objetivo geral da Educação apresentado no projeto que, segundo o documento, é “instrumento da sociedade para a promoção do 22 SAVIANI, op. cit., p. 130. SAVIANI, op. cit., p. 161. 24 SAVIANI, op. cit., p .91. 23 exercício da cidadania”25 e tem como, dentre outras finalidades: “[...] o preparo do cidadão para a compreensão e o exercício do trabalho, mediante acesso, à cultura, ao conhecimento científico, tecnológico e ao desporto”.26 No texto da LDB sancionada em 20/12/1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, a educação profissional, num capítulo mais conciso, está: [...] integrada às diferentes formas de educação, ao trabalho, à ciência e à tecnologia, conduz ao permanente desenvolvimento de aptidões para a vida produtiva. Parágrafo único: O aluno matriculado ou egresso do ensino fundamental, médio e superior, bem como o trabalhador em geral, jovem ou adulto, contará com a possibilidade de acesso à educação profissional. 27 Neste sentido, a atual LDB não está tão vinculada a prover o sustento material, como o texto de Hage, preocupa-se mais com sua inserção no mercado de trabalho e inclusão tecnológica e científica, qualificando-se para o mercado produtivo. No Substitutivo Jorge Hage o texto dá a entender que o educando deve compreender o exercício do trabalho e através dele prover sua existência material. Segundo Saviani o projeto da Câmara é influenciado por uma concepção social-democrata, e neste sentido, a educação é entendida como um direito social que deve ser garantido, planejado executado e supervisionado pelo Estado, diferente da concepção “minimalista de LDB” compatível com a idéia de um Estado neoliberal28. A análise contextualizada e articulada das fontes será primordial para atender aos objetivos deste trabalho, contudo, este estudo poderá ser ampliado se relacionado com o ensino de História ao refletir sobre quais conteúdos do fazer específico da História e do seu ensino podem contribuir, e como, à formação para o trabalho no contexto dos desafios inerentes ao advento do séc. XXI. Além disso, a análise deve possibilitar a compreensão sobre como a sociedade tomada como um grupo social que possui especificidades e objetivos, os quais, ao serem desvelados, permitirão respostas acerca do fato de os projetos educacionais preocupados com a formação para o trabalho haver facilitado o processo de aprendizagem e contribuído para que o aluno pudesse perceber seu lugar neste espaço social, pois: 25 SAVIANI, op. cit., p.72. SAVIANI, op. cit, p.72. 27 SAVIANI, op. cit., p .175. 28 SAVIANI, op. cit., p .195. 26 Considerando-se a contingência de milhares de jovens que necessitam, o mais cedo possível, buscar um emprego ou atuar em diferentes formas de atividades econômicas que gerem sua subsistência, parece pertinente que se faculte aos mesmos a realização de um ensino médio que, ao mesmo tempo em que preserva sua qualidade na educação básica como direito social e subjetivo, possa situá-los mais especificamente em uma área técnica ou tecnológica. 29 Dessa forma, o ensino de História, se devidamente articulado com este pensamento, pode ir além de uma história factual, que privilegia datas e heróis, a História ensinada estaria afinada com questões fortemente presentes no cotidiano dos alunos e do ambiente escolar em geral e poderá ser incorporada na vida prática dos envolvidos nesse processo, contribuindo para uma formação mais completa que proporciona ao aluno do século XXI compreender e participar ativamente de seu processo de aprendizagem e dar sentido a ele, considerando a proposição de Ciampi: O processo de conhecimento, inclusive no espaço escolar, implica um movimento de relações recíprocas entre o sujeito que conhece e o objeto a ser conhecido, num dado contexto sócio-cultural. As relações que envolvem alunos, professor e conhecimento, no espaço escolar, são complexas, articulam experiências, vivências, valores e expectativas variadas. Nesse espaço, cruzam-se vozes e significados diversos, influindo no processo de construção de conhecimento [...]30 Assim, tanto o aluno como o professor de História estariam construindo conhecimento juntos e proporcionando maneiras de interação social, não apenas voltada ao trabalho e sim para a vida de um modo geral, construindo sua existência material e intelectual. Com se estudo, pretendemos inserir a educação e as políticas educacionais no contexto do ensino de História no limiar do século XXI, colaborando para desvendar como a disciplina poderá contribuir para uma formação mais integrada ao ambiente social e educacional, fazendo com que o aluno consiga atribuir mais sentido e participe mais ativamente da construção de seu próprio conhecimento. 29 FRIGOTTO, Gaudêncio; CIAVATTA, Maria, RAMOS, Marise (orgs.). Ensino Médio Integrado: concepção e contradições. São Paulo: Cortez, 2005, p.77. 30 CIAMPI, Helenice. op. cit.,p.112-113. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ABUD, Kátia Maria. O conhecimento histórico e ensino de História: a produção de conhecimento histórico escolar In: SCHMIDT, Maria Auxiliadora; CAINELLI, M.R. (orgs.) III Encontro Perspectivas do Ensino de História. Curitiba, Aos QuatrosVentos, 1995. BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Lei 5.692 de 11 de agosto de 1971. Disponível em <http://www2.camara.gov.br/legislação/publicacoes/republica> Acesso em: 21 agosto de 2006. BRANDÃO, Carlos Rodrigues. O que é educação. 33 ed. São Paulo: Brasiliense, 1995 (col. Primeiros Passos). BRESSAN, Vera. Educação Geral e Profissional: ensino médio integrado e as possibilidades da formação unitária e politécnica. Curitiba:UFPR, 2006 (Mestrado em Economia Política da Educação). CARMO, Jefferson Carrielo do. 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