PARA ENTENDER MELHOR A ESCOLA
Danilo Gandin *
Devo advertir meus leitores de que, embora muitas das ideias aqui levantadas possam
servir a qualquer nível de ensino, limito-me a falar do ensino básico, isto é, educação infantil,
ensino fundamental e ensino médio, excetuado o profissionalizante. Entre as muitas
características deste ensino, convém pensar de imediato que ele não é fonte do extraordinário.
O extraordinário é aquilo que é novo, pouco firme na prática das pessoas ou dos grupos, mas
que já é claramente aceito por setores da sociedade. Por exemplo: há uma grande compreensão
da democracia republicana, mas quase não há prática disto.
Esta condição da escola acontece porque é de sua natureza e de outras instituições
reproduzir o cotidiano da sociedade; fazem isto porque devem “integrar” as crianças e os
adolescentes na sociedade em que chegaram e na qual terão qu e sobreviver e buscar seu lugar.
Esta reprodução faz-se sem que seja necessário pensar . Veja-se o desenvolvimento do racismo
ou, pelo menos, do desrespeito a etnias não dominantes: ele s acontecem com naturalidade,
como um dia foi “natural”, para quase todos, haver escravidão.
Numa sociedade com hierarquia de valores consolidada ou numa sociedade bem
autoritária, as escolas reproduzirã o – sob pena de fecharem – o total da cultura daquela
sociedade; em casos assim os educadores nem se darão conta que poderiam agir de outra
forma. Quando, porém, a sociedade tem conflito de ide ias, isto é, dentro dela são vividas
distintas hierarquias de valores, a escola entra em crise, muitas vezes perde o rumo,
comprometendo sua finalidade de ser espaço educativo, e, quase sempre, aprofunda mudanças
técnicas para seguir fazendo aquilo que já fazia . Neste caso, o debate sobre educação se
universaliza.
A consequência desta reprodução é forte: as escolas, no seu conjunto, não podem ser
muito melhores do que a sociedade na qual estão incluídas; na nossa realidade, elas são, por
exemplo, mais autoritárias do que muitos setores sociais e menos amplas e profunda s, quanto
ao conhecimento, do que a mídia. A reprodução se dá através da estrutura das escolas e ,
sobretudo, do cotidiano escolar. O essencial dest e cotidiano são os conteúdos préestabelecidos, as notas, as séries e as disciplinas e o professor falando o tempo todo.
*
Professor e escritor e conferencista.
O vestibular é um entrave de grande importância : ele exige pseudo-especializações dos
alunos, o que impossibilita um educar -se do modo como já se pensa em nossa sociedade ; as
autoridades educacionais, junto com a legislação e a regulamentação, são as grandes
responsáveis pela manutenção dos processos escolares do jeito que eles foram e são (sempre
serão?). A saída é a lucidez. A sociedade, as autoridades e, sobretudo, os educadores precisam
escolher o que querem reproduzir e mudar o processo esc olar a partir desta opção. Assim a
escola pode ser transformadora do cotidiano, ampliando o que já está pensado em nossa
sociedade e que ainda é pequeno na prática.
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