TERCERIZAÇÃO OU PRECARIZAÇÃO DO TRABALHO: A SITUAÇÃO DO HIPOSSUFICIENTE Poliana Beordo1 1. INTRODUÇÃO: Para Plácido e Silva (2002) Súmula: “é o que explica o teor, ou o conteúdo integral de alguma coisa”, sendo um resumo propriamente dito. Enfim, pode-se dizer que a súmula é um extrato, um resumo, um compêndio das reiteradas decisões exaradas pelos tribunais superiores versando sobre uma determinada matéria. Desde o início do processo de industrialização o mundo teve um crescimento dos problemas ligados às relações de trabalho, ocasionando detrimento da mão-de-obra a favor da redução de custos, com a flexibilização, terceirização, redução salarial, mecanização e robotização das indústrias. Favorecendo assim as relações de consumo, devido ao aumento da produção e trazendo gravíssimas conseqüências no universo trabalhista. No Brasil, não ocorreu nada muito diferente, a globalização e a acirrada concorrência com outros mercados trouxeram novas relações de trabalho, mas o Direito tenta regulamentar algumas normas para ocorrer uma harmonia nesta nova relação. Existe possibilidade de terceirização quando o serviço prestado pelo trabalhador seja meio e não fim da empresa. Notamos que ao ser exteriorizar essas normas perdem sua finalidade. Ao inserir no mundo jurídico a S 331 o TST tinha o intuito de minimizar o desemprego e abrir novos caminhos para contratação de mão-de-obra. Contudo as brechas deixadas na edição da súmula e à perspicácia de alguns empregadores em fraudar o sistema aliado ao medo do trabalhador em ficar fora do mercado de trabalho e sua subordinação moral faz vítimas e dificulta o acesso ao judiciário. Hoje, identifica-se facilmente o cumprimento de jornada de trabalho exacerbada sem qualquer contraprestação da gratificação extraordinária reduzindo, muitas vezes, a condição análoga à de escravo os trabalhadores. Em alguns casos as condições de trabalho são muito prejudiciais à saúde, perigosas, dissociadas nas normas de segurança 1 Universidade de Ribeirão Preto – UNAERP . E-mail: [email protected] e medicina do trabalho e quando o trabalhador torna-se improdutivo, a dispensa é sumária. Esse problema vai além da esfera trabalhista e se insere na questão social quando a falta de cidadania, a falta de especialização profissional, e as ausências generalizadas de oportunidades impedem a busca por empregos dignos. Enfim, a questão trabalhista liga-se intimamente à vida dos trabalhadores e conseqüentemente as suas relações sociais, pois passam a enfrentar várias dificuldades e cedem vários benefícios em troca muitas vezes de um salário aquém do mínimo. Nesta perspectiva iremos discutir as relações sociais associadas ao trabalho. 2. OBJETIVOS: Após analisar o instituto pretendemos demonstrar as implicações trazidas pela flexibilização bem como edição de Súmulas cujo escopo era fazer entender matéria sobre a qual a Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT) foi omissa. Traçar parâmetros, estabelecer divergências e convergências entre a Constituição, Carta Magna, CLT e as Súmulas que versem a respeito da terceirização possibilitando que o leitor chegue a suas conclusões a respeito da eficácia dessa Súmulas como meio eficaz de solução de conflitos. 3. METODOLOGIA: No processo de construção desta pesquisa, primeiramente será utilizado o amplo material bibliográfico disponível para conseguir abordar o tema. A Terceirização foi escolhida como universo desta pesquisa devido a grande polêmica ainda existente entre sua efetividade em auxiliar os operadores do direito a combater com as fraudes cometidas pelos empregadores ao sistema. Através do estudo realizado na nova sistemática jurídica considerando que nos proporcionará uma visão ampla das alterações vivenciadas pelo nosso ordenamento pátrio, que afeta não apenas os operadores do direito, mas é sentida principalmente por toda sociedade afoita por uma verdadeira pacificação social. O tema escolhido tem forte apelo social, uma vez que trabalhadores são explorados a exaustão enquanto empregadores sedentos de lucros se apegam ao que ditam as normas dizendo agir legalmente. Por fim, fornecer dados necessários para que o leitor entenda melhor o instituto, bem como tire suas conclusões a respeito do tema. 4. DESENVOLVIMENTO: “A dignidade só é possível com a liberdade, porque somente o homem livre é digno, pois terá reconhecida sua honradez, a sua nobreza de ser humano. Mas para que possa haver uma humanização total e abrangente, devem todas as organizações sociais humanas reconhecer seus membros por seus atributos intrínsecos humanos, e não pelos seus atributos materiais externos como riqueza material.” Santos, Antonio Silveira Ribeiro dos, (2008) A terceirização surgiu como forma de “flexibilização” trabalhista, vislumbrava inicialmente a geração de mais empregos, uma vez que descentralizava a relação direta empregador empregado, e passava para terceiro a responsabilidade do vínculo empregatício. Notadamente seus efeitos foram inversos e o avanço desenfreado deste processo no país, ocasionou o acréscimo de inúmeras ações trabalhistas relacionadas à terceirização. Diante de tal situação e depois de reiteradas discussões, em 1993, o Tribunal Superior do Trabalho (TST) edita a Súmula 331 dando provimento a licitude da contratação de mão-de-obra terceirizada desde que para exercício de atividade meio da empresa tomadora, formando vinculo diretamente com a prestadora. Esse entendimento encontra-se vinculado ao disposto no artigo 2º da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), o qual estabelece que empregador é aquele que assume os riscos da atividade econômica, admitindo e assalariando, bem como dirigindo a prestação pessoal dos serviços. Esclarece que será considerado atividade-meio aquela diz respeito à atividade secundária da empresa, isto é, não se referindo à sua própria atividade normal, como serviço de limpeza, de alimentação de funcionários, vigilância, etc. E incorpora também o princípio da responsabilidade subsidiária que prevê que o inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica na responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços quanto àquelas obrigações. Contudo, o principal determinante das mudanças no mundo do trabalho continua sendo a redução de custos. Dessa forma, a terceirização teve rápida e ampla difusão por todas as áreas da economia onde as estratégias utilizadas buscam o aumento da intensidade do ritmo de trabalho, a maior concentração de tarefas e responsabilidades, o que evidentemente tem resultado numa precarização das condições de trabalho e de emprego. Cabe destacar que os diversos direitos sociais trabalhistas, inclusive o mandamento de “redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança” previstos no artigo. 7º, inciso XXII, da CF/88 e consagrados pela Norma Regulamentadora (NR) 31, item 31.20, vem sendo violados, uma vez que os níveis salariais e os benefícios sociais nas subcontratadas são inferiores aos da empresa contratante, a falta de equipamentos de segurança (EPI’s) associados ao maior desgaste e tensão fazem com que os empregados sintam-se menosprezados, consequentemente há propensão ao maior índice de acidentes e doenças de trabalhos. As empresas contratantes notificam apenas os agravos ocorridos entre os empregados do quadro próprio e, em geral, a registrar apenas os casos mais graves. Os acidentes e doenças profissionais que envolvem os trabalhadores das empresas subcontratadas não são considerados pela contratante e, em geral, nunca são notificados à Previdência Social. A precarização também é sentida no tocante de reduzir o empregado à condição análoga a de escravo de modo os intermediadores obrigam estes a comprar mercadorias de seus estabelecimentos das tomadoras, submetendo os trabalhadores a trabalhos forçados ou a jornada exaustiva, bem como sujeitando-os a condições degradantes de trabalho, e restringindo, por qualquer meio, sua locomoção em razão de dívida contraída com o empregador ou preposto: Por fim, o processo de terceirização tem aumentado a não comunicação dos acidentes e doenças ocupacionais deixando os trabalhadores desprotegidos e vitimados, revelando ser não apenas um processo de transferência de atividades entre empresas e setores da economia, mas também uma transferência de riscos e de responsabilidades. 4.4 - A FLEXIBILIZAÇÃO TRABALHISTA: A flexibilização surge como forma de proporciona a adequação necessária ao Direito do Trabalho frente a instabilidades econômicas diante das quais surge o desemprego. A tendência da flexibilização é decorrente da passagem da era industrial para pós-industrial o que proporcionou a expansão do setor terciário. Assim, deveria haver proteção ao trabalhador estivesse ele sob subordinação ou não, empregado ou desempregado. Neste contexto a flexibilização das normas do Direito do trabalho visa assegurar as condições mínimas ao trabalhador, em contrapartida a sobrevivência da empresa. A Constituição privilegia em vários momentos o instituto: quando determina a possibilidade de redução dos salários por convenção ou acordo coletivo (artigo 7º, VI); a compensação ou redução da jornada de trabalho mediante acordo ou convenção coletiva(artigo 7º, XIII); aumento da jornada de trabalho; participação nos lucros (7º, XI), estipulação dessa participação mediante convenção ou acordo coletivo (artigo 621 da CLT), por exemplo. No entanto, esse instituto será também utilizado para compatibilizar economia com novos métodos de gestão de mão-de-obra o que acabara por prejudicar o empregado que se submeterá ao trabalho sem registro em carteira e consequentemente sem os direitos e benefícios que lhe são garantidos. Só deveria haver transferência para terceiros de atividade-meio, manutenção, limpeza, conservação, vigilância etc, o que não tem acontecido, uma vez que as empresas prestadoras passaram a terceirizar, também, atividade-fim. Transformar a prestação de serviços em um grande mercado onde o que se negocia é o trabalhador não deveria ser o fim da terceirização. 4.5. EDIÇÃO DE SÚMULAS: A edição da Súmula 257 pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST) teve com escopo regular a relação do vigilante de banco, sendo ele contratado direta ou indiretamente pelas agências bancárias ou por intermédio de empresas especializadas ele não será considerado bancário. Passamos pela 256 do mesmo órgão cujo escopo era coibir a terceirização, uma vez que em seu texto vinha estabelecido que o vínculo empregatício se dava entre o trabalhador e a empresa que toma os seus serviços e de fato se beneficia com eles. Por fim, a mais controversa de todas: a Súmula 331 do TST que atende a interesses empresariais imediatos deixa desprotegidos os trabalhadores. Por ela fica estabelecido que uma empresa pode oferecer mão-de-obra a outra empresa, para executar serviços no âmbito da primeira, desde que estes serviços não se vinculem à atividade-fim da empresa que a contrata e desde que não haja subordinação direta dos trabalhadores à empresa tomadora – diferenciando atividade-meio e atividade-fim. Além disso, no caso de não pagamento dos créditos trabalhistas desses trabalhadores, por parte da empresa prestadora, a tomadora será considerada responsável, subsidiariamente, na obrigação de adimplir tais créditos. Pretendia-se com isso garantir ao hipossuficiente meios dignos e condições adequadas para o trabalho. Porém, seu texto controverso colaborou para fraudes, para informalização, para precarização das condições de trabalho e acabou simplesmente “legalizando” a intermediação de mão-de-obra. A terceirização de mão-de-obra está provocando a deteriorização das relações de trabalho, uma vez que os terceirizado recebem salários menores, não têm acesso aos benefícios conquistados por convenção coletiva. Os terceirizados normalmente ficam excluídos de algumas atividades da empresa tomadora visando o empregador evitar a subordinação direta e consequentemente o vínculo. Não são integrados as CIPAS e como não tem representação sindical subordinam-se a trabalhar em quaisquer condições que lhe são apresentadas, sem possibilidade de rejeição institucional. O meio-ambiente do trabalho, desse modo, é relegado a segundo plano, gerando aumento de doenças profissionais. Ademais, referida Súmula fere o artigo 2º da CLT. Segundo o artigo o empregador é a “empresa” que assume os riscos da atividade econômica, uma vez que está sendo terceirizada a maioria dos serviços considerados essências ou de atividade permanente das empresas. Como explica Evaristo de Moraes Filho (1993), "Em nossa legislação fica para a empresa o tratamento abstrato, incorpóreo, de bem complexo, de coisas materiais e imateriais, inclusive relações do trabalho, para o exercício da atividade econômica". 5. CONCLUSÃO: Diante de tais fatos fica o empregado, que já é parte hipossuficiente, em total situação de desvantagem, uma vez que irá se submeter à tratamentos muitas vezes desonrosos, humilhantes. São colocados em segundo plano, se trata de um mero instrumento através do quais as empresas prestadoras de serviços se desincumbem de suas obrigações para com a tomadora de serviços. Submetem-se a salários mais baixos, condições inadequadas de trabalhos muitas vezes expondo-se a perigo eminente suas vidas. Alguns, colocados em condições análogas a de escravos só conseguiram sair dos respectivos empregos mortos, pois devem ao patrão mais do que podem pagar. Perdem a saúde, não apenas a do corpo, mas a mental, uma vez que auto-estima é quase inexistente nessa gente que sofre de sol a sol debaixo dos olhos atentos do empregador. O Poder Legislativo capaz de elaborar normas deve produzi-las o mais breve possível a fim de conduzir o processo de terceirização ao cumprimento de sua função social e econômica, resguardando o diferencial competitivo às empresas brasileiras, sem esquecer do fator mais importante, resguardado pelo Direito Trabalhista: a promoção do bem comum e garantindo um direito fundamental constitucional e base do direito do trabalho, a dignidade da pessoa humana. BIBLIOGRAFIA E NOTAS: Silva, e Plácido. Vocabulário Jurídico. p 297 MORAES FILHO, Evaristo de. Do Contrato de Trabalho como Elemento da Empresa, São Paulo, LTr, 1993, p. 214. MARTINS, Sergio Pinto. Direito do trabalho. 22. ed. São Paulo: Atlas, 2006. CARRION, Valentin. Comentários à Consolidação das Leis do Trabalho. 23. ed. São Paulo: Saraiva, 1998. OLIVEIRA, Juarez de. Constituição Federal de 1988. 8 ed. São Paulo, 2002