EEssttuuddoo ddoo G
Geennee C
CFFTTRR:: D
Diissttrriibbuuiiççããoo aalléélliiccaa ee hhaapplloottííppiiccaa eem
m
PPoorrttoo VVeellhhoo -- RRoonnddôônniiaa
Mestranda: Maria Izabel Ovellar Heckmann Alecrim
Orientadora: Dra. Vera Engracia Gama de Oliveira
Porto Velho – 03 de dezembro de 2002.
A minha mãe
Patrosina
elemento essencial em
todas as minha realizações
e no significado em nossas vidas...
As minha filhas
Poliana e Priscilla,
porque vocês existem....
meus irmãos: Altair,
Napoleão e Irajá,
pelo incentivo, carinho e apoio.
Lembrança Saudosa
de meu Pai Olavo,
que foi o início de tudo...
E a Deus,
por me dar coragem
de enfrentara caminhada.
Agradecimentos
A Dra. Vera Engracia Gama de Oliveira, que me conduziu desde a Iniciação
Cientifica, com sua vasta experiência e capacidade profissional, na conquista de um
objetivo de importância impar em minha vida.
Ao Prof. Luiz Hildebrando Pereira da Silva, pela atenção e incentivo, expressos em
forma de apoio na formação de minha vida Científica.
A Ms Giselda Maria Kalil de Cabello, pela cooperação, por tudo que me ensinou
sobre Fibrose Cística.
Ao Prof. Aguinaldo Luiz de Simões, incentivador deste mestrado e futuro orientador
de doutorado.
Ao Prof. Henrique Krieger, pela disponibilidade em me orientar nas análises
estatísticas.
Aos Professores membros da banca examinadora, pela disponibilidade para avaliar
este trabalho e assim contribuir para minha formação.
A Ms Mauro Sugiro Tada, pelo incentivo
Aos colegas de Laboratório: Josileide, Jefferson, Marlene, Francisca e Almeida.
A todos colegas do Centro de Pesquisa em Medicina Tropical.
A Fundação Universidade Federal de Rondônia, por proporcionar a oportunidade de
fazer este curso.
Ao Hemeron por ceder as amostras de sangue dos doadores.
Aos indivíduos das sub-amostra, em especial do bairro de Candelária e Bate Estaca.
As minhas filhas, por serem obrigadas a compreender minhas ausências constantes.
E finalmente a Capes, Ipepatro e Ministério da Saúde, pelo apoio institucional. E ao
CNPq, pela bolsa concedida desde a Iniciação Científica.
Sumário
1. Introdução................................................................................................................
1.1Função do Gene CFTR.................................................................................
1.2 Tipos de mutações........................................................................................
1.3 Estudo de distribuição..................................................................................
1.4 Distribuição de Mutações no gene CFTR no Brasil....................................
1.5 Marcadores Intra e Extragênicos..................................................................
1.6 Análise de Haplótipos..................................................................................
2. Objetivos...................................................................................................................
3. Material e Métodos..................................................................................................
3.1 Caracterização da população........................................................................
3.1.1 População em estudo – Porto Velho.........................................................
3.1.1.a Hemeron....................................................................................
3.1.1.b São Carlos.................................................................................
3.1.1.c Candelária..................................................................................
3.1.1.d Bate Estaca................................................................................
3.1.2 Guajará Mirim...............................................................................
3.1.3 Candeias do Jamari........................................................................
3.2 Coleta do Material........................................................................................
3.3 Métodos de análises laboratoriais ...............................................................
3.3.1 Condições utilizadas para a amplificação do DNA.......................
3.3.2 Programas para PCR.....................................................................
3.3.3 Confirmação da amplificação........................................................
3.3.4 Digestão dos RFLPs......................................................................
3.3.5 Gel de Poliacrilamida....................................................................
4. Análise dos Dados....................................................................................................
4.1 Análises de Segregação................................................................................
4.2 Caracterização demográfica das populações................................................
4.3 Freqüências..................................................................................................
4.4 Detecção da Mutação ΔF508 – determinação do tamanho amostral...........
5. Resultados.................................................................................................................
5.1 Caracterização demográfica dos indivíduos................................................
5.2 Freqüências..................................................................................................
5.2.1 Freqüências alélicas.......................................................................
5.2.2 Freqüências Haplotípicas..............................................................
5.2.2.1. XV2c e KM19 – Hemeron............................................
5.2.2.2. XV2c e KM19 – São Carlos..........................................
5.2.2.3. XV2c e KM19 – Candelária..........................................
5.2.2.4. XV2c e KM19 – Bate Estaca.........................................
5.2.2.5. XV2c e IVS6aGATT – Hemeron..................................
5.2.2.6. XV2c e IVS6aGATT – São Carlos...............................
5.2.2.7. XV2c e IVS6aGATT – Candelária................................
5.2.2.8. XV2c e IVS6aGATT – Bate Estaca..............................
5.2.2.9. KM19 e IVS6aGATT – Hemeron.................................
5.2.2.10. KM19 e IVS6aGATT – São Carlos.............................
5.2.2.11. KM19 e IVS6aGATT – Candelária.............................
5.2.2.12. KM19 e IVS6aGATT – Bate Estaca...........................
5.3. Distribuição de Haplótipos..........................................................................
6. Análise de Segregação.............................................................................................
7. Probandos.................................................................................................................
8. Discussão...................................................................................................................
8.1 Freqüências alélicas.................................................................................................
8.1.1 ΔF508........................................................................................................
8.1.2 Marcadores polimórficos..........................................................................
8.2 Freqüência Haplotípicas..........................................................................................
8.3 Rastreamento de Mutações......................................................................................
8.4 Análise de Segregação ............................................................................................
9. Bibliografia...............................................................................................................
10. Resumos..................................................................................................................
10. Resumo deste trabalho.................................................................................
10.1 Resumo SBG 01 – 2000.............................................................................
10.2 Resumo SBG 02 – 2000.............................................................................
......
10.3 Resumo SBG – 2001..................................................................................
10.4 Resumo SBG – 2002..................................................................................
11. Anexos.....................................................................................................................
11.1 Extração de DNA – Proteinase K..............................................................
11.2 Coloração com Nitrato de Prata.................................................................
11.3 Eletroforese – gel de poliacrilamida (PAGE)............................................
11.4 Termo de Consentimento...........................................................................
11.5 Ficha de Inquérito......................................................................................
Sumário de Figuras, Tabelas, Fotos e Gráficos
Figura 01:
Representação esquemática do Gene CFTR e da proteína e o modelo
proposto para sua localização na membrana plasmática............................ ......
Figura 02:
Representação esquemática das cinco classes de mutações do gene
CFTR..........................................................................................................
Tabela 01:
Mutações no Gene CFTR mais freqüentes (CFGAC 1994).......................
Tabela 02:
Distribuição de mutações CF em amostras de fibrocísticos brasileiros
(Cabello e Cols., 1999; Raskin e Cols., 1999)...........................................
Tabela 03:
Mutações no gene CFTR em 74 pacientes fibrocísticos do Rio de
Janeiro (Cabello; 2001)..............................................................................
Tabela 04:
Alelos associados com a mutação ΔF508..................................................
Figura 03:
Mapa físico de Marcadores extra e intragênicos utilizados para estudos
da distribuição de haplótipos......................................................................
Tabela 05:
Caracterização dos haplótipos definidos pelos marcadores KM19,
XV2c e IVS6aGATT..................................................................................
Tabela 06:
Haplótipos (KM19/XV2c) de indivíduos CF portadores de mutações
desconhecidas.............................................................................................
Tabela 07:
Quatro mutações mais freqüentes no mundo (em Raskin 1999)................
Foto 01:
Vista aérea do bairro de Candelária as margens do Rio Madeira, Porto
Velho..........................................................................................................
Tabela 08:
Análises de PCR segundo protocolos específicos......................................
Foto 02
Produtos de PCR analisados através de PAGE 15%, corados com
Nitrato de Prata, para identificação do alelo ∆F508. Da esquerda para
direita M – marcador de peso molecular X174/HaeIII, Canal 01 –
Heterozigoto ΔF508, canais 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9, 10, 11, 12 –
Homozigotos normais................................................................................
Foto 03:
Produto da PCR analisados através de PAGE a 15%, corados com
Nitrato de Prata, para identificação do STR IVS6aGATT. M – marcador
de peso molecular X174/HaeIII, Canais 01, 05 e 08 – Heterozigoto,
canais 02, 03, 04, 07, 09, 10, 13, 17, 18, 19, 20, 21, 22, 26 –
Homozigotos alelo 6 e canais 06, 11, 12, 14, 15, 16, 23, 24 e 25 –
Homozigotos alelo 7..................................................................................
Foto 04:
Produto da PCR digeridos com Pst I e visualizados em gel de PAGE a
6% para identificação do RFLP KM19. M - Peso Molecular
X174/HaeIII – Canais 01, 02, 03, 06, 07, 08, 09, 10, 12, 15 e 18 –
Heterozigotos, canais 04, 05, 11, 14, 17, 19, 20,21, 23, 24, 25, 26 e 27 –
Homozitogos alelo 1, e o canal 22 – Homozigoto alelo 2.........................
Tabela 09:
Rastreamento da mutação DF508 nas amostras de Porto Velho, RO........
Tabela 10:
Distribuição dos sujeitos (geração parental) da Pesquisa nas quatro subamostras, segundo local de nascimento.....................................................
Tabela 11:
Distribuição percentual dos ancestrais dos sujeitos da Pesquisa nas
quatro sub-amostras, segundo local de nascimento do Pai........................
Tabela 12:
Distribuição percentual dos ancestrais dos sujeitos da Pesquisa nas
quatro sub-amostras, segundo local de nascimento da mãe.......................
Gráfico 01: Distribuição segundo local de nascimento da geração parental dos
indivíduos nascidos em Rondônia nas quatro sub-amostras......................
Gráfico 02: Distribuição dos indivíduos de quatro sub-amostras do população de
Porto Velho – RO, por sexo e faixa etária.................................................
Tabela 13:
Parâmetros demográficos das quatro sub-amostras analisadas..................
Tabela 14:
Distribuição genotípica observada (O), esperada (E) e freqüências
alélicas para quatro locos gênicos na sub-amostra Hemeron.....................
Tabela 15:
Distribuição genotípica observada (O), esperada (E) e freqüências
alélicas para quatro locos gênicos na sub-amostra São Carlos..................
Tabela 16:
Distribuição genotípica observada (O), esperada (E) e freqüências
alélicas para quatro locos gênicos na sub-amostra do bairro Candelária
(geração parental).......................................................................................
Tabela 17:
Distribuição genotípica observada (O), esperada (E) e freqüências
alélicas para quatro locos gênicos na sub-amostra do bairro Bate Estaca
( geração parental)......................................................................................
Tabela 18:
Distribuição genotípica observada (O), esperada (E) e freqüências
alélicas para quatro locos gênicos das quatro sub-amostras agrupadas
(Hemeron, São Carlos, Candelária e Bate estaca, caracterizando a
população de Porto Velho..........................................................................
Figura 04:
Padrão de distribuição das freqüências alélicas dos marcadores XV2c,
KM19 e GATT, nas quatro sub-amostra separadas e Porto Velho
(agrupadas).................................................................................................
Tabela 19:
Freqüência dos haplótipos formados pelo XV2c e KM19........................
Tabela 20
Freqüência dos haplótipos formados pelo XV2c e KM19........................
Tabela 21:
Freqüência dos haplótipos formados pelo XV2c e KM19........................
Tabela 22:
Freqüência dos haplótipos formados pelo XV2c e KM19........................
Tabela 23:
Freqüência dos haplótipos formados pelo XV2c e IVS6AGATT............
Tabela 24:
Freqüência dos haplótipos formados pelo XV2c e IVS6aGATT.............
Tabela 25:
Freqüência dos haplótipos formados pelo XV2c e IVS6aGATT..............
Tabela 26:
Freqüência dos haplótipos formados pelo XV2c e IVS6aGATT..............
Tabela 27:
Freqüência dos haplótipos formado pelo KM19 e IVS6aGATT..............
Tabela 28:
Freqüência dos haplótipos formado pelo KM e IVS6AGATT.................
Tabela 29:
Freqüência dos haplótipos formado pelo KM e IVS6AGATT.................
Tabela 30:
Freqüência dos haplótipos formado pelo KM e IVS6AGATT.................
Tabela 31:
Haplótipos gerados pelos marcadores XV2c e Km19 (A, B, C e D),
quando associados ao microssatélite IVS6aGATT (alelo 6 e 7),
observados em 4 sub-amostras de Porto Velho – Rondônia......................
Tabela 32:
Distribuição percentual dos haplótipos (A, B, C e D) quando associados
ao microssatélite IVS6aGATT (alelo 6 e 7), observados em quatro sub-
amostras de Porto Velho – Rondônia.........................................................
Tabela 33:
Distribuição percentual dos haplótipos (A, B, C e D) nas quatro subamostras em estudo....................................................................................
Tabela 34
Haplótipos gerados pelos marcadores XV2c e Km19 (A, B, C e D)
observados em 4 amostras de Porto Velho – Rondônia (KM19 e XV2c).
Tabela 35:
Distribuição das famílias analisadas por número de filhos e presença dos
pais da sub-amostra Candelária..................................................................
Tabela 36:
Distribuição das famílias analisadas por número de filhos e presença dos
pais da sub-amostra Bate Estaca................................................................
Tabela 37:
Distribuição das famílias nucleares do bairro Candelária, por tipo de
família e tamanho amostral, quanto ao Marcador XV2c...........................
Tabela 38:
Distribuição das famílias nucleares do bairro Candelária, por tipo de
família e tamanho amostral, quanto ao marcador KM19...........................
Tabela 39:
Distribuição das famílias nucleares do bairro Candelária, por tipo de
família e tamanho amostral, quanto ao STR GATT..................................
Tabela 40
Distribuição das famílias nucleares do bairro Bate Estaca, por tipo de
família e tamanho amostral, quanto ao Marcador XV2c...........................
Tabela 41
Distribuição das famílias nucleares do bairro Bate Estaca, por tipo de
família e tamanho amostral, quanto ao marcador KM19..........................
Tabela 42
Distribuição das famílias nucleares do bairro Bate Estaca, por tipo de
família e tamanho amostral, quanto ao STR GATT..................................
Tabela 43
Distribuição das famílias nucleares do bairro Candelária, por tipo de
família e tamanho amostral, quanto a distribuição dos Haplótipos...........
Tabela 44:
Distribuição das famílias nucleares do bairro Bate Estaca, por tipo de
família e tamanho amostral, quanto a distribuição dos Haplótipos...........
Figura 05:
Heredograma das duas famílias Fibrocística: A) Família de Guajará
Mirim B) Família da Linha Triunfo...........................................................
Tabela 45:
Mutações analisadas nas famílias Fibrocísticas.........................................
Abreviaturas
BE
Bate Estaca
CBAD
aplasia congênita dos vasos deferentes
CD
Candelária
CEPEM
Centro de Pesquisa em Medicina Tropical
CF
Fibrocísticos ou Fibrose Cística
CFGAC
Cystic Fibrosis Genetic Analysis Consortium
CFTR
Gene Regulador da Condutância Transmembrânica do inglês Cystic
Fibrosis Transmembrane Conductance Regulator.
EWGCFG
European Working Group on CF Genetic
IVS6aGATT
é um tetranucleotídeo (GATT) constituído por repetições in tandem,
localizado na junção do íntron 6 com o éxon 6B do gene CFTR
KM19
Marcador dialélicos extragênicos localizado no lócus D7S23, em uma
região de aproximadamente 125 kb situada na porção anterior do gene
CFTR
LAGEHUMA
Laboratório de Genética Humana Aplicada
NBD
domínios que se ligam a nucleotídeos
PVH
Porto Velho
RFLP
Restriction Fragment Length Polymorphism
RO
Rondônia
SBG
Sociedade Brasileira de Genética
SC
São Carlos
XV2c
Marcador dialélicos extragênicos localizado no lócus D7S23, em uma
região de aproximadamente 175 kb situado na porção anterior do gene
CFTR
ΔF508
Deleção de um aminoácido (fenilalanina) na posição 508 do gene CFTR
PAGE
Gel de Poliacrilamida
Introdução
______________________________________________________________________
1
1. Introdução
O
gene
Regulador
da
Condutância
Transmembrânica
(Cystic
Fibrosis
Transmembrane Conductance Regulator, CFTR) foi localizado através de análise genética
de famílias Fibrocísticas (FC) em muitos países (Kerem e cols. 1989; Riordam e cols. 1989;
Rommens e cols. 1989), através de estudos de ligação. Tsui e Collins (1989) utilizando
técnicas de clonagem posicional e salto cromossômico, isolaram e mapearam o gene CFTR
no braço longo do cromossomo 7q21.31. O gene CFTR possui cerca de 250 Kb de DNA
genômico, com 27 éxons, com tamanhos que variam de 38 a 724 pb (Zielenski e cols.
1991), numerados de 1 a 24, onde estão incluídos os éxons 6a e 6b, 14a e 14b e 17a e 17b,
codificando um mRNA de cerca de 6,5 Kb, e massa molecular de 168.138 Da (Rommens e
cols. 1989). Esse mRNA transcreve uma proteína de 1480 aminoácidos (Kerem, 1989).
Figura 01: Representação esquemática do Gene CFTR e da proteína e o modelo proposto
para sua localização na membrana plasmática
Introdução
______________________________________________________________________
2
Segundo Riordan e cols. (1989) e Welsh e Smith (1993; 1995), a proteína tem 5
domínios. São dois domínios transmembranas ou TDMs (duas unidades repetidas que
atravessam a membrana de lado a lado 6 vezes) e dois domínios nucleotídeos-ligantes ou
NBDs (domínios que se ligam a nucleotídeos) que estão separados por um domínio
regulatório ou domínio R. Os TMDs estariam associados à formação dos poros (canais de
íons cloro) e os NBDS controlariam a atividade desses canais pela interação com
nucleotídeos do citoplasma; o domínio R também controla a atividade dos canais de cloreto
através da fosforilação, geralmente dependente do AMP cíclico (Figura01).
1.1 Função do Gene CFTR
A proteína é uma molécula multifuncional, cuja principal função é regular o canal
de cloro e controlar o mecanismo de outros caminhos de transporte (Píer e cols. 2000).
Mutações neste gene resultam na ausência ou disfunção da proteína, alterando a
seletividade do íon cloro e conseqüentemente causando Fibrose Cística (FC) e/ou aplasia
congênita dos vasos deferentes (ACVD).
Fibrose Cística representa a primeira desordem hereditária elucidada pelo processo
de genética reversa (depois chamada clonagem posicional) (Rommens e cols., 1989), sendo
a doença de herança recessiva mais prevalente em indivíduos de ascendência Européia
(Anderson, DH, 1938). Anteriormente era conhecida como Fibrose Cística do Pâncreas. As
manifestações clínicas não só estão relacionadas com o acometimento da função exócrina
do pâncreas mas também com glândulas intestinais (Íleo Meconial), bílis ou vesícula biliar
(cirrose hepática), glândulas bronquiais (infecções broncopulmonares crônica com
enfisema) e glândulas sudoríparas (grande concentração de eletrólitos no suor) e também a
infertilidade que pode ocorrer em homens e mulheres.
Introdução
______________________________________________________________________
3
1.2 Tipos de mutações
Segundo Estivill (1996), entre as mutações que ocorrem no gene CFTR, 42% são de
sentido trocado, 23% alteram a matriz de leitura, 16% interferem no processamento
(splicing), 15% são alterações sem sentido e 4% são outras modificações, incluindo
deleções de aminoácidos e grandes deleções de DNA. Existem cinco principais
mecanismos moleculares de disfunção da proteína CFTR ou 5 classes de mutações (Figura
02). As mutações de classe I levam à ausência de síntese da CFTR e representam 54% do
total; as de classe II, que correspondem à mutação ΔF508, bloqueiam o transporte de
proteína até a membrana plasmática das células epiteliais; as de classe III, interferem na
regulação do canal clorídrico; as de classe IV alteram a condução do íon cloro e as de
classe V reduzem a síntese da CFTR.
Figura 02: Representação esquemática das cinco classes de mutações do gene CFTR
Introdução
______________________________________________________________________
4
1.3 Estudos de distribuição
Estudos de genética de população e a determinação das freqüências alélicas e
haplotípicas de diversos polimorfismos que ocorrem no gene CFTR, em diferentes grupos
étnicos, é de extrema importância para caracterização populacional da Fibrose Cística,
sendo fundamental para as estratégias de exames diagnósticos, bem como para a detecção,
tratamento precoce e aconselhamento genético.
A partir da detecção do gene CFTR mais de 1000 mutações associadas a Fibrose
Cística (FC) foram identificadas na população mundial. A distribuição de mutações deste
gene é variável, e na maioria dos casos, rara ou especifica de alguma região geográfica.
Entre as diversas mutações ao longo do gene CFTR que causam Fibrose Cística (FC) a
mais comum é a ΔF508. Uma deleção de três pares de bases (CTT) no exon 10 do gene
CFTR, acarreta a perda de um resíduo de fenilalanina na posição 508 da proteína CFTR
(ΔF508) (Riordan e Cols., 1989; Kerem e Cols., 1989).
Tentar explicar sua origem em populações européias sempre foi um desafio aos
pesquisadores do assunto. O grupo de Morral e Cols. (1994), utilizando 3 marcadores de
microssatélites altamente polimórficos, realizou um estudo com o objetivo de determinar a
origem e evolução dos cromossomos portadores dessa mutação na Europa. Os dados de
haplótipos demonstraram que ΔF508 ocorreu no período Paleolítico (Morral e cols., 1994)
há mais de 52.000 anos, em uma população geneticamente distinta de qualquer grupo
europeu atual, e espalhou-se pela Europa em expansões cronologicamente distintas, as
quais são responsáveis pelas diferentes freqüências de ΔF508 na Europa. A mutação F508
é alta nas populações caucasóides e sua freqüência varia consideravelmente entre diferentes
grupos populacionais e regiões geográficas. Cinco hipóteses tentam explicar a alta
incidência de fibrose cística na maioria das populações européias (e seus descendentes):
heterogeneidade genética, alta taxa mutacional, deriva meiótica, deriva genética e vantagem
do heterozigoto (Romeo e cols., 1989). Bertranpetit e Calafell (1996) investigando a alta
Introdução
______________________________________________________________________
5
freqüência de fibrose cística e os diferentes aspectos de mutações que causam a doença em
diversas áreas da Europa e a idade da mutação
F508 sugeriram que a resistência do
heterozigoto à cólera e outras doenças intestinais desidratadoras, no passado, contribuíram
para a fixação e expansão da mutação na Europa. Outros trabalhos vão ao encontro dessa
hipótese de vantagem seletiva, como os de Cuthbert e cols (1995), que concluíram que os
heterozigotos para fibrose cística resistem a diarréia secretora melhor que os indivíduos
normais sendo por isso geneticamente vantajosos. Outras evidências são fornecidas por
estudos de ligação, como na formação de haplótipos entre marcadores localizados na região
do gene CFTR. Um exemplo são os resultados obtidos por Sereth e cols. (1993), que
indicaram que a maioria das mutações FC estão associadas com o mesmo haplótipo em
regiões extensas do gene, o que suporta a hipótese de vantagem seletiva. Esta vantagem
seletiva poderia ser explicada pela fisiologia da resposta do indivíduo a agentes como o
bacilo da cólera. Ratos que não expressam CFTR não secretam fluido em resposta à toxina
de cólera, que induz a secreção intestinal. Os heterozigotos expressam 50% da quantidade
normal da proteína CFTR no epitélio intestinal, e a resposta à toxina se reduz também a
50% do fluido normal e íon Cloro no epitélio intestinal, sugerindo vantagem seletiva ao
heterozigoto FC (Rodman e Zamudio, 1991; Gabriel e cols, 1994).
A expectativa de vida de uma criança com FC aumentou consideravelmente em
poucas décadas: de 08 anos em 1970 passou a 29,5 em 1998 (Bolyard, 2001). Estudos
realizados pela Universidade Federal de Minas Gerais, região brasileira de alta freqüência
de mutações no gene CFTR (ver tabela 02) mostraram que a idade da criança na época do
diagnóstico foi o único fator associado com óbito na população analisada. A média de vida
mais alta foi de 5,10 anos, em meninos, quando o diagnóstico era feito antes dos doze
meses, bem abaixo da média mundial, sendo que as crianças estavam sob forte risco de
irem a óbito antes de doze meses, devido a falta de diagnóstico e cuidados diferenciados e
intensivos (Camargo e cols.,2000).
Apesar de a mutação ΔF508 ser a mais comum em todo o mundo (66% dos
cromossomos com FC; FCGAC; Cystic Fibrosis Genetic Analysis Consortium, 1994), sua
freqüência varia consideravelmente entre diferentes grupos humanos e localizações
geográficas, indo de 26% na Turquia a 88% na Dinamarca [European Working Group on
Introdução
______________________________________________________________________
6
FC Genetic (EWGFCG) 1990]. É o chamado gradiente de distribuição sudeste-nordeste da
mutação ΔF508 na Europa (Tabela 01).
O modelo de distribuição da mutação ΔF508 observado na Europa, com freqüências
mais altas no norte e mais baixas no sul, tem sido comprovado pela maioria, mas não por
todos os estudos epidemiológicos de FC. Casal e Cols. (1992), encontraram uma freqüência
de 87% para ΔF508 nos cromossomos de origem basca. Na Albânia, a análise de 92
cromossomos de diferentes regiões detectou uma freqüência de 75% para ΔF508, muito
alta para o sul da Europa.
A origem dos Albaneses e migração nômade há 3 mil anos antes de Cristo, além do
isolamento cultural e histórico deste grupo étnico, poderiam explicar essa freqüência tão
alta da mutação ΔF508 nessa região (Novelli e Cols., 1992). Em populações do sul da
Europa, em que a incidência de FC é de 1/3.500 nascimentos, a freqüência desta mutação
varia entre 40 a 60% entre os portadores da doença. Nas populações do norte da Europa a
variação da freqüência da mutação é de 70 a 90% entre os fibrocísticos e a incidência da FC
é em torno de 1/2.000 nascimento (EWGFCG, 1990).
Em populações não Européias a mutação ΔF508 também é a mais freqüente entre
fibrocísticos, embora ela seja relativamente mais baixa que na Europa. Na Argélia, sua
freqüência é de 26,3% (Estivill e Cols., 1987), enquanto em Israel, bem como na Turquia,
aparece em 30% dos indivíduos fibrocísticos. É menos freqüente em Africanos, com
incidência de 1/17.000 nascimentos (Boat e Cols., 1989; Fitzsimmons, 1993; Hamosh e
Cols., 1998) é rara em asiáticos onde a incidência é de 1/90.000 (Beaudet, 1989; Reed,
1969) e em paquistaneses é de 1/90.000 (Boat e Cols., 1989).Somente 4 outras mutações
[G542X (3,2%), G551D (2,9%), N1303K (2,1%) e R553X (1,6%)] tem freqüência total >
1% entre os cromossomos FC (Tsui e cols. 1992; FCGAC, 1994). A maioria das mutações
restantes são raras ou limitadas a populações especificas (Matteu e cols., 2001).
Introdução
______________________________________________________________________
Tabela 01: Mutações no Gene CFTR mais freqüentes (FCGAC 1994)
Mutação
Freqüência
(%)
População com maior prevalência
ΔF508
28,948
(66.0)
G542X
1,062
(2.4)
Espanhola
G551D
717
(1.6)
Inglesa
N1303K
589
(1.3)
Italiana
W1282X
536
(1.2)
Judaica - Askhenazi
R553X
322
(0.7)
Alemão
621+1G->T
315
(0.7)
Francesa - Canadense
1717-1G->A
284
(0.6)
Italiana
R117H
133
(0.3)
R1162X
125
(0.3)
R347P
106
(0.2)
3849+10kbC->T
104
(0.2)
ΔI507
93
(0.2)
394delTT
78
10-30%*
G85E
67
R560T
67
A455E
62
1078delT
57
2789+5G->A
54
3659delC
54
R334W
53
1898+1G->T
53
711+1G->T
49
Francesa - Canadense
2183AA->G
40
Italiana
3905insT
38
S549N
30
2184delA
29
Italiana
Nórdica, Finlandesa
Espanhola
6-17%*
Suíça; Amish; Acadian
Q359K/T360K
87.5%*
Judaica-Georgia
M1101K
69%*
Hutterite
Y122X
48%*
Francesa Ilhas Reunidas
1898+5G->T
30%
Chinesa, Tailandesa
3120+1G->A
11%
Afro-Americana
I148T
9.1%
Francesa - Canadense
7
Introdução
______________________________________________________________________
8
1.4 Distribuição de Mutações no gene CFTR no Brasil
Análises realizadas em diferentes estados do Brasil têm revelado que a freqüência
da mutação ΔF508 é bastante heterogênea e mais baixa que as freqüências na Europa
(Tabela 02, Cabello e Cols., 1999; Raskin e Cols., 1999).
Tabela 02: Distribuição de mutações FC em amostras de fibrocísticos brasileiros
(Cabello e Cols., 1999; Raskin e Cols., 1999)
Amostra
SC
RJ
RJ
SP
SP
PR
SP
RS
MG
Total
ΔF508
13
27
12
15
38
15
60
59
33
272
N/ ΔF508
35
61
22
33
88
19
56
61
29
404
Freqüências
0,27083
0,30682
0,35294
0,31250
0,30159
0,44118
0,51724
0,49167
0,53226
0,40237
²= 28,982
Martins e cols. (1993) encontraram uma freqüência de 33% para mutação ΔF508 em
uma amostra de 24 indivíduos FC do Estado de São Paulo, enquanto Ferri (1995), também
no estado de São Paulo, encontrou uma freqüência de 35% para esta deleção. Ferri também
analisou uma amostra de 120 indivíduos FC de SP, DF, PE e BA na qual foram estudadas 8
das mais freqüentes mutações da FC. Dessas, apenas quatro foram identificadas: ΔF508
(38%), G542X (8,3%), N1303K (1,6%) e W1282X (0,8%).
Em uma amostra de 540 indivíduos, do Espírito Santo, com quadro clínico
sugestivo de FC, as freqüências das mutações ΔF508, G542X, R553X e W1282X foram
respectivamente 3%, 0,2%, 02% e 0,2% (Rabbi-Bortolini e cols. 1998).
Errera e cols. (2000), com o objetivo de verificar a ocorrência da mutação ΔF508 na
etnia guarani, realizaram uma triagem em 146 índios pertencentes a três aldeias do Espírito
Santo. Em nenhuma das amostras foi observada a deleção ΔF508.
Introdução
______________________________________________________________________
9
O resultado da análise das mutações G542X, G551D, R553X e N1303, por Raskin e
cols. (1999), mostrou que as 4 mutações contribuem para 17% dos cromossomos nãoΔF508 e apenas 9% do número total de cromossomos com FC brasileiros. A freqüência de
cada mutação é semelhante às populações do sul da Europa, principalmente às populações
espanholas e italianas.
Bernardino e cols. (2000), realizaram a análise molecular de 160 cromossomos de
indivíduos brasileiros FC, identificando a presença de mutação em 97 pacientes. A
freqüência da deleção ΔF508 foi de 48,4%, seguida por um conjunto de mutações que
contribuem para 20,1% dos cromossomos não-ΔF508 [G542X (8,8%); R1162X (2,5%);
N1303K (2,5%) R334W (2,5%), W1282X (1,3%, G85E (1,3%), L206W (0,6%) e R553X
(0,6%)]. Foram encontradas também outras 7 mutações raras, além de 5 mutações nunca
antes descritas.
Cabello e cols. (2001) detectaram uma mutação rara (3120+1G→A com maior
freqüência em Afro-Americanos) através de análises com a técnica de SSCP em dois
indivíduos Fibrocísticos do Rio de Janeiro.
Tabela 03: Mutações no gene CFTR em 74 pacientes fibrocísticos do Rio de
Janeiro (Cabello; 2001)
Mutação (Genótipo)
2
Observado
Esperado
F508/ F508
8
4.879
1.997
F508/Não- F508
17
25.420
2.789
F508/G542X
3
1.027
3.790
1
2.676
1.050
F508/G551D
1
0.257
2.151
F508/3120+1G to A
1
1.540
0.189
3120+1G A /3120+1G A
1
0.122
6.348
3120+1G A /Não- F508
3
4.012
0.255
Não- F508/Não- F508
39
33.112
1.047
Não caracterizado
0
0.956
0.956
G542X/Não- F508
Introdução 10
______________________________________________________________________
Total FC indivíduos
74
Alelo
74.00
20.573
Freqüência Alélica (DP)
Não- F508
0.66892 (0.03332)
G542X
0.02703 (0.01372)
G551D
0.00676 (0.00681)
3120+1G A
0.04053 (0.01418)
0.25676 (0.03343)
F508
1.5 Marcadores Intra e Extragênicos:
Os marcadores estão localizados dentro ou próximos do gene CFTR, como
apresenta a figura 03. Entre estes marcadores podemos citar os RFLPs KM19 e XV2c e o
STR IVS6aGATT (Figura 03). A ausência do sítio de restrição para cada enzima (sendo Pst
I para Km19 e Taq I para XV2c) é indicativo do alelo 1 e a presença do sítio de restrição,
do alelo 2. Os marcadores dialélicos extragênicos (XV2c e KM19) estão localizados no
lócus D7S23, em uma região de aproximadamente 175 kb (XV-2c) e 125 kb (KM19),
situada na porção anterior do gene CFTR (Kerem e cols.,1989).
De acordo com a nomenclatura usual, os haplótipos XV2c/KM19 foram designados
como: A = 1/1, B = 1/2, C = 2/1 e D = 2/2.
A tabela 04 mostra alelos associados à mutação ΔF508 e alelos característicos de
indivíduos normais.
Tabela 04: Alelos associados com a mutação ΔF508
IVS6aGATT
XV-2c
6
1
Mutação ΔF508
7
2
Normal
Fonte: Huth e col., 1989; Dörk, 1992; Kerem e col.,1989
KM19
2
1
Introdução 11
______________________________________________________________________
Figura 03: Mapa físico de Marcadores extra e intragênicos utilizados para
estudos da distribuição de haplótipos
O marcador IVS6aGATT (intragênico) é um tetranucleotídeo (GATT) constituído
por repetições in tandem, localizado na junção do íntron 6 com o éxon 6B (figura 03), em
uma região de 210pb. Apresenta 3 alelos com freqüência polimórfica. Um com seis
repetições, outro com sete e outro, alelo raro, com oito repetições in tandem (Chehab e cols.
1991; Gasparini e cols. 1991).
Os haplótipos gerados pelos marcadores XV2c e Km19 (A, B, C e D), quando
associados ao microssatélite IVS6aGATT (alelo 6 e 7), subdividem-se em A6, A7, B6, B7,
C6, C7, D6 e D7 (Chehab e cols. 1991) (tabela 05).
Introdução 12
______________________________________________________________________
Tabela 05: Caracterização dos haplótipos definidos pelos marcadores
KM19, XV2c e IVS6aGATT
Haplótipo XV2c (alelo) Taq I KM 19 (alelo) Pst I IVS6aGATT
1
1
6
A6
1
1
7
A7
1
2
6
B6
1
2
7
B7
2
1
6
C6
2
1
7
C7
2
2
6
D6
2
2
7
D7
1: Ausência do sítio de restrição (Taq I ou Pst I) 2: Presença do sítio de restrição (Taq I ou Pst I)
1.6 Análise de haplótipos
A ampla diversidade da distribuição populacional e o multialelismo do gene CFTR
impedem um diagnóstico rápido de mutações que causam FC. O estudo através da análise
de associações entre haplótipos marcadores e mutações que causam Fibrose Cística pode
facilitar a detecção da causa da doença ou de portadores potenciais (Morral e cols., 1995).
Atualmente diversos estudos relacionando marcadores genéticos (Intra e Extragênicos)
ligados ao gene CFTR apresentam-se dispersos na literatura.
Raskin e cols. 1999, descreveram a distribuição de haplótipos entre indivíduos FC
em 5 estados brasileiros (Tabela 06).
Introdução 13
______________________________________________________________________
Tabela 06: Haplótipos (KM19/XV2c) de indivíduos FC portadores de mutações
desconhecidas
Estado
Brasileiro
RS
SC
PR
SP
MG
Total
Haplótipos (%)
A
36
43
28
35
30
172
B
14
17
28
53
10
122
C
41
9
44
0
50
144
D
9
1
0
12
10
32
Tabela 07: Quatro mutações mais freqüentes no mundo (em Raskin 1999).
Dados de Referência
Mutação
origem
Haplótipos
G542X
N1303
R553X
G551D
Sul da Europa
Sul da Europa
B
B
Norte da
Europa
América do
Norte
AeB
Européia
Mediterrâneo
B
Total de
indivíduos
26
11
3
1
Dados de Raskin
Número de Haplótipos
casos
25
B
Origem
?
1
A
?
10
B
?
1
D
?
2
B
Pai
Italiano
1
A
Mãe
Italiana
1
B
Italiano
A disfunção da proteína CFTR causa manifestações clínicas de uma maneira muito
variável, amplamente diversificada e inespecífica, podendo se manifestar já no período
neonatal. Alguns indivíduos mantêm-se totalmente assintomáticos por vários anos de vida,
ou mesmo podem não apresentar sintomas clínicos (European Working Group on FC
Genetic, 1990). As manifestações clínicas mais freqüentes são: distúrbios respiratórios
Introdução 14
______________________________________________________________________
agudos ou crônicos (50,5%), desnutrição, baixo crescimento físico (42,9%), esteatorréia,
fezes anormais (35,0%), íleo meconial, obstrução intestinal (18,8%), distúrbios eletrolíticos
(5,4%), prolapso retal (3,4%), pólipos nasais, sinusopatias (2,0%) e doenças hepatobiliares
(0,9%).
Inquéritos clínicos epidemiológicos realizados em amostras da população de
Rondônia, realizadas por equipes médicas do Centro de Pesquisa em Medicina Tropical, em
colaboração com pesquisadores da área de Genética, detectaram alguns desses distúrbios,
sendo relativamente freqüente o diagnóstico de morte por subnutrição entre as crianças.
No caso do gene CFTR, cujo produto é uma molécula multifuncional, é difícil
detectar presença ou ausência de doenças com características autossômicas recessivas da
disfunção do gene CFTR. O mecanismo responsável pelo aumento da freqüência de
doenças autossômicas recessivas pode ser o efeito fundador, associado ou não à presença de
alguma vantagem seletiva para indivíduos heterozigotos. Desde que não existe uma
mutação predominante na FC (com exceção de
F508) tornam-se necessárias triagens
populacionais para que se tenha uma visão mais específica das mutações FC brasileiras.
Materiais e Métodos
______________________________________________________________________
1
3. Material e Métodos
3.1 Caracterização da população
3.1.1 População em estudo – Porto Velho
Porto Velho capital do estado de Rondônia, está localizada ao Norte do estado de
Rondônia, na margem direita do Rio Madeira. Com 08º35’- 09º50’ latitude sul e 63º42’65º38’ longitude oeste do Meridiano de Greenwich, e uma área geográfica de 58.310 Km2,
limitando-se com Humaitá - AM (Norte), Jamari - RO (Sudoeste), Candeias do Jamari - RO
(Sul) e Guajará-Mirim - RO (O). Distancia-se 2.589 Km de Brasília. Porto Velho possui
onze Distritos: Abunã, Calama, Demarcação, Extrema, Fortaleza do Abunã, Jacy Paraná,
Mutum Paraná, Nazaré, Nova Califórnia, São Carlos e Vista Alegre de Abunã .
Com uma estimativa populacional de 504 996 habitantes, o município de Porto
Velho, RO, recebeu migrantes de outros estados brasileiros, que chegaram em massa a
Porto Velho desde os anos 80, com a exploração do garimpo, e a abertura da rodovia BR
364, que liga a Amazônia ocidental aos estados do sudeste, facilitando o fluxo migracional,
e, nos anos 90, devido a investimentos realizados em moradias, feito pelo Governo Federal
na região. A migração foi responsável pelo aumento acentuado da população da capital de
Rondônia. A vila de Porto Velho foi criada em 1913 e em 1914 transformou-se em
município. De 1971 a 1989 o garimpo foi a maior fonte econômica de Porto Velho (assim
como de Rondônia, que respondia por quase 70% da produção nacional). Atualmente Porto
Velho é conhecida como a capital do funcionalismo, sendo que 26% de seus habitante são
funcionários públicos (dados obtidos na Prefeitura Municipal de Porto Velho). No começo
do século XX Porto Velho era uma povoado com cerca de 300 habitantes, quase todos
homens, brancos, e algumas mulheres negras, havendo apenas uma mulher branca
(Ferreira, 1987). Situava-se a cerca de sete quilômetros de Santo Antônio, vilarejo
pertencente, na época, ao estado de Mato Grosso e cujo ponto foi escolhido para ser o início
da ferrovia Madeira-Mamoré. Era uma região povoada por índios Torá, Mura, Caripuras,
Pamas e outras nações indígenas e que foram sendo exterminadas tanto por missões jesuítas
como pelos portugueses, que partiram para a conquista da região do rio Madeira, no final
Materiais e Métodos
______________________________________________________________________
2
da primeira metade do século XVIII (Silva,1991). Em 1873, devido ao fluxo de migrantes
para coleta de látex, foi elevada à categoria de coletoria, passando a município em 1912.
Hoje, Santo Antônio é um bairro de Porto Velho, e segundo alguns historiadores constitui
uma relíquia histórica. Em 1907, por ocasião da construção da estrada de ferro MadeiraMamoré, a companhia ferroviária levantou, entre Porto Velho e Santo Antônio, um hospital
ao qual foi dado o nome de Candelária, e cuja região constitui atualmente o bairro mais
antigo de Porto Velho, no que se refere a sua população, constituída em grande parte por
descendentes de antigos operários da estrada Madeira - Mamoré. Em seis anos (de 1907 a
1912) a companhia construtora contratou 21 783 homens, de diversas nacionalidades, sendo
a maioria brasileiros vindo de outras regiões do Brasil, antilhanos e barbadianos, espanhóis
e portugueses, encontrando-se também, em números significantes, italianos,colombianos,
alemães,franceses, russos, venezuelanos, bolivianos, norte-americanos, etc (Ferreira, 1987).
Dados do hospital Candelária mostram que em 1911 diferentes moléstias fizeram vítimas
entre os operários contratados. Apesar de a pneumonia ter causado o maior número de
óbitos (55/116 doentes), a Malária apresentou maior morbidez, respondendo por 67,1% das
internações (2451/3642). Este quadro repete-se hoje: segundo dados da Fundação Nacional
de Saúde, o IPA (índice de positividade anual/ mil habitantes) no bairro Candelária, que
engloba Santo Antônio, foi ao redor de 300.
De acordo com estimativas feitas a partir de dados do censo de 1991 (IBGE), Porto
Velho possui atualmente um contingente de 3,95% de pessoas oriundas da região Norte
brasileira, 5,13% da região NE, 9,98% do SE brasileiro, 10,81% do S e 6,84% da região
centro-oeste do Brasil. Dos 10,81 % da região S, 9,16% (quase a totalidade) dos imigrantes
são oriundos do estado do Paraná . Os estados do Paraná e Minas Gerais forneceram 25,45
e 9,60% de imigrantes para Rondônia e São Paulo contribuiu também com um número
expressivo: 7,28%. Juntos, os estados do Nordeste contribuíram com 14,20% para o
povoamento de Rondônia, nos últimos anos. Em recente estudo feito em duas amostras de
Rondônia, uma população ribeirinha (Portuchuelo, distante ao redor de 15 Km de Porto
Velho) e uma rural (Monte Negro, distante 250 Km de Porto Velho) observou-se que a
contribuição africana foi praticamente a mesma nas duas populações (ao redor de 20%),
refletindo a migração observada durante o período da borracha e da construção da ferrovia
Madeira-Mamoré, sendo que os ameríndios foram encontrados numa proporção de quase
Materiais e Métodos
______________________________________________________________________
3
quatro vezes superior em Portuchuelo (42% , sendo 11% em Monte Negro). A diferença na
proporção de Caucasóides reflete a intensa migração devido ao garimpo e à política de
assentamento agrícola do governo federal: 38% em Portuchuelo e 60% em Monte Negro
(Ferreira, 2002).
Foto 01: Vista aérea do bairro de Candelária as margens do Rio Madeira, Porto Velho
A amostra utilizada para este estudo é composta de indivíduos de Porto Velho
capital do Estado de Rondônia e está sub-dividida em quatro sub-amostras: Hemeron, São
Carlos, Candelária e Bate Estaca.
3.1.1.a Hemeron: Esta sub-amostra é composta de 160 indivíduos não aparentados,
doadores, aceitos ou não, do banco de sangue de Rondônia (Hemeron).
3.1.1.b São Carlos: Sub-amostra composta de 78 indivíduos da população
ribeirinha de São Carlos, distrito de Porto Velho, obtida através de visitas dos sujeitos ao
médico, por ocasião da visita deste ao povoado.
Materiais e Métodos
______________________________________________________________________
4
3.1.1.c Candelária: Sub-amostra familial, constituída por 56 famílias, algumas das
quais descendentes de operários que trabalharam na construção da ferrovia MadeiraMamoré, totalizando 278 indivíduos, cuja distribuição quanto a sexo e faixa etária
encontram-se no gráfico 02.
3.1.1.d Bate Estaca: Este bairro é vizinho ao bairro de Candelária.Foram coletadas
21 famílias, num total de 112 amostras.
Este trabalho envolveu também 02 famílias de probandos, sendo uma da cidade de
Guajará Mirim - RO e a outra do assentamento Triunfo, pertencente ao município de
Candeias do Jamari – RO.
3.1.2 Guajará Mirim está localizada a 332 Km ao Oeste de Porto Velho. Possui 38
045 habitantes, com uma área geográfica de 25 114 km2 e limita-se ao Norte com Nova
Mamoré e Campo Novo - (RO), ao Sul com República da Bolívia e Costa Marques - (RO),
a Leste com Porto Velho (capital), Governador Jorge Teixeira e Costa Marques - (RO), e
a Oeste com a República da Bolívia.
3.1.3 Candeias do Jamari dista 25 Km de Porto Velho e está situada às margens do
Rio Candeias do Jamari, afluente do Rio Madeira. Possui 13.107 habitantes e uma área
geográfica de 6 867 Km2, limitando-se ao Norte com Porto Velho, ao Sul com Jamari, ao
Leste com Porto Velho e Cujubim e a Oeste com Porto Velho. A área urbana é contornada
rodovia federal BR 364 (Cuiabá – Rio Branco), e o assentamento Triunfo dista cerca de 40
Km da Br, a oeste, e a 120 Km de Porto Velho.
3.2 Coleta e Estocagem do Material
A coleta de amostra seguiu a determinação da resolução 196 do CONEP, sendo
aprovado (Registro CONEP = 3349). Os sujeitos da amostra deram consentimento escrito,
após serem esclarecidos sobre os objetivos da Pesquisa. (anexo 11.4) e a seguir
responderam a um questionário sobre dados demográficos e de saúde. Cada família teve um
registro antropogenético e de dados sócio-econômicos (anexo 11.5).
A coleta e armazenamento de sangue, assim como extração de DNA, separação de
alíquotas de hemácias, soro, seguiram a rotina de laboratório Hematológico e de análise
Molecular.
Materiais e Métodos
______________________________________________________________________
5
A equipe responsável pela coleta foi constituída por estudantes de Mestrado (UNIR)
e estagiários do Laboratório de Genética Humana Aplicada (LAGEHUMA), do Centro de
Pesquisa em Medicina Tropical (CEPEM): Almeida Andrade Casseb, Francisca de Jesus
Holanda, Josileide Duarte de Farias, Marlene Guimarães Santos e Maria Izabel Ovellar
Heckmann Alecrim, para os dados antropogenéticos e coleta hematológica. A realização do
trabalho experimental em Genética, no presente trabalho, foi associada a inquéritos clínicoepidemiológicos, desenvolvidos pelas equipes médicas do CEPEM.
3.3 Métodos de análises laboratoriais
Todas as amostras de sangue coletadas foram submetidas a análise molecular para
caracterização genotípica da mutação ΔF508 e dos marcadores polimórficos XV2C, KM19
e IVS6aGATT A realização de trabalho experimental em Genética, no presente Projeto,
será associada a inquéritos clínicos-epidemiológicos, atualmente desenvolvidos pelas
equipes médicas do CEPEM. O Centro de Pesquisa em Medicina Tropical (CEPEM),
localizado em Porto Velho, RO, conta, em seu quadro fixo de pessoal qualificado, com
pesquisadores com formação acadêmica níveis Mestrado, Doutorado e em desenvolvimento
(Pós-Graduação), em diversas áreas científicas, como Genética, Microbiologia, Virologia,
Imunologia, Parasitologia, e técnicos especialistas em diversas modalidades, todos
envolvidos na descrição, detecção e resolução de problemas referentes às doenças
infecciosas características da região. O CEPEM ocupa uma área física de aproximadamente
450 m2, em anexo.
3.3.1 Condições utilizadas para a amplificação do DNA
Os sistemas em estudo foram amplificados a partir do material genômico da
amostra, com a utilização da técnica de PCR (Saiki e col., 1988), com algumas
modificações (anexo 11.1).
Para todos os sistemas analisados as condições utilizadas para o preparo da reação
seguiram o protocolo seguinte:
Materiais e Métodos
______________________________________________________________________
-
0,5 M de cada primer em estudo;
-
0,2 mM de dNTP's;
-
Tampão (20mM Tris-HCl - pH 8,4; 50mM KCl);
-
1,5 mM MgCl2;
-
1,5U Taq DNA polymerase;
-
1 l de DNA genômico;
-
em um volume final de 50 l de reação.
6
3.3.2 Programa para PCR:
-
94ºC durante 5 minutos para desnaturação das fitas;
-
Seguidos de 30 ciclos de :
-
94ºC por 45segundos, para desnaturação das fitas;
-
A temperatura de hibridação dos primers conforme o sistema em estudo (Tabela
08);
-
E 72ºC por 1 minuto para extensão da fita;
-
Um ciclo de extensão final de 72ºC durante 7 minutos, para o crescimento da
cadeia.
Tabela 08: Análises de PCR segundo protocolos específicos.
Sistema
Primer
PAGE
ΔF508
GTT TTC CTG GAT TAT GCC TGG
CAC
GTT GGC ATG CTT TGA TGA CGC
TTC
15%
24 hs
XV2c
GTT GAA GTC AAT TGA ATG
GTT CAA ACT ATG TCA AAG
6%
5 hs
Taq I
48 C
65 C
KM 19
AAG GCT ACA CTG TTA ATT TT
GCT GCA TCA TAT AAG TTG CC
6%
5 hs
Pst I
52 C
37 C
IVS6aGATT
GTC TGG CAC ATA GGG AGG CA
ACT GAT CTT CCC AGC TCT C
15%
24 hs
Fonte: Dörk, 1992; Kerem e col.,1989
Enzima
De Restrição*
Temp.
de
hibridação
Temp.
de digestão
60 C
55 C
Materiais e Métodos
______________________________________________________________________
7
3.3.3 Confirmação da amplificação
Todos os sistemas foram analisados pela diferença de mobilidade do produto de
PCR em gel de agarose a 1,5% para a confirmação da amplificação.
3.3.4 Digestão dos RFLPs
O produto da PCR dos marcadores RFLPs foi digerido após a confirmação da
amplificação do produto da PCR, sendo posteriormente visualizados em gel de
Poliacrilamida e corados com Nitrato de Prata a 20%.
As condições de digestão foram desenvolvidas de acordo com o seguinte protocolo:
Reação com 25 l :
-
2,5 l de Tampão 10X React 2 Gibco-BR;
-
10 l do material amplificado (produto da PCR);
-
5 U de Enzima de restrição especifica ao sistema em estudo*;
-
qsp H20 Milli-Q autoclavada.
3.3.5 Gel de Poliacrilamida
Todos os sistemas formam analisados em gel de poliacrilamida (anexo 11.3). As
fotos 02, 03 e 04 apresentam o padrão de migração para os marcadores moleculares para F
508 ( foto 02), GATT (foto 03) e KM (foto 04).
Foto 02 Produtos de PCR analisados através de PAGE 15%, corados com Nitrato de Prata,
para identificação do alelo ∆F508. Da esquerda para direita M – marcador de peso
molecular X174/HaeIII, Canal 01 – Heterozigoto ΔF508, canais 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9, 10,
11, 12 – Homozigotos normais.
Materiais e Métodos
______________________________________________________________________
8
Foto 03: Produto da PCR analisados através de PAGE a 15%, corados com Nitrato de
Prata, para identificação do STR IVS6aGATT. M – marcador de peso molecular
X174/HaeIII, Canais 01, 05 e 08 – Heterozigoto, canais 02, 03, 04, 07, 09, 10, 13, 17, 18,
19, 20, 21, 22, 26 – Homozigotos alelo 6 e canais 06, 11, 12, 14, 15, 16, 23, 24 e 25 –
Homozigotos alelo 7.
Foto 04: Produto da PCR digeridos com Pst I e visualizados em gel de PAGE a 6% para
identificação do RFLP KM19. M - Peso Molecular X174/HaeIII – Canais 01, 02, 03, 06,
07, 08, 09, 10, 12, 15 e 18 – Heterozigotos, canais 04, 05, 11, 14, 17, 19, 20,21, 23, 24, 25,
26 e 27 – Homozitogos alelo 1, e o canal 22 – Homozigoto alelo 2.
Materiais e Métodos
______________________________________________________________________
9
4 Análise dos Dados
4.1 Análise de Segregação
As famílias foram agrupadas de acordo com cada loco:
XV2c: 1 / 1 x 1 / 2 ; 1 / 2 x 1 / 1 ; 1 / 2 x 1 / 2 ; 2 / 2 x 2 / 2
KM 19: 1 / 1 x 1 / 2 ; 1 / 2 x 1 / 1 ; 1 / 2 x 1 / 2 ; 2 / 2 x 2 / 2
GATT: 6 / 6 x 6 / 7 ; 6 / 7 x 6 / 6 ; 6/ / 7 x 6 / 7 ; 7 / 7 x 7 / 7
Com base neste parâmetro as famílias foram agrupadas em cinco tipos:
i = famílias em que somente a mãe é heterozigota;
ii = famílias em que somente o pai é heterozigoto;
iii = famílias em que pai e mãe são heterozigotos para ambos os alelos;
iv = famílias em que ambos são heterozigotos tendo ao menos 1 alelo diferente entre
eles;
v = famílias em que ambos são homozigotos.
Esta famílias foram separadas em dois grupos:
1 – Pai e mãe com genótipos identificados;
2 – Apenas o pai ou a mãe com genótipos identificados.
Os genótipos foram determinados para um total de 52 famílias do bairro Candelária
com um total de 105 filhos e 16 famílias do bairro Bate Estaca com total de 45 filhos.
4.2 Caracterização demográfica das populações
Os dados biológicos e relações de parentesco, obtidos a partir do preenchimento do
prontuário de cada individuo das 3 sub-amostras, foram tabulados e submetidos a análise
Materiais e Métodos 10
______________________________________________________________________
estatística para caracterização dos populações quanto aos parâmetros: Idade e sexo (Gráfico
02).
O tamanho efetivo da população (Ne) foi calculado pela fórmula padrão de
WRIGHT (1951).
Ne = 4NmNf
Nm+NF
A taxa de migração efetiva (me) foi estimada segundo Malécot (1948).
me = √ m (m + 2 k)
onde a taxa m = de migrantes de longa distância e k = a taxa de migrantes de pequena
distância. Considerando a dificuldade de distinguir com precisão “longa distância” e
“pequena distância”, procedemos como Freire-Maia e Cavalli-Sforza (1978): marcamos os
lugares de nascimentos dos migrantes em um mapa e verificamos a que distância a maioria
deles provinham, esta foi considerado limite entre pequena e grandes distâncias (Tabela
13).
4.3. Freqüências
As análises estatísticas para caracterização das freqüências alélicas e genotípicas
foram realizadas utilizando-se a programoteca GENIOC (Cabello e Krieger, 1997). O nível
de significância adotado foi de 5%.
Para análise haplotípica dos 374 cromossomos normais da amostra foram montadas
64 combinações dos três marcadores do gene CFTR. As análises estatísticas foram
realizadas através do programa BioEstat 2.0.
4.4. Detecção da Mutação F508- determinação do tamanho amostral
A freqüência de Fibrose cística é de aproximadamente 1:2500 nos indivíduos
caucasóides, correspondendo à freqüência do indivíduo homozigoto (CF é doença
autossômica recessiva). Nas condições do equilíbrio de Hardy-Weinberg esta freqüência é
Materiais e Métodos 11
______________________________________________________________________
dada por q2, sendo q a freqüência do alelo mutante. A freqüência dos portadores (indivíduos
heterozigotos) é aproximadamente 1:25, nos caucasóides, sendo a freqüência nas condições
de equilíbrio 2pq (portanto, p = 1-q).
Para calcularmos a freqüência do alelo, somamos a freqüência dos recessivos com
metade da freqüência dos heterozigotos:
q = 1/2500 + 1/25 x ½ = 0,0204
que é uma estimativa da freqüência do alelo F508 em populações caucasóides.
Existem poucos estudos sobre Mistura Étnica em Rondônia. Ferreira e cols.(2002),
analisando a população ribeirinha de Portuchuelo, com características populacionais bem
semelhantes às de SC,CD e BE, detectaram um proporção de genes de origem branca igual
a 0,40
0,07. Em Monte Negro, cuja história de povoamento se assemelha a de Porto
Velho, estes autores encontraram 0,67
0,07 de genes caucasóides. Dessa maneira, a
freqüência do alelo em SC, BE e CD pode ser considerada como:
q ’ = (0,0204 x 0,40) = 0,0082
A freqüência de afetados é estimada como q’2 = 0,0001
E a dos portadores, 2p’q’ = 0,0163
Portanto, sendo o total (q’2 + 2p’q’) = 0,0164 , o que dá, no mínimo, 16 indivíduos
portadores em cada 1000 indivíduos.
Utilizando cálculos semelhantes, mas considerando em 67% a contribuição
caucasóide para PV, estimamos encontrar 27 portadores em 1000 indivíduos.
A tabela 09 dá-nos o esperado em Bate Estaca, Candelária, Hemeron e São Carlos:
Tabela 09: Rastreamento da mutação DF508 nas amostras de Porto Velho, RO.
AMOSTRA
ESPERADO
Bate Estaca
0,32
Candelária
1,52
São Carlos
1,06
Hemeron
4,32
TOTAL
7,22
Discussão 49
______________________________________________________________________
6. Discussão
6.1 Formação genética da população de Rondônia
A população Brasileira é formada pela miscigenação de três etnias: branca, índia e
negra. Esta heterogeneidade é conseqüência da variedade das correntes migratórias, cuja
distribuição geográfica ocorreu de maneira irregular (Barreto, 1959; Salzano e FreireMaia., 1967).
Diversos estudos descrevem que as populações ancestrais de nativos americanos
migraram da Ásia para as Américas através do Estreito de Bering em algum período
durante o “Pleistoceno”, habitando o continente há pelo menos 15.000 anos, sendo os
ameríndios a população mais abundante em determinadas regiões. A mistura não é
homogênea em relação à proporção da contribuição de cada grupo ancestral, nem quanto à
contribuição relativa de homens e mulheres dos grupos étnicos parentais havendo, no
princípio da colonização destas regiões, uma freqüência muito superior de acasalamento
entre colonizadores e mulheres nativas que a encontrada entre nativos e mulheres do grupo
colonizador (Carvalho-Silva e cols., 2001).
A integração e a miscigenação iniciaram-se a partir da chegada dos portugueses ao
Brasil, que inicialmente não trouxeram suas mulheres e filhas. Aqui, convivendo durante
anos com as indígenas, começaram um primeiro processo de mistura étnica. A contribuição
africana veio pelo processo de escravatura e a diversidade de etnias africana que se
encontram no Brasil é imensa: banguelas, bantos, congos, angolas, monjolos, mandingas,
são alguns exemplos. Com a vinda dos africanos, a miscigenação prosseguiu em ritmo mais
acelerado. As negras foram as principais companheiras dos brancos no período colonial,
pois a sua utilização como escravas domésticas facilitou esse contato, formando-se misturas
étnicas que levaram ao aparecimento de mulatos ao lado de caboclos (Freire, 1993).
Os comerciantes franceses e holandeses deixaram também seus genes durante o
Brasil Colônia, no Maranhão e em Pernambuco, respectivamente. No século XIX, os
alemães vieram trabalhar no Sul do país, seguidos de italianos, poloneses e ucranianos. Já
no século XX chegaram os sírio-libaneses, japoneses, chineses e coreanos, misturando-se
aos brasileiros no sudeste do brasil (Barreto, 1959).
Discussão 50
______________________________________________________________________
A conseqüência genética da política social do passado, em relação à formação da
população brasileira atual, tem sido estudada em vários níveis biológicos, como os
polimorfismos clássicos. Um exemplo significante encontramos em Krieger e cols.(1965) e
Engracia1 (1972) cujos estudos sobre mistura racial, no nordeste brasileiro, mostram que a
contribuição de brancos, negros e índios, para o “pool” gênico, é de aproximadamente 59%,
30% e 11%, respectivamente. Seguem a linha dos polimorfismos clássicos os trabalhos de
Franco (1982), Probst e cols. (2000), Ferreira e cols. (2002) . Estudos moleculares, através
do mtDNA, principalmente, comprovam os dados obtidos anteriormente pela metodologia
clássica, como os trabalhos de Da Silva Jr e cols. 2002; Bonatto e cols. 2002; Alves-Silva e
cols. 2000, permitindo assim que se estime a contribuição de genes ameríndios e de outros
grupos étnicos na formação da população brasileira.
As linhagens maternas, medidas através de haplótipos de mtDNA, variam,
consideravelmente, entre as diversas regiões brasileiras: no Sul predominam os haplótipos
de origem européia (66%), havendo no Norte maior proporção de linhagens indígenas
(54%) e, no Nordeste, 44% são de origem africana. A região com maior uniformidade, mais
próxima da média brasileira, é o Sudeste, com uma freqüência de 33% de ameríndios
(Alves-Silva e cols., 2000).
Em recente estudo realizado em duas amostras familiais de Rondônia, uma
população ribeirinha (Portuchuelo, distante ao redor de 15 Km de Porto Velho) e uma rural
(Monte Negro, distante 250 Km de Porto Velho) observou-se que a contribuição africana
foi praticamente a mesma nas duas populações (ao redor de 20%), refletindo a migração
observada durante o período da borracha e da construção da ferrovia Madeira-Mamoré,
sendo que os ameríndios foram encontrados numa proporção de quase quatro vezes
superior em Portuchuelo (42%, sendo 11% em Monte Negro). A diferença na proporção de
Caucasóides reflete a intensa migração devido ao garimpo e à política de assentamento
agrícola do governo federal: 38% em Portuchuelo e 60% em Monte Negro (Ferreira e cols.,
2002).
No presente trabalho também pudemos observar diferenças, não só quanto à
composição étnica, mas também quanto ao índice migracional sugerido por dados oficiais
do IBGE (1991) (pg. 14, parágrafo 02). A diferença principal refere-se à alta proporção, em
nossos dados, de indivíduos oriundos da região Norte. Nossos dados, obtidos através das
Discussão 51
______________________________________________________________________
fichas cadastrais, mostraram um contingente de 19,4% de pessoas oriundas da região N,
16% da região NE, 7,2% do SE, 5,8% do S e 3,7% da região CO e 0,5% de indivíduos da
República da Bolívia. O estado do Amazonas contribuiu com o maior contingente de
pessoas (13,1%), seguido do Acre (5,8%) perfazendo respectivamente 18,9% da amostra.
Os estados do Paraná e Ceará contribuíram com 4,8% e 4%,respectivamente, e os estados
de São Paulo e Minas Gerais com percentuais iguais, equivalente a 2,67% cada. No total,
53,7% dos indivíduos nasceram em Rondônia. Esta situação ocorreu em 31,1% da fração
amostral Hemeron, 35,7% em Bate Estaca, e, em maior proporção, São Carlos (61,5%) e
Candelária (71,9%) (Tabelas 12, 13, 14).
Os dados obtidos referentes ao local de nascimento dos pais dos indivíduos das
quatro frações são observados nas Tabelas 10 e 11. A região Norte é responsável por 48,7%
da geração parental. O estado do Amazonas contribui sozinho com 26,1% em relação à
geração paterna e 25,4% da geração materna, enquanto que Rondônia contribuiu com 23%
da geração paterna e 16%, da geração materna, seguido do Acre com 3,8% e do estado do
Pará com 2,5%. O nordeste foi a região com maior contribuição (22,7%) depois da região
norte. O estado do Ceará contribuiu com um número expressivo de 12,2% para a geração
paterna e 10,6% para a geração materna. A região sul contribuiu com 4,9%; deste, 2,8% são
imigrantes oriundos do estado do Paraná.
Também é notada, na amostra de Candelária (Tabelas 13 e 14), a presença de
indivíduos cujos pais eram índios de tribos de Rondônia, com uma contribuição de 0,6% na
geração paterna e 0,4% de origem materna (Gráfico 01). A contribuição estrangeira foi
observada em 4,8% de indivíduos de origem Latino Americana e 1,2% de descendentes da
região do Mediterrâneo (Portugal 0,3%, Espanha 0,3% e Itália 0,3%). Entre os Latinos
Americano observamos principalmente a presença de Bolivianos, em diversos casos de
indivíduos não aparentados, sendo que a maioria dos descendentes destes possuem traços
indígenas. Detectamos também, na fração de Candelária, uma contribuição de 2,4% de
indivíduos negros descendentes da segunda geração de um ancestral comum originário da
Guiana Francesa.
As diferentes ondas migratórias, que causaram uma complexa e desigual
distribuição da população no estado de Rondônia, foram as responsáveis pela distribuição
étnica observada em nosso estudo. Ao Noroeste encontramos uma população com
Discussão 52
______________________________________________________________________
características de migrações do século XVIII; ao Sudeste, populações indígenas autóctones;
ao Leste, a população resultante das migrações do século XX. Estes dados, refletem a
história da formação da população rondoniense, iniciada a partir de 1723, seguindo o leito
dos principais rios da região Amazônica (Figura 05). Em 1907, com o início da construção
da E.F.M.M., e os 2 ciclos da borracha, no trecho encachoeirado do rio Madeira, vieram
trabalhadores de diversas localidades do Brasil, principalmente do sertão cearense, e
também de outros países. como americanos, ingleses, antilhanos e barbadianos (Oliveira,
2000).
Com a abertura da BR 364 na década de 60, do século passado (1966), iniciou-se o
segundo fluxo migratório. A partir deste período foi observado um aumento significativo
no índice populacional de Rondônia. Entre as décadas de 70 e 80, período auge da
colonização, o processo de ocupação foi linear, ao longo da BR 364 (Martine, 1978), tendo
os imigrantes vindos, em sua grande maioria, das regiões Sul, Sudeste e Centro Oeste,
principalmente dos estados do Paraná, Minas Gerais e Espírito Santo (Oliveira, 2000).
Houve concentração principalmente nas áreas de Ji-Paraná (ex - Vila de Rondônia), Muqui,
Cacoal, Pimenta Bueno, Ariquemes e Marco Rondon (Figura 05).
Na caracterização da população de Porto Velho, estudada através de quatro regiões
(os bairros de Candelária, Bate Estaca, o Hospital Hemeron e o vilarejo de São Carlos), a
descrição de parâmetros como migração, idade, sexo, etc são fundamentais para a
determinação de locos genéticos envolvidos em resistência a doença, ou mesmo na
determinação da estrutura da população para estudos diversos. Essas frações populacionais
e os respectivos parâmetros podem ser observados na Tabela 12.
Migração: A maior taxa de migração efetiva foi observada em Bate Estaca (0,78).
Entretanto, quando observamos a taxa de migração bruta, os maiores valores observados
foram os de São Carlos (0,759) e Hemeron (0,528), refletindo a história de migração de
Rondônia. O limite de pequena distância, segundo critérios discutidos em Material e
Métodos, foi de 200 Km para Bate Estaca e São Carlos e 400 Km para Candelária e
Hemeron. A maior taxa de migração de pequena distância foi observada em Bate Estaca
(0.89). Nas demais frações encontramos valores baixos. Os maiores valores de longa
distância foram observados em São Carlos (0,405) seguido do Hemeron (0,398) (Tabela
12).
Discussão 53
______________________________________________________________________
Figura 05: Movimento migratório da população Rondoniense (Heckmann, 2003)
Discussão 54
______________________________________________________________________
População reprodutora: Este parâmetro não foi observado no Hemeron devido à
falta de dados referentes a filhos. O maior número de indivíduos em idade reprodutiva foi
observado em São Carlos. Em Candelária a maior quantidade de indivíduos em idade
avançada contribuiu para a diminuição da População Reprodutora, além de um grande
número de indivíduos sem filhos. Em Bate Estaca a maioria dos casais não têm filhos.
População efetiva: As maiores proporções foram encontradas na amostra de
Candelária e São Carlos (132,81 e 65,75 respectivamente). Nas amostras do Hemeron e
Bate Estaca foram encontrados as menores estimativas (Tabela 12).
Idade e sexo: No Gráfico 02 (página 28) são apresentados os dados de idade e sexo.
Candelária apresenta uma distribuição piramidal dos indivíduos segundo o sexo e a idade,
que aparentemente se aproxima de uma distribuição normal. Provavelmente a estabilidade
desta população (a mais estável quanto a migrações) seja responsável por esta distribuição.
A maioria dos indivíduos do sexo feminino encontra-se na faixa etária de 0 a 24 anos, e os
do sexo masculino, de 15 a 19 anos. Em Bate Estaca a amostra é constituída em maior
quantidade de indivíduos que se encontram na faixa etária de 0 a 9 anos. Este dado pode ser
conseqüência dos tipos de famílias, que apresentam maior número de filhos, maior
concentração de crianças criadas por avós. As amostras de São Carlos foram coletadas de
indivíduos que procuravam atendimento médico, a maioria mulheres na faixa etária de 20 a
24 anos. O restante da amostra apresentou igual proporção de homens e mulheres para
todas as faixas etária. Na amostra do Hemeron são observadas somente as faixas etárias
entre 18 e 54 anos. A maioria desta amostra é constituída por indivíduos do sexo
masculino, na faixa etária de 18 a 24 anos, o que é esperado por serem amostras de
doadores de sangue.
Etnia: São apresentados na Tabela 13 os dados obtidos através das entrevista
referentes a cor da pele das quatro frações amostrais. Estes dados revelam uma grande
proporção de indivíduos considerados moreno-claro, variando de 47 a 58%. A amostra com
maior proporção de indivíduos brancos foi a do Hemeron (39%). Percebe-se aí a diferença
de povoamento da cidade de Porto Velho, havendo diferenças significativas em relação à
distribuição da população do centro da cidade e dos bairros antigos. Em São Carlos e Bate
Estaca observamos uma grande semelhança nesta estimativa de distribuição étnica (ver
Discussão 55
______________________________________________________________________
história do povoamento de Rondônia, página 13). Em Candelária a etnia negra é
representada pelos descendentes de uma única família, vinda da Guiana Inglesa.
6.2 Freqüência Alélica: ΔF508
Estudos de genética de população e a determinação das freqüências alélicas e
haplotípicas de diversos polimorfismos que ocorrem no gene CFTR, em diferentes grupos
étnicos, é de extrema importância para caracterização populacional da Fibrose Cística,
sendo fundamental para as estratégias de exames diagnósticos, bem como para a detecção,
tratamento precoce e aconselhamento genético.
A partir da detecção do gene CFTR mais de 1000 mutações associadas à Fibrose
Cística (FC) foram identificadas na população mundial. A distribuição de mutações deste
gene é variável, e na maioria dos casos, rara ou especifica de alguma etnia, que se confunde
às vezes com a região geográfica (Tabela 46). Entre as diversas mutações ao longo do gene
CFTR que causam Fibrose Cística (FC) a mais comum é a ΔF508. Apesar de a mutação
ΔF508 ser a mais comum em todo o mundo (66% dos cromossomos com FC; CFGAC;
Cystic
Fibrosis
Genetic
Analysis
Consortium,
1994),
sua
freqüência
varia
consideravelmente entre diferentes grupos humanos e localizações geográficas, indo de
26% na Turquia a 88% na Dinamarca [European Working Group on FC Genetic
(EWGFCG) 1990].
O modelo de distribuição da mutação ΔF508 observado na Europa, com freqüências
mais altas no norte e mais baixas no sul, tem sido comprovado pela maioria, mas não por
todos os estudos epidemiológicos de FC. Casal e cols. (1992), encontraram uma freqüência
de 87% para ΔF508 nos cromossomos de origem basca. Na Albânia, a análise de 92
cromossomos de diferentes regiões detectou uma freqüência de 75% para ΔF508, muito
alta para o sul da Europa. A origem dos Albaneses e migração nômade há 3 mil anos antes
de Cristo, além do isolamento cultural e histórico deste grupo étnico, poderiam explicar
essa freqüência tão alta da mutação ΔF508 nessa região (Novelli e cols., 1992).
Em populações do sul da Europa, em que a incidência de FC é de 1/3.500
nascimentos, a freqüência desta mutação varia entre 40 a 60% entre os portadores da
doença. Nas populações do norte da Europa a variação da freqüência da mutação é de 70 a
Discussão 56
______________________________________________________________________
90% entre os fibrocísticos e a incidência da FC é em torno de 1/2.000 nascimento
(EWGFCG, 1990).
Tabela 46: Mutações no Gene CFTR mais freqüentes na Europa (CFGAC 1994)
Mutação
Freqüência
(%)
População com maior prevalência
ΔF508
28,948
(66.0)
G542X
1,062
(2.4)
Espanhola
G551D
717
(1.6)
Inglesa
N1303K
589
(1.3)
Italiana
R553X
322
(0.7)
Alemão
1717-1G->A
284
(0.6)
Italiana
R117H
133
(0.3)
R1162X
125
(0.3)
R347P
106
(0.2)
3849+10kbC->T
104
(0.2)
ΔI507
93
(0.2)
394delTT
78
10-30%*
G85E
67
R560T
67
A455E
62
1078delT
57
2789+5G->A
54
3659delC
54
R334W
53
1898+1G->T
53
711+1G->T
49
Canadense
2183AA->G
40
Italiana
3905insT
38
S549N
30
2184delA
29
Italiana
Nórdica, Finlandesa
Espanhola
6-17%*
Suíça; Amish; Acadian
Em populações não Européias, a mutação ΔF508 também é a mais freqüente entre
fibrocísticos, embora ela seja relativamente mais baixa que na Europa. Na Argélia, sua
freqüência é de 26,3% (Estivill e cols., 1987), enquanto em Israel, bem como na Turquia,
aparece em 30% dos indivíduos fibrocísticos. É menos freqüente em Africanos, com
Discussão 57
______________________________________________________________________
incidência de 1/17.000 nascimentos (Boat e cols., 1989; Fitzsimmons, 1993; Hamosh e
cols., 1998) é rara em asiáticos onde a incidência é de 1/90.000 (Beaudet, 1989; Reed,
1969) e em paquistaneses é de 1/90.000 (Boat e cols., 1989). Somente quatro outras
mutações [G542X (3,2%), G551D (2,9%), N1303K (2,1%) e R553X (1,6%)] têm
freqüência total > 1% entre os cromossomos FC (Tsui e cols., 1992; FCGAC, 1994). A
maioria das mutações restantes são raras ou limitadas a populações especificas (Matteu e
cols., 2001).
Análises realizadas em diferentes estados do Brasil têm revelado que a freqüência
da mutação ΔF508 é bastante heterogênea e mais baixa que as freqüências na Europa
(Tabela 47, Cabello e cols., 1999; Raskin e cols., 1999).
Tabela 47: Distribuição de mutações FC em amostras de fibrocísticos brasileiros
Cromossomos
Amostra
Santa Catarina
Rio de Janeiro
Rio de Janeiro
São Paulo
São Paulo
Paraná
São Paulo
Rio Grande do Sul
Minas Gerais
Total
F508 Não-F508 total Freqüência F508
13
38
12
15
38
15
60
59
33
283
35
110
22
33
88
19
56
61
29
453
48
148
34
48
126
34
116
120
62
736
0,27083
0,25676
0,35294
0,31250
0,30159
0,44118
0,51724
0,49167
0,53226
0,38451
Referencia
Raskin e cols., 1993
Cabello e cols., 2001
Miranda e cols., 1993
Martins e cols., 1993
Parizotto e cols., 1997
Raskin e cols., 1993
Raskin e cols., 1993
Raskin e cols., 1993
Raskin e cols., 1993
2 = 38.321, df=8.
Martins e cols. (1993) encontraram uma freqüência de 33% para mutação ΔF508 em
uma amostra de 24 indivíduos FC do Estado de São Paulo, enquanto Ferri (1995), também
no estado de São Paulo, encontrou uma freqüência de 35% para esta deleção. Ferri também
analisou uma amostra de 120 indivíduos FC de SP, DF, PE e BA na qual foram estudadas 8
das mais freqüentes mutações da FC. Destas, apenas quatro foram identificadas: ΔF508
(38%), G542X (8,3%), N1303K (1,6%) e W1282X (0,8%).
Discussão 58
______________________________________________________________________
Em uma amostra de 540 indivíduos, do Espírito Santo, com quadro clínico
sugestivo de FC, as freqüências das mutações ΔF508, G542X, R553X e W1282X foram
respectivamente 3%, 0,2%, 0,2% e 0,2% (Rabbi-Bortolini e cols., 1998).
Errera e cols. (2000), com o objetivo de verificar a ocorrência da mutação ΔF508 na
etnia guarani, realizaram uma triagem em 146 índios pertencentes a três aldeias do Espírito
Santo. Em nenhuma das amostras foi observada a deleção ΔF508.
O resultado da análise das mutações G542X, G551D, R553X e N1303, por Raskin e
cols. (1999a) mostrou que as quatro mutações contribuem para 17% dos cromossomos nãoΔF508 e apenas 9% do número total de cromossomos com FC brasileiros. A freqüência de
cada mutação é semelhante às populações do sul da Europa, principalmente às populações
espanholas e italianas.
Bernardino e cols. (2000) realizaram a análise molecular de 160 cromossomos de
indivíduos brasileiros FC, identificando a presença de mutação em 97 pacientes. A
freqüência da deleção ΔF508 foi de 48,4%, seguida por um conjunto de mutações que
contribuem para 20,1% dos cromossomos não-ΔF508 [G542X (8,8%); R1162X (2,5%);
N1303K (2,5%); R334W (2,5%); W1282X (1,3%); G85E (1,3%); L206W (0,6%) e R553X
(0,6%)]. Foram encontradas também outras 7 mutações raras, além de 5 mutações nunca
antes descritas.
Cabello e cols. (2001) detectaram uma mutação rara (3120+1G→A) com maior
freqüência em Afro-Americanos, através de análises com a técnica de SSCP em cinco
indivíduos Fibrocísticos do Rio de Janeiro (Tabela 48).
Tabela 48: Freqüências alélicas de mutações no gene CFTR em 74 pacientes fibrocísticos
do Rio de Janeiro (Cabello e cols., 2001)
Alelo
Freqüência Alélica (DP)
Não-F508
0.66892 (0.03332)
G542X
0.02703 (0.01372)
G551D
0.00676 (0.00681)
3120+1GA
0.04053 (0.01418)
F508
0.25676 (0.03343)
Discussão 59
______________________________________________________________________
Em nosso trabalho, a descrição dos fenótipos observados, freqüências alélicas e
valores de χ² para a mutação ΔF508 foram ilustrados nas Tabelas 14, 15, 16 e 17.
Apenas um indivíduo, da comunidade de São Carlos, apresentou a mutação, em
heterozigose. Nas demais localidades, a freqüência foi nula. Esta ausência torna-se mais
significativa na amostra do Hemeron, em que eram esperados 27 indivíduos (ver Tabela
19).
Considerando os resultados antropogenéticos (Tabelas 9, 10 e 11), podemos inferir
que a baixa freqüência da mutação ΔF508 encontrada na população de Porto Velho é
conseqüência de mistura étnica, da alta incidência de grupos étnicos negróides e
ameríndios.
Para podermos discutir esses resultados como uma função de mistura populacional,
fizemos uma estimativa de mistura étnica nos mesmos moldes descritos em Material e
Métodos (pg. 22), mas, já conhecendo-se melhor a estrutura da população que estudamos,
utilizamos apenas os dados de mistura étnica referentes ao povoado de PortoChuelo
(Ferreira e cols., 2002) . A freqüência da mutação pode ser determinada como q = (0,449)
(0,35) + (0,355) (0,21) + (0,00) (0,44) = 0,2317.
De posse dessa estimativa, pudemos calcular a freqüência do alelo ΔF508 na
população, com os resultados obtidos no rastreamento da mutação ΔF508 na população
sadia, onde foi observado 1 portador do alelo mutante em três das amostras (HE, SC, CD).
O cálculo de heterogeneidade entre as três frações (n = 326) não apresentou χ2 significante
(Tabelas 18), o que possibilitou a determinação da freqüência da mutação com um N maior
(326), sendo encontrado o valor de q = 0,0030. Supondo que esta proporção corresponde à
estimativa da freqüência de heterozigotos e dado que a freqüência do alelo normal deve ser
próxima da unidade, então podemos estimar que a freqüência do alelo normal deve ser
próxima da unidade, sendo a freqüência do mutante ΔF508 = 0,0015 (próxima à
observada).
Esta baixa freqüência alélica pode ser explicada: a) nossa amostra foi muito
pequena; b) trabalhamos com indivíduos sadios, que não procuravam serviço médico (caso
do Hemeron) e c) as tabelas 9, 10 e 11 mostram que os sujeitos de nosso estudo são,
majoritariamente, nascidos na região Norte do país, ou descendem de Nortistas,
Amazonenses na maioria ou descendentes direto de índios de Rondônia e Bolivianos.
Discussão 60
______________________________________________________________________
Podemos supor, por esses resultados, que no Sul do estado de Rondônia a
freqüência da mutação ΔF508 possa ser maior do que a observada em Porto Velho, uma
vez que a concentração de indivíduos oriundos do sul do país encontram-se ao longo da BR
364.
6.3 Marcadores polimórficos
Uma análise detalhada dos genótipos observados e esperados segundo o modelo de
Hardy-Weinberg, das freqüências gênicas e valores do teste de χ2 (pHW), para os três
marcadores polimórficos e a mutação ΔF508, em cada fração amostral, pode ser observada
nas Tabelas 14 e 17. Os três marcadores (XV2c, KM19 e IVS6aGATT) foram encontrados
com freqüência polimórfica, tendo o χ2 variado de 0 a 4,201. Todos os três marcadores
polimórficos encontram-se dentro das proporções esperadas.
Calculou-se a heterogeneidade entre as quatro frações para se poder trabalhar, ou
não, com um N populacional maior (Tabelas 18). O único resultado com χ2 significante
(6,166, p < 0,02; 6,790, p < 0,05 e 6,736, p< 0,05) foi encontrados em BE, quando a
comparamos com as outras frações, para o marcador XV2c, em associações uni, bi e tri
populacionais, respectivamente. O pequeno tamanho amostral pode explicar esses
resultado.
O padrão da distribuição das freqüências dos marcadores XV2c, KM19 e GATT,
nas quatro amostras pode ser observado na figura 04.
XV2c: O alelo 1 deste marcador está associado à mutação ΔF508 em estudos de
desequilíbrio de ligação (Kerem e cols., 1989; Huth e cols., 1989; Dörk e cols., 1992). Em
populações não Fibrocística apresenta uma freqüência que varia de 0,48 a 0,57 em
diferentes populações (Tabela 49). Observa-se que em nosso estudo a freqüência deste alelo
foi maior que as descritas em outras populações, sendo detectadas em Bate Estaca (0,60) e
São Carlos (0,58) as maiores freqüências. Numa comparação com os dados da Tabela 49,
vemos que essa distribuição aproxima-se da observada na população alemã descrita por
Krowczak e cols. (1988). Não podemos, entretanto, fazer grandes divagações em torno
deste fato, porque temos uma fração populacional pequena e poucas populações para
comparação.
KM19: O alelo 2 deste sistema está associado à mutação ΔF508 (Kerem e
cols.,1989; Huth e cols., 1989; Dörk e cols., 1992). Nas quatro frações amostrais o alelo 1
Discussão 61
______________________________________________________________________
foi o mais freqüente (Tabela 14 a 17), o que está de acordo com a freqüência do ΔF508
encontrado em nosso estudo.
GATT: O alelo 6 deste sistema GATT está ligado à mutação ΔF508 (Gasparini e
cols., 1991). No presente estudo o alelo 7 do sistema GATT apresentou-se em maior
freqüência (0,71 a 0,77). Esta distribuição está dentro do esperado em população normais.
Tabela 49: Distribuição das freqüência alélicas dos marcadores XV2c/ KM19 e GATT de
cromossomos normais em diferentes países.
População
Alemanha
Califórnia
Espanha
França
Marcador
polimórfico
KM19
XV2c
KM19
XV2c
GATT
GATT
GATT
KM19
XV2c
KM19
XV2c
Freqüências
Alelo 1
Alelo 2
0,65
0,35
0,48
0,52
0,67
0,33
0,52
0,48
0,13
0,87
0,29
0,71
0,15
0,85
0,69
0,31
0,57
0,43
0,73
0,27
0,48
0,52
Referências
Krowczak e cols., 1988
Krowczak e cols., 1988
Dörk e cols., 1991
Dörk e cols., 1991
Dörk e cols., 1991
Chehab e cols. 1991
Gasparini e cols., 1990
Serre e cols., 1990
Serre e cols., 1990
Vidaud e cols., 1989
Vidaud e cols., 1989
6.4 Freqüência Haplotípica
mutação ΔF508 exibe forte associação com o haplótipo B (alelo 1 do XV2c com
alelo 2 do KM19) dos marcadores XV2c/KM19 em 96% dos cromossomos FC de origem
européia (Lemna e cols., 1990)e a severidade dos efeitos causado pela mutações no gene
CFTR (EWGFC., 1990, Beaudeth e cols. 1988). O mesmo haplótipo está associado com 16
mutações não-ΔF508, numa freqüência de 5% (Dörk e cols., 1992a; EWGFC; 1990;
Scriner e cols., 1995). Embora diversas mutações do gene CFTR estejam associadas a
haplótipos, dificultando identificação e diagnóstico da doença, combinações com dados de
genética de população torna possível o uso de haplótipos na caracterização das mutações
fibrocísticas devido à freqüência da distribuição haplotípica em relação à distribuição
geográfica das mutações (Morral e cols., 1996; Dörk e cols., 1991).
Discussão 62
______________________________________________________________________
Em várias populações, o haplótipo B, quando combinado com o alelo de seis
repetições (alelo 6) do microssatélite GATT (alelo 1 do XV2c com alelo 2 do KM19 com
alelo 6 do IVS6aGATT) fica em desequilíbrio de ligação com a mutação ΔF508, sugerindo
que a mutação ΔF508 foi originada a partir de um gene que possuía o alelo com seis
repetições deste polimorfismo (Chehab e cols., 1991). Também cromossomos ΔF508 que
são carreadores do alelo de sete repetições (alelo 7, alelo 1 do XV2c com alelo 2 do KM19
com alelo 7 do IVS6aGATT) podem indicar tanto a diferença na origem da mutação ΔF508
como na geração de eventos de recombinação. Assim, este simples sistema de dois alelos
proporciona uma identificação de eventos de crossing-over envolvendo a mutação em
questão e podem auxiliar na sua datação (Chehab e cols., 1991; Morral e cols., 1996).
Diante da importância da caracterização populacional de Haplótipos gerados pelos
marcadores XV2c e KM19 (A, B, C e D), fizemos o levantamento da freqüência deles nas
quatro frações populacionais, cujos resultados são apresentados nas Tabelas 20 a 23.
Podemos observar que os haplótipos A e C encontram-se em maior freqüência nas quatro
amostra, sendo Bate Estaca, com 0,4950, e São Carlos, com 0,4491, as localidades que
apresentaram o maior índice. Uma distribuição semelhante foi observada por Orozco e cols.
(2001) na população do México, enquanto que em outros paises esta freqüência é bastante
variada (Tabela 03).
A freqüência haplotípica da associação dos marcadores XV2c e o STR IVS6aGATT
pode ser observada nas Tabelas 24 a 27. O haplótipo 1-7 (alelo 1 do marcador XV2c/ alelo
7 do IVS6aGATT) é o mais freqüente nas quatro amostras, não havendo diferenças
significativas entre elas. Os haplótipos gerados pelo marcador KM19 e o STR IVS6aGATT
encontram-se nas Tabelas 28 a 31. O haplótipo cujos alelos não se encontram associados à
mutação ΔF508 é o 1-7 (Kerem e cols.,1989; Huth e cols., 1989; Dörk e cols., 1992), sendo
este o mais freqüente nas quatro frações. Este dado é compatível com a ausência da
mutação F508 em nossos dados.
A análise conjunta dos três marcadores do gene CFTR (KM19, XV2c e
IVS6aGATT) poderiam gerar 64 haplótipos na análise dos 408 cromossomos normais.
Foram porém detectados apenas 22 combinações (Tabela 32). Os haplótipos mais freqüente
nas quatro frações foram A7 e C7 (Tabela 33 e 34). A importância biológica deste dado não
pode ser determinada devido à ausência de dados na literatura, para comparação. Entretanto
Discussão 63
______________________________________________________________________
Chehab e cols. (1991) salientam a importância do alelo 7 na caracterização de mutações
não-F508 em populações não caracteristicamente caucasóides.
No México, Orozco e cols. (2001) observaram que os haplótipos A e C são os mais
freqüentes em cromossomos normais (49,1% e 31,8% respectivamente), sendo a
distribuição dos haplótipos de cromossomos carreadores de mutações novas ou
desconhecidas semelhantes à de cromossomos normais (P>0,05) . No estudo mexicano, o
haplótipo B e a mutação ΔF508 não foram observados em pacientes FC ameríndios,
sugerindo uma origem européia para a presença da mutação ΔF508 na América Latina. Os
haplótipos mais freqüentes em indivíduos FC foram os B e A (56,7% e 21,6% dos
cromossomos analisados, respectivamente), tendo o C e o D freqüências respectivamente
de 14,9% 6,8%. A composição étnica desta população mexicana era bastante heterogênea
(Ameríndios 50%, Hispânicos 40% e Africanos 10%). Numa comparação posteriormente
realizada (Tabela 44), o χ2 de heterogeneidade entre nossas frações populacionais e a
mexicana foi não significante (χ2 =7,614, 3 GL), levando à hipótese de que estas duas
amostras sejam semelhantes em relação à contribuição Ameríndia. Raskin e cols. (1997)
encontraram uma distribuição haplotípica bastante heterogênea entre as amostras de cinco
estados brasileiros, sugerindo a presença de variedade mutacional na população brasileira.
Utilizamos os dados das tabelas 35 a 37 para calcular a heterogeneidade, através do
programa CHISQ da programoteca Genioc. Este procedimento possibilitou-nos saber a
extensão das diferenças entre as nossas quatro frações populacionais e os dados da
literatura. Os resultados obtidos (Tabela 38) demonstram que as quatro amostras são
homogêneas e podem ser agrupadas, gerando uma amostra única (HE + SC + CD + BE =
Porto Velho).
Quando Porto Velho foi comparada com amostras de cinco estados brasileiros
(dados de Raskin e cols., 1997) das regiões Sul e Sudeste (RS, SC, PR, SP e MG), o χ2 de
heterogeneidade foi significante (Tabelas 39 a 43). A maior diferença (χ2 = 15,38, 3 GL) foi
observada na comparação feita com o Rio Grande do Sul (região Sul), onde predominam os
haplótipos de mtDNA de origem européia (Alves-Silva e cols., 2000), e a menor (χ2 =
9,247,3 GL ) foi observada com Minas Gerais (região Sudeste). Estes dados sugerem a
existência de um gradiente Noroeste-Sudeste, inversamente semelhante ao encontrado na
Europa, mas de acordo com nossa história de povoamento. Seguindo este raciocínio
Discussão 64
______________________________________________________________________
comparamos estes dados com uma amostra européia (Estivill e cols., 1988) e o χ2 = 66,642
(Tabela 45), altamente significante, indicou a grande diferença na distribuição do gene
CFTR entre as amostras, comprovando a diferença na composição étnica destas
populações.
6.4.1. Como foi discutido no ítem 6.1, no princípio da colonização das regiões Norte
e Nordeste, houve um incentivo ao casamento do colonizador com mulheres nativas
(Carvalho-Silva e cols, 2001). O esperado é que esta tendência de acasalamento reflita-se
em diferenças significantes em relação ao DNA herdado exclusivamente pelo pai (Y-DNA)
ou pela mãe (mtDNA) (Salzano, 1982; Rodrigues-Delfin, 1997; Bianchi e cols, 1998; RuizLinares e cols, 1999, Santos e cols, 1999, Carvalho-Silva e cols, 2001, entre outros). A
avaliação da história genética destas regiões é portanto relevante para otimizar desígnios de
estudos centrados na identificação de determinantes genéticos de doenças complexas.
Existem poucos estudos sobre a distribuição de polimorfismos de DNA na Amazônia
Brasileira, especificamente Rondônia, o que, por si só, justifica o estudo da estrutura desta
população, principalmente porque se trata de uma região em que o processo de
miscigenação é recente, e estudos familiares ou populacionais podem ser usados para
identificar genes que refletem as diferenças entre as populações, incluindo-se aí a
distribuição do gene CFTR e as causas determinantes da manutenção de mutações que
ocorrem neste loco.
Estudos realizados por Alves-Silva e cols. (2 000), em 247 mtDNAs de indivíduos
brasileiros demonstraram quase igual quantidade de contribuição genética matrilínea de
nativos americanos, africanos e europeus, havendo, entretanto, diferenças regionais,
refletindo a história de colonização portuguesa e migração européia, do século XIX. No SE
brasileiro, a contribuição da filogenia africana de mtDNA foi bastante alta. A introdução da
mtDNA no continente americano, segundo Bailliet e cols (1994) não foi acompanhada de
um efeito genético severo de “gargalo-de garrafa”, desde que suas análises, efetuadas num
total de 591 ameríndios, indicaram a existência de quatro haplótipos ameríndios principais
(classes A, B, C e D), não sendo descartada a existência de outros potenciais haplótipos
fundadores.
Desde que a identificação de ancestralidade é uma condição necessária para se
compreender e analisar a distribuição dos Haplótipos do gene CFTR, dois marcadores de
Discussão 65
______________________________________________________________________
mtDNA foram analisados em um total de 60 indivíduos da geração parental do bairro de
Candelária, num estudo preliminar sobre a origem dos indivíduos que povoaram Rondônia.
Observamos em 15 indivíduos a presença da uma deleção de 9pb e 16 do marcador HincII,
que são características de ameríndios, caracterizando em nível molecular a ancestralidade
indígena materna desta fração populacional (Stone e Stoneking., 1993).
Salientamos a presença destes em uma única família de cinco irmãos (figura 06), a
única distribuição familial encontrada para esses marcadores: a deleção de 9pb foi
detectada em todos os membros da irmandade e transmitidas para dois netos de uma das
irmãs desta família.
Todos os membros desta família possuem o haplótipo C7 do gene CFTR, em quatro
casos em homozigose e em um caso associado ao haplótipo B7 (figura 06).
Relatamos esta distribuição devido a que existe a possibilidade, depois que estudos
adicionais forem efetuados, de se montarem haplótipos de CFTR característicos de
ameríndios, se for confirmada a associação entre os haplótipos de mtDNA e do gene CFTR.
Figura 06: Heredograma da família de Candelária mostrando os haplótipos gerados pelos
marcadores do gene CFTR e marcadores do mtDNA (Heckmann, 2003)
6.5 Rastreamento de mutações
Foram realizados rastreamentos de mutações, na tentativa de detectar a presença da
mutação ΔF508, nas amostras dos probandos, e seus familiares (Tabela 50).
Tabela 50: Mutações analisadas nas famílias de Probandos de Triunfo e GuajaráMirim
Discussão 66
______________________________________________________________________
Mutações Analisadas
ΔF508
G551D
R553X
S549N
S549I
G542X
R334W
Na família de Guajará-Mirim, cujo diagnóstico molecular da mutação fibrocística
ainda não pode ser concluído (Figura 07), observamos, pelas análises dos haplótipos, que
os cromossomos FC são carreadores do haplótipo B7. A literatura pertinente mostra que ao
redor de vinte mutações fibrocísticas (entre elas as analisadas por nós) estão ligadas a este
haplótipo (ver Bobadilla e cols., 2002, para revisão).
Não foi detectada nenhuma das mutações acima apresentadas. A comparação de
nossos dados com os de outras localidades brasileiras (Tabelas 39-41) mostram a grande
heterogeneidade entre eles e os descritos para Santa Catarina, Rio Grande do Sul e Paraná
(χ23 = 10,605, 15,386 e 11,159, respectivamente). Raskin e cols. (1999b), em uma amostra
de 49 indivíduos do estado do Paraná e 30 do estado de Santa Catarina, de indivíduos
fibrocísticos, cuja mutação determinante da doença era desconhecida, detectaram seis alelos
da mutação R1162X entre os indivíduos de Santa Catarina e um alelo entre os indivíduos do
Paraná. Neste estudo, os 270 indivíduos não Fibrocísticos, oriundos do estado do Paraná,
com ascendência Italiana, usados como controle, não apresentaram a mutação R1162X.
Salientamos que esta mutação foi detectada em baixa freqüência em ameríndios de um
isolado americano e em italianos (Sul da Itália) (Mercier e cols., 1994). Nossa sugestão é
que, devido à presença desta mutação tanto em indivíduos de origem italiana ou ameríndia,
que a incluamos em novos rastreamentos, não só nos probandos e seus familiares, mas nos
indivíduos de nossas quatro frações populacionais, desde que entre os indivíduos de Porto
Velho foi encontrado o haplótipo B em heterozigose, com haplótipos A e D. Exceção feita
Discussão 67
______________________________________________________________________
com dois indivíduos da fração HE e um indivíduo da fração SC (todos eles B6B7). Este
indivíduo podem ser carreador de mutações ainda não descritas no gene CFTR.
Figura 07: Heredograma das duas famílias Fibrocística: A) Família de Guajará Mirim B)
Família da Linha Triunfo
Anexos
______________________________________________________________________
1
11. Anexos
11.1 - EXTRAÇÃO DE DNA - PROTEINASE K
I. OBJETIVO
Extração de DNA genômico.
II. MATERIAL E EQUIPAMENTOS
1. minicentrífuga
2. micropipeta (c/1 ponteira/amostra).
3. microtubos de polipropileno tipo "Eppendorf" de 1,5 ml
III. REAGENTES E SOLUÇÕES:
1. TAMPÃO PARA LISE DE ERITRÓCITOS (Tris/HCl 0,01M pH 7,6;
Sacarose 0,32M; MgCl2 5 Mm e Triton X-100 1%).
2. TAMPÃO PARA LISE DE LEUCÓCITOS (Tris/HCl 0.01 M pH 8,0; KCl
50 mM; MgCl2 2,5 mM; NP-40 0,45%; tween 20 (ou 80) 0,45%)
3. PROTEINASE K: 10 mg/ml
IV. PROCEDIMENTOS:
1. As amostras de sangue devem ser colhidas em tubos Vacutainer com EDTA.
2. Proceder alternativamente de acordo com o tipo de amostra:
(a) sangue total: 500 μl de sangue total.
(b) sangue total glicerolizado: 200 μl da papa de hemácias.
(c) "buffy coat" (BC): 50 μl do buffy coat.
(d) sangue total hemolisado: 300 μl do sangue total hemolisado.
3. Acrescentar 1 ml do tampão de lise de eritrócitos (lise 1).
4. Centrifugar a 6000 G por 1 minuto e descartar o sobrenadante.
Anexos
______________________________________________________________________
2
5. Os procedimentos 3 e 4 devem ser repetidos até que o precipitado fique
claro,
indicando
ausência
de
contaminação
com
a
hemoglobina.
Normalmente 3 vezes são suficientes.
6. Ressuspender o precipitado em 300 μl de tampão de lise de leucócitos,
adicionar 5 μl de proteinase K (10 mg/ml) e deixar pelo menos 1 hora a 65
C e mais 3 horas a 37 C (preferencialmente durante a noite).
7. Aquecer a 94 C por 10 minutos para inativar a proteinase K, estocar a -20
C até momento do uso.
11.2 - COLORAÇÃO - NITRATO DE PRATA
1. OBJETIVO
Coloração de gel de acrilamida com nitrato de prata - NaOH
2. SOLUÇÕES
Nitrato de Prata 20%
Solução fixadora: 750 água, 150ml de etanol e 6 ml de ácido acético
Solução reveladora: NaOH 2,25% (dissolver 22,5 g para 1 litro de água);
adicionar 1 ml de formaldeído a cada 100 ml desta solução no momento do
uso.
3. PROCEDIMENTOS
1. Adicionar o formaldeído à solução de NaOH
2. mergulhar o gel em 100 ml da solução fixadora
3. adicionar 1 ml da solução de nitrato de prata 20%
4. agitar por 5 min
5. desprezar a solução de nitrato de prata.
6. Lavar o gel com 100 ml de água.
Anexos
______________________________________________________________________
7. Despreza a água e adicionar 100 ml da solução reveladora (NaOH com
formaldeído).
8. Agitar constantemente controlando visualmente o aparecimento das
bandas.
9. Interromper com solução fixadora.
10. Manter em solução fixadora até o momento de secar para arquivar.
11.3 - ELETROFORESE – gel de poliacrilamida (PAGE)
1. OBJETIVOS
Observar o padrão de migração do produto de PCR
2. EQUIPAMENTOS
Cuba
Fonte (até 600 V)
2. MATERIAL PERMANENTE
Micropipetas 0-200 l
Seringa Hamilton (para aplicação das amostras)
Placas de vidro com espaçadores de 0,7mm (ou mais, para permitir a entrada da
agulha ou ponteira).
4. REAGENTES
TEMED
FORMAMIDA
6. SOLUÇÕES
6.1 Acrilamida-Bis 29:1% (29 g acrilamida, 1 g bis-acril. em 100 ml agua)
6.3 TBE 10x (Tris-borato-EDTA 0,9M pH 8,0)
6.4 KPS 10%
6.5 “Loading buffer” - Tampão de Corrida (azul de bromofenol).
3
Anexos
______________________________________________________________________
4
7. PROCEDIMENTOS
1.Preparar o gel de acordo com a tabela abaixo
Concentração do gel:
10%
Volume total do gel
20 ml
água
9,75 ml
sol de acril+bis 29:1
6,7 ml
glicerol
-
TBE 10x
2 ml
TEMED
40 l
Persulfato de Amônia
400 l
1. Despejar a solução dentro das placas e ajustar o pente, sem deixar bolhas de ar.
aguardar a polimerização (usualmente, 15-20 minutos – OBS; este tempo é muito
sensível à temperatura).
2. Preparo das amostras: Colocar em microtubo 3
l do tampão de corrida e
adicionar 5 l da amostra produto da PCR.
3. Diluir 10x o tampão TBE 10x em volume adequado ao tamanho da cuba
utilizada.
4. Despejar o tampão nos compartimentos da cuba.
5. Montar as placas na cuba.
6.Verificar a existência de bolhas entre o gel e o tampão do pólo positivo.
8.Aplicar amostras.
9. Condições elétricas: varia conforme o sistema; de modo geral, 15-20 V/cm da
coluna de separação, mantendo voltagem constante.
Anexos
______________________________________________________________________
5
11.4 – Termo de Consentimento
_________________________________________________________________________
TERMO DE CONSENTIMENTO
Eu, _________________________________________________ como morador da
comunidade de “Candelária” no município de Porto Velho, fui informado da justificativa,
objetivos, e procedimentos que serão utilizados na pesquisa " Controle de malária em
Área Urbana ” , e da liberdade de me recusar a participar ou retirar meu consentimento
em qualquer fase da pesquisa sem penalização nem prejuízo ao meu cuidado.
Porto Velho, _____de ______________ de 200___.
PACIENTE: _______________________________________________________
Anexos
______________________________________________________________________
6
11.5 - Ficha de Inquérito
ENTREVISTADOR: __________________________________________
IDENTIFICAÇÃO DO INDIVÍDUO
Data da Coleta:
Local da Coleta
Data de Chegada a Rondônia:
Data de Chegada a Porto Velho:
Registro Hemeron:
Registro CEPEM:
Nome:
Sexo:
Idade:
Etnia:
Endereço:
Bairro:
Município:
Estado:
Ponto de Referência:
Telefone para Contato:
Local de Nascimento:
Estado:
Ascendência Materna:
Ascendência Paterna:
Dados Sócio Econômico
Ocupação principal:
Endocruzamento:
Grau de Instrução:
Tipo de Construção:
Estado Civil:
Etilismo: ( ) Sim ( ) Não
Tabagismo: ( ) Sim / quantos ___ ( ) Não
Filhos ( ) Não ( ) Sim quantos: ____
Renda Familiar:
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Estudo do Gene e CFTR (Maria Izabel Alecrim & Vera Engracia