CAPA
ANTROPOLOGIA E EDUCAÇÃO:
SEXUALIDADE NA ADOLESCÊNCIA
MARIA OTILIA TELLES STORNI
(organizadora)
Ideia
João Pessoa
2015
FICHA TÉCNICA
Livro produzido pelo Projeto
Para Ler o Digital: reconfiguração do livro na Cibercultura – PIBIC/UFPB
Departamento de Mídias Digitais – DEMID / Núcleo de Artes Midiáticas – NAMID
Grupo de Pesquisa em Processos e Linguagens Midiáticas – Gmid/PPGC/UFPB
Coordenador do Projeto
Marcos Nicolau
Capa
Gabriel Jardim
Editoração Digital
Bruno Gomes
Alunos Integrantes
Bruno Gomes
Gabriel Jardim
Sâmara Lígia
Samara Cintra
EDITORA
Av. Nossa Senhora de Fátima, 1357, Bairro Torre
Cep.58.040-380 - João Pessoa, PB
www.ideiaeditora.com.br
Atenção: As imagens usadas neste trabalho o são para efeito de estudo,
de acordo com o artigo 46 da lei 9610, sendo garantida a propriedade
das mesmas aos seus criadores ou detentores de direitos autorais.
S885c
Storni, Maria Otilia Telles.
Antropologia e educação: sexualidade na adolescência [recurso
eletrônico] / Maria Otilia Telles Storni.- João Pessoa: Ideia, 2015.
1CD-ROM; 43/4pol. (636kb)
ISBN: 978-85-7539-977-4
1. Antropologia e educação. 2. Adolescência - sexualidade. 3. Gravidez precoce.
CDU: 39:37
Antropoligia e Educação
SUMÁRIO
Apresentação...........................................................................................................07
Orientações que Desorientam:
Questões do Adolescentes Do Sexo Feminino
Maria Otilia Telles Storni e Antonia Lúcia Barbosa De Sousa..............09
Gravidez Precoce:
Causas, Fatores e Valores Nos Relatos De Adolescentes
Andressa Maria Ramos e Maria Otilia Telles Storni..................................41
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Aos professores e pais de adolescentes,
inlcusive os da minha família
Dedico
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APRESENTAÇÃO
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A temática da sexualidade na adolescência é sempre muito polêmica e
cercada de silêncios e tabus tanto nas famílias quanto nas escolas. Considero que a educação sexual dos adolescentes é uma necessidade que deveria
ser considerada essencial para a educação dos nossos jovens. No entanto,
o Estado, os pais e os educadores continuam omissos, em sua maioria, tal
como eram há décadas atrás. O problema maior é que a mentalidade dos jovens, longe de compartilharem dos tabus antiquados, tem se transformado
em comportamentos de risco nas questões da sexualidade. Desvendar esta
problemática é a principal proposta da elaboração desta coletânea.
No entanto, não há muitas pesquisas feitas sobre esta temática, e é difícil
encontrar fundamentos teóricos e dados empíricos conjuntamente. Provavelmente essa escassez de trabalhos no contexto brasileiro se deve ao fato de
este ser um tema alvo de tabus e constrangimentos, apesar da necessidade
urgente de ele ser abordado em ambientes educacionais. Em João Pessoa/
PB por exemplo, surgiu um boato não comprovado de que o prefeito criou
um programa de treinamento de professores municipais para desenvolve-
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rem os Parâmetros Curriculares Nacionais para ministrarem, em suas escolas,
disciplinas com o conteúdo da educação sexual, porém nada se sabe sobre
sua concretização.
A intenção das autoras desta coletânea é então a de oferecer textos e
fundamentos teóricos que possam servir como material para todos os que
querem dar um passo adiante nessas omissões e silêncios. A organizadora e
uma das autoras deste livro começou então a pesquisar sobre este assunto
para incluir esta temática nas disciplinas de Antropologia Cultural que vem
ministrando na Universidade Federal da Paraíba, especialmente para os alunos de Serviço Social, que forma profissionais que deverão atuar em hospitais, Conselhos Tutelares e outras instituições encarregadas de orientar e
resolver problemas de crianças e jovens.
Nestas aulas surgiram interesses de alguns alunos desenvolverem pesquisas sobre este tema, então temos nesta coletânea dois artigos que foram
escritos a quatro mãos, sendo o primeiro um resumo com reflexões de uma
dissertação de mestrado e o segundo o texto de uma monografia de final
do curso de Ciências Sociais. Ambos focalizam estes trabalhos, só que foram
feitas adaptações dos textos para se transformarem nestes artigos.
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ORIENTAÇÕES QUE DESORIENTAM:
QUESTÕES DE ADOLESCENTES DO SEXO FEMININO
Maria Otilia Telles Storni1
Antonia Lúcia Barbosa De Sousa
Introdução
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Esse artigo tem como ponto de partida uma reflexão sobre a cultura da
sexualidade compartilhada pelas adolescentes do sexo feminino, mas, termina com um questionamento mais amplo sobre as relações das jovens com
seus familiares, nessa fase turbulenta das suas vidas. Nossa preocupação
com esse tema começou quando a primeira autora acima referida desenvolveu um trabalho de orientação de dissertação de mestrado de Sousa (2000),
1 Maria Otilia Telles Storni é mestra em Antropologia Social e doutora em Ciências Sociais com habilitação em Antropologia pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Exerce a função de professora do Departamento de
Ciências Sociais/CCHLA da Universidade Federal da Paraíba - UFPB. Antonia Lúcia Barbosa de Sousa é mestra em
Serviço Social pelo Programa de de Pós-Graduação em Serviço Social - PPGSS - e foi professora substituta do curso
de graduação em Serviço Social. Atualmente atua como profissional de Serviço Social no Hospital Universitário Lauro
Wanderley, da UFPB.
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a segunda autora, cujo objeto foi justamente a questão da sexualidade das
adolescentes do sexo feminino, na cidade de João Pessoa/PB. Esse trabalho
empírico foi feito no ano de 2000 e envolveu 21 (vinte uma) adolescentes
do sexo feminino, alguns dos seus familiares (07 – sete - pessoas) e 06 (seis)
profissionais do SEAD/HULW2, – uma médica, duas assistentes sociais, duas
psicólogas e uma enfermeira –, somando um total de 34 sujeitos focalizados
nessa pesquisa.
Dentre as adolescentes haviam seis delas oriundas de famílias de formação intelectual com base em cursos superiores da classe média alta de João
Pessoa3, que não estavam sendo atendidas por esse programa. Elas foram
incluídas justamente para fazer o contraponto das possíveis diferenças com
as demais atendidas pelo programa do HULW, de origem predominantemente de classe média baixa – com renda abaixo de 04 salários mínimos.
O objeto inicial dessa pesquisa foi a análise das teorias sobre os tabus e
contradições presentes nos modelos culturais que regulamentam a sexualidade na adolescência feminina, cujo conteúdo conservador é fortemente
arraigado nas mentalidades dos entrevistados ligados ao SEAD. O objetivo
2 A sigla SEAD/HULW significa Serviço de Atendimento de Adolescentes do Hospital Universitário Lauro Wanderlei,
mas, a primeira parte – SEAD - é um rótulo fictício pois o nome verdadeiro desse programa foi preservado para evitar
exposições sobre o excelente trabalho desenvolvido por ele. O objetivo desse programa é o de oferecer orientação
sexual e outras, que é prestado aos adolescentes pessoenses. Eles são, em sua maioria, do sexo feminino porque
não há médico urologista para atender os rapazes dessa faixa etária, em suas necessidades específicas de saúde.
3 Entende-se aqui por família de classe média alta aquela que tem renda igual ou maior que dez salários mínimos.
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maior dessa pesquisa era o de contribuir para a sistematização da orientação
da sexualidade de adolescentes do sexo feminino, num estado nordestino
em que as tradições patriarcalistas ainda são muito arraigadas, especialmente nas classes médias e baixas da população.
Dentre as constatações empíricas de Sousa (2002), destacaram-se as dificuldades das adolescentes para lidar com sua sexualidade; um dos maiores
problemas que elas enfrentam é a cultura moralista dos seus pais, os quais
não aceitam pensar nos novos valores - que defendem o exercício da sexualidade com afeto e segurança -, muitos menos orientá-las nesse sentido. A
palavra de ordem entre os familiares, especialmente os de classe média baixa, é a proibição do exercício da sexualidade antes do casamento, para suas
filhas, embora isso quase nunca aconteça.
Segundo Sousa (2002), o SEAD informa as adolescentes vinculadas ao programa sobre o funcionamento dos órgãos sexuais femininos e oferece também terapias e encontros para debate sobre a sexualidade e relacionamentos
familiares conflitantes que ocorrem nessa faixa etária das moças. Uma das
principais preocupações desse programa é orientá-las de modo que a decisão
sobre a perda da virgindade e usufruto da sexualidade com responsabilidade
seja tomada exclusivamente pelas adolescentes. Essa proposta de delegar a
decisão do exercício da sexualidade para as moças compõe a primeira orientação que desorienta, porque, enquanto o programa sugere que a decisão seja
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delas, suas famílias – de orientação visivelmente tradicional e patriarcalista transmitem a mensagem oposta, ou seja, elas não têm o direito de decidir por
um comportamento que é regulado e proibido por seus pais.
A orientação desses pais tradicionais4, que também são seus responsáveis perante a lei e de quem elas dependem e devem respeitar, determina a
proibição unânime de terem uma sexualidade ativa. Essa é a segunda orientação que desorienta. Para aumentar a sua confusão, as adolescentes são
concomitantemente pressionadas por seus amigos e/ou namorados para
exercerem, sim, sua sexualidade, mesmo que transgridam os regulamentos
familiares. Essas pressões sociais externas compõem o que consideramos
a terceira orientação que desorienta. Sousa (2002) concluiu que esse múltiplo discurso, com diferentes sugestões e influências, acaba confundindo e
comprometendo a naturalidade das adolescentes quanto ao usufruto de sua
sexualidade.
A pesquisa inicial e esse trabalho pretendem oferecer uma contribuição
para esclarecer aos orientadores sexuais, pois, suas conclusões objetivam
desmistificar o já repetido discurso: a falta de informações sobre métodos de
contracepção e desconhecimento sobre o funcionamento do corpo feminino é
a causa das dificuldades da sexualidade e conseqüente aumento do índice de
4 Os pais entrevistados por Sousa (2002) são os das adolescentes atendidas pelo SEAD e que são, em sua maioria,
de classe média baixa, com reduzido índice de escolaridade e nível de informação intelectual.
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gravidez e contaminação de doenças sexualmente transmissíveis na adolescência feminina. Como essa temática é polêmica, a orientadora da pesquisa
resolveu continuá-la, agora como autora dessas reflexões, após a defesa da
dissertação de sua orientanda. O que facilitou essa continuidade foi o fato
de ter acesso às seis entrevistadas de classe média alta, as mesmas que não
são atendidas pelo SEAD.
A idéia da continuação dessa pesquisa surgiu quando T. S. – hoje com 16
anos – e com quem uma das autoras tem uma relação de parentesco, declarou, para o nosso espanto, as suas preocupações em esconder de amigos e
colegas distantes, a orientação dos seus pais voltada para os novos valores
da sexualidade na adolescência, especialmente no tocante à sua permissão
de receber seu namorado em seu quarto: Não podemos ficar dizendo para
todo mundo o que nós pensamos e fazemos, pois senão vão pensar que somos
quase prostitutas! (T. S., 16 anos). Foi aí que percebemos que a mensagem
de liberação da sexualidade, embora seja atraente e supostamente coerente,
pode ser desorientadora se for transmitida num contexto cultural mesclado de
tabus e repressões moralistas da sexualidade das moças dessa faixa etária.
Esse comentário surgiu logo depois das entrevistas de Sousa (2002), e
motivou-nos a continuar a pesquisa, pois, percebemos que, por trás dessa
temática há inúmeras questões culturais que determinam o comportamento
dessas adolescentes. Segundo T. S. e suas amigas, poucos são os pais que
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entendem e aceitam os novos valores relacionados à sexualidade das moças.
É que a mentalidade dessas famílias possibilita que se classifiquem aquelas que usufruem sua sexualidade como promíscuas, “galinhas”, quase como
prostitutas, conforme suas próprias palavras.
Resolvemos então solicitar que a escola pública freqüentada por T. S.,
nessa época, oferecesse a disciplina Orientação Sexual, já que sabíamos que
ela é parte dos Parâmetros Curriculares Nacionais – PCNs – do Ensino Fundamental. Mas, T. S. e suas amigas foram unânimes em pedir insistentemente para que desistíssemos dessa idéia, pois o resultado seria segundo suas
próprias palavras, desastroso:
No mínimo pensariam que a senhora é promíscua e eu seria tratada do
mesmo jeito e depois, ninguém mais teria respeito comigo. Quando tem
uma aluna grávida que não é casada na escola, todo mundo pensa isso
dela, é muita humilhação! Os meninos tiram a maior onda da cara das meninas que eles acham suspeitas de não serem sérias. Eu não teria coragem
de pisar na escola se a senhora insistisse nessa loucura (T.S., 16 anos).
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Essa declaração sincera evidencia o modelo cultural retrógrado que permeia
o comportamento das adolescentes. Foi aí que percebemos que o discurso su-
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postamente esclarecido5 de orientação sexual para as adolescentes, apoiado
em valores da liberação do sexo com afeto, segurança e responsabilidade para
com os sentimentos do parceiro/a, compõem a quarta orientação que desorienta.
É importante destacar cada um dos discursos e respectivos valores que desorientam as adolescentes porque, a partir deles resolvemos pesquisar as razões
sócio-culturais das confusões mentais das adolescentes, no que se relaciona ao
tema da sexualidade feminina. Nosso intuito é o de colaborar para a reconstrução de uma sólida educação sexual para as adolescentes, de modo que essa
prática seja menos fragmentada e mais saudável.
A primeira orientação que desorienta, aquela que delega a decisão de
perda da virgindade e usufruto da sexualidade para as adolescentes, aparentemente não estaria errada, pelo contrário. O trabalho do SEAD, que sugere
essa orientação, é extremamente cuidadoso, ético e responsável, e, parte do
princípio de que não adianta reprimir ou negar o direito das adolescentes
ao exercício da sua sexualidade. Segundo as profissionais que compõem o
programa, as adolescentes acabam sempre transgredindo os ditames familiares e, se é assim, pelo menos elas têm acesso às informações sobre como
funciona o seu corpo e seu aparelho reprodutor, métodos de contracepção,
recebem conselhos e terapias. Dessa forma, o SEAD atua no sentido de evitar o aumento da gravidez na adolescência, das DSTs, e as orienta para que
5 Essa orientação é apoiada em autores como Reich (1972), Machado (1992) e Suplicy, 1994, entre outros.
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elas se posicionem com mais informação em relação ao seu mundo e seus
problemas pessoais e afetivos.
O problema é de seus pais, que usam o discurso contrário ao das adolescentes. A proibição da sexualidade na adolescência é a segunda orientação
que desorienta. Explicando melhor, os familiares que compartilham os valores tradicionais e repressivos quanto ao exercício da sexualidade das adolescentes, negam-lhes esses direitos, o que causa confusões nas idéias e valores das jovens. O ideal seria se o SEAD pudesse orientar simultaneamente
os pais dessas adolescentes para reprogramar suas mentalidades retrógradas
e omissas. Mas, esse programa tem limitações de recursos humanos e materiais, que dificultam o desenvolvimento desse trabalho de orientação familiar, que é tão essencial quanto o de esclarecimento das jovens atendidas
por ele6. Essa lacuna ficou mais visível quando se constatou, pela pesquisa,
que duas das adolescentes atendidas pelo programa engravidaram durante
o período em que freqüentavam as reuniões do programa, apesar de todas
as orientações do SEAD (Sousa, 2002).
É aí que se pode perceber o quanto que as referidas informações sobre
sexualidade para as jovens adolescentes não ajudam a diminuir o índice de
gravidez precoce, nem de doenças sexualmente transmissíveis. No momen6 De acordo com as políticas de saúde e dirigentes de hospitais públicos, a orientação sexual de adolescentes não
é prioridade nos hospitais públicos, por isso há dificuldades de acesso a recursos para o funcionamento desse programa (SOUSA, 2002).
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to da decisão sobre o exercício da sexualidade, as moças ficam sem saber se
acatam as orientações racionais e técnicas sobre contracepção e preservação
transmitidas pelo SEAD, ou, se obedecem às determinações repressivas das
famílias, a quem são ligadas por relações de dependência jurídica, financeira, afetiva e de obediência. Para piorar esse quadro de idéias contraditórias,
as adolescentes ainda precisam decidir se aceitam ou não, a terceira orientação que desorienta, composta pelas pressões de amigos e namorados, que
muitas vezes insistem em ações irresponsáveis baseadas no exercício da sexualidade banalizada e, o que é pior, sem segurança.
Em nossa pesquisa bibliográfica descobrimos dois textos esclarecedores
sobre esse tema, que são resultantes de pesquisas empíricas: Fraga (2000)
e Silva (2003). Suas conclusões são quase idênticas: a orientação sexual na
escola e na família não existe e não é aceita por causa dos valores morais conservadores, que destacam a repressão da sexualidade feminina como a única forma de educação sexual decente e moralizada para essas instituições.
Nas entrelinhas está o grande temor de que esta educação possa estimular
a prática sexual, ao invés de controlá-la e adiá-la para momentos de maior
maturidade destas jovens.
Sobre a moral conservadora vale tecermos aqui algumas sobre os valores
anteriores à revolução do feminismo e da pílula anticoncepcional, ou seja,
dos anos cinqüenta e sessenta do século XX e que, em alguns lugares do
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Brasil, como no nordeste, foi vigente até cerca de duas décadas atrás. Alguns
grupos religiosos ainda defendem tais valores, vale ressaltar.
No entanto, mesmo que tais modelos sejam considerados como ultrapassados eles ainda estão muito vivos nas mentalidades dos membros
mais velhos de algumas famílias patriarcais e também, de alguma forma,
estão presentes nas cabeças dos homens, inclusive os mais jovens. Há
uma grande confusão e desorientação nessas mentes porque, ao mesmo
tempo em que eles se apresentam como modernos e têm comportamentos ditos como libertários e distantes destes valores, também utilizam
estes mesmos modelos e adjetivos para classificarem as jovens que se
comportam de modo “libertário” e têm sexualidade ativa e variada. Essas
contradições valorativas estão no pano de fundo do cenário comportamental e sexual, então, se as adolescentes do sexo feminino se esquecerem ou desconsiderarem as conseqüências das irresponsabilidades das
práticas sexuais freqüentes e casuais podem ser tratadas como “imorais”.
A orientação e/ou educação sexual surgiu para que os educadores tentassem diminuir o efeito dessas contradições.
Segundo Suplicy (1999, p. 7-8, apud Silva, 2003, p. 307-308), a educação
sexual é informal e nos permite incorporar valores, símbolos, preconceitos e
ideologias. Já a orientação sexual é um processo formal que deve ser desenvolvido através de planejamento e deve ter objetivos que podem ir desde
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mostrar informações corretas acerca de assuntos relacionados sobre a sexualidade até o conhecimento de maneiras de obtenção de uma sexualidade
saudável e cheia de prazer. Suplicy (1999) reforça o papel da orientação sexual desempenhado pela escola, que deve ser voltado para a erradicação de
tabus e preconceitos. De acordo com Silva (2003) os professores da escola
onde foi feita a sua pesquisa sobre a orientação sexual, em João Pessoa/PB,
demonstraram “um certo” constrangimento para falarem sobre esse assunto e depois mencionaram suas vivências de repressão, tabus e moralismos
conservadores. Mais adiante ela completa:
Pelo que observei com algumas professoras dos terceiro e quarto ciclos do
ensino fundamental e com a coordenação pedagógica do turno matutino
da escola campo deste trabalho, o projeto de Orientação Sexual apresentado pelos Temas Transversais ainda não entrou em prática; as/os professoras/es pouco sabem a respeito e relataram a sua dificuldade em apresentar
tais conteúdos em suas mais distintas disciplinas (Grifos nossos).
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Fraga (2000, p. 149), em sua pesquisa de mestrado em Antropologia, feita numa escola de ensino fundamental, em Cachoeirinha, no interior do Rio
Grande do Sul, afirma:
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...dentro da estrutura mais formal da escola prevalece, de maneira geral,
uma espécie de lei do silêncio sobre as questões relativas à sexualidade.
Acredita-se que essa ausência da fala possa funcionar como um ‘preservativo’ que impeça o ‘contágio’ das condutas sexuais moralmente aceitas pelas
condutas rejeitadas.
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Segundo esse último autor, que invoca Foucault (1997) para lhe dar apoio,
é preciso fazer uma leitura sobre as diferentes maneiras de não dizer, o “lavar
as mãos”, ou seja, os silêncios são partes das estratégias de entrelinhas que
sustentam os discursos. A omissão e silêncio sobre a questão da sexualidade, no nosso entender, se juntam com a repressão sexual, o que diminui a
força simbólica dos movimentos femininos emancipacionistas, e, até certo
ponto, da pílula e outros métodos anticoncepcionais. A cultura patriarcal
está viva e forte, principalmente no que diz respeito às classificações morais
depreciativas das adolescentes que usufruem a sua sexualidade, em diversos
espaços da sociedade brasileira: nas famílias, nas escolas, nos grupos religiosos, entre os próprios grupos de adolescentes, etc .
Por causa desses valores culturais que ainda são arraigados na sociedade,
consideramos que o deixar a decisão da manutenção ou não da virgindade
nas mãos das adolescentes é uma falsa alternativa. Essa é uma orientação
inócua porque elas devem respeito, obediência aos seus pais e essa postura
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é prevista juridicamente pelo Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA -,
para o caso de moças que têm menos de dezoito anos. Se a questão é evitar os desastres da desorientação e repressão sexual, deve-se então buscar
meios de reeducar os pais para poderem ser melhores educadores. A pesquisa
de Sousa (2002) mostrou que os problemas não são conseqüência da falta
de informação das adolescentes, e sim, das lacunas da formação, inclusive e
principalmente a dos seus pais e familiares.
Quando o SEAD usa a estratégia de “delegar” a decisão de usufruto da
sexualidade para as adolescentes, as profissionais deixam uma mensagem
subliminar muito positiva: o exercício da sexualidade é bom e prazeroso,
mas requer responsabilidade e cuidados, e as conseqüências da falta de zelo
podem ser desastrosas e até fatais. Essas profissionais cuidadosamente quebram o silêncio e a repressão dos familiares e das escolas e, com isso, oferecem mais orientação do que as comunidades que envolvem as adolescentes.
Mas, para que essa orientação deixe de ser desorientadora, é preciso alcançar
os pais e as instituições educacionais para que esse discurso seja mais eficaz.
Em outras palavras, é necessário que se reflita sobre o contexto sociocultural e familiar das adolescentes. É aqui que consideramos importante abrir a
nossa análise para o contexto mais amplo dos problemas da adolescência,
especialmente a do sexo feminino.
Daqui por diante aprofundaremos na análise da quarta orientação que
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desorienta. Alguns pais de jovens de classe média alta, que são os que transmitem a mensagem da liberação da sexualidade com afeto, responsabilidade
e segurança, também pecam pela omissão, pois, caem no problema oposto
ao da repressão sexual. Esse discurso liberal é muito atraente, mas, pode cair
no vazio e desorientar porque pode causar confusão nas mentes das adolescentes, quando o comparam com a repressão reinante no contexto sociocultural que lhes envolve. O problema maior é o fato de essa orientação ficar
isolada de outras que se relacionam com o comportamento das adolescentes. Esse jogo de “esconde-esconde” das adolescentes pode então acarretar
dificuldades para elas em seus ambientes de socialização.
Em outras palavras, essa orientação também deve ser acompanhada de
limites através de uma sólida formação moral, ética e de princípios valorativos firmes, porque senão as jovens podem receber esse discurso como se
fosse um sinal verde para fazerem o que quiserem, em todos os sentidos. Esse
problema é tão sério que foi alvo de uma reportagem sobre adolescentes
publicada pela Revista Veja7, que se refere ao problema dos pais que não
conseguem impor sua autoridade e limites aos seus filhos adolescentes e,
esses, por sua vez, tiranizam a vida familiar além de se arriscarem a se tornar
adultos problemáticos, drogados, com gravidez precoce ou no mínimo desajustados:
7 MARTHE, Marcelo. “A tirania adolescente”, São Paulo, Revista Veja de 18/02/04, p. 70-77.
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Do ponto de vista emocional, o adolescente é um vulcão. Ele ainda não
sabe o que quer ser, mas tem certeza dos modelos em que não gostaria
de se espelhar: os adultos que o circundam, em especial os pais. Nas
diversas subfases que se sucedem na adolescência, ele alterna momentos
de agressividade, egocentrismo, insegurança e completa falta de senso de
perigo (MARTHE, M., Revista Veja de 18/02/2004, p. 73, grifos nossos).
Mesmo que não ocorram desastres, as conseqüências para o futuro podem
ser sérias. Jovens educados de maneira negligente correm o risco de se tornar adultos infelizes e desajustados. A falta de limites faz com que muitas
vezes essas pessoas se revelem inaptas para lidar com os reveses e frustrações naturais da vida. Elas têm dificuldades para se relacionar em ambientes marcados por hierarquias (como o trabalho) e, em muitos casos, não
conseguem nem mesmo se emancipar – tanto do ponto de vista emocional
quanto do financeiro (MARTHE, M., Revista Veja de 18/02/2004, p. 75, grifos
nossos).
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Essa mesma reportagem cita Tânia Zagury e Içami Tiba, que são respectivamente educadora e psicoterapeuta e que têm vários livros publicados
sobre a necessidade dos pais reassumirem sua autoridade sobre os adolescentes. Mas, para que esse artigo não caia numa fala “ranzinza”, cabe-nos
acrescentar algumas reflexões sobre desejo, desejos e consciência para se
posicionar no mundo, com a ajuda de Kehl (1995) e Manzini-Covre (1996b).
Primeiramente, é essencial que se saiba que todas as pessoas, os sujeitos,
são seres desejantes, ou melhor, todos têm um narcisismo que resulta da
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busca da plenitude original à qual Freud rotulou de presença da ausência ou
falta. Isto significa que, quando criança todo sujeito tem com sua mãe uma
relação corporal de plenitude, que é o seu paraíso auto-bastante.
Segundo Kehl (1995), o sujeito, quando criança, vai descobrir que não é
tudo para a mãe, pois, há um terceiro elemento, o pai, com quem disputa
a mãe, o que acarreta a perda do seu paraíso, do seu eu ideal, ou seja, do
seu narcisismo auto-bastante. Por isso, passará a vida tentando recompor a
imagem de plenitude que, na sua infância era a sua imagem real do paraíso.
A busca dessa auto-imagem se transforma num narcisismo secundário, ou
seja, uma procura interminável de realização que ocupe o lugar da busca
sublimada desse eu ideal. É sublimada porque o sujeito precisa recalcar esse
desejo do paraíso no inconsciente, já que a recomposição da plenitude original é impossível.
O narcisismo secundário relaciona-se com o ideal do eu, e se relaciona
com a realização dos projetos de vida, e/ou do desejo de objetos que a sociedade oferece ao sujeito. A realização dos ideais de cada pessoa também
tem a ver com a intersubjetividade, cujo desejo é o desejo do outro, da ação
coletiva. Também ainda depende da sublimação porque nunca se satisfaz,
mas realiza-se provisoriamente e propicia - pelo recalque acima referido -, a
troca do eu ideal singular para o ideal do eu coletivo. Aqui a sublimação conjuga certa realização do Desejo, do prazeroso com o valorizado. (HORNSTEIN,
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1989, apud MANZINI-COVRE, 1996b, p. 107). De acordo com esta autora, a
subjetividade tem como energia propulsora a libido, pois passa pela sexualidade, mas, inclui também o auto-desenvolvimento, emancipação e liberdade, em relação aos aspectos negativos do mundo social em que o sujeito
vive.
Em outras palavras, o desejo (no singular) pode despertar a ação transformadora do sujeito no seu contexto. Provoca a busca de solidariedades comunitárias que podem substituir os afetos e alegrias da infância do sujeito.
Mas também há o lado negativo e sombrio do eu, quando o ego do sujeito
é insaciável por dinheiro, interesses, destruição, enfim, poderes negativos. A
valoração social - a ética - pode então colocar limites nesses desequilíbrios.
A ética viabiliza a manutenção da pulsão de vida, permitindo “um certo”
equilíbrio entre os lados sombrio e luminoso do sujeito, entre o destruir e o
criar, ou, entre as formas de desejar. Enfim, no lugar dos desejos (no plural)
o ideal do eu tem então o desejo.
Explicando melhor, os desejos tanto podem se referir á busca de objetos, dinheiro ou interesses destrutivos ou se direcionarem aos projetos do
ideal do eu coletivo e consciente. A mídia e as indústrias produzem um sem
número de objetos consumíveis e efêmeros, cuja regra é a de ser descartável. É claro que o ato de consumir, em si mesmo, não tem nada de errado.
O problema é a troca dos valores sólidos, dos tesouros não-materiais, por
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esse prazer efêmero e desmedido. Quando o consumo se relaciona com a
construção de um estilo de vida é parte do ideal do eu; quando o consumo é
vazio e sem ética, o ser humano se destrói na descartabilidade. É necessário
então o equilíbrio entre o desejo insaciável e o desejo consciente, motivando
os jovens a buscarem suas próprias realizações através do seu engajamento
consciente e construtivo na sociedade que lhe envolve.
De acordo com esses autores, os desejos dos sujeitos dependem da maturidade para passar do prazeroso para o valorizado, onde o crescimento e
maturidade podem determinar a diferença entre os desejos – as vontades
destrutivas e irrefletidas - e O DESEJO que se transforma no IDEAL DO EU.
Aqui se refere ao desejo do afeto sincero apoiado na ética, que mantém a
consciência: o amor e o sentido ou projeto de vida. Nesse contexto de reflexão, a sexualidade das adolescentes só pode ser escolhida quando elas tiverem
superado, com a ajuda dos pais, a fase do querer insaciável e sem consciência.
Tudo isso só poderá ocorrer após toda a estruturação de sua vida através
dos seus estudos, desempenho de suas responsabilidades dentro e fora de
casa, e de demonstrar respeito e consideração por si e os que lhes cercam.
Nesse momento estarão prontas para desenvolverem relacionamentos amorosos, que incluem a sexualidade com segurança e afetividade, mesmo que
os parceiros não fiquem juntos “até que a morte os separe”. Os desejos e a
realização emocional e sexual são como que “sagrados”, não no sentido da
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velha moralidade hipócrita da ideologia cristã e sim por que o corpo do sentimento e do desejo é mais que a função mecânica-orgânica dos hormônios.
O orgasmo é mais que prazer, é o encontro de um no outro, um iluminando
o outro para construir uma identidade: a relação amorosa. A amorosidade
transforma os pares em parceiros que se unem na sua cumplicidade e respeito mútuo. A sexualidade é um espaço essencial porque celebra a vida e
também porque pode ser conjugada no presente e futuro.
Nesse momento conjuntural em que a sexualidade está sendo banalizada e mesclada de erotismo irresponsável, de um lado, e a repressão conservadora e desqualificação das jovens que não são virgens, por outro, é mais
fácil as adolescentes apreenderem apenas a primeira parte do discurso: o da
liberação sexual, pura e simplesmente. Os pais de classe média alta precisam
ser alertados sobre o problema que causam para seus filhos, principalmente
as filhas8, pela falta de limites firmes que se revela na estrutura de valores
culturais e comportamentais que desenvolvem na socialização das mesmas.
Por limites firmes se entende a exigência dos pais para que suas filhas respeitem a sua autoridade, vivenciem princípios valorativos sólidos e tenham
um comportamento adequado, o que inclui, obrigatoriamente, o desempenho escolar satisfatório, o cumprimento de tarefas domésticas, a manuten8 Sousa (2002) dedicou um capítulo inteiro à educação diferenciada para os rapazes e as moças, em nosso contexto paraibano e pessoense. Em resumo, as adolescentes são mais cobradas e discriminadas por suas atitudes
relacionadas à sexualidade, mas, não nos cabe aprofundar essa temática porque foge da alçada desse artigo.
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ção de seus quartos e pertences limpos e organizados, além de obedecerem
a horários, serem gentis, tenham cortesia e respeito pelas pessoas dentro e
fora de casa, etc.
Os limites firmes incluem o controle sobre os amigos e namorados, ou
seja, a vigilância atenta dos seus comportamentos e responsabilidades. Por
exemplo, se houver algum amigo/a que exerça influência suspeita ou negativa sobre suas filhas, os pais podem solicitar, polidamente, que essa pessoa
se afaste do convívio com elas. Não adianta reprimir ou liberar o exercício da
sexualidade das jovens se essas decisões não forem acompanhadas de uma
educação em que se mantenham limites comportamentais claros.
Sem esses pré-requisitos, a repressão gera comportamentos apoiados
no cinismo das adolescentes, enquanto que a liberação pode causar confusão, promiscuidade e insegurança nas moças. Para isso, elas devem zelar por
uma aparência cuidada e sem exposições exageradas, aprender a dizer aos
pais onde foram, com quem, explicar atrasos e terem o saudável hábito de
pedir permissão para o que quer que seja.
As liberações sexuais para as mulheres e adolescentes começaram a ser
difundidas nos anos setenta e oitenta, quando os ideólogos de esquerda pregavam discursos que valorizavam a liberdade e o diálogo na educação e se
apoiavam em autores como Marcuse, Sartre e outros, para defender essas
idéias. O lado positivo desses discursos se prende ao respeito ao educando
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em suas necessidades de expressão e espaço, que são necessários para o crescimento do ser humano. O lado problemático dessas falas foi constatado em
movimentos como o dos hippies, que faziam apologia às drogas, à irresponsabilidade quanto aos sentimentos e relacionamentos afetivos, à guisa de suas
críticas ao casamento burguês tradicional e ao mundo capitalista.
É necessário refletir sobre essas mensagens supostamente libertárias,
aproveitando-se delas nos aspectos de respeito ao outro, especialmente no
que se relacionam àquele aspecto da liberdade individual, que termina onde
começa a liberdade do outro ou dos outros que envolvem cada ser humano
no mundo. Não se pode esquecer que, quando a liberdade do outro é invadida, a conduta supostamente livre transforma-se em agressão.
O mundo funciona com regras e leis que vão além da estrutura cultural das pessoas, ou seja, os regulamentos comportamentais não dependem
apenas da escolha individual do ideário de cada vivente do universo, pois
senão tudo se transformaria num caos sem controle. Em outras palavras, a
liberdade e o diálogo também têm limites, que são necessários para preservar a organização social da vida em sociedade. E, como se diz no linguajar
popular, em caso de dúvida, é melhor errar pelo excesso de autoridade do
que pela falta de limites e de disciplina. As frustrações nunca fizeram mal aos
jovens, pelo contrário, eles se preparam com elas para enfrentar os revezes
da vida, como diz a citada reportagem da Revista Veja (2004). Já o excesso
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de liberdade pode acarretar em danos irreversíveis para os jovens.
Na questão da educação também são necessários a liberdade e o diálogo, desde que preservem a organização e controle da mini-sociedade que
são as famílias. A liberdade só pode ser oferecida, então, para as pessoas
que tem condições de escolher quais as alternativas que podem desejar,
pois, em caso de opções que resultem em riscos e danos de qualquer tipo,
a liberdade será destrutiva. As referidas condições de escolha referem-se à
maturidade dos educandos, que muitas vezes não conseguem compreender
a extensão dos riscos que correm com a tomada de determinadas decisões,
e é perigoso deixa-los aprender com a prática.
Segundo a já referida reportagem da Veja, os adolescentes, tanto do
sexo feminino quanto do masculino, passam por um verdadeiro turbilhão de
hormônios, que lhes causa mudanças físicas além de se tornarem, do ponto de vista emocional, um verdadeiro “vulcão”. Em síntese, eles não sabem
o que querem, o que querem ser, e se ressentem da mais completa falta de
senso de perigo (MARTHE, M.,2004, p. 73). No entanto, eles têm certeza dos
modelos em que não gostariam de se espelhar: os adultos que os rodeiam,
especialmente os pais.
As adolescentes também não têm maturidade para compreender que a
sexualidade exige responsabilidades que vão além do prazer imediato que
essa prática proporciona. É nesses momentos que os pais devem adiar a sua
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permissão para a sua prática e, em lugar dela, exigir o desempenho escolar
sem muitas explicações, já que elas não as compreenderiam.
Dentro dessa responsabilidade se inclui a questão dos sentimentos que
são acoplados a ela, que é o motor do sexo-vida, sexo-parceria, sexo-compromisso, que são de difícil compreensão para as jovens. O diálogo só é viável se há uma linguagem comum que permita a comunicação entre as pessoas que o praticam. Há valores e condutas que são inquestionáveis, por isso
são inegociáveis, e, nesses momentos, o verbo libertar é quase impossível de
ser conjugado, sob pena de correr riscos e danos que podem advir com a
sua transgressão. Nos comportamentos relacionados à sexualidade, mais do
que outros valores, o importante é o desejo e não os desejos.
A desorientação da liberação sexual aumenta porque o discurso comportamental à sua volta é o oposto, ou seja, baseado na repressão sexual, o que
deixa as jovens aturdidas. Isto pode ocorrer justamente num momento em
que elas não têm idade e maturidade para decidirem pela liberdade sexual. A
liberação, inclusive a da sexualidade, deve ser condicionada à compreensão
sobre o momento certo de maturidade, quando demonstrarem que tem responsabilidade para escolher o que é mais adequado e sem riscos para elas.
O contexto cultural do mundo das adolescentes, principalmente numa cidade nordestina ainda influenciada pelos valores tradicionais e repressores,
como João Pessoa/PB, não pode ser esquecido das orientações dos pais que
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se consideram esclarecidos, pois há o risco de choque de valores – de difícil
entendimento - dentro e fora das famílias. Essa contradição cultural precisa
ser evitada e depois, no devido tempo de maturidade, devidamente esclarecida para as filhas, uma vez que, se não houver cuidado e preservação, elas
poderão sofrer discriminações e depreciações que podem causar estragos e
confusões em sua auto-estima.
Essas questões exigem muita firmeza, e acompanhamento, que só serão
dispensados quando as adolescentes mostrarem que têm uma consciência
fortalecida quanto às conseqüências do descuido do sexo seguro e com afeto. Voltamos a repetir: antes de deixar a decisão sobre a sexualidade para as
adolescentes, como manda a primeira orientação que pode desorientar, é
necessário que elas tenham formação e maturidade para administrarem sua
própria vida afetiva e sexual.
Falta-lhes a coragem de dizer não, de ministrarem punições para comportamentos inadequados, e essas omissões são sempre acompanhadas de
um equivocado temor pelas seqüelas causadas pelas negativas, desde que
seus filhos eram bebês. Eles esqueceram que a arte de viver inclui o saber
conviver com frustrações e superá-las. Nas suas memórias, esses pais resgatam a luta que tiveram que empenhar para estudarem e se tornarem produtivos, independentes e realizados, porque venceram ou deixaram de lado as
frustrações.
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Com essa permissividade excessiva, muitos pais arriscam a desmotivar
os filhos e filhas para cultivarem a capacidade de luta e vontade de vencer
desafios, ou seja, impede-lhes de usufruírem da herança de sua história de
vida de disciplina, dedicação construtiva e digna no trabalho e nas suas famílias. Esquecem que a intolerância dos jovens com a negação dos desejos
desmedidos e sua falta de empenho para enfrentar dificuldades e frustrações ocorre, muitas vezes, porque são os próprios familiares que as tiram
do caminho. Com essa atitude eles lhes facultam o consumo de objetos e
comportamentos que não são necessários, pondo assim em risco e até empurrando, sem saber, os jovens para a busca dos falsos prazeres produzidos
pelo sexo irresponsável e outras fontes, como as drogas.
Nessa fragilidade os jovens se tornam presas fáceis de supostos amigos,
que os assediam para o comportamento irresponsável e transgressor. Aqui,
vale enfocar as questões sobre as amizades, com o apoio de Martín-Barbero
(2000). Esse autor, em seu texto sobre comunicação e identidade dos jovens,
alerta que a juventude de classe média urbana de hoje se desprendeu da
estrutura familiar patriarcal, e enfrenta as mudanças dos papéis paternos e
maternos. Nesse contexto moderno, os pais são quase sempre ausentes nas
novas famílias e as mães estão envolvidas com o mercado de trabalho, entre
outras questões. Esses fenômenos causam um desordenamento cultural que
é reforçado pela mídia eletrônica e informatizada, pois
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...ella rompe el orden de las secuencias que en forma de etapas/edades
organizaban el escalonado proceso del aprendizaje ligado a la lectura y las
jerarquias en que este se apoya. Y al deslocalizar los saberes, la televisión
desplaza las fronteras entre razón e imaginación, saber e información, trabajo y juego. Tradução da autora: ...ela (a mídia eletrônica e informatizada
– a TV e o computador) rompe a ordem das seqüências que, em forma de
etapas/idades, organizavam o escalonado processo de aprendizagem ligado à leitura e as hierarquias em que este se apóia. E, ao deslocar os saberes,
a televisão despreza as fronteiras entre razão e imaginação, saber e informação, trabalho e jogo. (MARTÍN-BARBERO, 2000, p. 4 de 11)9
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Esse mesmo autor mostra que os jovens estão diante da formação do
que ele denominou de comunidades hermenêuticas. Trata-se dos grupos que
compartilham idéias, valores estéticos, comportamentais, solidários, afetivos
e estilos de vida - modas, linguagens e práticas do cotidiano. As comunidades hermenêuticas respondem aos novos modos de perceber e narrar as
suas identidades e são mais desenraizadas das tradições e temporalidades,
com valores flexíveis e capazes de assimilar e conviver com universos culturais muito diversos. Mas, essa flexibilidade pode confundir mais que auxiliar
na orientação das jovens.
Martín-Barbero (2000) alerta que, com o surgimento das novas massas
9 Acessado por Internet em 23/04/01, no site http://www.oei.es/barbero.htm.
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de consumo, audiência de televisão e informática, as pessoas se tornam anônimas, pois, podem entrar em lojas e supermercados sem ter que se identificar. A forma de interação, principalmente dos jovens, supera as relações
familiares porque se dá através de repertórios estéticos, gostos e estilos de
vida que nem sempre encontram em seus grupos domésticos. Não é de se
estranhar que se agrupem em tribos cujo pertencimento se torna a fonte de
suas novas identidades, que são mais fortes do que as de seus familiares:
Enfrentando la masificada diseminación de sus anonimatos, y fuertemente
conectada a las redes de la cultura-mundo de la información y el audiovisual, la heterogeneidad de las tribus urbanas nos descubre la radicalidad de
las transformaciones que atraviesa el nosotros, la profunda reconfiguración
de la sociabilidad. Tradução da autora: Enfrentando a massificada disseminação de seus anonimatos, e fortemente conectada às redes da cultura-mundo da informação e do audiovisual, a heterogeneidade das tribos
urbanas nos descobre a radicalidade das transformações que nos atravessa,
a profunda reconfiguração da socialidade (MARTÍN-BARBERO, 2000, p. 6 de
11).
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Frente à nova estrutura de sociabilidade dos nossos jovens, cabe aos pais
criarem outra mentalidade familiar, para a qual se espera que esse trabalho
possa contribuir. Em outras palavras, Martín-Barbero (2000) alerta que as
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novas redes culturais produzidas pelas tecnologias da informática tornam
alguns valores mais voláteis e flexíveis, onde se aceita comportamentos e
idéias que antes eram tabus. Portanto, é necessário proceder à substituição
de valores retrógrados por novos valores e ética sólidos.
A flexibilidade de valores que antes eram consagrados pode, por exemplo, desvalorizar o desempenho nos estudos, que é trocado pelo gasto de
um grande espaço de tempo com jogos, brincadeiras e o exercício do sexo
irresponsável, entre outros. Neste sentido, é surpreendente o número de
jovens que abandonam os estudos, não querem trabalhar, usam drogas e
passam a vida em atividades de lazer irresponsável, como se pode ver nos
jornais, com as atividades de pegas de carro, por exemplo. Muitas vezes são
os próprios pais que os acobertam e os livram de punições e prisões.
É claro que alguns modelos culturais conservadores precisam ser repensados, mas, há valores que são eternos, como os que se referem ao respeito
à autoridade dos pais, a disciplina e responsabilidade nos estudos e no trabalho, a honestidade e, principalmente, o respeito às regras e leis, tanto as
de casa como as da sociedade. No nosso entender, a juventude é uma etapa
em que esses princípios valorativos precisam ser assimilados e cimentados
e não relativizados e flexibilizados, em nome do prazer e entretenimento
irresponsáveis. Há uma grande diferença entre a moralidade repressora do
contexto social e a liberalidade da sexualidade responsável, e essa distinção
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deve ser debatida em casa, onde os pais devem demarcar com clareza os
novos valores. Como são questões polêmicas as adolescentes precisam ser
alertadas para também se preservarem das mentalidades patriarcais, que
beiram a mediocridade.
Pode-se até mudar alguns valores comportamentais, especialmente aqueles que refletem os preconceitos e a hipocrisia moral dos valores conservadores10. Mas, uma vez acertados os novos princípios e regulamentos, de
comum acordo entre pais e filhas, sua observância deve ser exigida. É hora
dos familiares refletirem e questionarem sobre seus próprios valores para
escolher quais os que querem que seus filhos e filhas sigam, ou seja, os pais
precisam assumir seus papéis com responsabilidade, para não serem meros
repetidores dos ideários que receberam quando jovens.
Para finalizar, nunca é demais lembrar que uma das razões das desorientações é o fato de elas serem fragmentadas e transmitidas pelos diversos
grupos sociais com os quais as adolescentes convivem. O discurso racional e
técnico das orientações sexuais, bem como o da liberação sexual das jovens,
precisam ser harmonizados e acompanhados pela firmeza dos limites comportamentais, exigência de maturidade e de demonstração de responsabi10 Um exemplo de modelo de valores conservadores que pode ser questionado é o relativo ao patriarcalismo – o
popular machismo -, com a antiga e abjeta desvalorização das mulheres, o que não cabe mais no mundo em que
elas ganharam o mercado de trabalho e uma independência financeira do poder masculino. Mas, isso não implica
que as moças possam jogar todo esse ideário fora e começar a agir com a mesma irresponsabilidade dos homens
patriarcais, até porque, a inversão só reforça as tradições de valores equivocados (GIDDENS, 1993).
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lidade das adolescentes. A auto-afirmação e necessidade das adolescentes
de se incluírem em grupos através de comportamentos sexuais irresponsáveis devem ser então firmemente excluídas. Essa estrutura de valores das
orientações vale para qualquer assunto que afete as adolescentes, o que inclui, mas, não se reduz às questões da sexualidade. A grande valoração que
deve ser cultivada entre os jovens é então a do respeito que devem ter por
si mesmos e pelos outros.
Na mensagem final desse artigo oferecemos uma sugestão: quando os
pais esclarecidos e conscientes não conseguem que suas filhas aceitem mais
os seus limites, é hora de pedirem ajuda extra-familiar para a orientação de
si próprios e para as jovens. Ou seja, deve-se recorrer a terapeutas, conselheiros das escolas – as que dispõem de orientadores qualificados -, amigos,
autoridades judiciais e outras, para que suas mensagens e limites voltem a
ser respeitados. A conquista da consciência e harmonia de valores é o caminho da maturidade, liberdade, auto-estima e respeito das adolescentes por
si mesmas e pelas pessoas de seu convívio.
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Referências
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SUPLICY, Marta (Org.). Sexo se aprende na escola, São Paulo: Olho d´Água, 1999.
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GRAVIDEZ PRECOCE:
CAUSAS, FATORES E VALORES
NOS RELATOS DE ADOLESCENTES
Andressa Maria Ramos11
Maria Otilia Telles Storni12
1 Introdução
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O objeto de pesquisa desta monografia é a análise do fenômeno da
gravidez precoce das adolescentes de João Pessoa/PB. Este é um problema
social que vem atingindo principalmente as famílias de classe média baixa
desta cidade, cujas filhas estão engravidando com idades cada vez menores,
ou seja, hoje a gravidez precoce atinge a faixa dos nove aos dezessete anos
11 Andressa Ramos é bacharel em Ciências Sociais com habilitação em Sociologia cursada na Universidade Federal
da Paraíba. É a autora da monografia de TCC cujo texto foi adaptado pela sua orientadora para este artigo.
12 Maria Otilia Telles Storni é professora doutora em Ciências Sociais com habilitação em Antropologia pela Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo. Também é professora da Universidade Federal da Paraíba lotada no Departamento de Ciências Sociais, Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes. Foi a professora responsável pela orientação
da pesquisa feita para o Trabalho de Conclusão de Curso da primeira autora deste artigo
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destas meninas-moças. Essas jovens, além de não terem sua maturidade
orgânica para engravidarem, interrompem seus estudos e suas vidas, bem
como a dos seus filhos, se torna prejudicada por esta precocidade. Nossa
preocupação é a de desvendar as causas destas ocorrências, bem como, os
efeitos das mesmas não só para as mães-protagonistas como o restante das
suas famílias. Nosso ponto de partida é a seguinte questão: O QUE LEVA AS
ADOLESCENTES DE MENOS DE 18 ANOS A ENGRAVIDAR?
O objeto desta pesquisa está na resposta a pergunta problema acima
citada. Apresentamos então algumas reflexões e dados estatísticos: a gravidez precoce entre as adolescentes é um problema social grave e sobre este
fenômeno há alguns dados genéricos que são necessários para situar esta
questão. Na América Latina cerca de 2 milhões de meninas entre 15 e 19
anos dão à luz todos os anos, de acordo com Mello (2011), cujos dados foram publicados na Folha Universal (25 de setembro de 2011). Ainda segundo
esse jornal, cerca de 1,1 milhões de meninas engravidam todos os anos aqui
no Brasil, e as principais causas são: a falta de orientação dos pais e educadores e a falta de perspectivas de vida das jovens que se deixam engravidar.
Os dados nos mostram, segundo Mello (2011), que apesar dos números de
partos feitos em meninas entre 10 e 19 anos ter caído 20%, é preciso fazer
muito ainda aqui no país com relação a esta questão.
Segundo esta mesma fonte, a falta de diálogo entre pais e filhos é um
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dos principais problemas que acarretam na gravidez na adolescência, pois
os estudos mostram que no ambiente em que pais e jovens conversam sobre sexo a incidência da gravidez precoce é bem menor. Para muitas destas jovens, não há perspectiva de futuro, não há planos de vida. A Federação Brasileira de Ginecologia e Obstetrícia mostraram segundo Mello (2011)
que, apenas 30% das mães precoces freqüentam a escola com regularidade,
sendo que 57% delas abandonam os estudos para dar à luz e somente 27%
voltam a estudar depois de seis meses.
Segundo Fátima Morais, coordenadora do Setor de Saúde da Mulher da
SES – Secretaria Estadual de Saúde da Paraíba, de acordo com Alves (2011),
a mídia desempenha um papel fundamental no processo da sexualidade na
adolescência, pois, essas meninas são influenciadas para a descoberta da sexualidade precocemente. Está muito fácil o acesso, seja pela internet ou pela
TV, às informações a respeito do que é a vida sexual para essas adolescentes.
Fátima Morais acredita que isso também contribui para que os hormônios
sejam estimulados precocemente.
Ainda segundo Alves (2011), o psicólogo João Batista discorda da colocação anterior, achando que não se deve culpar a mídia por todos os males
a respeito desse assunto, pois, todos devem saber o que filtrar dela. No entanto, sabemos que a mesma tem uma grande responsabilidade na questão
do erotismo e da sexualidade precoce.
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Na opinião do psicólogo João Batista, citado por Alves (2011), a família é
a base da formação dos indivíduos. Portanto, a ausência dela transforma-se
num vilão que dá espaço à gravidez na adolescência. Mesmo que a família
não dialogue abertamente sobre sexualidade, é ela quem dá as primeiras
noções sobre o que é adequado ou não, por meios de gestos, expressões,
recomendações e principalmente proibições.
Existe um fator que deve ser ressaltado, que é o afastamento dos membros das famílias e a desestruturação familiar, quer seja pela separação dos
pais ou pela correria na vida deles para arcarem com a carga de trabalho
diária. A verdade é que os pais estão cada vez mais afastados de seus filhos.
Além dessa questão, há entre os adolescentes uma liberdade sem responsabilidades. Eles passam, muitas vezes, a não ter a quem dar satisfações de
sua rotina diária, vindo a procurar os pais ou responsáveis apenas quando o
problema da gravidez já foi instalado.
De acordo com a reportagem de Alves (2011), talvez essa situação fosse diferente se desde cedo os pais fossem presentes, conversassem com as
crianças e respondessem o que elas perguntam. É necessário respeitar as
suas curiosidades sem falsos moralismos, com visão realista e sem críticas
para criarem canais abertos de comunicação e compreensão.
Por outro lado, de acordo com o nosso entender, consideramos que essas atitudes devem ser acompanhadas de limites comportamentais que de-
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vem ser impostos pelo exercício da autoridade desses pais. A autoridade,
atenção e vigilância dos adolescentes, tanto do sexo masculino quanto do
feminino, podem facilitar as relações dos pais com os filhos adolescentes e
dos adolescentes com eles mesmos, fazendo com que os jovens se sintam
mais seguros, amados e respeitados. Vejamos se essas premissas e reflexões
são confirmadas ou não pelos dados empíricos desta pesquisa.
Esta pesquisa se justifica devido à gravidade do problema social da gravidez precoce das adolescentes na Paraíba. Consideramos importante abordar
esta temática porque este problema tem tido uma freqüência preocupante,
mas, nas escolas e nos meios de comunicação esta questão parece passar
despercebida. No entanto, o maior silêncio é o das políticas públicas estatais
que aparentemente ignoram esta ocorrência, bem como, os problemas gerais de educação e de drogas entre os jovens são invisibilizados.
Em vista deste contexto e das cortinas de silêncio sobre a gravidez precoce é importante questionar se a existência desse problema social se dá
apenas devido às irresponsabilidades das adolescentes, ou, se há outros fatores causais que contribuem para o aumento da gravidez precoce. Como
a idade das grávidas é cada vez menor é importante também perguntar se
elas têm maturidade física e emocional para desenvolverem a sua sexualidade e terem filhos.
Será que a queda dos antigos valores morais que separavam as moças de
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família das que tinham comportamentos sexuais permissivos contribui para
o crescimento do índice de gravidez precoce das adolescentes? Através desse questionamento é importante analisar as temáticas relacionadas com a
moral e sexualidade, bem como, verificar se essas mudanças de valores têm
trazido confusões e incertezas de significados entre os pais e responsáveis
por essas jovens. Enfim, a contribuição desta pesquisa está na verificação
dos obstáculos que estão atrapalhando as famílias para evitar que suas filhas
engravidem precocemente.
A contribuição deste trabalho também está no alerta que estamos apresentando aos setores envolvidos com a juventude, especialmente a feminina, que parece sofrer mais com o escanteio em que é colocado este problema social. Este silêncio e falta de orientação das famílias com relação aos
excessos comportamentais das adolescentes precisa ser quebrado para que
se possa enfrentar a questão com vistas à redução desta incidência. Este é
um problema para ser abordado tanto em nível familiar como também pelas
políticas públicas estatais e educacionais.
O objetivo geral desta pesquisa foi: Analisar histórias de gravidez precoce e seus desdobramentos relacionados com o contexto familiar de adolescentes de João Pessoa/PB.
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Antropoligia e Educação
Os objetivos específicos foram:
* Identificar as categorias teóricas relacionadas com a gravidez precoce
de jovens;
* Captar os relatos de fontes primárias – pesquisa de campo – e secundárias – documentais – de duas histórias recentes de gravidez precoce de
jovens de classe média baixa de João Pessoa/PB;
* Focalizar nesses dados as causas dessas ocorrências;
* Analisar os dados à luz de teorias socioantropológicas e elementos
jurídicos pertinentes à este fenômeno.
1.1 Metodologia
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Sujeitos da pesquisa
A pesquisa de campo foi feita através de coleta de dados documentais e
empíricos. Nesta última modalidade da pesquisa de campo foram selecionadas duas colaboradoras que foram localizadas entre as pessoas conhecidas
do nosso convívio familiar. Ambas são moradoras do bairro denominado
Mangabeira IV, que é habitado por famílias que moram em casas ou prédios
de apartamento de um ou no máximo dois quartos, cuja renda é considerada baixa, razão pela qual não podem residir em prédios com mais cômodos.
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Suas famílias são de pais trabalhadores em serviços de baixa remuneração que não exigem qualificação de escolaridade, ou seja, as mulheres se
dedicam aos serviços como faxineiras ou empregadas doméstica e os homens, em geral, trabalham na construção civil. Também foi feita uma entrevista com a Delegada da Delegacia de Atendimento da Mulher, a Drª Maria
da Conceição Casado da Silva, para ela apresentar o seu parecer técnico sobre a gravidez precoce. É importante ressaltar que esta última entrevistada
autorizou a apresentação do seu nome para esta monografia.
Natureza da pesquisa
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Esta foi uma pesquisa de natureza qualitativa e como tal responde a
questões muito particulares. Nas ciências sociais há uma preocupação com
o nível de realidade que não pode ser quantificado, trabalhando com o universo de significados, motivos, aspirações, crenças, valores e atitudes, o que
corresponde a um espaço mais profundo das relações, dos processos e dos
fenômenos que não podem ser reduzidos à operacionalização de variáveis
(Gi, 2002). Bogdan e Biklen (1994, p. 134) enfatizaram que “a pesquisa qualitativa tem o ambiente natural como sua fonte direta de dados e o pesquisador como seu principal instrumento”.
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Instrumentos de pesquisa
Nesta pesquisa foram desenvolvidos os seguintes instrumentos: a pesquisa documental, a observação e a técnica da história de vida com ajuda
da entrevista semi-estruturada. A pesquisa documental, ao se referir a este
trabalho monográfico, tratou-se de fontes jornalísticas. Laville & Dionne
(1999, p. 168) afirmaram que “documentos não são arquivos ultrapassados,
mas veículos vivos de informação”. Foram utilizadas também as técnicas da
observação e sobre elas Laville & Dione (1999, p. 176, itálico dos autores)
afirmam:
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“A observação como técnica de pesquisa não é contemplação beata e passiva; não é também um simples olhar atento. É essencialmente um olhar ativo sustentado por uma questão e por uma hipótese cujo papel essencial – é
um leitmotiv desta obra (...) Não é, pois, surpreendente que a observação
tenha também um papel importante na construção dos saberes, no sentido
em que a expressão é entendida em ciências humanas. Mas para ser qualificada de científica, a observação deve respeitar certos critérios, satisfazer
certas exigências: não deve ser uma busca ocasional, mas ser posta a serviço de um objeto de pesquisa, questão ou hipótese, claramente explicitado;
esse serviço deve ser rigoroso em suas modalidades e submetido a críticas
nos planos da confiabilidade e da validade”.
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Antropoligia e Educação
Para colher os dados das adolescentes que foram grávidas precoces, foi
utilizado o método da história oral de vida. De acordo com autora portuguesa Ana Sofia António (2004, p. 98-99):
“As histórias de vida permitem reconhecer o sujeito não só enquanto profissional ou agente de uma determinada acção, mas, também, enquanto pessoa. Neste sentido, a informação humaniza a própria investigação. Ora, no
âmbito de uma investigação interessa, muitas vezes, conhecer os ‘mundos
vividos’ pelos sujeitos, assim como, perceber a articulação entre as acções
por eles exercidas e as suas vidas. (...)”. Esta técnica de investigação possibilita ao investigador verificar a importância atribuída pelos narradores aos
acontecimentos, abrindo, não raras vezes, a porta a novos significados; uma
vez que, contribui para o entendimento das representações e da interpretação dadas aos diferentes acontecimentos da vida quotidiana dos sujeitos.
As histórias de vidas têm, igualmente, interesse pelo acolhimento das cargas emocionais e dos sistemas de valor que facilitam fazer”.
Mais à frente, a mesma autora (2004, p. 100) complementa:
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“Uma história de vida pode assim traduzir-se numa narrativa aonde vários
factores se vão dando a conhecer, tais como as relações familiares, o desenvolvimento pessoal, o meio sócio e cultural no qual o indivíduo se insere, a
carreira profissional e o quotidiano pessoal”.
50
Antropoligia e Educação
Sobre as formas de colher os dados das histórias de vida António (2004,
p. 102) esclarece:
“Para recolher histórias de vida é comum realizarem-se entrevistas, pois
permitem que o investigador tenha acesso a informações com relativa profundidade. Claro está que a intensidade e o interesse que a informação
obtida através de uma entrevista estão directamente condicionados pela liberdade que o entrevistador der ao entrevistado. Contudo, o entrevistador
nunca pode contar com a total espontaneidade do narrador, já que, este
último, raramente se sente à vontade para mencionar exactamente o que
pretende”.
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Para a coleta das informações sobre as histórias de vida foi utilizada a
técnica da entrevista semi-estruturada e nelas foram efetuadas gravações
com a concordância das pessoas entrevistadas. Bogdan e Biklen (1994, p.
134) lembram que “a entrevista é utilizada para recolher dados descritivos
na linguagem do próprio sujeito, permitindo ao investigador desenvolver
intuitivamente uma idéia sobre a maneira como os sujeitos interpretam aspectos do mundo”. Eles também afirmam:
“Nas entrevistas semiestruturadas fica-se com a certeza de se obter dados comparáveis entre os vários sujeitos, embora se perca a oportunidade
de compreender como é que os próprios sujeitos estruturam o tópico em
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Antropoligia e Educação
questão. Se bem que esse tipo de debate possa animar a comunidade de
investigação, a nossa perspectiva é a de que não é preciso optar por um
dos partidos. A escolha recai num tipo particular de entrevista, baseada no
objectivo da investigação. Para além disso, podem-se utilizar diferentes tipos de entrevista, em diferentes fases do mesmo estudo. Por exemplo, no
início do projecto pode parecer importante utilizar a entrevista mais livre e
exploratória, pois nesse momento o objectivo é a compreensão geral das
perspectivas sobre o tópico. Após o trabalho de investigação, pode surgir a
necessidade de estruturar mais as entrevistas de modo a obter dados comparáveis num tipo de amostragem mais alargada” (BOGDAN; BIKLEN, 1994:
135-136).
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É importante notificar que a entrevista semi-estruturada é feita com um
roteiro flexível, ou seja, pode ser modificado no momento das entrevistas
para melhorar a clareza das perguntas, o que de fato ocorreu, como se pode
ver na descrição da pesquisa.
Como já foi dito antes, as entrevistas visaram a história recente da gravidez precoce das participantes desta pesquisa de campo. Em relação à primeira colaboradora, houve certa resistência de inicio para conseguirmos marcar
a entrevista, talvez pelo medo que a adolescente tinha tido de sua mãe vir
a saber do conteúdo da nossa conversa. Este detalhe demonstrou o teor
do relacionamento dessas duas personagens. Quando então conseguimos
marcar a entrevista, que foi concedida na sua casa, ela ficou inicialmente
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Antropoligia e Educação
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um pouco intimidada com a nossa chegada e principalmente com o fato de
usarmos um gravador para a entrevista. Esta conversa gravada transcorreu
na sua residência e neste momento não havia mais ninguém em sua casa.
Começamos a entrevista com uma afirmação categórica de que o conteúdo da entrevista seria resguardado do conhecimento da sua mãe, e para
a monografia o seu nome seria preservado pela ética da pesquisadora. Ao
explicarmos que aquele instrumento de gravação facilitaria o nosso trabalho
e seria inclusive melhor para que não houvesse interrupções na hora em que
teríamos que parar para escrever, ela então aceitou a entrevista e o gravador
com mais tranqüilidade. Seu filho estava com a avó que saiu de casa com a
criança para viabilizar a entrevista sem interrupções.
A segunda entrevista transcorreu de maneira bastante direta e com respostas curtas. Não havia ninguém na residência da segunda entrevistada;
seu filho estava na escola e a mãe estava trabalhando. Ambas as entrevistas
duraram cerca de trinta minutos aproximadamente e consideramos que as
duas entrevistadas se mostraram receptivas e dispostas a colaborarem com
a pesquisadora.
2 Fundamentação teórica
Neste capítulo pretendeu-se buscar os elementos teóricos do objeto de
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Antropoligia e Educação
estudo desta pesquisa, que é a gravidez precoce de adolescentes paraibanas. Para iniciar conceituamos a adolescência de modo geral. O conceito de
adolescência começou a ser enunciado nos moldes atuais através da cultura
européia, especialmente a alemã. De acordo com Osório (1989, p. 101):
A adolescência é uma etapa evolutiva peculiar ao ser humano. Nela culmina todo o processo maturativo biopsicossocial do Indivíduo. Por isto, não
podemos compreender a adolescência estudando separadamente os aspectos biológicos, psicológicos, sociais ou culturais. Eles são indissociáveis
e é justamente o conjunto de suas características que confere unidade ao
fenômeno adolescência.
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Nesta fase há inúmeras problemáticas entre as jovens, e, dentre elas destacamos a sexualidade. Este é um tema polêmico carregado de mitos e tabus, tanto que nas últimas décadas tem se tornando o centro das discussões
sociais, científicas e nos meios educacionais. Isso ocorre em grande parte
pela influência da mídia através de programas, novelas, filmes, etc., que nem
sempre trata de forma clara esse assunto. De qualquer modo, é uma fase
configurada por turbulências, conflitos e mudanças físicas e hormonais.
Nessa perspectiva, Aristóteles considerou os adolescentes como: Apaixonados, irascíveis, capazes de serem arrebatados por seus impulsos, (ainda
que tenham) altas aspirações (...) se o jovem comete uma falta é sempre no
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lado do excesso e do exagero, uma vez que eles levam todas as coisas longe
demais (KIELL apud GUNTHER, 1964, p. 18-19).
Segundo Souza (2002), nas sociedades contemporâneas e complexas
não é tão simples delinear com precisão essa transição da infância para a
adolescência, uma vez que os ritos não existem, mas a passagem permanece. Ela acontecerá com maior ou menor dificuldade, pois, os conflitos
existem, mas poderiam superar o turbilhão de emoções e transformações
se encontrassem um apoio social organizado.
A adolescência, por incluir um processo de maturação sexual, também
envolve perdas e a criança perde seu mundo infantil e as ligações estreitas
que tinha com seus pais. No âmbito familiar ocorre esse processo de libertação do mundo infantil, que se dá com certa ambigüidade onde ao mesmo
tempo pais e filhos querem e temem as responsabilidades e riscos dessa
nova etapa da vida. Takiuti, (1997, p. 229) afirma: “Uma das funções dos ritos
de passagem nas sociedades tradicionais é representar essa morte simbólica
configurada pela perda dos pais infantis e do mundo infantil (...)”.
Souza (2002) lembra que nessa fase os adolescentes estão em meio a reflexões e questionamentos, buscando aceitar e entender as mudanças físicas,
como também definir sua nova identidade social que inclui a sexual. Nessa
busca de afirmação para encontrar seu verdadeiro “eu”, surge a necessidade
de procurar novos valores, padrões de comportamento e novas figuras de
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Antropoligia e Educação
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identificação fora do âmbito familiar. Eles tentam romper com a relação de
dependência afetiva com relação aos pais e familiares, pois eles, que até então eram tidos como idealizados, passam a ser criticados e contestados.
É justamente nesse momento quase sempre conturbado que vem a
tona a sexualidade. O governo, a sociedade e a família geralmente não estão preparadas para lidarem com essa temática, pelo fato de ainda estarem
presos na contradição do proibido e do desejado. A sexualidade, nesse
sentido, passa a ser apreendida de forma distorcida e muitas vezes é exercida de forma impulsiva e insegura, até pela imaturidade dos jovens. Ainda de acordo com Takiuti (1997), a inquietação em torno da adolescência
atravessa séculos, apesar da transição criança-adulto acontecer de modo
diferente, de acordo com cada cultura. Mas, em todas elas o segmento
adolescente sempre significou um grupo mais vulnerável aos problemas
da sociedade e do meio a que pertence.
O Estatuto da Criança e Adolescente – ECA – considera adolescente a
pessoa entre doze e dezoito anos de idade (Lei Nº 8.069, de 13 de julho
de 1990). No entanto, a OMS – Organização Mundial de Saúde –, define a
adolescência como a fase do jovem que tem entre doze e dezenove anos;
os profissionais da área social fazem referências a questões culturais, apesar
das divergências quanto aos limites da idade para essa definição. Na verdade, é uma fase de desenvolvimento biopsicossocial (SOUZA, 2002).
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De acordo com esta última autora, as/os adolescentes, ao vivenciarem a
sexualidade, sentem necessidade e curiosidade de buscarem prazer, apesar
de a sociedade regulamentar e limitar esse processo. As jovens adolescentes
se vêem diante de uma estimulação virtual contínua, inclusive através dos
meios de comunicação, por um lado, e por outro, ao tentarem exercitar a
sexualidade encontram situações confusas, ao mesmo tempo em que essas
vivências são sempre julgadas como perigosas. A suposta permissividade
sexual apregoada pelos jovens as deixa vulneráveis, pois, podem cair no
comportamento de risco, com a possibilidade de contraírem gravidez, aborto e doenças sexualmente transmissíveis- DST`s -, entre outros.
O adolescente, ao vivenciar a sexualidade, sente necessidades de ir à busca
de prazer, apesar da sociedade regulamentar e limitar esse processo. As jovens
adolescentes se vêem diante de uma estimulação virtual contínua, inclusive através dos meios de comunicação, por um lado, e por outro, ao tentarem exercitar
a sexualidade não encontram uma aceitação no seu universo sóciocultural real.
Carelli (2002) afirma que diante de todos esses riscos que rondam a vida
sexual e afetiva dos adolescentes contemporâneos, diversas pesquisas vêm
sendo feitas em torno dessa temática tão polêmica, cheia de tabus e preconceitos. Dentre elas destacamos a pesquisa13 feita pela UNESCO em parceria
13 Pesquisa divulgada IN: CARELLI, Gabriela - O sexo começa cedo e com ousadia -, Revista Veja, São Paulo, 13/02/02,
p. 80.
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com o Ministério da Saúde, que entrevistou 16000 (dezesseis mil) jovens estudantes de catorze capitais brasileiras. Uma parte investigou como eles se
defendem da ameaça da AIDS; uma segunda parte enfocou aspectos comportamentais, não somente os ligados diretamente a AIDS e sim com o que
se passa na mente desses adolescentes, nessa etapa de transição do fim da
infância quando os hormônios estão descontrolados.
Segundo os dados coletados pela UNESCO, da mesma fonte, que se aprofundou entre jovens de 11 a 24 anos, há uma tendência para a iniciação sexual precoce, com namoros breves e intensos; essas foram as marcas desses
adolescentes nos anos 90, e que se mantém na primeira década do século
XXI, de acordo com o nosso entender. De acordo com essa pesquisa a “primeira vez” das meninas acontece aos 15 anos e dos meninos aos 14 nesta
década. Pelas nossas observações, no início do século XXI esta idade da iniciação sexual na Paraíba pode ser menor, mas, não dispomos de dados para
comprovar esta percepção.
Um levantamento feito há quatro anos pelo Ministério da Saúde mostra
que a iniciação sexual do adolescente masculino ocorre entre 16 e 19 anos, o
que vem mostrar uma mudança significativa e comprovar que está havendo
uma revolução sexual dentro da revolução sexual. Diz a psiquiatra Carmita
Abda, coordenadora do Projeto Sexualidade do Hospital das Clínicas de São
Paulo: “Os jovens agora estão fazendo sexo cada vez mais cedo e de for-
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ma bem mais despreocupada [e insegura] que antes” (ABDA, apud CARELLI,
2002, p. 80).
Segundo esta última fonte, apesar de os jovens se lançarem mais cedo aos
vôos da sexualidade, ao mesmo tempo eles se encontram confusos diante
da complexidade dessa iniciação, por estarem vivenciando uma fase turbulenta permeada de medos, culpas e desejos. Um dado importante apontado
na referida pesquisa é o relacionamento familiar onde os pais estão mais
abertos ao diálogo, o que não garante que aconteça de forma tranqüila e
sem tensões. Algumas famílias têm pais que são conscientes e tentam proteger os filhos de uma possível gravidez e de doenças, permitindo que os
mesmos tenham uma vida sexual saudável – ou seja, com responsabilidade
e segurança - dentro de suas próprias casas. Porém as estatísticas revelam
que essa batalha está longe de ser conquistada, ou seja, nem todos os pais
são compreensivos, protetores e responsáveis.
Segundo essa mesma pesquisa, essa realidade é constatada através do
número de jovens que contraíram o vírus da AIDS, índice esse que se mantém estável há uma década: 2000 (dois mil) casos anuais. Já em relação à
gravidez a situação vem se agravando. De acordo com um levantamento da
Universidade Federal de São Paulo realizado em todas as regiões do país,
revelou-se que nasce um milhão de bebês por ano de mães solteiras entre
15 e 19 anos, com um agravante: de cada 100 (cem) adolescentes que en-
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gravidam sem planejar, 25 já tem pelo menos um filho.
A referida pesquisa indica algumas pistas para esclarecer esse fenômeno.
Uma delas é que os jovens sabem como e porque usar a camisinha, pois, essa
geração é informada; e eles o fazem com disciplina com parceiros que conheceram há pouco tempo. Ainda segundo a pesquisa, as jovens que informaram
usar camisinha chegam a 90%, mas há um grande declínio quando o relacionamento se consolida, e apenas dois em dez, continuam a usar o preservativo
com a mesma freqüência de antes. Esses dados evidenciam que a gravidez
precoce pode ser resultante desses padrões de comportamento, mas, há outros que ainda não conhecemos. Faltam mais pesquisas quantitativas sobre
esta complexa temática, daí o nosso interesse de desenvolver este estudo.
A liberdade recebida pelos jovens leva à banalização de assuntos como o
sexo, por exemplo. Essa liberação sexual, acompanhada de falta de limites e
de cobrança de responsabilidades são motivos que favorecem a incidência
de gravidez na adolescência. Na verdade o que existe é uma falta de firmeza e autoridade dos pais para saberem com quem os filhos andam, impor
limites e perguntar sobre sua vida fora de casa, visto que a educação sexual
é, prioritariamente, uma competência da família, pois é peça chave na formação da identidade de gênero e no desempenho dos papeis sexuais dos
seus filhos. De acordo com Louro (2008), as identidades sexuais do sujeito
são resultantes das formas como vivem a sua sexualidade.
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Segundo esta autora, as pessoas deveriam estar preparadas para constituir família, principalmente, para ter filhos, pois, a relevância no contexto
sócio-econômico, político e psicológico é tal que o descumprimento da tarefa de educador acarreta um desequilíbrio grande. Quanto mais estiverem
sem a devida atenção e vigilância estiverem estes jovens, maiores as chances
de ocorrerem, crimes, miséria, problemas com drogas, prostituição, gravidez
precoce e outros. O abandono familiar pode ser caracterizado não pela falta
material e sim de acompanhamento da vida desses jovens pelos pais.
De acordo com Luz e Lopes (2008) alguns pais e/ou responsáveis ainda não estão cientes de que o poder familiar é um exercício de cidadania.
É mais um dever que um poder. Melhor dizendo, os genitores têm o papel
da total responsabilidade com os filhos, pois o sucesso ou fracasso social
deles depende das orientações recebidas, onde o bem e o mal são dois pólos que se repelem e se atraem concomitantemente, A ausência dos pais na
educação desses jovens e principalmente na vida das meninas pode trazer
grandes conseqüências, como o envolvimento no mundo da prostituição e
a gravidez precoce.
Oliveira (2002) em seu trabalho sobre a prostituição em Patos-PB nos fala
que a responsabilidade dos pais é o fator essencial para coibir a prostituição
das adolescentes. Portanto, não cabe somente à justiça solucionar o problema da prostituição infanto-juvenil, pois o Ministério Público só tem poderes
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Antropoligia e Educação
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para punir os aliciadores e os que lucram com essa atividade criminosa. Os
pais das menores, é que são os principais responsáveis por essa problemática, e os únicos que têm poderes para impedir que suas filhas se deixem
envolver com essas práticas.
Essas adolescentes de classes baixas sofrem de vários problemas e abandonos. Além disso, elas vivem uma grande mistura de valores morais e comportamentais, quando ao mesmo tempo tem que demonstrar um comportamento moral, para não ficarem “mal vistas” pela sociedade. Segundo Oliveira
(2002), em Patos as jovens de famílias de poucos recursos querem imitar as
meninas de classe social alta, e para isso aspiram ter dinheiro e renda, o que
é conseguido pela prostituição, para comprarem os objetos do seu desejo.
Essa é uma questão de formação educacional de moral e de valores que os
pais necessitam assumir com suas filhas.
O mais importante a ser feito, segundo Souza (2002), em sua dissertação
que fala de “sexualidade na adolescência”, é uma mudança por parte dos
pais em relação à maneira como eles encaram a educação sexual e, com isso,
trocar os tabus por novas conversas com seus filhos. Nesse texto de Souza
(2002), foram analisados alguns dos problemas da sexualidade na adolescência principalmente aqueles que reprimem ou preferem “não perceber”
a descoberta da sexualidade pelos adolescentes devido aos valores morais
conservadores. O que ocorre, de acordo com esta autora, é que os pais não
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informam nem formam as suas filhas sobre a questão da sexualidade, e, ao
mesmo tempo em que são proibidas de terem relações sexuais, também não
têm outros limites comportamentais para que elas evitem os envolvimentos
deste nível com os namorados.
A pesquisa de Souza (2002) foi mais especificamente sobre as adolescentes do sexo feminino em João Pessoa, principalmente aquelas envolvidas
no PROAMA – Programa de Atenção Multidisciplinar ao Adolescente – do
Hospital Universitário da Universidade Federal da Paraíba, Campus de João
Pessoa/PB. Neste estudo o que de fato foi constatado é que na verdade tem
que ser avaliada a falta de sintonia que existe entre as orientações do PROAMA, os tabus e valores morais da família e o que de fato ocorre em relação
ao comportamento na prática dessas adolescentes entre os amigos e namorados. Se houvesse mais sintonia entre os discursos das jovens, do PROAMA
e dos pais, os três segmentos conseguiriam diminuir o índice das doenças
sexualmente transmissíveis e o índice da gravidez precoce nas adolescentes.
A única ferramenta que os pais têm utilizado é o discurso da moralidade
para reprimir o comportamento sexual das filhas. Se esse discurso for desconstruído, mesmo que seja antiquado e difícil de as jovens acatarem, elas acabarão
ficando sem limites e orientações, o que pode gerar gravidezes precoces. Tudo
indica que é isso que está acontecendo entre as adolescentes, no entanto, os
nossos dados empíricos poderão desvendar essas reflexões hipotéticas.
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Helen Gonçalves (2006) escreveu um artigo sobre uma pesquisa qualitativa realizada em Pelotas-RS com jovens entre 18 e 19 anos que já tinham
filhos. O objetivo, no inicio da pesquisa, era entender o contexto no que se
diz respeito à gravidez precoce na adolescência, porém, algo que se destacou durante a pesquisa foi o conceito de “aproveitar a vida” dentro da fala
dos adolescentes. Esse jargão acabou ajudando a explicar os comportamentos dos adolescentes. Na verdade, investigar o que é esse “aproveitar a vida”
foi algo que se tornou peça fundamental desse trabalho para se entender o
que é “ser jovem”.
A gravidez precoce remete, nesse trabalho, a visão de um compromisso,
que é o lado oposto do “aproveitar a vida”. Esse fenômeno mostra então
uma aparente paradoxalidade pois, a gravidez na adolescência passa a ser
resultado da liberdade atual e do modo como os jovens “aproveitam a vida”,
mas, só as mães precoces têm o trabalho e comprometimento com seus filhos. Pode-se supor que as jovens, na sua imaturidade, não consigam perceber esta contradição resultante da paradoxalidade do ato de “viver a vida” e
sofrer as conseqüências da gravidez precoce.
O momento posterior à gravidez também é estudado nessa pesquisa, e o
que pôde ser visto é que no momento em que a adolescente tem um grande
apoio da família é possibilitado a ela de ter o seu lazer de volta mesmo depois de ter um bebê precocemente. Aqui nos perguntamos: Será que o apoio
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dos pais das adolescentes que são mães precoces estão ajudando quando
assumem os cuidados e custos desses netos nascidos precocemente?
No texto, “O aprendizado da sexualidade: reprodução e trajetórias sociais
de jovens brasileiros”, Aquino, Almeida, Araújo e Menezes (2006) começam
falando da gravidez precoce como um problema social que acarreta grandes
conseqüências para os jovens e que apesar de não ser assunto novo, tem
apresentado interesse nos dias atuais. O estudo foi feito sobre jovens da cidade de Salvador, Rio de Janeiro e Porto Alegre para mostrar as experiências
reprodutivas de jovens, homens e mulheres dessas três cidades.
De acordo com esta fonte, na faixa etária dos 18-19 anos foi constatado
que é maior a incidência de gravidez referida pelas mulheres do que pelos
homens nessa mesma faixa etária. Isto significa que para eles, os pais precoces, o ato de ter filhos precocemente não significa que eles devam participar, contribuir financeiramente e dar atenção aos filhos que geraram com
suas parceiras adolescentes. Em termos práticos essas crianças filhas de pais
precoces não têm mães com maturidade para cuidar delas, e os seus pais se
tornam quase sempre ausentes. Por isso se tornam os “filhos-netos” dos pais
das adolescentes que engravidaram precocemente.
Nesta mesma fonte os números mostram também que na cidade de Salvador e Rio de Janeiro o período entre a menarca e a primeira gravidez é
menor, mostrando assim, uma precocidade maior na gravidez. Outro fator
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importante é o fato de que, quanto mais próxima à gravidez da menarca,
menor o nível de instrução e de renda dessa mãe adolescente. Algo interessante que foi mostrado nesse trabalho é o fato de que geralmente as mães
das meninas que engravidam cedo, também foram mães cedo, o que não é
mera coincidência.
Com a ajuda de depoimentos de especialistas e médicos citados por
Aquino, Almeida, Araújo e Menezes (2006), o que se pode perceber e que
inclusive é enfatizado pela mídia, é o crescente numero de meninas que engravidam cada vez mais precoces em torno dos 11 e 12 anos. Porém, algo
curioso é que essas experiências reprodutivas delas são normalmente com
homens mais velhos. Outro aspecto interessante detalhado nesse trabalho é
o fato de como reagem com a notícia da gravidez, o casal em si e a família
também. Perante a gravidez os meninos e as meninas reagem de maneira
diferente: ao saberem da noticia as mulheres contam logo para uma pessoa
de confiança, os homens demoram bem mais para falar á alguém.
Neste estudo acima citado, a gravidez precoce não interfere, por exemplo, nos estudos ou trabalho dos rapazes, porém, para as mulheres a gravidez precoce acabou interferindo na carreira escolar, o que, por conseguinte,
atrapalhou os planos do futuro delas. Em relação às crianças o estudo feito
mostrou que as crianças nascidas de pais adolescentes estão vivendo menos freqüentemente com ambos os pais. Isso significa que não deu certo a
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união do pai e da mãe e, portanto, o que é mais comum de fato é a criança
crescer no meio da mãe e da família dela. Entretanto, quando o assunto é
realmente o sustento da criança os pais estão mais evidenciados do que as
mães, ou seja, a grande maioria dessas crianças são sustentadas pelos pais e
avós maternos.
Enfim, a gravidez na adolescência apresenta-se, nesse trabalho um fenômeno complexo que contem diferenças em virtude da diversidade entre as
regiões e as classes sociais das adolescentes. Os dados revelam que a continuidade ou a interrupção da gravidez na adolescência é influenciada fortemente pela vontade da gestante ou do seu companheiro.
No livro “Corpo, identidade e bom-mocismo”, de Fraga (2000), o assunto
sexualidade foi tratado através da peça: “Brinquei de Médico... deu no que
deu”. Esta peça foi apresentada no ambiente escolar – Escola Maria Fausta,
em Cachoeirinha-RS. Este autor abordou de uma maneira diferente o assunto da sexualidade, gerando, inclusive, algumas discussões e reflexões sobre
assuntos pertinentes à sexualidade na adolescência, tais como descoberta
do corpo e do desejo, aborto, gravidez precoce, métodos de prevenção e
anticoncepcionais, além de relacionamento familiar e abordagem dos pais
e educadores. Foi uma maneira diferente de se abordar o assunto, pois os
alunos foram incentivados a pensar no que é o sexo consciente, conversado
e dividido (questões da “hora certa, pessoa certa, lugar certo”).
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Como o próprio título da peça acima referida falava, a verdade é que com
sexualidade não se brinca. É muito importante que os jovens falem – antes
de iniciarem a prática sexual – com pessoas como pais, professores, psicólogos e etc, ou seja, com pessoas que possam apontar o que é certo e o que
é errado. O problema é que este diálogo é praticamente inexistente. Vemos
então atitudes polarizadas que vão desde a repressão exarcebada até a falta
de limites das pré-adolescentes, o que mostra a necessidade de um equilíbrio nas relações das adolescentes com seus pais.
Na verdade, a família, mais uma vez, aparece como peça fundamental para
que não haja um “desvio de conduta sexual”, ou seja, de terem relações sexuais sem a maturidade necessária por parte das meninas adolescentes. A
peça vista na escola acima referida anuncia a responsabilidade de uma falta
de educação que começa em casa com a falta de apoio e compreensão dos
pais. Por outro lado, achamos que fica claro muitas vezes, o fato de que se a
adolescente tivesse ouvido o pai ou a mãe e acatado os limites e cuidados de
vigilância deles nada disso – em relação à gravidez precoce – teria acontecido.
Em contrapartida, para Rodrigues (2006), que trabalhou sua dissertação
sobre a educação e orientação sexual no Ensino Médio, cuja pesquisa empírica foi feita em uma escola pública e outra escola particular de Patos-PB,
deveria haver uma pedagogia de educação sexual nas escolas de segundo
grau. Esta proposta poderia auxiliar no combate de problemas como os al-
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Antropoligia e Educação
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tos índices de gravidez precoce das adolescentes, como também a prostituição infanto-juvenil e incidência de DSTs, Doenças Sexualmente Transmissíveis nesta cidade que é a maior concentração urbana fora de João Pessoa e
Campina Grande. Na verdade, como foi constatada pela autora, existe uma
grave omissão por parte das escolas com relação a programas de orientação
e educação sexual.
Muitas vezes, a pressão sobre as adolescentes as leva a um silencio de
risco dentro da família, cabendo então à escola desenvolver a educação sexual para reforçar a educação familiar também. De acordo com Louro (2008),
tudo o que se refere à sexualidade as adolescentes encontram no ambiente
escolar embora nem sempre de modo saudável. Essa “aprendizagem” ocorre
através de brincadeiras, namoros, piadas e no próprio discurso de colegas
e até professores. A escola é de grande importância no repasse de informações adequadas sobre educação sexual, porém, a família tem o dever de
orientar seus filhos nessa questão, afinal a família é o primeiro núcleo onde
os filhos recebem informações. Esses dois ambientes precisam estar em sintonia quando se trata da prevenção da gravidez precoce das adolescentes.
Vejamos como essas questões emergem nos dados empíricos do próximo
capítulo.
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Antropoligia e Educação
3 Gravidez precoce e histórias de vida: dados empíricos
Neste capítulo demos visibilidade aos dados empíricos documentais e
resultantes da pesquisa de campo deste trabalho. Os dados documentais
são oriundos do Jornal Correio da Paraíba, cuja reportagem citada retrata a
situação da gravidez precoce no estado da Paraíba. Os dados resultantes da
pesquisa de campo são os de duas entrevistas feitas com adolescentes de
João Pessoa/PB, cujos nomes aqui colocados são fictícios. Elas relataram as
suas histórias de vida relacionadas com as respectivas vivências de maternidade precoce, as quais foram analisadas tanto em termos teóricos como
através de referenciais jurídicos. Após a comparação dos dados das duas
histórias de vida apresentamos também uma declaração sobre a temática
feita pela Delegada da Delegacia de Atendimento à Mulher, Dra. Maria da
Conceição Casado da Silva, que permitiu que o seu nome real fosse colocado nesta monografia.
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3.1 Dados documentais
Os dados que se seguem abaixo são provenientes de duas reportagens do jornal Correio da Paraíba, que tem maior tiragem de exemplares
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Antropoligia e Educação
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em João Pessoa. É importante esclarecer que não foi feita uma pesquisa
exaustiva nos jornais locais desta cidade já que a proposta desta pesquisa
foi dirigida para os dados das entrevistas das jovens, sendo que a fonte
jornalística foi mais ilustrativa da pesquisa de campo por ter apresentado
dados históricos e estatísticos importantes.
Na primeira reportagem, de Alves (2011), do Jornal Correio da Paraíba de
04 de setembro de 2011, nos mostra dados alarmantes, revelando que, só no
primeiro semestre de 2011, 4.259 adolescentes deram à luz a bebês aqui na
Paraíba. Se transformarmos esses números em dias, teremos uma média de
23 mães precoces por dia deste ano no Estado. Nessa reportagem de Alves
(2011) do Jornal Correio da Paraíba, da mesma forma que a de Mello (2011),
citada no capítulo anterior, nos mostra também que apesar desses números
terem caído nos últimos anos, ainda continuam preocupantes os índices de
gravidez na adolescência.
Os dados revelados por Alves (2011) publicados no Jornal Correio da Paraíba nos mostram, mais precisamente, que 3.343 bebês nasceram de mães
entre 10 e 17 anos no início deste ano até o mês de agosto, e que João
Pessoa aparece como a cidade que tem o maior índice. Aqui na capital, as
adolescentes grávidas são encaminhadas para unidades que têm estrutura
para esses casos, como o Hospital Universitário Lauro Wanderley, o Instituto
Cândida Vargas e a Maternidade do Hospital Frei Damião.
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Antropoligia e Educação
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Na segunda reportagem, de 01 de dezembro de 2011, escrita por Celina Modesto (p. B1), consta que, de acordo com o IBGE, em 1999 houve 365
adolescentes que engravidaram com menos de quinze anos, enquanto que
em 2010, houve 523 jovens que foram mães precoces dentro desta mesma
faixa etária. Este aumento, segundo esta fonte, representa 43,28% nos últimos onze anos. Por outro lado, houve 49. 759 mulheres que foram mães
em 2010 e, neste número geral 14.352 tinham entre 20 e 24 anos, e 12.026
mulheres que tiveram filhos estavam na faixa de 25 a 29 anos. Isto significa,
de acordo com Modesto (2011) que as mulheres estão postergando a maternidade quando conseguem alcançar os 20 anos sem terem filhos.
Pode-se interpretar esses dados da seguinte maneira: quando a idade das
mulheres avança há uma ponderação mais madura na tomada de decisão de
ter filhos, ou seja, deverão refletir se elas vão poder dispor de tempo e recursos financeiros para essa missão por conta própria sem depender dos pais.
No box da reportagem há duas declarações de mães precoces, uma com 17
anos grávida do segundo filho, sendo que no primeiro os pais a apoiaram,
mas, na segunda gestação encontrou um parceiro que assumiu a responsabilidade de cuidar desta mãe inclusive o filho que não é dele. No segundo
caso a mãe precoce tem 14 anos e afirma que queria ser mãe, independente
da pouca idade e que seus pais estariam apoiando tal desejo. No entanto, é
importante ressaltar que com 14 anos nenhuma jovem tem maturidade para
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Antropoligia e Educação
desejar e tomar esta decisão por não ter autonomia emocional e financeira,
e os pais terminam por serem reféns da imaturidade dessa adolescente.
3.2 Dados empíricos: histórias de gravidez precoce
Neste item pretende-se relatar as circunstâncias anteriores à ocorrência
da gravidez da primeira e segunda entrevistada. Primeiramente são apresentados os dados genéricos e os relatados pela mãe da mesma e depois
colocamos as perguntas, respostas e respectivas análises dos dados desta
entrevista. Em seguida inserimos as declarações da Delegada da Polícia Civil
titular da Delegacia Especializada de Atendimento da Mulher – DEAM – de
Santa Rita/PB.
História de Sara
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Caracterização genérica da colaboradora:
Idade: 18 anos;
Escolaridade: Ensino fundamental incompleto
Renda mensal familiar: R$ 1.500,00 dos pais, porque Sara não trabalha
nem estuda. A renda mensal é instável porque nem sempre o pai e/ou a mãe
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Antropoligia e Educação
estão trabalhando.
Dados de observação do contexto: Segundo a mãe de Sara, ela começou a
andar sozinha à noite desde os onze anos. Hoje não gosta de fazer nada em
casa, nem as refeições do bebê, que são cozinhadas pela avó antes de sair
de casa para o trabalho. Quando chega as seis horas da tarde e a mãe não
chega ela fica telefonando para apressar a sua volta para ficar com o filho e
ela sair para se entreter na rua.
Para facilitar a sistematização dos dados desta entrevistada suas falas
foram subdivididas em dois itens expressos por perguntas que virtualmente as adolescentes podem se fazer, pois, mesmo sendo indagações fictícias
há grande probabilidade de surgirem na mente das jovens que vivenciam a
gravidez precoce: “Estou grávida, como isso foi acontecer?”; e “O bebê nasceu,
e agora?”.
Estou grávida, como isso foi acontecer?
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Para responder a indagação deste item fizemos algumas perguntas cujas
respostas serão colocadas em tela para melhor visualização.
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Antropoligia e Educação
Como era a sua vida social e de lazer antes de você engravidar?
Eu saía, ia para festas, [minha vida] era muito melhor. Às vezes minha
mãe deixava eu sair, às vezes eu ia escondido. E ela [a mãe] ia atrás de
mim. Eu saia para todo lugar.
Nesta fala a colaboradora deixou bem claro que os limites dos pais quanto ao seu comportamento e direito de sair para se divertir eram muito confusos porque a mãe permitia que ela saísse algumas vezes e quando havia
proibição para as saídas, ela ia assim mesmo. Isso foi feito mesmo com a
ciência da mãe, que ia “escondida” atrás dela. Vale indagar: se a mãe desta
jovem sabia dessas saídas porque não a impedia de fazer isso ou então a
trazia de volta para casa? A confusão dos limites facilitou para que esta adolescente considerasse que “podia” infringir as proibições já que a mãe não a
trouxe de volta para casa fazendo valer a sua autoridade.
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Antropoligia e Educação
Como eram os limites comportamentais que seus pais lhe davam, ou
seja, o que lhe era permitido e proibido fazer antes de engravidar?
No início ela [a mãe] não deixava eu sair, mas eu saía escondido, daí ela
começou a deixar escondido do meu pai, minha mãe ficava sabendo e meu
pai não, até porque se ele [o pai] soubesse a reação dele seria outra.
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Aqui se vê outra contradição perigosa em termos educacionais, que se refere primeiramente à autoridade da mãe que tentou impor limites e não foi obedecida. Pelas entrelinhas percebe-se que tanto o pai como a mãe não permitia
que a garota de menos de treze anos saísse de casa à noite sozinha e que esta
progenitora acabou cumpliciando com a desobediência permitindo que ela fizesse isso escondendo o comportamento de transgressão do pai da jovem.
Em outras palavras, esta mãe, já desautorizada pela filha, terminou desautorizando também ao seu esposo e pai da jovem. Esta seqüência de falhas de autoridade da mãe e aparente omissão do pai – que não prestava
atenção na ausência da filha - levou a adolescente a considerar que poderia
agir como bem lhe aprouvesse, inclusive na iniciação sexual, mesmo sem ter
a menor consciência e maturidade para isso.
Ficou claro que os pais da adolescente não cumpriram as suas obrigações
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Antropoligia e Educação
e responsabilidades. Os pais de menores, especialmente as garotas, são os
principais responsáveis pelos deslizes comportamentais que elas cometem e
são os únicos que têm poderes para coibir essas práticas. A eles cabe orientar, colocar limites comportamentais e vigiar suas filhas de acordo com Oliveira (2002). Se elas não estão sendo devidamente cuidadas inclusive neste
sentido estão sendo “condenadas” ao abandono social e moral. Se for este o
caso, estes pais estão incorrendo no crime previsto no artigo 247 do Código
Penal Brasileiro, que proíbe o seguinte comportamento:
“Permitir alguém, que menor de 18 anos, sujeito ao seu poder, ou confiada
a sua guarda ou vigilância:
I - Freqüente casa de jogos ou mal afamada, ou conviva com pessoa viciosa
ou de má vida;
II - Freqüente espetáculo capaz de pervertê-lo ou de ofender-lhe o pudor,
ou participe de representação de igual natureza;
III - Resida ou trabalhe em casa de prostituição;
IV - Mendigue ou sirva a mendigo para excitar a comiseração pública;
Pena de detenção de 1 a 3 meses ou multa”.
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Antropoligia e Educação
Segundo o jurista Celso Delmanto (2000), a conduta delituosa dos pais
está em permitir alguém (expressa ou tacitamente) que seja menor de 18
anos e esteja sob sua guarda ou sujeita a seu poder, que tenha qualquer
dos comportamentos indicados nos incisos I, II e III. Para a configuração do
crime, não basta uma conduta ocasional, sendo necessária a habitualidade.
Como se pode ver, pelas leis brasileiras, cabe aos pais evitarem as possibilidades de desregramento comportamental dos filhos, o que pode redundar
na gravidez precoce das adolescentes. A gravidez nesta faixa etária é então
conseqüência deste contexto de falhas familiares.
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Antropoligia e Educação
Como, por que e com quem engravidou?
Foi com meu primeiro namorado, comecei a namorar com ele eu tinha
12 anos, perdi a virgindade com 13 e engravidei com 14 anos. Ele [o namorado] tinha 18 anos quando engravidei. Primeiro passamos dois anos
namorando até eu engravidar, eu não queria, mas, não me prevenia. Fui
morar com ele eu tinha 13 anos, passamos dois meses e eu voltei para
casa, no momento em que engravidei estávamos meio enrolados, a gente
tinha acabado, mas ficávamos de vez em quando. Quando eu descobri que
estava grávida eu estava em João Pessoa e ele [o namorado] em Nova Floresta [interior da Paraíba], que foi onde a gente se conheceu. Daí avisei á
ele, mas ele sempre foi muito mulherengo e nem deu importância ao aviso.
Quando eu estava com seis meses de gravidez voltamos, mas depois de alguns meses que o bebê nasceu acabamos de vez.
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Nesta tela se percebe mais uma vez a omissão dos pais desta jovem que
“permitiu” que ela vivenciasse todas essas ocorrências, chegando ao ponto dela ter ido morar com o namorado quando ainda tinha treze anos. Isso
só pode acontecer se houver a anuência dos pais, ou seja, a garota fazia o
que queria nesta época e provavelmente os pais nem tentaram impedir que
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Antropoligia e Educação
isso ocorresse. Como já foi mencionado acima, os jovens que têm abaixo de
dezoito anos devem obedecer aos pais ou responsáveis. Permitir esta coabitação da adolescente com o namorado com tão pouca idade é mais uma
prova do abandono moral destes pais.
O bebê nasceu, e agora? O que mudou depois que o bebê nasceu?
Mudou tudo na minha vida, saio, mas não como antes. Quando eu saio
para algum lugar meu filho fica com minha mãe. O pai do meu filho não
liga, é muito difícil ele ajudar em alguma coisa, só ajuda quando eu ligo pedindo, nunca visita o filho, passa meses para ajudar. Voltei a estudar esse
ano, mas parei, acho que devido a influências de alguns amigos, que colocaram coisas na minha cabeça, mas ano que vem quero voltar a estudar de
novo.
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Percebe-se nesta fala da colaboradora, que a mãe-avó assume obrigações com a criança que deveria ser da adolescente. Ou seja, a avó do bebê
continuou sem impor limites e exigir a responsabilidade da filha com o neto.
É uma espécie de círculo vicioso, a mãe não cuida bem do comportamento
da filha, que por sua vez não assume as responsabilidades com o bebê.
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Antropoligia e Educação
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Mesmo os cuidados básicos do bebê são da responsabilidade da avó.
Conforme os relatos da mãe desta jovem fornecidos à pesquisadora fora da
gravação da pesquisa, a jovem mãe precoce não se preocupa nem com a
alimentação da criança, sendo que a avó que tem que preparar as papinhas
do bebê antes de sair para o seu trabalho como faxineira. Quando a avó demora a chegar em casa à noite esta jovem telefona insistentemente para a
mãe para cobrar a presença e cuidar do bebê para que ela possa sair para a
diversão. Neste ritmo não é difícil perceber que há enormes possibilidades
de ela engravidar novamente da mesma forma impensada da primeira gravidez.
A adolescente confirma os dados da pesquisa feita por Mello (2001),
quando a jovem relata que parou os estudos depois da gravidez assumindo
ter feito isso por motivos fúteis, ou seja, devido a influencias de amigos. Aqui
se pergunta, onde estão os pais desta jovem que não exigem que ela continue a estudar. A entrevistada confirma mais uma vez a falta de maturidade,
característica presente nos adolescentes, o que reproduzia a irresponsabilidade dos pais na vida desta jovem. O pai da criança que deveria ser presente
neste momento ajudando com as obrigações e exercendo o seu papel, teve
um total descaso, por parte dele, em relação ao filho e pelas entrelinhas essa
ausência não foi questionada de modo nenhum pelos pais da jovem. De
acordo com as leis brasileiras de proteção da criança e adolescente (http://
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Antropoligia e Educação
portal.mec.gov.br/secad/arquivos/pdf/guiaescolar/guiaescolar_p062_065.
pdf) encontramos os seguintes textos de lei:
1. Ato sexual praticado com criança ou adolescente menor de 14 anos, por
pessoas mais velhas do que a vítima, independentemente de ser “forçado”
ou não, fica presumida a violência da pessoa de maior idade. Nesse caso,
deve-se aplicar os artigos relativos aos crimes de estupro, atentado violento ao pudor e rapto violento. A comprovação de violência não é necessária,
basta a comprovação do ato sexual.
2. Adolescentes, de qualquer sexo, na faixa etária entre 14 e 18 anos, a partir
de uma decisão pessoal sobre qual a melhor idade para a iniciação sexual,
podem manter relações sexuais consentidas com pessoas da mesma faixa
etária.
3. Relações sexuais entre adolescentes e pessoas maiores de 18 anos, mesmo ocorridas sem violência, podem ser passiveis de crime de “corrupção de
menores” ou de “sedução”, se denunciadas às autoridades.
As leis acima deixam claro que as práticas sexuais nesta faixa etária são vetadas e são consideradas como crimes com penalidades previstas juridicamente.
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Antropoligia e Educação
Como se sentiu depois de ter tido um filho na adolescência?
Não gostei nem um pouco, não queria engravidar de jeito nenhum,
depois que nasce a gente gosta dele [o bebê], mas é diferente, porque eu
não queria essa gravidez.
Aqui se vê neste relato da colaboradora, que a mesma não desejava essa
gravidez, portanto vale indagar: Se a adolescente não queria engravidar porque não se prevenia? Entra aí a total falta de responsabilidade dos jovens
perante a sexualidade, e por isso, a obrigação dos pais de serem os responsáveis pelas atitudes impensadas dos seus filhos, gerando conseqüências
como a gravidez precoce. Além disso, a fala mostra um desconforto individualista maior da jovem com ela mesma do que com o seu filho, ao qual
afirma gostar sem muita convicção.
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História de vida de Amara
Caracterização genérica da colaboradora:
Idade: 20 anos;
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Antropoligia e Educação
Escolaridade: Ensino fundamental incompleto
Renda mensal familiar: R$ 1.000,00 dos pais, porque Amara não trabalha, só
estuda. (Não dispomos de mais dados sobre a família desta colaboradora).
Estou grávida, como isso foi acontecer?
Como era a sua vida social e de lazer antes de você engravidar.
Sempre gostei muito de sair com minhas amigas, normalmente minha
mãe sabia com quem eu saía. Meu pai nunca se interessou muito em
saber.
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Vemos aí neste relato, uma total omissão por parte do pai desta adolescente, que não se interessava em saber os passos e atitudes da sua filha. Há
também a falta de limites, que não eram impostos pela mãe, quando ela diz
que a mãe “normalmente sabia”, o que é uma expressão ambígua.
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Antropoligia e Educação
Como eram os limites comportamentais que seus pais lhe davam, ou
seja, o que lhe era permitido e proibido fazer antes de engravidar?
Normalmente eu namorava escondido, nunca levei namorado para
casa, porque eu sabia que se eu levasse eles [os pais] não iam deixar eu
ficar saindo mais.
Nesta fala, notamos uma possível tentativa de imposição de limites por
parte dos pais, quando ela diz que namorava “escondido”, o que significa
que ela não tinha permissão para ter um namorado. Em suma, os pais não
sabiam o que a adolescente fazia, aonde ia e com quem andava na rua.
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Antropoligia e Educação
Como, por que e com quem engravidou?
Eu tinha 16 anos quando engravidei, foi com meu namorado na época,
ele tinha 18 anos, a gente ás vezes usava camisinha, quando não tinha não
usava, daí no dia não usamos [camisinha], não imaginava que isso fosse
acontecer. Ele [o namorado] dizia que a gente ia casar, mas começou a ir me
ver cada vez menos. Até o dia em que descobri que ele tinha outra, Quando
eu descobri estava com uns quatro meses de gravidez, fiquei arrasada, daí
quando ele viu que eu já tinha descoberto as suas traições, quis acabar de
vez com o relacionamento da gente, sofri muito.
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Neste relato, a colaboradora, deixa claro a total falta de responsabilidade
dos jovens perante a sexualidade, quando ela assume que nem sempre usava camisinha. Se os pais, que são responsáveis pela adolescente, tivessem
imposto os limites necessários, sendo presentes nas suas funções e fazendo
valer a suas responsabilidades como tais, aí então poderiam ter sido evitado
todo o sofrimento vivenciado pela adolescente, como por exemplo, o abandono por parte do pai do seu bebê.
Também aqui se percebe que estes pais não questionaram juridicamente o namorado por ter tido relações sexuais com a filha com a conseqüente
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Antropoligia e Educação
gravidez, o que é viabilizado pelas leis brasileiras, como já foi citado acima.
Uma jovem que engravida pode solicitar o aborto no sistema médico oficial – SUS – justamente porque este comportamento não condiz com as leis
(NÓBREGA, 2011 e BANDEIRA, 1999).
O bebê nasceu, e agora? O que mudou depois que o bebê nasceu?
Tive apoio dos meus pais, o pai da criança dizia que ia assumir e não
assumiu. Minha mãe foi tudo para mim, me ajuda até hoje. Sempre gostei
de sair, mas assim que ele [o bebê] nasceu não deu mais, depois de um
ano mais ou menos que ele nasceu foi que voltei a sair, e minha mãe fica
com ele quando eu saio. Voltei a estudar faz pouco tempo. O pai da criança
só ajuda quando ele quer, já pensamos em colocar na justiça para ele ser
obrigado a ajudar.
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Neste relato vemos o apoio dos pais, quando instalado o problema da
gravidez na adolescência, sendo que a mãe-avó aparece como a pessoa que
mais ajudou e ajuda até hoje. A adolescente retomou aos poucos seus estudos e sua vida social. As responsabilidades como mãe da criança ela divide
com a sua mãe [avó da criança], onde na verdade era para ser dividida com o
pai da criança, que por sua vez não ajuda nem com os gastos, isto é, com as
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Antropoligia e Educação
responsabilidades financeiras. Aqui se questiona: por que ainda há hesitação
na busca dos direitos jurídicos desta criança e a mãe adolescente da mesma.
Como se sentiu depois de ter tido um filho na adolescência?
Péssima, levei muito tempo para se acostumar com a idéia, mas gosto
e amo meu filho, e ele não tem culpa de nada.
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Nesta fala, a adolescente retrata a maneira como ela se sentiu quando
se deparou com a conseqüência de uma gravidez precoce, que é resultado
de uma educação sem limites dada pelos pais das adolescentes. A colaboradora, ao menos na sua fala, demonstrou ter um sentimento amoroso
sincero pelo filho e a consciência de que ele [a criança] não teve culpa dos
comportamentos sem responsabilidades dos pais. Mas, a jovem continua
querendo sair de casa para se divertir, já que sua mãe cuida do bebê. Como
o outro caso aqui retratado, vemos enorme possibilidade de uma segunda
gravidez impensada.
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Antropoligia e Educação
Semelhanças dos dois relatos de maternidade na adolescência:
• Falta de limites comportamentais dos pais;
• Falta de educação sexual dada pela família e pela escola;
• Ausência dos cuidados das mães adolescentes com seus bebês, sendo
que nos dois casos as avós maternas é que assumem esses cuidados;
• Ausência dos pais das crianças que nasceram de situações de gravidez
precoce e falta de cobrança jurídica dos direitos das mães adolescentes e
seus bebês com relação aos jovens pais desses bebês;
• Há chance de uma segunda gravidez de forma irresponsável
Apresentamos a seguir, as declarações da Dra. Maria da Conceição Casado
da Silva, Delegada titular da DEAM de Santa Rita/PB, localizada na Grande
João Pessoa/PB
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Antropoligia e Educação
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A gravidez precoce é um crime social gravíssimo porque sofrem essas
mães, sofrem as crianças e sofrem os avós das crianças, principalmente os
maternos, porque têm de arcar com esta situação. Fere a Constituição Brasileira, o Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA – e outras legislações.
No entanto, os maiores responsáveis pela ocorrência não são as mães precoces, que não têm maturidade emocional para evitar. São os pais delas,
geralmente de classes carentes, que não se dispõem a cuidar e vigiar atentamente o comportamento dessas moças, que ficam “soltas” fazendo o que
querem com os namorados. Abaixo de 14 anos elas não deveriam nem ter
permissão para namorar, pois, é muito cedo para isso, muito menos saírem
na noite para as baladas longe da vigilância dos pais e voltarem tarde da
noite para casa. É um caso crime de abandono moral das adolescentes.
Depois que engravidam os pais nem se preocupam mais em ir buscar os
direitos dessas mães em buscar a responsabilidade dos pais dessas crianças
para fornecerem recursos atenção e carinho que os filhos necessitam. Esse
é um assunto que a DEAM faz atendimentos e oferece orientação para os
pais e avos desse filhos nascidos precocemente. Se os pais dessas moças
são irresponsáveis como é que se vai esperar que elas sejam responsáveis
com as crianças que vão nascer! É bem provável que as mães dessas adolescentes também tenham tido filhos antes da hora, o que leva a um círculo
vicioso da avó que acaba cuidando dessas crianças.
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Antropoligia e Educação
Nesta fala da Delegada confirmam-se as leis acima citadas e as análises
feitas sobre a surpreendente ausência dos pais das adolescentes, já que eles
não procuram ou não querem ter autoridade para impor limites comportamentais e de vigilância das mesmas. A ocorrência maior é nas classes mais
baixas e carentes da população, que também sofrem por falta de uma escolaridade mínima que lhes permita ter uma renda familiar para oferecerem
uma educação sólida e estruturada para suas filhas.
Essa falta de perspectiva de futuro dessas famílias é a maior causa de
risco moral para essas famílias. De acordo com a referida Delegada, o risco
moral se relaciona com o abandono moral, onde os jovens cometem muitos
atos de contravenção para conseguirem sobreviver; no caso das adolescentes pobres trata-se do risco uso de drogas e/ou da prostituição infanto-juvenil, que também foi analisado por Oliveira (2002).
Considerações finais
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Os dados e as teorias dos autores aqui citados – Ariés (1981), Osório
(1989), Takiuti (1997), Louro (2008) entre outros – nos levaram a algumas
reflexões sobre o que há por trás do problema social da gravidez precoce
em seu enfoque jurídico-moral no contexto urbano capitalista pós-moderno
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Antropoligia e Educação
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especialmente no Brasil. Todas as sociedades, desde as antigas, modernas,
urbanas, rurais, indígenas e outras, têm sistemas de regulamentos sociais
que determinam como deve ser a trajetória de vida dos seus membros. Esta
é uma questão cultural que deve ser delimitada e concretizada pelas políticas econômicas de cada formação social.
No universo capitalista urbano pós-moderno espera-se que os jovens
se qualifiquem profissionalmente através da escolaridade formal, para serem produtivos e auto-sustentáveis através de emprego e renda adquiridos
através da sua formação teoricamente gerada pela escolaridade. As classes
médio-baixas escapam desta programação ideológico-cultural e econômica
porque fogem aos padrões de escolarização profissional e por isso subsistem com baixos salários e precárias condições de acesso à instituições educacionais, mesmo as públicas e gratuitas. No Brasil existem regulamentos
constitucionais que responsabilizam os pais de família pela escolarização
obrigatória de seus filhos e eles estão citados formalmente porque este é o
caminho para as pessoas se prepararem para enfrentar o mercado de trabalho para terem emprego e renda, mais do que pelo valor do conhecimento
e desenvolvimento humano.
A gravidez precoce, que é vista quase como uma “doença social” no contexto desta expectativa de trajetória social, torna-se um sério obstáculo para
o desenvolvimento da formação de mão de obra das classes médio-baixas,
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Antropoligia e Educação
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mesmo aquela com baixa qualificação. Em outras palavras, as adolescentes,
quando não estudam ou interrompem a escolarização por causa da gravidez
antecipada e “desorganizada” – sem suas famílias constituídas –, ficarão fora
do mercado de trabalho por mais tempo do que o previsto e ainda geram
crianças que também serão “improdutivas” durante pelo menos uma década
e meia. Esta ocorrência causa uma quebra da programação da auto-sustentabilidade do emprego e renda que se espera que elas adquiram. Ao contrário disso, elas e suas crianças nascidas precocemente podem continuar
a ser um “peso” para a sociedade por se constituírem uma sobrecarga dos
serviços estatais.
É por causa desta situação que existem as leis determinando a responsabilidade dos pais para evitar que suas filhas engravidem antes de se tornarem parte da mão de obra com renda e auto-sustentabilidade. É também
por causa desta lógica que os homens jovens não se acham na obrigação de
arcarem com a paternidade da gravidez precoce das suas parceiras sexuais
adolescentes. O custo social da pobreza e exclusão infantil leva os sistemas
estatais a intervirem para tentar diminuir este “peso” dos riscos sociais das
crianças órfãs e abandonadas, e isto ocorre no Brasil desde o período colonial. Nesta época, segundo Cabral e Sousa (2004), as Ordenações do Reino
de Portugal provia com recursos a Irmandade das Santas Casas da Misericórdia para acolherem as crianças enjeitadas de origem pobre, negra, indí-
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gena e até de famílias ricas que geravam filhos bastardos que deviam ser
escondidos da sociedade.
A invocação desses dados históricos foi feita para justificar a preocupação
do Estado em não arcar com o ônus da exclusão social. Hoje o Estado cobra
dos pais, através de leis e constituições nacionais, a responsabilidade de transformar suas proles em mão de obra rentável e auto-sustentável. Por isso a gravidez precoce é tão questionada e sancionada em termos morais e jurídicos.
Estas jovens aqui focalizadas são de classe média baixa e portam uma escolaridade limitada ao ensino fundamental incompleto. Nossos dados e respectivas leis deixaram claro que a responsabilidade da maternidade precoce
não é das adolescentes e sim de seus pais que, de acordo com a jurisdição
formal, não quiseram ou não puderam cuidar dessas jovens para impedir que
engravidassem precocemente. São adolescentes que passaram pelo que as
leis denominam de “abandono moral” por parte dos seus pais porque eles
não impuseram limites comportamentais para evitar que elas assumissem
precocemente comportamentos de risco sexual e social para elas mesmas
e para a sociedade. E hoje, depois que seus bebês nasceram, continuam se
expondo a esses riscos e reproduzem a falta de cuidados com os filhos, além
de poderem se tornar mães novamente.
Além disso, de acordo o as entrelinhas das leis, essas crianças nascidas
neste contexto tendem a ser irresponsáveis com o comportamento sexu-
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Antropoligia e Educação
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Sumário
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al futuro o que evidencia o círculo vicioso da falta de cuidados familiares e
comportamentos de risco sexual, moral e material, através dos quais podem
ocorrer problemas de natureza criminal, uso de drogas, etc. Aqui cabe um
questionamento: se o Estado tem uma expectativa de trajetória de vida produtiva para os jovens, por que não propicia uma atuação estatal mais efetiva
para reforçar o trabalho e autoridade dos pais nesses cuidados com as adolescentes, que são as mais vulneráveis na gravidez precoce?
Há, por exemplo, instituições estatais como os Conselhos Tutelares da Infância e Adolescência que poderiam reforçar a autoridade dos pais, embora
seja difícil, na prática, que eles atuem neste papel. Em sondagens informais
uma conselheira afirmou que só toma providências mais drásticas como o
encaminhamento de processos na justiça, quando há casos graves de maus
tratos das mães com os seus bebês ou em caso de prostituição e abusos
contra adolescentes abaixo de quinze anos. Essas dificuldades conjugadas
com a falta de informações desses pais tornam o controle comportamental-sexual dessas mães precoces quase impossível. Em outras palavras, não há
um trabalho preventivo para impedir o surgimento de novas gravidezes.
Nota-se que até existem instituições, órgãos públicos, curadorias e mesmo forças policiais para essa finalidade. No entanto, estas instâncias não
atuam como deveriam, parecem mais um jogo de simulações formais com
pouca ou nenhuma eficácia social e jurídica. Neste quadro da realidade per-
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cebe-se que o Estado não cumpre com rigor as suas próprias leis, por isso
questiona-se: Se o Estado não consegue que seus representantes assumam
as suas responsabilidades no geral e neste caso específico, como pode cobrar as responsabilidades das famílias?
Essas contradições acarretam na sobrecarga das já difíceis condições
de cumprimento das responsabilidades paternas das famílias neste contexto. Neste sentido consideramos difícil definir com clareza o que significa a palavra responsabilidade neste contexto social e jurídico, porque os
cidadãos, de modo geral, não têm nem seus direitos garantidos e também não cumprem minimamente os seus deveres, já que, à sombra desse Estado distante das famílias elas acabam por mostrar uma autoridade
leniente, omissa e ausente. O que se pode concluir é que há uma interrogação na busca a prevenção e soluções para a gravidez precoce neste
momento da história brasileira.
No capítulo 2 desta monografia foram feitos vários questionamentos sobre as contradições que existem na vida das adolescentes, especialmente
com relação aos seus pais. Como este trabalho é limitado na sua abrangência, não foram feitas entrevistas com os seus pais para analisarmos as razões
de não imporem limites comportamentais para as suas filhas. Pelas falas das
adolescentes-mães a continuação do comportamento sexual de risco lhes
parece “natural”, ou seja, elas não se dão conta de que continuam juridica-
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mente irresponsáveis. Aqui cabem outros questionamentos: se as adolescentes já conhecem os métodos contraceptivos quais seriam as razões de
eles não serem levados mais a sério? Por que não se cobra esta prática dessas jovens com mais firmeza?
Pelas respostas das entrevistas elas demonstraram não conseguir pensar
no futuro ou no ajustamento produtivo na sociedade através dos estudos
e preparação para o mercado de trabalho. Essas questões, que deveriam
ser formalmente transmitidas pelos seus pais, lhes foge da compreensão e
consciência porque continuam imaturas e só pensam no aqui e agora. Neste
sentido deve-se ponderar que o apoio dos pais é necessário, mas, é difícil
entender a razão desses avôs e avós aceitarem a continuação da vida sexual
de risco das filhas com a evidente possibilidade de surgir mais uma gravidez.
Seria falta de autoridade dos pais? Seria o caso de as adolescentes se considerarem sexualmente liberadas por não serem mais virgens?
Uma das entrevistadas demonstrou temor de a mãe tomar conhecimento de suas declarações na entrevista, o que evidencia que os pais não sabem
o que ocorre com ela nas saídas de entretenimento. O problema é a continuação da falta de limites dos pais para exigir que as filhas assumam uma
sexualidade segura. Há evidências de falta de comunicação e conflitos nas
relações familiares das adolescentes precoces, ou seja, os pais continuam
não conseguem impor sua autoridade.
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Essas constatações empíricas nos levam a concluir que a cultura da irresponsabilidade comportamental das jovens e a suposta falta de limites paternos é tão forte que, mesmo depois das experiências difíceis da maternidade
precoce essas jovens continuam se expondo aos mesmos riscos. Isto provavelmente ocorre porque os pais-avós assumem os cuidados de seus filhos-netos, o que significa que elas, as adolescentes-mães, continuam com a mesma
falta de limites que já havia antes das jovens terem vivenciado a maternidade.
Aliás, aqui cabe mais uma pergunta: como uma menor de idade pode
ser responsável por seu bebê se ela não é responsável nem por si mesma?
A lacuna mais grave é que as instituições ligadas às políticas públicas não
assumem a cobrança do cumprimento da ECA, que é uma das leis que determinam as responsabilidades dos pais das mães precoces em relação ao
impedimento de elas transgredirem essas leis.
No caso em pauta do objeto desta pesquisa, as jovens carentes continuam sem receber nenhum esclarecimento de educação sexual e uso de métodos contraceptivos, seja por parte das famílias, seja por parte das autoridades educacionais. É importante ressaltar que crianças e adolescentes não
têm condições de auto-determinar se querem ou não ter relações sexuais
ou engravidar, ou seja, os pais é que devem administrar o comportamento
delas para evitar esta ocorrência conforme ditam as leis citadas no capítulo
anterior. O discurso de que elas “quiseram” engravidar encobre primei-
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ramente a ausência do Estado que falha na aplicação das leis, especialmente a do Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA. As políticas públicas precisam cobrar das famílias a aplicação da lei e não agir somente
em casos extremos de risco de vida e abandono moral.
Os pais desses bebês nascidos precocemente também não são sancionados e cobrados juridicamente por terem empurrado essas adolescentes ao
destino malfadado destas gravidezes precoces e nem são obrigados a assumirem também os cuidados dessas crianças embora a lei exija isso. Existem
algumas instituições na Paraíba como o BEMFAM – BEM-ESTAR FAMILIAR
NO BRASIL, e o PROAMA – PROGRAMA DE ATENÇÃO MULTIDISCIPLINAR
DO ADOLESCENTE – do Hospital Universitário da UFPB. Estas até atendem
aos jovens, mas, são limitadas porque não estendem esta atenção para as
famílias para cobrarem delas a responsabilidade pela imposição de limites comportamentais que suas filhas deveriam ter, como nos mostra Souza
(2002). Estamos às voltas com uma falta de responsabilidade geral institucionalizada que ocorre ao arrepio das leis que regulamentam a questão da
maternidade precoce.
É importante esclarecer que o BEMFAM é uma Organização Não Governamental que recebe recursos de convênios com instituições públicas do Estado Brasileiro. Presta diversos serviços aos usuários carentes da população,
ainda que nem todos sejam gratuitos. No entanto, cobra taxas de alguns
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serviços que são menores do que as de mercado. De acordo com os folhetos
informativos desta ONG (Informe Anual do BEMFAM de 2007), há diversos
serviços oferecidos por ela, especialmente os referentes à saúde reprodutiva
feminina.
Contudo, de acordo com as nossas constatações, as políticas públicas
relacionadas ao BEMFAM, por exemplo, são limitadas à distribuição de camisinhas e atendimento médico quando são procurados para isso. Sem dúvida,
é uma grande contribuição para as grávidas precoces terem acompanhamento pré-natal, por exemplo. Mas, não faz um aconselhamento preventivo
sobre isso com os pais, o que é tão necessário quanto a atenção que dispensam às mulheres. Em outras palavras, só atuam quando o problema da
gravidez está instalado ou em alguns casos de violência contra as mulheres.
Além disso, há apenas um posto do BEMFAM e PROAMA em João Pessoa, e
por melhores que sejam os atendimentos, não alcançam a orientação, inclusive a jurídica, que deve ser dada aos pais, avôs e avós. Mas, na prática esses
direitos e deveres são voláteis e ausentes.
Os dados mostraram que a gravidez precoce, nesses casos, não é causada pela falta de informação e de conhecimento de métodos contraceptivos,
porque as duas entrevistadas os conheciam muito bem quando engravidaram. Quando a adolescente se sente ajustada e confiante na família, pode
adiar o início da atividade sexual. Para que isso ocorra, é preciso que seus
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pais criem, desde cedo, um ambiente de respeito, amor e firmeza nos limites
comportamentais. Assim, a adolescente vai desenvolvendo uma boa imagem
de si mesmo e do mundo e com isso pode planejar o seu futuro profissional.
Isso vai ajudá-la a cuidar melhor de si e a se preservar, para que possa concretizar seus projetos de vida com respeito e responsabilidade. Em resumo,
a gravidez precoce é um problema sério e deve ser evitado. Para isso é
necessário criar uma conscientização geral para as/os jovens que deve
alcançar mais do que o moralismo das leis e autoridade dos pais: um filho não pode ser fruto de uma atitude impensada. Precisa ser planejado
e ser fruto de um projeto de vida.
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