CRIAÇÃO DA VISÃO por Luiz Otavio da Silva Nascimento* O anjo de Javé apareceu a Moisés numa chama de fogo no meio de uma sarça. Por isso, desci para libertá-lo do poder dos egípcios e para fazê-lo subir dessa terra para uma terra fértil e espaçosa, terra onde corre leite e mel... O objetivo da libertação veio em resposta à crise dos filhos de Israel, trazendo consigo a visão da posse da terra. A Terra Prometida. O projeto de libertação, portanto, foi um movimento para se atingir esse ideal. Da mesma maneira, o projeto de mudança numa empresa deve ser um movimento para se atingir um ideal que é apresentado a todos os colaboradores sob a forma de visão. Antes de tentar empreender um projeto de mudança deve-se criar uma visão que, então, deverá ser amplamente comunicada de forma a ser perseguida pelos colaboradores. LUCAS1 mencionou que as empresas necessitam de uma visão pelas seguintes razões críticas: ` Para Guiá-las... Como as estrelas que têm – por milênios – guiado marinheiros aos seus destinos e a portos seguros, uma visão articulada irá liderar a todos de um ponto a outro, dentro da jornada empresarial, alinhando prioridades e objetivos, evitando a fragmentação; 1 LUCAS, James R.; Anatomy of a Vision Statement, Management Review, New York, American Management Association, Fevereiro 1998 ` Para Lembrá-las... A mesma organização que pode lembrar-se de um erro por anos, pode se esquecer em questão de meses do que representa e em que deseja tornar-se. A visão deve ser algo que fará com que todos se lembrem, durante os anos seguintes, dos mais importantes porquês; ` Para Inspirá-las... As pessoas sadias não são inspiradas pelo trabalho em si mesmo. Elas se inspiram pelo propósito do trabalho, pelo resultado do trabalho, pelas prioridades e pelos objetivos intrínsecos; ` Para Controlá-las... Quando as coisas estão confusas e os negócios começam a desandar, a visão pode trazer a empresa de volta à realidade; ` Para Libertá-las... É difícil olhar para o futuro. Os eventos do passado pressionam as empresas a manterem a inércia. Essa é a maneira como sempre fizemos as coisas aqui, é o coro usual. A visão, nesse caso, pode abrir as portas para um futuro renovador. Em geral, a visão é um conjunto de valores e de princípios básicos de uma empresa. Uma declaração de sua interdependência (acionistas, colaboradores, consumidores e comunidade). A definição de suas prioridades, seus planos e objetivos. A determinação e publicação daquilo que a faz única e diferenciada. O impulso para o seu futuro. KAPLAN e NORTON2, recomendam que na criação da visão deve ser considerado um conjunto de premissas operacionais, tais como: 2 KAPLAN, Robert S.; NORTON, David P.; The Balanced Scorecard, 1 ed., Boston; Harvard Business School Press, 1996, 322 p.. ` Multifunções... Adoção de processos integrados de negócios que rompam as tradicionais funções, combinando os benefícios da especialização com a velocidade, a eficiência e a qualidade; ` Links com Clientes e Fornecedores... O pedido do cliente acionando automaticamente a rede de fornecimento que, por sua vez, num processo de melhoria contínua, está sempre em busca de redução de custos, aumento da qualidade e redução dos tempos de resposta; ` Segmentação do Cliente... O atendimento às necessidades específicas de um grupo, sem a cobrança de adicionais pela alta variedade e/ou baixos volumes; ` Escala Global... Não mais existem barreiras para a competência; ` Inovação... Antecipar as futuras necessidades dos clientes e dar-lhes serviços cada vez melhores é crítico para o sucesso a longo prazo; ` Colaboradores Capacitados... O principal trabalho de um colaborador é pensar, resolver problemas e assegurar a qualidade, necessitando sempre estar em constante evolução pessoal e profissional. Com o intuito de ajudar as empresas a desenvolverem uma visão, a Wharton School da Universidade da Pennsylvania conduziu mais de 1.000 entrevistas junto a executivos seniores, identificando 12 características listadas a seguir que irão definir uma empresa líder do Século XXI: ` Conduzida pela visão; ` Com multiplicidade de funções; ` Com poucos níveis hierárquicos que, por sua vez, atuam com autonomia; ` Global; ` Networked, ou seja, conectada, participante de redes e parceiras; ` Baseada na Tecnologia da Informação; ` Focada no retorno ao acionista; ` Flexível e adaptável; ` Direcionada pelo e para o cliente; ` Focada na qualidade total; ` Baseada no trabalho em equipe; ` Inovadora e empreendedora. Aqui no Brasil, em trabalho semelhante3 realizado alguns anos antes, foi feita a mesma pergunta e encontraram-se as mais diversas citações provenientes desde executivos bem-sucedidos a renomados consultores. Em síntese, o trabalho resultou numa relação de seis características de uma empresa moderna e vencedora, orientada às necessidades do consumidor e inserida num ambiente competitivo baseado na qualidade. Essas características, altamente relacionadas entre si, são: leveza, rapidez, exatidão, visibilidade, multiplicidade e consistência. 3 NASCIMENTO, Luiz Otavio da Silva; Propostas para empresas do próximo milênio; Novembro de 1993. LEVEZA A era das grandes estruturas passou. Vivemos os novos tempos da competição em que as gorduras e as ineficiências internas de uma empresa não podem ser transferidas ao preço do produto, sob pena de condená-la ao fracasso. As estruturas têm de ser pragmáticas, direcionadas somente ao essencial, ao que é crítico para o sucesso, e apoiadas por uma eficaz e eficiente tecnologia da informação. Os níveis hierárquicos têm de ser diminuídos e a distância entre a direção da empresa e o consumidor tem de ser encurtada, o que gera a necessidade de rever todos os processos, quer produtivos, quer administrativos, além do sistema de distribuição e toda a sua logística. A leveza requer uma clara definição de responsabilidades e autoridade, e conduz a um maior envolvimento de todos. RAPIDEZ No mundo dominado pela tecnologia da informação, onde a mesma é disponível on-line e em tempo real para um número cada vez maior de pessoas, a rapidez nas ações torna-se imprescindível. A todo instante surge uma nova ação a demandar por uma reação imediata, no sentido de preservar ou ampliar participações de mercado. Novos participantes estão sempre a aparecer para substituir os lentos e esse movimento é apoiado por encurtamento das distâncias, redução das barreiras alfandegárias, novas tecnologias, ciclo de vida de produtos cada vez mais curtos, maior disseminação da informação e pela ânsia do consumidor pelo novo. EXATIDÃO A velocidade em que atualmente as coisas acontecem e os custos envolvidos exigem que toda e qualquer ação seja exata, pois pode não haver tempo e recursos para reparação de erros. Isso determina a necessidade das empresas focarem o que é importante, ou seja, o crítico para o sucesso no seu negócio, tendo como base um sistema de informações mercadológicas que monitore continuamente as constantes mutações do ambiente, contemplando o consumidor e a concorrência. A base da exatidão é o binômio qualidade-tempo em que a informação é disponível, aliado ao poder de análise e tomada de decisão da empresa. VISIBILIDADE A imagem que cada participante do sistema de distribuição tem da empresa é fundamental para o estabelecimento de parceiras. Na extremidade do sistema está o consumidor, a cada dia mais ávido de informações e desejando firmar parceira com a empresa que visivelmente melhor atende às suas necessidades e que almeja um relacionamento duradouro, respeitando-o como pessoa e cidadão. A visibilidade é construída por ações e comunicação, mas estas não podem ser apenas pontuais e sim um processo contínuo e consistente com o posicionamento desejado, apoiado por prospecções contínuas da percepção da imagem da empresa por seus parceiros desejados. MULTIPLICIDADE Esta característica tem dois enfoques. O primeiro é interno: a cada dia é maior a necessidade de uma gerência generalista com visão múltipla e com capacitação para uso das mais diversas ferramentas administrativas. Esse tipo de gerência propicia uma estrutura leve, ágil e com maior poder de exatidão. O outro enfoque é o externo que requer uma visão múltipla do mercado, quer em termos geográficos, quer em termos de nichos advindos de uma maxisegmentação, exponenciada pelo fenômeno da globalização e representadas por estilos de vida, e não mais por classes sociais e/ou de renda. CONSISTÊNCIA A consistência das ações de uma empresa vem da manutenção de um processo rotineiro de cumprimento das decisões emanadas de um planejamento estratégico que contemple uma orientação às necessidades do consumidor e a busca da competitividade baseada na qualidade. A qualidade de um caminho de longo prazo é a base da consistência, pois o rumo estabelecido irá nortear as ações de curto prazo, mantendo a coerência independentemente dos múltiplos mercados onde a empresa estiver inserida. A consistência irá, também, validar a imagem que o consumidor tem da empresa, tornando sinérgico todo o processo. Luiz Otavio da Silva Nascimento é Sócio - Diretor e Membro do Conselho Executivo da PBS. Extraído da 2a Edição do livro Êxodo – da visão à ação – uma proposta para o varejo brasileiro, publicado pela Editora SENAC-SP.