Revista Eletrônica Novo Enfoque, ano 2013, v. 17, n. 17, p. 129 –133 STAPHYLOCOCCUS AUREUS RESISTENTES (MARSA) ISOLADOS EM PSITACÍDEOS MARQUES, Daniel dos Santos Melo1 MOURA, Marcos de Assis 2 BALTHAZAR, Daniel de Almeida3 RAMOS, Carolina Haje4 FREITAS, Adriano Biase de 4 OLIVEIRA, Daniel Roede de Andrade4 Palavras-chave: Staphylococcus aureus, MRSA, psitacídeos, zoonose. Introdução Ao longo do tempo, os animais silvestres, e principalmente as aves, estão se tornando cada vez mais populares como animais de companhia acarretando uma grande demanda de veterinários especializados nessa área para cuidar da saúde desses animais e instruírem os proprietários (SANTOS et.al., 2007). Dentre as aves “pet”, os Psitacídeos ocupam um lugar de destaque como animais de estimação, atraindo compradores no mercado interno e externo (SICK, 1997). Nos últimos anos, diversos estudos foram desenvolvidos demonstrando a resistência do Staphylococcus sp. a antimicrobianos, destacando-o como multirresistente a pelo menos três classes de antibióticos (LOEFFLER, A. et al. 2010; SPRINGER, B. et al. 2009). No Brasil, cerca de 40% a 60% dos S. aureus isolados de amostras clínicas oriundas de animais são Staphylococcus aureus resistentes à meticilina (MRSA) (SANTOS, A.L. et al. 2007; LOEFFLER, A. et al. 2010; SOUSA JUNIOR, F. C. et al. 2009). Nas últimas décadas, houve 1 Acadêmico Bolsista PIBIC&T/UCB (Vigência: Out./2012 a Out./2013). Laboratório de Microbiologia e Imunologia Veterinária da Universidade Castelo Branco. Curso de Medicina Veterinária da Universidade Castelo Branco, Campus Penha, Rio de Janeiro, RJ, Brasil. 2 Co-Orientador. Laboratório de Microbiologia e Imunologia Veterinária da Universidade Castelo Branco. Curso de Medicina Veterinária da Universidade Castelo Branco, Campus Penha, Rio de Janeiro, RJ, Brasil. 3 Orientador. Laboratório de Microbiologia e Imunologia Veterinária da Universidade Castelo Branco. Curso de Medicina Veterinária da Universidade Castelo Branco, Campus Penha, Rio de Janeiro, RJ, Brasil. 4 Acadêmicos do Curso de Medicina Veterinária da Universidade Castelo Branco, Laboratório de Microbiologia e Imunologia Veterinária da Universidade Castelo Branco. Campus Penha, Rio de Janeiro, RJ, Brasil. um aumento significativo da presença de MRSA em animais domésticos. Apesar de alguns autores considerarem o potencial antropozoonótico da infecção muito limitado, houve constatação nos Estados Unidos do aumento da presença de cepas resistentes à meticilina entre os anos de 2001 e 2005 em animais de companhia (JONES, R. D. et al. 2007). Penna et al., analisando amostras de duzentos cães acometidos por dermatite, otite externa ou cistite observaram um percentual de 86,5% de cepas multirresistentes, principalmente a betalactâmicos. Segundo FREITAS et al., em estudo realizado no Rio de Janeiro com S. aureus isolados do ouvido externo de cães e gatos, o meropenem foi sensível para todas as amostras testadas, seguido da cefuroxima, ciprofloxacino, cefalexina, vancomicina e ceftriaxona. A gentamicina e clindamicina apresentaram apenas 15% de resistência, mas também um alto percentual de amostras com sensibilidade intermediária (21,1% e 25%, respectivamente). Estudos com cepas de bactérias isoladas de aves silvestres têm demonstrado altos índices de resistência a antimicrobianos, mesmo em amostras de que essas aves provavelmente nunca foram tratadas com antibióticos (LEVEMORE et al. 2001; MIDDLETON & AMBROSE, 2005, DEBOER et al. 2007). No Brasil, estudo realizado em Minas Gerais reportou elevado índice de resistência bacteriana em amostras oriundas de pássaros selvagens de vida livre (NASCIMENTO et al. 2003). S. aureus presentes em animais apresentam considerável capacidade de transferência de determinante de resistência para cepas humanas e, por isso, as infecções por S. aureus multirresistentes em animais de companhia devem ser interpretadas como um problema de saúde pública, no entanto o inverso também ocorre e constitui um risco para a saúde do animal debilitado (SPRINGER et al., 2009). Tendo em vista o exposto, a falta de dados na literatura, o potencial risco para pessoas imunossuprimidas, portadores de neoplasias e que se submeteram a cirurgias recentes que tenham contato próximo com estas espécies de animais e o uso indiscriminado e inadequado de antimicrobianos tanto em humanos quanto em animais que este trabalho teve como objetivo caracterizar os perfis de resistência in vitro de cepas S. aureus obtidas da coana de psitacídeos com maior proximidade ao homem, do Jardim Zoológico do Rio de Janeiro (Fundação RioZoo), analisadas no Laboratório de Microbiologia e Imunologia Veterinária (LMIV) da Universidade Castelo Branco. Procedimentos Metodológicos Para o isolamento bacteriano, foram coletadas amostras da coana de 60 Psitacídeos, sendo 15 Ara ararauna, 15 Amazona aestiva, 15 Aratinga Leucophthalmus Amazona farinosa do Jardim Zoológico do Rio de Janeiro (Fundação RioZoo). As e 15 coletas 129 foram realizadas com auxílio de swabs Stuart (Meus S.R.L–Itália®), na região da coana, identificados com o número de registro do animal correspondente. As amostras foram mantidas refrigeradas entre 8-10ºC por no máximo 4 horas e transportadas ao LMIV, onde receberam numeração sequencial. O swabs foram semeados em caldo BHI (Brain Heart Infusion – Oxoid®) para enriquecimento primário. Em seguida, as amostras foram semeadas em ágar Sal Manitol (Mannitol Salt Agar Base – HMEDIA®). Após o crescimento, as colônias que continham bactérias gram positivas foram submetidas ao Teste de Catalase, Proteína A, Coagulase (Staphclin®) e Teste de Voges-Proskauer (KONEMAN, E. W. et al. 2008). Finalmente, as cepas positivas para todos os testes laboratoriais foram consideradas S. aureus e, destas, feitos os testes de susceptibilidade a antibióticos (TSA), seguindo o padrão estabelecido pelo CLSI (2011) em Muller-Hinton Agar (MicroMED®). Os antimicrobianos testados foram: Cefalexina, Ceftriaxona, Ciprofloxacino, Meropenem, Oxacilina, Penicilina e Vancomicina. Todas as análises foram realizadas em triplicata, e os resultados analisados e processados em banco dados da Microsoft Office Excel (Microsoft™). Todos os procedimentos de manipulação de animais foram aprovados pelo Comitê de Ética no Uso de Animais da Universidade Castelo Branco (CEUA - UCB), sob protocolo 059/12. Análise de dados As coletas obtidas de Ara ararauna evidenciaram a predominância do gênero Staphylococcus nas vias aéreas obtendo multirresistência em 25% das amostras, ou seja, 3/4 com sensibilidade ineficaz ao empregar pelo menos 3 antimicrobianos, envolvendo sempre betalactâmicos ou cefalosporinas nos maiores índices de ineficácia. Nesta espécie, foi possível isolar MRSA em 37,5% das amostras, o que representa a maior parte das resistências aos fármacos utilizados. Este número pode ser considerado alarmante, pois efetuando um comparativo com resultados de cães e gatos em diversos estudos anteriores obteve-se uma superação do percentual. O antibiótico de melhor eficácia tem sido o meropenem, obtendo 100% in vitro. Em Amazona aestiva foram encontradas 26,6% de cepas positivas para S. aureus. Se comparada à espécie anterior, exibiu cepas multirresistentes em todas as amostras isoladas, sendo que os S. aureus só demonstraram sensibilidade de 100% ao meropenem. Nestes animais, pôde-se encontrar 50% de cepas resistentes a oxacilina. Para a espécie Aratinga leucophthalmus obteve-se 13,3% de positividade para S. aureus, e por sua vez manteve o diagnóstico de cepas resistentes aos beta-lactâmicos, sendo 50% para 130 penicilina e 50% para oxacilina. Não houve deficiências de sensibilidade para as cefalosporinas, quinolonas e outras classes utilizadas. Quando analisada a espécie Amazona farinosa, 26,6% dos isolados eram S. aureus, sendo que dentro do grupo de animais que apresentaram S. aureus todos eram resistentes à penicilina e destes 100%, metade era resistente à vancomicina. O meropenem manteve-se com 100% de eficácia. Discussão de Resultados Após análise das amostras de coana dos sessenta psitacídeos saudáveis, obtivemos positividade em 16 (26,6%) das culturas para Staphylococcus aureus, demonstrando, assim, que o S. aureus também pode colonizar de forma assintomática os psitacídeos. A análise de resistência a antimicrobianos β-lactâmicos demonstrou que das 16 culturas positivas para S. aureus, 7 amostras foram resistentes à oxacilina, ou seja, 43,75% das amostras foram MRSA, seguido de 8 amostras resistentes à penicilina. Este trabalho revelou que o Meropenem foi sensível para todas as amostras positivas para S. aureus testadas (100%), seguido de ciprofloxacino e cefalexina (81,25% cada), vancomicina (75%), ceftriaxona (68,75%), oxacilina (56,25%) e penicilina (50%). A oxacilina apresentou um resultado preocupante, pois é o antibiótico de eleição para tratamento de S. aureus em humanos internados em Unidades de Terapia Intensiva; e das 16 amostras positivas, apresentou resistência em 7, ou seja, 43,75% de amostras resistentes. Este resultado demonstra que em psitacídeos o percentual de cepas resistentes à oxacilina é próximo ao que foi apresentado por cães com valor de 42,8% e inferior a 57,1% encontrado em gatos, segundo Freitas et al. Isso coloca os psitacídeos como um potencial meio de disseminação deste patógeno para humanos e outros animais. Como profissional de saúde que possui estreita relação e importância entre as saúdes animal e humana, o médico veterinário deve sempre estar atento e seguir as normas de biossegurança evitando a disseminação deste patógeno na comunidade. Além disso, devemos alertar para a importância do trabalho de controle e triagem MRSA em hospitais veterinários, considerando sempre o animal positivo como um importante reservatório e disseminador da infecção entre animais, seres humanos e no ambiente. Considerações Finais 131 De acordo com os dados previamente expostos, fica evidente que os animais de companhia albergam de forma assintomática cepas de Staphylococcus aureus resistentes e isso nos leva a alertar tantos os médicos veterinários quantos os proprietários desses animais sobre a importância de medidas preventivas a fim de evitar a disseminação desses patógenos. Para que a realidade de resistência a antimicrobianos encontrada na medicina humana não se torne uma realidade na medicina veterinária, é importante o uso racional e preciso de antibioticoterapia em animais domésticos, cabendo desta forma o incentivo para o uso do antibiograma com maior frequência pelos clínicos, tentando evitar assim a multirresistência e ineficácia dos antibióticos mais usados, principalmente na clínica de pequenos animais. Referências 1.DEBOER L.R. et al. Antimicrobial susceptibility of staphylococci isolated from the faeces of wild turkey (Meleagris gallopavo). Applied Microbiology, v 33 p.382-386, 2005. 2.FREITAS, A. B. et al. Staphylococcus Aureus resistentes em animais de companhia. Revista Eletrônica Novo Enfoque, Rio de Janeiro, v. 16, n. 16, p. 95 – 101, 2013. 3.JONES, R. D. et al. Prevalence of oxacillin- and multirresistant Staphylococci in clinical samples from dogs. Journal of American Veterinary Medical Association, v. 230, 2007. 4.KONEMAN, E. W. et al. Diagnóstico Microbiológico – Texto e Atlas Colorido. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2008, 1565p. 5.LEVEMORE D.M, et.al, 2001 Antibiotic resistance in bacteria from magpies (Pica pica) and rabbit (Oryctolagus cuniculus) from west wales. Everion. Microbiology v.3, p.658-661.2001. 6.LOEFFLER, A; LLOYD, D. H. Companion animals: a reservoir for methicillin-resistant Staphylococcus aureus in the community?. Epidemiology and Infection, n. 138, p. 595-605, 2010. 7.MIDDLETON J.H & AMBROSE.A. Enumaration and antibiotic resistance patterns of fecal indicator organism isolated from migratory Canada geese (Branta Canadensis) Journal Wild, v41, p.334-341. 2005. 8.NASCIMENTO A.M.A. et al. Antibiotic-resistant gram-negative bacteria in birds from the Brazilian Atlantic Forest. The Condor, v.105, p358-361. 2003. 9.PENNA, B. et al. Prevalência clínica de Staphylococcus sp de origem canina e sua resistência in vitro aos antimicrobianos. Clínica Veterinária, n. 90, p. 82-88, 2011. 10.SANTOS, A.L. et al. Staphylococcus aureus: visitando uma cepa de importância hospitalar. Jornal Brasileiro de Patologia Médica. v. 43.n.6,2007. 11.SICK HELMUT. Ornitologia brasileira. Rio de Janeiro. Nova Fronteira, 1997. 912 p 132 12.SOUSA JUNIOR, F. C. et al. Prevalência de Staphylococcus spp. Resistentes à meticilina isolados em uma maternidade escola da Cidade de Natal, Estado do Rio Grande do Norte. Revista da Sociedade Brasileira de Medicina Tropical. n. 42(2), p. 179-182, 2009. 13.SPRINGER, B. et al. Methicillin-resistant Staphylococcus aureus: a new zoonotic agent?. Wiener Klinische Wochenschrift: The middle European Journal of Medicine, n. 121, p. 8690, 2009. 133