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ESTUDO DA SÍNTESE DA POLIANILINA EM SOLUÇÃO DE ÁCIDO TARTÁRICO
Rafael Henrique Barbosa de Assis1,3; Olacir Alves Araújo2,3.
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Bolsista PIBIC/CNPq
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Pesquisador – Orientador
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Curso de Química Licenciatura, Unidade Universitária de Ciências Exatas e Tecno lógicas,
UEG
RESUMO
A Polianilina, polímero da anilina conhecido pela sua boa condutividade elétrica, foi
sintetizada utilizando-se como dopante o ácido tartárico e como agente oxidante o persulfato
de amônio visando a obtenção de um material com melhores propriedades mecânicas e
melhor solubilidade em solventes polares. As sínteses foram feitas em solução aquosa do
ácido selecionado, utilizando-se como variáveis as razões molares ácido tartárico/anilina nos
níveis 1,5; 3 e 4,5 e persulfato de amônio/anilina nos níveis 1,25; 2,5 e 3,75. Obteve-se
também a Polianilina dopada com ácido tartárico por dopagem direta da Base Esmeraldina
(forma eletricamente não-condutora da Polianilina) tendo como variável a razão ácido
tartárico/anilina nos níveis 1,5; 3 e 4,5. Medidas de espectroscopia no infravermelho
comprovaram a dopagem da Polianilina pelo ácido tartárico. Foram avaliados em cada
amostra a condutividade elétrica, o rendimento e a solubilidade.
Palavras Chave: polianilina; ácido tartárico; dopagem ácida
Introdução
Nos últimos 25 anos, a PAni e os demais polímeros intrinsecamente condutores (PIC)
têm despertado o interesse de vários grupos de pesquisa por apresentarem interessantes
propriedades elétricas e ópticas, possibilitando sua utilização em diversas aplicações
tecnológicas como: diodos emissores de luz, filmes para dissipação de carga elétrica,
blindagem da radiação eletromagnética, janelas inteligentes, sensores químicos e biosensores
como narizes eletrônicos, músculos artificiais, dispositivos eletrocrômicos, baterias
recarregáveis e etc (MAIA et al., 2000; FAEZ et al., 2000). A PAni possui um grande
potencial tecnológico devido à sua condutividade elétrica (~10 S.cm-1 ), alta estabilidade
química na forma oxidada e protonada, facilidade de síntese e eletrocromismo quando se varia
o pH ou o potencial elétrico (RODRIGUES, 1991), baixo custo do monômero, rota sintética
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simples, e reações com alto rendimento (HEEGER, 2001). Entretanto, a PAni, assim como os
demais polímeros condutores, são materiais de difícil processabilidade, pois são infusíveis e
apresentam baixa solubilidade nos solventes convencionais. Esta característica limita a
aplicação destes polímeros. Ultimamente, várias estratégias têm sido utilizadas para melhorar
a processabilidade da PAni. Um exemplo disso é a utilização de derivados substituídos da
anilina (GAZOTTI e DE PAOLI, 1996), a mistura de outros polímeros formando as chamadas
blendas (WANG et al., 2002; BAE et al., 2003; CHWANG et al., 2004) e a dopagem feita
com ácidos protônicos funcionalizados com grupos orgânicos, o que melhora a solubilidade
da PAni em solventes apolares (CAO et al., 1992). Com esta perspectiva de uso de ácidos
funcionalizados para melhorar as propriedades de mistura da polianilina, é interessante pensar
em um ácido que carregue outro grupamento polar ionizável de forma a propiciar uma melhor
compatibilidade entre a PAni e matrizes poliméricas polares bem como melhorar a sua
solubilidade em solventes polares e que apresentem menor toxicidade do que os solventes
orgânicos tradicionais. Neste contexto, o ácido tartárico (que apresenta dois grupamentos
ácido carboxílico) é uma espécie que apresenta as características adequadas para protonar a
PAni e ainda carregar um grupo polar ionizável capaz de interagir com substratos ou meios
polares.
Com base nas características estruturais do ácido tartárico e na necessidade de se
conferir à PAni uma melhor processabilidade, desenvolveu-se neste trabalho um método de
síntese da polianilina em solução de ácido tartárico de forma que este atue ao mesmo tempo
como dopante e como modificador estrutural visando melhorar a compatibilidade química
deste polímero com substratos e solventes polares.
Material e Métodos
A síntese química da PAni dopada com ácido tartárico (PAni(AT)) fo i realizada, em
triplicata, em duas etapas: a primeira, partindo de um planejamento fatorial 32 usando como
fatores a relação molar persulfato de amônio/anilina (PA/AN) nos níveis 1,25; 2,5 e 3,75 e
com relações molares ácido tartárico/anilina (AT/AN) nos níveis 1,5; 3,0 e 4,5 mantendo
constante a quantidade de anilina. Na segunda etapa foi feito um planejamento utilizando
razões molares PA/AN nos níveis 1,00 e 0,75 e as mesmas razões molares AT/AN nos três
níveis utilizados na primeira etapa. Em um erlenmeyer de 500 mL preparou-se a solução de
Ácido Tartárico (Merck) em 300 mL de água destilada. Esta solução permaneceu durante 15
minutos sob agitação em agitador magnético (Tecnal). Com a solução ainda sob agitação,
adicionou-se 2 mL de anilina (Synth). Esta solução foi resfriada em banho de gelo com sal
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grosso, até atingir temperatura no intervalo entre 0 - 5 ºC. Em um béquer de 200 mL
preparou-se uma solução de Persulfato de Amônio (Vetec) em 150 mL de água destilada.
Adicionou-se a solução recém-preparada de Persulfato de Amônio, gota-a-gota, à solução de
ácido tartárico e anilina sob agitação e com temperatura entre 0 e 5 ºC. O sistema foi mantido
sob agitação durante 5 horas. Após um período que variou de 5 a 10 dias, a dispersão da
PAni(AT) foi filtrada sob vácuo (Bomba de Vácuo Tecnal Scrubber TE-152), e lavada com
100 mL de água destilada. O material obtido na filtração foi seco em estufa à vácuo (Marconi
MA-030) a 80 ºC até obtenção de massa constante. O material seco foi pulverizado em
almofariz de porcelana.
Para a síntese direta da PAni (via dopagem da Base Esmeraldina), preparou-se
solução aquosa de NaOH (Vetec) 2 mol.L-1 . Adicionou-se 500 mL da solução de NaOH em
um erlenmeyer de 1000 mL, sob agitação magnética. Foi adicionada à solução de NaOH uma
amostra pulverizada de PAni(HCl) previamente sintetizada. O sistema foi mantido sob
agitação durante 5 horas à temperatura ambiente. Após três dias de repouso, a mistura foi
filtrada sob vácuo e lavada com 200 mL de água destilada. A base esmeraldina foi seca em
estufa à vácuo (Marconi MA-030) à 80 ºC até massa constante e pulverizada em almofariz.
Na obtenção da PAni(AT) via reprotonação da base esmeraldina (BE), manteve-se constante a
massa da BE, variando a razão molar ácido tartárico/nitrogênios da base (AT/N B). Utilizou-se
os valores de AT/N B de 1,5; 3,0 e 4,5. Em um béquer de 500 mL preparou-se 300 mL de
solução de ácido tartárico (Merck). 2,4990 g de base esmeraldina foram adicionados à solução
de ácido tartárico, mantendo o sistema sob agitação magnética durante 5 horas. Após um
período de repouso que variou de 3 a 5 dias, a mistura foi filtrada sob vácuo, utilizando na
lavagem 100 mL de água destilada. O material filtrado foi seco em estufa à vácuo a 80 ºC até
massa constante. Os materiais obtidos foram caracterizados por medida de condutividade
elétrica, espectroscopia na região do infravermelho e testes de solubilidade.
Resultados e Discussão
Os ensaios utilizando a relação PA/AN igual a 1,25 resultaram em um material de
coloração verde oliva, cor característica da PAni na sua forma condutora. Os valores de
rendimento nominal médio para essas sínteses foram os mais satisfatórios para os três níveis
escolhidos (1,25; 2,5 e 3,75) estando entre 62,4 + 9,9% e 69,1 + 2,6%. As sínteses realizadas
com a razão molar PA/AN igual a 2,5 resultaram em um material de coloração preta. Os
valores de rendimento nominal médio ficaram entre 55,37 + 10,9% e 67,10 + 7,7%. Os
elevados valores de desvio padrão para as relações AT/AN impossibilitaram a previs ão de
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qualquer tipo de influência deste parâmetro no rendimento nominal médio deste material. As
sínteses feitas com relação molar PA/AN igual a 3,75 resultaram em um material marron. Os
valores de rendimento nominal médio foram os menores entre os três níveis PA/AN usados,
ficando entre 43,98 + 3,7% e 54,49 + 4,1%. A diminuição no rendimento com o aumento na
quantidade de oxidante é um indicativo de que o excesso de persulfato de amônio continua
oxidando as cadeias poliméricas, de forma a causar a quebra dessas macromoléculas em um
efeito conhecido como sobreoxidação (SYED e DINESAN, 1991). Esses fragmentos de
cadeias poliméricas formam oligômeros, que são moléculas poliméricas menores e, portanto,
mais solúveis, que podem se separar da massa polimérica insolúvel durante a filtração.
As amostras com relação molar PA/AN igual a 1,25 apresentaram maior
condutividade elétrica, sendo observadas condutividades da ordem de 10-1 S.cm-1 . As
amostras obtidas com razões PA/AN igual a 2,5 apresentaram valores da ordem de 10-4 S.cm-1
e as com razões PA/AN igual a 3,75 apresentaram características de material isolante.
Conclui-se portanto, que a razão PA/AN igual a 1,25 é a mais adequada para a obtenção da
PAni(AT) com condutividade elétrica satisfatória.
A Figura 1 mostra os espectros na região do infravermelho para a base esmeraldina e
para a PAni(AT) obtida com a razão molar AT/AN igual a 1,25. A banda situada em 1587
cm-1 no espectro da base esmeraldina encontra-se deslocada para 1560 cm-1 e ligeiramente
mais larga no espectro da PAni(AT) como resultado da superposição provocada por absorção
característica do ácido tartárico. Segundo Silverstein (SILVERSTEIN, 1994) as vibrações de
estiramento axial C=O de ácidos carboxílicos não ionizados são caracterizadas por absorção
forte em 1760 cm-1 . Duas absorções, uma forte em torno de 1560 a 1610 cm-1 e outra fraca em
1400 cm-1 são atribuídas à presença de carboxilatos. Através dos dados fornecidos pelos
espectros, pode-se inferir que o ácido tartárico encontra-se presente na estrutura do material
polimérico e que os seus dois grupamentos ácido carboxílico encontram-se ionizados devido à
ausência de absorção forte em 1.760 cm-1 , característica de vibrações de estiramento axial
C=O de ácidos carboxílicos não ionizados. Duas absorções, uma forte e outra fraca,
caracterizam a presença de carboxilatos na estrutura da PAni: uma delas, em torno de 1560 a
1.610 cm-1 não foi observada pois deveria estar superposta junto à absorção atribuída ao
estiramento N=Q=N e C=C do anel aromático da PAni e a outra, encontra-se caracterizada
como um pequeno ombro em 1.400 cm-1 . A absorção forte em 1.306 cm-1 pode ser atribuída a
estiramento axial C-O e a absorção forte em 1.140 cm-1 é atribuída ao estiramento axial de
C-O dos grupamentos álcool do ácido tartárico.
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80
1587
1491
1375
1307
1215
1159
90
50
40
1400
60
50
40
1140
60
1560
1483
1306
Transmitância / %
829
1653
1628
Transmitância / %
70
70
530
80
30
30
4000
3500
3000
2500
2000
1500
1000
500
10
4000
-1
Número de Onda / cm
3471
3419
3466
3414
20
20
3500
3000
2500
2000
Número de Onda / cm
1500
1000
500
-1
Figura 1 – Espectro na região do infravermelho da base esmeraldina (à esquerda) e espectro
na região do infravermelho da PAni(AT) (à direita).
Nos testes de solubilidade feitos em etanol, diclorometano e NMP, observou-se que a
solub ilidade da PAni(AT) em NMP aumentou proporcionalmente à razão PA/AN e que nos
demais solventes a PAni pode ser considerada insolúvel. Possíveis ligações intermoleculares
formadas pelo ácido tartárico entre as cadeias da PAni podem ser responsáveis pela baixa
solubilidade da PAni(AT). Estas fortes interações coulombicas resultariam em uma maior
rigidez da estrutura como um todo provocando um possível aumento de regiões cristalinas na
massa polimérica, dificultando assim as interações solvente-soluto.
Nas sínteses da PAni(AT) com razões molares PA/AN inferiores a 1,25 observa-se
uma redução no rendimento nominal médio em relação aos valores observados nas sínteses
feitas com PA/AN igual a 1,25 e a condutividade elétrica observada para essas amostras são
da ordem de 10-2 S.cm-1 . Em termos de rendimento, não observou-se vantagem na síntese da
PAni(AT) via reprotonação da base esmeraldina quando comparada com a síntese oxidativa e
os rendimentos nominais de 63 a 64% observados são indícios de uma dopagem incompleta
ou o resultado do compartilhamento de moléculas de ácido tartárico por dois nitrogênios de
cadeias paralelas na formação de possíveis ligações intermoleculares. Observa-se ainda para a
PAni(AT) obtida por reprotonação da base esmeraldina, condutividades da ordem de
10-2 S.cm-1 , uma ordem de grandeza menor que as condutividades das amostras de PAni(AT)
obtidas por síntese direta com razão PA/AN de 1,25.
Conclusões
Através dos resultados obtidos conclui-se que a PAni(AT) pode ser obtida tanto pelo
método de síntese via oxidação química quanto pelo método de reprotonação da base
esmeraldina. Ao contrário do esperado, a inserção de um diácido carboxílico como dopante da
PAni não conduziu a uma melhoria na sua compatibilidade com solventes orgânicos. A
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possíve l existência de pontes de ácido tartárico talvez seja o motivo para tal fato pois, além de
proporcionar a formação de uma estrutura mais rígida, faz com que não haja grupamentos
ácido da molécula dopante disponíveis para interagir com o solvente. De acordo com a
escolha do nível PA/AN ideal (1,25) ou por reprotonação, é possível a obtenção da PAni(AT)
com rendimentos satisfatórios (60%) e condutividades elétricas típicas de semicondutores (da
ordem de 10-1 S.cm-1 ).
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