UNIVERSIDADE FEDERAL DO AMAZONAS – UFAM CURSO DE HISTÓRIA – 8º PERÍODO JOSÉ ESIVAL ROCHA DE SENA Resgate da Memória: Trabalhadores Braçais de Itacoatiara na década de 1970 Trabalho apresentado à Disciplina PRÁTICA VII, ministrada pelo Prof. Dr. Hideraldo Costa, como requisito para atribuição de nota do 1º exercício. MANAUS – AM 19 de Fevereiro de 2013 RESUMO O presente estudo de caso, constante dos processos judiciais trabalhistas nº. 05/73, 06/73, 07/73, 08/73 e 09/73 na Junta de Conciliação e Julgamento de Itacoatiara – AM, onde foi registrado o pedido dos trabalhadores braçais: Carlos Ferreira da Silva, Carlos Abreu de Barros, Jorge Fernandes de Souza, José Luiz Pará ROlim e Valdomiro Rodrigues Matos (reclamantes dos autos) contra a empresa Cia. Brasileira de Fiação de Tecelagem de Juta, despedidos por justa causa, por terem se negado a fazer hora extra. Requerem o pagamento de aviso prévio, férias proporcionais, gratificação de natal e FGTS. O objetivo desse trabalho é analisar a caixa de processo, verificar como esses profissionais do município de Itacoatiara na década de 70 procuraram a justiça para reivindicar seus direitos e como as empresas desrespeitavam as leis trabalhistas. I – CONSIDERAÇÕES INCIAIS Com base nos textos lidos, nas aulas e análise de alguns processos trabalhistas da caixa da Junta de Conciliação de Itacoatiara no período de 1973 para concretização desse trabalho, foram analisados 62 processos pela turma, todos em bom estado de conservação. Deram entrada na Junta de Conciliação e Julgamento de Itacoatiara, no dia 21 de maio de 1973, a reclamação contra a empresa Cia. Brasileira de Fiação e Tecelagem de Juta os seguintes trabalhadores: a) Carlos Ferreira da Silva, JCJ 05/73, casado, braçal, carteira profissional nº. 96.902. b) Carlos Abreu de Barros, JCJ 06/73, solteiro, braçal, carteira profissional nº. 69.711. c) Jorge Fernandes de Souza, JCJ 07/73, casado, braçal, carteira profissional nº. 38.167. d) José Luiz Pará Rolim, JCJ 08/73, casado, braçal, carteira profissional nº. 18.570. e) Valdomiro Rodrigues Matos, JCJ 09/73, solteiro, braçal, carteira profissional nº. 37.730. É uma reclamação formal, mas uma ação coletiva por se tratar do mesmo pedido. Os mesmos pediram na justiça a reversão da justa causa, dada pela empresa, por terem se negado a fazer hora extra. Os reclamantes recebiam salário de forma igualitária no valor de CR$ 206,40, pagos por semana; dentro da ação pediram aviso prévio, gratificação de natal, férias proporcionais e FGTS. Os valores dos pedidos foram respectivamente distribuídos de acordo com a seqüência abaixo: a) Cr$ 146,80 b) Cr$113,40 c) Cr$113,40 d) Cr$180,70 e) Cr$113,40 O reclamado, a Cia. Brasileira de Fiação e Tecelagem de Juta, alegou em sua defesa dos autos que: Os funcionários foram demitidos por justa causa por não concordarem em fazer hora extra, negaram-se a descarregar uma carga, haja vista que a empresa não disponibilizava de pessoal para tal tarefa, a realização só possível apenas na segunda-feira, apresentando, dessa forma, um prejuízo para a empresa. Em audiência realizada no dia 28 de abril de 1973, presidida pelo Juiz Presidente Antonio Carlos Marinho Bezerra, as partes conciliaram-se, sendo determinado pelo juiz o pagamento, no dia 30 de maio de 1973, a quantia de Cr$ 256,00 sendo os valores distribuídos da seguinte forma: a) Carlos Ferreira, Cr$ 56,00 b) Carlos Abreu, Cr$ 56,00 c) Jorge Fernandes, Cr$ 56,00 d) José Luiz Pará, Cr$ 32,00 e) Valdomiro Rodrigues, Cr$ 56,00 II – METODOLOGIA Os processos judiciais trabalhistas apresentam-se como fontes de valor inexorável para os historiadores e os cientistas sociais para conhecer e compreender o mundo do trabalho e dos trabalhadores no campo da História Social. Pois, com acesso a essas fontes, esses profissionais ajudarão a desmistificar a historiografia tradicional, de uma analise reducionista da história, que procurou ver o campo do trabalho e dos trabalhadores apenas por um viés da historiografia inglesa do século XIX, o trabalhador participativo de uma classe. A historiografia brasileira deixou de perceber o escravo como trabalhador e entender que no Brasil, o trabalho e os trabalhadores tinham outras peculiaridades, que o mesmo, independente de sindicato, de lugar, escolaridade, condição social, procurou a justiça para valer seus direitos. Esse novo redirecionamento da história, de trabalhar com os processos judiciais como fonte, de perceber outros sujeitos, até então calados, começa a lhes dar ouvido, voz e a lhes retratar. Essa nova abordagem de fazer história é recente, começou na Europa a partir da década de 1960, e no Brasil foi introduzido em meados dos anos 80 com a redemocratização do país. Como diz Benito Bisso Schmidt no seu texto: Porém, desde meados da década de 1980, acompanhando o processo de redemocratização da política do país, a historiografia social brasileira, em intenso diálogo com a historiografia marxista britânica, procurou corrigir esse reducionismo, desviando o foco dos líderes e das organizações para o trabalhador comum e a vida quotidiana, voltando-se para as múltiplas formas de dominação de resistência que se manifesta nas fábricas, nas vidas operárias, nos períodos de lazer, entre outros.1 1 Schimidt, Benito Bisso. (org.) Trabalho, justiça e direitos no Brasil. - Pesquisa histórica e preservação das fontes. São Leopoldo, Oikos, 2010. (Pg. 26) III – Trabalhadores Braçais, profissionais comum em Itacoatiara na década de 1970. Ao analisar o processo escolhido e a leitura parcial de todos os processos da caixa, foi observado que a maioria dos reclamantes trabalhava como braçais. Talvez isso se justifique porque Itacoatiara na década de 70 era uma cidade com traços predominantemente rurais. A maior parte da população que veio constituir o município era do interior e com pouca escolaridade. O processo demonstrou que os trabalhadores braçais de Itacoatiara, apesar de não serem organizados, possuir um sindicato, em nenhum momento foram passivos, e que sim, lutaram e resistiram contra o desmando do patrão. Podemos citar como exemplo, quando se negaram a fazer hora extra ou quando eles procuraram a justiça para denunciar e reivindicar seus direitos. Outro aspecto importante a ser ressaltado nesse texto, foi quando se verificou que dos sessenta e dois processos da caixa, vinte eram reclamatórias contra a S/A Fazenda Boa Vista, logo depois vem a Cia. De Fiação e Tecelagem de Juta com sete processos, em seguida, com o mesmo número de processos, vem a Nibro do Amazonas Ltda. Todos esses processos eram de trabalhadores braçais, onde se percebe a não valorização desse profissional e o desrespeito pelas empresas quanto ao cumprimento das leis trabalhistas. Citamos como exemplo o processo analisado, onde a empresa Cia. Brasileira de Fiação e Tecelagem de Juta dispensou cinco funcionários por justa causa, por terem se negado a fazer hora extra. Com base na CLT, no Art. 61, do decreto lei 5.452/43, que fala sobre a hora extra e segue uma análise sobre a lei: “A jornada legal é de 44 horas semanais. O empregado recebe salário por esse montante de labor. Sendo o contrato de trabalho sintagmático, tem o empregado deveres, bem como a empresa”. Pois bem, não existe artigo de lei que obrigue o empregado a prestar serviço em período superior, ficando a critério do mesmo. O empregado não responde pelos riscos do negócio, a empresa sim. “Assim, não é possível, em qualquer hipótese, seja a convite ou não, a advertência de um empregado pela não realização de horas extras”. (uj.novaprolink.com.br) O município de Itacoatiara desde o final do império já se apresentava como uma das três cidades mais populosas do Estado do Amazonas, perdendo apenas para Manaus e Parintins. Se compararmos os censos de 1970 e 1980, percebemos que houve um aumento considerável na população do município, que em 1970 era cerca de 37,346 e em 1980 passou para 52.882 mil habitantes. Esse crescimento se deu provavelmente pela construção da rodovia AM-10, durante a década de 1960, inicio do governo militar, que tinha como projeto o desenvolvimento do Brasil. Depois de sua inauguração, notou-se um grande fluxo migratório para Itacoatiara, principalmente de homens atrás de emprego. Itacoatiara, nesse período, demonstrou ser bastante desenvolvida, com muitas opções de trabalho e tendo a base da economia sustentada pelas atividades primárias e terciárias. IV – CONSIDERAÇÕES FINAIS Os processos judiciais trabalhistas precisam ser preservados, digitalizados e disponibilizados para as universidades públicas e privadas, e as escolas tanto da rede estadual quanto da rede pública, e a população em geral. Mas, para que isso aconteça, é necessário que o Estado tenha políticas públicas e parecerias com esses órgãos, para serem digitalizados e preservados. Só assim estaremos fazendo história e resgatando a memória dos sujeitos que ficaram invisíveis para a história. Talvez ainda não percebamos o quanto essas fontes são importantes para o historiador de hoje, mas para as sociedades futuras estaremos deixando um grande legado. Vejo com bons olhos a forma como essa disciplina está sendo ministrada, pois se desde o início da graduação tivéssemos disciplinas com esse teor, onde trabalha a teoria e a prática sem se distanciar, não estaríamos com tanta dificuldade para escreve monografia; o contato direto com essas fontes foi de extrema importância, porque possibilitou alargar o meu olhar sobre as fontes. Dessa forma, penso que a grade do curso deveria ser revista, dando ênfase a e pesquisa, mas desde que a teoria e prática fossem trabalhadas simultaneamente, só assim os graduandos terão uma formação melhor. V – BIBLIOGRAFIA E FONTES UTILIZADAS www.ombmg.org.br http://memoria.trt11.jus.br www.biblioteca.ibge.go.br CHALHOUB, Sidney. O Conhecimento da História, o Direito à memória e os Arquivos Judiciais. IN SCHMIDT, Benito (org.). Trabalho, justiça e direitos no Brasil: Pesquisa histórica e preservação das fontes. São Leopoldo, Oikos, 2010. PETERSEN, Silvia Regina Ferraz. Imprensa periódica como fonte para a pesquisa sobre os direitos do trabalhador. IN SCHMIDT, Benito (org.). Trabalho, justiça e direitos no Brasil: Pesquisa histórica e preservação das fontes. São Leopoldo, Oikos, 2010. SCHMIDT, Benito Bisso. Trabalho, Justiça e Direitos: perspectivas historiográficas; IN SCHMIDT, Benito (org.). Trabalho, justiça e direitos no Brasil: Pesquisa histórica e preservação das fontes. São Leopoldo, Oikos, 2010.