1351 Abuso sexual intrafamiliar: do silêncio ao seu enfrentamento V Mostra de Pesquisa da PósGraduação Jaina Raqueli Pedersen1, Patrícia Krieger Grossi2 (orientador) 1 Mestre em Serviço Social pelo Programa de Pós Graduação em Serviço Social, Faculdade de Serviço social, PUCRS, 2 Doutora em Serviço Social, professora no Programa de Pós Graduação em Serviço Social, Faculdade de Serviço Social, PUCRS. Resumo O abuso sexual intrafamiliar contra crianças e adolescentes configura-se como um problema social vivenciado por milhares de crianças e adolescentes a longa data. Recentemente, devido aos avanços legais, crianças e adolescentes foram reconhecidos como sujeitos de direitos e merecedores de proteção integral, contribuindo para uma maior visibilidade do abuso sexual e preocupação por parte da sociedade. Profissionais como Assistentes Sociais que trabalham com estes sujeitos, visando à proteção e garantia dos direitos dessa população, reconhecem o abuso sexual intrafamiliar, assim como as demais formas de manifestação da violência, como expressões da questão social e, portanto, objeto de seu trabalho profissional. A família, de um modo geral, também vem sendo vítima de vários processos sociais, decorrentes do atual contexto da sociedade capitalista e mais especificamente da reestruturação produtiva, que vem impondo limites e dificuldades para este grupo social. Para poder resistir a este cenário vem se organizando das mais diversas formas para cumprir com o seu papel protetivo, o que nem sempre é possível. Famílias que experimentam os efeitos dessa realidade, através das mais perversas formas de inserção na sociedade capitalista, sentem-se desprotegidas para cuidar de seus membros. Consequentemente, esta desproteção contribui para o aumento da violência intrafamiliar, em especial do abuso sexual envolvendo crianças e adolescentes. V Mostra de Pesquisa da Pós-Graduação – PUCRS, 2010 1352 Introdução O presente estudo versa sobre a vitimização sexual de crianças e adolescentes através do abuso sexual intrafamiliar enquanto expressão da questão social. Seu objetivo consiste em analisar criticamente as expressões da questão social que contribuem para a vitimização de crianças e adolescentes através do abuso sexual intrafamiliar e as estratégias de enfrentamento adotadas pelas famílias destes sujeitos a partir da inserção no Serviço de Enfrentamento à Violência, ao Abuso e à Exploração Sexual contra Crianças e Adolescentes, a fim de contribuir com subsídios para a sua qualificação. No que se refere ao abuso sexual este É definido como qualquer interação, contato ou envolvimento da criança ou adolescente em atividades sexuais que ela não compreende, não consente, violando assim as regras legais da sociedade. [...] significa todo ato ou relação sexual erótica, destinada a buscar prazer sexual. A gama de atos é bastante ampla abrangendo atividades: sem contato físico – voyeurismo, cantadas obscenas, etc.; com contato físico, implicando graus diferentes de intimidade que vão dos beijos, carícias nos órgãos sexuais até cópulas (oral, anal, vaginal); sem emprego da força física; mediante emprego da força física (SCOBERNATTI, 2005, p. 99-100). Metodologia Trata-se de uma pesquisa qualitativa desenvolvida com nove (9) familiares de crianças e adolescentes vítimas de abuso sexual intrafamiliar, duas (2) Assistentes Sociais e uma (1) Psicóloga do Serviço de Enfrentamento à violência, abuso e exploração sexual do município de Carazinho/RS e duas (2) estagiárias de Serviço Social, a partir de entrevistas com aplicação de um formulário com questões abertas e fechadas. As entrevistas com os familiares foram realizadas no domicílio, sendo estas gravadas e as entrevistas com os profissionais e estagiárias foram realizadas na instituição, sendo posteriormente submetidas à análise de conteúdo de Bardin. Foi também utilizada a observação sistemática das condições de moradia e do entorno. Realizou-se também a análise documental do Relatório Anual do Sistema de Acompanhamento Qualiquantitativo do Sentinela, a partir de um roteiro de análise documental. Resultados (ou Resultados e Discussão) No que se refere às principais características sócio-demográficas das famílias, os resultados da pesquisa apontam que em relação às mães das vítimas, apresentam em sua maioria, faixa etária entre 22 e 29 anos, ensino médio incompleto, o lar como espaço de trabalho. Destaca-se que em relação aos pais das vítimas, seis estão separados o que dificultou V Mostra de Pesquisa da Pós-Graduação – PUCRS, 2010 1353 o acesso a informações referentes à figura paterna. No que se refere ao sexo das crianças ou adolescentes abusados, destaca-se o predomínio do sexo feminino (6) em relação ao sexo masculino (3). Quanto às estratégias de enfrentamento a violência mais utilizada pela família a partir da inserção no Serviço de Enfrentamento à Violência, ao Abuso e à Exploração Sexual contra Crianças e Adolescentes, ressalta-se principalmente a permanência das famílias no referido serviço, e o apoio das mães às vítimas, o que contribui para o enfrentamento da intergeracionalidade da violência nas famílias estudadas. Dentre as limitações do Serviço de Enfrentamento à Violência, ao Abuso e à Exploração sexual de crianças e adolescentes no enfrentamento do abuso sexual intrafamiliar, destaca-se a insuficiência de recursos institucionais, precariedade das condições de trabalho das profissionais e de acesso das famílias ao Serviço. Quanto as suas possibilidades, ressalta-se que o próprio processo de atendimento e acompanhamento das vítimas de abuso sexual intrafamiliar contribui para que estas repensem sua condição de vítimas e insiram-se no processo de enfrentamento da violência. Conclusão Visando contribuir com subsídios para a qualificação do Serviço de enfrentamento à violência, ao abuso e à exploração sexual de crianças e adolescentes, chama-se a atenção para o fato de que o enfrentamento do abuso sexual, assim como o de outras formas de violência, está para além dos serviços e programas sociais, ou seja, é uma questão que não se resume ao âmbito local, mas que está posta para a sociedade contemporânea a partir do desfecho e da manutenção do sistema econômico capitalista e às transformações que este provoca nas relações sociais e nos processos de socialização. Em outras palavras, pensar o enfrentamento do abuso sexual intrafamiliar requer a sua articulação à manifestação da violência estrutural e à necessidade de um novo projeto societário capaz de potencializar princípios que ampliem a humanização das relações sociais e possibilitem a crianças e adolescentes crescer e se desenvolver livres dos processos de individualização e da reprodução social pautada na coisificação do ser humano. Caso tenha alguma esse espaço pode ser utilizado. Referências BARDIN, Laurence. Análise de conteúdo. Rio de Janeiro. Edições 70, 1977. SCOBERNATTI, G., Violência intrafamiliar: teoria e prática – uma abordagem interdisciplinar. Pelotas: Armazém Literário, 2005. AZEVEDO, Maria Amélia; GUERRA, Viviane Nogueira de Azevedo. Crianças vitimizadas: a síndrome do pequeno poder. 2. ed. São Paulo: Iglu, 2000. V Mostra de Pesquisa da Pós-Graduação – PUCRS, 2010