ATIVISMO JUDICIAL E A TEORIA DA SEPARAÇÃO DOS PODERES1 JUDICIAL ACTIVISM AND THE THEORY OF THE SEPARATION OF POWERS RESUMO O presente estudo tem por objetivo diferenciar os institutos do Ativismo Judicial e da Judicialização do Direito. O Ativismo Judicial surgiu após a 2º grande guerra mundial com a ascensão dos Direitos Fundamentais e a decadência do Constitucionalismo Liberal, surgindo então uma nova doutrina constitucional: o Neo-Constitucionalismo. A Judicialização do Direito é um fenômeno contingencial, decorrente da própria Constituição e permite que o Poder Judiciário aprecie questões de ordem social e política. O Ativismo Judicial, se aliado com o instituto da judicialização transforma o Judiciário em uma espécie de “constituinte”, e isso acaba por invadir a esfera do Poder Legislativo, ferindo de forma direta ao principio da Separação dos Poderes de Montesquieu consagrado no artigo 2º Constituição Federal de 1988, como uma Clausula Pétrea, ou seja, não pode ser alterado nem mesmo por Emenda Constitucional. Faz-se isso por meio de referências bibliográficas e análise de casos práticos no Supremo Tribunal Federal, como por exemplo, o recente julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade número 4277 que decidiu sobre a União Estável Homoafetiva. Palavras-Chave: Ativismo Judicial. Judicialização do Direito. Teoria da Separação dos Poderes. ABSTRACT This study aims to distinguish the institutes of Judicial Activism and Judicialization law. The Judicial Activism arose after the 2nd Artigo apresentado por Camila Loureiro Moutinho, graduanda em direito pela Faculdade de Direito do Sul de Minas, sob a orientação do Professor Mestre Leandro Côrrea de Oliveira, ao Programa de Iniciação Científica da Faculdade de Direito do Sul de Minas com apoio e financiamento da Fundação de Amparo à Pesquisa de Minas Gerais. 1 world war with the rise of Fundamental Rights and the decline of Liberal Constitutionalism, appearing then a new constitutional doctrine: the Neo-Constitutionalism. The Judicialization law is a contingent phenomenon, arising from the Constitution itself and allows the judiciary enjoy social issues and politics. The Activism Judicial allied itself with the Institute of judicialization transformed the judiciary into a kind of "constituent" and it turns out to invade the sphere of the Legislature, wounding directly to the principle of Separation of Powers Montesquieu set out in Article 2 of the Constitution of 1988, as a stony clause, or can not be changed even by constitutional amendment. This is done by means of references and analysis of practical cases in the Supreme Court, for example, the recent trial of the Direct Action of Unconstitutionality number 4277 which ruled on the Union Homoafetiva Stable. Keywords: Judicial Activism. Judicialization of the law. Theory of Separation of Powers. INTRODUÇÃO Verifica-se, a partir do segundo pós-guerra o aumento do protagonismo judicial em razão da ascensão dos Direitos Fundamentais e a decadência do Constitucionalismo Liberal, surgindo então o chamado Neo-Constitucionalismo. Dá-se através de uma participação mais ampla e intensa do judiciário na concretização dos princípios e direitos fundamentais. Decorre da necessidade do poder judiciário em suprir as omissões e conter os abusos do poder legislativo e executivo. Com o advento do chamando neo-constitucionalismo surgiu a idéia de que os princípios constitucionais substituem os princípios gerais de direito e que aqueles princípios possibilitam ao magistrado a possibilidade de decidir, sem necessidade de embasamento legal, apenas pela interpretação principiológica constitucional. A Judicialização é um fenômeno contingencial, decorre do próprio texto constitucional que permite que diversas questões de ordem política ou social, sejam levadas a apreciação do Poder Judiciário, ocorrendo então uma judicialização dessas questões. O fenômeno do Ativismo Judicial, se aliado com o instituto da judicialização, transforma o Judiciário em uma espécie de “constituinte”, que invade a esfera do Poder Legislativo, ferindo de forma direta ao principio da Separação dos Poderes de Montesquieu consagrado na Constituição Federal de 1988. 1. Ativismo Judicial e a Judicialização do Direito 1.1. Ativismo Judicial O Ativismo Judicial pode ser entendido como uma atitude, uma posição filosófica do intérprete, uma próatividade na concretização da CRFB, em resumo, levar a CRFB em lugares que nela não estão previstos. 2 De acordo com Carla Kalcenik3 uma das principais características que diferencia o Poder Judiciário dos outros dois poderes é a sua inércia. Enquanto o poder executivo e o poder legislativo atuam "ex officio" o poder judiciário precisa ser provocado. Essa característica tem por objetivo assegurar a imparcialidade do juiz. Foi essa idéia que Montesquieu manifestou quando elaborou a teoria da separação dos poderes. Ainda de acordo com Carla Kacelnik, no período conhecido como Pós-Guerra, foram criados os Tribunais Constitucionais, que tinha como finalidade principal resguardar os direitos fundamentais. Mesmo que o Parlamento praticasse um ato que a sociedade aprovasse, obedecendo assim o princípio democrático, se esse ato 2KALCENIK, Carla. Controle de Constitucionalidade e o Ativismo Judicial. 2009. 72 f. Monografia (Bacharel) - PUC Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2009. 3idem fosse contrário aos direitos fundamentais estabelecidos na Constituição, o Tribunal Constitucional deveria intervir. Os tribunais constitucionais eram baseados na idéia de Kelsen e eram órgãos autônomos e independentes, sem qualquer relação com os demais poderes, principalmente o poder judiciário, porém, os integrantes do tribunal constitucional tinham as mesmas prerrogativas dos integrantes do Poder Judiciário. As Constituições criadas no pós-guerra tinham um caráter bastante principiológico, trazendo em seu texto diversos princípios que acabam por estender o papel do poder judiciário na condição de interprete da lei em detrimento do legislador, uma vez que deixa mais espaço para interpretações, que acabam por “construir” um novo direito. Nesse contexto de pós-guerra surge o Ativismo Judicial, através principalmente da jurisprudência norte-americana, quando se deu uma ascensão dos Direitos Fundamentais e a decadência do Constitucionalismo Liberal, surgindo então o chamado Neo- Constitucionalismo. Dá-se através de uma participação mais ampla e intensa do judiciário na concretização dos princípios e direitos fundamentais. Pode ocorrer através do controle de constitucionalidade bem como através da edição de súmulas vinculantes. Porém, não é qualquer manifestação acerca do controle de constitucionalidade, por exemplo, que configura a prática do ativismo judicial. Se esta manifestação estiver de acordo com o estabelecido pela Constituição Federal, não estará configurada a prática ativista, ou seja, para que seja configurada uma decisão ativista, esta deve estar além do objeto de seu conhecimento, deve estar invadindo a competência de outro órgão. O ativismo judicial pode ser praticado tanto no exercício da prestação jurisdicional (por meio dos autos do processo) quanto de forma externa aos autos pelos magistrados como, por exemplo, em entrevistas, discursos de posse e pronunciamentos fora dos autos dos processos. O ativismo extra jurisdicional torna explícita uma dimensão de "politização do Judiciário", aproximando-o do modo de atuação dos demais poderes de Estado, os quais são legitimados democraticamente para tanto. 4 Segundo Cass Sunstein, “o ativismo judicial pode ser mensurado pela freqüência com que um determinado magistrado ou tribunal invalida as ações de outros poderes de Estado, especialmente do Poder Legislativo.” 5 Vanice Regina Lírio do Vale explica que “Além disso, também será considerado ativista o magistrado ou tribunal que procura suprir omissões (reais ou aparentes) dos demais Poderes com suas decisões.”6 No mundo atual, é imprescindível que direitos sociais sejam efetivados, e isso é tarefa primordial do poder público, executivo e do poder legislativo, que tem o dever de realizar projetos sociais que visem integrar a sociedade e criar leis que possibilitem essa integração e a efetivação de tais direitos, respectivamente. Entretanto, muitas vezes esses poderes são inertes nessas questões, deixando de agir nesse sentido. Diante dessa inércia, surge o poder judiciário, invadindo a esfera do poder legislativo, principalmente através do Supremo Tribunal Federal no Brasil, que proferem suas decisões obrigando os outros poderes a garantir políticas públicas, voltadas à efetivação desses direitos. Para alguns estudiosos, a violação dos direitos fundamentais justifica a prática do ativismo judicial: O STF tem a atribuição constitucional de ser o guardião da Constituição Federal e, se necessário, aplicará 4VIEIRA. José Ribas, SILVA. Alexandre Garrido da, CHALOUB. Jorge de Souza, MEDEIROS. Bernardo Abreu de, PESSANHA. Daniella dos Santos. Ativismo Judicial, judicialização da política e garantismo no Supremo Tribunal Federal. IN: I Fórum de Grupos de Pesquisa em Direito Constitucional e Teoria do Direito. Anais eletrônicos. Disponível em: http://www.arcos.org.br/livros/anais-do-i-forum-degrupos-de-pesquisa-em-direito-constitucional-e-teoria-do-direito/3-ativismo-judicialjudicializacao-da-politica-e-garantismo-no-supremo-tribunal-federal/. Acesso em: 06 de dez. 2011. 5 SUNSTEIN, Cass. Radicals in robes: why extreme right-wing Courts are wrong for America. 6 VALLE, Vanice Regina Lírio do. Ativismo Jurisdicional e o Supremo Tribunal Federal. Juruá Editora: Curitiba, 2009. preceitos constitucionais diretamente a situações não expressamente contempladas em seu texto. Neste momento, o Supremo atuará otimizando princípios consagrados na Carta Magna, por meio de interpretação adequada e que dessa possa dar concretude a reais anseios e valores da sociedade. Então a Corte se valerá não apenas no espaço de abstração que os princípios facultam ao intérprete, mas terá ainda o fundamento normativo para a tomada da decisão necessária em dada oportunidade. 7 O ministro do Supremo Tribunal Federal, Celso Melo8 também faz parte dos juristas que se posicionam a favor do ativismo judicial. Segundo o Ministro, as leis brasileiras são de baixa qualidade e é por essa razão que os juízes devem ter um papel mais ativo na interpretação das leis e até mesmo da constituição. Entretanto, esse não é o entendimento mais correto, uma vez que a prática do ativismo judicial gera insegurança jurídica e fere de forma expressa o princípio da separação dos poderes, uma vez que o Poder Judiciário vem invadindo a esfera do Legislativo de forma clara ao legislar no lugar dos parlamentares, representantes diretos e legítimos do povo, sendo assim, o Direito, ao ser legislado pelo STF não provém da vontade do povo. 1.2 Judicialização do Direito Judicialização significa que algumas questões de larga repercussão política ou social estão sendo decididas por órgãos do Poder Judiciário, e não pelas instâncias políticas tradicionais: O Congresso Nacional e o Poder Executivo. (...) Como intuitivo, a judicialização envolve uma transferência de poder para juízes e tribunais, com alterações significativas na linguagem, na argumentação e no modo de participação da sociedade.9 7SILVA, Renato Jardim da. A Expressão do Legítimo Ativismo Judicial:decisões que respeitam a vontade do constituinte originário à luz dos valores sociais hodienos. 2009. 72 f. Monografia (Bacharel) - Escola Superior Mpdft, Brasília, 2009. 8FILHO. José Celso de Mello. Supremo Constituinte. Conjur. 15 de março de 2006. Entrevista concedida a Consultor Jurídico. Disponível em: http://www.conjur.com.br/2006-mar-15/juizes_papel_ativo_interpretacao_lei Acesso em: 12 de jan.2012. 9BARROSO, Luís Roberto. Judicialização, Ativismo Judicial e Legitimidade Democrática.Disponível em: De acordo com Carla Kacelnik "Judicialização da Política é o efeito de transgredir a competência decisória dos Poderes Legislativo e Executivo para o Poder Judiciário."10 Ernani Rodrigues Carvalho conceitua a Judicialização como uma “reação do Judiciário frente à provocação de um terceiro e tem por finalidade revisar a decisão de um poder político tomando como base a Constituição.” 11Débora Alves e Andrei Koerner entendem que: Judicializar a política é valer-se dos métodos típicos da decisão judicial na resolução de disputas e demandas nas arenas políticas em dois contextos. O primeiro resultaria da ampliação das áreas de atuação dos tribunais pela via de poder de revisão judicial de ações legislativas e executivas, baseando na constitucionalização de direitos e dos mecanismos de checks and balances. O segundo contexto, mais difuso, seria constituído pela introdução ou expansão de staff judicial ou de procedimentos judiciais no Executivo e Legislativo.12 O instituto da Judicialização do Direito (ou das decisões políticas) é bem próximo do instituto do ativismo judicial, entretanto, com este não se confunde. Apesar de muito próximos, os fenômenos da judicialização e do ativismo judicial não se confundem. O ativismo judicial pode ser descrito como uma atitude, decisão ou comportamento dos magistrados no sentido de revisar temas e questões - prima facie - de competência de outras instituições. Por sua vez, a judicialização da política, mais ampla e estrutural, cuidaria de macro-condições jurídicas, políticas e institucionais que favoreceriam a transferência decisória do eixo Poder Legislativo - Poder Executivo para o Poder Judiciário. 13 <http://www.direitofranca.br/direitonovo/FKCEimagens/file/ArtigoBarroso_para_Se lecao.pdf>. Acesso em: 21 jan. 2012. 10KACELNIK, Carla. Controle de Constitucionalidade e o Ativismo Judicial. 2009. 72 f. Monografia (Bacharel) - PUC Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2009. 11CARVALHO, Ernani Rodrigues. Em busca da judicialização da política no Brasil: apontamentos para uma nova abordagem. Rev. Sociol. Polit. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S010444782004000200011&lng=en&nrm=iso> Acesso em 17 de janeiro de 2012. 12MACIEL, Débora Alves; KOERNER, Andrei. Sentidos da Judicialização da Política: duas análises. Disponível em <http://www.scielo.br/pdf/%0D/ln/n57/a06n57.pdf> Acesso em 05 de dezembro de 2011. 13VIEIRA. José Ribas, SILVA. Alexandre Garrido da, CHALOUB. Jorge de Souza, MEDEIROS. Bernardo Abreu de, PESSANHA. Daniella dos Santos. Ativismo Judicial, A judicialização, no contexto brasileiro, é um fato, uma circunstância que decorre do modelo constitucional que se adotou, e não um exercício deliberado de vontade política(...) Já o ativismo judicial é uma atitude, a escolha de um modo específico e proativo de interpretar a Constituição, expandindo o seu sentido e alcance. Normalmente ele se instala em situações de retração do Poder Legislativo, de um certo descolamento entre a classe política e a sociedade civil, impedindo que as demandas sociais sejam atendidas de maneira efetiva.14 Para Débora Alves e Andrei Koerner, o fenômeno da Judicialização do Direito (ou das decisões políticas) é uma forma de superação da teoria da separação dos poderes, ampliando assim os poderes dos Tribunais. A judicialização da política é um fenômeno mundial que se agrava em decorrência do controle de constitucionalidade, principalmente o controle misto. No Brasil, a Judicialização da Política se potencializou devido a alguns motivos especiais: 1) a redemocratização, fazendo com que juízes e tribunais recuperassem suas garantias e prerrogativas, passando a ter um poder político, além de criar novos direitos, um novo conceito de cidadania; 2) o modelo constitucional brasileiro que é abrangente, isto é, a Constituição trata de muitos temas e trazer uma matéria para dentro da Constituição facilita que ela seja judicializada (transformar a política em direito); 3) o sistema brasileiro de controle de constitucionalidade que é misto, todo juiz e tribunal pode declarar a inconstitucionalidade, de acordo com o modelo norte-americano, e há também a ação direta de inconstitucionalidade proposta perante o STF em face de uma norma, de acordo com o modelo europeu.15 O cenário histórico que deu origem à Judicialização da Política foi a decadência do Império Soviético ao final da guerra fria e a judicialização da política e garantismo no Supremo Tribunal Federal. IN: I Fórum de Grupos de Pesquisa em Direito Constitucional e Teoria do Direito. Anais eletrônicos. Disponível em: http://www.arcos.org.br/livros/anais-do-i-forum-de- grupos-de-pesquisa-em-direito-constitucional-e-teoria-do-direito/3ativismo-judicial-judicializacao-da-politica-e-garantismo-no-supremotribunal-federal/. Acesso em 06 de dezembro de 2012. 14BARROSO, Luis Roberto. Judicialização, Ativismo Judicial e Legitimidade Democrática.Disponível em: <http://www.direitofranca.br/direitonovo/FKCEimagens/file/ArtigoBarroso_para_Se lecao.pdf>. Acesso em: 21 jan. 2011 15KACELNIK, Carla. Controle de Constitucionalidade e o Ativismo Judicial. 2009. 72 f. Monografia (Bacharel) - PUC Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2009. ascensão dos Estados Unidos como superpotência mundial e com isso, a conseqüente expansão da revisão judicial. Para o autor Francês Antoine Garapon16, a apatia popular e a inércia ou incapacidade do poder político frente às demandas sociais também são causas para o surgimento da Judicialização da Política. O sucesso da justiça é inversamente proporcional ao descrédito que afeta as instituições políticas clássicas, causado pela crise de desinteresse e pela perda do espírito público. A posição de um terceiro imparcial compensa o ‘déficit democrático’ de uma decisão política agora voltada para a gestão e fornece à sociedade a referência simbólica que a representação nacional lhe oferece cada vez menos. 17 Para Luis Roberto Barroso18 as causas que levaram ao surgimento da judicialização são: a) democratização, “(...) a redemocratização fortaleceu e expandiu o Poder Judiciário, bem como aumentou a demanda por justiça na sociedade brasileira.”; b) constitucionalização abrangente, “que trouxe para a Constituição inúmeras matérias que antes eram deixadas para o processo político majoritário e para a legislação ordinária.”; c) sistema brasileiro de controle de constitucionalidade, que, por ser misto permite que “quase qualquer questão política ou moralmente relevante pode ser alçada ao STF.” Neste padrão, observa-se então que a judicialização é uma conseqüência da existência do controle de constitucionalidade e não se confunde com o ativismo judicial. A verdade é que numa democracia esta conseqüência deve ser cautelosamente observada, já que pode ser boa ou ruim. 2. A Teoria da Separação dos Poderes GARAPON, Antoine, O Juiz e a Democracia – o guardião das promessas. Editora Revan. 1999. 17 Ibidem. 18 BARROSO, Luis Roberto. Judicialização, Ativismo Judicial e Legitimidade Democrática.Disponível em: <http://www.direitofranca.br/direitonovo/FKCEimagens/file/ArtigoBarroso_para_Se lecao.pdf>. Acesso em: 21 jan. 2011. 16 2.1. A Teoria da Separação dos Poderes e sua evolução Histórica Conforme ensina Alexandre de Moraes, a teoria da Separação dos Poderes (ou da Tripartição dos Poderes do Estado) já existe desde a antiguidade, quando Aristóteles dividiu as funções estatais em três grupos: funções deliberativas, executivas e judiciais: Essa classificação foi esboçada pela primeira vez por Aristóteles, na já citada obra Política, onde eram repartidas as funções do Estado em deliberante (consistente na tomada das decisões fundamentais), executiva (consistente na aplicação pelos magistrados dessas decisões) e judiciária (consistente em fazer justiça).19 Em todo governo, existem três poderes essenciais, cada um dos quais o legislador prudente deve acomodar da maneira mais conveniente. Quando estas três partes estão bem acomodadas, necessariamente o governo vai bem, e é das diferenças entre estas partes que provêm as suas. o primeiro destes três poderes é o que delibera sobre os negócios do Estado. O segindo compreende todas as magistraturas ou poderes constituídos, isto é, aqueles de que o Estado precisa para agir, suas atribuições e a maneira de satisfazê-las. O terceiro abrange os cargos de jurisdição. 20 Outros pensadores e filósofos também trouxeram a idéia da Separação dos Poderes, como Maquiavel, em sua obra “O Príncipe” e John Locke, em sua obra “Do Segundo Tratado sobre o Governo Civil”. Porém, a teoria da separação de poderes como conhecemos surgiu no contexto da Revolução Francesa que e foi desenvolvida por Montesquieu e publicada em seu livro “O Espírito das Leis” em 1748. Montesquieu era contra a Monarquia Absolutista e foi um dos idealizadores da Revolução Francesa. O autor acreditava que havia uma necessidade de equilíbrio no poder e que este só seria alcançado com a descentralização do poder de uma só pessoa e, evitando assim, o Poder Absolutista, como ocorria à época da Revolução Francesa, onde o Rei tinha poderes para administrar, executar e legislar. Quando, na mesma pessoa ou no mesmo corpo de magistratura, o poder legislativo está reunido ao poder executivo, não existe liberdade; porque se pode temer que o mesmo monarca ou o mesmo senado crie leis tirânicas para executá-las tiranicamente. 19 20 MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. São Paulo: Atlas, 2011. ARISTÓTELES, A Política. São Paulo: Martins Fontes, 2007. Tampouco existe liberdade se o poder de julgar não for separado do poder legislativo ou executivo. Se estivesse unido ao poder legislativo, o poder sobre a vida e a liberdade dos cidadãos seria arbitrário, pois o juiz seria legislador. Se estivesse unido ao poder executivo, o juiz poderia ter a força de opressor. Tudo estaria perdido se o mesmo homem, ou mesmo corpo dos principais, ou dos nobres, ou do povo exercesse os três poderes: o de fazer as leis, o de executar as resoluções públicas e o de julgar os crimes ou as querelas entre os particulares. 21 Todo o poder nas mãos de apenas uma pessoa enseja em grandes injustiças, e por isso surge a necessidade de dividi-lo entre instituições devidamente constituídas. A Separação dos Poderes garante um exercício moderado do poder e é o oposto do totalitarismo. Tem por objetivo moderar o Poder do Estado. Alguns estudiosos criticam o termo “divisão de poderes”, pois o que se divide não é o poder em sim, e sim as funções, pois o poder é sempre uno e indivisível. São criados órgãos diferentes e a cada um deles compete uma função especifica. A teoria da Separação dos Poderes é considerada hoje como requisito indispensável do exercício do poder democrático. Montesquieu descreveu a separação dos poderes em: Legislativo, Executivo e Judiciário. Para o teórico, deveria existir um sistema em que cada órgão do Poder desempenhasse papel diferente do outro. E mais, cada órgão deveria ser independente e harmônico entre si. Atrelada a Teoria da Separação dos Poderes está o sistema dos Freios e Contrapesos (Checks and balances), pois segundo Montesquieu “só o poder freia o poder”. De acordo com Alexandre de Moraes: A constituição, ao determinar que o Legislativo, o Executivo e o Judiciário são poderes da República, independentes e harmônicos, adotou a doutrina constitucional norte-americana do checks and balances, pois ao mesmo tempo que previu diversas e diferentes funções estatais para cada um dos Poderes, garantindo-lhes prerrogativas para o bom exercício dela, estabeleceu um sistema complexo de freios e contrapesos para harmonizá-los 21 MONTESQUIEU. O Espírito das leis. São Paulo: Martin Claret, 2007. em prol da sociedade. Assim, poderá o Poder Legislativo sustar a executoriedade de lei delegada editada pelo Chefe do Poder Executivo que exorbite os limites constitucionais: CF art. 49, V. o Senado Federal processará e julgará o Presidente da República e os ministros do Supremo Tribunal Federal em crimes de responsabilidade. CF, art. 52, I e igualmente deverá aprovar por maioria absoluta de seus membros a indicação presidencial para o cargo de Ministro do Supremo Tribunal Federal CF, art. 52, III. Todos esses instrumentos encontramse previstos no sistema de freios e contrapesos constitucionais, visando impedir o arbítrio estatal. 22 O sistema dos freios e contrapesos esteve presente na Inglaterra a partir da ação da Câmara dos Lordes de balancear os projetos de lei da Câmara dos Comuns, a fim de evitar que leis fossem aprovadas pelo impulso das pressões populares. Para Montesquieu era fundamental a existência das duas Câmaras na Inglaterra, pois dessa forma, uma limitaria a outra, garantindo direitos para toda a população, como bem expressa o autor em sua obra “O Espírito das Leis”: Existem sempre num Estado pessoas eminentes pelo nascimento, pelas riquezas ou pelas honras. Se elas ficassem confundidas entre o Povo, e não tivessem senão um voto como os outros, a liberdade comum seria a sua escravidão, e elas não teriam interesse em defender a liberdade, porquanto a maioria seria contra elas. A participação dessas pessoas na Legislação deve pois estar proporcionada às demais vantagens que têm no Estado. Ora, isto se dará se elas formarem um corpo com direito de frear as iniciativas do Povo, assim como o Povo terá o direito de frear as delas.23 2.1.1. Teoria da Separação dos Poderes no Direito Brasileiro A modelo da tripartição dos poderes sempre esteve presente no Direito Brasileiro. A Constituição de 1824 trazia ainda a idéia de quarto poder, o poder moderador, que seria exercido pelo Imperador e que estaria em uma posição hierárquica superior aos demais poderes. No direito brasileiro atual cada poder tem suas funções típicas: a do legislativo é a de criar as leis, a do executivo é administrar o 22MORAES, 23 Alexandre de. Direito Constitucional. São Paulo: Atlas, 2011. MONTESQUIEU. O Espírito das leis. São Paulo: Martin Claret, 2007. Estado, executando as leis criadas pelo legislativo e a do Judiciário é resolver os conflitos entre as pessoas, usando como fundamento as leis criadas pelo legislativo. As funções do Estado são conferidas a Órgãos especializados para cada atribuição, havendo funções típicas e atípicas para cada um. Cabe ao Judiciário aplicar as leis aos casos concretos. Ao legislativo incube criar as leis. O Executivo define e executa políticas públicas, observando as leis criadas e vigentes, exercendo a função de governo; ao fazer intervenções, presta serviços públicos e ao formentar a economia, está na função administrativa. 24 Porém, além dessas funções típicas, cada poder tem também suas funções atípicas. Ao poder legislativo não compete apenas legislar, ele também pode dispor sobre sua organização interna, que tem natureza executiva, e pode também realizar o julgamento de Impeachment do Presidente da República pelo Senado nos crimes de responsabilidade que a rigor, tem natureza jurisdicional. O Poder Executivo além de exercer sua função típica que é administrar o Estado, pode também criar medida provisória com força de lei pelo Presidente da República, o que tem natureza legislativa, como também realizar o julgamento de defesas e recursos administrativos pelo poder executivo, realizando assim, uma função de natureza jurisdicional. E o Poder Judiciário exerce sua função atípica ao elaborar os regimentos internos dos Tribunais, função de natureza legislativa e ao conceder licenças e férias aos magistrados e serventuários da justiça, função essa de natureza executiva. É nesse contexto de funções típicas e funções atípicas que o sistema de freios e contrapesos se baseia. Dessa forma a separação de poderes no direito brasileiro não é absoluta, rígida, havendo sempre uma espécie interferência de um poder na função de outro poder. 24SILVA, Renato Jardim da. A Expressão do Legítimo Ativismo Judicial:decisões que respeitam a vontade do constituinte originário à luz dos valores sociais hodienos. 2009. 72 f. Monografia (Bacharel) - Escola Superior MPDFT, Brasília, 2009. O sistema de freios e contrapesos está previsto na Constituição Federal de 1988 em seu artigo 2º “São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.” 25 3. Ativismo Judicial no STF – Análise Prática Neste capitulo, o objetivo é analisar duas decisões proferidas pelo Supremo Tribunal Federal que são consideradas ativistas. Para isso, será analisada a ADIn 4277 que trata da União Homoafetiva e a Súmula Vinculante número 11 que trata do uso das algemas. 3.1 ADIn 4277 e ADPF 132 – União Homoafetiva. A ação direta de inconstitucionalidade 4277 e a Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental 132 foram propostas respectivamente pela Procuradoria Geral da República (PGR) e pelo Governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral. Foram julgadas, em decisão inédita, pelo plenário do Supremo Tribunal Federal na sessão dos dias 4 e 5 de maio de 2011. Na ADPF n° 132, o governador do Estado do Rio de Janeiro, Sergio Cabral, pede seja afastada a interpretação discriminatória do regime jurídico do servidor público fluminense a excluir direitos aos homossexuais, assegurando os benefícios previstos nas normas estaduais aos parceiros de união estável homoafetiva. Já a ADI n° 4277 foi resultado de acolhimento pela PGR de representação feita pela Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão, embasada em pareceres do professor Luís Roberto Barroso. Na ação, subscrita pela então procuradora-geral da República Débora Duprat, pede-se seja o art. 1723 do Código Civil declarado inconstitucional por não prever como entidade familiar a união estável entre pessoas do mesmo sexo. A ação foi proposta inicialmente em forma de ADPF (ADPF n° 178), mas convertida em ADI por decisão da ministra Ellen Gracie, BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constitui%C3%A7ao.htm Acesso em: 17 fev.2012 25 porque verdadeiramente pretende a declaração de inconstitucionalidade de um dispositivo de lei, não se insurgindo propriamente contra atos do Poder Público. 26 No dia 4 de maio de 2011, teve inicio no Plenário do STF o julgamento da ADIn 4277, tendo como relator o Ministro Ayres Britto. O ministro Dias Toffoli não participou do julgamento, pois estava impedido, uma vez que atuação como Advogado Geral da União no momento da propositura da ação. A votação foi unânime, todos os 10 ministros votaram pela procedência da ADIn, e concederam interpretação conforme a Constituição ao artigo 1723 do Código Civil. O julgamento, no entanto, gerou polêmica com relação ao STF ter sido ativista ou não. Para alguns estudiosos, dentre eles Maria Berenice Dias, o STF apenas interpretou a Constituição Federal de forma democrática, apenas confirmando o que já era decidido nos tribunais inferiores, não configurando, portanto, como uma prática ativista.Tourinho Leal a decisão do STF também não pode ser tida como ativista. Um Congresso Nacional que, por meio de suas maiorias políticas, bloqueia o livre desenvolvimento dos debates legislativos acerca desse tema. Propostas são apresentadas e não conseguem seguir seu caminho natural. Nesse caso temos, evidentemente, o sufocamento de direitos fundamentais das minorias por parte das maiorias. Daí o STF, por meio do seu poder contra-majoritário, forçar a maioria a aceitar a outorga de direitos às minorias. Nada de ativismo.27 O jurista Lênio Streck28 tem uma opinião contrária. Em sua concepção, o Supremo Tribunal Federal agiu de forma ativista, se 26LAGO, Rodrigo Pires Ferreira. A união estável homoafetiva na pauta do STF. Disponível em: <http://www.osconstitucionalistas.com.br/a-uniao-estavelhomoafetiva-na-pauta-do-stf>. Acesso em: 06 fev. 2012. 27LEAL. Saul Tourinho. Limites do Poder. Conjur. 25 de setembro de 2011. Entrevista concedida ao Consultor Jurídico. Disponível em: http://www.conjur.com.br/2011-set-25/ativismo-judicial-stf-tema-curso-tv-justica Acesso em: 04 de nov.2012. 28JUCA. Francisco, STRECK. Lênio Luiz. Gazeta do Povo. 08 de maio de 2011. Entrevista concedida à Gazeta do Povo. Disponível em: Acesso em: 02 de fev. 2012. colocando no lugar do legislador e violando o principio da separação dos poderes. Até mesmo o Ministro Ricardo Lewandowski em seu voto, mostrou preocupação com a possibilidade de o Tribunal estar invadindo a esfera do Poder Legislativo. Embora tenha votado pela procedência da ação, o Ministro votou por uma interpretação do artigo 1723 do Código Civil por analogia e não uma interpretação extensiva, pois esta viria a ferir o principio da separação dos poderes. Não há, aqui, penso eu, com o devido respeito pelas opiniões divergentes, como cogitar-se de uma de mutação constitucional ou mesmo de proceder-se a uma interpretação extensiva do dispositivo em foco, diante dos limites formais e materiais que a própria Lei Maior estabelece no tocante a tais procedimentos, a começar pelo que se contém no art. 60, § 4º, III, o qual erige a “separação dos Poderes” à dignidade de “cláusula pétrea”, que sequer pode ser alterada por meio de emenda constitucional. (...) Em outras palavras, embora os juízes possam e devam valer-se das mais variadas técnicas hermenêuticas para extrair da lei o sentido que melhor se aproxime da vontade original do legislador, combinando-a com o Zeitgeist vigente à época da subsunção desta aos fatos, a interpretação jurídica não pode desbordar dos lindes objetivamente delineados nos parâmetros normativos, porquanto, como ensinavam os antigos,in clariscessatinterpretatio. (...) Convém esclarecer que não se está, aqui, a reconhecer uma “união estável homoafetiva”, por interpretação extensiva do § 3º do art. 226, mas uma “união homoafetiva estável”, mediante um processo de integração analógica. Quer dizer, desvela-se, por esse método, outra espécie de entidade familiar, que se coloca ao lado daquelas formadas pelo casamento, pela união estável entre um homem e uma mulher e por qualquer dos pais e seus descendentes, explicitadas no texto constitucional.29 3.2 Súmula Vinculante nº. 11 – Uso das Algemas 29BRASIL. Supremo Tribunal Federal. ADIN (Ação Direta de Inconstitucionalidade) nº 4277. Voto do Ministro Ricardo Lewandowski. Disponível em: < http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=178939&tip= UN>. Acesso em: 15 de fev. 2012. Antes de analisar a edição da Súmula Vinculante nº. 11 é importante entender o que é uma súmula vinculante. O instituto da Súmula Vinculante foi introduzido no Ordenamento Jurídico Brasileiro com a Emenda Constitucional nº. 45 de 30 de dezembro de 2004. Está previsto no artigo 103-A da Constituição Federal: O Supremo Tribunal Federal poderá, de ofício ou por provocação, mediante decisão de dois terços dos seus membros, após reiteradas decisões sobre a matéria constitucional, aprovar súmula que, a partir de sua publicação na impressa oficial, terá efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual, municipal, bem como proceder à sua revisão ou cancelamento, na forma estabelecida em lei.30 O efeito vinculante obriga o legislador a fazer a observar estritamente a interpretação que o Supremo Tribunal Federal conferir à constituição, impedindo a aplicação de norma semelhante em qualquer parte do território brasileiro. Este efeito evita que surgindo mesma questão jurídica, novos processos sejam instaurados, ainda que contendo partes distintas ou outro pedido, operando-se no plano subjetivo, uma ampliação do efeito vinculante para além dos limites da coisa julgada.31 Alguns autores consideram a edição de Súmulas Vinculantes como uma prática de ativismo judicial, uma vez que “congela” a interpretação da lei na hora de aplicá-la. As Súmulas Vinculantes são talvez o maior exemplo do fenômeno ativismo judicial em nosso país. É na prática o Poder Judiciário criando o direito, legislando e congelando a interpretação, ao tempo em que adentra no papel do poder legislativo, na tentativa de fazer com que haja uma prestação jurisdicional com mais celeridade.32 A súmula vinculante nº 11 trata do uso de algemas: BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constitui%C3%A7ao.htm Acesso em: 17 fev.2012. 31SANTOS, Richard Eduard Dos. Súmulas Vinculantes e o Ativismo Judicial. Disponível em: <http://www.jurisway.org.br/v2/dhall.asp?id_dh=6639>. Acesso em: 18 fev. 2012. 32 SANTOS, Richard Eduard Dos. Súmulas Vinculantes e o Ativismo Judicial. Disponível em: <http://www.jurisway.org.br/v2/dhall.asp?id_dh=6639>. Acesso em: 18 fev. 2012. 30 Só é lícito o uso de algemas em casos de resistência e de fundado receio de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia, por parte do preso ou de terceiros, justificada a excepcionalidade por escrito, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente ou da autoridade e de nulidade da prisão ou do ato processual a que se refere, sem prejuízo da responsabilidade civil do Estado.33 Tal súmula foi editada em razão do julgamento do Habeas Corpus nº. 91952-9/SP de 2008 que foi proposto pela defesa do pedreiro Antônio Sérgio da Silva que recorreu pedindo a anulação da sua condenação pelo Tribunal do Juri, uma vez que passou todo o julgamento algemado, contrariando assim o artigo 474, parágrafo 3º do CPP: Não se permitirá o uso de algemas no acusado durante o período em que permanecer no plenário do Júri, salvo se absolutamente necessário à ordem dos trabalhos, à segurança das testemunhas ou à garantia da integridade física dos presentes.34 Diante disso, o STF decidiu “também, deixar mais explicitado o seu entendimento sobre o uso generalizado de algemas (...).” 35 Os votos foram baseados nos princípios constitucionais da dignidade humana e respeito a integridade física e moral do acusado. Após sua edição, a Súmula sofreu duas grandes críticas. A primeira devido ao fato de ter sido editada após inúmeras prisões de banqueiros que foram expostos a mídia usando algemas. A segunda, e mais importante para este trabalho, diz respeito à prática do ativismo judicial. 33 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Súmula nº 11. Disponível em: http://www.stf.jus.br/portal/cms/verTexto.asp?servico=jurisprudenciaSumulaVinc ulante. Acesso em: 15 de fev. 2011. 34 BRASIL. Decreto-Lei nº. 3.689, de 3 de outubro de 1941. Código de Processo Penal Brasileiro. Legislação Federal. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del3689Compilado.htm. Acesso em: 17 de fev.2012 35 GOMES, Luiz Flavio. Súmula Vinculante nº.11 regulamenta o uso de algemas. Disponível em: <http://www.lfg.com.br/artigo/20080814172534858_direito-criminal_sumulavinculante-n-11-regulamenta-o-uso-das-algemas.html>. Acesso em: 18 fev. 2012 A Constituição assegura a edição de súmulas vinculantes “após reiteradas decisões sobre a matéria constitucional” e no caso em tela só houve um único precedente, relatado pela Ministra Carmen Lúcia no HC 89429-1/RO. Dessa forma, parece-nos claro que o Supremo usurpou a esfera do Poder Legislativo ao editar a Súmula Vinculante nº. 11. CONCLUSÃO O Estado Democrático de Direito tem como princípio a Separação dos Poderes, que no Brasil está consagrado no artigo 2º da Constituição Federal. Por esse princípio, idealizado por Montesquieu, os poderes legislativo, executivo e judiciário são independentes um dos outros, cada qual tendo suas funções típicas e atípicas expressas no texto Constitucional e devido a essa independência funcional, cada poder deve exercer suas funções dentro de sua competência, na sua própria esfera, não podendo extrapolar os limites e invadir a competência dos outros poderes. O Ativismo Judicial ocorre justamente quando o Poder Judiciário extrapola os limites de sua competência e invade a esfera de outro poder, normalmente a do Poder Legislativo. É de suma importância que se compreenda a diferença entre Ativismo Judicial e Judicialização do Direito, pois embora sejam institutos “primos” como bem explica Luis Roberto Barroso, são diferentes. O primeiro se caracteriza por uma invasão de um poder na competência de outro poder, ocorre quando, por exemplo, o Supremo Tribunal Federal ao proferir uma decisão acaba por “criar” uma lei. A Constituição Federal atribui a competência de criação e edição de leis ao Poder Legislativo, uma vez que seus membros são eleitos pela população e por isso são considerados representantes do povo brasileiro, tendo a competência, portanto, para a criação de leis que irão interferir diretamente na vida da sociedade. O segundo decorre do próprio texto constitucional, sendo A Judicialização é o instituto que permite que o Poder Judiciário aprecie questões de ordem social e políticas, porque a Constituição Federal de 1988, expressamente, garante a todos benefícios de ordem social e política. Dessa forma, percebe-se que o que fere o Princípio da Separação de Poderes é tão somente a prática ativista, uma vez que a Judicialização do Direito é permitida pela Carta Magna. O Ativismo Judicial pode se dá em qualquer instância, por qualquer juiz, desde que este, ao proferir sua decisão, “o faça de forma a usurpar a função típica do legislativo. Entretanto, é mais comum observarmos tal prático no Supremo Tribunal Federal, através das decisões dos Juízes principalmente em sede de Controle de Constitucionalidade e na edição de Súmulas Vinculantes. O Supremo Tribunal pode declarar o que é constitucional, e o que está de acordo com as leis e costumes das nações civilizadas, mas não pode dizer, ao surgirem novas circunstâncias, o que é aconselhável para o caso ou o que lhe é mais conveniente. Tal postura configuraria um exagero. Nesse caso, a sociedade iria entrever o surgimento de uma ditadura judiciária e o Supremo não teria mais o apoio da opinião pública.36 (grifo original) Para a decisão ser considerada ativista é necessário que o magistrado inove no Ordenamento Jurídico, como se legislador fosse. A prática ativista por parte do Judiciário ganha apoio de certa parcela da população, uma vez que “é visto como solucionador dos problemas não constituídos.” resolvidos ou causados pelos demais poderes 37 Entretanto, assim como o ativismo pode ser útil e proporcionar benesses à sociedade, ele afronta o Estado Democrático de Direito, e 36 SILVA, Renato Jardim da. A Expressão do Legítimo Ativismo Judicial:decisões que respeitam a vontade do constituinte originário à luz dos valores sociais hodienos. 2009. 72 f. Monografia (Bacharel) - Escola Superior MPDFT, Brasília, 2009. 37 SILVA, Renato Jardim da. A Expressão do Legítimo Ativismo Judicial:decisões que respeitam a vontade do constituinte originário à luz dos valores sociais hodienos. 2009. 72 f. Monografia (Bacharel) - Escola Superior MPDFT, Brasília, 2009. desta forma, causa prejuízos à população. Depois de todo esse estudo fica claro que o ativismo judicial gera insegurança jurídica e como já exaustivamente demonstrado, fere princípios constitucionais da democracia e separação dos poderes. A solução para os problemas de inércia do poder legislativo e executivo não se encontra no judiciário e sim em criar uma maior consciência na população para que saibam reivindicar seus direitos de forma correta, exigindo dos poderes competentes a implementação de políticas públicas e sociais. Vive-se em uma democracia representativa, não em uma tecnocracia. Para o bom funcionamento do Estado Democrático de Direito é necessário que cada poder faça a sua parte. É de conhecimento de todos que o Poder Judiciário está repleto de processos e por isso não consegue exercer sua função típica de forma rápida e digna, fazendo com que o cidadão que aciona a justiça demore muito para receber uma resposta. Diante disso, não é certo exigir que um órgão que não tem condições de “cumprir suas funções tenha que exercer funções de outros poderes. Assim, conclui-se que a prática do Ativismo Judicial, principalmente por parte dos membros do Supremo Tribunal Federal, vai contra os princípios do Estado Democrático de Direito, gerando insegurança jurídica e ferindo princípios constitucionais, tais quais os princípio da separação dos poderes e da democracia. REFERÊNCIAS ALENCAR, André. Conceito de Constituição. 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