Renato Silva de Assis Supervisor Técnico da Paraíba Análise do Projeto de Lei que dispõe sobre os planos de custeio e de benefícios do regime próprio de previdência social do Estado da Paraíba No dia 20 de agosto o poder executivo enviou para a Assembleia Legislativa da Paraíba, em caráter de urgência (necessidade de tramitação no prazo de 10 dias), um projeto de lei que dispõe sobre os planos de custeio e de benefícios do regime próprio de previdência social do Estado da Paraíba. Tal instrumento busca alterar e acrescentar dispositivos à Lei nº 7.517/2003 que por sua vez, dispõe sobre a criação da Autarquia PBPREV – Paraíba Previdência dos Servidores Públicos do Estado da Paraíba. Breves considerações sobre o estoque de inativos e pensionistas do Estado paraibano Antes de adentrar nas principais mudanças trazidas pelo atual projeto, vale apenas lembrar um pouco da conjuntura econômica da década de 90. Esse período foi um momento onde houve uma verdadeira estagnação na economia brasileira. Mesmo sendo importante no que compete a tão sonhada estabilidade econômica, em termos de crescimento econômico o país deixou a desejar. Com isso verificou-se um baixo número de contratações no mercado de trabalho gerando assim a manutenção de altas taxas de desemprego. No setor público não foi diferente. Nesse período houve um baixo número de contratações de servidores públicos e em contra partida se verificou um alto número de servidores que se aposentaram, aumentando o número de inativos no funcionalismo publico dos estados brasileiros. Essa situação fez com que a parcela das despesas com pessoal referente aos inativos e pensionistas crescesse significativamente se perdurando para a década de 2000. Em junho de 2012, segundo informações do Tribunal de Contas da Paraíba, das 117.748 pessoas que recebiam algum tipo de rendimento do governo paraibano, 25.471 eram servidores inativos (21,6%) e 10.638 eram pensionistas (9%). Em dezembro de 2010, essas quantidades eram de 22.665 e 10.596, respectivamente. Verifica-se que nesse período houve um aumento de 2.806 pessoas no quadro de inativos e 42 pensionistas, aumentando assim o total de pessoas que recebiam rendimentos oriundos da PBPREV. No que compete ao quantitativo de servidores ativos, nota-se que de dezembro de 2010 para junho de 2012, houve uma redução no quadro de servidores, diminuindo assim a quantidade de contribuintes para PBPREV. Em dezembro de 2010 existiam 49.260 servidores efetivos ativos, reduzindo-se para 47.669 em junho de 2010 (queda de 1.591 servidores). Os comissionados efetivos obtiveram uma redução de 467 pessoas, já para os apenas comissionados a redução foi de 719 pessoas. Quanto aos prestadores de serviços a redução foi de 6.115 pessoas. Essas informações mostram que nesse período houve uma queda considerável no total de contribuintes da PBPREV. Segundo o Governo estadual, a atual folha de benefícios da PBPREV é superior à soma das receitas do RPPS estadual. Diante disso, o atual projeto de lei encaminhado para assembleia legislativa traz uma série de ajustes que buscam fortalecer a Previdência Estadual e estruturá-la para o futuro, que conforme o governo, a tornará superavitária e independente. Vale destacar que segundo o Art. 2º, §1º,da Lei Nº 9.717 de 29 de novembro de 1998, a união, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios são responsáveis pela cobertura de eventuais insuficiências financeiras do respectivo regime próprio, decorrentes do pagamento de benefícios previdenciários. De acordo com a nota técnica enviada para Assembleia Legislativa sobre a PBPREV, hoje o aporte necessário para cobrir a insuficiência de receita corresponde a 46% da folha de pagamento dos inativos e pensionistas. Outros problemas que surgem da legislação que rege a PBPREV são as lacunas legislativas e a jurisprudência dominante do Tribunal de Justiça Estadual dissonante com o que dispõe a Lei nº 7.517/2003 (Lei que cria a PBPREV). Esses gargalos tem gerado uma intensa demanda judicial no âmbito desta autarquia. Análise dos principais ajustes Atualmente os valores referentes às contribuições patronais (22%) e do servidor (11%) não bastam para atingir o equilíbrio do sistema. Nesse contexto surge o chamado “déficit técnico atuarial”, que é uma espécie de divida das gerações presentes, decorrentes do manejo do regime de previdência social realizado pelas gerações passadas. Dada essa situação, o governo do estado da Paraíba optou pela elaboração de uma minuta de projeto de lei contendo os delineamentos da política de equacionamento baseada na instituição por lei da chamada segregação de massas de segurados. Esse mecanismo realiza uma separação desses segurados em dois grupos distintos, a partir da definição de uma data de corte, sendo um grupo intitulado de Plano Financeiro e o outro de Plano Previdenciário (que de acordo com o atual projeto seria o fundo capitalizado). Os principais ajustes que o projeto de lei traz como forma de modificar e acrescentar dispositivos a Lei de criação da PBPREV (Lei Nº 7.517/2003), foram implementados no Art. 13º (fontes do Plano de Custeio da PBPREV), Art. 16º (criação do fundo de capitalização e do fundo financeiro) e Art. 19º (critérios de concessão de benefícios para dependentes). As principais mudanças são apresentadas a seguir. Base de cálculo da Contribuição previdenciária Atualmente, a Lei Estadual que cria a Autarquia PBPREV (Lei nº 7.517/2003), em seu artigo 13, inciso II, dispõe que a contribuição previdenciária do segurado deve incidir sobre a totalidade da remuneração do servidor ativo e a patronal, sobre o valor total da folha de pessoal. Em oposição, o art. 4º da Lei Federal nº 10.887/2004, afirma que a contribuição social do servidor público ativo da União deverá incidir a totalidade da base de contribuição, esta compreendida como o vencimento do cargo efetivo, acrescidos das vantagens permanentes, estabelecidas em lei, excluídas as parcelas: a) diárias para viagens; b) ajuda de custo em razão de mudança de sede; c) indenização de transporte; d) o salário-família; e) auxilio-alimentação; f) auxilio-creche; g) parcelas remuneratórias pagas em decorrência de local de trabalho; h) parcela percebida em decorrência do exercício de cargo em comissão ou de função comissionada ou gratificada; i) abono de permanência; j) adicional de férias; l) adicional noturno; m) adicional por serviço extraordinário; n) parcela paga a titulo de assistência a saúde suplementar; o) parcela paga a titulo de assistência pré-escolar; p) parcela paga a servidor publico indicado para integrar conselho ou órgão deliberativo, na condição de representante de governo, de órgão ou de entidade da administração publica do qual é servidor. No mesmo artigo, no paragrafo 2º dessa Lei federal, observa-se que o servidor ocupante de cargo efetivo poderá optar pela inclusão, na base de cálculo da contribuição, de parcelas remuneratórias percebidas em decorrência de local de trabalho e do exercício de cargo em comissão ou de função comissionada ou gratificada, e daquelas recebidas a título de adicional noturno ou de adicional por serviço extraordinário, para efeito de cálculo do beneficio a ser concedido. Vale destacar que mesmo a Lei Federal facultando ao segurado a opção pela incidência da contribuição sobre parcelas propter laborem (gratificações concedidas em razão das condições excepcionais em que está sendo prestado um serviço comum), fica vedada expressamente a incorporação de tais vantagens à aposentadoria, ainda que tenha havido contribuição sobre ela. Ela servirá apenas para majorar a média aritmética das remunerações de contribuição. Diante disso, observa-se que existe um impasse entre a Lei Estadual nº 7.517/2003 e a Lei Federal nº 9.717/97, em relação a base de cálculo da contribuição previdenciária, o que vem gerando uma grande demanda judicial e administrativa para a PBPREV, que por sua vez, encontram jurisprudência tanto no TJ/PB como sobre o STJ. Segundo nota do governo estadual, o que este projeto de lei visa, no âmbito da base de cálculo para a incidência de contribuições previdenciárias, é tornar a legislação da PBPREV mais clara, adequando-a assim a legislação federal. A seguir, são comentadas a principais alterações no art. 13º que trata sobre om plano de custeio da PBPREV. Art. 13º I – Contribuições previdenciárias, mensais e obrigatórias, do ente patronal, na ordem de 22% [...] sobre o valor total da folha de pessoal, excluídas as parcelas não integrantes da base de contribuição, [...]. Análise: Neste artigo a mudança seria apenas o acréscimo do termo “excluídas as parcelas não integrantes da base de contribuição”, haja vista que pela Lei que institui a PBPREV, a contribuição seria sobre o total das remunerações. XV - Contribuição incidente sobre os proventos de aposentadorias e pensões concedidas pela PBPREV, com percentual igual ao estabelecido para os segurados em atividade, sobre a parcela que supere o limite máximo estabelecido para os benefícios do Regime Geral de Previdência Social. Paragrafo 4º: Os segurados ativos contribuirão também sobre o décimo terceiro salário, bem como sobre os benefícios de licença-maternidade e licença para tratamento de saúde, e os inativos e pensionistas sobre a gratificação natalina ou abono anual. Análise: Quanto ao inciso XV e o paragrafo 4º, nota-se que são mecanismos que já eram executados pela PBPREV, pois já encontravam amparo na legislação federal. O atual projeto de Lei apenas trouxe estes itens para o corpo do texto da Lei que regulamenta a criação da PBPREV. Paragrafo 5º: Quando o pagamento mensal do servidor sofrer descontos em razão de faltas ou de quaisquer outras ocorrências, a alíquota de contribuição deverá incidir sobre o valor total da remuneração de contribuição prevista em lei, relativa a remuneração mensal do servidor no cargo efetivo, desconsiderando os descontos. Análise: segundo o Art. 214º, § 1º, do Decreto nº 3.048, de 6 de maio de 1999, que aprova o Regulamento da Previdência Social, “Quando a admissão, a dispensa, o afastamento ou a falta do empregado, inclusive o doméstico, ocorrer no curso do mês, o salário-de-contribuição será proporcional ao número de dias efetivamente trabalhados, observadas as normas estabelecidas pelo Instituto Nacional do Seguro Social. O Art. 71 da IN MPS/SRP 3/2005 também ratifica esse regulamento. Logo nota-se que o ajuste feito pelo paragrafo 5º traz um dispositivo de receita diferente da legislação federal. Paragrafo 6º: O servidor ocupante de cargo efetivo poderá optar pela inclusão, na base de calculo da contribuição, de parcelas remuneratórias propter laborem, bem como as percebidas em decorrência de local de trabalho e do exercício de cargo em comissão ou de função comissionada ou gratificada, e daquela recebidas a titulo de adicional noturno ou de adicional por serviço extraordinário, para efeito de calculo de beneficio a ser concedido com fundamento no art. 40 da Constituição e no art. 2º da Emenda Constitucional nº 41, de 2003, respeitada, em qualquer hipótese, a limitação estabelecida no § 2º do art. 40 da Constituição Federal. Análise: Este dispositivo, segundo cálculo feito pela consultoria contratada pelo Governo do Estado, se adequa a legislação federal, entretanto, traz uma diminuição na arrecadação previdenciária na ordem de R$ 3,16 milhões, acarretando o aumento do déficit previdenciário e consequentemente o aporte do tesouro estadual. Essa redução acontece devido o fato de se retirar da base de contribuição, parcelas remuneratórias (adicional noturno, adicional sobre local de trabalho, etc.) que divergem da base de remuneração ditada pela legislação federal. Paragrafo 7º: O servidor afastado ou licenciado temporariamente do exercício do cargo efetivo sem recebimento de remuneração ou de subsidio pelo ente federativo, somente contará o respectivo tempo de afastamento ou licenciamento para fins de aposentadoria, se recolher mensalmente as respectivas contribuições previdenciárias do período, compreendidas tanto pela cota patronal quanto pela do próprio segurado. Paragrafo 8º: A contribuição efetuada pelo servidor na situação de que trata o paragrafo anterior não será computada para cumprimento dos requisitos de tempo de carreira, tempo de efetivo exercício no serviço publico e tempo no cargo efetivo para concessão de aposentadoria. Análise: O paragrafo 7º estabelece que, para que o servidor afastado ou licenciado temporariamente do cargo efetivo sem recebimento de remuneração ou subsídios, conte com o respectivo tempo para fins de aposentadoria, ele terá que arcar mensalmente com as contribuições tanto da cota patronal (22%) como da cota do próprio segurado (11%). Esse ajuste encontra amparo no paragrafo 2º do art. 35 da Orientação Normativa da SPS nº 02/09. Esse dispositivo legal diz que apenas em face da omissão da lei quanto ao ônus pelo recolhimento da contribuição da parcela do ente federativo (patronal) durante o período de afastamento ou licenciamento, o repasse à unidade gestora do RPPS do valor correspondente continuará sob a responsabilidade do ente. Criação dos Fundos Financeiro e Capitalizado Neste âmbito tal projeto busca apresentar delineamentos da política de equacionamento baseada na instituição por lei da chamada segregação de massas de segurados, criando assim fundo diferentes para segurados contratados em períodos diferentes. Art.º 16 – A. Fica criado o Fundo Previdenciário Capitalizado, de natureza contábil e caráter permanente, para custear, na forma legal, as despesas previdenciárias relativas aos segurados admitidos a partir da data da publicação desta lei. Art. 16 - B. Fica criado o Fundo Previdenciário Financeiro, de natureza contábil e caráter temporário, para custear as despesas previdenciárias relativas aos segurados admitidos até a data da publicação desta lei. Análise: O fundo financeiro servirá para os contribuintes admitidos até a data da publicação deste projeto de lei, enquanto o primeiro será mantido para os admitidos a partir da data da publicação do mesmo. O Fundo capitalizado em sua essência será criado em moldes equilibrados, pois as contribuições feitas pelos servidores para esse fundo, serão capitalizadas para a concessão futura dos seus próprios benefícios. Já o financeiro, trará os desiquilíbrios entre receitas e despesas, oriundos da gestão atual de caixa da PBPREV. Conclusão: Ao se analisar os ajustes no plano de custeio apresentados acima, nota-se que nenhum deles traz um mecanismo capaz de amenizar significativamente os déficits apresentados pelo regime de previdência do estado no curto e médio prazo. Muitos deles tem apenas um caráter de adequação a legislação federal, sendo já executados durantes anos pela PBPREV mesmo não tendo texto próprio na Lei estadual. Quanto aos fundos, nota-se que enquanto o fundo capitalizado em sua essência traz uma relação de equilíbrio entre receita e despesa, o financeiro por sua vez, não apresentou nenhum mecanismo eficaz no que compete ao equacionamento de déficit. A proposta trazida pela criação desses fundos é que na medida em que o financeiro seja finalizado no longo prazo, reste apenas a parte referente ao capitalizado. Diante disso, surge a necessidade de uma maior discussão sobre como ficará a situação dos beneficiários do fundo financeiro no longo prazo.