INSTITUTO OSWALDO CRUZ Pós-Graduação em Biologia Parasitária SEBASTIÃO ALDO DA SILVA VALENTE ESTUDOS DOS SURTOS DE DOENÇA DE CHAGAS OCORRIDOS NO PARÁ E AMAPÁ: ANÁLISE PARASITOLÓGICA, SOROLÓGICA E MOLECULAR DBP/IOC FIOCRUZ Rio de Janeiro 2008 Livros Grátis http://www.livrosgratis.com.br Milhares de livros grátis para download. INSTITUTO OSWALDO CRUZ Pós-Graduação em Biologia Parasitária SEBASTIÃO ALDO DA SILVA VALENTE ESTUDOS DOS SURTOS DE DOENÇA DE CHAGAS OCORRIDOS NO PARÁ E AMAPÁ: ANÁLISE PARASITOLÓGICA, SOROLÓGICA E MOLECULAR Tese apresentada ao Curso de Doutorado em Biologia Parasitária do Instituto Oswaldo Cruz – Fiocruz, como requisito parcial para a obtenção do grau de Doutor. Orientadores: FIOCRUZ: Dr. Octávio Fernandes UFPA: Dr. Habib Fraiha Neto DBP/IOC FIOCRUZ Rio de Janeiro 2008 Valente Silva, Sebastião Aldo Estudos dos surtos de doença de Chagas ocorridos no Pará e Amapá: análise parasitológica, sorológica e molecular / Sebastião Aldo da Silva Valente. Rio de Janeiro: Instituto Oswaldo Cruz, 2008. 162 fls. Tese (Doutorado em Biologia Parasitária) Coordenação do Curso de PósGraduação em Biologia Parasitária, Instituto Oswaldo Cruz – FIOCRUZ. 1. Doença de Chagas – epidemiologia 2. Biologia Molecular I. Fundação Oswaldo Cruz. II. Instituto Oswaldo Cruz. Departamento de Medicina Tropical. III. Título. CDU: 616.34-002:578 INSTITUTO OSWALDO CRUZ Pós-Graduação em Biologia Parasitária ESTUDOS DOS SURTOS DE DOENÇA DE CHAGAS OCORRIDOS NO PARÁ E AMAPÁ: ANÁLISE PARASITOLÓGICA, SOROLÓGICA E MOLECULAR SEBASTIÃO ALDO DA SILVA VALENTE Tese submetida à Comissão Examinadora composta pelo corpo docente do Programa de PósGraduação em Biologia Parasitária da Fundação Oswaldo Cruz e por professores convidados de outras instituições, como parte dos requisitos necessários à obtenção do grau de doutor. Aprovada em: ___9__/__07___/__2008___ EXAMINADORES: Prof. Dr. José Rodrigues Coura - (FIOCRUZ – RJ - Brasil) - Presidente Prof. Dr. Márcio Neves Bóia - (FIOCRUZ – RJ - Brasil) Prof. Dr. Ralph Lainson – (SVS-Instituto Evandro Chagas – PA – Brasil) Prof. Dr. Sylvio Celso Costa– (FIOCRUZ – RJ - Brasil) Profa. Dra. Ângela Cristina Veríssimo Junqueira - (FIOCRUZ – RJ - Brasil) Rio de Janeiro, 9 de julho de 20008 Não dês guarida aos maus pensamentos e reage contra todo e qualquer estado de abatimento e ociosidade que persista em ti. Não te permitas descansar além do devido e ocupa tuas mãos com o bem e o coração com o perdão. Na medida de tuas possibilidades, auxilia a quem sofre e não te concentres excessivamente em teus próprios problemas nem dramatizes a tua dor. A prova é a tua oportunidade de redenção. Caminha e chegarás. Prece espírita de Carlos A. Bacelli Dedicatória A meus pais Waldomiro e Perpétua, incansáveis na proteção e no carinho e por me ensinarem a não desistir nunca, independente das forças opostas que tenhamos de enfrentar. Aos meus avós Carlos, Raimunda e Rosemunda, que me ensinaram a amar as coisas simples do Baixo Amazonas. A minha esposa Vera, companheira solidária dos caminhos mais difíceis e meus filhos Aldo Augusto e Luís Alberto presentes que Deus me deu. A todos eles que me perdoem pela ausência de tantos anos dedicados a uma paixão, quase obsessão: meu trabalho exercido neste mundão amazônico, dormindo em redes de barcos, lendo à luz de lamparinas, comendo bolachas e me enchendo de sonhos e esperança, ouvindo os cantos dos pássaros e os ruídos da mata. ii AGRADECIMENTOS Ao meu orientador Professor Dr. Octavio Fernandes, por me nortear num novo caminho científico. Pela sua conduta científica esmerada e incentivadora em momentos difíceis que foram superados com firmeza, mas também com confiança, e me fez ver a doença de Chagas na Amazônia como um desafio a ser superado. Minha gratidão e admiração. Ao Dr. Habib Fraiha Neto pela visão das endemias da Amazônia e incentivo desde os primeiros passos no IEC, sempre disposto a me amparar quando minhas forças fraquejavam. À minha amiga, irmã e tutora Patrícia Cuervo Escobar, pela competência, dedicação e paciência em me ensinar os primeiros passos desse complexo e surpreendente mundo da biologia molecular. Jamais esquecerei os momentos de aprendizado compartilhado. Ao Instituto Evandro Chagas, um bastião de credibilidade científica fincado no coração da Amazônia e que moldou a minha formação acadêmica. À FIOCRUZ, formadora de mão de obra especializada para uma região carente como a Amazônia. Aos Professores Cláudio Ribeiro e Henrique Leonel Lenzi, por fomentar num grupo de pesquisadores em Belém o espírito da ciência com arte, carinho e determinação. À amiga e grande incentivadora Dra. Elizabeth Conceição de Oliveira Santos, diretora do Instituto Evandro Chagas, pelo olhar responsável e empreendedor no trato da coisa pública e da Saúde da Amazônia. À Dra. Vera da Costa Valente, responsável pelo Laboratório de Diagnóstico de Doença de Chagas, pela determinação, seriedade, organização e critérios rigorosos aplicados no Laboratório de Diagnóstico, principalmente na sorologia, hemocultura, atendimento e seguimento dos pacientes. O afeto e seriedade com que tratava estas pessoas foram decisivos para que eles sempre voltassem. A ela meu sincero agradecimento. A toda a equipe técnica e administrativa do Instituto Evandro Chagas, que nos forneceu o suporte necessário em toda esta jornada. Aos amigos e grandes incentivadores: Drs. Michael Miles, Alexandre Linhares, Jorge Travassos da Rosa, José Maria de Souza, José Augusto Muniz, Antônio Teixeira (UnB) e Marta Geraldes Teixeira (USP) que me fizeram acreditar nos meus sonhos. À Dra. Izabel Rodrigues, amiga de fé e incansável de todas as horas a quem recorri nos momentos mais críticos e sempre recebido com carinho. Muito obrigado pela dedicação. Ao Núcleo de Medicina Tropical da Universidade Federal do Pará, onde a semente deste doutoramento foi lançada, especialmente aos professores José Luis Nascimento, Conceição Pinheiro e Luiz Carlos Silveira. Ao Ambulatório de Doença de Chagas, à Dra. Ana Yecê N. Pinto, pela dedicação no atendimento e seguimento dos pacientes e aos dados clínicos. Aos Drs. Ângelo Crescente, Nagib Abdon, Raimundo Leão e Lourival Marsola, pelo apoio na conduta clínica. A Dra. Maria do Carmo Brígido, IBAMA-PA pela preciosa ajuda no projeto de licenciamento e manejo animal. Aos dedicados profissionais técnicos e ex-técnicos do Laboratório de Doença de Chagas/IEC, iii José Aprígio, José Abud, Francisco Gomes, Edinaldo Ribeiro, Aguinaldo Freitas, Leonardo Carvalho, Carlos Alberto, Gilberto César e Raimundo Nivaldo de Almeida. Aos meus estagiários e bolsistas, fiéis escudeiros e sementes que planto para o futuro: Leidiane, Deborah, Andréa, Ellen, Sérgio, Fabíola e Caroline, que me apoiaram especialmente nos meses que enfrentei dificuldades na leitura de artigos e digitação desta tese. Ao Laboratório de Geo-Processamento do IEC, em especial ao Dr. Nelson Veiga e Douglas Gasparetto, pelo aconselhamento no geo-referenciamento e confecção de mapas. Ao serviço de Biblioteca do IEC, em especial a Vânia Cunha Araújo, pelo incentivo e atendimento sempre oportunos e eficientes. Às Sras. Maria José A. Mateus, Isabella M. A. Mateus, Sheila de M. Lobo, Maria Izaleth B. do Carmo e Nilton M. Pereira, pelo apoio técnico no levantamento e obtenção dos artigos e auxílio na editoração desta tese. À Profa. Edna Souza pela correção gramatical do Manuscrito e ao pessoal do Setor de Informática do IEC, pelo apoio sempre disponível de pedidos muitas vezes mirabolantes que precisei fazer, sempre atendido incondicionalmente. Aos colegas da SEPAR, especialmente a Ocidéa Oliveira, Fátima França, Marinete Póvoa, Zuíla Corrêa, Lourdes Garcez e Marco Antônio, por acreditarem neste trabalho. Aos colegas da turma do Doutorado, Elizabeth Salbé, Ana Yecê, Eliete Araújo, Ana Ventura, Vânia Noronha, Ester Miranda, Sâmia Demachki, Solange Costa, Gionovaldo Lourenço e Wallace Santos, pelo esforço, luta e cumplicidade ao longo desta batalha. À Coordenadora do Curso de Pós-Graduação em Biologia Parasitária, Dra. Ana Gaspar, à secretária Luciane Wandermurem, Fabíola, Eduardo Portugal e demais funcionários, por todos os serviços e orientação prestados no decorrer deste trabalho. Aos professores da FIOCRUZ, Cláudio Ribeiro, Ricardo Lourenço, Márcio Bóia, José R. Coura, Henrique Lenzi, Ana Ma. Gaspar, Márcia Lazera, Bodo Wanke e Leonardo Carvalho, pelos ensinamentos e incentivos recebidos ao longo deste trabalho. Às Secretarias Municipais de Saúde de Abaetetuba, Afuá, Ananindeua, Bagre, Barcarena, Belém, Bragança, Ponta de Pedras, Santarém, Macapá, Mazagão e Santana pelo apoio logístico neste trabalho tão extenso. Especialmente ao Dr. Clóvis Miranda, da Secretaria Estadual de Saúde do Amapá, pela insuperável ajuda. A todos nossos pacientes à quem não temos palavras para agradecer pela disciplina em todo o acompanhamento laboratorial. Meus sinceros agradecimentos aos colegas do Laboratório de Epidemiologia Molecular de Doenças Infecciosas da FIOCRUZ – RJ, que durante estes últimos três anos me receberam com tanta atenção e carinho: Beth, Carla Sodré, Cátia Sodré, Dário, Estela, Fábio, Helena, Joseli, Kátia, Larissa, Maria Esther, Maria Inês e Simone K. Um especial agradecimento aos Drs. Adeilton, Aline, Eduardo (Dudu), Mariângela, Martha, Nédia e Simone Santos, pelo apoio logístico imprescindível e pelas sugestões, orientações e pela paciência no ensinamento de passos importantes nos meus experimentos. Meus sinceros agradecimentos e respeito. iv Resumo Relatos de casos de doença de Chagas na Amazônia Brasileira têm sido relativamente freqüentes na literatura. Entretanto, não se encontram relatos desses surtos acompanhados sistematicamente. Durante os últimos anos, o Instituto Evandro Chagas teve a oportunidade de fazer o seguimento de vários surtos agudos da doença, e nessa tese são descritas análises parasitológicas, sorológicas, entomológicas e de reservatórios de seis deles, utilizando desde técnicas tradicionais, até técnicas moleculares. A pesquisa parasitológica foi realizada em 423 pessoas (sintomáticos e contatos) relacionadas aos surtos do Pará (Abaetetuba, Ananindeua, Barcarena, Belém e Bragança) e do Amapá (Mazagão). Foram encontradas 28,6% (121/423) de positividade em pelo menos um dos testes parasitológicos: 44,62% (54/121) na gota espessa; 9,09% (11/121) no QBC®; 81% (98/121) no xenodiagnósticos e 60% (73/121) na hemocultura. A pesquisa sorológica incluiu uma amostragem de 3633 pessoas nos municípios estudados. No teste de triagem (HAI) foram detectados 4,40% dos indivíduos positivos (160/3633). Pelo teste de IFI para pesquisa de IgG estes soros apresentaram positividade de 3,19% (116/3633) e 3,02% (110/3633) apresentaram testes positivos para anticorpos IgM anti-Trypanosoma cruzi. Os pacientes diagnosticados (n=121) foram tratados e acompanhados pelo menos até dois anos. Realizou-se o seguimento dos exames laboratoriais em 4 cortes de tempo: antes de tratar, 6 meses, 1 ano e 2 anos após tratamento, exceto o surto de Mazagão que teve os seguimentos expandidos para cinco e sete anos. Os exames parasitológicos negativaram em 118 (97,52%) pacientes. Três pacientes foram re-tratados e negativaram os testes parasitológicos subseqüentes. Em 5 surtos os exames sorológicos seguidos até dois anos revelaram negativação da IgM e redução progressiva dos títulos de IgG sem desaparecimento da imunoglobulina. No surto de Mazagão, todos os pacientes se revelaram sorologicamente negativos após 7 anos. Dos 145 mamíferos silvestres capturados, 75 foram Didelphis marsupialis, 34 Philander opossum, 21 Marmosa cinerea, 2 Marmosa murina e 13 Proechimys guyanensis. Destes 56 foram coletados em Abaetetuba, 7 em Ananindeua, 40 em Barcarena, 5 em Belém, 25 em Bragança e 12 em Mazagão. A taxa de infecção por Trypanosoma cruzi foi de 68,96% (100/145), sendo 69,33% dos D. marsupialis (52/75), 70,58% dos P. opossum (24/34), 61,90% das M. cinerea (13/21), 100% das M. murina (2/2) e 69,23% dos P. guyanensis (9/13). Foram capturados 1022 triatomíneos de 5 espécies. As taxas de infecção foram R. pictipes - 51,81%; R. robustus - 14%; Rhodnius milesi - 33%; Panstrongylus geniculatus - 51,47% e Panstrongylus lignarius - 27,27%). Os sítios de coleta foram palmeiras (73,09%); armadilhas de luz (17,31%) e sítios diversos (9,6%). Um dos surtos teve o importante agrupamento dos casos de forma familiar levando a hipótese de transmissão pela mesma via de infecção, possivelmente a via oral sendo o suco de açaí o único alimento encontrado associado a este grupo. A tipagem de mini-exon mostrou a existência de TC I e TC Z3. Trypanosoma rangeli também foi evidenciado na região. A tipagem de RAPD gerou uma diversidade tão grande que não foi possível chegar a qualquer conclusão, exceto a diversidade existente entre os parasitos que circulam nos surtos e a possível multiclonalidade dos isolados. v Abstract Reports of Chagas Disease in the Brazilian Amazon region are relatively frequent. However, reports of Acute Chagas Disease (ACD) outbreaks with regular prospective assessment of the cases in this region are scarce. During the past few years, the team of Instituto Evandro Chagas had the opportunity of following-up several outbreaks of ACD in the Amazon and herein, the parasitological, serological, entomological and sylvan reservoir analyses of six outbreaks are described using from traditional techniques to molecular approaches. Parasitological studies were carried out in 423 individuals (symptomatic patients and their household contacts) related to these six outbreaks (Abaetetuba, Ananindeua, Barcarena, Belém, Bragança, Mazagão). The overall positivity was 28,6% (121/423), as based on results from at least one of the parasitological tests: 44,62% (54/121) using stained blood smear; 9,09% (11/121) with Quantitative Buffy Coat (QBCTM) analysis; 81% (98/121) in xenodiagnosis; and 60% (73/121) in haemoculture. Serology was performed in 3633 inhabitants of the above mentioned municipalities. The screening test (IHA) was positive in 4,40% (160/3633) of the individuals. Using the indirect immuno-fluorescence assay, positivity rates were of 3,19% (116/3633) and 3,02% (110/3633) for anti-Trypanosoma cruzi IgG- and- IgM antibodies, respectively. All infected patients with Trypanosoma cruzi (n=121) were properly treated and followed-up for at least two years upon diagnosis. The laboratory follow-up was carried out at 4 time-points: before treatment; 6 months, one year and two years after the start of treatment, except for Mazagão outbreak where the follow up was extended up to five and seven years. The parasitological tests were negative in 118 (97,52%) patients. Three patients had to be re-treated and yielded negative parasitological examinations afterwards. In 5 outbreaks, serological analyses, prospectively conducted up to 2 years, revealed negative anti-T. cruzi IgM antibodies and progressive declining in the specific IgG titres, without disappearance of the immunoglobulin. All patients enrolled in the Mazagão outbreak became serologically negative 7 years after treatment. One hundred and forty five wild mammals were captured during these investigations corresponding to the following species: 75 Didelphis marsupialis; 34 Philander opossum; 21 Marmosa cinerea; 2 Marmosa murina; and 13 Proechimys guyanensis. These animals were caught in the following settings: Abaetetuba (n=56); Ananindeua (n=7); Barcarena (n=40); Belém (n=5); Bragança (n=25) and Mazagão (n=12). The T. cruzi infection rate among these mammals was 68,96% - 69,33% (52/75) of the D. marsupialis, 70,58% (24/34) of the P. opossum, 61,90% (13/21) of the M. cinerea, 100% (2/2) of the M. murina and 69,23% (9/13) of the P. guyanensis species. A total of 1022 triatomines bugs were captured corresponding to 5 species which were infected at the following rates: Rhodnius pictipes, 51,81%; Rhodnius robustus, 14%; Rhodnius milesi, 33%; Pantrongylus geniculatus, 51,4%; and Panstrongylus lignarius, 27,27%. The collections of triatomine bugs were carried out in palm trees (73,09%); light traps (17,31%); and various other settings (9,6%). One of the outbreaks had and important familial clustering of the cases leading to the hypothesis of a common source for transmission, possibly through the frequent ingestion of açaí juice. The typing of T. cruzi samples, based on the mini-exon gene, showed the presence of TC I and TCZ3. Trypanosoma rangeli was also present in the region. The RAPD genetic analysis yielded a broad diversity of profiles preventing us from drawing any firm conclusion, except for the observation that a significant variety of parasites circulate during outbreaks of Chagas disease in the Amazon what is also evidenced by the multiclonality of prevailing strains. vi LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS °C Graus centígrados µ Micron µl Microlitros µM Micromolar ABA Abaetetuba ALAT Alanina-aminotransferase ANA Ananindeua Ar Armadilha ASAT Aspartato-aminotransferase BAR Barcarena BEL Belém bp Pares de bases BRA Bragança BSA Bovin Serum Albumin Cap/Exa Capturado/ Examinado CL Clone cm Centímetros DCA Doença de Chagas Aguda DNA Ácido desoxirribonucléico dNTPs Deoxidonucleotídeo EDTA Etileno-diamino tetra-acetato de sódio ELISA Ensaio imonuenzimático G6PD Glicose-6-fosfato-dehidrogenase GE Gota espessa vii GPI Glicose-fosfato-isomerase HAI Hemaglutinação indireta Hemo Hemocultura HIV Vírus da Imunodeficiência Humana Hoff Meio de cultura desenvolvida por Hoff IBAMA Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e de Recursos Naturais Renováveis IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística IEC Instituto Evandro Chagas IFI Imunofluorescência Indireta IgG Imunoglobulina G IgM Imunoglobulina M IOC Instituto Oswaldo Cruz Kb Kilobase KCl Cloreto de potássio KDNA Ácido desoxirribonucléico da mitocôndria Kg Kilograma LIT Liver Infusion Tryptose m RNA RNA mensageiro MDH Malato dehidrogenase ME Microepidemia Mg Miligramas MgCl2 Cloreto de magnésio ml Mililitros mM Milimolar viii mm Milímetros NEG Negativo ng Nanogramas NR Não realizado NREA Não reagente Palm Palmeira PBS Phosphate Buffer Solution PCR Reação em Cadeia da Polimerase PGM Phosphofoglucomutase pH Potencial hidrogeniônico pmol Picomol Pop População POS Positivo QBC System Quantitative Buffy-Coat r DNA DNA ribossômico r RNA RNA ribossômico RAPD Randômica Amplificação de DNA Polimórfico Rnas Molécula de RNA dotada de função enzimática RPM Rotação por Mmnuto RPMI 1640 Meio monofásico de cultura desenvolvido pela Roswell Park Memorial Institute SL Spliced leader SUS Sistema Único de Saúde SVS Secretaria de Vigilância em Saúde TBE Tampão Tris-Borato EDTA ix TCI Tripanosoma cruzi I TCII Tripanosoma cruzi II TCLE Termo de Consentimento Livre e Esclarecido TFD Tratamento fora do domicílio TR Trypanosoma rangeli Tris KCL Tris(Hidroximetil) aminometano Tris-HCL Tris-Hidroximetil ácido clorídrico UV Ultra violeta W Watts Xeno Xenodiagnóstico Z1 Zimodema 1 Z2 Zimodema 2 Z3 Zimodema 3 x LISTA DE FIGURAS Figura 1. Distribuição geográfica da Doença de Chagas Aguda na Amazônia Brasileira de 1968 a 2007.................................................................... Figura 2. 17 Distribuição geográfica dos surtos de doença de Chagas aguda no Pará e Amapá entre os anos de 1995 e 2005....................... 25 Figura 3. Discussão dos objetivos do trabalho com as comunidades................. 27 Figura 4. A. T. cruzi visualizado no QBC® System. B. T. cruzi visualizado em gota espessa................................................................................... Figura 5. Comunidade ribeirinha onde ocorreu surto de doença de Chagas aguda em Abaetetuba.......................................................................... Figura 6. 39 42 À esquerda, residência de pacientes no surto de Ananindeua. À direita, dois dos pacientes com diagnóstico positivo de fase aguda para doença de Chagas........................................................................ Figura 7. 46 À esquerda, residências de pacientes do surto de Barcarena. À direita, dois pacientes com diagnóstico positivo para fase aguda de doença de Chagas................................................................................ Figura 8. 49 À esquerda, residência de pacientes do surto de Belém. À direita, três dos pacientes com diagnóstico positivo para fase aguda de doença de Chagas................................................................................ Figura 9. 52 À esquerda, residências de pacientes do surto de Bragança. À direita, coleta de sangue de um dos pacientes com diagnóstico positivo para fase aguda de doença de Chagas.................................... Figura 10. Ambiente de transmissão e pacientes num surto de doença de Chagas familiar no Mazagão-AP........................................................ Figura 11. 55 58 A. Didelphis marsupialis; B. Philander opossum; C. Marmosa cinerea; mamíferos mais capturados nos estudos dos surtos.............. 62 Figura 12. Coleta de triatomíneos em palmeiras................................................... 65 Figura 13. Coleta de triatomíneos em armadilhas luminosas............................... 66 Figura 14. Gel de Mini-Exon com caracterização de isolados do surto de Mazagão............................................................................................... Figura 15. Géis de RAPD com isolados representativos de humanos, mamíferos e triatomíneos dos 5 surtos................................................ Figura 16. 70 71 Fenogramas por surtos gerados a partir das matrizes de similaridade obtidos com o coeficiente de Jaccard.................................................. xi 72 LISTA DE GRÁFICOS Gráfico 1. Acompanhamento de exames parasitológicos positivos dos pacientes de Abaetetuba.................................................................................................. Gráfico 2. Acompanhamento de exames sorológicos dos pacientes de Abaetetuba, em 4 intervalos de tempo........................................................................... Gráfico 3. 59 Acompanhamento de exames sorológicos dos pacientes de Mazagão, em 5 intervalos de tempo................................................................................. Gráfico 18. 57 Acompanhamento de exames parasitológicos positivos dos pacientes de Mazagão..................................................................................................... Gráfico 17. 57 Resumo dos resultados parasitológicos e sorológicos observados no surto de Bragança....................................................................................... Gráfico 16. 56 Acompanhamento de exames sorológicos dos pacientes de Bragança, em 4 intervalos de tempo............................................................................ Gráfico 15. 54 Acompanhamento de exames parasitológicos positivos dos pacientes de Bragança..................................................................................................... Gráfico 14. 54 Resumo dos resultados parasitológicos e sorológicos observados no surto de Belém............................................................................................ Gráfico 13. 53 Acompanhamento de exames sorológicos dos pacientes de Belém, em 4 intervalos de tempo.................................................................................... Gráfico 12. 51 Acompanhamento de exames parasitológicos positivos dos pacientes de Belém.......................................................................................................... Gráfico 11. 51 Resumo dos resultados parasitológicos e sorológicos observados no surto de Barcarena...................................................................................... Gráfico 10. 50 Acompanhamento de exames sorológicos dos pacientes de Barcarena, em 4 intervalos de tempo............................................................................ Gráfico 9. 48 Acompanhamento de exames parasitológicos positivos dos pacientes de Barcarena.................................................................................................... Gráfico 8. 48 Resumo dos resultados parasitológicos e sorológicos observados no surto de Ananindeua................................................................................... Gráfico 7. 47 Acompanhamento de exames sorológicos dos pacientes de Ananindeua, em 4 intervalos de tempo........................................................................... Gráfico 6. 45 Acompanhamento de exames parasitológicos positivos dos pacientes de Ananindeua................................................................................................. Gráfico 5. 44 Resumo dos resultados parasitológicos e sorológicos observados no surto de Abaetetuba.................................................................................... Gráfico 4. 43 61 Resumo dos resultados parasitológicos e sorológicos observados no surto de Mazagão........................................................................................ xii 61 LISTA DE TABELAS Tabela 1. Surtos de doença de Chagas fora da Amazônia Brasileira 1967-2006....... 11 Tabela 2. Surtos de doença de Chagas na Amazônia Brasileira 1968-2007.............. 13 Tabela 3. Distribuição geográfica dos surtos de doença de Chagas aguda no Pará e Amapá entre os anos de 1995 e 2005......................................... Tabela 4. 26 Pesquisa sorológica em municípios onde ocorreram surtos de doença de Chagas dos estados do Pará e Amapá entre os anos de 1995 e 2005............................................................................................................ 29 Tabela 5. Iniciadores do gene de Mini-Exon............................................................. 35 Tabela 6. Oligonucleotídeos usados na análise de RAPD.......................................... 36 Tabela 7. Surtos de doença de Chagas aguda que ocorreram no Pará e Amapá entre os anos 1995-2005............................................................................. Tabela 8. Surtos de doença de chagas aguda selecionados para os estudos no Pará e Amapá entre os anos de 1995 e 2005...................................................... Tabela 9. 38 39 Pesquisa parasitológica em municípios onde ocorreram surtos de doença de Chagas no estado do Pará e Amapá entre os anos de 1995 e 2005......................................................................................................... Tabela 10. 40 Pesquisa sorológica em municípios onde ocorreram surtos de doença de Chagas nos estados do Pará e Amapá, entre os anos de 1995 e 2005............................................................................................................ Tabela 11. Mamíferos coletados nas áreas de ocorrência de surtos nos estados do Pará e Amapá entre 1995 a 2005................................................................ Tabela 12. 65 Triatomíneos capturados em diferentes ecótopos no Pará e Amapá entre os anos de 1995 e 2005............................................................................... Tabela 16. 64 Distribuição dos triatomíneos coletados em 5 espécies de palmeiras em municípios dos estados do Pará e Amapá, 1995-2005............................... Tabela 15. 63 Palmeiras como principais ecótopos de triatomíneos em municípios do Pará e Amapá, 1995-2005.......................................................................... Tabela 14. 63 Presença de tripanossomas em mamíferos silvestres coletados nos estados do Pará e Amapá entre os anos de 1995 e 2005............................ Tabela 13. 41 67 Taxa de infecção de triatomíneos coletados nos estados do Pará e Amapá entre os anos de 1995 e 2005......................................................... xiii 68 LISTA DE QUADROS Quadro 1. Espécies de triatomíneos já referidas à Região Amazônica do Brasil.... 06 Quadro 2. OTU- Unidade taxonômica operacional................................................. 37 Quadro 3. Acompanhamento de exames parasitológico dos pacientes de Abaetetuba em 4 intervalos de tempo..................................................... Quadro 4. Acompanhamento de exames sorológicos dos pacientes de Abaetetuba em 4 intervalos de tempo..................................................... Quadro 5. Acompanhamento de exames sorológicos dos pacientes 56 Acompanhamento de exames parasitológicos dos pacientes do Mazagão em 5 intervalos de tempo....................................................... Quadro 14. 55 Acompanhamento de exames sorológicos dos pacientes de Bragança em 4 intervalos de tempo....................................................................... Quadro 13. 53 Acompanhamento de exames parasitológicos dos pacientes de Bragança em 4 intervalos de tempo........................................................ Quadro 12. 52 Acompanhamento de exames sorológicos dos pacientes de Belém em 4 intervalos de tempo.............................................................................. Quadro 11. 50 Acompanhamento de exames parasitológicos dos pacientes de Belém em 4 intervalos de tempo........................................................................ Quadro 10. 49 Acompanhamento de exames sorológico dos pacientes de Barcarena em 4 intervalos de tempo........................................................................ Quadro 9. 47 Acompanhamento de exames parasitológicos dos pacientes de Barcarena em 4 intervalos de tempo....................................................... Quadro 8. 46 de Ananindeua em 4 intervalos de tempo.................................................... Quadro 7. 44 Acompanhamento de exames parasitológicos dos pacientes de Ananindeua em 4 intervalos de tempo.................................................... Quadro 6. 43 59 Acompanhamento de exames sorológicos dos pacientes do Mazagão em 5 intervalos de tempo........................................................................ xiv 60 SUMÁRIO 1. Introdução................................................................................................. 1.1. Retrospectiva dos estudos sobre reservatórios e vetores silvestres do T. 01 cruzi e da doença de Chagas na Amazônia Brasileira.............................. 03 1.2. Importância epidemiológica da transmissão oral da doença de Chagas... 07 1.3. Histórico dos estudos sobre transmissão oral na América do Sul............ 07 1.4. Evidências de infecção humana por via oral............................................ 08 1.4.1. Na América do Sul................................................................................... 08 1.4.2. No Brasil................................................................................................... 10 1.5. Os surtos de doença de Chagas Aguda na Amazônia Brasileira................................................................................................... 11 2. Diversidade genética do T. cruzi.............................................................. 19 3. Objetivos................................................................................................... 24 3.1. Objetivo geral........................................................................................... 24 3.2. Objetivos específicos................................................................................ 24 4. Material e métodos................................................................................... 25 4.1. Dados gerais do estudo............................................................................. 25 4.1.1. Municípios ou localidades........................................................................ 25 4.1.2. Visitas às áreas de estudo......................................................................... 26 4.1.3. Trabalhos com a população humana........................................................ 26 4.1.4. Detecção de casos agudos......................................................................... 27 4.1.5. Coleta de material e diagnóstico laboratorial........................................... 27 4.1.6. Exames parasitológicos............................................................................ 28 4.1.6.1. Pesquisa de T. cruzi em gota espessa....................................................... 28 4.1.6.2. Exame das amostras pelo QBC® System Quantitative Buffy Coat........... 28 4.1.6.3. Hemocultura.............................................................................................. 28 4.1.6.4. Xenodiagnóstico artificial......................................................................... 28 4.1.7. Sorologia................................................................................................... 28 4.1.8. Tratamento e seguimento de casos........................................................... 30 5. Estudo de reservatórios silvestres............................................................. 30 5.1. Captura e identificação de animais silvestres........................................... 30 5.2. Coleta de sangue dos animais................................................................... 31 5.3. Hemoscopia e hemocultura....................................................................... 31 5.4. Xenodiagnóstico....................................................................................... 31 xv 6. Estudo entomológico................................................................................ 32 6.1. Coleta de triatomíneos silvestres em palmeiras........................................ 32 6.2. Coleta com armadilhas luminosas............................................................ 33 6.3. Identificação dos espécimes coletados..................................................... 33 6.4. Exame do conteúdo intestinal dos triatomíneos....................................... 33 7. Isolamento e cultivo in vitro..................................................................... 34 7.1. Isolamento de pacientes, de animais silvestres e de triatomíneos silvestres.................................................................................................... 34 8. Extração de DNA...................................................................................... 34 9. Tipagem genotípica das cepas de tripanossomas pelo gene de Miniexon........................................................................................................... 35 10. Tipagem por RAPD.................................................................................. 36 11. Análise fenética......................................................................................... 37 12. Análise estatística dos dados..................................................................... 37 13. Resultados................................................................................................. 38 13.1. Casuística dos surtos de DCA e estudos na população humana...................................................................................................... 13.2. 38 Exames parasitológicos: Pesquisa de T. cruzi em gota espessa (GE), Pesquisa de T. cruzi pelo QBC® System Quantitative Buffy Coat, hemocultura e xenodiagnóstico artificial.................................................. 39 13.3. Sorologia................................................................................................... 40 13.4. Tratamento e seguimento de casos agudos............................................... 41 13.5. Surto de Abaetetuba.................................................................................. 42 13.6. Surto de Ananindeua................................................................................. 46 13.7. Surto de Barcarena.................................................................................... 49 13.8. Surto de Belém.......................................................................................... 52 13.9. Surto de Bragança..................................................................................... 55 13.10. Surto de Mazagão..................................................................................... 58 14. Captura de animais.................................................................................... 62 14.1. Captura e identificação de animais silvestres........................................... 62 ® 14.2. Pesquisa de T. cruzi pelo sistema QBC e em gota espessa (GE)............ 63 14.3. Xenodiagnóstico e Hemocultura............................................................... 63 15. Estudo entomológico................................................................................ 64 15.1. Coleta de triatomíneos em palmeiras........................................................ 64 xvi 15.2. Coleta de triatomíneos em armadilhas luminosas..................................... 66 15.3. Exame do conteúdo intestinal dos triatomíneos........................................ 66 16. Isolamento e cultivo in vitro..................................................................... 69 16.1. Isolamento de tripanossomas em amostras de pacientes, animais e triatomíneos............................................................................................... 69 17. Tipagem genotípica das cepas de tripanossomas pelo Mini-exon............ 69 17.1. Tipagem de isolados de pacientes............................................................. 69 17.2. Tipagem de isolados de animais silvestres............................................... 69 17.3. Tipagem de isolados de triatomíneos silvestres........................................ 69 17.4. Análise fenética por RAPD....................................................................... 70 18. Discussão.................................................................................................. 73 18.1 Diagnóstico parasitológico e sorológico................................................... 75 18.2 Seguimento dos casos com testes parasitológicos e sorológicos.............. 78 18.3 Coleta e caracterização de animais silvestres........................................... 79 18.4 Coleta e caracterização de triatomíneos silvestres.................................... 81 18.5 A variabilidade e a diversidade genética do T. cruzi................................ 83 18.6 Estudo da variabilidade de isolados de surtos do Pará e Amapá pelo marcador de RAPD (Random Amplification of Polymorphic Dna).......................................................................................................... 86 19. Conclusões................................................................................................ 90 20. Referências................................................................................................ 91 21 Anexos....................................................................................................... 112 xvii ANEXOS Anexo 1. Submissão do projeto de estudos ao Comitê de Ética do Instituto Evandro Chagas............................................................................................................. 112 Anexo 2. Ficha Epidemiológica nos Estudos da População Humana............................. 113 Anexo 3. Termo de consentimento livre esclarecido...................................................... 114 Anexo 4. Meios de cultura Hoff’s, RPMI 1640 e meio LIT........................................... 116 Anexo 5. Técnica de Hemaglutinação Indireta............................................................... 117 Anexo 6. Técnica de Imunofluorescência Indireta.......................................................... 118 Anexo 7. Artigo submetido e aceito para publicação...................................................... 119 Anexo 8. Preparo de soluções salinas para dissecação de triatomíneos.......................... 134 Anexo 9. Autorização do IBAMA................................................................................... 135 Anexo 10. Protocolo do Comitê de Ética em Pesquisa com Animais do Instituto Evandro Chagas............................................................................................... Anexo 11. 136 Isolado de tripanossomatídeos obtidos em surtos de Doença de Chagas no estado do Pará e Amapá – 1995 a 2005........................................................... 137 Anexo 12. Isolamentos de pacientes em microepidemia no Pará e Amapá...................... 138 Anexo 13. Isolamentos de animais em surtos no Pará e Amapá....................... 139 Anexo 14. Isolamentos de triatomíneos em surtos no Pará e Amapá............... 140 xviii Sebastião Aldo da Silva Valente Introdução 1. INTRODUÇÃO A posição taxonômica do protozoário Trypanosoma schizotrypanum cruzi descrito por Carlos Chagas em 1909 enquadra-o na Ordem Kinetoplastida e Família Trypanosomatidae. Morfologicamente apresenta um único flagelo e uma mitocôndria que contém o cinetoplasto e concentra praticamente um terço do DNA (kDNA) da célula em estruturas reticulares no formato de maxi e minicírculos, diferentes de demais eucariotas que apresentam o DNA espalhado por toda a mitocôndria. A posição do cinetoplasto é um referencial para distinguir morfologicamente o estágio do parasita. Na fase de tripomastigota metacíclico, forma infectante para o hospedeiro, o cinetoplasto situa-se posteriormente ao núcleo. Na fase de epimastigota, o cinetoplasto apresenta-se em posição justanuclear e anterior ao núcleo e na fase de amastigota apresenta-se difundido como esferas em torno dos flagelos ainda em formação. O parasita apresenta um cilco heteroxênico que envolve vertebardos e invertebrados. O parasita infecta pelo menos mil espécies de mamíferos e quase uma centena de espécies de triatomíneos, hemípteros hematófagos obrigatórios da Família Reduviidae. T. cruzi vive no intestino dos triatomíneos e, após o repasto sanguíneo, as formas de tripomastigota metacíclico podem penetrar pela pele e mucosas íntegras e com solução de continuidade do hospedeiro, incluindo o homem, em função do rápido processo alérgico pruriginoso local. Entre as várias formas de transmissão (vetorial, transfusional, congênita e acidental), a via oral é a mais importante na Amazônia Brasileira, (VALENTE et al., 2006). Apesar de descrita desde 1909 por Carlos Chagas, somente décadas depois foi reconhecida como um agravo de grande repercussão na saúde pública da América Latina. Estimativas do Banco Mundial e da Organização Mundial de Saúde nos anos que antecederam as campanhas de combate aos triatomíneos domiciliares apontavam para um contingente de 16 a 18 milhões de pessoas infectadas numa extensa área compreendida desde o México até a Argentina, cobrindo países como Belize, Guatemala, Honduras, El Salvador, Nicarágua, Costa Rica, Panamá, Colômbia, Venezuela, Guiana, Suriname, Guiana Francesa, Equador, Peru, Bolívia, Chile, Paraguai, Uruguai e Brasil, todos apresentando diferentes indicadores de soro prevalência para a infecção (SCHMUNIS et al., 1999). Na década de 90, da casuística sul americana o Brasil participava com 40% dos infectados e a região considerada endêmica com presença de triatomíneos domiciliares abrangia uma faixa de 2 milhões de km2 abrigando uma população sob risco de infecção em torno de 18 milhões de pessoas e previa-se também que 200.000 novos casos, com 21.000 óbitos, ocorreriam a cada ano (SCHOFIELD & DIAS, 1999; MOREL, 2000). A taxa de mortalidade da doença de Chagas entre as doenças 1 Sebastião Aldo da Silva Valente Introdução parasitárias não pode ser subestimada, considerando que é responsável pela morte de 50 mil pessoas por ano, ficando atrás somente da malária e da esquistossomose (WHO, 2002). A doença acomete na América Latina principalmente pessoas muito pobres da população. A fase aguda apresenta quadro clínico semelhante a outros processos infecciosos, com lesões pontuais de gravidade variável. Nessa fase podem surgir quadros clínicos graves e até irreversíveis, como a cardite chagásica, que acomete entre 20 e 30% dos casos, as megasíndromes 6% (cólon e esôfago) e seqüelas neurológicas em 3% dos infectados. A mortalidade oriunda das lesões cardíacas é alta, haja vista que aparecem, sobretudo, na fase crônica, décadas após a infecção aguda. Os quadros oligossintomáticos e silenciosos vão se manifestar muitos anos após a infecção, criando problemas sociais e previdenciários de relevância (DIAS et al., 2002b). Não existe vacina nem desenvolvimento de novas drogas mais eficientes do que as duas drogas disponíveis que são as mesmas de 30 atrás, com efeitos colaterais indesejáveis e de eficácia satisfatória somente na fase aguda da doença. Iniciativas regionais para controle de triatomíneos foram adotadas nos países andinos do Cone Sul e da América Central e reduziram a transmissão vetorial, apesar das dificuldades de recursos financeiros e da falta de pessoal (DIAS et al., 2002a; MONCAYO, 1997, 2003). A doença de Chagas apresentava-se como endemia em grande parte do território brasileiro em habitações infestadas por triatomíneos: Triatoma infestans; Triatoma sordida, Triatoma brasiliensis; Triatoma pseudomaculata e Panstrongylus megistus, todos derivados dos ecótopos degradados de campos abertos naturais e úmidos da Mata Atlântica e do semiárido de caatingas e cerrados (FORATTINI, 1980; MALCOLM, 1991). Esse cenário mudou bastante após as ações de controle triatomínico e a atual área endêmica brasileira praticamente se extinguiu (SILVEIRA, 2002). Ambientes ecológicos exauridos por alterações contínuas e de longa data proporcionam a perda da fertilidade do solo, deterioram a qualidade de vida da população rural que habita as áreas endêmicas. Essas populações sem moradia, educação, saneamento e alimentação dignas têm favorecido historicamente a domiciliação dos triatomíneos e a permanência da doença de Chagas. A exploração desordenada dos recursos naturais, seguida de devastação de grandes faixas territoriais na cobertura vegetal da região equatorial amazônica tem produzido espaços abertos de dimensões colossais, a ponto de, em alguns deles, não haver mais sinais de recuperação, fato que leva à aceleração dos processos irreversíveis de desertificação. Essas condições contribuem para o desaparecimento das espécies nativas de aves e mamíferos, fontes alimentares imediatas de insetos hematófagos, constituindo-se na perda de uma barreira que facilita a dispersão de doenças veiculadas por 2 Sebastião Aldo da Silva Valente Introdução insetos, incluindo os triatomíneos silvestres e criam possibilidades de sobrevivência de espécies importadas, (SHAW et al., 1969; FORATTINI, 1980; MACOLM, 1991; TEIXEIRA et al., 2001). Até o momento já foram registradas na região 22 espécies (GALVÃO et al., 2003), sendo que duas, Rhodnius pictipes e Panstrongylus geniculatus infectados com T. cruzi, eventualmente insetos adultos invadem domicílios picando o homem e favorecendo aparecimento de casos agudos. Em decorrência desse fato, o processo de endemização da doença de Chagas já estaria ocorrendo na Amazônia Brasileira, pelo deslocamento do ciclo silvestre para próximo do domicílio do homem, incluindo triatomíneos que buscam alternativas de fonte alimentar e de abrigo (SCHOFIELD et al., 1982; COURA et al., 2002a; VALENTE, et al., 2004). 1.1. RETROSPECTIVA DOS ESTUDOS SOBRE RESERVATÓRIOS E VETORES SILVESTRES DO T. CRUZI E DA DOENÇA DE CHAGAS NA AMAZÔNIA BRASILEIRA FERREIRA & DEANE (1938) foram os pioneiros na realização de estudos sobre reservatórios e vetores silvestres do T. cruzi na Região Amazônica, encontrando a irara (Tayra barbara) naturalmente infectada. Mais tarde, DEANE & JANSEN (1939) identificaram o parasito em material isolado de triatomíneos e de marsupiais. RODRIGUES & MELO (1942), trabalhando no Aurá, realizaram o primeiro inquérito hemoparasitoscópico de doença de Chagas na Amazônia e examinaram 117 indivíduos, todos negativos. Observaram, porém, a infecção natural por tripanossoma tipo T. cruzi em onze gambás, cinco tatus, cinco morcegos, três tamanduás e uma irara, comprovando o ciclo silvestre na região. Em outros trabalhos realizados posteriormente por DEANE (1961a. 1961b, 1964a, 1964b, 1967), com reservatórios silvestres na periferia de Belém e na rodovia Belém- Brasília, foi detectada a presença de organismos tipo T. cruzi em marsupiais e morcegos. Ao examinarem 1.171 mamíferos de 13 diferentes espécies no Estado do Pará, LAINSON et al., (1979) encontraram tripanossomas semelhantes a T. cruzi em marsupiais (Didelphidae), tatus (Dasypus novemcinctus), porco-espinho (Coendou sp.), quatis (Nasua nasua) e roedores. DEANE (1963, 1964c) realizou os primeiros inquéritos sorológicos de doença de Chagas na Amazônia Brasileira, nos Estados do Amapá e Pará e não detectou resultados positivos nas populações estudadas. O primeiro caso de doença de Chagas de que se tem registro na Amazônia foi observado em 1940 na Guiana Francesa, em menor, de 7 anos, quando foram encontrados amastigotas de T. cruzi em material de punção esternal (FLOCH & TASQUÉ, 1941). Anos 3 Sebastião Aldo da Silva Valente Introdução mais tarde, FLOCH & CAMAIN (1948) descreveram novos casos de infecção assintomática e casos agudos na Guiana. Somente no final de 1960 foram descritos em Belém os primeiros casos autóctones de doença de Chagas da Amazônia Brasileira, quatro casos agudos, simultâneos, numa mesma família e num mesmo domicílio (SHAW et al., 1969). Outros episódios dessa natureza foram detectados na região nas décadas seguintes. Entre os anos de 1975 e 1979, um amplo Inquérito Sorológico Nacional para doença de Chagas (CAMARGO et al., 1984), revelou baixos índices de soro-prevalência na Região Amazônica: no Amapá 0%; Roraima 0,3%; Rondônia 0,4%; Pará 0,6%; Amazonas 1,9%; e Acre 2,4%. Inquéritos recentemente realizados no Município de Barcelos (AM) têm apresentado índices elevados (12,5%) de anticorpos anti-T. cruzi, associando a infecção chagásica principalmente a pessoas dedicadas à extração de piaçava, as quais referem freqüentes ataques por triatomíneos, conhecidos no local como “piolho da piaçava” (COURA et al., 1994, 1995). SHERLOCK (1979) e LAINSON et al., (1979) referiram que as espécies amazônicas, citadas no Quadro 1, com exceção do Triatoma rubrofasciata, são de hábitos silvestres restritos e que a ausência de triatomíneos colonizando domicílios contribui para que a região não seja reconhecida como endêmica da doença de Chagas. Essas condições, entretanto, não explicam nem impedem que episódios familiares regulares e freqüentes ocorram na região, visto que eventualmente adultos de R. pictipes e P. geniculatus voam para o interior das casas atraídos pela luz, inclusive picando o homem, originando casos agudos a partir do ciclo enzoótico (VALENTE et al., 1998a, 1999a,b, 2001, 2004). São escassos os estudos sobre o envolvimento de espécies silvestres com a transmissão da doença de Chagas na Amazônia Brasileira. Referem-se, na maioria, a investigações dos hábitos alimentares (RODRIGUES & MELO, 1942), ou à observação da taxa de infecção natural por tripanossomas (DEANE, 1947; ALMEIDA, 1971; ALMEIDA & MACHADO 1971; LAINSON et al., 1979; MASCARENHAS, 1986). Novas perspectivas nesse campo foram alcançadas por MILES (1976) que introduziu uma metodologia facilitando o seguimento de mamíferos até seus refúgios, proporcionando a identificação dos ecótopos naturais de diversas espécies de triatomíneos da Amazônia Brasileira (R. pictipes, R. robustus, P. geniculatus, P. lignarius, P. rufotuberculatus, E. mucronatus, M. trinidadensis, Belminus herreri), além da descrição de Rhodnius paraensis (SHERLOCK et al., 1977). Estudos que empregam essa metodologia foram realizados em outras regiões e os resultados foram ratificados (MILES et al., 1981b, MILES & SOUZA, 1986). 4 Sebastião Aldo da Silva Valente Introdução O encontro desses triatomíneos, de acordo com BARRETT & GUERRERO (1991), é relativamente freqüente, diante da existência na Amazônia Brasileira de grandes faixas de terra, estimadas em 20.000 Km2, ocupadas por babaçuais com variadas espécies de palmeiras do gênero Orbygnia, ecótopos naturais das principais espécies que compõem a fauna triatomínica da região, principalmente R. pictipes, R. robustus e P. geniculatus. Algumas dessas espécies, como adultos do Rhodnius brethesi, no Estado do Amazonas, vivem em palmeiras de piaçava (Leopoldinia piacaba), associados com pequenos répteis (MASCARENHAS, 1987; 1991). Quando famintos, atacam as pessoas que exploram a piaçava, em busca de alimento no Rio Padauari, afluente do Rio Negro (COURA et al., 1994a). Na cidade de Manaus, NAIFF et al., (1998) observaram que adultos famintos de P. geniculatus, portadores da infecção por T. cruzi, entraram em domicílios, sobretudo na estação seca. 5 Sebastião Aldo da Silva Valente Introdução Quadro 1. Espécies de triatomíneos já referidos à Região Amazônica do Brasil1 Espécie Alberprosenia malheiroi Belminus herreri Cavernicola lenti Cavernicola pilosa Eratyrus mucronatus Brasil Desconhecido Desconhecido Sem registro Associado à transmissão Não Brasil, Panamá Brasil Brasil, Colômbia, Equador, Panamá e Venezuela Brasil, Bolívia, Colômbia, Guiana Francesa, Guiana, Peru, Suriname, Trinidad e Venezuela Brasil, Bolívia, Peru, Colômbia, Panamá, Suriname, Trinidad e Venezuela Argentina, Bolívia, Brasil, Colômbia, Costa Rica, Equador, Guiana Francesa, Guiana, Nicarágua, Suriname, Panamá, Paraguai, Peru, Trinidad, Uruguai e Venezuela Tronco de árvores Cavernas Cavernas Árvores ocadas Lagartixas Morcegos Morcegos Coendou e roedores Sem registro Sim Sim Sim Não Não Não Não Palmeiras Marsupiais e Sem registro roedores Marsupiais, roedores, Sim tatus e animais domésticos Não Descritor(es) Serra, Serra & Von Atzingen, 1980 Lent & Wigodzinsky, 1979 Barrett & Arias, 1985 Barber, 1937 Stål, 1859 Microtriatoma trinidadensis Lent, 1951 Ecótopo Animal associado + T. cruzi Buracos no chão, Sim palmeiras, chiqueiros e galinheiros Panstrongylus lignarius Walker, 1873 Brasil, Guiana, Suriname e Venezuela. Buracos e copas de Sim Não árvores Panstrongylus rufotuberculatus Champion, 1899 Bolívia, Brasil, Colômbia, Costa Rica, Equador, México, Desconhecido Desconhecido Sim Talvez Panamá, Peru e Venezuela. Psamolestes tertius Lent & Jurgerg, 1965 Brasil Ninhos de aves Aves Sim Não Rhodnius amazonicus Almeida, Santos & Sposina, Pará Desconhecido Desconhecido Desconhecid Desconhecido 1973 o Rhodnius brethesi Matta, 1919 Brasil, Colômbia e Venezuela Palmeiras Lagartixas Sim Talvez Rhodnius jacundaensis Serra, Serra & Von Atzingen, Brasil Desconhecido Desconhecido Desconhecid Desconhecido 1980* o Rhodnius nasutus Stål, 1859 Brasil (Ceará, Maranhão, Paraíba, Piauí, Rio Grande do Norte) Palmeiras Marsupiais Sim Sim Rhodnius neglectus Lent, 1954 Brasil (Bahia, Goiás, Mato Grosso, Maranhão, Minas Gerais, Marsupiais e Sim Talvez Paraná, Pernambuco, São Paulo) roedores Rhodnius milesi Valente et al.,; 1999 Brasil Palmeiras Marsupiais e Sim Talvez roedores Rhodnius paraensis Sherlock, Guitton & Miles, Brasil Palmeiras Echimys Não Não 1977 Rhodnius pictipes Stål, 1872 Bolívia, Brasil, Colômbia, Equador, Guiana Francesa, Guiana, Palmeiras Roedores e Sim Sim Peru, Suriname, Trinidad e Venezuela. marsupiais Rhodnius prolixus Stål, 1859 Colômbia, Costa Rica, Guiana Francesa, Guiana, Guatemala, Palmeiras, Roedores, marsupiais Sim Sim Honduras, México, Nicarágua, El Salvador e Venezuela domicílios e anexos e homem Rhodnius robustus Larrousse, 1927 Brasil, Colômbia, Equador, Guiana Francesa, Peru e Venezuela Palmeiras e Roedores e Sim Sim bromélias marsupiais Triatoma maculata Erichson, 1848 Aruba, Boanire, Brasil, Suriname e Venezuela Desconhecido Animais silvestres e Sim Sim homem Triatoma rubrofasciata De Gerr, 1773 Cosmopolita Abrigos do rato Rato doméstico Sim Sim doméstico 1 Fonte: GALVÃO et al., (2003). Checklist of the current valid species of the subfamily Triatominae Jeannel, 1919 (Hemiptera, Reduviidae) and their geographical distribution, with nomenclatural and taxonomic notes. Zootaxa 202: 1-36 (2003). _________________________________________________________________________________________________________________________________________________ Panstrongylus geniculatus Latreille, 1811 Distribuição 6 Sebastião Aldo da Silva Valente Introdução 1.2. IMPORTÂNCIA EPIDEMIOLÓGICA DA TRANSMISSÃO ORAL DA DOENÇA DE CHAGAS A via oral da infecção chagásica ao homem é considerada um mecanismo primário de transmissão. Esse mecanismo alternativo tem merecido atenção e deverá manter importância quando medidas sanitárias interromperem a transmissão vetorial e a transfusional (COURA, 1997). O conceito de transmissão oral da doença de Chagas está intimamente relacionado ao ambiente enzoótico natural do T. cruzi. Nesse ciclo, triatomíneos silvestres partilham ecótopos naturais com mamíferos silvestres, cujo sangue constitui sua fonte alimentar. Considerando que os mamíferos reservatórios de T. cruzi (marsupiais, edentados e roedores) são também insetívoros, eles podem, eventualmente, alimentar-se de triatomíneos naturalmente infectados, desde que tais oportunidades lhes sejam oferecidas. Acredita-se que assim se mantenha o ciclo do parasito em natureza, por via digestiva e não transcutânea, já que esta é, certamente, dificultada pela espessura do tegumento e pela própria pelagem dos animais. 1.3. HISTÓRICO DOS ESTUDOS SOBRE TRANSMISSÃO ORAL NA AMÉRICA DO SUL Observações sobre a possibilidade de transmissão de T. cruzi por via oral foram referidas inicialmente por NATAN-LARRIER (1921), depois por BRUMPT (1931), KOFOID & DONAT (1933) e CARDOSO (1933), que testaram a capacidade de mamíferos de se infectarem com fezes de triatomíneos. MAZZA et al., (1936) descreveu um caso agudo em lactente, atribuindo-o à transmissão por via digestiva, tendo demonstrado a presença de tripomastigotas no leite materno. Informações de grande valor histórico sobre casos humanos de doença de Chagas por essa via são também enumeradas, detalhadamente, pela revisão de STORINO & JÖRG (1994), em que dois relatos merecem atenção, ambos relacionados à região do Chaco argentino. No primeiro, o Dr. Ramón Freire informa que, ao tratar uma criança de 3 meses, em fase aguda, obteve da mãe da criança a informação de que a doença se manifestara imediatamente após uma curandeira da região “receitar-lhe” uma beberagem composta de várias ervas em mistura com sangue fresco de tatu. O segundo relato, feito pelo Dr. Braverman, refere que atendeu uma criança de 12 anos com quadro grave de insuficiência __________________________________________________________________________________________ 7 Sebastião Aldo da Silva Valente Introdução cardíaca, culminando com óbito, vinte dias após participar de uma excursão de caça em que consumiu exclusivamente carnes de animais silvestres, como pacas, tatus e gambás. Naquela região esses animais são reservatórios naturais do T. cruzi (MAZZA et al., 1930, 1931). Nos estudos experimentais sobre a viabilidade do parasito pela via oral, TORRICO (1950) e WOOD (1960) observaram a sobrevivência de T. cruzi em triatomíneos um mês após a morte desses insetos, ingeridos por animais domésticos, como coelhos, gatos e cães. VERGANI (1952) registrou que, quando moscas domésticas se alimentavam de sangue de animais infectados por T. cruzi, ou mesmo de fezes de triatomíneos, permaneciam com o parasito por até oito dias, levando cães que se alimentassem delas a se infectar. Esse trabalho, ampliado por DIAZ UNGRÍA (1968) demonstrou, mesmo temporariamente, que outros insetos, como baratas Periplaneta americana e Blatella germanica poderiam infectar-se quando alimentadas com dejetos ou alimentos contaminados com T. cruzi. MAYER (1961) e DIAZ UNGRÍA (1964) submeteram animais experimentais à ingestão de leite contaminado com formas infectantes de T. cruzi isoladas de triatomíneos. Os animais apresentaram infecção no intervalo de 9 a 29, dias com diferentes manifestações clínicas. DIAZ UNGRÍA (1967) demonstraram que o T. cruzi, se transmitido por via oral, não perde sua capacidade de infecção quando enfrenta o suco gástrico. Nos anos seguintes, diversos trabalhos ratificaram a viabilidade da transmissão por via oral, com a utilização de diferentes vias, hospedeiros e vetores expostos à contaminação pelo T. cruzi (RICKMANN, 1966; GOMES, 1966; DIAZ UNGRÍA, 1969; DIAZ UNGRÍA & SOTO BRACHO, 1970; DIAZ UNGRÍA & ZEUSS 1971; DAVIS, RUSSEL & ADAMS, 1980; LAINSON et al., 1980). 1.4. EVIDÊNCIAS DE INFECÇÃO HUMANA POR VIA ORAL 1.4.1. Na América do Sul A infecção humana por via oral pelo T. cruzi foi presumida por MAZZA et al., (1936) e TÁLICE (1964), na Argentina, quando depararam com casos clínicos cuja epidemiologia afastava qualquer possibilidade de contato com vetor ou história de transfusão. CARPINTERO (1978), examinando um grupo de mil casos de doença de Chagas, observou que os pacientes não conheciam triatomíneos, nunca haviam sido submetidos a transfusão, mas se referiam à ingestão freqüente de carne de animais silvestres hospedeiros do T. cruzi, quase sempre assados primitivamente “até dourar a pele”, conforme hábitos regionais. __________________________________________________________________________________________ 8 Sebastião Aldo da Silva Valente Introdução No Equador, AMUNARRIZ et al., (1991) e AGUILAR & YÉPEZ (1995) relataram que estudos sorológicos realizados por GUDERIAN e colaboradores (dados não publicados) em 1011 pessoas de 18 comunidades da Província de Secumbios, predominantemente nativos quíchuas da Amazônia equatoriana, resultaram em índice de infecção de 6,03%. No relato, os autores chamam a atenção que este índice poderia ser atribuído tanto à transmissão vetorial, quanto à transmissão oral, esta a partir da ingestão de carne de animais silvestres semi-crus, importante fonte alimentar que talvez fosse responsável por focos da doença entre índios da Amazônia equatoriana. A via oral também foi observada na Colômbia. RODRIGUEZ et al., (1992) encontraram evidência de surto a partir de manifestação de insuficiência cardíaca em habitantes de Tibu, Norte de Santander. Naquela localidade, seis soldados de um grupamento militar desenvolveram manifestações clínicas (sem óbito) compatíveis com doença de Chagas aguda (DCA), confirmadas apenas pelos exames imunológicos. Na ausência de lesão de porta de entrada, sugeriu-se a transmissão por via oral, considerando que o grupo tinha hábito de ingerir carne de animais silvestres durante os trabalhos na selva. Ainda na Colômbia, CARCERES et al., (1999) encontraram insuficiência cardíaca em 13 pessoas (3 óbitos) do povoado de Guamal, Departamento de Magdalena. Naquela localidade, as casas não tinham triatomíneos. Suspeitou-se de DCA adquirida por transmissão oral do T. cruzi, por ingestão do vinho extraído de uma palmeira. Em dezembro de 2007, um surto de doença de Chagas foi detectado numa escola primária do Município de Chacao, região metropolitana de Caracas, Venezuela, sendo confirmados pelo menos 8 casos por exames parasitológicos e mais de 100 por sorologia. Autoridades locais iniciaram tratamento específico em massa nos escolares. A clínica predominante foi síndrome febril prolongada, calafrios, cefaléia, mialgias, artralgias, palpitações, edema facial e de membros inferiores, eritema nodoso (em adultos), hepatomegalia e parestesias. Esses casos foram inicialmente tratados como dengue e mononucleose infecciosa. Suspeita-se que o suco de uma fruta local contaminado com fezes de triatomíneos teria desencadeado o surto (PROMED NEWS, 2007). __________________________________________________________________________________________ 9 Sebastião Aldo da Silva Valente Introdução 1.4.2. No Brasil A suspeita de transmissão de T. cruzi por via oral já pode ser deduzida do próprio artigo original de CARLOS CHAGAS (1909). Na tentativa de Oswaldo Cruz obter infecção em macacos pela picada de triatomíneos, a infecção de Calitrix penicilatta foi possivelmente mediada por ingestão dos triatomíneos pelos sagüis (COURA, 1997). O primeiro surto de doença de Chagas de que se tem notícia no Brasil foi registrada em Teutônia, localidade do Município de Estrela (RS), em março de 1965 (COURA, 1966; SILVA et al., 1968) e se caracterizou como infecção aguda simultânea de 17 pacientes. Seis deles foram a óbito e, na autópsia observou-se formas amastigotas de T. cruzi no músculo cardíaco. O xenodiagnóstico e a reação de fixação de complemento confirmaram o diagnóstico de doença de Chagas. Após a investigação epidemiológica, especulou-se que a transmissão poderia ter ocorrido pela ingestão de refeição servida na Escola Agrícola de Teutônia. O segundo surto foi registrada em Belém (PA) por SHAW et al., (1969), em uma família de 4 pessoas com quadro clínico típico de fase aguda de doença de Chagas. Após os estudos epidemiológicos, sugeriu-se a hipótese de transmissão por um alimento contaminado com fezes de triatomíneo silvestre. A viabilidade experimental dessa hipótese foi posteriormente demonstrada por LAINSON et al.,( 1980). Na localidade de Riacho de Santana (BA) um surto com 20 casos foi reportado por BARRETT et al., (1979), mas os autores não precisaram o alimento envolvido. Novo surto ocorreu em outubro de 1986 no município de Catolé do Rocha (PB), descrita por SHIKANAI-YASUDA et al., (1991). Um numeroso grupo de 94 pessoas participara de uma festa familiar e 26 delas apresentaram, simultaneamente, quadro muito semelhante aqueles referidos pelos pacientes de Teutônia. Um paciente de 74 anos foi a óbito após insuficiência cardíaca aguda. Na autópsia, foram observadas miocardite, esofagite e presença de amastigotas no tecido cardíaco. Exames sorológicos realizados no grupo revelaram resultados positivos (IgM) em 26 pessoas, das quais, 9 tiveram ainda o xenodiagnóstico positivo, dentre 14 examinadas. Concluiu-se que a transmissão teria ocorrido pela ingestão de caldo de cana, único alimento não cozido servido para os convidados e o que poderia estar contaminado com secreção anal de gambá ou fezes de triatomíneos, ambas espécies encontradas infectadas com T. cruzi no peridomicílio. Um resumo dos surtos conhecidos fora da Amazônia Brasileira encontra-se na Tabela 1, abaixo. __________________________________________________________________________________________ 10 Sebastião Aldo da Silva Valente Introdução Tabela 1. Surtos de doença de Chagas fora da Amazônia Brasileira, 1967-2006 UF MUNICÍPIO ANO Nº. CASOS REFERÊNCIA RS Teutônia 1967 17 Coura, 1966 BA Riacho de 1979 20 Barrett et al., 1979 Santana PB Catolé do Rocha 1991 26 Shikanay-Yasuda et al., 1991 SC Navegantes 2005 24 Steindel et al.,; 2008 CE Redenção 2006 8 Relato SVS no site: http://www.saude.ce.gov.br/internet/p ublicacoes/notastecnicas/nota_tecnica _chagas.pdf BA Macaúbas 2006 7 Relato SVS BA Ibipitanga 2006 6 Relato SVS TOTAL 108 Fonte: Ministério da Saúde, Brasil, 2007. O surto que mais chamou atenção ocorreu no município de Navegantes, SC, em 2005, e por se tratar de roteiro turístico muito concorrido, teve grande repercussão na mídia nacional e internacional. Acometeu um grupo de 24 pessoas, com 4 óbitos. Após a investigação epidemiológica aventou-se a hipótese de que triatomíneos silvestres foram triturados junto com feixes de cana, contaminado o caldo vendido para pessoas em lanchonete de uma auto-estrada (STEINDEL et al.,; 2008). Outros três surtos ocorreriam em 2006, sendo um no Estado do Ceará, município de Redenção, com 8 casos, e dois surtos na Bahia, um no município de Macaúbas, com 7 casos, e outro no município de Ibipitanga, com seis. As secretarias de saúde dos dois estados não conseguiram concluir como ocorreu a transmissão, nem identificou o(s) alimento(s) envolvido(s). 1.5. SURTOS DE DOENÇA DE CHAGAS AGUDA NA AMAZÔNIA BRASILEIRA Após a ocorrência do primeiro episódio familiar em Belém, outros viriam a ocorrer na região (resumidos na Tabela 2), como o relatado por RODRIGUES et al., (1988) que descreveram dois episódios, um com 6 casos no bairro de Santa Rita e outro com 2 casos agudos no bairro do Pacoval, todos ocorrido simultaneamente em outubro de 1984 na cidade de Macapá (AP), com história de febre prolongada, edema de membros inferiores, mal estar, cefaléia e exame parasitológico positivo em gota espessa. __________________________________________________________________________________________ 11 Sebastião Aldo da Silva Valente Introdução Outro episódio com 3 casos foi registrado em 1982 (comunicação pessoal dos Drs. Sarcinelli & Fraiha) numa família do bairro da Pedreira em Belém. Esses indivíduos apresentaram quadro agudo grave, todos com exames parasitológicos positivos, havendo um dos pacientes evoluído para óbito. Novos surtos seriam detectados: um com 3 casos em Belém, em 1983, e outro com 5 casos, na cidade de Cametá, PA, em 1988 (comunicação pessoal do Dr. Adelson Souza), todos ocorrendo entre os meses de setembro e outubro. Os pacientes exibiam quadro típico de fase aguda e enfatizavam nunca terem se ausentado do Estado nem terem sido submetidos a transfusão. Apresentaram os mesmos sintomas: febre prolongada (35 a 45 dias), edema dos membros inferiores e da face, cefaléia e eritema cutâneo. Seis dos 8 casos apresentavam exames parasitológicos positivos e todos revelaram imunofluorescência com IgG e IgM positivos. Novamente SOUZA et al., (1989) descreveram outro surto familiar ocorrido em um bairro da periferia de Belém, num grupo de 3 pessoas, em situações clínicas e epidemiológicas muito semelhantes àquelas referidas pelo mesmo autor em 1983. CRESCENTE et al., (1992) observaram em 1991 a ocorrência de surto em 4 pessoas de uma família residente na Vila de Icoaraci, a 20 km de Belém, todos com sintomas de fase aguda, sendo os seus exames sorológicos e parasitológicos positivos. Na investigação epidemiológica não foi comprovada a participação convencional de triatomíneos na transmissão, sugerindo-se então uma forma alternativa, talvez de transmissão coletiva via contaminação de alimentos. No ano seguinte, VALENTE et al., (1993) registraram novo episódio ocorrido em 1992, envolvendo 5 pessoas de uma mesma família, no município de Afuá, na região do Marajó (PA), que após passarem por vários serviços médicos sem diagnóstico, foram encaminhadas ao IEC em Belém em estado precário de saúde. Apresentavam sintomas como febre de mais de 40 dias, eritema cutâneo, edema generalizado, miocardiopatia e cefaléia, sendo as pesquisas parasitológica e sorológica positivas para doença de Chagas. Investigações realizadas no local detectaram a presença de vetores e reservatórios silvestres muito próximos ao domicílio, levando observadores a suspeitar do seu envolvimento na contaminação de alimentos ingeridos pelos pacientes. __________________________________________________________________________________________ 12 Sebastião Aldo da Silva Valente Introdução Tabela 2. Surtos de doença de Chagas na Amazônia Brasileira de 1968 a 20071 UF - MUNICÍPIO ANO Nº. DE SURTOS Nº. DE CASOS/SURTO MA - SÃO LUÍS 1985 01 02 MA- BACURITUBA 1985 01 02 AC - RIO BRANCO 1993 01 03 AP - MACAPÁ 1974-2005 10 50 AP - MAZAGÃO 1996 01 17 AP - SANTANA 1999-2004 03 35 AM - TEFÉ 2004 01 09 AM - COARI 2007 01 25 PA - BELÉM 1968-2005 32 104 PA - CAMETÁ 1988-1999 02 08 PA - AFUÁ 1992 01 05 PA - C. DO ARARI 1992-2006 02 16 PA - VIZEU 1996 01 03 PA - ABAETETUBA 1998-2005 07 55 PA - BAGRE 1999 02 16 PA - SANTARÉM 1999-2006 02 31 PA - PONTA DE PEDRAS 2001 01 09 PA - IGARAPÉ-MIRI 2002 01 12 PA - BARCARENA 2002-2205 03 15 PA - ANANINDEUA 2003 06 23 PA - S. J. DE PIRABAS 2003 01 03 PA - BREVES 2003-2007 02 15 PA - MUANÁ 2004 01 04 PA - S. S. BOA VISTA 2004 01 03 84 465 TOTAL 1 Fonte: Instituto Evandro Chagas, 2007. Citados em Valente et al., (1999 a,b, 2006); Pinto et al., (2004). VIANA et al., (1994) identificaram em Rio Branco (AC) 3 casos agudos numa mesma família, caracterizados por evolução rápida e grave, com febre alta, edema generalizado, miocardiopatia, inclusive com óbito de um menor. Na ocasião, os autores não concluíram sobre a forma de transmissão, apesar de encontrarem no peridomicílio triatomíneos silvestres infectados com T. cruzi. No quintal da residência foram identificados vários exemplares de palmeiras denominadas urucurizeiro (Attalea phalerata). Segundo relato da mãe, era hábito das crianças aguardarem a queda dos frutos do urucuri que lhes serviam de alimento, muitas vezes não lavados. Esses frutos se dispõem em cachos junto à coroa das palmeiras, onde foram coletadas dezenas de triatomíneos (R. pictipes) infectados com T. __________________________________________________________________________________________ 13 Sebastião Aldo da Silva Valente Introdução cruzi. Possivelmente algum fruto contaminado com fezes frescas de triatomíneos possibilitou a transmissão da enfermidade para aquelas crianças. Em 1996, dois novos episódios foram referidos. O primeiro, em Viseu, apresentou 2 casos e o segundo, em Belém, acometeu 4 indivíduos (VALENTE et al., 1997a). Todos se encontravam em fase aguda, com quadro febril prolongado, miocardiopatia, edema de membros inferiores e exame parasitológico positivo. A investigação epidemiológica afastou totalmente a possibilidade de transmissão vetorial ou transfusional, razão pela qual os autores sugeriram novamente a transmissão por via oral, porém não tiveram oportunidade de chegar à conclusão sobre o mecanismo. A hipótese de transmissão oral foi finalmente apresentada por VALENTE et al., (1997b) em episódio verificado no Estado do Amapá, quando 17 pessoas se infectaram por ingestão do sumo do açaí, tudo levando a crer que um ou mais triatomíneos silvestres, atraídos pela luz, tivessem caído dentro da máquina elétrica de despolpar os frutos, contaminando o alimento. O episódio ocorreu entre os meses de outubro e novembro de 1996, na Serraria Monte Castelo, na localidade de Rio Bispo, Município de Mazagão, onde residem 4 famílias, num total de 26 pessoas, numa pequena vila em que a distância máxima entre as casas era de 50 metros. Uma das moradoras reconheceu a partir de um mostruário um triatomíneo, embora não precisando a espécie, ressaltou ter encontrado um exemplar naquele mesmo ano na sala de uma das residências. Os pacientes nunca se ausentaram do Estado, nem tinham sido submetidos a transfusão. Os dados referentes a esse estudo encontram-se descritos em um dos artigos que compõem esta tese. Estudo epidemiológico realizado no local registrou a presença de triatomíneos silvestres em palmeiras de urucuri, Attalea phalerata, reconhecido ecótopo desses insetos na região - 30% das palmeiras examinadas (6/20) estavam infestadas por Rhodnius pictipes e R. robustus infectados com tripanossomas indistinguíveis de T. cruzi, a uma distância de até 50 metros das casas. Investigou-se o hábito alimentar das famílias, observando-se que o único alimento comum, não cozido, consumido era o açaí, preparado às 11:00 e às 20:00 h em máquina elétrica. Nesse episódio de Mazagão, na ocasião o maior surto da região, o mecanismo de contaminação foi simulado in loco, mediante a instalação de armadilha de luz nas proximidades da máquina de processar o açaí, logrando-se a captura de triatomíneos infectados em várias noites subseqüentes, inclusive no interior da máquina em duas ocasiões. __________________________________________________________________________________________ 14 Sebastião Aldo da Silva Valente Introdução Esse achado de Mazagão permitiu valorizar a importância do açaí como alimento potencialmente envolvido na transmissão da doença de Chagas, já que reúne características importantes, como ser um alimento não cozido e amplamente consumido na região. Em dois novos episódios registrados num bairro central de Belém (4 casos) e em Santana, no Amapá (4 casos), foi também observada a provável participação do açaí no mecanismo de transmissão (VALENTE et al., 1998b). Em 1998, no município de Abaetetuba, dois importantes surtos de doença de Chagas foram registradas, uma na sede municipal (com 13 casos, 2 óbitos), outra em Vila de Beja (5 casos, um óbito). Além da sintomatologia típica de fase aguda já observada em outros surtos, foi possível, no episódio da sede do município, encontrar um triatomíneo (P. geniculatus) já morto, mas com parasitos ainda viáveis no conteúdo intestinal, achado dentro de um cesto com os frutos procedentes de ilhas da região (VALENTE et al., 1999a,b; PINTO et al., 1999). Nesse mesmo ano, foi ainda identificado no bairro da Terra Firme, em Belém, um episódio familiar com 2 casos cuja epidemiologia afastava totalmente a transmissão vetorial tradicional. O chefe da família, um dos infectados, comercializava açaí numa pequena revenda e apresentou, junto com a esposa, febre elevada e prolongada, quadro de miocardiopatia chagásica aguda grave, edema generalizado e insuficiência renal. O estudo epidemiológico revelou indícios de transmissão pela ingestão de açaí (VALENTE, comunicação pessoal). Em 1999, outros 3 episódios com 20 casos foram registrados no Pará: um em Cametá com 3 casos (PANTOJA et al., 2000), outro em Bagre com 7 casos (VALENTE et al., 2000) e um surto com 13 casos em Santarém (VALENTE et al., 2001). O episódio de Cametá envolveu duas jovens, de 18 e 22 anos, e seu pai de 45, que residiam na localidade de Carapajó, onde é freqüente a ocorrência de leishmaniose visceral. Os familiares referiam quadro febril prolongado, com edema do rosto e dos membros inferiores, cefaléia, vômito, diarréia, hepatoesplenomegalia, área cardíaca aumentada, com importante derrame pericárdico. O diagnóstico sorológico inicial foi dado como leishmaniose visceral, comum naquela região, posteriormente a pesquisa direta de parasitos circulantes mostrou-se positiva para DCA. Dois desses casos, uma jovem de 22 anos e o seu pai, evoluíram para óbito antes de iniciarem o tratamento. No episódio de Bagre, 7 pessoas de 3 famílias foram envolvidas. Esses indivíduos partilhavam da mesma alimentação, com consumo diário de açaí. Nesse cenário, provavelmente a transmissão da doença ocorreu de maneira semelhante à de Abaetetuba. Triatomíneos também foram encontrados em paneiros de açaí em pelo menos uma ocasião e __________________________________________________________________________________________ 15 Sebastião Aldo da Silva Valente Introdução provavelmente foram levados para a máquina e triturados. Já no episódio de Santarém, o primeiro registrado no oeste do Pará, o alimento provável de contaminação foi o sumo da bacaba, preparado nas mesmas condições do açaí (VALENTE et al., 2001). Já em 2006, ainda em Santarém, na Vila de Mojuí dos Campos, um surto que acometeu 21 pessoas foi investigada, concluindo-se novamente pelo envolvimento do sumo de bacaba na transmissão (CRESPO et al., 2007). Durante o ano de 2000, seis episódios, ainda inéditos, somando 30 casos, foram registrados na região: três no Amapá (13 casos) e três no Pará (17 casos). No Amapá, dois episódios ocorreram na cidade de Macapá, envolvendo 2 e 5 casos, respectivamente. O terceiro episódio ocorreu na cidade de Santana, 6 casos com um 1 óbito. Fator comum nesses episódios foi o consumo de açaí, uma vez que Macapá e Santana são muito próximas à bacia do Marajó, maior produtora da fruta no Pará. Os três episódios do Pará ocorreram em bairros do centro de Belém: o primeiro, com 9 casos no bairro da Pedreira, o segundo com dois casos no bairro do Marco e o terceiro com 6 casos no bairro do Reduto. Nesses cenários não foram encontrados triatomíneos que pudessem ser incriminados na transmissão e não havia histórico de transfusão sangüínea. Mais uma vez a similaridade epidemiológica residia no consumo de suco de açaí (VALENTE et al., 2001, 2002). Entre os anos de 2001 e 2002, na Bacia do Marajó, foram identificados 10 casos, sendo 5 associados a um surto no município de Ponta de Pedras. Os pacientes, com sintomas gerais de cefaléia, febre arrastada, eritema cutâneo, calafrios, tiveram inicialmente suspeita de malária e dengue, mas foram finalmente diagnosticados como doença de Chagas aguda (VALENTE et al., 2002). A investigação no local do agravo levou à coleta de 86 insetos, distribuídos entre as espécies R. robustus, R. pictipes e P. geniculatus. Desses, 27 apresentaram T. cruzi nas fezes. O ecótopo principal desses insetos foram palmeiras do gênero Orbignya dentre as quais 17 foram examinadas, 60% delas estando infestadas por triatomíneos silvestres. Quinze animais silvestres foram capturados (5 D. marsupialis, 4 M. cinerea, 4 P. guyanensis e 2 M. murina), 5 deles (33,3%) apresentando infecção por tripanossomatídeos semelhantes ao T. cruzi. Adicionalmente, outros 5 casos de DCA esparsos ocorreram em outros municípios do Marajó. O primeir surto do Estado do Amazonas ocorreu em 2004, no município de Tefé, num grupo de 9 pessoas que apresentaram quadro de febre intensa, edema de membros inferiores e da face, com um dos pacientes evoluindo para um quadro de meningoencefalite. Na ausência de vetores envolvidos diretamente nos domicílios dos pacientes, foi proposta a __________________________________________________________________________________________ 16 Sebastião Aldo da Silva Valente Introdução transmissão pela via oral, sem definição do alimento ingerido (BORBOREMA et al., 2005; LACERDA et al., 2005). A partir da formalização de uma base de vigilância para doença de Chagas no Pará e Amapá, entre 2005 e 2006, um número significativo de casos da doença foi detectado e notificado. A distribuição geográfica parece abranger o nordeste e o oeste do Pará e a meso região do Marajó e no estado do Amapá, região pertencente aos dois estados (Figura 1). Os indícios epidemiológicos apontam que a hipótese de transmissão oral seria o mecanismo alternativo mais importante na transmissão da doença de Chagas na Amazônia brasileira. Os dados apresentados são de uma casuística pontual que deve ser levada em consideração para uma grande subnotificação. Figura 1. Distribuição geográfica da doença de Chagas aguda na Amazônia Brasileira 1968 - 2007 __________________________________________________________________________________________ 17 Sebastião Aldo da Silva Valente Introdução Além da contaminação de alimentos não cozidos, como os sumos do açaí e da bacaba, pelas fezes de triatomíneos infectados, a presença de formas metacíclicas de T. cruzi na secreção de glândulas anais do gambá Didelphis marsupialis, animal com hábitos tanto silvestres, como peri-urbanos, não pode ser descartada como mais um elemento a favorecer a transmissão em alguns desses episódios (LENZI 1984; NAIFF et al., 1987). O mecanismo tradicional de contaminação por contato com formas metacíclicas provenientes de fezes de triatomíneos parece não ser o mais freqüente na região, diante da existência de numerosos episódios com evidências, de transmissão oral. Ao contrário dos surtos eventuais registradas em Teutônia (RS) e Catolé do Rocha (PB), aquelas que vêm ocorrendo na Amazônia brasileira apresentam freqüência regular e representam referência importante na epidemiologia regional da doença de Chagas. Como apresentado, após a descrição do primeiro surto de doença de Chagas na região Amazônica brasileira por SHAW et al., (1969), quase uma centena de outros surtos envolvendo mais de 500 pessoas já foram descritos, em sua maioria associados à possibilidade da via oral (VALENTE et al., 1999a; COURA et al., 2002a). Nos demais estados da região Norte a prevalência é muito escassa. Em Roraima e Rondônia, ainda não foram diagnosticados casos agudos, apesar de um recente inquérito sorológico realizado em Roraima revelar soro prevalência de 1,4% em duas populações compostas predominantemente de imigrantes. Os achados de colônias de T. maculata na região não detectaram infecção por tripanossomas (LUITGARDS-MOURA et al., 2005). Por outro lado, ainda nos estados de Roraima e Rondônia, DRUMOND & MARCOPITO (2006) identificaram a doença de Chagas como causa de 3 óbitos entre os anos de 1981 e 1998, em pessoas naturais de Rondônia e nenhum óbito em nativos de Roraima. __________________________________________________________________________________________ 18 Diversidade genética do T. cruzi Sebastião Aldo da Silva Valente 2. DIVERSIDADE GENÉTICA DO T. CRUZI A população de T. cruzi é extremamente heterogênea e formada por um variado pool de amostras, clones ou cepas oriundas do ciclo enzoótico (milhares de reservatórios mamíferos e uma centena de triatomíneos) e do ciclo domiciliar que inclui o homem. Quando analisadas à luz de diferentes marcadores, apresentam e apontam para a presença de pelo menos duas linhagens populacionais com características biológicas, imunológicas, bioquímicas, farmacológicas, de virulência e de distribuição epidemiológica também muito distinta (BRENER & GAZZINELLI, 1997; FERNANDES et al., 1998; MILES et al., 2003). Essa variabilidade há muito conhecida, já fora observada por Carlos Chagas (CHAGAS, 1909) em diferenças morfológicas do parasita, as quais ele classificara na ocasião como formas largas e finas do T. cruzi. Mais tarde, esses dados foram muito bem estudados por BRENER, (1973), e outros parâmetros, como aqueles relacionados a diferentes respostas imunológicas, foram descritos (NUSSENZWEIG et al., 1963) e NUSSENZWEIG & GOBL, (1966). A utilização de populações de T. cruzi clonadas e não-clonadas evidencia a heterogeneidade do parasita e revela que as linhagens, na verdade, são constituídas de subpopulações com amplas características (POSTAN et al., 1986, FINLEY & DVORAK, 1987). Analisando perfis bioquímicos num grupo de seis isoenzimas (ASAT: aspartato aminotransferase, ALAT: alanina aminotransferase, G6PD: glicose-6-fosfato dehidrogenase, MDH: malato dehidrogenase, GPI: glicose fosfato isomerase e PGM: fosfoglicomutase) MILES et al., (1977) identificaram inicialmente dois padrões bem definidos de populações de T. cruzi que foram agrupados como zimodemas: Z1 associado a mamíferos, principalmente marsupiais, e triatomíneos silvestres e Z2 ligado ao ciclo doméstico. Posteriormente, estudando um grupo maior de amostras dentro de um repertório mais extenso de enzimas, MILES et al., (1981a,b, 1983) ratificaram os estudos anteriores e descreveram um novo padrão (Z3) relacionado com mamíferos terrestres que vivem em tocas no chão como o Dasypus novemcinctus e Monodelphis brevicaudata e co-habitam com triatomíneos da espécie Panstrongylus geniculatus. Os mesmos autores observaram que, eventualmente, isolados pertencentes a Z1 e Z3 poderiam infectar ocasionalmente o homem no Estado do Pará. Nenhum isolado do tipo Z2 foi descrito na região Norte. A análise de 15 loci de enzimas propostas por TIBAYRENC et al., (1986), em mais de uma centena de isolados, ampliou a margem de agrupamentos para 43 zimodemas que eles denominaram de clonets que seriam os componentes de uma população clonal e que apresentariam um perfil semelhantes para um grupo específico de marcadores genéticos. A __________________________________________________________________________________________ 19 Diversidade genética do T. cruzi Sebastião Aldo da Silva Valente complexidade na interpretação desses estudos filogenéticos não permitiu estabelecer uma correlação com os zimodemas propostos por MILES et al., (1980). Seqüências não-conhecidas de DNA, quando amplificadas por PCR com iniciadores representados por fragmentos de oligonucleotídeos aleatórios (ramdom amplified polymorphic DNA - RAPD), permitiram identificar o polimorfismos existente entre isolados do parasito. A utilização de iniciadores aleatórios é vantajosa, pois dispensa o conhecimento prévio da seqüência a ser amplificada. Nessa abordagem, um único conjunto de primers aleatórios é usado para amplificação de PCR gerando perfis complexos que podem ser usados para construir árvores genéticas. O estudo da estrutura genômica de isolados de T. cruzi por análise de RAPD apresentou altos níveis de semelhança entre linhagens que pertencem ao mesmo zimodema como o Z1 sugerindo que este parece ser um grupo geneticamente distinto bem definido suportado pelo RAPD, (TIBAYRENC et al., 1993; STEINDEL et al., 1993). Os estudos já disponíveis sobre diversidade genética em vários níveis consideram que o genoma de T. cruzi é notavelmente flexível e sua estrutura diplóide pode permitir que esse parasita tenha uma população de estrutura clonal e reprodução assexuada (TIBAYRENC et al., 1990). Achados sustentam a hipótese de troca genética de T. cruzi nos isolados da América Central e do Sul e sugerem que essa troca aconteça durante a transmissão silvestre e ele contribui para a geração de diversidade de fenótipos e genótipos nesse parasita, também comprovado por RAPD (CARRASCO et al., 1996; GAUNT et al., 2003) Os genes de mini-exon estão envolvidos na maturação de mRNA presente em todos os tripanosomatideos. Esses genes são organizados em repetições do tipo tandem de 100 a 200 unidades. Cada repetição é constituída por uma região transcrita que contém um exon altamente conservado de 39 nucleotídeos, uma região de intron moderadamente conservado de 50-110 bp e uma região não transcrita altamente variável em tamanho e sucessão que dependem da espécie do tripanossomatideo (DE LANGE et al., 1984; AGABIAN, 1990). Igualmente para os genes de rRNA, a ocorrência de sucessivas repetições no gene de splicead leader (SL) com diferentes graus de conservação fazem desse gene um referencial de importância para a taxonomia e diagnóstico. O gene de rRNA do T. cruzi demonstrou que, basicamente, as populações do parasito poderiam ser dividas em duas. A seqüência de 100 pb disposta na extremidade 3’ gene do RNAr 24Sα é dimórfica e tem sido usada como alvo para identificação de linhagens de T. cruzi. Utilizando a amplificação por PCR dessa seqüência de 88 cepas e clones, foram obtidos __________________________________________________________________________________________ 20 Diversidade genética do T. cruzi Sebastião Aldo da Silva Valente produtos separados em grupos: grupo 1 de 125 pb, grupo 2 de 110 pb e produtos dos dois grupos 1/2. A região intergênica do gene de mini-exon mostra igualmente dimorfismo entre as cepas do protozoário. Ao se juntar a tipagem de isolados tanto pelo gene de mini-exon, quanto pelo ribossômico, houve uma concordância entre ambos os genótipos. Após a análise de 38 cepas, foram definidas duas linhagens (rDNA e mini-exon linhagem 1 e linhagem 2). Curiosamente, amostras com perfil rDNA grupo 1/2 apresentaram no mini-exon perfil de linhagem 1. A interpretação desses achados, somados com os resultados obtidos na análise de RAPD (SOUTO et al., 1996), possibilitou visualizar e dividir esses isolados nas duas grandes linhagens filogenéticas: 1 e 2. Quando comparadas aos padrões de zimodemas propostos por MILES et al., (1977), a linhagem 1 correspondia ao zimodema 2 e a linhagem 2 ao zimodema 1. O grupo Z3 não se agrupou às linhagens 1 e 2. Um estudo de associação do dimorfismo dessas linhagens com os ciclos de transmissão do T. cruzi no ambiente doméstico e silvestre e morbidade da doença de Chagas foi desenvolvido com isolados de quatro regiões geográficas distintas: estado do Amazonas, como área não endêmica, e estados de Minas Gerais, Paraíba e Piauí, reconhecidas regiões endêmicas (FERNANDES et al., 1998). Nesse estudo, sugeriu-se que a linhagem 1 estaria associada ao homem na transmissão da doença de Chagas nas áreas endêmicas (Minas Gerais, Paraíba e Piauí), enquanto a linhagem 2 estaria associada ao ciclo silvestre do T. cruzi (Amazonas). Resultados muito semelhantes em que se utilizou um número maior de amostras (157 isolados do homem, mamíferos e triatomíneos silvestres de 12 estados brasileiros) foram obtidos com o mesmo protocolo e permitiram que ZINGALES et al., (1998) agrupassem os isolados em dois grupos, ratificando a associação da linhagem 1 com o ciclo doméstico, estando presentes no ciclo silvestre as duas linhagens. As pesquisas epidemiológicas em vários estados brasileiros como também na Colômbia e Bolívia indicam que a linhagem 1 predomina no ciclo doméstico, sendo principalmente isolada de pacientes chagásicos, enquanto a linhagem 2 está presente, sobretudo, no ciclo silvestre (FERNANDES et al., 1998; ZINGALES et al., 1998). As metodologias moleculares têm uma vantagem considerável sobre as isoenzimas por requerer uma quantidade de parasitas muito menores. O terceiro grupo isoenzimático de T. cruzi, denominado como zimodema 3 (Z3) (MILES et al., 1980), foi descrito na Amazônia, associado com o ciclo silvestre de transmissão e pela infecção de tatus, marsupiais terrestres, espécies de triatomíneos raramente __________________________________________________________________________________________ 21 Diversidade genética do T. cruzi Sebastião Aldo da Silva Valente circulantes no meio de humanos (BARRETT et al., 1980; MILES et al., 1981a; POVOA et al., 1984). O gene de mini-exon não serviu para agrupar o Zimodema 3 em qualquer linhagem (FERNANDES et al., 1998, 2001). Estabelecido o consenso de que T. cruzi abrigava duas grandes linhagens filogenéticas, durante as comemorações do aniversário da descoberta da doença de Chagas (1999), foi proposta e acatada uma nova nomenclatura para as linhagens. Assim convencionaram-se as denominações de T. cruzi I (zimodema I, linhagem 2) associada ao ciclo silvestre e T. cruzi II (zimodema 2, linhagem 1) associada ao ciclo doméstico. O zimodema 3 pertencente ao ciclo silvestre permaneceu com a denominação original. (RECOMENDATIONS, 1999). Estudos mais detalhados de tipagem com a utilização de isolados provenientes do ciclo silvestre foram impulsionados com a iniciativa de organismos ambientais de reproduzir em cativeiro espécies ameaçadas de extinção para depois reintroduzi-las no seu ambiente original. O transporte de animais entre áreas geográficas pode trazer conseqüências imprevisíveis para o ciclo silvestre da doença de Chagas, desde que infectados com o T. cruzi. Este fato foi observado num grupo de primatas com testes sorológicos positivos para anticorpos anti T. cruzi (Centro de Primatologia do Rio de Janeiro) (LISBOA et al., 2004). Detectou-se também que micos-leão-dourados (Leontopithecus) infectados apresentaram isolados tipados molecularmente como T. cruzi II. Estudos mais amplos têm referido que, dentro desses 2 grandes grupos ou linhagens filogenéticas, uma extensa heterogeneidade pode ser vista, corroborando, pois a diversidade genética já comprovada dentro da distribuição geográfica e ecológica dos ciclos de transmissão do T. cruzi. Nesse sentido utilizando a metodologia de eletroforese de enzimas (22 loci gênicos diferentes) e RAPD com 20 iniciadores aleatórios, BRISSE et al., (2000), após analisarem 50 cepas de T. cruzi, propuseram que parte dessas cepas se agrupariam num grupo de T. cruzi I e as demais seriam distribuídas em 5 subgrupos 2a, 2b, 2c, 2d, 2e. No subgrupo 2a inser-se-iam as cepas de Z3; no subgrupo 2b as cepas T. cruzi II; no subgrupo 2c as cepas com perfis isoenzimáticos mistos (Z3 e Z1); no subgrupo 2d, T. cruzi II oriundos da Bolívia e no subgrupo 2e, cepas híbridas (CL). A associação de gravidade da doença somente com as cepas de T. cruzi II nas regiões consideradas endêmicas merece reflexão quando se interpretam os resultados de trabalhos realizados por AÑEZ et al., (2004) na Venezuela. Numa mesma área em que circulam as duas linhagens, em uma situação ocorria infecção aguda, com apresentação de formas clínicas variáveis, e enquanto os quadros mais severos apresentavam infecção com parasitas caracterizados como T. cruzi I. O comprometimento cardíaco de gravidade considerável em pacientes dessa linhagem chegava a ser 3 vezes maior nesses casos do que naqueles com __________________________________________________________________________________________ 22 Diversidade genética do T. cruzi Sebastião Aldo da Silva Valente infecção comprovada pelo T. cruzi II, divergindo de outros trabalhos que os portadores de T. cruzi I teriam sintomatologia mais branda. Enfatizam, ainda, que a caracterização do parasita diferente de T. cruzi II não é de utilidade prognóstica e os aspectos ligados ao parasita e hospedeiro devem ser levados em consideração para se entender a diversidade de sintomas e a evolução clínica da doença. Apesar do extenso conhecimento que já se tem sobre esse parasita, o maior volume de informações são com isolados das áreas endêmicas. Uma análise mais detalhada das cepas amazônicas permitiria mais esclarecimentos sobre as linhagens de T. cruzi circulantes na área, sobretudo como elas se comportam nos numerosos surtos de doença de Chagas que vêm ocorrendo nessa região. Um minucioso estudo da diversidade genética, a partir da utilização de marcadores moleculares disponíveis, com as amostras de T. cruzi isoladas de pacientes, reservatórios e vetores silvestres poderia identificar e caracterizar a origem desses ciclos e garantir entendimento de sua epidemiologia de transmissão. __________________________________________________________________________________________ 23 Sebastião Aldo da Silva Valente Objetivos 3. OBJETIVOS 3.1. OBJETIVO GERAL Estudar os surtos de doença de Chagas aguda ocorridas no Pará e Amapá entre 1995 e 2005 por meio de marcadores epidemiológicos, imunoparasitológicos e moleculares; 3.2. OBJETIVOS ESPECÍFICOS • Sistematizar as histórias epidemiológicas dos surtos de doença de Chagas agudas ocorridas no Pará e Amapá no período proposto, com a perspectiva de buscar fatores comuns que estejam envolvidos potencialmente com a transmissão; • Avaliar a soro-prevalência dos contatos intradomiciliares dos casos índices e dos vizinhos da comunidade; • Estudar a fauna triatomínea presente nas comunidades onde ocorreram os surtos; • Identificar potenciais reservatórios do T. cruzi pela capturas por armadilhas e isolamento dos parasitos a partir de hemoculturas e/ou xenodiagnóstico; • Estudar a diversidade genética (Tipagem pelo gene de mini-exon e por RAPD) dos parasitos circulantes nos diversos surtos isolados a partir de casos humanos, triatomíneos e reservatórios, avaliando a similaridade dos genótipos. __________________________________________________________________________________________ 24 Sebastião Aldo da Silva Valente Material e Métodos 4. MATERIAL E MÉTODOS 4.1. DADOS GERAIS DO ESTUDO 4.1.1. Municípios ou localidades As investigações de casos agudos de doença de Chagas atendidos pelo Laboratório de Doença de Chagas do Instituto Evandro Chagas foram desenvolvidas em municípios do Pará e Amapá. As áreas de estudo foram escolhidas em função de casos-índices identificados. Os municípios se encontram descritos na Figura 2 e Tabela 3, assim como os dados geográficos e população. Figura 2. Distribuição geográfica dos surtos de doença de Chagas aguda no Pará e Amapá entre os anos de 1995 e 2005 __________________________________________________________________________________________ 25 Sebastião Aldo da Silva Valente Material e Métodos Tabela 3. Distribuição geográfica dos surtos de doença de Chagas aguda no Pará e Amapá entre os anos de 1995 e 2005 UF Município 1 AP SUAP1. Mazagão PA Bairro/2Localidade Ano de ocorrência N de casos Rio Bispo2 1996 17 SUAP2. Macapá Buritizal1 2002 10 SUAP3. Santana Provedor1 2003 4 SUPA1. Afuá S. Antônio2 1993 5 SUPA2. Abaetetuba Vila de Beja2 1998 11 SUPA3. Belém Pedreira1 1999 12 SUPA4. Bagre Centro1 2001 7 SUPA5. Barcarena Santa Lúcia1 2001 6 SUPA6. Santarém Pau DArco2 2001 13 SUPA7. Bragança Flexeira2 2002 10 SUPA8. Belém Telégrafo1 2003 9 SUPA9. Ananindeua D. Industrial1 2004 17 Total 121 4.1.2. Visitas às áreas de estudo Os estudos foram realizados entre os anos de 1995 e 2005, sendo realizadas duas excursões anuais a cada uma das localidades descritas no item posterior 5.1, permanecendo-se um período entre 12 e 21 dias. A equipe foi composta por 3 profissionais para a coletas de animais e triatomíneos. As secretarias de saúde locais a visitaram às residências, realizaram anamnese e coleta de sangue da população envolvida. Quando detectado um caso agudo, esse eram encaminhados por meio de procedimentos de Tratamento Fora de Domicílio (TFD) para complementação de diagnóstico e tratamento específico no Instituto Evandro Chagas. 4.1.3. Trabalhos com a população humana Os procedimentos adotados nos trabalhos com os pacientes e/ou comunidades foram submetidos ao Comitê de Ética em Pesquisas do IEC (Anexo 1). Discutiu-se os objetivos e a metodologia a aplicar (Figura 3) e necessidade de anuência individual livre de consentimento para coleta de sangue e informações, pelo preenchimento de uma Ficha Epidemiológica (Anexo 2) e assinatura do Termo de consentimento livre esclarecido (Anexo 3). __________________________________________________________________________________________ 26 Sebastião Aldo da Silva Valente Material e Métodos 4.1.4. Detecção de casos agudos Pacientes procedentes da rede do SUS e/ou Ra rede privada em municípios do Pará e Amapá com suspeita de doença de Chagas foram avaliados clínica e epidemiologicamente e preenchendo-se fichas e questionários próprios do Instituto Evandro Chagas. As principais informações objetivavam identificar se o caso era isolado ou se parte de um possível surto. Figura 3. Discussão dos objetivos do trabalho com as comunidades 4.1.5. Coleta de material e diagnóstico laboratorial As amostras de sangue foram coletadas sempre que possível por punção venosa em volume entre 10 e 15 ml. Nos menores de 5 anos, a coleta foi realizada com papel de filtro por punção digital, sendo todos os materiais de coletas como seringas, agulhas e lancetas descartáveis. __________________________________________________________________________________________ 27 Sebastião Aldo da Silva Valente Material e Métodos 4.1.6. Exames parasitológicos 4.1.6.1. Pesquisa de T. cruzi em gota espessa Coletado o sangue, uma gota foi colocada em lâmina para confecção de gota espessa e posteriormente corada pelo Giemsa. O exame foi realizado em microscópio ótico com objetiva de 40X, observando-se no mínimo 500 campos por 3 técnicos. 4.1.6.2. Exame das amostras pelo QBC® System Quantitative Buffy Coat Foram utilizados 4 capilares por paciente seguindo os procedimento de coleta de sangue, preenchimento e leitura de acordo com as recomendações do fabricante. Os capilares foram examinadas exaustivamente na faixa de leitura recomendada por 3 técnicos. 4.1.6.3. Hemocultura Foram utilizados 4 tubos de meio bifásico de Hoff´s por paciente semeando-se 200 µl de sangue por tubo. A leitura das hemoculturas foi feita a partir de 28 dias da semeadura até 90 dias quando foram descartados. Na hipótese de crescimento de tripanossomas, estes eram repicados para meios líquidos RPMI 1640 e/ou meio LIT para obtenção de massa parasitária. Os meios de cultura são descritos no Anexo 4. 4.1.6.4. Xenodiagnóstico artificial Dez ml de sangue heparinizado foram colocados em ampolas de vidro munidas de uma membrana de borracha que permitia que ninfas de triatomíneos em jejum de 60 dias tivessem acesso ao sangue. O sistema foi adaptado a um banho maria que mantinha as ampolas aquecidas a uma temperatura entre 37 e 39oC, estimulando a alimentação dos triatomíneos. Utilizaram-se espécies de Rhodnius prolixus, Triatoma infestans e Panstrongylus megistus, 20 ninfas de 5 estágios por paciente, mantidas no insetário do Instituto Evandro Chagas para esse trabalho. O exame do conteúdo intestinal dos triatomíneos foi feito com 30 e 60 dias após a alimentação. 4.1.7. Sorologia A amostragem em cada população foi definida pelos cálculos estatísticos dos Softwares Stat Calc versão 4.0 e Epi Info 5.0 que levam em consideração o número de casos __________________________________________________________________________________________ 28 Sebastião Aldo da Silva Valente Material e Métodos em uma população e o impacto do agravo dentro dos grupos afetados de acordo com o tamanho da comunidade com a aplicação da fórmula para cálculo de população infinita: N= (1,96)2.p.q/L2 cuja a razão 1, 962 é a probabilidade de distribuição normal do evento; p: probabilidade do evento existir; q: probabilidade do evento não existir (1-p); L: erro aceitável de 2%. Considerou-se que a repercussão dos casos agudos nas comunidades levari a um número mínimo de pelo menos 10% dos moradores investigados sorologicamente, além de todos os indivíduos que procuravam por demanda espontânea. Na área rural, esses surtos ocorreram em comunidades com 200 a 500 habitantes. A seleção da amostragem foi sempre acima da recomendada pelos cálculos estatísticos como apresentado na tabela 4. Tabela 4. Pesquisa sorológica em municípios onde ocorreram surtos de doença de chagas nos estados do Pará e Amapá entre os anos de 1995 e 2005 Pop. IBGE No de Pop. % de infectados Pop. % pop Município Município casos Local na pop. local Estudada estudada Abaetetuba/PA 119.152 11 1687 0,65 1184 70,18 5 2487 0,2 1094 43,98 16 3890 0,41 687 17,66 Ananindeua/PA 393.569 17 2867 0,6 337 26,18 Barcarena 76.069 6 812 0,73 321 39,53 Belém/PA 1.280,614 2 635 0,31 75 11,81 5 3635 0,13 743 20,44 6 3298 0,18 1135 34,41 Bragança 100.924 7 355 1,97 175 49,29 Afuá/PA 29.505 5 108 4,6 97 89,81 Bagre/PA 13.708 7 135 5,18 97 71,85 P. Pedras/PA 18.694 10 1189 0,84 913 76,78 Santarém/PA 262.538 10 236 4,23 126 53,38 Macapá 283.308 10 2387 0,41 296 12,4 Santana/AP 80.439 4 794 0,5 532 67 Total 2.658,520 121 24.515 0,49 7.812 31,86 Triagem por hemaglutinação indireta e imunofluorescência indireta (IFI) qualitativo (1/40), confirmação por IFI quantitativa e exames complementares. Foram seguidos ainda os procedimentos para estudos sorológicos para doença de Chagas propostos no Manual de Normas Técnicas do MS/FNS utilizando-se dois testes qualitativos de diferentes princípios (BRASIL, 1994). Foram usados: a hemaglutinação indireta – HAI (IgG)- (kit Hemacruzi 96, Ref. 35.066, Biomérieux) e a imunofluorescência indireta (IFI) como teste padrão ouro de confirmação - (kit Imunocruzi, Biomérieux ref. 35051) com titulação de soros para a pesquisa de IgG e IgM anti-T. cruzi. __________________________________________________________________________________________ 29 Sebastião Aldo da Silva Valente Material e Métodos As diluições utilizadas nos dois testes foram de 1:20 até 1:1280, e consideradas aceitáveis como soros reagentes, o cut off de 1:40 para os dois testes como recomenda o fabricante. Os procedimentos dos testes sorológicos encontram-se descritos nos Anexos 5 e 6. 4.1.8. Tratamento e seguimento de casos Os casos confirmados foram encaminhados ao Ambulatório do Laboratório de Doença de Chagas, em Belém, para tratamento específico. Para o estudo de seguimento deste trabalho foram selecionadas os surtos: SUPA2 Abaetetuba, SUPA9 Ananindeua, SUPA5 Barcarena, SUPA3 Belém e SUPA7 Bragança que possuíam dados mais organizados e consistentes. Adicionalmente foi analisado o surto SUAP1 do Mazagão, Amapá, cujos resultados se encontram descritos no artigo submetido à publicação. Anexo 7. Nos surtos de Abaetetuba, Ananindeua, Barcarena, Belém e Bragança, os pacientes foram acompanhados em 4 momentos: antes do tratamento, com 6 meses, 1 ano e mais de 2 anos de tratamento. No surto de Mazagão, os pacientes foram acompanhados em 5 intervalos: antes do tratamento, com 6 meses, 1 ano, 5 anos e 7 anos de tratamento. 5. ESTUDO DE RESERVATÓRIOS SILVESTRES 5.1. CAPTURA E IDENTIFICAÇÃO DE ANIMAIS SILVESTRES Os procedimentos com os animais silvestres tiveram autorização do IBAMA (Anexo 9) e foram submetidos ao Comitê de Ética em Pesquisa com Animais do Instituto Evandro Chagas (Anexo 10). Para o procedimento de captura, foram utilizadas armadilhas dobráveis nas dimensões 50x20x19 cm (comprimento, altura e largura) fabricadas em arame fosco com peso de 2 kg. Frutas como abacaxi, banana, milho em espigas e pasta de amendoim foram utilizados como isca. As armadilhas num total de 100 foram ordenadas entre 300 e 500 m dos domicílios, em trilhas naturais ou construídas, com a abertura voltada para a trilha, distantes 15 m entre si. Revisão diária foi realizada para recolher os animais capturados e troca das iscas a cada dois dias, dependendo do período das excursões. Os animais capturados foram identificados no Instituto Evandro Chagas baseando-se na chave taxonômica de PETERSON & PINE, (1982). __________________________________________________________________________________________ 30 Sebastião Aldo da Silva Valente Material e Métodos 5.2. COLETA DE SANGUE DOS ANIMAIS Animais capturados foram tratados inicialmente com sulfato de atropina 0,05 mg/kg de peso pela via subcutânea ou intramuscular e posteriormente sedados com aplicação de Cloridrato de ketamina 12 mg/kg e numa segunda opção com fenobarbital sódico (Sagatal®, RHODIA, 10 mg/ml, diluição 1:20 ml em soro fisiológico), 0,2 ml/kg de peso. Foi realizada em seguida a punção da veia radial ou punção cardíaca, com seringas e agulhas descartáveis de calibre fino 21X5 mm. 5.3. HEMOSCOPIA E HEMOCULTURA As amostras de sangue obtidas foram semeadas no próprio local, em meios de cultivo bifásico (3 tubos por animal), e processados os exames parasitológicos (gota espessa e exame pelo QBC® System Quantitative Buffy Coat). 5.4. XENODIAGNÓSTICO Utilizou-se uma caixa por animal, com 10 ninfas de III e IV estágio de R. prolixus, T. infestans ou P. megistus mantidas em insetário. As caixas foram identificadas com os dados do animal (espécie, sítio de origem e data da realização do exame) e presas ao animal por 20 minutos ou pelo tempo necessário até o completo repasto sangüíneo que era inferido pelo aumento do volume abdominal em até 4 vezes. No final da coleta, todos os animais foram identificados com anéis apropriados ou tatuados e devolvidos ao seu sítio de captura original. Os triatomíneos foram mantidos em condições do laboratório (24 e 28oC), e o conteúdo intestinal examinado em 30 e 60 dias com auxílio de pinça para a compressão do abdômen e coleta do conteúdo intestinal. O material foi diluído em solução salina e antibiótico, para pesquisa das formas de tripanossomas em microscopia óptica. O material positivo foi semeado nos meios de cultura já descritos para isolamento e futura identificação e caracterização do parasito. __________________________________________________________________________________________ 31 Sebastião Aldo da Silva Valente Material e Métodos 6. ESTUDO ENTOMOLÓGICO 6.1. COLETA DE TRIATOMÍNEOS SILVESTRES EM PALMEIRAS Inicialmente foi utilizada a metodologia descrita por NOIREAU et al., (1999), um modelo simples de armadilha que utiliza copos plásticos de 12 cm de altura por 8 cm de largura, tendo no interior camundongo albino adulto ou pinto de uma semana. A boca do frasco deve ser fechada com tela de arame de malha de 2 mm, quando se usam camundongo, ou tela de nylon ao quando se usam pintos. Em volta do frasco foi colocada fita adesiva dupla face de 5 cm. de largura (ADERE e 3M) com uma das extremidades voltadas para cima da tela. As armadilhas, em número de cinco por palmeira ou outro ecótopo foram colocadas na copa de palmeiras ou em ecótopos previamente selecionados, de preferência do gênero Orbygnya, localizadas mais próximas dos domicílios humanos, que apresentavam copa que ofereça frutos, palha e epífitas, condições que ofereciam satisfatória proteção e abrigo ou refúgio a pequenos animais. As armadilhas foram colocadas com auxílio de escadas de dois lances (altura total de 7,80 metros) construída em fibra de vidro e alumínio de peso leve para deslocamento na mata. Quando a altura da palmeira foi muito superior à da escada, utilizou-se o auxílio de cintos de segurança apropriados para escalar postes. O tempo de permanência das armadilhas na árvore foi de no mínimo 2 dias, com exame diário para verificar a captura de triatomíneos e substituição dos animais cansados e famintos por outros mais saudáveis. Os triatomíneos são atraídos pelo gás carbônico emitidos pelos animais e, quando tentam se alimentar nesses animais, ficam colados na fita adesiva. As armadilhas de fita adesiva que capturaram triatomíneos em palmeiras serviram de referencial para que as árvores fossem selecionadas para posterior dissecção, procurando-se restringir ao mínimo possível o número de palmeiras dissecadas (MILES et al., 1981b). A área imediatamente próxima da palmeira selecionada foi limpa e no chão colocado um plástico branco, sobre o qual foi realizada a dissecção. As palmeiras foram cortadas com motosserras (Sthil, modelo 08) e a dissecção com outra de modelo 010 e com auxílio de terçados e facões, luvas de raspa de couro e pinças de vários tamanhos. Insetos coletados foram acondicionados em frascos plásticos, um para cada palmeira, com tampa perfurada para permitir ventilação satisfatória, etiquetados o nome científico e vulgar da palmeira e do inseto coletado (quando possível), data e local onde foi efetuada a coleta. __________________________________________________________________________________________ 32 Sebastião Aldo da Silva Valente Material e Métodos 6.2. COLETA COM ARMADILHAS LUMINOSAS Foi utilizado o modelo básico de SONTWOOD, (1978) (Pensilvania Trap), de tamanho reduzido para facilitar transporte e instalação. Esta armadilha é provida de fonte luminosa de luz branca fluorescente de 15 W, com dispositivo alternativo de 12 e 120 volts, para ser alimentada por bateria automotiva e gerador portátil, respectivamente. É constituída por três lâminas verticais de alumínio, de 12 por 50 cm., presas a cobertura plana, quadrada, do mesmo material, e dispostas radialmente de modo a formar três ângulos de 120o contornando a lâmpada. Na borda inferior, as lâminas se acoplam à abertura de um funil, envolvido por um saco de pano coletor dos espécimes atraídos pela luz. Cordas de nylon foram utilizadas para suspender as armadilhas até o local de sua instalação, copas de palmeiras ou árvores, sendo ligadas no horário entre 19:00 e 22:00 h. por um período de no mínimo 10 dias consecutivos. 6.3. IDENTIFICAÇÃO DOS ESPÉCIMES COLETADOS Para a identificação foram utilizados os critérios taxonômicos estabelecidos por LENT & WYGODZINSKY, (1979). Os insetos foram identificados no Laboratório de Doença de Chagas do Instituto Evandro Chagas em Belém. 6.4. EXAME DO CONTEÚDO INTESTINAL DOS TRIATOMÍNEOS Os exemplares coletados foram levados ao laboratório e separados para: (i) acondicionamento em baldes plásticos apropriados com objetivo de se estabelecerem em colônias úteis a trabalhos experimentais e (ii) processo de desinfecção em uma solução própria e processamento do conteúdo intestinal. Por compressão do abdômen foi realizada a dissecção da ampola retal e retirada do conteúdo intestinal. O material obtido foi diluído em solução mista, solução salina + antibiótico, específica para esse fim e examinado: (i) a fresco entre lâmina e lamínula e (ii) em esfregaços corados pelo Giemsa. Eventuais parasitos foram identificados sob microscopia óptica (40x). As soluções usadas nos procedimentos desses itens encontram-se descritas no Anexo 8. __________________________________________________________________________________________ 33 Sebastião Aldo da Silva Valente Material e Métodos 7. ISOLAMENTO E CULTIVO IN VITRO 7.1. ISOLAMENTO DE PACIENTES, DE ANIMAIS SILVESTRES E DE TRIATOMÍNEOS SILVESTRES Os parasitos obtidos de amostras de sangue de pacientes e animais silvestres, assim como de triatomíneos, foram cultivados em meio liquido LIT e/ou RPMI1640 suplementado com 10% de soro fetal bovino inativado a 55°. Quando os cultivos in vitro apresentaram crescimento exponencial (7 a 10 dias), 2 ml foram transferidos para garrafas de cultura de com meio LIT e/ou RPMI1640 para a produção de massa parasitária. Esse cultivo foi realizado num volume final de 20 ml e o meio suplementado com até 20% de soro fetal bovino inativado e mantido a 28°C por 7 a 10 dias com agitação eventual dos frascos que eram examinados diariamente em microscópio invertido para se avaliar o crescimento até atingir a concentração de 109 formas epimastigotas para extração de DNA total. Uma alíquota desse meio, rica em formas epimastigotas, foI mantida criopreservada em nitrogênio líquido na proporção de 1,8 ml do meio e 0,2 ml de glicerol seguindo os procedimentos descritos por MILES, (1993). 8. EXTRAÇÃO DE DNA Utilizou-se o kit da AMERSHAM PRODUTO 27-5237-01 obedecendo-se ao protocolo do fabricante nas seguintes etapas: Lise de células: Num tubo de 1,5 ml, foram colocados 1 ml de uma cultura na fase log 1,5x106, células, adicionados 600 µl de PBS e a mistura centrifugada a 13.000-16.000 rpm por 5 min mantendo 20-40 µl de pellet. O sobrenadante foi desprezado e o sedimento agitado 2X no vórtex e repetido o passo anterior. Foram acrescentados 600 µl de solução de lise de célula, agitando-se o tubo por inversão com auxílio de uma micropipeta. A seguir, a mistura foi incubada a 37oC, acrescentados 3 µl de Rnase e a amostra misturada por inversão e incubada a 37oC por 30 min. Foram então acrescentados 200 µl de solução de precipitação, misturado vigorosamente no vórtex e processada centrifugação a 13.000 rpm por 3 min. Precipitação do DNA: O sobrenadante com o DNA foi transferido para outro tubo de 1,5 ml contendo 600 µl de isopropanol a 100%. A amostra foi misturada por inversão até se visualizarem as linhas brancas correspondentes ao DNA precipitado. A amostra foi centrifugada a 13.000 rpm por 1 min, o sobrenadante descartado e o pellet lavado com 600 µl __________________________________________________________________________________________ 34 Sebastião Aldo da Silva Valente Material e Métodos de etanol a 70%. O pellet de DNA foi seco por 15 minutos e acrescentados 100 µl de solução de hidratação ao sedimento. A integridade do DNA extraído foi verificada por corrida em gel de agarose a 0,8% em TBE (0,09 M Tris-borato; 0,002 M EDTA pH 8,0). 9. TIPAGEM GENOTÍPICA DAS CEPAS DE TRIPANOSSOMAS PELO GENE DE MINI-EXON As cepas de referência (TCI X10Cl1, TCII ESMERALDO CL2, Z3 CAN III CL1 e T. rangeli R1625) usadas foram fornecidas pelo Laboratório de Epidemiologia Molecular do Departamento de Medicina Tropical do Instituto Oswaldo Cruz (IOC) e as demais amostras correspondem aos isolados de tripanossomatídeos que circulam nos surtos descritos nessa tese (Anexo 11). Os isolados obtidos foram tipados inicialmente pelo gene de mini-exon por meio de um PCR multiplex, (FERNANDES, et al., 2001). Essa reação amplifica especificamente uma parte do espaçador não-transcrito desse gene distinguindo as duas principais linhagens de T. cruzi¸ identificando T. cruzi Z3 e T. rangeli. A reação foi constituída por 100 pmol de cada iniciador, 150 μM de dNTPs, num tampão de 10 mM de Tris-HCl (pH 8,3), 1,5 mM de MgCl2, 25 mM de KCl, 0,1 mg/mL de albumina bovina e 2,5 U de Amplitaq GoldTM DNA Polimerase (Cetus Perkin Elmer ®). Aproximadamente 10 ng de DNA genômico foram acrescentados e as reações foram feitas num volume final de 50 μL com água Miliq Ultra pura. Os iniciadores apresentam as seguintes seqüências: Tabela 5. Iniciadores do gene de Mini-exon Padrão/gene No pares de bases Seqüência TCI 200 pb 5’-ACACTTTCTGGCGCTGATCG TCII 250 pb 5’-TTGCTCGCACACTCGGCTGCAT Z3: 150 pb 5’-CCGCGCACAACCCCTATAAAAATG TR 100 pb 5’-CCTATTGTGATCCCCATCTTCG EXON 5’-TACCAATATAGTACAGAACTG As reações foram processadas num termociclador GeneAmp ® PCR Instrument System 9600 (Perkin-Elmer) com o perfil térmico consistindo de um passo inicial de 5 minutos a 95ºC, seguidos de 34 ciclos de 30 segundos a 94ºC, 30 segundos a 55ºC e 30 segundos a 72ºC, com uma extensão final de 10 minutos a 72ºC. __________________________________________________________________________________________ 35 Sebastião Aldo da Silva Valente Material e Métodos Os produtos amplificados foram submetidos à eletroforese em gel de agarose 2%, corados com brometo de etídio e visualizados sob luz ultravioleta. Os géis foram fotografados com foto documentador de imagem de gel BIORAD UNIVERSAL HOOD 03350®. 10. TIPAGEM POR RAPD Foram estudados pela análise de DNA polimórfico amplificado aleatoriamente (RAPD) isolados em trios de cepas obtidos do homem, mamíferos e triatomíneos silvestres de 5 surtos ocorridos nos municípios de Ananindeua, Bragança, Abaetetuba, Belém e Barcarena, sendo as cepas previamente tipadas com o gene de mini-exon. Os oligonucleotídeos decaméricos (Tabela 6) usados para amplificar o DNA genômico dos isolados possuem seqüência arbitrária [kit Ready-To-Go™ RAPD Analysis Kit (Pharmacia Biotech)]. As reações de RAPD foram feitas segundo as recomendações do fabricante em 25 μl de volume final que continha Amplitaq™ DNA polimerase, 0.4 mM de cada dNTP, 2.5 μg de BSA, 3mM de MgCl2, 30mM KCl e 10 mM de Tris (pH 8.3) e 20ng de DNA genômico. As reações foram feitas num termociclador GeneAmp® PCR Instrument System 9600 (Perkin-Elmer) com o seguinte perfil térmico: 1 ciclo de 95°C, 5 min e 45 ciclos de 95°C, 1 min; 36°C, 30 seg; 72°C, 2 min. Tabela 6. Oligonucleotídeos usados na análise de RAPD. Oligonucleotídeos Seqüência RAPD 1 5’-GGTGCGGGAA-3’ RAPD 2 5’-GTTTCGCTCC-3’ RAPD 3 5’-GTAGACCCGT-3’ RAPD 4 5’-AAGAGCCCGT-3’ RAPD 5 5’-AACGCGCAAC-3’ RAPD 6 5’-CCCGTCAGCA-3’ Os produtos de amplificação foram primeiramente analisados em géis de agarose a 2% em tampão TBE 1X, corados com brometo de etídeo, visualizados sob luz UV e documentados com filme Polaroid®. Os produtos foram aplicados em géis de poliacrilamida GeneGel Excel 12.5/24 Kit (Pharmacia Biotech), separados por eletroforese no GenePhor Electrophoresis Unit (Pharmacia Biotech) e corados pela prata segundo os protocolos do PlusOne® DNA Silver Staining Kit (Pharmacia Biotech). Os géis foram lavados com água e secos à temperatura ambiente. Os fragmentos foram medidos por comparação com o marcador de peso molecular de 100 pb (Pharmacia Biotech). A interpretação dos resultados foi feita de acordo com os dendrogramas e matrizes geradas pelas análises fenéticas, __________________________________________________________________________________________ 36 Sebastião Aldo da Silva Valente Material e Métodos observando primeiramente a discriminação entre os isolados dentro de um mesmo surto e, depois, a similaridade entre os isolados de diferentes surtos. 11. ANÁLISE FENÉTICA As análises dos perfis de restrição foram feitas com métodos numéricos. Com base na presença e ausência de bandas se construíram matrizes de 1 e 0 respectivamente, que continham as unidades taxonômicas (cepas) e os caracteres (número de bandas no RAPD). Se uma cepa apresentava uma banda atribuía-se 1, ao passo que, nas cepas nas quais não existia essa mesma banda, atribuía-se 0. Essa matriz foi analisada com o programa NTSYS-pc Versão 2.1 (Exeter Software), utilizando-se o Coeficiente de Jaccard (J). Esses coeficientes geram matrizes de similaridade que, por sua vez, são analisadas pelo método não-ponderado de agrupamento aos pares por médias aritméticas (UPGMA) que produzem fenogramas. Quadro 2. OTU : Unidade Taxonômica Operacional OTU y OTU x 1 1 a 0 b 0 c d CS = a + d / a+ b + c + d J = a/a+b+c As árvores geradas pelo coeficiente de Jaccard foram submetidas à análise de “bootstrap” para avaliar estatisticamente o nível de consistência da topologia da árvore. A topologia é consistente se o grupo aparece em mais do 75% das árvores geradas durante uma análise de 1000 repetições. A análise de “bootstrap” foi feita com o programa “Free Tree” (PAVLICEK et al., 1999). 12. ANÁLISE ESTATÍSTICA DOS DADOS Para calcular o tamanho das amostras foram utilizados os softwares Stat Calc e o Bioestat versão 3.0. Para os resultados obtidos foram realizadas comparações de proporção usando o programa Epi Info Ver 2000; foi usado um nível de significância de 5% (p<0,05). __________________________________________________________________________________________ 37 Sebastião Aldo da Silva Valente Resultados 13. RESULTADOS 13.1. CASUÍSTICA DOS SURTOS DE DCA E ESTUDOS NA POPULAÇÃO HUMANA No período de estudos foram detectados pelo IEC e pela rede do SUS 53 surtos sendo 42 no Pará (79,24%) e 11 no Amapá (20,75%). Esses surtos representaram 268 casos agudos: 61 no Amapá (22,76%) 7 surtos em Macapá com 35 casos agudos, 2 em Santana com 9 casos e 1 surto no Mazagão com 17 casos (esse surto foi objeto de um estudo em separado). No Pará foram identificados 207 casos agudos (77,23%), com a seguinte distribuição: Abaetetuba (6 surtos com 40 casos agudos), Afuá (1 surto com 5 casos); Ananindeua (4 surtos com 27 casos), Bagre (1 surto com 7 casos), Barcarena (1 surto com 6 casos), Belém (26 surtos com 86 casos), Bragança (2 surtos com 13 casos), Ponta de Pedras (1 surto com 10 casos) e Santarém (1 surto com 13 casos). Os surtos, no Amapá e no Pará, ocorreram predominantemente entre os meses de julho e dezembro (n=52), sobretudo no mês de outubro (n=35). Fora desse período, ocorreu um surto no mês de fevereiro no Amapá e uma no mês de abril no Pará. Dessa casuística, (Tabela 7) foram selecionados inicialmente 12 surtos ocorridos no Pará e Amapá, num total de 121 casos agudos para realização dos estudos de análise, por apresentarem informações consistentes relacionadas às pesquisas parasitológicas, sorológicas e epidemiológicas. Tabela 7. Surtos de doença de Chagas aguda que ocorreram no Pará e Amapá ocorridos entre os anos de 1995 a 2005 UF MUNICÍPIO SURTOS DETECTADOS No DE CASOS AP Macapá 07 35 Mazagão 01 17 Santana 02 09 Abaetetuba 06 40 Afuá 01 05 Ananindeua 04 27 Bagre 01 07 Barcarena 01 06 Belém 26 86 Bragança 02 13 Ponta de Pedras 01 10 Santarém 01 13 53 268 PA TOTAL As análises descritas nesta tese não correspondem a todos os surtos ocorridos, mas para um grupo deles, referidos na tabela 8 como surtos estudados por possuírem dados mais __________________________________________________________________________________________ 38 Sebastião Aldo da Silva Valente Resultados completos na história epidemiológica, de diagnóstico e seguimento. Nos demais surtos, os resultados apresentados compõem análise preliminar disponível no banco de dados do Laboratório de Doença de Chagas do IEC. Tabela 8. Surtos de doença de Chagas aguda selecionados para os estudos no Pará e Amapá – 1995 a 2005 UF MUNICÍPIO CÓDIGO DO SURTO No DE CASOS AP Macapá Mazagão Santana Abaetetuba Afuá Ananindeua Bagre Barcarena Belém ME01. Macapá 1 ME02. Mazagão ME03. Santana 2 ME04. Abaetetuba ME05. Afuá 2 ME06. Ananindeua ME07. Bagre 2 ME08. Barcarena 2 ME09. Belém ME10. Belém 2 ME11. Bragança ME12. Santarém 10 17 6 15 05 14 07 6 12 09 07 13 PA Bragança Santarém TOTAL 121 1 2 Surto de Mazagão, Estado do Amapá selecionado para estudo. Surtos de Abaetetuba, Ananindeua, Barcarena, Belém e Bragança, estado do Pará selecionados para estudos. Pacientes seguidos por um período ≥ 2 anos por exames clínicos, parasitológicos e sorológicos. 13.2. EXAMES PARASITOLÓGICOS: PESQUISA DE T. CRUZI EM GOTA ESPESSA (GE), PESQUISA DE T. CRUZI PELO QBC® SYSTEM QUANTITATIVE BUFFY COAT, HEMOCULTURA E XENODIAGNÓSTICO ARTIFICIAL A pesquisa parasitológica nesses surtos foi direcionada para um grupo de 423 pessoas relacionadas com suspeita clínica (n=153) e seus contatos diretos (familiares, n=81) e vizinhos (n=189) nos municípios citados. Cento e vinte um indivíduos (121/423 – 28,6%) apresentaram pelo menos um teste parasitológico positivo (Figura 4). Figura 4. A. T. cruzi visualizado no QBC® System. B. T. cruzi visualizado em esfregaço. __________________________________________________________________________________________ 39 Sebastião Aldo da Silva Valente Resultados Entre os 121 pacientes positivos nos testes parasitológicos aplicados, a seguinte segmentação foi obtida: 44,62% com gota espessa (54/121); 91,73% com QBC® (111/121); 81% com xenodiagnósticos (98/121) e 60% com hemoculturas (73/121). Tabela 9. Todos os indivíduos parasitológicamente positivos eram sintomáticos para doença de Chagas aguda. Existem diferenças estatisticamente significativas no percentual de positividade das amostras estudadas. Em ordem decrescente a maior positividade foi com o QBC, Xenodiagnóstico, Hemocultura e Gota Espessa. Exame padrão GE (44,22%) Xeno (81%) QBC (91,73) Município Macapá Mazagão Santana Abaetetuba Afuá Ananindeua Bagre Barcarena Belém Bragança Santarém Total Comparação QBC (91,73%) Xeno (81%) Hemocultura (60%) GE (44,22%) QBC (91,73) Hemocultura (60%) Hemocultura (60%) p-value P=0,000000 P=0,000000 P=0,014 P=0,00000 P=0,014 P=0,000416 P=0,00000 χ21gl 61,89 34,25 5,98 34,25 5,93 12,46 32,74 Tabela 9. Pesquisa parasitológica em municípios onde ocorreram Surtos de doença de Chagas nos estado do Pará e Amapá – 1995 a 2005 *Pop. No GE QBC Xeno o o de casos +/N (%) Estudada +/N (%) +/No(%) 48 10 5/10(50) 10/10(100) 8/10(80) 26 17 6/17(35,3) 14/17(82,3) 14/17(82,3) 27 6 2/6(33,3) 5/6(83) 6/6(100) 96 15 9/15(60) 15/15(100) 12/15(80) 16 5 3/5(60) 4/5(80) 4/5(80) 42 14 5/14(35,7) 14/14(100) 11/14(78,5) 21 7 4/7(57,1) 6/7(85,7) 6/7(85,71) 19 6 2/6(33,3) 6/6(100) 5/6(83,3) 34 12 5/12(41,7) 12/12(100) 9/12(75) 27 9 4/9(44,4) 8/9(88,8) 7/9(77,7) 23 7 3/7(42,8) 7/7(100) 5/7(71,4) 44 13 6/13(46,1) 10/13(76,92) 11/13(84,6) 423 121 54/121(44,6) 111/121(91,73) 98/121(81) Hemo +/No(%) 7/10(70) 8/17(47) 5/6(83,33) 7(46,66) 3/5(60) 9/14(64,3) 5/7(83,3) 4/6(66,6) 7/12(58,3) 5/9(55, 5) 3/7(42,8) 10/13(76,9) 73/121(60) *Familiares diretos e/ou vizinhos com possível associação com o surtos. 13.3. SOROLOGIA A pesquisa sorológica incluiu uma amostragem determinada anteriormente que reuniu um grupo de 3633 pessoas distribuídas nos municípios em estudo. Em números globais, no teste de triagem HAI, foram detectados inicialmente 4,40% dos indivíduos (160/3633) positivos na sorologia. Esses soros, quando testados pela IFI para a pesquisa de IgG anti-T. cruzi, apresentaram positividade de 3,19% (116/3633), enquanto 3,02% dos indivíduos (110/3633) __________________________________________________________________________________________ 40 Sebastião Aldo da Silva Valente Resultados apresentaram testes positivos para anticorpos IgM anti-T. cruzi, todos apresentando sintomatologia e confirmados com os testes parasitológicos. Nas comunidades entre contatos e/ou familiares nenhum apresentava sintomatologia. Os resultados detalhados dos estudos realizados por município encontram-se na tabela 10. Tabela 10. Pesquisa sorológica em municípios onde ocorreram surtos de doença de Chagas nos estados do Pará e Amapá, entre os anos de 1995 e 2005 Pop. IBGE Município Casos (n) HAI IgG IgM Exa +(%) Exa +(%) Exa +(%) Macapá 283.308 10 2387 (0,4) 60/296 (12,4) 16/296 (5,4) 9/296 (3) 10/296 (3,4) Mazagão 13.913 17 26(65,4) 26/26(100) 15/26 (57,7) 9/26 (34,6) 6/26 (23,) Santana 80.439 6 794 (0,75) 77/532 (67) 9/532 (1,7) 9/532 (1,7) 6/532 (1,1) Abaetetuba 119.152 15 3890 (0,4) 61/687 (17,7) 21/687 (3) 16/687 (1,9) 15/687 (2,) Afuá 29.505 5 108 (4,6) 75/97 (89,8) 5/97 (5,1) 5/97 (5,1) 5/97 (5,) Ananindeua 393.569 14 2867 (0,5) 112/337 (11,7) 18/337 (5,3) 14/337 (4,1) 14/337 (4,) Bagre/PA 13.708 7 135 (5,2) 78/107 (79,2) 11/107(10,3) 7/107 (6,5) 7/107 (6,5) Barcarena 76.069 6 812 (0,7) 85/321 (39,5) 9/321 (2,8) 6/321 (1,8) 6/321 (1,8) Belém 1.280,614 12 1635 (0,7) 39/743 (45,4) 19/743 (2,5) 12/ 743 (1,6) 12/743(1,6) 9 635 (1,4) 14/186 (29,3) 11/186 (6) 9/186 (4,8) 9/186 (4,8) Bragança 100.924 7 355 (1,9) 86/175 (49,3) 175/11 (6,3) 7/175 (4) 7/175 (4) Santarém 262.538 13 236 (5,5) 135/126 (53,4) 126/15(11,9) 13/126(10,3) 13/126(10,3) Total 2.633,739 121 13880 (0,5) 848/3633 (23,3) 160/3633(4,4) 116/3633(3,2) 110/3633(3) Triagem por hemaglutinação indireta e imunofluorescência indireta (IFI) qualitativo (1/40), confirmação por IFI quantitativa e exames complementares. Município Pop.Local/ % de infectados Amos. Calc./ Estudada(%) 13.4. TRATAMENTO E SEGUIMENTO DE CASOS AGUDOS Todos os pacientes diagnosticados (N=121) foram tratados conforme o protocolo de tratamento específico e acompanhados pelo tempo mínimo de dois anos. A partir desse prazo temporal, dentro de cada surto houve perda de contato com alguns pacientes. Por outro lado, foi possível fazer o seguimento dos exames laboratoriais em 4 cortes de tempo: antes de tratar, 6 meses, 1 ano e acima de 2 anos após tratamento em cinco surtos corridos nos municípios de: (i) Abaetetuba (15 pacientes), (ii) Ananindeua (14 pacientes), (iii) Barcarena (6 pacientes), (iv) Belém (12 pacientes), (v) Bragança (7 pacientes) e (vi) Mazagão (17 pacientes); esse surto acompanhado em 5 cortes de tempo: antes de tratar, 6 meses, 1 ano, 5 anos e 7 anos após tratamento. __________________________________________________________________________________________ 41 Sebastião Aldo da Silva Valente Resultados 13.5. SURTO DE ABAETETUBA Nesse surto, todos os 15 indivíduos sintomáticos (Figura 5) antes de iniciar o tratamento apresentaram pelo menos um exame parasitológico positivo - 60% de positividade (9/15) na gota espessa, 100% (15/15) no QBC®, 80,0% (12/15) no xenodiagnóstico e 46,6 % (7/15) na hemocultura. Nos demais intervalos após o tratamento, todos os exames parasitológicos apresentaram resultados negativos. Quadro 3, Gráficos 1. Figura 5. Comunidade ribeirinha onde ocorreu surto de doença de Chagas aguda em Abaetetuba __________________________________________________________________________________________ 42 Sebastião Aldo da Silva Valente Resultados * Quadro 3. Acompanhamento de exames parasitológicos dos pacientes de Abaetetuba em 4 intervalos de tempo Antes de tratar Paciente GE/QBC XEN/CUL ABA 01 POS/POS POS/NEG ABA 02 NEG/POS POS/NR ABA 03 POS/POS POS/NR ABA 04 NEG/POS POS/POS ABA 05 POS/POS POS/NR ABA 06 POS/POS NR/POS ABA 07 NEG/POS NR/POS ABA 08 POS/POS NR/POS ABA 09 NEG/POS POS/POS ABA 10 NEG/POS POS/NR ABA 11 POS/POS POS/POS ABA 12 POS/POS POS/POS ABA 13 POS/POS POS/NR ABA 14 POS/POS POS/NR ABA 15 NEG/POS POS/NR * Constam somente os exames que apresentem pelo menos um resultado positivo nos demais intervalos com 6 meses, 1 e 2 anos de tratamento Gráfico 1. Acompanhamento de exames parasitológicos positivos dos pacientes de Abaetetuba 16 15 14 13 12 11 10 9 8 7 6 5 4 3 2 1 0 GE QBC XENO CUL Antes de Tratar POS NEG NR A sorologia diagnóstica realizada antes do tratamento mostrou que todos os indivíduos (15/15) com sintomatologia compatível com DCA apresentavam anticorpos IgM anti-T. cruzi (IFI) com títulos variando entre 1/40 e 1/640. Doze dos quinze pacientes (80% - 12/15) foram reativos na sorologia para a pesquisa de IgG com títulos variando entre 1/40 a 1/320 e todos (15/15) apresentaram HAI reagente. Após seis meses de tratamento, dois pacientes apresentaram IgM anti-T. cruzi positivos com título de 1/40 e os demais negativos. Para IgG todos os pacientes apresentavam títulos entre __________________________________________________________________________________________ 43 Sebastião Aldo da Silva Valente Resultados 1/40 até 1/160, sendo todas reagentes em HAI. Com um ano de tratamento, nos títulos de IgM todos apresentaram resultados negativos e os títulos de IgG variaram de 1/40 até 1/640 entre 14 pacientes, sendo em um paciente negativo. O teste de HAI permaneceu reativo em 66,66% (10/15) dos pacientes e 33,33% não reagentes (5/15). Acima de dois anos de tratamento todos os títulos de IgM permaneceram negativos. Quanto à IgG anti-T. cruzi, 6,6% (1/15) dos pacientes apresentaram títulos negativos e os demais tiveram os títulos variando entre 1/40 e 1/160. Na HAI, 46,6% (7/15) apresentaram títulos não-reagentes e os demais pacientes ainda reativos. Quadro 4, Gráficos 2 e 3. Quadro 4. Acompanhamento de exames sorológicos dos pacientes de Abaetetuba em 4 intervalos de tempo Antes de tratar 6 Meses 1 ano 2 anos Paciente IgG/IgM HAI IgG/IgM HAI IgG/IgM HAI IgG/IgM HAI ABA 01 1:80/1/1:80 + 1:160/NEG + 1:80/NEG + 1:40/NEG NREA ABA 02 1:40/1:80 + 1:80/NEG + NEG/NEG NREA NEG/NEG + ABA 03 NEG/1:80 + 1:40/NEG + 1:40/NEG + 1:40/NEG NREA ABA 04 NEG/1:160 + 1:160/NEG + 1:80/NEG + 1:40/NEG NREA ABA 05 1:40/1:80 + 1:80/1:40 + 1:40/NEG NREA 1:40/NEG NREA ABA 06 1:40/1:160 + 1:40/NEG + 1:80/NEG + 1:80/NEG + ABA 07 NEG/1:320 + 1:160/NEG + 1:40/NEG + 1:80/NEG + ABA 08 1:40/1:40 + 1:80/NEG + 1:160/NEG + 1:80/NEG NREA ABA 09 1:40/1:80 + 1:40/1:40 + 1:40/NEG + 1:40/NEG NREA ABA 10 1:80/1:640 + 1:80/NEG + 1:640/NEG + 1:40/NEG + ABA 11 1:160/1:640 + 1:160/NEG + 1:80/NEG + 1:80/NEG NREA ABA 12 1:40/1:160 + 1:80/NEG + 1:40/NEG NREA 1:40/NEG + ABA 13 1/80/1:80 + 1:40/NEG + 1:80/NEG NREA 1:40/NEG NREA ABA 14 1:320/1:320 + 1:160/NEG + 1:80/NEG + 1:160/NEG + ABA 15 1:40/1:160 + 1:160/NEG + 1:40/NEG NREA 1:80/NEG + Gráfico 2. Acompanhamento de exames sorológicos dos pacientes de Abaetetuba, em 4 intervalos de tempo 16 15 14 13 12 11 10 9 8 7 6 5 4 3 2 1 0 IgG IgM HAI IgG Antes de tratar IgM HAI IgG 6 Meses REA NREA 1/40 IgM HAI 1 Ano 1/80 1/160 1/320 1/640 1/1280 IgG IgM 2 Anos NEG __________________________________________________________________________________________ 44 HAI Sebastião Aldo da Silva Valente Resultados Gráfico 3. Resumo dos resultados parasitológicos e sorológicos observados no surto de Abaetetuba __________________________________________________________________________________________ 45 Sebastião Aldo da Silva Valente Resultados 13.6. SURTO DE ANANINDEUA Nesse surto, os 14 indivíduos sintomáticos em fase pré-tratamento (Figura 6) apresentaram exames parasitológicos positivos, sendo 35,71% (5/14) na gota espessa e 100% (14/14) no QBC®. O xenodiagnóstico apresentou 78,57% de positividade (11/14) e a hemocultura teve 71,42% (10/14) de positividade. Com seis meses de tratamento 21,4% (3/14) apresentavam xenodiagnóstico positivo e foram tratados novamente. Os demais pacientes nesse intervalo e nos seguintes após o tratamento tiveram os exames parasitológicos com resultados negativos. Quadro 5, Gráfico 4. Figura 6. À esquerda, residência de pacientes no surto de Ananindeua. À direita, dois dos pacientes com diagnóstico positivo de fase aguda da doença de Chagas. *Quadro 5. Acompanhamento de exames parasitológicos dos pacientes de Ananindeua em 4 intervalos de tempo Antes de tratar Paciente GE/QBC XEN/CUL XEN/CUL ANA 01 POS/POS POS/POS POS/NEG ANA 02 POS/POS POS/NEG NEG/NEG ANA 03 NEG/POS POS/NEG POS/NEG ANA 04 NEG/POS POS/POS NEG/NEG ANA 05 NEG/POS POS/POS POS/NEG ANA 06 NEG/POS NEG/POS NEG/NEG ANA 07 NEG/POS POS/POS NEG/NEG ANA 08 POS/POS NEG/POS NEG/NEG ANA 09 NEG/POS POS/POS NEG/NEG ANA 10 POS/POS POS/NEG NEG/NEG ANA 11 POS/POS POS/POS NEG/NEG ANA 12 NEG/POS POS/POS NEG/NEG ANA 13 NEG/POS POS/NNEG NEG/NEG ANA 14 NEG/POS NEG/POS NEG/NEG * Constam somente os exames que apresentem pelo menos um resultado positivo nos demais intervalos com 6 meses, 1 e 2 anos de tratamento __________________________________________________________________________________________ 46 Sebastião Aldo da Silva Valente Resultados Gráfico 4. Acompanhamento de exames parasitológicos positivos dos pacientes de Ananindeua 15 14 13 12 11 10 9 8 7 6 5 4 3 2 1 0 GE QBC XENO CUL GE Antes de tratar QBC XENO CUL 6 meses POS NEG NR O diagnóstico sorológico dos indivíduos com sintomatologia compatível de DCA revelou no teste de IFI, 64,28% (9/14) dos pacientes foram IgM anti-T. cruzi positivos, títulos variando entre 1/40 e 1/640. Para anticorpos IgG anti-T. cruzi 57,14% (8/14) dos pacientes foram positivos com títulos entre 1/40 a 1/320. O teste de HAI apresentou 78,57% de positividade (11/14). Seis meses após o tratamento, 2 pacientes (14,28%) ainda apresentavam títulos de IgM positivos. Os pacientes apresentavam IgG com títulos reativos entre 1/40 e 1/160. O teste de HAI foi reagente para todos os pacientes. Um ano após o tratamento, a IFI por pesquisas de IgM anti-T. cruzi apresentou resultados negativos, enquanto a mesma técnica, por ocasião da pesquisa de IgG, mostrou resultados variando de 1/40 e 1/160. A HAI revelou apenas 57,14% (8/14) dos pacientes como positivos. Dois anos após o tratamento, um paciente apresentou título de IgM positivo em vigência de malária por P. falciparum e todos apresentaram IgG com títulos variando entre 1/40 e 1/160. Na HAI, 7 pacientes apresentaram resultados não reativos. Quadro 6, Gráficos 5 e 6. Quadro 6. Acompanhamento de exames sorológicos dos pacientes de Ananindeua em 4 intervalos de tempo Paciente ANA 01 ANA 02 ANA 03 ANA 04 ANA 05 ANA 06 ANA 07 ANA 08 ANA 09 ANA 10 ANA 11 ANA 12 ANA 13 ANA 14 Antes de tratar IgG/IgM HAI 1:80/1:40 + NEG/NEG + 1:40/NEG + NEG/NEG + 1:40/1:80 NREA NEG/1:160 NREA 1:40/1:40 + 1:80/1:40 + NEG/1:320 + 1:40/1:640 + 1:160/NEG + NEG/1:160 + NEG/1:80 NREA 1:320/NEG + 6 Meses IgG/IgM 1:80/1:80 1:40/NEG 1:40/1:80 1:40/NEG 1:80/NEG 1:80/NEG 1:40/NEG 1:40/NEG 1:40/NEG 1:80/NEG 1:80/NEG 1:160/NEG 1:160/NEG 1:80/NEG HAI + + + + + + + + + + + + + + 1 ano IgG/IgM 1:80/NEG 1:40/NEG 1:80/1:NEG 1:160/NEG 1:80/NEG 1:40/NEG 1:40/NEG 1:80/NEG 1:80/NEG 1:40/NEG 1:160/NEG 1:40/NEG 1:80/NEG 1:40/NEG HAI + NREA + + + NREA NREA + + NREA + NREA NREA + 2 anos IgG/IgM 1:40/NEG 1:40/NEG 1:160/1:320 1:40/NEG 1:80/NEG 1:40/NEG 1:80/NEG 1:40/NEG 1:40/NEG 1:160/NEG 1:80/NEG 1:40/NEG 1:80/NEG 1:80/NEG HAI NREA NREA + NREA + NREA + NREA NREA + + NREA + + __________________________________________________________________________________________ 47 Sebastião Aldo da Silva Valente Resultados Gráfico 5. Acompanhamento de exames sorológicos dos pacientes de Ananindeua, em 4 intervalos de tempo 15 14 13 12 11 10 9 8 7 6 5 4 3 2 1 0 IgG IgM Antes de tratar HAI IgG IgM HAI 6 Meses IgG IgM HAI 1 Ano IgG IgM HAI 2 Anos REA NREA 1/40 1/80 1/160 1/320 1/640 1/1280 NEG Gráfico 6. Resumo dos resultados parasitológicos e sorológicos observados no surto de Ananindeua __________________________________________________________________________________________ 48 Sebastião Aldo da Silva Valente Resultados 13.7. SURTO DE BARCARENA Seis pessoas, todas sintomáticas, (Figura 7) apresentaram antes do tratamento, exame parasitológico de gota espessa positivo em 33,33% (2/6) e 100% (6/6) no QBC®. Quando examinados pelo xenodiagnóstico, 83,33% foram positivos (5/6) e a hemocultura foi positiva em 66,66% dos casos (4/6). Após seis meses de tratamento e nos outros cortes temporais, todos os exames parasitológicos foram negativos. Quadro 7, Gráfico 7. Figura 7. À esquerda, residência de pacientes do surto de Barcarena. À direita, dois dos pacientes com diagnóstico positivo para fase aguda da doença de Chagas. *Quadro 7. Acompanhamento de exames parasitológicos dos pacientes de Barcarena em 4 intervalos de tempo Antes de tratar Paciente GE/QBC XEN/CUL BAR 01 NEG/POS POS/POS BAR 02 NEG/POS POS/POS BAR 03 NEG/POS POS/NEG BAR 04 POS/POS POS/POS BAR 05 NEG/POS POS/NEG BAR 06 POS/POS NEG/POS * Constam somente os exames que apresentem pelo menos um resultado positivo nos demais intervalos com 6 meses, 1 e 2 anos de tratamento __________________________________________________________________________________________ 49 Sebastião Aldo da Silva Valente Resultados Gráfico 7. Acompanhamento de exames parasitológicos positivos dos pacientes de Barcarena 7 6 5 4 3 2 1 0 GE QBC XENO CUL Antes deTratar POS NEG NR A sorologia diagnóstica demonstrou positividade para IgM em 100% dos pacientes (6/6), enquanto a pesquisa de IgG foi positiva em 83,33 (5/6) dos indivíduos sintomáticos com títulos entre 1/40 a 1/160. Todos foram reagentes no teste de HAI. Seis meses após o tratamento, nenhum paciente apresentou IgM positiva. Os títulos de IgG variaram de 1/40 a 1/160 entre os seis pacientes. No teste de HAI, todos os pacientes foram reagentes. Um ano após o tratamento, a pesquisa de IgM continuava negativa em todos os pacientes e os títulos de IgG permaneceram em níveis entre 1/40 e 1/160. Na HAI 50% (3/6) dos pacientes foram não-reagentes. Dois anos após o tratamento, a pesquisa de IgM permanecia negativa em todos os pacientes. Os títulos de IgG permaneciam positivos entre 1/40 e 1/160 e os testes de HAI se revelaram negativos em 2 indivíduos. Quadro 8, Gráficos 8 e 9. Quadro 8. Acompanhamento de exames sorológicos dos pacientes de Barcarena em 4 intervalos de tempo Antes de tratar 6 Meses 1 ano 2 anos Paciente IgG/IgM HAI IgG/IgM HAI IgG/IgM HAI IgG/IgM HAI BAR 01 1:80/1:80 + 1:80/NEG + 1:40/NEG + 1:160/NEG + BAR 02 NEG/1:40 + 1:80/NEG + 1:80/NEG + 1:40/NEG NREA BAR 03 1:160/1:160 + 1:80/NEG + 1:40/NEG NREA 1:80/NEG + BAR 04 1:40/1:80 + 1:160/NEG + 1:160/NEG + 1:40/NEG + BAR 05 1:80/1:80 + 1:80/NEG + 1:80/NEG NREA 1:40/NEG NREA BAR 06 1:40/1:80 + 1:40/NEG + 1:80/NEG NREA 1:80/NEG + __________________________________________________________________________________________ 50 Sebastião Aldo da Silva Valente Resultados Gráfico 8. Acompanhamento de exames sorológicos dos pacientes de Barcarena, em 4 intervalos de tempo 7,00 6,00 5,00 4,00 3,00 2,00 1,00 0,00 IgG IgM HAI IgG Antes de tratar IgM HAI IgG 6 Meses REA NREA 1/40 1/80 IgM HAI IgG 1 Ano 1/160 1/320 1/640 IgM HAI 2 Anos 1/1280 NEG Gráfico 9. Resumo dos resultados parasitológicos e sorológicos observados no surto de Barcarena __________________________________________________________________________________________ 51 Sebastião Aldo da Silva Valente Resultados 13.8. SURTO DE BELÉM Entre os 12 pacientes (Figura 8) identificados como agudos, 5 (41,66%) apresentaram exame de gota espessa positivo, enquanto no teste de QBC® todos (12 - 100%) apresentaram resultados positivos. O xenodiagnóstico apresentou 75% de positividade (9/12) e a hemocultura foi positiva em 58,33% (7/12) dos testes efetuados. Nos demais intervalos pós-tratamento, todos os exames parasitológicos apresentaram resultados negativos. Quadro 9, Gráfico 10. Figura 8. À esquerda, residência de pacientes do surto de Belém. À direita, três dos pacientes com diagnóstico positivo para fase aguda de doença de Chagas. * Quadro 9. Acompanhamento de exames parasitológicos dos pacientes de Belém em 4 intervalos de tempo Antes de tratar Paciente GE/QBC BEL 01 POS/POS BEL 02 NEG/POS BEL 03 NEG/POS BEL 04 NEG/POS BEL 05 NEG/POS BEL 06 POS/POS BEL 07 POS/POS BEL 08 NEG/POS BEL 09 NEG/POS BEL 10 NEG/POS BEL 11 POS/POS BEL 12 POS/POS XEN/CUL POS/NEG POS/NR POS/NR POS/POS POS/NEG NEG/POS NEG/POS NEG/POS POS/POS POS/NEG POS/POS POS/POS * Constam somente os exames que apresentem pelo menos um resultado positivo nos demais intervalos com 6 meses, 1 e 2 anos de tratamento __________________________________________________________________________________________ 52 Sebastião Aldo da Silva Valente Resultados Gráfico 10. Acompanhamento de exames parasitológicos positivos dos pacientes de Belém 13 12 11 10 9 8 7 6 5 4 3 2 1 0 GE QBC XENO CUL Antes de Tratar POS NEG NR Por ocasião do diagnóstico sorológico, todos os pacientes se mostraram IgM anti-T. cruzi positivos (12/12 – 100%) com títulos variando entre 1/40 e 1/640, caracterizando a fase aguda da doença, e títulos de IgG positivos em 83,33% (10/12) com títulos entre 1/40 e 1/320. O teste de HAI na fase pré-tratamento apresentou resultados reativos em todos os pacientes. Aos seis meses após o tratamento, todos os pacientes apresentavam títulos de IgM negativos, e essa característica se estendeu pelos dois outros cortes temporais (1 e 2 anos). Os títulos de IgG se mantinham entre 1/40 e 1/320. Os testes de HAI permaneceram todos reagentes. Com um ano de tratamento, os títulos de IgG variavam entre 1/40 e 1/160, e os testes de HAI um foi negativo e os demais reagentes. Os pacientes apresentaram, após 2 anos de tratamento, anticorpos de IgM todos negativos. Para IgG, os anticorpos apresentaram títulos entre 1/40 e 1/160. A HAI se revelou negativa em dois pacientes. Quadro 10, Gráficos 11 e 12. Quadro 10. Acompanhamento de exames sorológicos dos pacientes de Belém em 4 intervalos de tempo Paciente BEL 01 BEL 02 BEL 03 BEL 04 BEL 05 BEL 06 BEL 07 BEL 08 BEL 09 BEL 10 BEL 11 BEL 12 Antes de tratar IgG/IgM HAI 1:80/1:80 + 1:40/1:40 + 1:40/1:160 + NEG/1:80 + 1:40/1:80 + 1:80/1:160 + NEG/1:320 + 1:160/1:640 + 1:160/1:320 + 1:80/1:160 + 1:80/1:80 + 1:320/1:320 + 6 Meses IgG/IgM 1:40/NEG 1:80/NEG 1:40/NEG 1:160/NEG 1:160/NEG 1:80/NEG 1:80/NEG 1:160/NEG 1:40/NEG 1:80/NEG 1:320/NEG 1:160/NEG HAI + + + + + + + + + + + + 1 ano IgG/IgM 1:40/NEG 1:80/NEG 1:160/NEG 1:60/NEG 1:40/NEG 1:40/NEG 1:40/NEG 1:80/NEG 1:80/NEG 1:40/NEG 1:160/NEG 1:80/NEG HAI + + + + NREA + + + + + + + 2 anos IgG/IgM 1:40/NEG 1:40/NEG 1:40/NEG 1:80/NEG 1:160/NEG 1:80/NEG 1:40/NEG 1:80/NEG 1:80/NEG 1:160/NEG 1:40/NEG 1:40/NEG HAI + + + + + NREA + + NREA + + + __________________________________________________________________________________________ 53 Sebastião Aldo da Silva Valente Resultados Gráfico 11. Acompanhamento de exames sorológicos dos pacientes de Belém, em 4 intervalos de tempo 13 12 11 10 9 8 7 6 5 4 3 2 1 0 IgG IgM HAI IgG 1 Antes de tratar IgM HAI IgG 6 Meses REA NREA 1/40 IgM HAI 1 Ano 1/80 1/160 1/320 1/640 1/1280 IgG IgM 2 Anos NEG Gráfico 12. Resumo dos resultados parasitológicos e sorológicos observados no surto de Belém __________________________________________________________________________________________ 54 HAI Sebastião Aldo da Silva Valente Resultados 13.9. SURTO DE BRAGANÇA Sete pessoas acompanhadas nesse surto (Figura 9) apresentaram exame de gota espessa positivo em 42,85% (3/7) e 100% (7/7) no QBC®. O xenodiagnóstico apresentou 71,42% de positividade (5/7) e a hemocultura foi positiva em 42,85% (3/7) dos positivos. Nos intervalos seguintes pós tratamento, todos os exames parasitológicos negativaram. Quadro 11, Gráfico 13. Figura 9. À esquerda, residência de pacientes no surto de Bragança. À direita, coleta de sangue de um dos pacientes com diagnóstico positivo para fase aguda de doença de Chagas. * Quadro 11. Acompanhamento de exames parasitológicos dos pacientes de Bragança em 4 intervalos de tempo Antes de tratar Paciente GE/QBC XEN/CUL BRA 01 POS/POS POS/NEG BRA 02 NEG/POS POS/NR BRA 03 NEG/POS POS/NR BRA 04 NEG/POS POS/POS BRA 05 NEG/POS POS/NR BRA 06 POS/POS NR/POS BRA 07 POS/POS NR/POS * Constam somente os exames que apresentem pelo menos um resultado positivo nos demais intervalos com 6 meses, 1 e 2 anos de tratamento __________________________________________________________________________________________ 55 Sebastião Aldo da Silva Valente Resultados Gráfico 13. Acompanhamento de exames parasitológicos positivos dos pacientes de Bragança 8 7 6 5 4 3 2 1 0 GE QBC XENO CUL Antes de tratar POS NEG NR Os testes de IFI foram positivos nos 7 pacientes, com os títulos de IgM variando de 1/40 e 1/160. Já os títulos de IgG foram positivos em 4 (57,14%) com títulos entre 1/40 e 1/80. No ensaio de HAI todos apresentaram resultados reativos. Com seis meses do tratamento, todos os pacientes apresentaram títulos de IgM negativos que permaneceram negativos até os dois anos após o tratamento. Os títulos de IgG variaram entre 1/40 e 1/80. Os testes de HAI foram todos reagentes. Com um ano de tratamento, os títulos de IgG variaram de 1/40 até 1/80. Todos os testes de HAI permaneciam reativos. Aos dois anos após o tratamento, os títulos de IgG variaram entre 1/40 e 1/160. Em três pacientes o ensaio de HAI foi negativo, permanecendo positivo nos outros. Quadro 12 e Gráficos 14 e 15. Quadro 12. Acompanhamento de exames sorológicos dos pacientes de Bragança em 4 intervalos de tempo Antes de tratar 6 Meses IgG/IgM HAI IgG/IgM BRA 01 1:80/1:160 + 1:40/NEG + BRA 02 NEG/1:80 + BRA 03 1:80/1:160 BRA 04 Paciente 1 ano IgG/IgM HAI 1:80/NEG + 1:40/NEG + 1:40/NEG + 1:40/NEG + 1:40/NEG NREA + 1:80/NEG + 1:40/NEG + 1:40/NEG NREA NEG/1:80 + 1:40/NEG + 1:80/NEG + 1:80/NEG NREA BRA 05 1:40/1:160 + 1:40/NEG + 1:80/NEG + 1:80/NEG + BRA 06 NEG/1;180 + 1:80/NEG + 1:40/NEG + 1:160/NEG + BRA 07 1:40/1:40 1:40/NEG + 1:80/NEG + 1:80/NEG + HAI IgG/IgM >2 anos HAI + __________________________________________________________________________________________ 56 Sebastião Aldo da Silva Valente Resultados Gráfico 14. Acompanhamento de exames sorológicos dos pacientes de Bragança, em 4 intervalos de tempo 8 7 6 5 4 3 2 1 0 IgG IgM Antes de Tratar HAI IgG IgM HAI 6 Meses IgG IgM HAI 1 Ano IgG IgM HAI 2 Anos REA NREA 1/40 1/80 1/160 1/320 1/640 1/1280 NEG Gráfico 15. Resumo dos resultados parasitológicos e sorológicos observados no surto de Bragança __________________________________________________________________________________________ 57 Sebastião Aldo da Silva Valente Resultados 13.10. SURTO DE MAZAGÃO O surto de Mazagão foi um marco que, pela primeira vez, reuniu dados epidemiológicos que confirmaram a proposta de transmissão oral da doença de Chagas. Acometeu 17 indivíduos (Figura 10) com sintomatologia própria de doença aguda e os exames parasitológicos que antecederam o tratamento apresentaram 100% (17/17) de positividade. sendo 35,29% (6/17) na gota espessa e 94,11% (16/17) no QBC®. O xenodiagnóstico apresentou 82,35% de positividade (14/17) e a hemocultura teve 41,17% (7/17) de positividade. Com seis meses, um ano, e cinco anos de tratamento, todos os pacientes negativaram, com exceção de um que, desde o início, apresentou alergia ao benzonidazol e teve suspenso o tratamento por várias vezes. No quinto ano esse paciente, que apresentou sorologia positiva para HIV, teve um xenodiagnóstico positivo, tratou novamente, agora com nifurtimox, tem exame parasitológico como todos os demais pacientes após o sétimo ano de tratamento. Quadro 13, Gráfico 16. Figura 10. Ambiente de transmissão e pacientes num surto de doença de Chagas familiar no Mazagão-AP. __________________________________________________________________________________________ 58 Sebastião Aldo da Silva Valente Resultados *Quadro 13. Acompanhamento de exames parasitológicos dos pacientes de Mazagão em 5 intervalos de tempo Antes de tratar Paciente GE/QBC XEN/CUL XEN/CUL A 5209 A 5219 A 5210 A 5211 A 5220 A 5221 B 5222 B 5200 B 5201 B 5198 B 5199 B 5202 C 5203 C 5205 C 5206 C 5208 C 5258 NEG/NEG NEG/POS POS/POS NEG/POS NEG/POS POS/POS NEG/POS NEG/POS POS/POS NEG/POS POS/POS NEG/POS NEG/POS NEG/POS POS/POS NEG/POS POS/POS POS/NEG POS/ NEG POS/ NEG POS/POS POS/ NEG POS/ NEG NEG/NEG POS/ NEG POS/POS POS/ NEG POS/POS POS/POS NEG/ NEG POS/POS POS/POS POS/POS NEG/NEG NEG/NEG NEG/NEG NEG/NEG NEG/NEG NEG/NEG NEG/NEG NEG/NEG NEG/NEG NEG/NEG NEG/NEG NEG/NEG NEG/NEG NEG/NEG POS/NEG NEG/NEG NEG/NEG NEG/NEG * Constam somente os exames que apresentem pelo menos um resultado positivo nos demais intervalos com 6 meses, 1 e 2 anos de tratamento Gráfico 16. Acompanhamento de exames parasitológicos positivos dos pacientes de Mazagão 17 16 15 14 13 12 11 10 9 8 7 6 5 4 3 2 1 0 GE QBC XENO CUL Antes de tratar POS NEG Antes de iniciar o tratamento, os pacientes apresentaram no teste de IFI IgG 47,05% (8/17) de positividade para IgG (títulos variando entre 1:40 e 1:320) e 35,29% (6/17) de positivos __________________________________________________________________________________________ 59 Sebastião Aldo da Silva Valente Resultados para IgM anti-T. cruzi com títulos variando entre 1:40 e 1:640. O teste de HAI apresentou 47,05% de positividade (8/17). Com seis meses de tratamento, 88,23% (15/17) dos pacientes apresentavam IgG com títulos reativos entre 1/40 e 1/640. O teste de IgM foi negativo em todos os indivíduos, enquanto o teste de HAI foi reagente para todos os pacientes. Um ano após o tratamento, a IFI para IgM anti-T. cruzi permaneceu negativo, enquanto a pesquisa de IgG foi positiva em 70,58% (12/17) dos pacientes com resultados variando de 1/40 e 1/320. A HAI foi positiva em 70,58% (12/17) dos pacientes. Com cinco anos de tratamento, todos os pacientes apresentaram IFI IgG e IgM e HAI negativos, com exceção do paciente que contraiu o HIV e havia interrompido o tratamento no passado. Ele apresentou IgG e IgM com títulos respectivos de 1:320 e 1:80, além de HAI positivo. Após tratar novamente, com sete anos, ele e os demais pacientes apresentaram todos os testes sorológicos negativos . Quadro 14, Gráficos 17 e 18. Quadro 14. acompanhamento de exames sorológicos dos pacientes de Mazagão em 5 intervalos de tempo Antes de tratar 6 Meses IgG/IgM HAI IgG/IgM HAI IgG/IgM HAI IgG /IgM HAI A 5209 1:80/NEG + 1:80/ NEG + 1:40/ NEG + NEG/NEG NREA A 5219 NEG/NEG NREA 1:40/NEG + NEG/NEG NREA NEG/NEG NREA A 5210 1:80/1:320 + 1:80/NEG + 1:80/ NEG + NEG/NEG NREA A 5211 NEG/NEG NREA 1:40/NEG/ + 1:40/ NEG + NEG/NEG NREA A 5220 NEG/NEG NREA 1:40/NEG + 1:40/ NEG + NEG/NEG NREA A 5221 NEG/NEG NREA NEG/NEG + NEG/NEG NREA NEG/NEG NREA A 5222 NEG/1:40 + 1:80/NEG + 1:40/ NEG + NEG/NEG NREA B 5200 NEG/1:40 + 1:80/NEG + 1:40/ NEG + NEG/NEG NREA B 5201 NEG/1:320 + 1:80/NEG + 1:40/ NEG + NEG/NEG NREA B 5198 1:40/1:640 + 1:40/NEG + 1:80/ NEG + NEG/NEG NREA B 5199 1:160/NEG + 1:80/NEG + 1:40/ NEG + NEG/NEG NREA B 5202 NEG/NEG NREA 1:80/NEG + NEG/NEG NREA NEG/NEG NREA B 5203 NEG/NEG NREA 1:40/NEG + NEG/NEG NREA NEG/NEG NREA C 5205 1:320/NEG + NEG/NEG + 1:40/ NEG + 1:320/1:80 REA C 5206 1:320/NEG NREA 1:40/ NEG + NEG/NEG NREA NEG/NEG NREA C 5208 1:320/1:40 NREA 1:80/ NEG + 1:80/ NEG + NEG/NEG NREA C 5258 1:320/NEG NREA 1:640/NEG + 1:320/NEG + NEG/NEG NREA Paciente 1 ano 5 anos * Constam somente os exames que apresentem pelo menos um resultado positivo nos demais intervalos com 6 meses, 1 e 2 anos de tratamento __________________________________________________________________________________________ 60 Sebastião Aldo da Silva Valente Resultados Gráfico 17. Acompanhamento de exames sorológicos dos pacientes de Mazagão, em 5 intervalos de tempo 18 17 16 15 14 13 12 11 10 9 8 7 6 5 4 3 2 1 0 IgG IgM HAI IgG Antes de Tratar REA IgM HAI 6 Meses NREA IgG IgM HAI 1 Ano 1/40 1/80 1/160 IgG IgM HAI IgG 5 Anos 1/320 1/640 IgM HAI 7 Anos NEG Gráfico 18. Resumo dos resultados parasitológicos e sorológicos observados no surto de Mazagão __________________________________________________________________________________________ 61 Sebastião Aldo da Silva Valente Resultados 14. CAPTURA DE ANIMAIS 14.1. CAPTURA E IDENTIFICAÇÃO DE ANIMAIS SILVESTRES Os mamíferos foram capturados nas localidades onde os surtos de DCA ocorreram: Abaetetuba, Ananindeua, Barcarena, Belém e Bragança, no Estado do Pará, e no município de Mazagão, no Estado do Amapá. Foram capturados 145 mamíferos silvestres, sendo 132 da ordem Didelphimorpha (Marsupialia) representados por 4 espécies e 13 mamíferos da ordem Rodentia, todos de uma única espécie. Tabela 11. Da Ordem Didelphimorpha, foram capturados 75 Didelphis marsupialis, 34 Philander opossum, 21 Marmosa cinerea, e 2 Marmosa murina; da Ordem Rodentia, foram 13 Proechimys guayanensis. Foram capturados56 animais em Abaetetuba, 7 em Ananindeua, 40 em Barcarena, 5 em Belém, 25 em Bragança e 12 em Mazagão. Figura 11. Figura 11. A. Didelphis marsupialis; B. Philander opossum; C. Marmosa cinerea: mamíferos mais capturados nos estudos dos surtos. __________________________________________________________________________________________ 62 Sebastião Aldo da Silva Valente Resultados Tabela 11. Mamíferos coletados e taxa de infecção para T. cruzi nas áreas de ocorrência de surtos nos estados do Pará e Amapá entre 1995 a 2005 Municípios D. marsupialis P. opossum M. cinerea M. murina Cap/Exa Cap/Exa Pos(%) Cap/Exa Pos(%) Cap/Exa Pos(%) Cap/Exa Pos(%) Pos(%) P. guyanensis Abaetetuba 21/21 16(76,2) 23/23 18(78,2) 7/7 5(71,4) ─ ─ 5/5 3(60) Ananindeua 7/7 5(71,4) ─ ─ ─ ─ ─ ─ ─ Barcarena 23/23 16(69,6) 5/5 4(80) 6/5 3(60) ─ ─ 6/6 3(50) Belém 5/5 3(60) ─ ─ ─ ─ ─ ─ ─ ─ Bragança 13/13 9(69,2) 6/6 4(66.6) 4/4 1(25) ─ ─ 2/2 1(50) Mazagão 6/6 3(50) ─ ─ 4/4 2(50) 2/2 1(50) ─ ─ Total 75/75 52(69,33) 34/34 26(76,4) 21/21 11(52,38 ) 2/2 1(50) 13/13 7(53,84) ─ 14.2. PESQUISA DE T. CRUZI PELO SISTEMA QBC® E EM GOTA ESPESSA (GE) O teste do QBC revelou uma positividade de 68,96% (145/100), estando infectados com tripanossomas 69,33% dos D. marsupialis (52/75), 70,58% dos P. opossum (24/34), 61,90% das M. cinerea (13/21), 100% das M. murina (2/2) e 69,23% dos P. guyanensis (9/13). Na GE, 37,3% (28/75) dos exemplares de D. marsupialis coletados apresentaram resultados positivos; 47,05% dos P. opossum (16/34); 42,85% das M. cinerea (9/21); 50% das M. murina (1/2) e 38,46% dos P. guyanensis (5/13). 14.3. XENODIAGNÓSTICO E HEMOCULTURA Xenodiagnóstico: positivo em 64% (48/75) dos D. marsupialis; 58,82% (20/34) dos P. opossum; 52,38% (11/21) das M. cinerea; 50% (1/2) das M. murina e 65,53% (8/13) dos P. guyanensis. Quanto à hemocultua, foram obtidos os seguintes índices de positividade: D. marsupialis 54,66% (41/75); P. opossum 67,64% (23/34); M. cinerea 47,61% (10/21); M. murina 50% (1/2) e P. guyanensis 53,84% (7/13). Os resultados compilados na tabela 12. Tabela 12. Presença de tripanossomas em mamíferos silvestres coletados nos estados do Pará e Amapá entre os anos de 1995 e 2005 Hospedeiro No de Gota espessa animais Pos %Pos QBC® Pos 75 34 21 2 28 16 9 1 37,3 47,05 42,85 50 13 145 5 59 38,46 40,68 %Pos Xenodiagnóstico Pos %Pos Hemocultura Pos %Pos 52 24 13 2 69,33 70,58 61,90 100 48 20 11 1 64 58,82 52,38 50 41 23 10 1 54,66 67,64 47,61 50 9 100 69,23 68,96 8 88 65,53 60,68 7 82 53,84 56,55 Didelphimorpha D. marsupialis P. opossum M. cinerea M. murina Rodentia P. guyanensis Total de animais __________________________________________________________________________________________ 63 Sebastião Aldo da Silva Valente Resultados 15. ESTUDO ENTOMOLÓGICO Foram capturados nas localidades em que ocorreram os surtos (Abaetetuba, Ananindeua, Barcarena, Belém, Bragança e Mazagão), 1022 triatomíneos de cinco espécies: R. pictipes (n=737); R. robustus (n=83); R. milesi (n=64); P. geniculatus (n=98) e P. lignarius (n=40). 15.1. COLETA DE TRIATOMÍNEOS EM PALMEIRAS 174 palmeiras de 5 espécies foram examinadas nos diferentes municípios. A espécie Schelea martiana (urucuri) representou 38,5% (67/174) das examinadas; Orbgnya speciosa (babaçu) 19,54% (34/174); Maximiliana regia (inajá) 21,83% (38/174); Elaeis melanoccoca (dendê) 10,917% (19/174) e Oenocarpus bacaba (bacaba) 9,19% (16/174). Tabela 13. O índice de infestação de triatomíneos nessas palmeiras foi de 61,19% (41/67) para S. martiana; 64,70% (22/34) para O. speciosa; 50% (19/38) para M. regia; 57,89% (11/19) para E. melanoccoca; e 75% (12/16) para O. bacaba. Tabela 13. Palmeiras como principais ecótopos de triatomíneos em municípios dos estados do Pará e Amapá, 1995-2005 Espécie Investigadas Positivas %Positiva S. martiana - Urucuri 67 41 61,19 O. speciosa - Babaçu 34 22 64,70 M. regia - Inajá 38 19 50 E. melanoccoca - Dendê 19 11 57,89 O. bacaba - Bacaba 16 12 75 Total 174 105 60,34 As palmeiras regionais (Figura 12, Tabela 14) foram os principais ecótopos das 5 espécies de triatomíneos coletados. A espécie S. martiana (urucuri) abrigava 33,03% (247/747)) dos exemplares de triatomíneos coletados; M. regia (Inajá) 24,63% (184/747); O. speciosa (babaçu) 21,95% (164/747); E. melanoccoca (dendê) 11,91% (89/747) e ; O. bacaba (bacaba) 8,43% (63/747). __________________________________________________________________________________________ 64 Sebastião Aldo da Silva Valente Resultados Tabela 14. Distribuição dos triatomíneos coletados em 5 espécies de palmeiras em municípios dos estados do Pará e Amapá, 1995-2005 ESPÉCIE R. pictipes R. robustus R. milesi P. geniculatus P. lignarius Total (%) S. martiana (Urucuri) 213 14 ─ 12 8 247(33,06) M. regia (Inajá) 149 12 ─ 13 10 184(24,63) O. speciosa (Babaçu) 82 8 58 10 6 164(21,95) E. melanoccoca 78 (Dendê) 7 ─ 4 ─ 89(11,91) O. bacaba (Bacaba) 55 8 ─ ─ ─ 63(8,43) Total Geral 577 49 58 39 24 747(100) Figura 12. Coleta de triatomíneos em palmeiras Barcarena foi o município com maior número de coletas de triatomíneos em todos os métodos com 432 exemplares, enquanto nos demais locais, foram coletados: 269 insetos em Abaetetuba; 197 em Bragança; 68 em Mazagão, 41 em Belém, 15 em Ananindeua. __________________________________________________________________________________________ 65 Sebastião Aldo da Silva Valente Resultados 15.2. COLETA DE TRIATOMÍNEOS EM ARMADILHAS LUMINOSAS Um total de 177 triatomíneos de 4 espécies foi coletado com armadilhas de luz (Figura 13). Rhodnius pictipes representou 68,92% (122/177) dos insetos coletados; R. robustus 12,99% (23/177); P. geniculatus 12,43% (22/177) e P. lignarius 5,65% (10/177). Nenhum exemplar de R. milesi foi capturado com armadilhas luminosas. Barcarena foi o município com maior número de exemplares coletados (n=105) enquanto nos demais locais foram coletados: 32 em Abaetetuba; 14 em Bragança; 13 em Belém, 10 em Mazagão e 3 em Ananindeua. Tabelas 14 e 15. Figura 13. Coleta de triatomíneos em armadilhas luminosas Noventa e oito triatomíneos foram coletados em sítios diferentes das palmeiras e das armadilhas de luz. Esses insetos foram trazidos por moradores sem definição do ecótopo. 15.3. EXAME DO CONTEÚDO INTESTINAL DOS TRIATOMÍNEOS A taxa de infecção geral observada por meio da pesquisa de tripanossomas no conteúdo intestinal desses triatomíneos foi de 51,81% em R. pictipes (271 positivos dos 523 examinados dos 737 coletados); 70,14% em R. robustus (47 positivos em 67 examinados dos 83 coletados); 33% em R. milesi (14 positivos em 42 examinados dos 64 coletados); 51,47% em P. geniculatus (35 positivos em 68 examinados dos 98 coletados) e 27,27% em P. lignarius (6 positivos em 22 examinados dos 40 coletados). A taxa de triatomíneos infectados por municípios foi de 53,18% em Abaetetuba (117/220); 40% em Ananindeua (6/15); 59,85% em Barcarena (164/274); 31,03% em Belém (9/29); 27,73% em Bragança (33/119)e 67,69% em Mazagão (44/65). __________________________________________________________________________________________ 66 Sebastião Aldo da Silva Valente Resultados Tabela 15. Triatomíneos capturados em diferentes ecótopos no Pará e Amapá entre os anos de 1995 e 2005 Município R. pictipes n=737 R. robustus n=83 R. milesi n=64 P. geniculatus n=98 P. lignarius n=40 Total Ar. luz Palm. Outros Ar. luz Palm. Outros Ar. luz Palm. Outros Ar. luz Palm. Outros Ar. luz Palm. Outros Abaetetuba, PA 16 180 12 11 14 4 ─ ─ ─ 3 8 8 2 5 6 269 Ananindeua, PA ─ ─ ─ ─ ─ ─ ─ ─ ─ 3 7 5 ─ ─ ─ 15 Barcarena, PA 78 239 11 12 24 7 ─ ─ ─ 9 14 19 6 13 ─ 432 Belém, PA 6 10 3 ─ ─ ─ ─ ─ ─ 5 4 5 2 6 ─ 41 Bragança, PA 14 90 12 ─ 11 ─ ─ 58 6 ─ ─ ─ ─ ─ ─ 197 Mazagão, AP 8 58 ─ ─ ─ ─ ─ ─ ─ 2 ─ ─ ─ ─ ─ 68 Total 122 577 38 23 49 11 ─ 58 6 22 39 37 10 24 6 1022 ____________________________________________________________________________________________________________________________________________ 67 Sebastião Aldo da Silva Valente Resultados Tabela 16. Taxa de infecção de triatomíneos coletados em localidades dos estados Pará e Amapá entre os anos de 1995 a 2005 R. pictipes Municípios R. robustus R. milesi P. geniculatus P. lignarius Total Cap/Exa Pos(%) Cap/Exa Pos(%) Cap/Exa Cap/Exa Cap/Exa Pos(%) Cap/Exa Pos(%) Cap/Exa Pos(%) Abaetetuba, PA 208/175 86 (49) 29/24 21(87) ─ ─ 19/13 8(61) 13/8 2(25) 269/220 117(53,18) Ananindeua, PA ─ ─ ─ ─ ─ ─ 15/15 6(40) ─ ─ 15/15 6(40) 328/205 126(61) 43/35 22(63) ─ ─ 42/25 14(56) 19/9 2(22) 432/274 164(59,85 Belém, PA 19/15 3(20) ─ ─ ─ ─ 14/9 4(44) 8/5 2(40) 41/29 9(31,03) Bragança, PA 116/65 14(21) 11/8 4(50) 64/42 14(33) 6/4 1(25) ─ ─ 197/119 33(27,73) Mazagão, AP 66/63 42(67) ─ ─ ─ ─ 2/2 2(100) ─ ─ 68/65 44(67,69) 737/523 271(51,81) 83/67 47(70,14) 64/42 14(33) 98/68 35(51,47) 40/22 6(27,27) 1022/722 373(51,66) Barcarena, PA Total ____________________________________________________________________________________________________________________________________________ 68 Sebastião Aldo da Silva Valente Resultados 16. ISOLAMENTO E CULTIVO IN VITRO 16.1. ISOLAMENTO DE TRIPANOSSOMAS EM AMOSTRAS DE PACIENTES, ANIMAIS E TRIATOMÍNEOS Foram obtidos 48 isolados de tripanossomas a partir de hemocultivo com sangue humano: 10 de Abaetetuba; 7 de Ananindeua; 1 de Barcarena; 21 de Belém, 1 de Bragança e 8 de Mazagão. A partir de amostras de mamíferos, foram obtidos 16 isolamentos, sendo 14 de Didelphis marsupialis, 1 de Philander opossum e 1 de Marmosa cinerea. A procedência desses isolados está assim distribuída: 5 a partir de mamíferos capturados em Abaetetuba, 5 em Barcarena, 2 em Ananindeua, 2 em Belém e 2 em Bragança. A partir de triatomíneos silvestres, 33 isolados foram caracterizados como T. cruzi I: 24 amostras obtidas de R. pictipes, 6 de R. robustus e 3 de P. geniculatus. A procedência desses isolados está assim distribuída: 7 de Abaetetuba, 2 de Ananindeua, 13 de Barcarena, 2 de Belém, 4 de Bragança e 5 de Mazagão 17. TIPAGEM GENOTÍPICA DAS CEPAS DE TRIPANOSSOMAS PELO MINIEXON 17.1. TIPAGEM DE ISOLADOS DE PACIENTES De 48 isolados de origem humana, 42 foram caracterizados como T. cruzi I (TcI) e 6 como pertencentes ao Z3 de T. cruzi. Apenas nos município de Ananindeua, no Pará, e no município de Mazagão, no Amapá, foram encontrados ambos os genótipos. Anexo 12. 17.2. TIPAGEM DE ISOLADOS DE ANIMAIS SILVESTRES Todos os 16 isolados de animais silvestres: 14 amostras obtidas de D. marsupialis, 1 de P. opossum e 1 de M. cinérea foram caracterizados como T. cruzi I: Anexo 13. 17.3. TIPAGEM DE ISOLADOS DE TRIATOMÍNEOS SILVESTRES Trinta e três isolados de triatomíneos silvestres: 24 amostras obtidas de R. pictipes, 6 de R. robustus e 3 de P. geniculatus foram caracterizados como T. cruzi I: Anexo 14. No município de Mazagão, no Amapá, dois isolados de R. pictipes foram caracterizados como Tc I e um como Z3. Em dois isolados ocorreu uma superposição de Tc I e Trypanosoma rangeli. Figura 14. __________________________________________________________________________________________ 69 Sebastião Aldo da Silva Valente Resultados Figura 14. Gel de Mini-exon com caracterização de isolados do surto de Mazagão. Isolados dos pacientes 1 e 2 com perfil de TcI; Isolados de pacientes 3 a 8 com perfil de Z3; Isolados de R. pictipes 9 e 10 perfis de Z3 e T. rangeli; R. pictipes 11 perfil de Z3 e R. pictipes 12 e 13 perfil de TcI. 17.4. ANÁLISE FENÉTICA POR RAPD Foi analisada a relação de similaridade dos clones circulantes em cinco surtos de doença de Chagas Aguda (Abaetetuba, Ananindeua, Barcarena, Belém e Bragança) por RAPD. Foram usados isolados representativos de humanos, mamíferos e triatomíneos dos 5 surtos. Bandas com tamanhos variando entre 300pb e 2.5Kb foram identificadas (Figura 15). Dentre os seis primers usados, o RAPD-1 e RAPD-5 foram aqueles que detectaram maior polimorfismo entre os isolados, porém outros quatro "primers" diferentes foram de utilidade para melhorar a discriminação entre os isolados (Figura 15). A variabilidade exibida pelos isolados foi independente dos genótipos dos mesmos (TC I ou Z3). Além da discriminação dos isolados pela presença ou ausência de bandas, observaram-se também diferenças na intensidade dos fragmentos, a qual foi independente da quantidade de DNA molde adicionado à reação. A análise fenética do padrão de RAPD por surto revela que os isolados provenientes de humano, mamífero e inseto são heterogêneos e rapidamente diferenciáveis entre eles pela observação do perfil de amplificação aleatória. Na análise fenética, as bandas com o mesmo peso molecular nos diferentes isolados foram consideradas como o mesmo caractere de amplificação. Os fenogramas por surtos (Figura 16) gerados a partir das matrizes de similaridade obtidos com o coeficiente de Jaccard mostraram que os três isolados apresentam valores de similaridade ao redor de 0,35 e que não é uma relação clara entre os isolados circulantes em cada surto. Em adição, a análise fenética por primer demonstrou uma extensa variabilidade entre os isolados circulando nos diferentes surtos (Figura 16). Essa heterogeneidade tampouco mostrou relação com o genótipo dos parasitos. __________________________________________________________________________________________ 70 Sebastião Aldo da Silva Valente Resultados Figura 15. Seis géis de RAPD com isolados representativos de humanos, mamíferos e triatomíneos dos 5 surtos. Bandas com tamanhos variando entre 300pb e 2.5Kb Dentre os seis “primers” usados, o RAPD-1 e RAPD-5 foram aqueles que detectaram maior polimorfismo entre os isolados. ____________________________________________________________________________________________________________________________________________ 71 Sebastião Aldo da Silva Valente Resultados Figura 16. Fenogramas por surtos gerados a partir das matrizes de similaridade obtidos com o coeficiente de Jaccard mostraram que os três isolados apresentam valores de similaridade ao redor de 0,35. __________________________________________________________________________________________ 72 Sebastião Aldo da Silva Valente Discussão 18. DISCUSSÃO O crescente aumento do número de casos agudos de doença de Chagas na Amazônia Brasileira parece indicar que essa região seria a nova fronteira e um desafio para se entender a doença e seus aspectos ecológicos e epidemiológicos. O ciclo enzoótico do T. cruzi está presente em toda a região, e a fauna triatomínica diversificada habita predominantemente em palmeiras que ocupam uma vasta área do território amazônico (BARRETT & GUERRERO al., 1991). Apesar das evidências de mudanças no comportamento dos triatomíneos silvestres como fonte primária na origem de casos agudos, aparentemente se dissocia do raciocínio epidemiológico a picada de vetores como origem da principal da via de transmissão da doença de Chagas que vem ocorrendo na região pelas surtos em episódios familiares. Nessas formas de apresentação da doença, a transmissão pelo mecanismo tradicional por contaminação por meio de contato com formas metacíclicas provenientes de fezes de triatomíneos, não é o mais freqüente na região e cabe a oportuna introdução de novas propostas, linhas de trabalho e metodologias de pesquisas no tocante à dinâmica populacional, estudo de dispersão, epidemiologia e balanço ecológico dos vetores silvestres, capazes de esclarecer essa hipótese de veiculação da doença na Amazônia Brasileira. Neste trabalho analisamos 6 surtos de DCA na região Amazônica procurando elucidar aspectos parasitológicos, sorológicos, potenciais vetores e mamíferos silvestres existentes no sítio da epidemia, assim como a tipagem molecular dos T. cruzi isolados. Quando da descrição dos primeiros casos de DCA em Belém, SHAW et al., (1969) observaram nesse surto acometimento familiar com sintomatologia clínica, exames parasitológicos e sorológicos positivos típicos de fase aguda. Esse mesmo cenário foi encontrado no estudo em Mazagão, estado do Amapá numa comunidade formada por 26 pessoas de 4 famílias entre os quais 17 apresentaram sintomas de fase aguda confirmados depois com exames parasitológicos. De maneira semelhante ao surto de Belém, ali os pacientes também não exibiram porta de entrada, não se ausentaram do município e não havia colonização de triatomíneos nos domicílios. Após investigação epidemiológica, especulou-se também a possibilidade de transmissão alimentar coletiva a partir de um alimento contaminado. Posteriormente, entre 1970 e 1980, foram reconhecidos 22 casos agudos a maioria composta por achados isolados com quadro típico de envolvimento de vetores silvestres e relatados posteriormente por vários autores no Pará, Amapá Amazonas e Acre, compilados por BARATA et al., (1988). O Pará e o Amapá apresentam a maior casuística de DCA da __________________________________________________________________________________________ 73 Sebastião Aldo da Silva Valente Discussão região, independentemente da forma de transmissão que lá ocorre, certamente, pela atuação do Instituto Evandro Chagas, pioneiro na pesquisa da doença na região. A partir de 1990, o Instituto Evandro Chagas promoveu uma mudança no direcionamento de linhas de trabalho e, como Centro de Referência Regional, insistiu na formação de mão-de-obra especializada, mantendo um serviço básico de vigilância, conseguindo detectar um grande número de casos, mudando o paradigma de região indene e expondo a emergência e peculiaridades regionais da enfermidade. Estudos sobre a doença de Chagas aguda nas áreas endêmicas identificaram que a ocorrência acontecia no verão, entre os meses agosto e dezembro, fenômeno talvez associado à atividade vetorial nas áreas de transmissão com triatomíneos domiciliados (LARANJA et al., 1956; DIAS, 1982). De maneira semelhante, na Amazônia, a freqüência de casos agudos também se concentra no mesmo período, sazonalidade de difícil explicação, considerando que não ocorre na região espécies domiciliadas. Na estação seca da Amazônia, os colonos derrubam e queimam as matas para preparar o plantio nas roças e extrativismo, o que facilitaria a dispersão de vôo de triatomíneos e sua atração pela luz das casas, fato registrados por LAINSON et al., (1979) e VALENTE et al., (1998a) no Pará e por NAIFF et al., (1998) em Manaus, AM. Apesar de a associação da via oral ser importante historicamente na casuística da região, não existem estudos conclusivos que quantifiquem essa forma de transmissão. LAINSON et al., (1980) comprovavam experimentalmente esta hipótese quando contaminaram uma variedade de alimentos com formas de cultura de T. cruzi, obtendo 100% dos camundongos infectados. No surto de Mazagão, o depoimento dos moradores das 4 famílias sobre o alimento vinculado na suspeição de transmissão está voltado para o suco de açaí, o único de consumo comum entre os infectados. É provável, entretanto, que, de alguma maneira, ocorra o envolvimento de triatomíneos e/ou reservatórios infectados no entorno das habitações humanas para que ela seja consumada. Nos surtos que acompanhamos, a hipótese de transmissão pela via oral seria a mais viável, considerando que o comportamento de triatomíneos aqui envolvidos é bem distinto da situação observada por COURA et al., (1994; 1995) em Barcelos com R. brethesi envolvido diretamente com a transmissão vetorial dos casos ali detectados. Os surtos de DCA, objetos deste trabalho no Pará, ocorreram em municípios da mesorregião do nordeste do estado (Abaetetuba e Bragança) e mesorregião Metropolitana de Belém (Ananindeua, Barcarena e Belém). No Amapá, o surto descrito ocorreu no município do Mazagão. Todos os municípios dos dois estados estão inseridos no estuário ribeirinho e recebem grande influência da região do Marajó e do nordeste do Pará, onde se concentram a __________________________________________________________________________________________ 74 Sebastião Aldo da Silva Valente Discussão casuística da doença de Chagas aguda do Pará e Amapá e as maiores produtoras de açaí da Amazônia. Essa estação também coincide com a safra do açaí, fruto nativo da área de várzea, que alcança sua máxima produção nesse período (ROGEZ, 2000). Sobre esse alimento, a discussão de seu envolvimento na transmissão da doença de Chagas é assunto muito controverso, considerando que o consumo vem de séculos, enquanto a sua relação com a possível transmissão é relativamente recente. Há de se levar em conta também que o estudo sistematizado da doença na região é bem recente, sendo prioridade outras enfermidades bem mais prevalentes na região. Para as comunidades do nordeste do Pará, por força cultural e necessidade de subsistência, principalmente em populações de baixa renda, a dificuldade na obtenção de alimentos torna o consumo eventual de caça, cada vez mais raro, pela destruição das matas e pela fiscalização dos órgãos ambientais, condicionando o consumo quase obrigatório do açaí pelo menos 2 vezes ao dia, em substituição ao tradicional arroz e feijão. O transporte dos frutos e o modo de extração da polpa para preparo do suco e sua comercialização com higiene, absolutamente precária, contribuem para a transmissão de muitas doenças, inclusive com a hipótese da doença de Chagas. Uma iniciativa importante para a mudança desse tratamento dado ao açaí foi apresentada pelo Ministério da Saúde do Brasil que, durante o encontro em que estabeleceu o Consenso Brasileiro de Doença de Chagas, propôs a criação de um programa para se estabelecerem boas práticas na produção do produto in natura (BRASIL, 2005), depois ratificada em outra reunião específica para o assunto (BRASIL, 2007). O perfil epidemiológico desse modo de transmissão foi proposto para o surto autóctone do Mazagão. Ali, numa comunidade bem fechada, o sítio enzoótico presente nas cercanias, o depoimento dos moradores e os hábitos alimentares das famílias afetadas direcionaram o raciocínio epidemiológico da transmissão para a possibilidade de ingestão do suco do açaí contaminado com formas viáveis de T. cruzi. Esse alimento consumido in natura foi o que apresentou as características mais prováveis de contaminação. Como mostrado em outra seção deste trabalho na série histórica entre os anos de 1968 e 2007 observa-se claramente não só o crescimento do número de surtos e casos, como também a sua distribuição temporal é regular na região. 18.1. DIAGNÓSTICO PARASITOLÓGICO E SOROLÓGICO Considerada indene para doença de Chagas, a Amazônia por muito tempo não teve um estudo de avaliação sistemática dos casos de doença de Chagas. Deve-se ressaltar aqui os __________________________________________________________________________________________ 75 Sebastião Aldo da Silva Valente Discussão trabalhos de alguns autores que se detiveram em analisar com mais cuidado as possibilidades de transmissão na região, entre os quais citamos os trabalhos de SHAW et al., 1969; LAINSON, et al., (1979), RODRIGUES et al., (1988); COURA et al., (1994, 1995, 1997, 2002a); (VALENTE et al., 1999b; 2006, PINTO et al., 2004) Achados esporádicos da enfermidade culminavam, quando muito, em investigações pontuais para delimitar a extensão da infecção e tratar dos casos clínicos. A casuística entre os estados da região é bem distinta, bem como as apresentações clínicas e os aspectos soroepidemiológicos que permeiam a transmissão. O Inquérito Sorológico Nacional, realizado na Amazônia Brasileira entre 1975 e 1979 por CAMARGO et al., (1984) revelou os seguintes percentuais de soro-prevalência: 0% no Amapá, 0,3% em Roraima, 0,4% em Rondônia, 0,6% no Pará, 1,9% no Amazonas e 2,4% no Acre. O diagnóstico dos casos detectados também se comporta de maneira muito diversa. No estado do Amazonas, inquéritos sorológicos realizados por COURA (1997) no município de Barcelos submetendo 886 amostras a testes de ELISA c IFI apresentaram soro prevalência inicial de 13,2% de positividade (COURA et al., 1999). Mais tarde, essas mesmas amostras submetidas a teste com antígenos mais específicos a positividade caiu pela metade, 6,8%. Esses índices sorológicos se reportaram a comunidades de habitantes ribeirinhos que trabalhavam com a extração da piaçava em cujas árvores se abrigavam colônias numerosas de R. brethesi (COURA et al., 1994, 1995, 2002a). Qualquer pesquisa sorológica realizada na Amazônia enfrentará variados graus de dificuldade logo no primeiro momento, em função de os antígenos disponíveis no mercado serem preparados a partir do extrato de cepas que não são próprias da região. GUTIERREZ et al., (2004) realizando pesquisa sorológica em 638 indivíduos em regiões da Colômbia, com transmissão ativa de doença de Chagas, e utilizando 3 testes imunoenzimáticos e o teste de imunoflourescência com frações de antígenos distintos encontraram discordância apreciável entre os métodos aplicados. Mesmo quando foi aplicado o PCR para confirmação dos positivos, essa metodologia também teve rendimento limitado. Um outro obstáculo a superar seriam os resultados falsos-positivos proporcionados por reações cruzadas com as leishmanioses, endêmicas na região (FRANK et al., 2003) e ainda os resultados inconclusivos observados em anticorpos de titulação muito baixa (UMEZAWA et al., 2004). Esses problemas foram detectados por COURA et al., (1994; 1995) nos inquéritos de Barcelos e, provavelmente, naquelas localidades, seriam casos crônicos de doença de Chagas originados de T. cruzi I caracterizado por menor morbidade e baixa parasitemia quando comparado com T. cruzi II, habitualmente encontrado em áreas endêmicas tradicionais (FERNANDES et al., __________________________________________________________________________________________ 76 Sebastião Aldo da Silva Valente Discussão 1998). Os investigadores que agora trabalham na Amazônia recomendam sempre a execução de duas técnicas de diferentes princípios e se possível utilizando antígenos a partir de cepas regionais de modo a se conseguirem resultados satisfatórios no diagnóstico sorológico. Por outro lado, os testes parasitológicos aplicados nessas populações apresentaram resultados muito baixos e praticamente não se observou sintomatologia clínica apreciável. Bem mais tarde, já em 2003, dois indivíduos foram a óbito com miocardiopatia atribuída à doença de Chagas crônica. Em 2005, mais três casos, dessa vez crônicos, foram referidos naquela região (ALBAJAR et al., 2003; Xavier et al., 2006). Estudos que reúnem casuística de fase aguda da doença de Chagas são escassos. Tomamos para efeitos comparativos a experiência venezuelana na análise de 59 casos agudos com 15,53% de casos assintomáticos e detectados em pesquisa sorológica. Enquanto isso, os testes parasitológicos para doença de Chagas apresentaram positividade para gota espessa 34%, xenodiagnóstico 61% e hemocultura 53%, (AÑEZ et al., 1999). Nossa casuística é o dobro da venezuelana e, no trabalho realizado os testes de diagnóstico parasitológicos utilizados para detecção dos 121 casos agudos apresentaram percentuais de positividade de 44,62% com gota espessa; (54/121); 91,73% com QBC® (111/121); 81% com xenodiagnósticos (98/121) e 60% com hemoculturas (73/121). A pesquisa sorológica possibilitou observar ainda que, da amostragem selecionada em 3633 pessoas das localidades em estudo, no teste de triagem HAI foram detectados 4,40% dos indivíduos (160/3633) positivos. Na pesquisa de IFI para pesquisa de IgG anti-T. cruzi, esse número caiu para 3,19% (116/3633) de positividade e 3,02% (110/3633) de indivíduos positivos para pesquisa de anticorpos IgM anti-T. cruzi. Apesar de uma concordância satisfatória entre os indivíduos com exame parasitológico e sorológicos, sobretudo entre indivíduos que apresentavam sintomatologia clínica, ocorreram casos em que indivíduos com exame parasitológico positivo tiveram pesquisa de IgM negativo, justificado talvez pela precocidade do diagnóstico parasitológico sem tempo de formação de anticorpos específicos, porém, o mais provável é que a deficiência dos antígenos disponíveis para a detecção de fase aguda seja uma realidade para o cenário amazônico. O Ministério da Saúde está preocupado e pediu ajuda da comunidade científica na reunião de especialistas na Reunião Anual de Pesquisa Aplicada em Doença de Chagas em 2007, para viabilizar a solução desse problema (RECOMENDAÇÕES, 2006). Nos exames sorológicos, atendemos as recomendações de GUTIERREZ et al., (2004) e, apesar das limitações das técnicas citadas por (FRANK et al., 2003), (UMEZAWA et al., 2004), a pesquisa de anticorpos totais por hemaglutinação foi um método importante para triagem e auxiliar de seguimento dos casos, enquanto a pesquisa de anticorpos IgM e IgG __________________________________________________________________________________________ 77 Sebastião Aldo da Silva Valente Discussão anti-T. cruzi foi de grande utilidade para confirmação de diagnóstico, principalmente naqueles pacientes com exame parasitológico negativo e doença de curso prolongado. O marcador sorológico IgG anti-T. cruzi detectado pela IFI, quando livre das reações cruzadas, apresenta maior sensibilidade na detecção de positividade em relação aos exames parasitológicos na fase crônica (LUQUETTI & CASTRO, 1997), entretanto perde na especificidade. Na fase aguda, tem pouco valor diagnóstico quando usado isoladamente, porém é muito útil para decidir o tratamento de suspeitos enquanto se aguardam técnicas parasitológicas indiretas como hemocultura e xenodiagnóstico de resultados demorados em vigência de pesquisa direta negativa. As combinações de resultados sorológicos, à luz de variados tipos de antígenos, inclusive com cepas regionais e parasitológicos, poderiam aumentar a sensibilidade na detecção de casos agudos. O que vimos nos nossos estudos mostram similaridade com aqueles obtidos na Venezuela e também com os surtos ocorridos em outras localidades como Teutônia, (COURA 1966), Catolé do Rocha (SHYKANAI-YASUDA, 1991), Navegantes (STEINDEL et al., 2008) e com os surtos regionais SHAW et al., (1969), PINTO et al., (2001; 2004). Entretanto apresenta uma significativa diferença com aqueles alcançados por COURA et al., (1994, 1995; 2002b) no Amazonas. 18.2. SEGUIMENTO DOS CASOS COM TESTES PARASITOLÓGICOS E SOROLÓGICOS Na fase aguda da doença, os trabalhos de seguimento são escassos na comprovação da eficácia terapêutica. A revisão de COURA & CASTRO (2002) aponta dificuldades como tipo de casuística, critérios de avaliação e tempo excessivamente prolongado para avaliação satisfatória e análise de dados. Preconiza-se que o seguimento de pacientes diagnosticados e tratados na fase aguda seja realizado com exames sorológicos e parasitológicos seriados e regulares com um acompanhamento a longo prazo. A cura clínica, objeto de controvérsias, seria alcançada naqueles indivíduos com testes negativos persistentes ou desaparecimento parasitológico e com títulos de declínio progressivo em pelo menos três diluições nos testes sorológicos (BRASIL, 2005). Esses princípios adotados atualmente são muito vulneráveis a diversas situações próprias das técnicas sorológicas, como sensibilidade dos testes aplicados e discordância de resultados entre indivíduos tratados (GALVÃO et al., 1993, LUQUETTI & CASTRO, 1997); sorologia positiva persistente e prolongada em pacientes cujos exames parasitológicos são constantemente negativos; sorologias negativas cujos pacientes __________________________________________________________________________________________ 78 Sebastião Aldo da Silva Valente Discussão apresentam exame parasitológico positivo (SALOMONE et al., 2003) e dificuldades inerentes à própria natureza dos antígenos utilizados nos testes sorológicos e dos diferentes estados imunitários pelos quais esses pacientes passam. Os seis surtos estudados, num total de 71 pacientes, somente um (entre os 17 pacientes do surto de Mazagão) apresentou teste parasitológico positivo. Ele teve intolerância ao benzonidazol e depois se infectou com o vírus HIV no quinto ano de avaliação do tratamento quando foi tratado novamente com nifurtimox. Os demais negativaram os exames parasitológicos como é descrito na literatura (COURA & CASTRO, 2002). Quanto à análise temporal de seguimento dos exames tanto parasitológicos, quanto sorológicos, somente os pacientes do surto do Mazagão que foram avaliados até 7 anos apresentam hoje os testes parasitológicos e sorológicos negativos. Por outro lado, os pacientes dos surtos de Abaetetuba (15), Ananindeua (14), Barcarena (6), Belém (12) e Bragança (7) que somaram 54 foram acompanhados por pouco mais de 2 anos e todos ainda exibem sorologia positiva com títulos entre 1:40 e 1/160. Nesse ínterim, a sua avaliação clínica não justificou o novo tratamento de nenhum dos pacientes e espera-se que, no final de sete anos de acompanhamento, eles possam alcançar a cura. Não há uma explicação razoável que justifique a presença persistente e prolongada dos anticorpos IgG anti-T. cruzi pós tratamento da fase aguda. ANDRADE et al., (1988) observaram que células dendríticas do baço de camundongos mantinham-se infectadas muitos tempo após a cura. Supõe-se também que anticorpos, quando frente a açúcares como o galactosil, estimulam a formação de proteínas com epítopos comuns com os antígenos e contribuem de maneira expressiva para a freqüente ocorrência de reações cruzadas nos testes sorológicos, sobretudo aqueles que utilizam antígenos totais (GALVÃO et al., 1993). A persistência ou não dos anticorpos IgG não garante a cura nem exclui o paciente de um acompanhamento mais prolongado. Em adição, tem-se que se ter em mente que a presença de IgG positiva em indivíduos tratado significa que, a rigor, a doença não se curou. 18.3. COLETA E CARACTERIZAÇÃO DE ANIMAIS SILVESTRES Pelo menos 110 espécies de mamíferos de sete ordens (Arthiodactyla, Carnívora, Chiroptera Didelphiamorphia, Primata, Rodentia e Xenarthra) são reservatórios do T. cruzi, atuando num ciclo silvestre amplamente distribuído em ecótopos representados por buracos no chão e em pedras, ocos de árvores, bromélias e copas de palmeiras em matas primárias e secundárias, altiplanos andinos e charcos, serradas, campos abertos, caatingas, floresta __________________________________________________________________________________________ 79 Sebastião Aldo da Silva Valente Discussão Amazônica e Atlântica da América do Sul, Central e do Norte (MILES et al., 2003). O ciclo enzoótico do T. cruzi foi referido já nos estudos iniciais da doença por CHAGAS, (1924a,b) quando identificou tripanossomas em macacos Chrysothrix sciureus no Estado do Pará. Posteriormente os trabalhos de DEANE et al., (1961b, 1964b, 1964c, 1967) e já nos idos de 1970 MILES et al., (1981a,b), PÓVOA et al., (1984) contribuíram com informações importantes sobre a fauna de mamíferos envolvidos na enzootia. Na Amazônia Brasileira, o ciclo do T. cruzi é predominantemente silvestre (MILES et al., 1978, 1981, 1983, 2003, VALENTE et al., 1999b; COURA 2000, COURA et al., 2002a; DIAS et al., 2002a), com achados eventuais de mamíferos domésticos (porcos), na região do Marajó, e silvestres (marsupiais), em praticamente toda a região, alguns infectados e encontrados muitas vezes no domicílio ou no entorno das habitações humanas (VALENTE et al., 1998a; LUITGARDS-MOURA et al., 2005). O conceito de transmissão oral da doença de Chagas está intimamente relacionado ao ambiente enzoótico natural e primário do T. cruzi (COURA, 1997). Nesse ciclo, triatomíneos e mamíferos silvestres partilham ecótopos naturais, cujo sangue constitui sua fonte alimentar. Considerando que os mamíferos reservatórios de T. cruzi (marsupiais, edentados e roedores) são também insetívoros, eles eventualmente, se alimentam de triatomíneos naturalmente infectados e acredita-se que assim se mantenha o ciclo do parasito em natureza, por via digestiva. A contaminação via formas tripomastigostas metacícilicas presentes nas fezes estaria dificultada pela espessura e pelagem do tegumento dos animais. Outra forma de transmissão seria a eliminação pelas glândulas anais de didelfídeos das formas infectantes do T. cruzi (DEANE et al., 1984; LENZI 1984; NAIFF et al., 1987; JANSEN et al., 1999). Essas alternativas de contaminação pelo T. cruzi poderiam de alguma maneira estar associadas com os surtos de doença de Chagas que vêm ocorrendo no Brasil, tanto nas áreas rurais, como agora também em áreas urbanas, por ingestão de alimentos contaminados com excretas de triatomíneos e/ou de animais infectados (MILES et al., 2003; SHIKANAI-YASUDA et al., 1991; VALENTE et al., 1999a, 2006; STEINDEL et al., 2008). A fauna de mamíferos capturadas nas investigações dos surtos de DCA nesta tese, reuniu a captura de 145 espécimes: 75 exemplares de D. marsupialis, 34 de P. opossum, 21 de M. cinerea, 2 M. murina e 13 de P. guyanensis. A taxa de infecção alcançada é elevada com os diferentes exames aplicados com média de 68,96% (100/145) para o teste parasitológico QBC® que se mostrou o mais sensível e coincide com dados de LAINSON et al., (1979) e MILES et al., (1981b) no Pará e bem superior aos evidenciados em piaçabais localizados na margem esquerda do Rio Negro. COURA et al., (2002a) consideram que a baixa parasitemia poderia se dever aos limitadores faunísticos naturais daquela região representados __________________________________________________________________________________________ 80 Sebastião Aldo da Silva Valente Discussão provavelmente pela grande extensão entre as margens dos rios, verdadeiras barreiras hidrográficas, influindo na distribuição e dispersão de mamíferos (WALLACE, 1979) tanto no Rio Amazonas, como nos seus afluentes como no Rio Negro (AVILA-PIRES 1964). É possível que dezenas de espécies de mamíferos deixassem de ser capturadas em virtude do tamanho de nossas armadilhas e que tenhamos selecionado animais de pequeno porte. Acrescenta-se a esse fato a predominância de área de várzea inundável nos sítios de coleta que impossibilitava o acesso da equipe aos possíveis abrigos de animais maiores. No levantamento realizado por SILVA et al., (2001), na Amazônia Brasileira, pelo menos 311 espécies de mamíferos de dez ordens foram descritas, entretanto o conhecimento detalhado da diversidade de mamíferos em regiões da Amazônia Brasileira que atuam com reservatórios da doença de Chagas é escasso. A coleta dos mamíferos neste estudo, em matas secundárias e de capoeira, aponta para o homem invadindo esses sítios para morar ou explorar os recursos extrativistas, expondo-se à contaminação acidental pelo T. cruzi (LAINSON et al., 1979; MILES et al., 1981a,b, TEIXEIRA et., al 2001). Nossos resultados revelaram que 51,72% (75/145) dos animais coletados apresentaram elevada taxa de infecção para T. cruzi como P. opossum e D. marsupilais que se abrigam revelando taxas respectivas de 70,58% (24/34) e 69,33% (52/75). Esses animais se movimentam entre o ambiente silvestre e o peridomicílio em busca de alimento e de alguma forma pode participar dos processos de contaminação. Há de se considerar também que muitas comunidades ribeirinhas consomem esses mamíferos, abrindo assim opções de transmissão do T. cruzi com possíveis casos agudos como ocorre no Pará e Amapá, sem depender da colonização domiciliar dos vetores (VALENTE et al., 2006). Um estudo mais detalhado sobre a manutenção dos ciclos e a dinâmica de transmissão destes tripanossomas entre mamíferos silvestres e triatomíneos na região já realizados pontualmente por diversos autores (MILES et al., 1983; COURA 2000; MARCILI et al., 2003; FERNANDES et al., 2001; MAIA DA SILVA et al., 2004) deveriam ser encorajados na região. 18.4. COLETA E CARACTERIZAÇÃO DE TRIATOMÍNEOS SILVESTRES Além dos mamíferos silvestres, uma fauna de triatomíneos composta por vinte e uma espécies foi levantada por GALVÃO et al., (2003) na Amazônia Brasileira, distribuídas em vários ecótopos. As espécies mais numerosas, as do gênero Rhodnius, apresentam a distribuição geográfica relacionadas diretamente com a dispersão das diferentes espécies de palmeiras, seus abrigos preferenciais. Com algumas exceções de habitats seletivos, no caso da __________________________________________________________________________________________ 81 Sebastião Aldo da Silva Valente Discussão espécie de R. brethesi que se abriga seletivamente em palmeira de piaçava, outros triatomíneos como R. prolixus são versáteis e infestam palmeiras como Cocus nucífera, Oenocarpus bataua, Atallea butyracea e Atallea elegas na América do Sul e Central (GAUNT & MILES, 2000; ABAD-FRANCH et al., 2004). Comportamento semelhante apresentam R. robustus e R. pictipes, como comprovamos em nosso trabalhos. Abrigam-se na Amazônia em palmeiras comuns como de urucuri, inajá, dendê, bacaba e babaçus. Nesta tese os triatomíneos foram capturados em diversos sítios onde ocorreram DCA: R. pictipes; R. robustus; R. milesi; P. geniculatus e P. lignarius com diferentes taxas de infecção por T. cruzi, sendo o principal ecótopo de coleta as palmeiras que possuem importância na economia regional e na sobrevivência dos ribeirinhos, pois suas palmas servem de cobertura para residências, as fibras de matéria-prima para a confecção de utensílios como cestas, peneiras, esteiras e chapéus, enquanto os frutos e seus derivados são consumidos tanto pelas comunidades, como pelos animais domésticos. Diante dessa importância, a coleta dos triatomíneos em palmeiras foi realizada, sobretudo com as armadilhas de fita adesiva descrita por NOIREAU et al., (1999), e um número restrito de árvores foi selecionado para dissecação. A proximidade dessas palmeiras das residências é um fato preocupante, considerando que a infestação de triatomíneos foi significativa, com uma média de 9,7 triatomíneos coletados por palmeira. Quando comparados com os estudos já realizados na região, podemos observar semelhança de resultados com relação às espécies de R. robustus, R. pictipes e P. lignarius (LAINSON et al., 1979; MILES et al., 1981a,b,. Por outro lado, P. geniculatus foi a espécie, que em nossos trabalhos, foi coletado predominantemente em palmeira e em armadilhas de luz. Essa espécie apresenta a maior dispersão geográfica nas Américas do Sul e Central, habitando regiões distintas e, mesmo formando colônias pequenas, já foi referida em abrigos de porcos no Marajó, Pará (VALENTE et al., 1998a) e encontrado de ninfas na estrada Barcelos–Caurés periferia de Barcelos (comunicação pessoal) em assentamentos agrícolas e um variado elenco de ecótopos naturais, ora vivendo em buracos no chão com tatus, ora em palmeiras e também invadindo e colonizando o peridomicílio (RYCKMAN, 1986; GAUNT & MILES, 2000; CARRASCO et al., 2005). Nas regiões trabalhadas não coletamos nenhum exemplar de R. brethesi, espécie de importância em Barcelos no estado do Amazonas que se abriga em palmeiras de piaçava e ataca os trabalhadores que exploram a fibra dessa palmeira (COURA et al., 1994, 1995, 2002a; MASCARENHAS et al., 1991). Outra fonte de captura foram as armadilhas luminosas colocadas próximo das residências, sendo o rendimento dessa metodologia muito comprometido pelo seu furto. Todavia serviu como um parâmetro importante para verificar que insetos adultos infectados, __________________________________________________________________________________________ 82 Sebastião Aldo da Silva Valente Discussão principalmente no verão, voam para dentro das casas atraídos pela luz e famintos à procura de fonte alimentar. Eles podem contribuir para ocorrência de casos isolados ou cair em utensílios domésticos e contaminar alimentos, originando surtos descritos na região, (PINTO et al., 2004; VALENTE et al., 1999b, 2006). Com a divulgação dos trabalhos e instalação de postos de informações de triatomíneos nas localidades, 98 exemplares de 4 espécies de triatomíneos foram entregues e/ou coletados pelos moradores em sítios diferentes das palmeiras e armadilhas de luz, indicando a eficiência do trabalho de vigilância epidemiológica comunitária. Em todos os métodos de coleta, a taxa de infecção por tripanossomas no conteúdo intestinal desses triatomíneos foi elevada e em conformidade com os trabalhos já referidos na região (LAINSON et al., 1979; MILES 1981a,b, 1983; COURA et al., 2002a), corroborando para a presença do ciclo do T. cruzi como importante fonte primária de infecção para a ocorrência de casos agudos na região, independente da maneira de transmissão. A coleta considerável de triatomíneos às proximidades dos domicílios, a elevada taxa de infecção por T. cruzi nos incentivam a especular sobre a sua importância que, mesmo sem domiciliação, participariam da transmissão da doença por meio dos surtos que vêm crescendo na região. Para essa forma de apresentação da transmissão da doença, parece caber a oportuna introdução de novas propostas, linhas de trabalho e metodologias de pesquisas no tocante à dinâmica populacional, estudo de dispersão, epidemiologia e balanço ecológico dos vetores silvestres, à luz da nova situação ecológica em que se encontra a Amazônia Brasileira. O plano de trabalho para a doença de Chagas na Amazônia recomendou em encontros recentes (ROJAS et al., 2005) que seja realizada uma atualização na lista de mamíferos passíveis de infecção pelo T. cruzi. É proposta a adoção de estudos multidisciplinares e de parcerias com grupos que atuem em sistemática e ecologia de mamíferos utilizando metodologias básicas de exames parasitológicos e/ou moleculares, quando possíveis, com atenção especial para marsupiais e roedores pelas suas características sinantrópicas e ambivalentes. 18.5. A VARIABILIDADE E A DIVERSIDADE GENÉTICA DO T. CRUZI A população de T. cruzi é extremamente heterogênea e formada por um grandes número de cepas oriundas do ciclo enzoótico (milhares de reservatórios mamíferos e de uma centena de triatomíneos) e do ciclo domiciliar que inclui o homem. Quando analisadas à luz de diferentes marcadores, essas cepas apresentaram perfis distintos e apontam para a presença de uma população com características biológicas, virulência, imunológicas, bioquímicas, __________________________________________________________________________________________ 83 Sebastião Aldo da Silva Valente Discussão farmacológicas, formas clínicas e distribuição epidemiológica muito distinta (BRENER & GAZZINELLI, 1997; FERNANDES et al., 1998; MILES et al., 2003). MILES et al., (1977, 1981a,b, 1983) identificaram três padrões isoenzimáticos de T. cruzi que foram agrupados como zimodemas: Z1, Z2 e Z3. O Z2 estava ligado ao ciclo domiciliar infectando animais domésticos, à doença de Chagas aguda e à cardiopatia chagásica crônica, enquanto Z1 e Z3 relacionavam-se ao ciclo silvestre. Os mesmos autores observaram que eventualmente Z1 e Z3 também poderiam infectar homem no Estado do Pará, mas nenhum isolado do tipo Z2 humano autóctone foi descrito na região Norte. STEINDEL et al., (1995) caracterizaram isolados de triatomíneos e animais silvestres cuja maioria, 92%, apresentou perfil de Z1 próprio do ciclo silvestre do T. cruzi, mas um pequeno número de isolados apresentaram perfis duplos de Z1+Z2. Embora o estado de Santa Catarina tenha ocorrência muito rara de doença de Chagas, o tipo Z2 representaria uma oportunidade de domiciliação, ainda que remota. Mais tarde, utilizando os marcadores de mini-exon, gene ribossômico e RAPD, SOUTO et al., (1996), FERNANDES et al., (1998) e ZINGALES et al., (1998) ratificaram os achados isoenzimáticos; num encontro (RECOMENDAÇÕES, 1999), aprovou-se uma nova denominação para dois grupos principais de T. cruzi: Z1 seria Tc I e Z2 seria Tc II. Mantevese a denominação de Z3. Utilizando o gene de mini-exon, pela primeira vez foi analisado o perfil genotípico de um número considerável de isolados relacionados à transmissão de surtos de doença de Chagas ocorridos em cinco surtos do Pará e um do Amapá envolvendo o trinômio humanos/mamíferos silvestres/triatomíneos silvestres. Os resultados da tipagem revelaram entre os 48 isolados de origem humana, 42 tiveram o perfil de Tc I e 6 como perfil de Z3 de T. cruzi. Apenas nos municípios de Ananindeua, no Pará, e no município de Mazagão, no Amapá, foram encontrados ambos os genótipos Tc I e Z3 num mesmo surto. Os isolados dos mamíferos silvestres (14 D. marsupialis, 1 P. opossum e 1 de M. cinerea) revelaram que todos exibiam o perfil de Tc I. Para os 33 isolados de triatomíneos silvestres, 31 foram caracterizados como Tc I (24 amostras obtidas de R. pictipes, 6 de R. robustus e 3 de P. geniculatus) e 2 apresentaram superposição de perfis de Tc I e T. rangeli. Tentativas da utilização dos marcadores para fornecer subsídios e uma melhor compreensão de epidemiologia foram propostas por Miles et al., (1977) em três áreas geográficas distintas de transmissão da doença de Chagas. Foram caracterizadas mais de 300 amostras de T. cruzi oriundas da Venezuela, região de não-ocorrência de formas clínicas de mega-síndromes; da região Amazônica onde a ocorrência da doença de Chagas é ocasional e do Centro Oeste e Sudeste do Brasil, reconhecidas áreas endêmicas com predominância de __________________________________________________________________________________________ 84 Sebastião Aldo da Silva Valente Discussão manifestações clínicas das mega-síndromes. Pelos resultados obtidos, observou-se que na Venezuela e na Amazônia Brasileira os zimodemas predominantes foram o Z1 e Z3, como observamos em nossos resultados, enquanto nas regiões Centro Oeste e Sudeste do Brasil o zimodema predominante foi o Z2 associado diretamente com as formas clínicas variadas e exibidas no curso da doença de Chagas, ainda não presentes na Amazônia Brasileira. A variabilidade apresentada nos nossos estudos, caracterizando-se os isolados pelo gene de mini-exon, mostrou claramente a presença, como esperada, de dois genótipos de T. cruzi: Tc I e Z3 e T. rangeli. Entre os surtos estudadas, a do Mazagão envolveu 17 pessoas de três das quatro famílias que habitavam uma comunidade bastante fechada e reclusa no Rio Bispo composta por 26 pessoas. Foi possível caracterizar genótipos de T. cruzi isolados de oito pacientes e de cinco triatomíneos. O emprego do gene de mini-exon (FERNANDES et al.,, 1998) revelou que as infecções nos pacientes se deu pelos genótipos T. cruzi Z3 em duas famílias e genótipos mistos de Z3 e Tc I na terceira família. Entre os triatomíneos, os isolados foram identificados como Tc I, Z3 e amostras mistas de Z3 com T. rangeli. O encontro de infecções mistas nesse tipo de transmissão foi observado por STEINDEL et al., (2008) na microepidemia de Santa Catarina. Quando isolados de T. cruzi do homem, apresentaram perfil típico de Tc II, enquanto os isolados de animais silvestres apresentaram perfis de Tc I e dos triatomíneos perfis mistos de Tc I e Tc II. No surto de Ananindeua, município da área metropolitana de Belém, em uma das comunidades onde ocorreu o surto com uma população de mais de três mil pessoas, foram detectados entre os isolados de humanos genótipos de Tc I e Z3. Nos demais surtos em Abaetetuba, Barcarena, Belém e Bragança o mini-exon não revelou variabilidade. A variabilidade e a associação entre genótipos como Z1 e Z3 no ciclo silvestre de isolados de humanos e mamíferos e/ou triatomíneos silvestres que verificamos nos surtos do Pará e Amapá já foram referidas também por vários autores na América do Sul. Na Guiana Francesa e Chile, DEDET et al., (1985) e APT et al., (1987) encontraram Z1 no ambiente silvestre. Na Colômbia WIDMER et al., (1985) referiram somente Z1 tanto no ciclo silvestre, como no homem. Os autores deduziram que o ciclo domiciliar não era exclusivo com cepas caracterizadas como Z2 fora das regiões endêmicas. Análise de isolados de T. cruzi na Colômbia, entre hospedeiros em bases eco-geográficas distintas, foram tipados como Z1 que circulava, tanto no ciclo domiciliar, quanto no ciclo silvestre, por outro lado Z3 era exclusivo de T. cruzi do ciclo silvestre SARAVIA et al., (1987). Resultados semelhantes foram observados na Argentina por MONTAMAT et al., (1992) que interpretaram não haver uma __________________________________________________________________________________________ 85 Sebastião Aldo da Silva Valente Discussão correlação fechada para perfis isoenzimáticos em áreas onde os ciclos silvestres e domésticos se sobrepunham com transmissão ativa. Ainda estudando um grupo de 14 isolados colombianos de diferentes procedências, CUERVO et al., (2002), utilizando um PCR multiplex com gene de mini-exon como alvo (FERNANDES et al., 2001), observaram que um grupo de 10 amostras apresentavam perfil de T. cruzi I, duas com perfil de Z3 e duas como T. rangeli. Essas mesmas amostras, quando submetidas a outros marcadores relacionados ao gene ribossômico (CUPOLILLO et al., 1995, FERNANDES et al., 1999a) apontaram que os isolados identificados pelo mini-exon como um único grupo de TCI derivavam para dois subgrupos, enquanto Z3 permanecia como um grupo separado e T. rangeli permanecia inalterado. A caracterização de populações de T. cruzi de pacientes do surto de DCA em Santa Catarina mostrou que os 9 isolados de humanos apresentaram perfil Tc II, enquanto as duas amostras isoladas de T. tibiamaculata apresentaram perfil misto Tc I e Tc II e duas amostras isoladas de didelfídeos foram Tc I (STEINDEL et al., 2008). É possível que haja um relacionamento entre origem geográfica de isolados de T. cruzi e seus hospedeiros, como o Z3 oriundo da mesma região de floresta tropical, (Tumaco, Colômbia Sudoeste), porém de hospedeiros mamíferos distintos. Esse achado indica a existência de ciclos independentes envolvendo hospedeiros específicos dentro do mesmo ecótopo (FERNANDES et al., 1999b) e pode justificar a presença de genótipos diferentes entre os isolados de humano no surto de Ananindeua, no Pará, e entre humanos e triatomíneos silvestres no surto de Mazagão, no Amapá. A heterogeneidade dos isolados de T. cruzi que observamos em nossos estudos provavelmente relaciona-se também à sua biogeografia e à capacidade dos hospedeiros (vertebrados e triatomíneos) em selecionar cepas ou clones que podem predominar dentro de um ciclo ou de vários subciclos silvestres, substituindo populações originais por outras com perfis distintos (D'ALESSANDRO et al., 1984, Travi et al., 1994), porém circulando somente no ambiente silvestre. 18.6. ESTUDO DA VARIABILIDADE DE ISOLADOS DE SURTOS DO PARÁ E AMAPÁ PELO MARCADOR DE RAPD (RANDOM AMPLIFICATION OF POLYMORPHIC DNA) DNA amplificado com iniciadores de seqüências aleatórias (RAPD) permitiu identificar o polimorfismo existente entre isolados. Quando observamos a variabilidade dos isolados analisados pelo gene de mini-exon, foi possível visualizar genótipos distintos entre __________________________________________________________________________________________ 86 Sebastião Aldo da Silva Valente Discussão isolados humanos de Ananindeua, no Pará (Tc1 e Z3) em Mazagão, no Amapá, entre isolados de humanos (Tc1 e Z3) e entre triatomíneos (Tc1 e T. rangeli). Entretanto, nos demais surtos, todos os isolados foram tipados como Tc1. Esses isolados foram então analisados pelo RAPD, gerando perfis complexos que poderiam ser usados para tirar conclusões de proximidade genética. A análise da relação de similaridade dos clones circulantes em cinco surtos de doença de Chagas aguda (Abaetetuba, Ananindeua, Barcarena, Belém e Bragança) por RAPD, representados por isolados de humanos, mamíferos e triatomíneos gerou bandas com tamanhos variando entre 300pb e 2.5Kb. Dentre os seis primers usados, o RAPD-1 e RAPD-5 detectaram acentuado grau de polimorfismo entre os isolados caracterizados inicialmente como Tc I pelo mini-exon. A estrutura genômica de isolados de T. cruzi, quando analisada por RAPD, mostrou níveis altos de semelhança entre linhagens do mesmo zimodema como o Z1, sugerindo que este parece ser um grupo geneticamente bem definido. Porém o polimorfismo genético encontrado por perfis de RAPD é pouco reprodutível, podendo ser utilizado para identificação intragrupo (TIBAYRENC et al., 1993; STEINDEL et al., 1993). A variabilidade exibida pelos isolados entre os surtos no Pará não dependeu da sua origem genotípica (TC I ou Z3). Além da discriminação dos isolados pela presença ou ausência de bandas, observou-se também diferenças na intensidade dos fragmentos, sem dependência da quantidade de DNA, molde adicionado à reação. A análise fenética do padrão de RAPD por surto revela que os isolados provenientes de humano, mamífero e inseto são heterogêneos e rapidamente diferenciáveis entre eles pela observação do perfil de amplificação aleatória. Na análise fenética, as bandas com o mesmo peso molecular nos diferentes isolados, foram consideradas como sendo o mesmo caractere de amplificação. As análises dos fenogramas por surtos gerados a partir das matrizes de similaridade e obtidos com o coeficiente de Jaccard mostraram que os três isolados apresentam valores de similaridade ao redor de 0,35 e que não é uma relação clara entre os isolados circulantes em cada surto. Em adição, a análise fenética por primer demonstrou uma extensa variabilidade entre os isolados que circulam nos diferentes surtos. Essa heterogeneidade tampouco mostrou relação com o genótipo dos parasitos. O extenso conhecimento que se tem do parasita foram obtidos da caracterização de isolados procedentes das áreas tradicionalmente endêmicas. Analisar um maior número de cepas amazônicas (Tc1 e Z3) poderia fornecer informações que talvez permitisse entender seu comportamento nos numerosos surtos de doença de Chagas que vêm ocorrendo na região, que __________________________________________________________________________________________ 87 Sebastião Aldo da Silva Valente Discussão se espressam clinicamente desde casos oligo e poli sintomático até quadros brandos a severos de DCA (PINTO et al., 2004). Um minucioso estudo da diversidade genética, utilizando os atuais marcadores moleculares disponíveis, com as amostras de T. cruzi que tivemos oportunidade de analisar reforça a tese de como são complexos os intrincados aspectos epidemiológicos que afetam o homem quando ele perturba o ciclo enzoótico do T. cruzi. Uma preocupação adicional que cerca a doença seria a introdução do genótipo Tc II, ainda não referido na Amazônia. A reprodução de espécies ameaçadas de extinção em cativeiro e depois reintrodução no seu ambiente original poderiam mudar de maneira significativa os ciclos epidemiológicos da doença de Chagas, transportando geograficamente ciclos de um lugar para o outro com implicações na transmissão da doença. Esse fato foi observado quando 198 primatas, entre animais introduzidos no Centro de Primatologia do Rio de Janeiro, e de outros ali nascidos, apresentaram testes sorológicos positivos para antocorpos anti-T. cruzi. Detectou-se também que 4 amostras de micos-leão-dourado (Leontopithecus) apresentaram genótipos ompatíveis com o T. cruzi II, (LISBOA et al., 2004). A sensível melhora das notificações, a casuística dos surtos no Pará, Amapá e Amazonas nos 5 últimos anos proporcionou a detecção em torno de 60 casos agudos por ano. Não obstante, a rota epidemiológica daqueles surtos sugerirem a ingestão de alimentos contaminados com formas de T. cruzi, sendo o suco de açaí o principal suspeito, em nenhum dos surtos até então investigados, foi possível a demonstração direta do flagelado no suco ingerido. É provável que a ingestão ocorrera em período bem anterior às investigações. Entretanto, estudos de caso-controle feitos pela SVS/IEC em Abaetetuba, Cachoeira do Arari e Barcarena e pela SVS e Secretaria de Saúde do Amazonas em Coari, concluem pelo envolvimento do açaí na transmissão desses surtos, dados discutidos em 2007 em Reunião de Especialistas em Uberaba, quando se considerou que esse tipo de contaminação na Amazônia guarda uma relação muito semelhante com os episódios envolvendo o caldo de cana na transmissão do surto no Estado de Santa Catarina (STEINDEL et al., 2008). Nos surtos que apresentamos foi caracterizada a autoctonia de todos os pacientes envolvidos, porque nenhum deles ausentara-se do estado para regiões endêmicas nem tinham sido submetidos a transfusões de sangue nos últimos 2 anos. Nenhuns dos pacientes que acompanhamos apresentavam porta de entrada. Os casos foram caracterizados como agudos, apoiados nos exames parasitológicos e marcadores de IgM positivos na maioria dos casos, além de sintomatologia típica de fase aguda. No seguimento pelo tempo mínimo de 2 anos de evolução do tratamento, foi de bom prognóstico com reversão parasitológica e recuo dos títulos sorológicos, mas sem assegurar que os pacientes estejam realmente curados. __________________________________________________________________________________________ 88 Sebastião Aldo da Silva Valente Discussão Nos estudos com mamíferos concluiumos que esses participam ativamente na manutenção do ciclo epizoótico do T. cruzi. Quanto à participação dos triatomíneos, as pesquisas entomológicas realizadas nas áreas de ocorrência dos surtos não se detectou colonização de triatomíneos de nenhuma espécie nos domicílios dos pacientes, mas registrou a presença constante em ciclos silvestres e em ecótopos muito próximo do domicílio humano. A variabilidade dos genótipos indica heterogeneidade tanto entre os principais grupos identificados pelo gene de mini-exon (Tc1, Z3 e T. rangeli), como dentro dos grupos visualizadas pelo RAPD. Os surtos estudados têm uma característica comum, e o melhor investigado, o de Mazagão, teve diagnóstico, tratamento dos pacientes e investigação epidemiológica rápidas. O isolamento e modo de vida dos pacientes facilitaram a formulação da hipótese de transmissão pela via oral, baseando-se nas argumentações: i) ausência de vetores colonizando os domicílios, mas presentes nas cercanias e diariamente coletados quando se utilizaram armadilhas luminosas; ii) os casos ocorrendo de forma simultânea e coletiva com as famílias partilhando de um alimento não-cozido comum, o açaí, que preparado em condições precárias de higiene nos induz a associá-lo com a transmissão; iii) os resultados obtidos nos estudos parasitológicos e sorológicos, na captura de animais e no levantamento triatomínico e a genotipagem dos isolados ajudaram na sustentação da hipótese. __________________________________________________________________________________________ 89 Sebastião Aldo da Silva Valente Conclusões 19. CONCLUSÕES Os estudos sistemáticos dos surtos de doença de Chagas aguda na região Amazônica nos levaram às seguintes conclusões: • Os pacientes detectados nos surtos foram todos parasitologicamente positivos em pelo menos um dos testes aplicados. • Exames de concentração em capilares como o QBC®, apresentaram maior positividade para a pesquisa de tripanossomas do que a gota espessa e xenodiagnóstico. • A sorologia foi difícil de ser interpretada, pois entre os 121 casos parasitologicamente positivos 16 pacientes apresentaram sorologia negativa e a positividade de IgM não foi um bom marcador de doença de Chagas aguda. É possível que com a precocidade do diagnóstico não tenha havido tempo suficiente para a formação de anticorpos específicos. A impossibilidade de se ter um antígeno obtido a partir de cepas regionais também pode ter contribuído para a ocorrência desse fenômeno. • A discordância entre a IFI e a hemaglutinação foi pequena, mas ocorreram em 3 casos dos 121 estudados. • Depois de tratados os pacientes apresentaram desaparecimento da parasitemia patente. • A evolução para cura foi observada por diminuição dos títulos da sorologia com perspectiva de efetiva negativação após sete anos nos pacientes do surto de Mazagão. Nos demais surtos uma avaliação, por tempo mais prolongado, se faz necessária. • Mamíferos silvestres infectados estavam presentes em todos os sítios mantendo a enzootia. O principal mamífero foi D. marsupialis com 69,33% (52/75) de infecção para T. cruzi. • Triatomíneos infectados estavam presentes em todos os focos e as espécie como R. pictipes, R. pictipes e P. geniculatus foram encontrados em sítios muito próximos do domicílio humanos e podem ser incriminados na transmissão. • Um dos surtos observado em Mazagão (AP) teve um importante agrupamento familiar todos febris com suspeita inicial de malária e com pesquisa de plasmódio negativa depois foram confirmados como positivos para doença de Chagas. • Nesse surto do Amapá foi proposta a hipótese de transmissão por um meio de contaminação comum como a via oral e o suco de açaí foi o único alimento encontrado associado a este grupo. • A tipagem de mini-exon mostrou a existência de TC I e TC Z3. T. rangeli também foi evidenciado na região. • A tipagem de RAPD gerou uma diversidade tão grande que não foi possível chegar a qualquer conclusão exceto a diversidade existente. __________________________________________________________________________________________ 90 Sebastião Aldo da Silva Valente Referências 20. REFERÊNCIAS ABAD.; FRANCH, F.; PALOMEQUE, F. S.; AGUILAR, M.; MILES, M. A. The ecology of palm tree-living Rhodnius populations: a methodological proposal for the characterisation of `risk ecotopes`. In: Memorias Eclat-Amcha International Workshop On Chagas Disease Surveillance In The Amazon Region. 2002, Reserva Natural Palmarí, Rio Javari, Amazonas. Artigo. Bogotá, Colombia: CIMPAT, Universidad de los Andes, p. 6474, 2004. AGABIAN, N. Trans splicing of nuclear pre-mRNAs. The Cell, v. 61, n. 7, p. 1157-1160, 1990. AGUILAR, M.; YÉPEZ, R. Evolución epidemiológica de la enfermedad de Chagas en el Ecuador. 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Submissão do Projeto de estudos ao Comitê de Ética em Pesquisas do Instituto Evandro Chagas __________________________________________________________________________________________ 112 Sebastião Aldo da Silva Valente Anexos Anexo 2. Ficha Epidemiológica Aplicada nos estudos com a população humana __________________________________________________________________________________________ 113 Sebastião Aldo da Silva Valente Anexos Anexo 3. Termo de Consentimento Livre e Esclarecido Protocolo de Pesquisa: ESTUDO DA DIVERSIDADE GENÉTICA DAS AMOSTRAS DE TRYPANOSOMA CRUZI ISOLADOS NOS SURTOS DE DOENÇA DE CHAGAS OCORRIDAS NO PARÁ E AMAPA Você está sendo convidado(a) a participar do projeto de pesquisa acima citado. O documento abaixo contém todas as informações necessárias sobre a pesquisa que estamos fazendo. Sua colaboração neste estudo será de muita importância para nós, mas se desistir a qualquer momento, isso não causará nenhum prejuízo a você. Eu, (nome e profissão) ............................................................................................................ residente e domiciliado na ....................................................................................................................................................., RG .................................................. , e inscrito no CPF/MF ........................................................ nascido(a) em _____ / _____ /_______ , abaixo assinado(a), concordo de livre e espontânea vontade em participar como voluntário(a) do projeto ESTUDO DA DIVERSIDADE GENÉTICA DAS AMOSTRAS DE TRYPANOSOMA CRUZI ISOLADOS NOS SURTOS DE DOENÇA DE CHAGAS OCORRIDAS NO PARÁ E AMAPA Declaro que obtive todas as informações necessárias, bem como todos os eventuais esclarecimentos quanto às dúvidas por mim apresentadas. 4.1. Objetivo geral Estudar os surtos de doença de Chagas ocorridas no Pará e Amapá entre 1992 e 2002 através de ferramentas epidemiológicas, imunoparasitológicas e moleculares; 4.2. Objetivos específicos • • • • • Definir as histórias epidemiológicas dos surtos de doença de Chagas ocorridas no Pará e Amapá no período proposto com a perspectiva de se buscar fatores de risco de transmissão, a partir do estudo de casos índices; Avaliar a soro-prevalência dos contatos intradomiciliares dos casos índices e dos vizinhos da comunidade; Estudar a fauna triatomínea presente nas comunidades aonde ocorreram os surtos; Identificar potenciais reservatórios do T. cruzi através de capturas por armadilhas e isolamento dos parasitos a partir de hemoculturas e/ou xenodiagnóstico; Estudar a diversidade genética (Tipagem pelo gene de mini-exon e por RAPD) do parasito circulante nos diversos surtos, isolado a partir de casos humanos e triatomíneos e reservatórios infectados com tripanossomas, avaliar sua associação, interdependência e extensão de diversidade entre os isolados e verificar se há alguma predominância entre cepas oriundas do ciclo silvestre envolvidas nos surtos; Você está sendo convidado a participar deste estudo, pois faz parte de comunidades onde ocorreu ou tem indicadores epidemiológicos que possibilitam a ocorrência de casos agudos de doença __________________________________________________________________________________________ 114 Sebastião Aldo da Silva Valente Anexos de Chagas. Você está doando uma alíquota de seu sangue para que possamos realizar os testes de diagnósticos adequados como os exames parasitológicos e sorológicos. Estou ciente que: I) O estudo se faz necessário para que se desenvolvam diagnósticos precoces para a doença de Chagas de fase aguda. II) Essa coleta de sangue será feita exclusivamente para este estudo e em nada influenciará a minha saúde; não vai me causar nenhum problema, exceto o pequeno incômodo no momento da coleta para a coleta de sangue (introdução da agulha para retirada do sangue). Os riscos da retirada de sangue são eventualmente um pequeno hematoma local (rouxidão), algum desconforto e, raramente, tontura. Todo o material utilizado é estéril, atóxico e descartável. III) Serão coletados 10 ml de sangue. Posso ser reconvocado para novas doações, caso necessário. Nos casos positivos o material será guardado na soroteca do Instituto Evandro Chagas para futuros estudos. IV) Quando detectado um caso agudo de doença de Chagas receberei todo o tratamento específico e acompanhamento da doença gratuitamente. V) Tenho a liberdade de desistir ou de interromper a colaboração neste estudo no momento em que desejar, sem necessidade de qualquer explicação. VI) A desistência não causará nenhum prejuízo à minha saúde ou bem estar físico. VII) Os resultados obtidos durante este trabalho serão mantidos em sigilo, mas concordo que sejam divulgados em publicações científicas, desde que meus dados pessoais não sejam mencionados. VIII) Caso eu desejar, poderei pessoalmente tomar conhecimento dos resultados, ao final desta pesquisa ( ) Desejo conhecer os resultados desta pesquisa. ( ) Não desejo conhecer os resultados desta pesquisa. Este estudo visa um maior conhecimento sobre a doença de Chagas na região visando elaborar estratégias mais eficientes de controle. É provável que o voluntário em questão não seja beneficiário direto destes avanços. _________________________________________________________________________________ Este projeto de pesquisa foi aprovado pelo Comitê de Ética do Instituto Evandro Chagas na Coordenação do Dr. Manoel do Carmo Pereira Soares, Instituto Evandro Chagas. Rodovia BR 316, Km7 s/n. Bairro Levilândia, Ananindeua, PA. CEP 67.030-070. Fone 91-3214-22237. Quaisquer dúvidas, que possam ocorrer com relação a esse estudo, poderão ser contatados: Dr. Sebastião Aldo da Silva Valente – Laboratório de Doença de Chagas – Instituto Evandro Chagas. Rodovia BR 316, Km7 s/n. Bairro Levilândia, Ananindeua, PA. CEP 67.030-070. Fone 91-3214-2107. Belém, ____ de _____________ de 200__. ( ) Voluntário ................................................................................................... Testemunha 1 : _______________________________________________ Nome / RG / Telefone Testemunha 2 : ______________________________________________ Nome / RG / Telefone Coordenador: ________________________________________ Impressão digital __________________________________________________________________________________________ 115 Sebastião Aldo da Silva Valente Anexos Anexo 4. Meios de Cultura Meio Bifásico de Hoff´s O meio ágar-sangue bifásico será usado no isolamento primário e cultivo de estoques, apresentando a seguinte composição: Difco bacto ágar-sangue base 14g. BBL tripticase peptona 5g. Oxoid L 28 ágar purificado 3g. Cloreto de sódio (ANALAR) 6g. Água destilada 1.000 ml. Sangue inativado de coelho 0,5 ml por tubo. Durante os trabalhos de campo serão utilizados tubos de sistema a vácuo (BDH), a inoculação sendo feita através da tampa, conforme preconizado por MILES et al., (1993). Meio monofásico – RPMI 1640 (GIBCO) Este meio requer os seguintes componentes: RPMI 1640 (Gibco, BRL, Paisley, Scotland) suplementado com 0,5% (w/v) tripticase (BBL), 0,5% (w/v) HEPES, 0,03M hemin, 10% (v/v) SBF inativado, 2 mM de glutamato de sódio, 2 mM de piruvato de sódio e antibióticos. Preparadas como segue: solução de tripticase estéril concentrada 100X (0,175 g/ml autoclavada), HEPES (1M, esterilizada a filtro) e HEMIN (2,5 mg/ml em 0,01M NaOH, autoclavado). Adicionar 2,8 ml de tripticase, 2 ml de HEPES e 0,8 ml para cada 100 ml de solução estoque de RPMI 1640, junto com 10 ml de SBF, 1 ml de 200 mM de glutamato de sódio, 200 mM de piruvato de sódio (com penicilina, estreptomicina, concentração final 250 UI/ml e 250 μg/ml, respectivamente). As soluções de glutamina, piruvato e antibióticos é esterilizada em filtro, antes da adição. Para acondicionar os meios, são utilizados frascos plásticos de 50 ml, descartáveis (Falcon, USA). A adição de 5-fluorocytosine (100 μg/ml) e gentamicina (100 μg/ml) é utilizada para evitar o crescimento de fungos e bactérias. MEIO DE L.I.T MEIO I Infusão de fígado (Difco) Triptose Água destilada MEIO II NaCl KCl Na2 HP04 anidro Glicose Água destilada MEIO III Solução de hemoglobina Soro bovino fetali Solução antibiótica 6,0 g 10,0 g 700 ml 8,0 g 0,8 g 13,0 g 2,0 ml 700 ml 40 ml 100 a 200 ml 10 ml SOLUÇÃO ANTIBIÓTICA Penicilina cristalina 500.000 1 frasco; Estreptomicina 1g 1frasco; Água estéril 10 ml Misturar os 3 meios, completar para 2.200 ml com água destilada. Esterilizar por filtração em Seitz. SOLUÇÃO DE HEMOGLOBINA Lavar hemácias de boi 3 vezes com salina. Lisar 1 volume de papa com 9 volumes de água destilada. Congelar durante uma noite. Descongelar a 37°C. __________________________________________________________________________________________ 116 Sebastião Aldo da Silva Valente Anexos Anexo 5. Técnica de Hemaglutinação Indireta Este método utiliza hemácias de aves estabilizadas e sensibilizadas com antígenos totais de Trypanosoma cruzi (antígenos solúveis), que são aglutinadas quando colocadas em contato com diluições de soros de pacientes chagásicos. Amostra: Soro obtido a partir de punção venosa ou de coleta digital em tubos capilares. Não utilizar plasma, nem amostras contaminadas, turvas ou hemolisadas. Procedimentos A - Teste Qualitativo - Para triagem de amostras: Usar uma cavidade por amostra, incluindo os controles positivo e negativo, a cada série de testes. 1) Em tubos de ensaio, diluir a 1/40 as amostras a ensaiar e os soros controle (R3 e R4) em diluente de soros R2A; Ex.: 10 μl da amostra + 0,4ml de R2A; 2) Transferir 50 μl da diluição de cada amostra e dos soros controle R3 e R4 para as cavidades respectivas da microplaca; 3) Homogeneizar bem a suspensão de hemácias (R1), por agitação delicada do frasco, e adicionar 25 μl a cada cavidade; 4) Para perfeita homogeneização, imprimir à placa vibração mecânica, batendo com os dedos nas bordas, seguidamente por 3 a 4 minutos. Deixá-la em repouso por 1 hora, à temperatura ambiente (cerca de 250C, em local isento de vibrações); 5) Leitura - efetuada ao final da incubação. Interpretação REAÇÃO POSITIVA: Véu uniforme de hemácias recobrindo toda a cavidade, podendo estar, às vezes, parcialmente retraído nas bordas. REAÇÃO FRACAMENTE POSITIVA: Véu pouco nítido, apresentando pequeno depósito de hemácias no fundo da cavidade. REAÇÃO NEGATIVA: Botão compacto de hemácias no fundo da cavidade. Obs.: O título do soro positivo (R3) deverá ser confirmado por ensaio quantitativo, conforme descrito no esquema geral do teste quantitativo. Em algumas populações, com certa freqüência os soros apresentam aglutininas naturais da classe IgM que podem causar aglutinação inespecífica. A adição de 2-mercaptoetanol (2ME) às diluições de soros aqui indicadas, inativa anticorpos IgM e afasta essa interferência. __________________________________________________________________________________________ 117 Sebastião Aldo da Silva Valente Anexos Anexo 6. Técnica de Imunofluorescência Indireta para doença de Chagas Procedimento: 1. Separar as lâminas já fixadas com antígeno de T. cruzi, secar em estufa a 37oC, por 5 minutos, dentro de uma câmara úmida. Marcar as amostras com os números dos soros respectivos, em cada fileira de orifícios da lâmina. 2. Preparo das diluições em PBS: no primeiro orifício da placa colocar 200 μl de PBS; nos demais, 100 μl. Retirar do primeiro orifício 20 μl de PBS e desprezar. Em seguida, colocar 20 μl do soro a ser testado no primeiro orifício e agitar bem, usando a micropipeta. 3. Retirar 100 μl da primeira diluição e colocar no orifício seguinte, agitar e retirar 100 μl e assim proceder, sucessivamente, nos orifícios restantes. Deixar os 100 μl no último orifício. 4. Colocar 20 μl de PBS nas lâminas onde está fixado o antígeno e deixar em repouso durante 5 minutos à temperatura ambiente. Retirar o PBS com a pipeta e substituir pelas diluições nos orifícios. Geralmente se usam as seguintes diluições: 1:10, 1:20, 1:40, 1:80, 1:160, 1:320, 1:640 e 1:1280. Em seguida, levar as lâminas úmidas à estufa a 37oC, onde devem permanecer por 30 minutos. 5. Retirá-las, em seguida, lavá-las com jatos suaves de PBS e imergi-las nesse mesmo tampão por 10 minutos. Retirar e lavar com jatos suaves de água destilada, e imergi-las em água destilada, por mais cinco minutos. 6. Retirar as lâminas da água destilada, secá-las e colocar 10 μl do conjugado preparado com anti-IgG ou anti-IgM e Azul de Evans. Levar em câmara úmida para estufa a 37oC, durante 30 minutos. 7. Retirar as lâminas da estufa, lavar com jatos de PBS e imergi-las em PBS por 10 minutos. Secar as lâminas, montar com glicerina e observar em microscópio apropriado para imunofluorescência. __________________________________________________________________________________________ 118 Sebastião Aldo da Silva Valente Anexos Anexo 7. Artigo submetido e aceito para publicação __________________________________________________________________________________________ 119 Sebastião Aldo da Silva Valente Anexos Analysis of an acute Chagas disease outbreak in the Brazilian Amazon: human cases, triatomines, reservoir mammals and parasites Sebastião Aldo da Silva Valente1 Vera da Costa Valente 1, Ana Yecê das Neves Pinto1, Mª de Jesus Barbosa César,2 Marivaldo Picanço dos Santos 2, Clóvis Omar Sá Miranda2 Patrícia Cuervo3, Octavio Fernandes3 Summary A outbreak of acute Chagas disease was observed in Mazagão, Amapá, Brazilian Amazon in 1997. Among the 26 inhabitants, 17 presented prolonged fever and general symptoms compatible with acute Chagas disease (65.3% - 17/26). All of them were submitted to parasitological (direct search of parasites, haemoculture and xenodiagnosis) and serological tests (indirect haemagglutination and indirect immunofluorescence). All of the 17 symptomatic patients were positive in, at least, one parasitological test (100% - 17/17) and 11 (64.7% - 11/17) were IgM or IgG antiT. cruzi positive. All the asymptomatic patients were negative in the parasitological tests (100% - 9/9) and only one presented IgG anti-T. cruzi antibodies in low titers (1/40) (11.1% - 1/9). None of them were IgM anti-T. cruzi positive (0% - 9/9). Sixty eight triatomine bugs were captured in the vicinity of the dwellings (66 Rhodnius pictipes and 2 Panstrongylus geniculatus). Forty five insects were infected with T. cruzi (43 R. pictipes and 2 P. geniculatus – 66.1% - 45/68). Thirteen trypanosomatid strains were isolated: 8 from humans and 5 from R. pictipes. Four were genotyped as T. cruzi I (two from humans and two from R. pictipes) and 7 as T. cruzi Z3. (6 from humans and one from R. pictipes). Two protozoan stocks from R. pictipes were composed of two different parasite species: T. cruzi Z3 and T. rangeli. The appropriate treatment was established for all 17 patients and a drastic decrease in the parasitemia was observed in 16 of them (94.1% - 16/17) during the follow-up period (six months, one year, 5 and 7 years). The serological tests were negative in all the 17 patients 7 years post treatment. This outbreak revealed the overlap of different genotypes in the same ecotope, raises the possibility of transmission 1 SVS – Instituto Evandro Chagas, Belém, PA. 2Secretaria de Saúde do Estado do Amapá, Macapá, AP. Instituto Oswaldo Cruz, Fiocruz, Rio de Janeiro, Brasil. Endereço para correspondência: Rodovia BR 316, KM 7, S/Nº, CP 50, CEP 67.030-070 Ananindeua, Pará, Brasil. Telefones (005591)3214-2106 e 3214-2107. Email: [email protected] 3 __________________________________________________________________________________________ 120 Sebastião Aldo da Silva Valente Anexos mediated by the oral route and shows the need for early therapeutic intervention for better patient management of acute Chagas disease in the Brazilian Amazon. Keywords: acute Chagas disease, outbreak, oral transmission, Amazon, T. cruzi. Introduction Since the success achieved in vector control the number of acute cases of Chagas disease has declined and morbidity is primarily due to the chronic infection. However, simultaneous outbreaks of acute Chagas disease (ACD) have been reported in different regions of Latin America, probably following transmission by alternative routes1. The first such recorded Brazilian outbreak of ACD occurred in Teutônia, southern Brazil, in the sixties, affecting simultaneously 17 patients of the same family, of whom 5 died.2,3 The transmission was attributed to contaminated food offered in a local school. New ACD episodes were also described in other regions such as in Catolé do Rocha, northeastern Brazil, where 26 individuals were infected as shown by positive parasitological and serological tests. The ingestion of sugar cane juice was proposed as the transmission route.4 In 2005, 8 cases of ACD were identified in Santa Catarina, southern Brazil. Three of them died and again, sugar cane juice was incriminated as the infection source.5 In the Amazon region, the first ACD cases were registered in the forties in French Guyana,6 while in the Brazil the first records were in the sixties, occurring in Pará state. In this outbreak 4 members of the same family were infected. As no triatomine bugs were found, the oral route was proposed as the source of infection.7,8 At least six hundred cases of ACD have since been registered in the Brazilian Amazon, leading to its characterization as an emerging disease in the region. The ACD outbreaks involved from one to six families suggesting that transmission may have arisen from the same source.9-13 The causative parasites were typed as belonging to T. cruzi I (zymodeme 1), associated with the sylvatic cycle and therefore, the ACD cases were considered as a zooantroponosis. A outbreak of ACD affecting 17 individuals belonging to three families from Mazagão municipality, Amapá state, Brazilian Amazon that occurred in 1997 is described herein in detail showing aspects related to the human cases, triatomines and the involved parasites. __________________________________________________________________________________________ 121 Sebastião Aldo da Silva Valente Anexos Case histories and methods Study areas and patients The outbreak occurred in October 1997, in the locality of Rio Bispo, Mazagão municipality, Amapá State, Brazil (S 00º 41’ 14.9” W 051º 38’ 46.1” – Figure 1). The study included all of the 26 inhabitants from solely four families living in the locality: A (8 members), B (6 members), C (7 members) and D (5 members). The first case was identified accidentally when a thick blood smear test was made from one patient to determine if the prolonged fever was due to the presence of malaria parasites. Trypomastigote forms were found in the peripheral blood and this result led to the investigation of ACD in all the other inhabitants of the village. The patients diagnosed as ACD cases were treated with benzonidazole (Rochagan®, Roche –5 mg/kg of weight) during 60 days. In the case of allergy to the drug, nifurtimox was implemented (Lampit®, Bayer - 8 mg/kg of weight) for 45 days. Clinical data and laboratory (serology, direct search for the parasite, xenodiagnosis and/or haemoculture) were used in follow-ups, carried out at six months, one year, 5 and 7 years post-treatment. Diagnosis of ACD: direct search for the parasite, xenodiagnosis, haemoculture and serology Blood smears were obtained from all the individuals, stained with Giemsa and examined under the light microscope searching for trypomastigote forms. The QBC® test (Quantitative Buffy Coat System, Malaria Diagnostic Kit, Becton Dickinson, USA) was also used. Xenodiagnosis was carried out using 20 third instars nymphs of Triatoma infestans per patient. The nymphs had not been fed for 60 days and were placed on the patients arms and left for 20 minutes, or until the meal was considered completed.14 One hundred µl of total blood were placed in 6 tubes of biphasic Hoff’s medium,14 providing a total of 600 µl of cultivated blood. Serology was performed using the indirect haemagglutination test (IH) and indirect imunofluorescence (IIF). In the latter, anti-human IgM and IgG labelled with fluorescein (BIOLAB, São Paulo) were used. For IH, a titre of 1:40 was tested and for IIF sera dilutions up to 1:1280 were tested. The reference value for both tests was a negative result at the 1:40 dilution. __________________________________________________________________________________________ 122 Sebastião Aldo da Silva Valente Anexos Capture of sylvatic reservoirs Fifty wire traps were used for capturing sylvan mammals, potentially acting as T. cruzi reservoirs. Fruits were used as bait and the traps placed 100 m distant from the households, with at least a distance of 20 m between the traps. The traps were examined every day during 15 days to collect the captured mammals and change baits. Triatomine survey Search for triatomines was conducted in all residences of the village. Two light traps (fluorescent lamp), placed over the extracting machine of açaí juice and on the table of the community kitchen were also used. Four other traps were placed 20m from each residence. The survey also included the search of the annexes and possible natural ecotopes in the vicinity of the village. Molecular characterization of trypanosomatid isolates Genomic DNA from the isolates was extracted using a commercial kit (AMERSHAM). A multiplex PCR that amplifies the non-transcribed region of the miniexon gene was used for the molecular typing.15 Amplified products were submitted to 2% agarose gel electrophoresis, stained with ethidium bromide and visualized under UV light. T. cruzi I, II, Z3 and T. rangeli DNAs were used as positive controls. Results Description of the ACD cases and parasitological tests: The first confirmed ACD case was a child of thirteen years (family A) who presented with prolonged fever with chills, headache, joint and muscular pain suggesting malaria. The thick smear for Plasmodium sp. was negative however, and new symptoms appeared: cutaneous itching exanthema of both legs, face and abdomen accompanied by leg edema. A new examination of the peripheral blood for haemoparasites revealed circulating trypomastigote forms. As sixteen more individuals in the village were presenting fever (6 relatives of the index case and 10 other neighbours), ACD investigation was carried out on all residents of the locality. Of these 16 patients, 5 had parasites morphologically similar to T. cruzi in their peripheral blood. All patients had never been out of the region, indicating the cases as autochthonous. The QBC test confirmed the six cases that were positive on direct examination (index case and 5 more), and demonstrated circulating trypanosomes in __________________________________________________________________________________________ 123 Sebastião Aldo da Silva Valente Anexos 10 other patients. Fifteen of the suspected patients were submitted to xenodiagnosis and 14 were positive. One of them had been negative for the blood smear and QBC test. (Table 1, Figure 3). Considering the results of the three tests (blood smear, QBC and xenodiagnosis) 17 ACD cases were diagnosed, distributed among the 26 members of the 3 families inhabitanting the village (Table 1, Figure 3) Eleven patients were submitted to hemoculture and 8 stocks were isolated for further molecular typing. One of the residents, shown a triatomine collection, identified these insects as those that entered his dwelling at night attracted by light. Serology for Chagas disease – one month before treatment implementation: Twenty six individuals were tested for the presence of IgM and IgG anti-T. cruzi (IIF test). Six (6/26 – 26.1%) patients were IgM anti-T. cruzi positive and 9 (9/26 – 34.6%) presented circulating IgG anti-T. cruzi. The 11 patients that were serologically positive, either IgM or IgG anti-T. cruzi, (3 from family A, 4 from B, 4 from C – 11/26) showed positive results in at least one of the parasitological tests. Six patients were positive for the parasitological tests and presented all serological tests negative. The concordance of the results of the two serological methods used was 100% at this stage (Table 1, Figure 3). Post-treatment laboratory follow-up: Seventeen ACD confirmed cases were treated (7 from family A, 6 from B and 4 from C). The first follow-up was performed after 6 months of treatment. All patients were parasitologically negative by direct blood test, QBC, xenodiagnosis and in vitro culture. Detection of IgM anti-T. cruzi was unsuccessful in all patients. Fifteen (15/17 – 88.2%) were IgG anti-T. cruzi positive with titres ranging from 1:40 to 1:640. Two patients presented discordant results in the serological tests, being negative on IIF and positive in IH (Figure 3). On the second evaluation, 1 year after treatment, all IgM anti-T. cruzi were negative. Twelve patients still presented IgG anti-T. cruzi with titres ranging from 1:40 to 1:320 (Figure 3) __________________________________________________________________________________________ 124 Sebastião Aldo da Silva Valente Anexos The third evaluation was made 5 years post-treatment. One patient was positive in the xenodiagnosis and the IgM anti-T. cruzi gave a positive result (1:80) having previously been negative. The IgG anti-T. cruzi continued to be positive (1:320) confirming the results obtained on the first and second evaluation posttreatment. This patient was again treated and showed positive anti-HIV serology (data not shown). All the other patients were negative for the parasitological and serological tests (Figure 3) The last follow-up took place 7 years after treatment. All patients were negative for all parasitological and serological tests (Figure 3). Capture of sylvatic mammals: Six Didelphis marsupialis and six Marmosa sp. were captured in the vicinities of the region where the outbreak took place. Fifty percent of these animals were revealed to be infected with protozoa morphologically similar to T. cruzi when blood samples were submitted to direct search of parasites after Giemsa staining (3 Didelphis marsupialis and 3 Marmosa sp.). Triantomine survey and collection: Three triatomines, identified as R. pictipes were collected in hammocks. One of them was positive for flagellate forms similar to T. cruzi. No triatomine colonies were found in the residences or in the house annexes. Six specimens of R. pictipes were also captured in the light traps placed in the communal kitchen (Figure 2) . Five of them were infected with trypanosomes (5/6 – 83.3%). The light traps placed in the peridomestic habitat, captured 4 triatomines: two R. pictipes and two P. geniculatus, which were all infected with trypanosomes. Those placed in the village neighborhood, captured 55 R. pictipes. Thirty-five of these were also infected (35/55 – 63.6%). In total, 45 out of 68 captured triatomines were infected with trypanosomatid protozoa similar to T. cruzi (45/68 – 66.2%). Molecular characterization: Eight trypanosomatid isolates were obtained and characterized - 8 from humans (3 from family A, 4 from B and one from C) and 5 from R. pictipes. The three stocks from family A were characterized as Z3 (either TCIIa or IIc, which are not distinguished by the mini-exon method). Among the 4 isolates from family B, two __________________________________________________________________________________________ 125 Sebastião Aldo da Silva Valente Anexos were typed as T. cruzi I and two as Z3. The only isolate from family C was genotyped as T. cruzi Z3. Among the 5 R. pictipes isolates, two were T. cruzi I, one was typed as Z3 and two presented mixed-infection molecular profiles: Trypanosoma rangeli and T. cruzi Z3. Discussion The appropriate epidemiological and laboratory investigation of this ACD outbreak in Mazagão, Brazilian Amazon, provided fast and reliable diagnosis of the cases, leading to early therapeutic intervention. The geographical isolation of the patients, the way of living of the involved families and the simultaneous association of the cases with the alimentary habit of consuming a regional fruit juice (açaí) supports the putative oral transmission of the parasite. The absence of evidence of triatomine bites and lack of intradomiciliary triatomine colonies supports this hypothesis. Indeed, triatomine bugs were found in the vicinity of the village, as vectors maintaining the enzootic cycle of American trypanosomiasis, and also in the communal kitchens, probably attracted by the electric lights.7,10 It is interesting to find the presence of all the stakeholders of the epidemioogical cycle of Chagas disease in the same microarea. In Mazagão, triatomines, wild reservoirs and humans were encountered infected with T. cruzi comprising the entire scenario for American trypanosomiasis and the presence of Chagas disease. Experimentally, it has been shown that a wide variety of foodstuffs contaminated with epimastigotes of T. cruzi are a source of infection for 100% of laboratory mice fed with these contaminated foods (Lainson et al., 1980) and several ACD outbreaks have been associated with putative oral transmission and epidemiologically linked to the ingestion of açaí juice potentially contaminated with T. cruzi.10,13.Nevertheless, this hypothesis was not formally proven due to difficulties in isolating the parasites from the açaí.11 Recently, oral transmission involving sugar cane juice was incriminated in one outbreak with 24 cases in southern Brazil.5 In the same manner, oral transmission has been considered in ACD outbreaks in Equador,16 Colombia17,18 and Venezuela.19 Out of the 26 inhabitants of Rio Bispo, Mazagão, 17 presented ACD confirmed, by at least one parasitological test.20,21 However, the detection of circulating IgM anti-T. cruzi (IIF), a potential marker of acute phase, and/or IgG (IIF and IH) was only achieved in 64.7% of the ACD __________________________________________________________________________________________ 126 Sebastião Aldo da Silva Valente Anexos cases, demonstrating that during this phase it is not possible to predict the presence of antibody. This could be attributed to the different antigenic stimulus mediated by distinct parasite strains, or mediated by the infection timeframe. Independent of the cause, serology for ACD patients is still a problem to be overcome.22,23 In this outbreak, treatment of ACD cases resulted in clearance of circulating parasites and progressive reduction of the IgG anti-T. cruzi titers leading to serologically negative results in 7 years. This is coherent with the expectations for treatment of Chagas disease defined by PAHO.13,24 Only one patient turned out to be positive in parasitological tests 5 years post-treatment. This patient never presented negative results in serological tests before (second and third follow-ups - 6 months and 1 year, respectively), demonstrating that, indeed, he was so far not cured.25 In addition, this patient was HIV positive (data not shown), which could explain the reactivation of the disease with circulating parasites.26 The stocks isolated from humans and triatomines involved in this outbreak (T. cruzi I, T. cruzi Z3 and T. rangeli) are typical of the Brazilian Amazon.27-29 The miniexon method does not distinguish TCIIa from TCIIc, and classifies both as Z3 but we presume that the isolates are most likely to be TCIIa, previously associated with human infections. The overlap of T. cruzi and T. rangeli infection of humans is described in the Amazon region.15 In addition the T. cruzi genotypes found in this outbreak are typical of the sylvatic cycle of T. cruzi, corresponding to the scenario of the outbreak in which human dwellings are close to the primary forest.30,31 Probably, the richness of the biodiversity, including sylvan mammals and triatomines, in this village, maintains the circulation of the different genotypes in the environment.32 The existence of regular and seasonal ACD outbreaks in the Brazilian Amazon, probably caused by oral transmission, reveals the needs to implement alternative control measures for Chagas disease. Malaria is endemic in the region and health care service is already structured for its early diagnosis and treatment. This same infrastructure could be used for ACD diagnosis. The training of microscopists and health agents for identifying T. cruzi in thick blood smears and in triatomine bugs could act as a surveillance system. After early detection of putative ACD cases, epidemiological and therapeutic interventions should take place. Orientation concerning contamination of raw food, such as açaí juice, should be given to the population in order to avoid episodes of ACD outbreaks. Prolonged febrile cases with negative thick blood smears for Plasmodium, should be considered and used as indicative for starting ACD laboratory investigation, enabling a better __________________________________________________________________________________________ 127 Sebastião Aldo da Silva Valente Anexos patient management, such as early diagnosis and treatment, and the avoidance of future higher morbidities. Acknowledgement Secretaria de Vigilância em Saúde- SVS, CR/FNS-AP, Secretaria de Estado de Saúde do Amapá, Secretaria Municipal de Saúde do Mazagão and European Committee Latin American for Research on Triatomines – ECLAT for financial support. F.S Gomes, A. Freitas, R.N Almeida, R.B Nascimento and JM Nascimento for technical support. To Dr. Marinete Póvoa for the revision of the manuscript in English. The works with humans populations were appropriately approved by the Committee of Ethics (Instituto Evandro Chagas). The capture of mammals and the experiments carried out involving these animals were appropriately approved by the environmental authorities (IBAMA, Brazil) and by the Committee of Animal Ethics (Instituto Evandro Chagas). Conflict of interest: none References 1. Coura JR. Transmissão da infecção chagásica por via oral na história natural da doença de Chagas. Rev Soc Bras Med Trop 2006; 39 Suppl 4: 113−117. 2. Coura JR. 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Families N With Direct individuals symptomes examination + A 8 7/8 2/8 6/8 6/6* 3 B 6 6/6 2/6 6/6 5/6 4 C 7 4/7 2/7 4/7 3/3* 1 D 5 0/5 0/5 0/5 0/0* 0 Total 26 17 6 14 14 8 • QBC + Xeno + Parasite Isolation Six out of the 7 family A members and 3 out of 4 family C members with symptoms were submitted to the xenodiagnosis. None of the family D members were submitted to this test since they did not presented symptoms. Figure 1. Geographical location of the Village Rio Bispo in the municipal district of Mazagão, State of Amapá, Brazil where the acute Chagas disease outbreak took place. __________________________________________________________________________________________ 132 Sebastião Aldo da Silva Valente Anexos Figure 2. The communitary kitchen showing the conditions of the açaí juice preparation. 1A. The Family seating around the table where the tools used for açai juice extraction are exposed. In the yellow rectangle area is the apparatus for the açaí maceration (amplified n 1B). The arrows determine the possible sequence of the events that allowed an eventual contamination of the açaí juice with triatomine fecal material when the vector is attracted by the light. Figure 3. Indirect Immunofluorescence Test results for detection of IgM (red square or circle) and IgG (blue square or circle) anti-T. cruzi in the patients belonged to the four families (A, B, C e D). In green is shown the values for the families of the patients. The stippled line is the title, whose results above the line are positives. The patients in the square were parasitologically positives in, at least, one of the tests (Indirect blood test, QBC, xenodiagnosis and in vitro culture). The circles correspond to the patients parasitologically negatives. Stars represent the patients who had discordant results between Indirect Immunofluorescence Test and haemagglutination. __________________________________________________________________________________________ 133 Sebastião Aldo da Silva Valente Anexos Anexo 8. Preparo de soluções salinas para dissecação de triatomíneos • Solução de Hibitane® (Zeneca) Gluconato de clorohexedine a 5% Sache de 10 ml q.s.p. • 1 litro de água destilada. Solução Mista: Solução 1 (bicloreto de mercúrio - HgCl2 cloreto de sódio - NaCl HCl concentrado Etanol absoluto Água destilada Solução de antibióticos 2 Penicilina Gentamicina 5-fluorcitosina 1mg/ml, diluída em água destilada e protegida da ação da luz) 0,025 g 0,65 g 0,125 ml 25 ml 75 ml) 5.000.000 UI, 40 mg/ml 5 ml __________________________________________________________________________________________ 134 Sebastião Aldo da Silva Valente Anexos Anexo 9. Autorização do IBAMA __________________________________________________________________________________________ 135 Sebastião Aldo da Silva Valente Anexos Anexo 10. Protocolo do Comitê de Ética em Pesquisas com Animais do Instituto Evandro Chagas. __________________________________________________________________________________________ 136 Sebastião Aldo da Silva Valente Anexos Anexo 11. ISOLADOS DE TRIPANOSSOMATÍDEOS OBTIDOS EM SURTOS DE DOENÇA DE CHAGAS NOS ESTADOS DO PARÁ E AMAPÁ – 1995 A 2005 MUNICÍPIO HOMEM MAMÍFEROS TRIATOMÍNEOS Abaetetuba 10 5 7 Ananindeua 7 2 2 Barcarena 1 5 13 Belém 21 2 2 Bragança 1 2 4 *Mazagão, AP 8 0 5 48 16 33 Total __________________________________________________________________________________________ 137 Sebastião Aldo da Silva Valente Anexos Anexo 12. ISOLAMENTOS DE PACIENTES EM SURTOS NO PARÁ E AMAPÁ ORIGEM GEOGRÁFICA CÓDIGO DA AMOSTRA TIPAGEM Abaetetuba 5152-H9DMG Tc1 Abaetetuba 6492-H18MJSF Tc1 Abaetetuba 6493-H19AFF Tc1 Abaetetuba 6495-H20JBFF Tc1 Abaetetuba 6499-H21RNM Tc1 Abaetetuba 6500-H22SPF Tc1 Abaetetuba 6503-H23JBPF Tc1 Abaetetuba 6567-H25DSP Tc1 Abaetetuba 10213-H42TSB Tc1 Abaetetuba 10290-H44 MNSM Tc1 Ananindeua 11149-H45 ERSC Tc1 Ananindeua 11189-H46 MJRR Tc1 Ananindeua 11206-H47ESC Tc1 Ananindeua 11209-H48MASS Tc1 Ananindeua 11214-H49CASS Tc1 Ananindeua 12350-H54WSC Z3 Ananindeua 11267-H59 MAFF Tc1 Barcarena 11875-H56MFFM Tc1 Belém S/N-H1MHS Tc1 Belém 2087-H2MGA Tc1 Belém 3395-H6JFSF Tc1 Belém 5107-H8TSSES Tc1 Belém 5929-H15ON Tc1 Belém 6408-H17NCC Tc1 Belém 8513-H31FPN Tc1 Belém 8566-H32SAG Tc1 Belém 8759-H33VCFC Tc1 Belém 8760-H34AJAM Tc1 Belém 8761-H35AMC Tc1 Belém 10113-H41VLS Tc1 Belém 10251-H43WAAL Tc1 Belém 11228-H50JRMR Tc1 Belém 11228-H51JRMR Tc1 Belém 12156-H53LBS Tc1 Belém 10269-H58RML Tc1 Belém 8514-H66MPC Tc1 Belém 8515-H67NPM Tc1 Belém 8517-H68KMGF Tc1 Belém 12156-H75LBS Tc1 Bragança 11905-H52CWSP Tc1 Mazagão 5199-H10RBS Tc1 Mazagão RBS/5202-H10-1 RBS Tc1 Mazagão RBS/5200-H11 RBS Z3 Mazagão 5208-H12MBS Z3 Mazagão 5211-H13EDS Z3 Mazagão 5211-H14EDS1 Z3 Mazagão 5211-H15LSS Z3 Mazagão 5222-H1MJPS Z3 __________________________________________________________________________________________ 138 Sebastião Aldo da Silva Valente Anexos Anexo 13. ISOLAMENTOS DE ANIMAIS EM SURTOS NO PARÁ E AMAPÁ ORIGEM CÓDIGO DA GEOGRÁFICA AMOSTRA Abaetetuba HOSPEDEIRO TIPAGEM 5165-M14 D. marsupialis Tc1 Abaetetuba 5792-M17 D. marsupialis Tc1 Abaetetuba 5792-M22 D. marsupialis Tc1 Abaetetuba 5838-M19 P. opossum Tc1 Abaetetuba 2161-M9 D. marsupialis Tc1 Ananindeua ANA/03-M1 D. marsupialis Tc1 Ananindeua 2077-M6 D. marsupialis Tc1 Barcarena BAR/33-M2 D. marsupialis Tc1 Barcarena 5302-M15 M. cinerea Tc1 Barcarena 5300-M21 D. marsupialis Tc1 Barcarena 2161-M8 D. marsupialis Tc1 Barcarena 5665-M16 D. marsupialis Tc1 Belém 598-M5 D. marsupialis Tc1 Belém 5827-M18 D. marsupialis Tc1 Bragança BRAG/22-M3 D. marsupialis Tc1 Bragança BRAG/26-M4 D. marsupialis Tc1 __________________________________________________________________________________________ 139 Sebastião Aldo da Silva Valente Anexos Anexo 14. ISOLAMENTOS DE TRIATOMÍNEOS EM SURTOS NO PARÁ E AMAPÁ ORIGEM CÓDIGO DA GEOGRÁFICA AMOSTRA Abaetetuba HOSPEDEIRO TIPAGEM 5155-B31 R. pictipes Tc1 Abaetetuba 7081-B20 R. pictipes Tc1 Abaetetuba 7084-B21 R. pictipes Tc1 Abaetetuba 7089-B22 R. pictipes Tc1 Abaetetuba 2039-B13 R. robustus Tc1 Abaetetuba 583-B29 R. pictipes Tc1 Abaetetuba 611-B30 R. pictipes Tc1 Ananindeua 5290-B17 P. geniculatus Tc1 Ananindeua 5291-B18 P. geniculatus Tc1 Barcarena 50-B3 R. pictipes Tc1 Barcarena 51-B4 R. pictipes Tc1 Barcarena 52-B5 R. pictipes Tc1 Barcarena 66-B6 R. pictipes Tc1 Barcarena 83-B7 R. pictipes Tc1 Barcarena 124-B8 R. robustus Tc1 Barcarena 141-B10 R. pictipes Tc1 Barcarena 149-B11 R. pictipes Tc1 Barcarena 7301-B25 R. pictipes Tc1 Barcarena 7312-B26 R. pictipes Tc1 Barcarena 7343-B27 R. pictipes Tc1 Barcarena 5184-B15 R. robustus Tc1 Barcarena 2083-B14 R. robustus Tc1 Belém 5275-B16 P. geniculatus Tc1 Belém 7095-B24 R. pictipes Tc1 Bragança 10-B1 R. robustus Tc1 Bragança 18-B2 R. pictipes Tc1 Bragança 132-B9 R. robustus Tc1 Bragança 7090-B23 R. pictipes Tc1 Mazagão 198-B12 R. pictipes Z3+T. rangeli Mazagão 198-B13 R. pictipes Z3+T. rangeli Mazagão 198-B14 R. pictipes Z3 Mazagão 198-B15 R. pictipes TcI Mazagão 198-B16 R. pictipes TcI __________________________________________________________________________________________ 140 Livros Grátis ( http://www.livrosgratis.com.br ) Milhares de Livros para Download: Baixar livros de Administração Baixar livros de Agronomia Baixar livros de Arquitetura Baixar livros de Artes Baixar livros de Astronomia Baixar livros de Biologia Geral Baixar livros de Ciência da Computação Baixar livros de Ciência da Informação Baixar livros de Ciência Política Baixar livros de Ciências da Saúde Baixar livros de Comunicação Baixar livros do Conselho Nacional de Educação - CNE Baixar livros de Defesa civil Baixar livros de Direito Baixar livros de Direitos humanos Baixar livros de Economia Baixar livros de Economia Doméstica Baixar livros de Educação Baixar livros de Educação - Trânsito Baixar livros de Educação Física Baixar livros de Engenharia Aeroespacial Baixar livros de Farmácia Baixar livros de Filosofia Baixar livros de Física Baixar livros de Geociências Baixar livros de Geografia Baixar livros de História Baixar livros de Línguas Baixar livros de Literatura Baixar livros de Literatura de Cordel Baixar livros de Literatura Infantil Baixar livros de Matemática Baixar livros de Medicina Baixar livros de Medicina Veterinária Baixar livros de Meio Ambiente Baixar livros de Meteorologia Baixar Monografias e TCC Baixar livros Multidisciplinar Baixar livros de Música Baixar livros de Psicologia Baixar livros de Química Baixar livros de Saúde Coletiva Baixar livros de Serviço Social Baixar livros de Sociologia Baixar livros de Teologia Baixar livros de Trabalho Baixar livros de Turismo