IV Congresso Português de Sociologia O Abandono Escolar no meio rural Os jovens entre os dois saberes: Escola e Trabalho Tânia Marisa Silva Costa _________________________________________________________________ Síntese: O Abandono Escolar é um grave problema que afecta a sociedade portuguesa, e é nela que se encontram as suas causas. A Escola, a Família e o Mercado de Trabalho são determinantes na escolha entre a Escola e o Trabalho. Um estudo efectuado numa localidade rural permitiu chegar a conclusões que refutam esta ideia, e ajudam a compreender a dimensão do fenómeno. Esmiuçando os resultados obtidos é possível identificar as características dos jovens mais atingidos pelo fenómeno Resumo: O abandono escolar tornou-se um problema maior dos actuais sistemas de ensino. Não sendo novo, ele requere hoje uma reavaliação, devido às mudanças profundas que as sociedades têm vindo a registar quer na socialização dos jovens quer nas exigências que estas fazem, cada vez mais, à participação destes em diferentes esferas do social. Em sociedades como a portuguesa, em que o sistema de ensino se universalizou mais tardiamente e em que o mercado de trabalho é pouco exigente em qualificações, a atracção pelo trabalho juvenil constitui um factor de peso para o abandono escolar. Um estudo recentemente realizado, cujo objectivo consistia em analisar, numa área rural (onde as taxas de abandono são mais acentuadas), as determinantes sociais desse abandono, permitiu retirar algumas conclusões que ajudam a compreender o problema, a sua gravidade e dimensão. Verificou-se que o perfil dos jovens que abandonam a escola evidencia uma pertença a famílias com baixas habilitações, baixos rendimentos e dificuldades económicas. Se estas dificuldades empurram os jovens, desejosos de autonomia financeira, para o mercado de trabalho, também a Escola assume uma parte da responsabilidade no abandono precoce pela incapacidade que ela mostra de motivar e de desenvolver o interesse dos jovens pela educação e pela formação. A análise dos motivos que levam os jovens a abandonar a escola constitui, assim, o cerne deste estudo e assenta num modelo complexo que procura relacionar entre si as variáveis Escola, Família e Mercado de Trabalho,todas elas concorrentes na determinação do fenómeno. Na sociedade de hoje muito se discute a Educação. Conforme o enunciado pela Lei de Bases do Sistema Educativo (Lei n.º46/86, de 14 de Outubro), a Educação é um direito que assiste a todos e que permite “o desenvolvimento pleno e harmonioso da personalidade dos indivíduos.”1 A Educação tem sido uma das principais preocupações dos recentes governos. Esta questão extrapolou a esfera política sendo actualmente um assunto de enorme relevância social. De facto, a Educação passou a ter uma feição social não sendo mais um assunto de caracter exclusivamente político . O fenómeno da Educação despertou o interesse da sociedade em detectar e corrigir os problemas educacionais de forma a cumprir as directrizes enunciadas na Constituição da República Portuguesa relativamente a esta matéria. Apesar de tardios, os estudos realizados nesta área permitiram desenvolver um conhecimento profundo e demonstraram a necessidade imperativa de se realizarem novos estudos, que actualizem esse conhecimento. 1 Lei de Bases do Sistema Educativo (Lei nº46/86, de 14/10) IV Congresso Português de Sociologia Uma questão relacionada com a Educação que tem merecido especial atenção nos últimos tempos é o Abandono Escolar. Este acarreta consequências nefastas para a sociedade em geral, pelo que se torna urgente identificar as causas da sua persistência. As elevadas taxas de Abandono Escolar que actualmente se verificam, para além das consequências imediatas, têm consequências que só serão visíveis no futuro. O Abandono Escolar prejudica a produtividade de um país e representa, sobretudo, um desperdício, lamentável, de vidas jovens. O Abandono Escolar não é só um problema social e educacional; ele é simultaneamente um problema económico. Numa sociedade com graves problemas sociais e económicos, muitos são os jovens que se vêem ‘empurrados’ para a vida activa, tendo que terminar a sua carreira escolar, mesmo antes de concluída a escolaridade mínima obrigatória, como tentativa de melhorar as suas condições de vida. Os jovens que hoje abandonam a formação escolar, serão os agentes de produção de amanhã. Deste modo, a produção do nosso país poderá ser ameaçada se este fenómeno não for controlado. O modo mais eficiente de travar e de combater o Abandono Escolar passa, forçosamente, pela sua prevenção, criando estruturas e bases que motivem os jovens a manter-se na escola e a concluir o percurso escolar pré- definido. É, portanto, necessário identificar os factores geradores do Abandono Escolar e o grupo alvo deste fenómeno. A importância de um conhecimento esclarecido acerca das causas do fenómeno, e dos indivíduos mais atingidos por ele, reside no facto de só assim ser possível prevenir e combater o fenómeno. Conhecer hoje, para agir no futuro, contrariando a tendência actual de ‘remediação’. Foi esta a motivação da elaboração de um estudo sobre o Abandono Escolar num meio rural, onde as taxas do fenómeno são consideradas mais elevadas. Nesse estudo pretendia-se identificar os motivos que levam os jovens a decidir pôr termo ao seu percurso escolar, optando por ingressar no mercado de trabalho. A questão que esteve presente em toda a investigação foi a de saber o que determina a decisão dos jovens quando estes optam por abandonar o sistema escolar. Para perceber as decisões que conduzem à ruptura com a Escola tem que se conhecer os jovens que as tomam, ou seja, é necessário contextualizar essas decisões. A caracterização dos jovens que abandonam a Escola é imprescindível para se identificar, atempadamente, o aluno em risco de abandono. Identificar o ‘aluno em risco’ permite que se possa agir sobre ele a fim de evitar a situação real de abandono, e conseguir que ele ‘volte’ à Escola. Não existe uma causa única do Abandono Escolar. Este só muito recentemente começou a ser objecto de estudo, no entanto, já existem várias tentativas de interpretação do fenómeno. São diversos os autores que, na esperança de encontrar uma solução para o problema, o analisam, tentando indicar as suas causas. A diversidade de interpretações torna árdua a tarefa de agrupar, num só bloco, as causas do Abandono Escolar. Dada a complexidade do fenómeno, este pode ser apreendido de inúmeras formas. Para evitar a dispersão seguiu-se o modelo teórico de João Ferrão (1992), pois este agrupa as várias causas em três focos principais: Escola, Família e Mercado de Trabalho. Numa destas três entidades reside a explicação da maioria das situações, reais e potenciais, de Abandono Escolar. Efectivamente, o estudo, desenvolvido numa freguesia rural do distrito de Aveiro, revelou que as principais causas do fenómeno estão intimamente relacionadas com as referidas esferas da sociedade. Outras causas também são apontadas para os abandonos verificados, mas, pode dizer-se que, na maioria dos casos, as situações de abandono encontram explicação num destes pontos, ou na conjugação dos mesmos. Para se chegar a esta, e a outras conclusões, foi aplicado na freguesia de Loureiro um inquérito, dirigido a jovens pertencentes ao grupo etário 16-25 anos, que pretendia absorver, sobretudo, o percurso escolar dos jovens, bem como as IV Congresso Português de Sociologia principais características do seu agregado familiar. A informação que pode ser retirada do mesmo permitiu, então, caracterizar os jovens da freguesia, e perceber como é que as entidades mencionadas anteriormente condicionam a decisão de abandonar, ou não, o sistema de ensino. Caracterização dos jovens inquiridos A análise dos dados permite-nos caracterizar os jovens que fizeram parte da amostra. Dos 150 inquiridos 55,8% deram por concluída a sua formação académica, enquanto que os restantes 44,2% se encontram a frequentar os vários níveis do sistema de ensino. Isto significa que um grande número de jovens já está inserido no mercado de trabalho, tendo deixado para trás a formação escolar. Se tivermos em conta a idade dos inquiridos (Quadro n.º1), concluí-se que o universo dos estudantes é constituído, maioritariamente, por jovens com idades compreendidas entre os 16 e os 19 anos, enquanto que, os jovens mais velhos se situam fora do mundo escolar. Ser estudante é um atributo dominante dos jovens entre os 15 e os 20 anos. A partir dos 22 anos marca-se uma ruptura muito intensa com o mundo escolar. Cerca de 79,3% dos inquiridos com 22 e 23 anos já se afastaram do universo escolar e, passando para a faixa etária seguinte, verificamos que 82,8% dos jovens já está totalmente inserido no mundo do trabalho. Podemos concluir que o universo escolar é dos mais novos, enquanto que o mundo do trabalho é dos mais velhos. Quadro nº1 Situação perante a Escola, segundo a idade Estudante Não estudante 16-17 70,0% 30,0% 18-19 66,7% 33,3% 20-21 46,4% 53,4% 22-23 20,7% 79,3% 24-25 17,2% 82,8% Quando analisamos a escolaridade dos inquiridos (Gráfico n.º1) percebemos que 28,4% têm uma escolaridade igual ou inferior ao 2º ciclo. O nível de escolaridade seguinte, ou seja, o 9º ano reúne 40,5% dos inquiridos e os jovens com o 12º ano representam 27% da população. Em relação ao ensino superior apenas 3,4% dos jovens completou este nível. Gráfico n.º1 Escolaridade do inquirido 50 40,5 40 27 30 27 20 10 0 1,4 0,7 3,4 Primária Ciclo 9ºano 12ºano Médio Superior Escolaridade do inquirido No entanto, estes valores requerem uma análise mais profunda pois eles envolvem tanto os jovens que já deram por terminado o seu percurso escolar, como aqueles que ainda frequentam o sistema de ensino. Em relação aos jovens que já estão inseridos na vida activa (Gráfico n.º2), 32,4% concluíram o 2º ciclo, 23,9% concluíram o 9º ano, 19,7% terminou o 12º ano e apenas 7% obteve um grau académico superior. Confirma-se a ideia de que os jovens que estão inseridos no mundo do trabalho têm baixas qualificações escolares, o que pode ser um indicio de abandono escolar. IV Congresso Português de Sociologia Gráfico n.º 2 Escolaridade completa, dos inquiridos activos 35 30 25 20 15 10 5 0 32,4 23,9 19,7 2,8 4,22,8 5,6 7 1,4 Primária Ciclo 7ºano 8ºano 9ºano 10ºano 12ºano Medio Superior Escolaridade completa Os valores apresentados são mais facilmente compreendidos se tivermos em conta a idade. São, sobretudo, os jovens mais velhos, isto é, com idades compreendidas entre 22 e os 25 anos aqueles que só estudaram até ao final do 2º ciclo. Se tivermos em atenção que para o grupo etário dos 24-25 anos a escolaridade obrigatória só compreendia este nível de escolaridade, justifica-se plenamente os valores apresentados. Dos jovens, com idades compreendidas entre os 16 e os 17 anos, 75% saíram para o mundo do trabalho quando completaram a escolaridade obrigatória. Este valor revela uma tendência para ‘fazer só o que é obrigatório’. Os jovens tendem cada vez mais a permanecer na escola somente enquanto são obrigados por lei (Lei n.º46/86). Ao nível do 12º ano são sobretudo os jovens com 18-19 anos aqueles que se deixam ficar pelo ensino secundário. A tentativa, ou mesmo tentativas, falhada ou falhadas de entrar na universidade poderá ser uma justificação para os jovens darem por terminado o seu percurso escolar no fim do 12º ano. A ideia de possuir uma formação ‘intermédia’, ou seja, não se ter um curso superior, mas também não se ficou só com a escolaridade mínima obrigatória, pode igualmente justificar que seja este o grupo etário onde mais vezes a ruptura com a escola coincide com o fim do 12º ano. O número de jovens que concluíram um curso superior é extremamente baixo mas, como já foi referido, necessário será analisar os dados com alguma prudência. De facto, os valores dos jovens que continuam inseridos no mundo académico pode alterar a situação. Uma parte dos inquiridos ainda continua a estudar o que poderá implicar uma mudança posterior dos valores da escolaridade. Os jovens que continuam a estudar contribuirão para que a realidade no futuro seja diferente. Como alguns deles ainda frequentam o ensino, mantendo em aberto o nível académico que poderão vir a completar, compreende-se, em certa parte, os baixos níveis de escolaridade atingidos pelos jovens inquiridos. Analisando o bloco de jovens que frequentam o sistema de ensino verifica-se que os jovens tendem a prolongar os seus estudos, demonstrando alguma preocupação a longo prazo. Efectivamente, os jovens que estão inseridos no mundo escolar situam-se, essencialmente, em dois níveis: 12º ano (26%) e Ensino Superior (32,5%), o que revela que a situação poderá vir a alterar-se futuramente. Todavia, o número de jovens da freguesia de Loureiro que já deram por terminado o seu percurso académico possuem, efectivamente, baixas habilitações escolares, situação esta que marcará para sempre as estatísticas. Haverá, sempre, uma percentagem elevada de indivíduos com baixa formação escolar. Nos futuros adultos desta freguesia haverá sempre uma parcela que retém baixas habilitações escolares. Se a questão das baixas qualificações nos níveis etários mais velhos está parcialmente entendida, as camadas mais jovens continuam a ser alvo de uma grande preocupação. Dos jovens que deram por terminado o seu trajecto escolar no 9º ano, 35,3% pertencem ao grupo etário dos 16-17 anos. Os jovens deste grupo etário estabeleceram uma ruptura definitiva com o mundo escolar optaram por iniciar uma actividade exterior ao sistema de ensino. Não se pode, portanto, IV Congresso Português de Sociologia aplicar a justificação de que ainda estão a frequentar escola, num nível académico seguinte, pois eles quebraram todos os laços existentes com a escola. Os jovens das camadas etárias mais baixas, saídos há relativamente pouco tempo da escola, são os que realmente preocupam. Esta situação reforça a ideia de que a escola, apesar das iniciativas postas em prática, continua a ter problemas no que diz respeito a manter os alunos inseridos no mundo escolar. A questão das habilitações escolares é um assunto que preocupa a todos, pela natureza especifica e delicada da situação. Apesar de se verificar que os jovens da freguesia detêm baixas qualificações académicas, não há interesse, por parte dos mesmos em alterar essa situação. Esta ‘despreocupação’ é comprovada pelos 28,6% dos jovens que afirmam que não se importam de ter deixado de estudar. Os restantes 71,4% gostavam de ter continuado o seu percurso escolar, contudo, a maioria destes não têm intenções de retomar os estudos, ou seja, para 46% a ruptura com a escola é derradeira (Gráfico n.º3). Gráfico n.º3 Opinião acerca da escola 46 50 Não me importo de ter deixado de estudar 40 30 28,6 25,4 20 10 0 Gostava de ter continuado e penso voltar Gostava de ter continuado, mas não penso voltar Opinião acerca da Escola Os jovens com idades compreendidas entre os 16 e os 17 anos, que já saíram da escola, parecem ter ficado marcados negativamente por ela, já que 50% diz não se importar de ter deixado de estudar (Quadro n.º 2). O recente abandono conduz a que 37,5% considere que, embora gostasse de continuar os estudos, não pensa voltar a faze-lo. Só uma minoria diz ter intenções de voltar a estudar (12,5%). Os jovens dos restantes níveis etários, revelam, na sua maioria, que gostariam de continuar a estudar, mas que essa hipótese não faz parte dos seus projectos de vida. Quadro n.º2 Opinião acerca da escola, segundo a idade 16-17 Não me importo de ter deixado a 50% escola Gostava de ter continuado, penso 12,5% voltar Gostava de ter continuado mas não 37,5% volto penso 18-19 25% 20-21 15,4% 22-23 25% 24-25 37,5% 37,5% 30,8% 25% 21,4% 37,5% 53,8% 50% 42,9% Caracterização da Família dos jovens inquiridos Para melhor caracterizar a população jovem de Loureiro deverá analisar-se as características do seu meio familiar. As características da família são muito importantes para entender as decisões e atitudes dos jovens, quer em relação à escola, quer em relação ao mercado de trabalho. O meio familiar pode influenciar e determinar uma situação de abandono. As características familiares que mais influenciam o percurso escolar dos jovens são, inquestionavelmente, a escolaridade dos familiares mais próximos e o tipo de profissões e ocupações que estes desempenham. Estes pontos podem condicionar o estilo de vida de um grupo familiar e, consequentemente, manipular IV Congresso Português de Sociologia o estilo de vida dos jovens. É, portanto, importante conhecer um pouco melhor as propriedades do meio familiar onde o jovem se insere. As habilitações dos pais são uma característica muito importante nesta análise. Muitos autores afirmaram que existe uma correlação positiva entre o nível de instrução dos pais e o nível de instrução do filho. Importa, então, conhecer o nível de habilitações dos progenitores dos jovens de Loureiro. A 4ª Classe é o nível de habilitações mais comum entre os progenitores da freguesia de Loureiro. A maioria dos pais e das mães concluiu o grau académico referente à Escola Primária (82% e 65,2% respectivamente), sendo que os restantes níveis apresentam valores muito dispersos (Quadro n.º3). Quadro n.º 3 Escolaridade dos progenitores Mãe Pai < 4ªClas 4ªClasse 8,5% 65,2% 2,3% 82,0% Ciclo 16,3% 4,5% + Ciclo 2,1% 2,3% 9ºano 1,4% 4,5% + 9º ano 12ºano 1,4% 0,7% 0,8% 3,0% Ens.Sup 1,4% 0,8% Como se pode perceber poucos são os pais que detêm um diploma para além do da 4ª Classe. A instrução das mães revela níveis mais ‘equilibrados’ do que os valores dos pais, pois nestes há 82% que possuem a Escola Primária, enquanto que nas mães este valor representa ‘só’ 65%. Para além da grande fasquia que se concentra na escolaridade primária, a instrução da mãe revela dois valores que indicam algum tipo de contradição: os 16,3% de mães que possuem o Ciclo Preparatório chocam com os 8,5% de mães que nem sequer concluíram a escolaridade primária. As baixas habilitações académicas dos progenitores correspondem, de certo modo, às profissões que desempenham. As profissões que dominam na população adulta de Loureiro encerram-se num conjunto de actividades que não necessitam de habilitações muito elevadas. Como era esperado, os progenitores masculinos são sobretudo empregados fabris. Se atendermos ao facto de que a freguesia está rodeada de indústria compreende-se que os pais ocupem, na sua maioria, postos de trabalho neste sector. Outro sector presente é o Comércio, onde 16,3% dos pais desenvolvem nele as suas actividades. As restantes profissões referidas têm um peso pouco significativo dizendo respeito a actividades características do sexo masculino: Serralheiro, Carpinteiro, Pedreiro, Mecânico. Com apenas 0,8% cada, as actividades de Docente do Ensino Secundário, Técnico Oficial de Contas e Programador Informático também estão presentes. Estes valores demonstram que as profissões que requerem mais habilitações estão praticamente ausentes na população adulta masculina. As profissões que a população adulta feminina desempenha acompanha a tendência atrás descrita. Há uma enorme percentagem de profissões, para as quais não são necessárias as habilitações escolares. Como é facilmente compreensível a grande maioria das mães, mantêm-se no lar assumindo o papel de ‘donas de casa’. Contudo, os 48,3% das mães que se dizem domésticas poderão não corresponder à realidade. Efectivamente, deve-se atender que algumas destas domésticas não ‘trabalham’ só em casa. Parte delas trabalha fora de casa, mas assumem-se como ‘donas de casa’, ou seja, não se consideram trabalhadoras. Em relação a este estatuto deveremos atender ainda ao facto de se incluir, em grande parte dos casos, na lida doméstica tarefas relacionadas com a agricultura. Estas mulheres desempenham uma actividade remunerada mas ‘escondem-se’ por detrás de uma máscara. Os produtos agrícolas, tais como os cereais, mas sobretudo o leite, necessário à grande empresa de laticínios presente no concelho, constituem uma fonte de rendimento relativamente forte, mas é muitas vezes camuflada. As progenitoras da freguesia de Loureiro também contribuem para o desenvolvimento do sector industrial, especialmente do sector do calçado, na medida em que, tal como nos homens, também se ocupam de actividades de cariz operário. Constituindo o segundo sector mais ocupado pelas mães, mas não fazendo ‘concorrência’ à actividade doméstica, o sector IV Congresso Português de Sociologia secundário chega a ocupar 14,7% das progenitoras oriundas da freguesia. Tal como acontecia com a população masculina, as mulheres também desenvolvem actividades consideradas muito próprias da condição de mulheres: Empregadas de limpeza, Cabeleireira, Costureira e Auxiliares da Acção Médica e Educativa. Na cauda ficam as profissões mais exigentes em termos de habilitações. Aqui, as mulheres concentram-se na docência, constituindo 4,2% do total. No seu conjunto podemos dizer que os progenitores dos jovens inquiridos detêm baixas habilitações escolares, de certo modo correspondentes às necessidades profissionais. As profissões e actividades que desempenham não exigem formação escolar. A escolaridade que os jovens gostavam de atingir As habilitações que um jovem detêm nem sempre correspondem aos seus desejos. As aspirações dos jovens podem não passar de meras utopias, ou seja, eles fabricam um sonho mas têm clara consciência de que não o poderá realizar. O diploma que os jovens mais gostariam de possuir é, sem dúvida, o do ensino superior (40,4%), demonstrando que continua em voga a valorização do ‘canudo’ (Gráfico n.º4). Gráfico n.º 4 Escolaridade que os inquiridos gostavam de atingir < 9ªano 9ºano 12ºano Ens. Sup. Outra A escolaridade que os jovens gostavam de atingir varia consoante a idade (Quadro n.º4). Os jovens mais novos demonstram que anseiam por um curso superior (40,7%), mas não descuram a hipótese de ficar pelo 12º ano (33,3%). Entre os 18 e os 19 anos os jovens parecem ser mais realistas, isto é, demonstram grande interesse em frequentar um curso universitário, mas afirmam que gostariam, somente, de terminar o ensino secundário. Esta atitude pode estar relacionada com as expectativas reais que os jovens têm. Não se pode esquecer que são os jovens deste grupo etário aqueles que estão mais próximos da possibilidade de ingressar no ensino superior, logo deverão ser estes jovens os mais conscientes das dificuldades inerentes ao processo de ingresso na universidade. Quadro n.º 4 Escolaridade que o inquirido gostava de atingir, segundo idade Acabar <9ºano Acabar 9ºano Acabar 12ºano Acabar Ens.Sup Acabar Outra 16-17 22,2% 33,3% 40,7% 3,7% 18-19 3,4% 10,3% 41,4% 37,9% 6,9% 20-21 3,7% 3,7% 40,7% 44,4% 7,4% 22-23 3,6% 25,0% 14,3% 46,4% 10,7% 24-25 3,4% 6,9% 34,5% 34,5% 20,7% Os grupos etários seguintes, que compreendem jovens com idades compreendidas entre os 20 e os 23 anos, seguem a tendência geral, podendo, todavia, fazer-se duas observações. Os jovens destas idades conhecem o valor que um grau académico elevado possui na nossa sociedade. Os jovens activos apercebem-se desse valor quando se consciencializam que suas habilitações, apesar de suficientes para as funções que desempenham, são desvalorizadas. IV Congresso Português de Sociologia Com a mesma idade os jovens que ainda frequentam o ensino, o ensino superior, apercebem-se que, efectivamente, o grau académico que virão a completar está associado a um estatuto reservado. Em ambos os casos há uma nítida percepção do valor que este grau académico têm e das ‘vantagens’ que lhe estão associadas. No grupo etário mais velho, os jovens continuam a apontar o ensino superior como o mais desejado. Para os jovens que já saíram da escola a justificação desta escolha coincide com a apresentada no escalão etário anterior para jovens activos. Em relação aos jovens estudantes, particularmente os do ensino superior, é legitima esta posição, pois ela somente revela a ansiedade de acabar o iniciado. Atingir outro tipo de grau académico, identificado, geralmente com níveis superiores à licenciatura, apresenta neste escalão etário um valor com algum peso (20,7%), algo que não se verificou em nenhum outro escalão. Este valor é compreensível se atendermos ao facto de os jovens serem ambiciosos. O grupo etário mais velho não é excepção, e por isso compreende-se que, aqueles que frequentam ou que tenham completado o ensino superior, desejem atingir um grau académico mais elevado. Quando cruzamos a escolaridade do indivíduo com a que o mesmo gostava de atingir observam-se posições muito coerentes. Quem detêm o ciclo preparatório como habilitação desejava atingir o 9º ou o 12ºano. Estes jovens não apostam no ensino superior, provavelmente porque têm consciência da improbabilidade da situação. O jovens que concluíram a escolaridade mínima obrigatória anseiam por terminar o 12º ano e um curso superior. Os que têm o 12ºano concluído concentram os seus desejos na frequência do ensino superior. Quem conclui este grau académico gostaria de atingir um nível ainda mais elevado. Através de todas estas posições é possível afirmar que os jovens são ambiciosos, pois mantêm sempre presente o desejo de elevarem a sua escolaridade (Quadro n.º5). Quadro n.º5 Escolaridade que o inquirido gostava de atingir,segundo escolaridade Acabar <9ºano Acabar 9ºano Acabar 12ºano Acabar E Sup. Acabar Outra <9ºano 7,9% 39,5% 36,8% 13,2% 2,6% 9ºano 5,6% 48,1% 42,6% 3,7% 12º ano 12,8% 71,85 15,4% Ens.Sup 20,0% 80,0% Quando questionados acerca da possibilidade de ter atingido, ou de vir a atingir, o grau académico desejado, a maioria dos jovens (64,8%), respondeu afirmativamente, enquanto que 35,2% não teve essa possibilidade, ou acha que não vai ter. As razões mencionadas para o facto de os jovens não terem tido a possibilidade de, ou que acham que vai impossibilitar, atingir a escolaridade que pretendiam são as seguintes: ter dificuldades económicas; não ter tempo para estudar; o insucesso escolar e dificuldades de aprendizagem; não ter interesse pelos estudos e, ainda, o ingresso no mercado de trabalho (Gráfico n,º5) Gráfico n.º5 Motivos que impossibilitaram, ou impossibilitarão, a escolaridade desejada Não gostar da escola 20 18,6 Ter dificuldades económicas 16,3 15 Não ter tempo 14 11,6 11,6 11,6 9,3 10 7 Dificuldades de aprendizagem/ Insucesso Não ter vontade 5 Entrar no mercado de trabalho 0 Não conseguir compatibilizar escola/ trabalho Outra Motivos para não prosseguir estudos IV Congresso Português de Sociologia Sendo estes motivos também válidos para aqueles jovens que consideram não ser possível vir a concretizar os seus desejos a nível de escolaridade, podese afirmar que os jovens desta freguesia têm alguns entraves ao prosseguimento dos estudos. Se analisarmos as razões que os jovens consideram estar na base do Abandono Escolar em geral, confirma-se uma relativa correspondência de ideias. Razões do Abandono Escolar Do ponto de vista dos inquiridos, estudantes e não estudantes, os indivíduos que abandonam a escola fazem-no, sobretudo, porque não têm condições económicas que permitam suportar as despesas escolares. Para além das dificuldades económicas (22,3%), os inquiridos apontam, também, os desejos de ganhar dinheiro (12,8%) e de independência (13,8%), que permite ao jovem usufruir de um rendimento ‘só seu’. As condicionantes económicas parecem marcar fortemente a decisão de abandonar o sistema de ensino, todavia não são só elas que condicionam tal decisão (Gráfico nº6). Na opinião dos inquiridos, a relação que os jovens mantêm com a escola influencia, do mesmo modo, a decisão de ingressar precocemente na vida activa. O facto dos jovens não gostarem da escola (12,8%), e de terem sido atingidos pelo insucesso escolar (9,6%), são, segundo os inquiridos, situações que podem determinar as situações de abandono. Gráfico n.º6 Opinião dos inquiridos acerca das razões do Abandono Escolar 21,3 12,8 Jovens não gostam da Escola 9,6 Insucesso Escolar Jovens querem ganhar dinheiro Dificuldades Econ´micas 7,4 12,8 Jovens querem independência Jovens preferem trabalhar 13,8 Outra 22,3 Quando se questionou os jovens, sobre se foi o motivo apontado por eles próprios, aquele que nos seus casos pessoais determinaram, ou poderão vir a determinar, a sua saída, a resposta recai sobre o ‘não’ (51,5%), embora a resposta afirmativa (48,5%), não tenha valores muito dispares. Os jovens que afirmam que não abandonaram, ou não abandonarão, a escola, consideram que isso se ficará a dever ao facto de terem possuído, ou de possuírem, condições e desejos que os motivaram, ou motivam para a frequência escolar (Gráfico n.º7). O facto de desejarem prosseguir os estudos (22,2%), de valorizarem a formação académica (14,8%) e de gostarem da escola (5,6%), são alguns pontos mencionados pelos jovens que não saíram, nem pretendem sair, do mundo académico. A completar este quadro harmonioso os jovens apresentam uma situação económica favorável (16,7%), indispensável em qualquer situação, e um apoio familiar (5,6%), sempre ansiado. IV Congresso Português de Sociologia Gráfico n.º7 Razões, apontadas pelos inquiridos, que possibilitaram, ou irão possibilitar, atingir escolaridade desejada 30 27,8 25 22,2 20 14,8 15 10 5 Ter apoio da família Valorização dos estudos 16,7 Situação Económica favorável Desejo de concluir estudos 7,4 5,6 5,6 Gostar da escola Vontade própria 0 Outra Razões que possibilitaram atingir escolaridade desejada A análise anterior refere-se à opinião dos inquiridos acerca das possíveis causas do abandono escolar. Pedia-se que indicassem qual a causa que, do seu ponto de vista, poderia induzir ao Abandono Escolar. As opiniões, como é do conhecimento geral, nem sempre correspondem à realidade. Neste caso, e uma vez que também opinavam os jovens que frequentam a escola, que poderão estar desfasados da realidade, deve-se avaliar as causas indicadas pelos jovens que efectivamente já estão irremediavelmente afastados do mundo escolar (Gráfico n.º8). As razões que levaram os jovens não estudantes a deixar para trás a formação ‘literária’ estão intimamente relacionadas com o sistema de ensino. O facto de não gostarem da escola, conduziu 26,7% dos jovens trabalhadores a inserirem-se mais cedo no mercado de trabalho. Ainda em relação à escola, os jovens com dificuldades de aprendizagem também se sentiram empurrados para fora dela em 18,3% dos casos. As dificuldades económicas são um ponto sempre sublinhado quando se aborda a questão do abandono escolar. A vertente económica está sempre presente, embora se divulgue e defenda que o ensino é gratuito. Em 10% dos casos o ensino acarreta despesas que o agregado familiar não consegue suportar. O apoio do agregado é importante para o prosseguimento dos estudos, tanto que alguns jovens mencionam o facto de não ter apoio familiar para justificar a sua situação de abandono. A influência do agregado não se fica só pela ausência de apoio aos jovens. A desvalorização da formação escolar, por parte dos pais, pode manipular a valorização por parte dos jovens. Em 16,7% dos casos há uma desvalorização da escola que impele para uma entrada precoce no mundo profissional. As dificuldades de aprendizagem, traduzida na maior parte das vezes em insucesso escolar é um dos factores que mais pesa aquando da decisão de abandonar os estudos. Sendo o insucesso escolar, maior parte das vezes mesurado pela reprovação, importa aqui invoca-la para melhor conhecer a sua dimensão entre os jovens de Loureiro. Gráfico n.º8 Razões que levaram os inquiridos activos a Abandonar a Escola 18,3 20 6,7 10 26,7 Dificuldades em aprender Não gostar de estudar Não era importante Família não apoiava Dificuldades económicas Estudar para outra região Outra 1,7 16,7 Reprovar, pelo menos uma vez em todo o seu percurso escolar, é uma realidade que faz parte da vida dos jovens que já entraram para o mercado de trabalho. Efectivamente, em 63,1% dos casos a reprovação está presente, IV Congresso Português de Sociologia possibilitando a constatação de que este grupo de jovens conheceu, em larga escala, o fenómeno do insucesso escolar. Surge, novamente, o facto de não se gostar da escola a justificar, maioritariamente, o insucesso escolar, a reprovação. Este motivo aparece à cabeça da lista (39%), mas seguem-lhe as dificuldades das matérias leccionadas (22%), e a avaliação considerada injusta(12,2%). Verificase, portanto, que os motivos apontados para a reprovação e, consequentemente, para o insucesso escolar, estão directamente associados à escola. As capacidades individuais não são mencionadas, sendo assim posta ‘toda a culpa’ na escola. O insucesso escolar afectou, especialmente, as faixas etárias mais baixas. São os jovens mais novos aqueles que já viveram pelo menos uma situação de reprovação. Em todos os escalões etários a maioria dos jovens que já ‘chumbaram’ é esmagadora. Só os jovens com 24-25 anos estão imunes a esse vírus (Quadro n.º6). Quadro n.º6 Reprovou alguma vez, segundo idade. SIM NÃO 16-17 75% 25% 18-19 75% 25% 20-21 76,9% 23,1% 22-23 65% 35% 24-25 40% 60% A análise das reprovações e do insucesso escolar, é importante, pois estes fenómenos estão fortemente ligados ao Abandono Escolar. Não são raros os casos em que o jovem abandona a escola em consequência de um ‘chumbo’. Marcarem um jovem com insucesso escolar, reprovando-o, pode ter implicações muito graves a nível de frequência escolar. Se esta já era difícil, sendo marcada de ‘más notas’ e ‘repreensões’, mais difícil ficará após lhe ser passado um atestado oficial de insucesso. A motivação de um jovem na escola, que têm dificuldades de aprendizagem e de integração, diminui quando ele experiencia uma situação de reprovação. A própria auto- estima do jovem é afectada, e isso pode ter consequências nefastas quer a nível do percurso escolar, quer a nível da vivência em sociedade. A relação que o jovem estabelece com o professor, ou professores, têm muita influência no modo como os jovens encaram a escola. O facto de se gostar, ou não da escola também vai condicionar o abandono escolar. O gosto pela escola passa muitas vezes pela relação Professor/Aluno. Não é só nesta relação que se baseia o gosto pela escola e pelos estudos, mas pode-se dizer que esta relação é a base de tudo o que se passa na escola. O abandono escolar está também associado ao não gosto pela escola, que está , por sua vez, associado à relação Professor/ Aluno. Logo pode-se dizer que a dita relação pode estar na origem do abandono escolar. Em Loureiro, é possível afirmar que as relações com os professores não intervêm negativamente no processo de abandono escolar. A relação que os jovens estabelecem com os professores é descrita, frequentemente, como ‘razoável’ ou ‘boa’. São mínimos os jovens que declaram ter tido uma ‘má’, ou ‘péssima’ relação com os docentes, sendo superados pelos que afirmam ter uma relação ‘muito boa’ com a docência (Gráfico n.º9). Estas posições podem surpreender; contudo se mencionar que, na freguesia de Loureiro, até à inauguração da Escola Básica dos 2º e 3º Ciclos, em 1995, o 2º ciclo era ministrado na denominada Telescola, a surpresa poderá desvanecer. Na telescola o corpo docente era constituído por dois elementos: um professor de ‘letras’ e outro de ‘matemáticas’. Os alunos que a frequentaram não enfrentaram a ‘dificuldade’ que acarreta ter que se adaptar a vários professores, com personalidades diferentes, com modos de leccionar e avaliar variados. Até esse nível escolar a relação Professor/Aluno poderia beneficiar da proximidade existente. A telescola, não diferia muito do esquema vivido na escola primária, e, exactamente por isso, não implicava grandes choques entre o professor e aluno, tão frequentes quando os jovens tem que prosseguir o seu percurso em instituições escolares em nada iguais à escola que tinham até aí frequentado. IV Congresso Português de Sociologia Sabendo que um grande número de jovens frequentou a telescola, onde não teve más relações com os professores, pode dizer-se que estas relações não conduziram ao abandono escolar. Não foi por causa da relação que os jovens estabeleceram com os docentes que eles abandonaram a escola. Gráfico n.º 9 Relação que os jovens estabeleciam com os professores 38,1 39,7 40 30 20 10 0 15,9 3,2 Péssima Má Razoável Boa Muito Boa 3,2 Relação com os professores Fortemente associada quer ao insucesso, quer ao abandono escolar está a distância Casa/Escola. As características desta freguesia permite que, a este nível, ocorram duas situações distintas. A existência de uma E.B 2 e 3 na freguesia permitiu que os jovens deixassem de ser obrigados a percorrer distâncias significativas, se quisessem frequentar o nível seguinte ao leccionado na freguesia pela telescola, ou seja o 3ºciclo do Ensino Básico. Assim sendo, quem frequenta o ensino básico do 2º ou 3º ciclo tem que percorrer uma distância, relativamente, curta. O contrário se passa a quem têm que sair da freguesia para frequentar os restantes níveis do sistema de ensino. A freguesia fica a alguns quilómetros (7KM-10KM) das cidades mais próximas, onde é leccionado o Ensino Secundário, pelo que implica o uso de um meio de transporte, particularmente o autocarro. A fraca rede de transportes existente obriga os jovens a permanecerem todo o dia fora de casa. Esta situação, nova para muitos deles, pode justificar vários problemas de adaptação ao novo meio escolar. O facto de não se estar perto de casa é o suficiente para provocar algum tipo de ansiedade, desconforto e solidão no jovem. Encontramos assim duas situações: jovens, mais novos, que frequentam a escola da freguesia, percorrem uma distância de poucos quilómetros (mim.-2;max.-5), normalmente de bicicleta ou a pé; jovens, mais velhos, que frequentam as Secundárias nas cidades vizinhas percorrem longas distâncias de autocarro. Mesmo enfrentando algumas adversidades, em relação à rede de transportes e à distância Casa/Escola, elas não afectam a frequência das aulas. O absentismo característico das zonas rurais não se sente na freguesia de Loureiro. Somente 23,5% dos jovens faltava com alguma frequência às aulas, enquanto que 47% dos jovens raramente se ausentava da escola. O absentismo fica-se a dever, sobretudo, as razões intimas da escola e relativas à disposição pessoal dos jovens. Não gostar da escola, associada à falta de vontade e ‘preguiça de ir às aulas’ justificam os valores do absentismo. Este, pelo menos em Loureiro, já não se fica a dever à necessidade de participar, ocasionalmente e sazonalmente, nas tarefas agrícolas familiares. Ocupações dos jovens inquiridos enquanto estudantes Os jovens, enquanto estudantes têm tendência para ‘entrarem’ temporariamente no mundo dos trabalhadores. São frequentes as ocasiões em que o jovem estudante acumula tarefas. É, normalmente, nos períodos de férias e nos fins- de- semana que os jovens da freguesia decidem ‘ocupar o tempo’ e ‘ganhar uns dinheiritos’. Efectivamente, 56,7% dos jovens afirmam ter tido uma actividade, remunerada ou não, enquanto frequentavam a escola. Os restantes IV Congresso Português de Sociologia 43,3% nunca tiveram que repartir o seu tempo de estudo com nenhuma outra actividade. Se as jovens têm uma presença superior aos jovens no mundo da escola, os valores das ocupações enquanto estudante demonstram que no mundo do trabalho o sexo masculino está em supremacia. Realmente são os jovens do sexo masculino aqueles que ao longo do seu percurso escolar mais experiências viveram no universo trabalho. Como era esperado, são os jovens com 16 e 17 anos aqueles que menos experiências tiveram no mundo do trabalho. Os restantes grupos etários têm participações na ordem dos 60%, ou seja, em cada escalão etário 40% dos casos não tiveram ocupações de qualquer espécie. A ocupações dominantes actividades enquanto estudantes são as seguintes: Empregado de Balcão; Empregado Fabril; Empregado de escritório; Monitora em Colónia de Férias/ Babby-sitter e ainda frequência de Estágios. Uma grande parte dos jovens que dizem ter sido Empregado de Balcão, desempenharam a sua função numa propriedade dos pais, ou familiares. Todas as outras actividades foram por conta de outrém. Com pouco peso aparecem actividades como electricista, serralheiro e trolha, que demonstram que as ajudas ‘diárias’, embora menos frequentes, ainda se verificam. A única actividade que não está associada ao mundo do trabalho, mas antes ao mundo do lazer é a de futebolista. Esta actividade, não remunerada, é a única que não está conotada com o carácter de trabalho. Todas as outras, remuneradas ou não, estão sempre associadas ao mundo do trabalho. Para uma fraca minoria, relativa àqueles que ‘trabalham’ diariamente ou nos fins-de-semana, o desempenho duma actividade extra escolar com o sentido de ‘trabalho’, implica uma divisão do tempo de estudo. Para os jovens que só desempenham essas funções em períodos de férias estas questão não se coloca. O tempo de estudo não é afectado, mas a sua vida será. Somente pelo facto de ter exercido uma actividade durante algum tempo a vida de um jovem será afectada. Pode ser afectada, como já se disse, pelo facto de ter de dividir o tempo de estudo, como pode ser também afectada no sentido de se ‘ganhar gosto ao dinheiro’ e pode ainda ser afectado o modo como se olha para o mundo do trabalho. São muitos os jovens que ‘vão trabalhar’ nas férias para poder comprar aquilo que os pais não lhes podem oferecer, e que depois sentem a diferença quando, em tempo de aulas não têm acesso a essa remuneração. Esta situação aliada a outros motivos de várias ordens alicia o jovem para o mundo do trabalho. Habituados a ter o seu próprio dinheiro, buscam um poder de compra permanente. Estas ocupações enquanto estudantes em tempo de Férias, embora não tenham tido influência directa no tempo de estudo, têm no abandono da escola. O facto de ganharem o seu dinheiro aguçou-lhes o desejo de ter poder de compra ao longo de todo o ano e não, somente, por alguns ‘meses’. Na análise realizada aos motivos que os jovens pensam ser mais frequentes nos casos de abandono escolar são referidos o ‘desejo de ganhar dinheiro’ e de ‘independência’. Esta análise vem de encontro a esta situação. Estes desejos, impulsionados aquando da experiência vivida no mundo do trabalho podem tornar-se realidade. Situações temporárias de trabalho tornam-se, ocasionalmente, situações permanentes. Não são raros os casos em que os jovens permanecem num posto de trabalho que foram só ocupar durante as férias. As ocupações enquanto estudante podem, então, condicionar directamente o abandono escolar. Os jovens que tenham vivido uma situação de trabalho têm uma maior tendência para optar pela inserção no mercado de trabalho. De modo mais indirecto, o facto de ter vivido situações reais de trabalho influencia o modo como se vê o mercado de trabalho. A experiência nesse campo elucida acerca desse mundo que era estranho aos jovens, esbatendo qualquer tipo de receio a esse nível. IV Congresso Português de Sociologia As razões que estão na base da procura destes ‘empregos de Verão’ coincidem com as razões de inserção na vida activa. Os motivos que mais atraem o jovem para a vida activa, temporária ou permanente, são idênticas. O que atraiu os jovens activos para a vida activa O que mais atrai os jovens na vida activa (Gráfico n.º10) é o facto de se poder ganhar dinheiro. Ganhar dinheiro é a razão mais apontada para justificar a saída da Escola e a inserção na vida activa. Conclui-se, então que as determinantes económicas estão sempre presentes na decisão de sair do sistema de ensino e iniciar uma profissão. Conviver com os outros (12,5%) e sentir-se socialmente útil (6,3%) não tem, efectivamente, tanto peso como as determinantes económicas no seu conjunto (‘ganhar dinheiro’-54,7% e ‘autonomia financeira’- 9,4%), mas também atraem de forma, mais ou menos significativa, os jovens para o mundo do trabalho. Usufruir de liberdade e independência (6,3%), ao mesmo tempo que se sente mais responsável (6,3%) são também razões apontadas para um jovem se inserir na vida activa. Algumas razões apontadas sobre o que mais atrai os jovens na vida activa não coincidem com as apontadas para o abandono, mas no essencial podemos afirmar que são as razões económicas as mais determinantes de tais situações. Gráfico n.º10 O que mais atrai os jovens na Vida Activa 60 54,7 50 Ganhar dinheiro Sair de casa Autonomia financeira Sentir-se socialmente útil Conviver com os outros Aumento da responsabilidade Ocupar o tempo Liberdade e independência Outra 40 30 20 10 0 9,4 1,6 6,3 12,5 6,3 1,6 6,3 1,6 Atracção pela Vida Activa Conclusão O estudo acerca do Abandono Escolar, realizado numa freguesia rural do Distrito de Aveiro, permitiu concluir que, tal como era perspectivado teoricamente, este fenómeno tem as suas origens em três instituições da sociedade: Escola, Família e Mercado de Trabalho. A escola é responsável por muitos casos de abandono, pois não consegue manter os jovens inseridos no seu sistema. A escola não consegue motivar os jovens para os estudos, pois também não é capaz de apreender as necessidades individuais de um aluno. A Escola tem tendência para excluir os alunos que não se adaptam ao seu sistema uniforme e monolítico. No sistema de ensino existem desigualdades que a escola não consegue combater. Muitas dessas desigualdades vão originar insucessos, que por sua vez afastarão o jovem do mundo escolar. Efectivamente, o insucesso escolar, nas suas várias formas, condicionam a ruptura com a escola. O insucesso contribui para que o jovem se sinta mal no ambiente escolar. O jovem começa a não gostar da escola, sendo muitas vezes obrigado pelos pais a frequenta-la. Contudo, isso não impede que ele acabe por desistir completamente de frequentar o sistema de ensino. A forma mais visível de insucesso escolar é sem dúvida a reprovação. Esta pode IV Congresso Português de Sociologia desembocar a ruptura do jovem com a escola, pois o facto de ter que repetir o ano como forma de castigo, leva o aluno a afastar-se de quem o rotula com sentido perjurativo. O absentismo, o desinteresse pelas matérias leccionadas, o mau comportamento que não possibilita estar atento à aula, o pouco tempo dedicado aos estudos, são algumas das razões que podem dar origem ao insucesso, e consequentemente ao abandono. Ainda envolvendo a escola temos que ter em conta a distância que o jovem têm que andar para chegar a ela. Quando a distância é grande o jovem tem dificuldades acrescidas. O facto de estar longe de casa todo o dia, e o tempo que gasta em transportes são só algumas particularidades que afectam quem não vive vizinho da escola. Deste modo, fica, imperativamente, afectado o tempo que o jovem pode dedicar aos estudos. Estas situações têm implicações na vida estudantil do jovem, mas não só. Se roubam tempo de estudo aos jovens, também retiram tempo de lazer. Este sendo preterido em relação ao do estudo, acaba por implicar um novo roubo. Assim, a distância casa- escola afecta duplamente o tempo dedicado ao estudo. Estas situações não são determinantes na saída da escola, mas pendem, para o lado negativo, em caso de dúvida. Em relação ao meio familiar, é inquestionável a influência que as características deste têm sobres os modos de vida dos jovens e sobre as decisões que estes tomam. A escolaridade dos progenitores está intimamente relacionada com a escolaridade dos filhos, havendo uma relação positiva entre a escolaridade, sobretudo, da mãe e a escolaridade dos filhos. As características económicas da famílias também condiciona a frequência escolar dos filhos, assim como as actividades desenvolvidas pelos pais. A componente económica pode ter intervenção directa no prosseguimento dos estudos, uma vez que existem, apesar do ensino ser, por lei, gratuito, despesas escolares que os pais não podem evitar, nem suportar. Essas ‘pequenas’ despesas podem ser incomportáveis para um grande número de famílias, que concentram, maioritariamente, as suas actividades no sector industrial. Os empregos, neste sector, são maioritariamente empregos que não permitem auferir um rendimento muito elevado, pelo que torna difícil corresponder às exigências económicas impostas pela escola. Num meio rural como é a freguesia de Loureiro, a agricultura, deixada há muito como actividade principal, é agora desenvolvida como actividade secundária. Contrariamente ao que era esperado, os jovens já não são requisitados para ajudar neste tipo de tarefas. A agricultura já não rouba braços à população jovem. Contudo os jovens não deixaram de acompanhar os pais nas suas actividades. Isto diz respeito, particularmente, aos jovens cujos progenitores desenvolvem uma actividade por conta própria. Os jovens são levados a ‘ajudar’ os pais nas suas actividades principais, ou nos conhecidos ‘biscates’, sobretudo de fim- de- semana. A desvalorização que os progenitores demonstram pelos estudos também têm alguns efeitos sobre o jovem. Numa casa onde não se valoriza a formação escolar, dificilmente o jovem se sentirá motivado para prosseguir os estudos. Se os pais pressionam o jovem para que este inicie uma profissão, este tenderá a responder positivamente à pressão. Não é possível esquecer que a pressão que os pais exercem sobre o jovem para que este entre no mercado de trabalho, têm origem exactamente no mercado de trabalho. O mercado de trabalho ‘luta’ em duas frentes: pressiona o jovem e pressiona os pais do jovem. Ao jovem ‘mostra-lhe’ as vantagens imediatas da inserção na vida activa (ganhar dinheiro; ter autonomia; ter um emprego), e ‘esconde-lhe’ as desvantagens mediatas, ou seja que só se farão sentir num futuro ‘longínquo’. Aos pais ‘convence-os’ de que um investimento a curto prazo nos filhos representa maior lucro, do que um investimento a longo prazo. Os projectos de vida a longo prazo não têm sucesso, neste tipo de família. Ao empregar mão- de- obra desqualificada, em termos de formação escolar e formação profissional, o mercado de trabalho envolvente da freguesia é um óptimo chamariz para quem corresponde a tais características. Se o mercado não IV Congresso Português de Sociologia recebesse jovens com instrução baixa, eles ‘obrigar-se-iam’ a manter-se na escola, já que não tinham outro tipo de actividade para desenvolver. O poder que o mercado de trabalho exerce sobre os jovens não é só demonstrado na altura do jovem iniciar a vida activa. Enquanto estudantes, os jovens também sofrem pressões por parte do mercado de trabalho. Os empregos de fim-de-semana e de férias são muito frequentes na freguesia. Um facto interessante que se verifica é que alguns desses empregos tornam-se permanentes antes do inicio das aulas. Por outro lado, o gosto que tomaram ao dinheiro, ao poder de compra que proporciona, induz muitos jovens a deixarem de estudar para ir trabalhar. Os jovens conhecendo o mundo do trabalho através das actividades que realizaram enquanto estudantes ficam mais motivados para a inserção na vida activa, precoce ou não. Resumindo e concluindo: É, perfeitamente, legitimo declarar que o Abandono Escolar têm os seus focos de origem em três sectores: Escola; Família e Mercado de Trabalho. As influências que cada um têm na vida do jovem podem ser decisivas. As pressões de cada sector, actuando isoladas ou conjuntamente, dão origem a situações de Abandono Escolar, que pode não ter efeitos drásticos instantâneos, mas que serão sentidos como tal no futuro. As pressões de cada entidade exerce sobre o jovem vai determinar fortemente a decisão de abandonar a escola e entrar precocemente na vida activa, ou seja, determina uma escolha fundamental: Qual dos dois saberes: Escola ou Trabalho?