Cílúl/
N? 1
UM JORNAL FEMINISTA
MAR/92
Nós somos de vários matizes.
Somos brancas, negras,
vermelhas e roxas (às vezes, de
raiva). Somos boas e más e
procuramos conjugar isto num
ser que ama e faz política com a
mesma intensidade. Somos mães,
donas de casa, operárias,
artistas... somos mulheres.
Acreditamos firmemente num
mundo mais harmônico, onde o
"ser humano" não seja
representado apenas pelo sexo
masculino, onde não existam
discriminações e desigualdades.
Num mundo onde não
exploremos a natureza como se o
planeta fosse inesgotável.
Somos Feministas. Por isso
resolvemos fazer um jornal. Não
um jornal para alguém que,
possivelmente, esteja apenas
assistindo nossa vida e nossa
luta. Um jornal para que aquela
que mora lá na fronteira saiba da
gente aqui. Queremos contar de
nós, do nosso jeito.
É que temos andado assim meio
separadas. Às vezes brigamos
entre nós. Sempre tem um
marido, um namorado, uma luta
urgente, um filho pra cuidar, o
almoço pra fazer, a roupa pra
lavar... a fábrica, o escritório, a
roça.
O mundo inventou coisas demais
para nos separar, mas nós
insistimos em ficar juntas, lutar
juntas, chorar e rir, juntas. O
jornal é pra isto! Começamos do
jeito que deu. Vamos melhorar e
contamos contigo.
Mande notícias do lado de lá!
129 operárias foram mortas pelo patrão, que ateou fogo a fábrica. Em 1910, no Congresso Internacional de Mulheres e
Copenhague, o 8 DE MARÇO se tornou o DIA INTERNACIONAL DA MULHER.
N
1l
O
QUOTAS:
AÇÃO POSITIVA
PARA SUPERAR AS
DESIGUALDADES
A fixação de quotas mínimas de
participação das mulheres nas direções sindicais e partidárias é uma
discussão extremamente atual no
movimento feminista. Não há como negar que o movimento operário e as esquerdas, deliberadamente ou não, reproduzem, nas suas instâncias, a política discriminatória
estabelecida pela classe dominante.
Mesmo que defendam um PROGRAMA FEMINISTA, secundarizam, na prática, a participação das
mulheres e, não raras vezes, menosprezam suas reivindicações específicas.
As companheiras que participam
do movimento sindical, por exemplo, acabam tendo que adaptar-se
ao que, foi convencionado, é um
"mundo masculino". Para serem
acolhidas, abrem mão de preciosos
valores femininos e, ao contrário do
que pretendem, fragilizam-se. Terminam vítimas das mais sutis e, freqüentemente, das mais escandalosas formas de discriminação.
Na verdade, a garantia de participação mínima das mulheres nas
instâncias, seja dos sindicatos, da
Central ou do partido, não significa, automaticamente, romper com
o "perfil masculino" destes movimentos. Mas é, indubitavelmente,
uma ação positiva no sentido de
fazê-lo.
DOSANDO OS INGREDIENTES
Sobre a necessidade de consolidarmos esta AÇÃO POSITIVA, a
companheira Lígia Mendonça, militante feminista de Curitiba, afir-
mava, durante o I ENCONTRO
REGIONAL DE BANCÁRIOS
SOBRE FEMINISMO, realizado,
no ano passado, em Novo Hamburgo:
"Há décadas as mulheres lutam
por igualdade em casa e na sociedade. Muito já conquistamos, embora em situação de desvantagem
em relação aos homens: somos parte expressiva do mercado de trabalho, quebramos preconceitos, ampliamos nossos espaços. Travamos
uma luta diária e incansável".
No entanto — diz ela —, "no
mundo inteiro, o movimento feminista coloca-se outros questionamentos: basta ser igual aos homens? O mundo masculino pode
garantir, além de igualdade, felicidade? Devemos abrir mão de nossa feminilidade para competir com
Experiências Sindicais
ITÁLIA ' O último Congresso da CGiL aprovou quota
mínima de participação de mulheres em SOft (nas direções) e 25% (nas secretarias).
Além disso, nos estatutos da CGIL foi aprovada uma norma anti-discriminatóría, prevendo a presença de, pelo menos, 40% de homens ou m ulheres nas diversas instâncias
(Comissões de Trabalhadores, Comissões de Negociação.
delegações para Congresso, Cursos de Formação, etc).
Esta proposta visa transformar a política de quotas em
igualdade de participação de acordo com a representação
nas bases.
BRASIL • OIV CONCVTdefiniu em seu Estatuto: "aprofundar a discussão sobre as quotas de participação das mulheres nas instâncias de direção e representação da CUT.
a exemplo de experiências de centrais sindicais de outros
países".
Em conjunto com a direção nacional da CUT, a COMISSÃO NACIONAL SOBRE A QUESTÃO DA MULHER
TRABALHADORA deve estabelecer um CALENDÁRIO
de discussão e debates nas instâncias da Central, com o
objetivo de aprofundar este tema.
Experiências Partidárias
FRANÇA ' Partido Socialista francês aplica um critério
de quotas que deítne percemagem mínima de mulheres nas
listas eleitorais e nas instâncias de direção, desde 1973.
ALEMANHA * Partido Social Democrata aprovou, em
1988, a implantação de uma política paulatina para chegar à quota mínima de pa rticipação equivalente a 40%.
para mulheres e homens (q uando forem minoria), nas listas para eleições parlamen tares, cargos de direção e dele-
MEXICO * O Partido Revolucionário dos Trabalhadores
(PRT) também introduziu quota mínima de participação
das mulheres em suas direções.
BRASIL* O Partido dos Trabalhadores aprovou, no seu
I Congresso Nacional (1991)', a implantação de quota mínima obrigatória de 30% de mulheres na composição das
direções partidárias.
eles? Parece que não. Há que se dosar estes ingredientes. Há que se resgatar elementos de equilíbrio entre
o mundo masculino e o mundo feminino. Há, enfim, que se construir
um mundo novo, com um novo homem e uma nova mulher".
RURAIS EM
BRASÍLIA
No próximo dia 9, as companheiras de Movimento Rural irão a Brasília exigir do Congresso Nacional a derrubada do veto presidencial ao artigo da
Constituição que garante salárkwnatemidade às
trabalhadoras rurais. Está sendo marcada, também,
uma audiência com o Ministro da Saúde, para tratar da 9? CONFERÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE.
No DIA INTERNACIONAL DA MULHER, 8
de março, as companheiras rurais realizarão assembléias municipais para tratar das suas questões específicas e eleger as delegadas à 2? ASSEMBLÉIA
ESTADUAL DO MOVIMENTO DE MULHERES TRABALHADORAS RURAIS, marcado para os dias 7, 8 e 9 de abril, em Passo Fundo.
MULHERES
DIRIGENTES
DISCUTEM
SUA SITUAÇÃO
Ao debaterem a situação de quem, além de mulher, é sindicalista, companheiras metalúrgicas de
Porto Alegre, Canoas, São Leopoldo, Passo Fundo e Caxias experimentaram, nos dias 15 e 16 de
feveiro, um exercício diferente.
As conclusões sâo, no mínimo, interessantes.
Constataram, por exemplo, que, nos últimos anos,
com a priorização dos aspectos econômicos das
Campanhas Salariais, houve um retrocesso no que
se refere às reivindicações específicas das mulheres;
que as fábricas e os sindicatos são ambientes eminentemente masculinos e que não há, por parte das
direções, investimento no sentido de romper com
este perfil, abrindo espaço à intervenção das mulheres; que, nas fábricas, além da discriminação salarial, das "cantadas" dos chefes e do trabalho insalubre, existe controle sobre o corpo e a saúde das
companheiras.
Simultaneamente à definição de um plano de lutas específico para o trabalho com mulheres na categoria, foi ratificada a necessidade das sindicahstas sistematizarem novas discussões, unificarem
propostas e redobrarem sua capacidade de responder, em conjunto, às adversidades. O ENCONTRO
DE MULHERES EM DIREÇÕES DE SINDICATOS METALÚRGICOS foi realizado em Caxias
e promovido pelo DEPARTAMENTO DOS METALÚRGICOS DA CUT.
LEIS MUNICIPAIS
PUNEM ATOS DE
DISCRIMINAÇÃO
"Uma lei iníqua" (malévola, perversa, extremamente injusta, segundo o Aurélio) foi a qualificação encontrada pelos empresários de Novo Hamburgo para o projeto de lei que adota o princípio
da igualdade entre homens e mulheres e prevê sanções aos estabelecimentos comerciais e industriais
que pratiquem atos de violência e discriminação
contra a mulher.
Noutros municípios, onde projetos sobre o mesmo tema foram apresentados, também houve fortes reações por parte da burguesia. Apesar das baixarias, em Porto Alegre, Novo Hamburgo e São
Leopoldo a proposta transformou-se em lei. Em
Santo Cristo, as companheiras estão tentando reverter a decisão do Presidente da Câmara, que declarou rejeitado o projeto sem ter havido nenhum
voto contrário.
MÍSTICA
FEMININA
196 mulheres, militantes de pastorais, participaram, no mês passado, do ENCONTRO DE MÍSTICA FEMININA DA PASTORAL POPULAR.
Segundo Ana Isabel de Moraes Alfonsin, uma das
organizadoras, "o encontro é um momento de reflexão, do ponto de vista da mulher pobre, sobre
como se expressa a opressão no capitalismo e na
sociedade machistas e como dar a volta por cima".
"A mística — explicou ela — é a força que as
mulheres têm e que vem de Deus, iluminando nossa caminhada''. Disse, ainda, que o objetivo do encontro (esta foi a quinta edição) "é animar as mulheres a encontrarem o caminho da sua libertação''.
...SE ME DEIXAM FALAR.
fruto da sociedade machista, e convencê-los
de que, a exemplo deles, lutamos contra a exploração;
4?) Enfrentar os patrões, que admitem, até,
serem questionados por sindicalistas homens,
mas jamais por uma mulher, o que, muitas
vezes, é reforçado por nossos companheiros;
5?) Enfrentar o mais terrível de todos os
desafios: o sindicalista-homem.
O sindicalista-homem que:
— luta contra a exploração, mas não mede esforços quando se trata de explorar a potencialidade das mulheres no Sindicato;
— luta por um sindicato de massa (de homens) e nada faz para garantir a participação das mulheres nas direções sindicais;
— luta por igualdade, mas tem uma relação desigual com as sindicalistas-mulheres e
não reconhece que se temos diferenças é porque não tivemos as mesmas oportunidades
ou condições iguais na sociedade;
— o sindicalista-homem que diz lutar por
uma nova sociedade, mas que é incapaz de
construir, com sua companheira, uma nova
relação em casa.
Nesta trajetória, vamos aos tropeços,
agüentando, resistindo, às vezes esmorecendo, mas sempre lutando para construir uma
nova relação. Muitas vezes, acabamos nos
brutalizando, perdendo a nossa feminilidade, a nossa cumplicidade com as demais mulheres, para conseguir sobreviver.
Uma mulher vítima de violência tem inúmeras
razões para denunciar o agressor e outras tantas para não fazê-lo. Por que denunciar, todas sabemos.
Mas, por que não?
Primeiro, porque as delegacias de mulheres (nem
falamos das demais), embora sendo uma antiga reivindicação do movimento feminista, não dispõem
de estrutura (material e humana) para propor alternativas às vítimas, que não seja o retomo ao lar;
segundo, por causa dos filhos; terceiro, por instabilidade financeira e assim por diante. Talvez a ordem de preocupações mude de mulher para mulher, mas a verdade é que, em todos os casos, são
bastante concretas e intímidadoras.
Foi a partir destas constatações, levantadas pelo
movimento de mulheres, que a Câmara de Vereadores de Porto Alegre aprovou e a Administração
Popular está executando o PROGRAMA DE AI^
BERGUES PARA MULHERES VÍTIMAS DA
VIOLÊNCIA.
VIOLÊNCIA NUM PUNO GLOBAL
"O que ocorre, normalmente—comenta Vânia
Araújo Machado, assessora técnica da FESCFUNDAÇÃO EDUCAÇÃO SOCIAL E COMUNITÁRIA —, é que as delegacias, mesmo recebendo as denúncias de maus-tratos, não têm como dar
assistência às vítimas. Nos albergues, queremos trabalhar com a questão da violência num plano mais
global. Lá, as mulheres e seus filhos terão atendimento psicológico, jurídico, participarão de oficinas e desenvolverão trabalhos profissionalizantes.
Tudo isto com o objetivo de reintegrá-las à sociedade, ajudá-las a reformular suas vidas e a resgatar sua dignidade".
EMERGENCIAL E PROVISÓRIO
A princípio, o PROGRAMA prevê dois tipos de
atendimento:
ALBERGUE EMERGENCIAL - terá vaga para 14 mulheres e filhos (no máximo, três) até 12 anos
de idade,xom permanência de 10 dias. "A triagem
— segundo Márcia Camargo, coordenadora do
PROGRAMA - será feita pelo HPS, pelas d legadas de mulheres e outros setores organizados, :omo a Coordenadoria das Promotorias Comunitárias".
ALBERGUE PROVISÓRIO ou CASAABRIGO — receberá 10 mulheres (e filhos), a título experimental, mas dispõe de 25 vagas. "Depois de três meses, que é o tempo de permanência
no abrigo, vamos preencher todas as vagas disponíveis", explica Márcia Camargo.
Vânia informa, ainda, que "no abrigo ficarão
as mulheres que correm risco de vida ou que estejam dispostas a romper com suas relações. A administração e coordenação das tarefas serão responsabilidade das próprias albergadas, num regime de
autogestão", finaliza.
CONTATOS
* Maria Eunice Dias Wolf
Nós, mulheres sindicalistas, entre tantas
outras formas de opressão, somos obrigadas
a enfrentar, no mínimo, CINCO DESAFIOS
para continuarmos sindicalistas:
1?) Temos que convencer nosso marido ou
companheiro, de quem a gente gosta e quer
ficar junto, que o sindicato e o casamento
não são incompatíveis e que não precisamos
fazer opção entre um e outro;
2?) Enfrentar as esposas dos nossos companheiros sindicalistas, que nos vêem como
rivais. Além de convivermos mais tempo com
seus maridos, eles são incapazes (ou não têm
interesse em fazê-lo) de conscientizá-las sobre a importância da sua luta;
3?) Enfrentar os peões, que também são
ALBERGUES RARA
AS VÍTIMAS
DE VIOLÊNCIA
Mas será que é assim que a gente busca
o SOCIALISMO?
Uma coisa nós temos certeza: não existirá
SOCIALISMO sem FEMINISMO. Por isto, lutamos pelo direito de dizer "não"; pelo direito de sair à rua sem sermos importunadas; pelo direito de educar nossos filhos
sem preconceitos machistas; pelo direito de
rir, de chorar e gritar, sem sermos taxadas de
vulgares ou vagabundas; pelo direito de estar nas direções dos sindicatos e sermos respeitadas como seres que também pensam e
sabem fazer política.
*(A companheira Eunice é tesoureira
do Sindicato dos Metalúrgicos dé
Canoas)
As companheiras interessadas em conhecer mais
de perto o PROGRAMA DE ALBERGUES podem fazer contato pelos fones (051) 226.8966 e
226.8954, na FESC.
MULHERES EM AÇÃO é uma publicação do LUA NOVA — Núcleo de
Ação Sindical e Feminista. Jornalista Responsável — Zaira Machado/Reg. Prof. 940147v. Equipe de
Edição — Helena Bonumá, Isabel
Freitas, Lurdes Rossoni, Suzana Pires.
Colaboraram
nesta edição: Anita Lucas de Oliveira, Jaqueline Balconi, Kátia Santorium, Luciana Coronel, Luiza Finken,
Rosane da Silva, Roseli Kern. Fotocomposiçào e impressão — Editora
Fotoletras. Tiragem — 3.000 exemplares.
UM 8 DE MARÇO EM DEFESA DA VIDA
Será que a nossa vida é melhor do que
era a vida das nossas avós?
Por um lado, é óbvio que o
movimento de mulheres garantiu
liberdades e oportunidades que não
existiam há 30, 40 ou 50 anos atrás.
Por outro, são estarrecedores os dados
sobre violência contra a mulher, sobre
o número de companheiras que
morrem em conseqüência de abortos
clandestinos, sobre esterilização em
massa, condições de trabalho, etc, etc,
etc
Num país onde, a cada três minutos,
morrem duas crianças menores de um
ano de idade; onde 21,8% dos bebês
(até cinco meses) são desnutridos, onde
40*70 da população passam fome; onde
90% dos partos nas maternidades são
operações cesarianas; onde metade dos
seus habitantes são desdentados; onde
milhares de pessoas são vítimas, todos
os anos, de malária, leptospirose,
esquistossomose, febre amarela, lepra,
tétano, dengue, cólera, n anis mo ... num'
país com estas características, a luta
das mulheres assume um papel
determinante na própria luta de
classes, na luta contra a exploração e a
miséria.
No meio de tantas adversidades, parece
impossível vislumbrar uma saída, mas
ela existe. Afinal, foi das adversidades
que emergimos para um 8 DE
MARÇO EM DEFESA DA VIDA.
DESOE 87, MULHERES LUTAM
MRA IMPLANTAR OPAiSM
Desde 1987, o MOVIMENTO ESTADUAL DE MULHERES TRABALHADORAS RURAIS na Região das Missões, Alio
Taquari e Serra discute e reivindica a implantação do PLANO DE ASSISTÊNCIA INTEGRAL À SAÚDE DA MULHER PAISM. Com a política de municipalização
da saúde, estas lutas assumiram um caráter
mais localizado e, a partir da entrada de várias companheiras nas comissões municipais
de saúde, obteve-se avanços significativos,
exemplo disso é Santo Cristo. Segundo Noeli
Schommer, há três anos o município já conta com o serviço de prevenção ao câncer.
"Infelizmente, no entanto, a implantação
do PAISM, via de regra, não saiu do papel.
Os prefeitos, quando pressionados pelos movimentos que tratam da questão da mulher,
tentam se eximir da responsabilidade, argumentando que não há repasse de verbas por
parte do Governo Federal. Neste jogo de
empurra-empurra, quem perde são milhões
de trabalhadoras que, não tendo acesso ao
caro e elitizado sistema privado de saúde, padecem diante da omissão e da negligência",
comenta.
Foi com o objetivo de agilizar a implantação do Plano que, no ano passado, as companheiras do MOVIMENTO SOSAGRICULTURA entregaram ao Governador do Estado uma pauta de reivindicações
específicas sobre a saúde da mulher. Recentemente, a Comissão de Mulheres do Sindicato dos Sapateiros de Ivoti realizou um seminário, a fim de obter uma radiografia da
categoria e articular lutas a nível municipal.
pecialmente nas questões ligadas à reprodução", explica.
' Através de uma pesquisa observamos que
as mulheres rurais não fazem exames de prevenção e que as razões vão desde a falta de
informação até o funcionamento precário
dos postos de saúde e o fato de, nos hospitais, elas serem tratadas como se não tivessem aparelho reprodutivo". A partir destas
constatações — continua Marlene —, "fomos às prefeituras, mas vimos que dificilmente havia destinação orçamentária para este
fim. Entregamos, então, uma pauta de reivindicações ao Governador, que nos encaminhou à Secretaria da Saúde e, daí, à Divisão
da Mulher".
Os primeiros resultados destas tratativas
começam a surgir. "Neste mês de março, vamos fazer o primeiro treinamento de agentes de saúde da mulher. O MOVIMENTO entra com o material humano, assessorado pela
Secretaria. São mais ou menos 30 companheiras que, depois, farão um trabalho de
orientação nas comunidades", diz.
A preocupação do MOVIMENTO DE
MULHERES TRABALHADORAS RURAIS não se restringe, entretanto, à "informação". Segundo Marlene, "estamos fazendo um levantamento de quantos postos de
saúde existem no Estado, quantos funcionam
e quantos não funcionam. A Secretaria, por
sua vez, assumiu o compromisso de tomar
providências. Assim, aquelas comunidades
onde não existem postos ou estão desativados serão atendidas por unidades móveis".
Embora dando "um voto de confiança ao
Secretário", Marlene faz questão de frisar que
"as mulheres rurais continuam mobilizadas,
já que esta é a única forma de pressionar o
Governo a assumir suas responsabilidades".
I0LANDA: "NÃO HÁ
VONTADE POLÍTICA"
Segundo IOLANDA MENTA GIASSON,
de Lajeado, assessora do MOVIMENTO DE
MULHERES TRABALHADORAS RURAIS e militante do MOVIMENTO DE
MULHERES TRABALHADORAS URBANAS, "a implantação do PAISM é uma
necessidade e corresponde às aspirações das
mulheres na área de saúde". Infelizmente, diz
ela, "apesar de ser um direito constitucional,
nada acontece. Como qualquer outra política pública, o PAISM não sai do papel".
Enquanto o Governo Collor sucateia o sistema de saúde e de seguridade pública, "nos
postos de atendimento, as mulheres têm que
disputar fichas de consulta, que não passam
de três ou quatro na maioria dos municípios", denuncia lolanda. "A situação é grave demais".
A implantação do PAISM é, na sua opinião, "um ponto fundamental do movimento
de mulheres, hoje, e só será conquistada com
muita luta e muita garra". Embora sendo um
programa oficial, "ele nasceu da mobilização das mulheres em todo o país e se ainda
não foi posto em prática é porque não há,
por parte das autoridades, vontade política
de executá-lo", finaliza.
iRLENEiWDASCiOSEÉ TEMAS POLÊMICOS,
WEMlMIWTir MAS TUDO A VER COM
A SAÚDE DA MULHER
MARLENE PASQUALI, da Região do
Alto Uruguai, integra a COORDENAÇÃO
ESTADUAL DO MOVIMENTO DE MULHERES TRABALHADORAS RURAIS e
participa, desde o Governo Samey, da luta.
pela implantação do PAISM e pela municipalização da sáude. "O Plano prevê repasses de verbas federais aos municípios para o
atendimento básico à saúde da mulher, es-
Embora o PAISM dê ênfase à gravidez, à
prevenção do câncer e ao planejamento familiar, questões essenciais no que se refere
à saúde da mulher, há outros aspectos que
não podem ser ignorados. Temas como o
"aborto" e a "Aids" ainda são considera-
dos "tabus" pela sociedade e tratados com
hipocrisia pelas autoridades sanitárias.
TRÊS HOMENS PARA CADA
MULHER CONTAMINADA
, Uma pesquisa divulgada recentemente pela
Escola Nacional de Saúde Pública mostra
que a proporção de mulheres contaminadas
pela Aids diminuiu de 10 homens por mulher, em 84, para cinco homens por uma, em
89, e há indícios de que, hoje, existam apenas três homens para cada mulher doente.
Segundo a pesquisa, 45% das mulheres contraíram o vírus através de transfusões de sangue e 30% em relações sexuais, sendo que a
maior parte das doentes é jovem. As donas
de casa representam 34% do total, asempregadas domésticas 14,4% e as prostitutas apenas 6,7%.
10% DE ABORTOS DO MUNDO
No que se refere ao aborto, os dados (oficiais) também são dramáticos. Estimativas
da Organização Mundial da Saúde — OMS
— dão conta de que, anualmente, quatro milhões de abortos são praticados no Brasil, o
equivalente a 10% do total no mundo. A partir da análise do quadro clínico de pacientes
femininas em período de fertilidade (14 a 40
anos), constatou-se que, destas, 400 mil mulheres morrem ou ficam com seqüelas irreversíveis, como tumores ou perda da fertilidade.
"REAVALIAÇÃO DAS
PRIORIDADES"
"A criminalização do aborto, levando
enormes contingentes femininos à prática
clandestina, contribui com parcela importante na mortalidade materna", declarou o diretor do Conselho Federal de Medicina, Antônio Henrique Pedrosa Neto, à revista Súmula, publicação da Fundação Osvaldo
Cruz. "Da mesma forma, a prática abusiva
e às vezes criminosa de cesarianas tem contribuído enormemente para o aumento deste índice", afirmou.
"A mortalidade materna em nosso país —
acrescentou Pedrosa — deve submeter-se a
uma urgente reavaliação das prioridades na-
cionais, com medidas eficazes para a resolução dos grandes problemas sociais e econômicos do nosso povo".
Os estudos feitos até agora evidenciam e
reforçam a estreita relação existente entre o
nível social e econômico da população e seu
coeficiente de mortalidade. Há, por exemplo,
uma clara predominância de mortalidade
materna nas regiões Norte (14,7% dos óbitos de mulheres) e Nordeste (7,1%), contra
3,6% registrados nas regiões Sul e Sudeste.
44% DE MULHERES
ESTERILIZADAS
Dados da Coordenação de Saúde
Materno-Infantil do Ministério da Saúde revelam que 44% das mulheres em idade fértil
estão esterilizadas, no Brasil, através de ligaduras de trompas. De acordo com Neusa
Heinzelmann, coordenadora adjunta do
PAISM, em Porto Alegre, estas informações
já foram confirmadas pelo instituto de pesquisas IBASE. No Rio Grande do Sul, 22,6%
das mulheres encontram-se na mesma situação.
Neusa comentou, ainda, que está para ser
regulamentada, em Porto Alegre, uma lei de
Planejamento Familiar, que dá acesso unK
versai a todos os métodos anticoncepcionais,
bem como às informações necessárias para
que cada mulher faça a melhor opção. O
atendimento será efetuado nos 10 postos de
atendimento do município.
Os dados são alarmantes e urge que o movimento feminista priorize esta questão.
CRECHE:
UM PROBLEMA DE MULHER
O Governo, historicamente, tem fugido da
responsabilidade de garantir assistência às
crianças e aos idosos. Encara a maternidade, não como uma função social, mas como
uma opção individual.
Na nossa sociedade, a tarefa de cuidar dos
filhos é da mãe, tanto que, nas raras empresas que concedem o auxílio-creche, este direito é negado aos homens.
Muito mais freqüente é a discriminação à
mulher no mercado de trabalho, seja pela opção de ter filhos, seja pela simples possibilidade de tê-los. Demissão de mulheres logo
após o parto ou mesmo quando se casam são
comuns, assim como a obrigatoriedade de
exames que comprovem a não-gravidez ou a
exigência absurda de atestado de esterilidade.
Em casa, as mulheres vivem a extensão
destes problemas, já que, geralmente, são elas
que assumem o cuidado dos filhos e as tarefas domésticas.
UM CONCEITO ESTABELECIDO
Mas se é importante a consciência da discriminação/exploração, é evidente, também,
que trata-se de uma lógica estabelecida e incentivada pela classe dominante. Cabe a homens e mulheres, pais e mães, trabalhadores e trabalhadoras, romper com tais conceitos. Igualmente, cabe ao Estado e às empresas a obrigação de oferecer condições para
o desenvolvimento integral das crianças, no
mínimo, durante o espaço de tempo em que
seus pais estão trabalhando.
LEI PRECISA SER
REGULAMENTADA
Definição sobre "a creche que queremos",
realização de seminário sobre educação e encaminhamento de um abaixo-assinado pela
regulamentação do art. 7? da Constituição,
são propostas aprovadas pela COMISSÃO
ESTADUAL SOBRE A QUESTÃO DA
MULHER TRABALHADORA DA CUT,
em debate realizado no último mês de janeiro.
Além de defender a assistência gratuita aos
filhos dos trabalhadores, as mulheres discutem o funcionamento das creches e préescolas, desde como são tratadas as crianças
até os aspectos pedagógicos e psicológicos
deste atendimento.
O abaixo-assinado, por sua vez, tem a finalidade de pressionar o Congresso Nacional e o Ministério da Educação a regulamentar o inciso XXV, art. 7?, capítulo II, da
Constituição, que trata dos Direitos Sociais.
A exemplo de tantos outros artigos de interesse dos trabalhadores, o texto constitucional é genérico no que se refere às creches e
não explicita sua aplicabilidade (quem são os
responsáveis, quais as punições àqueles que
descumprem a lei, etc).
PRIORIDADES
DO PAISM
O que prevê o PLANO DE ASSISTÊNCIA INTEGRAL À SAÚDE
DA MÚLHER/PAISM:
— Sexualidade e saúde dos adolescentes;
— Acompanhamento pré-natal e à
gravidez;
— Assistência ao parto;
— Programa de aleitamento, materno;
— Prevenção do câncer de colo de
útero e mama;
— Prevenção de doenças sexualmente
transmissíveis;
— Planejamento familiar;
— Métodos de controle de natalidade;
— Assistência à menopausa.
Recomendados/Livro
Eles por eles
"O namorado ciumento
suporta melhor a doença da
mulher amada do que a liberdade dela".
Mareei Proust
(Eseritor francês -1871-1922)
Elas por eles
"Os homens sempre querem ser o primeiro amor de
uma mulher; as mulheres
gostariam de ser o último
caso de um homem".
Oscar Wilde
(Escritor irlandês -1854-1900)
Elas por elas
' 'Quem sabe o que as mulheres poderão chegar a ser
quando, finalmente, forem
livres delas mesmas?"
Betty Friedan
(Escritora americana -1921-)
AMOR NOS
TEMPOS
DO CÓLERA
Um título atual para um tema
atual: o amor na velhice, numa
época difícil. Neste livro, que é tido por alguns como a autobiografia de GGM, o autor se detém no
cotidiano, na rotina do casamento e conclui que sempre é tempo
de amar. Não abandona, entretanto, o fantástico, as situações absurdas (pelo menos a primeira vista), a realidade exagerada, que é
marca da sua literatura.
Em "O Amor...", GGM narra
os detalhes, as pequenas minúcias
da vida em comum,4 os hábitos repetidos dia após dia, as desavenças e os desaforos quase inocentes de quem ama, os passos incertos da velhice.
"Coisa bem diferente teria sido a vida para ambos — diz ele,
nas primeiras páginas do livro —
se tivessem sabido a tempo que é
mais fácil contornar as grandes catástrofes matrimoniais do que as
misérias minúsculas de cada dia.
Mas se alguma coisa tinham
aprendido juntos era que a sabedoria nos chega quando já não
serve para nada".
Um livro fascinante, com um fi-
nal surpreendente, bem ao estilo
de Gabriel Garcia Marques.
BENDITA
MULHER ENTRE
OS FRUTOS
mas para enfrentar os soldados que,
acreditavam, o rei Luiz XVI estava
mandando de Versalhes. O administrador não sabia o que fazer. A multidão arrombou os portões e se apoderou de 40 mil fuzis e 12 canhões.
A pólvora estava na formidável fortaleza da Bastilha, transformada em
depósito e prisão. Para lá correram
todos, em busca de munição.
Pois antes de anoitecer a fortaleza caiu e, com ela, veio abaixo todo o Antigo Regime, representado
na figura do rei e em sua corte de
aristocratas inúteis. A multidão que
cercou a Bastilha era muito maior
do que os 8.000 reunidos na madrugada, na Praça dos Inválidos. Mas,
conforme cuidadoso recenseamento feito depois pela Assembléia Nacional, "os vencedores da Bastilha"
foram não mais do que 800, registrados e cadastrados, com nome,
endereço e profissão.
Assim, pode-se saber, com segurança, que entre eles estavam alguns
raros burgueses (três industriais,
quatro comerciantes e um cervejeiro), muitos pequenos produtores independentes, artesãos, oficiais de
corporação, militares em profusão.
Um terço, pelo menos, era de assalariados da manufatura e da construção. O mais jovem tinha oito
anos e UMA ÚNICA MULHER,
LAVADEIRA, IMPEDIRIA, AO
SER RECENSEADA, QUE A
QUEDA DA BASTILHA ENTRASSE PARA A HISTÓRIA
COMO UMA AVENTURA VIVIDA APENAS PELOS HOMENS.
Na madrugada do dia 14 de julho de 1789, oito mil parisienses irados estavam reunidos na Esplanada dos Inválidos. Eles queriam ar-
(Hobsbawm, J. Eric — "A Era das
Revoluções", Editora Paz e Terra,
1986).
{O AMOR NOS TEMPOS DO
CÓLERA, de Gabriel Garcia
Marquez, Editora Record, 429
págs.)
Conhecendo».
A nossa História
SUBVERSÃO NO PARAÍSO
Criada do sangue-menstruação e da saliva-desejo, Lilith (a esquecida primeira
mulher de Adão) é o arquétipo do
erotismo e dos desejos mais primitivos. Ao contrário de Eva, que foi
expulsa do Éden, Lilith se revoltou
e foi embora. Enquanto a primeira
optou apenas por desobedecer a ordem de não provar o fruto da árvore proibida, a segunda questionou
a superioridade de Adão e exigiu
igualdade. Eva cedeu à tentação, é
certo, mas por seu servilismo a
Adão, dificilmente escaparia ao escárnio de Lilith.
Na versão hebraica, Lilith foi
criada com pó negro e escrementos,
constituindo-se num ser essencialmente instintivo e realizador da natureza animal, portanto, contrário
ao divino, ao sagrado.
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Lilith era inconformada com a
desigualdade. Quando fazia amor
com Adão, indagava: "Por que devo deitar-me embaixo de ti? Por que
devo abrir-me sob teu corpo? Eu
também fui feita do pó e, por isto,
soü tua igual". Percebendo que
Adão não atenderia a seus apelos,
praguejou contra Deus, fez acusações ao marido e se foi.
É o momento em que o sol se
despede e a noite começa a descer
seu manto de escuridão sobre a terra. Adão sente a dor do abandono,
procura por Lilith, mas não a encontra.
Irredutível e inconformada, ela
desafiou o homem, profanou o nome do Pai e foi viver com as criaturas das trevas, deixando para trás a
monotonia do paraíso. A partir daí,
Lilith assume plenamente sua natu-
reza de demônio feminino, cuja sexualidade diabólica se volta contra
todos os homens, mas que é símbolo, também, de rebeldia e insubmissão.
O mito evoluiu sob várias formas,
atendendo as necessidades de cada
época e não se pode afirmar que as
bruxas/demônios tenham sido banidas deste mundo. A Lua Negra-
Lilith ressurge no espírito dos movimentos reivindicatórios da mulher, fruto do despertar da sua consciência, criando novas bases para a
associação homem-mulher, onde a
supremacia masculina cede espaço
para o equilíbrio consciente.
(Texto subsidiado em artigo de Romeo Graziano Filho, "LILITH: A
Face Oculta de Eva").
OPINIÃO:
Helena Bonumá
Temos marcado cada vez
mais nossa presença na cena
social, temos nos organizado
e lutado contra as diversas faces que assume nossa opressão. Construímos uma identidade de mulheres e de movimento. Afirmamos nossos
interesses comuns e definimos
nossos direitos ao corpo, à sexualidade livre, ao trabalho, à
saúde, à não-violência, enfim,
à igualdade.
Passamos por todo um processo de autoconhecimento
como gênero subordinado,
como marginalizadas das esferas públicas e de poder, como excluídas em nossos interesses específicos na história
da sociedade.
Neste processo, enriquecemos
a concepção de política, superando a visão que só percebe
a contradição de classe e omite a de gênero, sem compreender a ligação estreita que há
entre o público e o privado, o
trabalho assalariado e o doméstico, o coletivo e o individual, o cotidiano e a história.
Questionamos a visão tradicional de ação política, queremos a transformação de todas as formas desiguais de relação de poder onde quer que
se expressem, família, trabalho, sindicato, partido, etc...
Resgatamos o cotidiano como espaço da vida e da política.
Construímos novas formas e
novos espaços de ação coletiva, de luta e mobilização.
Aos poucos nos constituímos
enquanto sujeito-político.
Tivemos diversas conquistas.
Mas temos que admitir que
não há mudanças estruturais
significativas do papel da mulher na sociedade, na família
e no trabalho doméstico. As
mudanças são na forma de
comportamento e nos direitos
formais de cidadania.
São importantes mas não alteram significativamente nossa condição de subordinação.
Ainda enfrentamos um cotidiano de desigualdades e
opressão, ainda temos muito
que superar.
Certamente, isto passa por
nossa afirmação como mulheres e por, partindo da diversidade que nos caracteriza,
gestarmos a unidade necessária a um movimento amplo e
massivo, que potencialize a
ação que já temos desenvolvido.
Helena é militante Feminista.
Secretária Estadual de Formação do Partido dos Trabalhadores.
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Cílúl/ Nós somos de vários matizes. Somos brancas, negras