Volume 1 - Número 3 • SET/DEZ 2010 ero m . Nú me I u l o V 3. 10 Z 20 DE SET/ Volume 1 - Número 3 • set-dez 2010 RELATO DE PESQUISA/RESEARCH REPORTS Como comunicar más notícias Communicating bad news Nelson Henrique da Silva, Fabiana Augusto Neman.................................................................................................................................................... 111 Avaliação do conhecimento do protoco bls por alunos concluintes de graduação em enfermagem Evaluation of the knowledge of the students of graduation in nursing on the protocol bls Karina Venâncio, Érika Pensado Bezerra, Viviane de Lima Rocha, Marcos Antonio da Eira Frias .................................................................. 121 Efeitos da dupla tarefa na marcha de pacientes hemiparéticos. Dual Task Effect in Hemiparetic Gait Camila Torriani-Pasin, Kátia Lin, Michelly Arjona, Priscila Y Silva, Roberta Zancani de Lima, Eliane Pires de Oliveira Mota................... 128 COMUNICAÇÃO CURTA/SHORT COMMUNICATION Liderança: Uma relação entre predisposição biológica, inteligência emocionale diferenciação sexual. Leadership: A relationship among biological prEdisposition, emotional intelligence and sexual differentiation. Camila Paschoal Bezerra, Wilson Emanuel Fernandes dos Santos ......................................................................................................................... 136 MINI REVISÃO/MINI REVIEW Mucosite no paciente em tratamento de câncer Mucositis related-cancer treatment Ana Paula Pinho, José Carlos Misorelli, Roberto Montelli, Sergio Emerici Longato ........................................................................................... 145 Fisiopatologia do transtorno afetivo bipolar Pathophysiology of Bipolar Disorder Ana Paula Pinho, Joao Paulo Simoes Domeni, Vitor Marcelo Cortat Coca, Sergio Emerici Longato.............................................................. 161 PONTO DE VISTA/POINT OF VIEW A utilização da filosofia do Tratamento Restaurador Atraumático (ART) na parceria ensino-serviço. Parceria UNICID - Município de Itapira-SP: Relato de experiência exitosa The use of Atraumatic Restorative Treatment (ART) philosophy in partnership between UNICID and Itapira City - SP: Report of a successful experience Gerson Lopes, Vladen Vieira............................................................................................................................................................................................. 170 Leadership and governance for curriculum change Liderança e governabilidade em mudanças curriculares José Lúcio Martins Machado, Maria Cristina Iwana de Mattos, Joaquim Edson Vieira........................................................................................ 179 Science in Health A revista de saúde da Universidade Cidade de São Paulo. Chanceler PAULO EDUARDO SOARES DE OLIVEIRA NADDEO Reitor RUBENS LOPES DA CRUZ Vice-Reitor SÉRGIO AUGUSTO SOARES DE OLIVEIRA NADDEO Editor Chefe Cláudio Antônio Barbosa de Toledo Vice Editor Joaquim Edson Vieira Editoria Acadêmica Ester Regina Vitale Denise Aparecida Campos Assistente Editorial Mary Arlete Payão Pela Normalização e revisão Claudia Martins Edevanete de Jesus de Oliveira Chefe de Edição e Editoramento Juarez Tadeu de Paula Xavier Ricardo Di Santo Maria Bernadete Toneto Editoração Vinicius Antonio Zanetti Garcia Revisão do idioma português Antônio de Siqueira e Silva Assessoria de Marketing Lúcia Ribeiro Periodicidade: Quadrimestral Corpo Editorial por Secção 1 - Biomedicina Editor Sênior: Márcio Georges Jarrouge (mgjarrouge@ yahoo.com.br) Editores Associados: Ana Cestari, Marcia Kiyomi Koike 2 – Ciências Biológicas e Meio Ambiente Editor Sênior: Débora Regina Machado Silva (dregina@ cidadesp.edu.br) Editores Associados: Maurício Anaya, Ana Lúcia Beirão Cabral, 3 – Educação Física Editor Sênior: Roberto Gimenez (rgimenez@cidadesp. edu.br) Editores Associados: Marcelo Luis Marquezi, Maurício Teodoro de Souza 4 – Enfermagem Editor Sênior: Wana Yeda Paranhos ([email protected]) Editores Associados: Patricia Fera; Fabiana Augusto Neman, Adriano Aparecido Bezerra Chaves 5 – Fisioterapia Editor Sênior: Francine Barretto Gondo ([email protected]; [email protected]) Editores Associados: Fábio Navarro Cyrillo, Sergio de Souza Pinto, Renata Alqualo Costa 6 – Formação e capacitação na área da saúde Editor Sênior: Ecleide Cunico Furlanetto ([email protected]) Editores Associados: Julio Gomes de Almeida, Joaquim Edson Vieira, Stewart Mennin 7 - Gestão em saúde Editor Sênior: Wagner Pagliato (wpagliato@cidadesp. edu.br) Editores Associados: Marcelo Treff, Luiz Cláudio Gonçalves 8 – Inclusão social Editor Sênior: Edileine Vieira Machado da Silva ([email protected]) Editores Associados: Fernanda Mendonça Pitta, Juarez Tadeu de Paula Xavier 9- Informática na saúde Editor Sênior: Waldir Grec ([email protected]) Editores Associados: Sergio Daré, Aníbal Afonso Mathias Júnior, 10 – Medicina Editor Sênior: José Lúcio Martins Machado ([email protected]) Editores Associados: Jaques Waisberg, Sonia Regina P. Souza, Edna Frasson de Souza Montero, Marcelo Augusto Fontenelle Ribeiro Júnior, Sylvia Michelina Fernandes Brenna 11 – Odontologia Editor Sênior: Cláudio Fróes de Freitas ([email protected]) Editores Associados: Eliza Maria Agueda Russo, Rivea Ines Ferreira, Flavio Augusto Cotrim Ferreira 12 – Tecnologia em saúde Editor Sênior: Willi Pendl ([email protected]) Editores Associados: Luiz Fernando Tibaldi Kurahassi, Rodrigo de Maio EDITORIAL Prezado leitor, É com satisfação que apresentamos a terceira edição de nossa revista. Ao lado das constantes divulgações sobre novidades e curiosidades decorrentes do avanço tecnológico que compõem o espaço interativo, os trabalhos desta terceira edição têm como característica principal o alcance e impacto da informação. Assim, seja na comunicação de más notícias, como foi discutido pelos autores Nelson Henrique da Silva e Fabiana Neman, ou ainda a estimativa do grau de entendimento do protocolo BLS (Basic Life Support) pelos concluintes do curso de enfermagem, apresentado pelo grupo liderado pelo pesquisador Marco Antonio Frias; em ambos aparece a preocupação em reverter à comunidade o cuidado e eficiência no acolhimento. O relato sobre o trabalho de parceria entre instituições de ensino e prefeituras também reflete esse sentimento e a atual compreensão sobre as funções (e atribuições) do meio acadêmico é dissecada no texto elaborado pelos professores Gerson Lopes e Vladen Vieira. Ele apresenta que o alvo do processo educacional transcende a formação do sujeito, e que este deve ser focado na melhora da qualidade de vida da comunidade. Na educação superior, tem-se valorizado cada vez mais não só o aprendizado do conteúdo, que é a capacitação ao ofício, mas também a adequação de sua aplicação, o exercer do ofício. Essa mesma preocupação com a atitude do formador do profissional de saúde é o tema central da reflexão oferecida pelo artigo dos pesquisadores José Lúcio Machado, Maria Cristina de Mattos e Joaquim Edson Vieira. Os autores identificam as qualidades necessárias ao profissional dedicado à implantação de estratégicas de ensino contemporâneas, em consonância com os desafios de um educador atual. Ainda reforçam o sentimento de que, sem um líder comprometido e capaz, a possibilidade de sucesso é remota. Esse mesmo caminho, o de buscar o aprimoramento das atividades de um gestor competente, é trilhado pelos autores Camila Bezerra e Wilson Fernandes dos Santos, os quais mostram que são cruciais certas habilidades cognitivas. Interessantemente, a digressão é centrada nas mulheres que, de forma geral, os autores relatam ter vários desses atributos graças à sua própria natureza de formação. Já o texto da pesquisadora Camila Torriani-Pasin mostra o quão difícil é a execução simultânea de duas atividades e como a integridade do encéfalo é determinante para o sucesso desse desafio. Indivíduos acometidos por acidentes vasculares têm dificuldades em fazê-lo e a avaliação do desempenho nessas situações pode ser um ótimo indicador para detectar, de maneira imediata e sem grande investimento, a eventual melhora em pacientes submetidos a tratamento reabilitador. Atualização de conhecimento é o objetivo dos dois trabalhos do grupo do médico Sergio Longato. Cientes de que acompanhar os avanços do conhecimento é condição de sobrevivência e eficácia profissional, Sergio e sua equipe discorrem sobre a associação entre as lesões na mucosa de pacientes com câncer e ainda oferecem uma revisão sobre o transtorno afetivo bipolar, uma condição que tem sofrido aumento em sua prevalência e que produz forte impacto na vida social do indivíduo acometido. Desejamos uma excelente leitura. Revista Science in Health Corpo Editorial Medicina Relato de Pesquisa /Research Reports ISSN 2176-9095 2176-9095 ISSN Science in Health 2010 set-dez; 1(3): 111-20 COMO COMUNICAR MÁS NOTÍCIAS COMMUNICATING BAD NEWS Nelson Henrique da Silva* Fabiana Augusto Neman** Resumo ABSTRACT Introdução: Perante as necessidades de uma maior humanização na área da saúde, surgiu o interesse por esse assunto que é tão pouco estudado pelos alunos de medicina e também pouco difundido entre a grande maioria dos médicos do município de São Paulo. Com o objetivo de montar um protocolo de orientação para profissionais de saúde habilitados para a comunicação de más notícias, este estudo teve como base as opiniões de 20 médicos que atuam nas instituições de saúde do município de São Paulo. Métodos: Para tanto, foi montado um questionário composto de 18 questões. Resultados: Dentre as respostas mais relevantes, 50% dos médicos afirmaram que não receberam informação alguma em sua formação acadêmica relacionada a más notícias, 65% se sentem preparados para passar a informação e 75% não conhecem nenhum protocolo relacionado ao tema. Conclusão: Discute-se a necessidade de um maior debate do assunto nas universidades, além da necessidade de divulgação de protocolos relacionados. Introduction: Perante the needs of a larger humanization in the area of the health, the interest appeared for that subject that is so little studied by the medicine students and that is also little spread among the doctors of the municipal district of São Paulo in great majority. With the objective of setting up an orientation protocol for qualified professionals of health for the communication of bad news, this study had as base the 20 doctors’ opinion that act in the institutions of health of the municipal district of São Paulo. Methods: So that, a questionnaire composed by 18 subjects was set up. Results: Among the most relevant answers, 50% of the doctors said that they didn’t receive any information in his/ her academic formation about bad news; 65% said that they feel prepared to pass the information and 75% don’t know any protocol related to the theme. Conclusion: The need of a larger discussion about this subject is considered in universities, besides the need of popularization of related protocols. Descritores: Humanização das assistências • Relações mé- Descriptors: Humanization of assistance • Phisician-pacient dico-paciente • Revelação da verdade • Educação médica • Ética médica • Profissional da saúde. relations • Truth disclouse • Education, medical • Ethics, medical • Healt personel. 111 Medicina Relato de Pesquisa / Research Reports Silva NH, Neman FA. Como comunicar más notícias São Paulo • Science in Health • 2010 set-dez; 1(3): 111-20 ISSN 2176-9095 Introdução De acordo com Vandekief1 (2001), Muller2 (2002), Lima3 (2003), más noticias são todas aquelas que causam alguma mudança brusca na vida do paciente. Com isso, este pode vir a desenvolver outras patologias, além daquelas que já o acometeram. Outra definição é que “má notícia pode ser qualquer informação que afeta negativamente a vida futura do indivíduo” (Buckman4 1992). Não necessariamente precisa ser uma notícia de morte, mas alguma doença grave, incapacidades físicas causadas por acidente, perda da visão, entre outras. O interesse pelo presente trabalho surgiu por meio da observação de algumas pessoas que, por estarem passando por um processo de doença grave, receberam a notícia da patologia de maneira inadequada e, consequentemente, desenvolveram outros quadros de doenças físicas e até mesmo psíquicas. Além disso, a quantidade de trabalhos científicos relacionados a esse assunto é muito reduzida, proporcionando uma maior abertura para novos estudos e oportunidades de auxiliar os profissionais de saúde, principalmente os médicos, a oferecerem um maior conforto ao paciente que passa por um momento difícil. A qualidade da relação médico-paciente e do ensino médico atual também não pode deixar de ser ressaltada, visto que, no momento, é assunto muito discutido no meio acadêmico e está intimamente relacionada com a qualidade de comunicação de uma má notícia. Com isso, muitos tópicos relacionados aos referidos temas serão citados no decorrer deste trabalho, visando ressaltar a sua grande importância. A atual formação médica vem sendo muito contestada nos últimos anos, devido a diversas “falhas” encontradas em alguns profissionais médicos, já que algumas instituições trazem a promessa de um curso de medicina completo, mas que, na verdade, escondem um enorme despreparo e, consequentemente, profissionais inseguros, sem o conteúdo adequado, podendo afetar diretamente os pacientes. O médico é vítima da sociedade atual e ele não tem culpa, pois entra em uma faculdade esperançoso de tornar-se médico. É a sua intenção, seu desejo e sua aspiração, mas existem fábricas de diplomas, que devem ser um bom negócio, talvez mais político que financeiro. Abrem-se novas faculdades sem necessidade e sem a devida infraestrutura, sem corpo docente academica- 112 mente qualificado nem hospital próprio. Troncon et al.5 (1998) ressalta que ocorre um visível desinteresse da maioria das faculdades de medicina pelo conhecimento global do paciente, ou seja, os aspectos psicossociais são deixados de lado, prevalecendo fortemente o conhecimento específico e biológico. “As escolas médicas estão submergindo os estudantes em pormenores opressores sobre conhecimentos especializados e aplicação de tecnologias sofisticadas, restringindo a aprendizagem de habilidades médicas fundamentais, o que pode levar a uma fascinação pela tecnologia, tornando o artefato mais importante que o paciente. Faz-se necessário, portanto, introduzir com maior determinação temas de bioética na grade curricular dos cursos médicos e ouvir, com atenção (Troncon et al.5 1998). É fato que os próprios pacientes também estão sentindo as mudanças que ocorreram na Medicina e os sintomas desse fato são claros. O tecnicismo e a falta de humanização na medicina trouxeram à tona o fato de que o homem há de ter direitos de cidadania, entretanto, seu incremento veio atrasado, chegou de maneira abrupta e tumultuada, utilizando como ferramenta a reclamação. Se por um lado ela é fundamental, trouxe por outro um germe perverso que prejudica a relação médico-paciente. Foram péssimas as consequências para o doente que, sempre desconfiado, perde a segurança no médico, gerando para este muito desconforto. É comum e até frequente o médico ouvir, até mesmo na entrada do centro cirúrgico, uma grosseria do paciente ou de seu familiar. As palavras discorridas acima podem revelar que nem sempre o paciente sente-se seguro diante de um profissional médico, fato este que pode prejudicar a comunicação de uma má notícia por parte do médico e também pode alterar a interpretação do paciente diante das palavras que lhe foram ditas. É fundamental diante dessa problemática que o médico, a enfermeira e toda a equipe de saúde se preocupem em superar esses obstáculos e trazer à tona o humano que existe dentro do homem para que se consiga humanizar a medicina e, assim, cuidar do paciente, lembrando que tanto o paciente quanto a família sofrem. Venho observando rotineiramente, apesar de minha incipiente experiência, diversos pacientes indagando sobre o mau atendimento médico e relatando intenso descontentamento por motivo de se sentirem Medicina Relato de Pesquisa / Research Reports Silva NH, Neman FA. Como comunicar más notícias São Paulo • Science in Health • 2010 set-dez; 1(3): 111-20 ISSN 2176-9095 como algo não humano ou, até mesmo, desprovido de sentimentos “(...) busca-se o médico com quem nos sentimos à vontade quando descrevemos nossas queixas, sem receio de sermos submetidos, por causa disso, a numerosos procedimentos; o médico para quem o paciente nunca é uma estatística e, acima de tudo, que seja um semelhante, um ser humano cuja preocupação pelo paciente é avivada pela alegria de servir” (Lown6 2004). Apoiando as ideias acima e em defesa não só do paciente, mas também do médico, apresenta-se o Código de Ética Médica, no qual estão inseridos artigos que fomentam todos os argumentos até aqui apresentados. Duas passagens do código me chamaram à atenção com base na intenção da defesa moral, física e psíquica do paciente. São elas: Art. 6° - O médico deve guardar absoluto respeito pela vida humana, atuando sempre em benefício do paciente. Jamais utilizará seus conhecimentos para gerar sofrimento físico ou moral, para o extermínio do ser humano, ou para permitir e acobertar tentativa contra sua dignidade e integridade. Art. 41 - Deixar de esclarecer o paciente sobre as determinantes sociais, ambientais ou profissionais de sua doença. Essas palavras devem estar gravadas na memória de todo médico, principalmente daqueles que, de alguma forma, já informaram uma má notícia de maneira muito ríspida ou então não deram a devida atenção ao paciente que passa por um momento delicado de sua vida. Além disso, o Código de Ética Médica deve ser conhecido por todos os profissionais da área, pois muitos equívocos poderão ser evitados. É imprescindível citar também que na hierarquia hospitalar as responsabilidades e tarefas delegadas a cada membro da equipe de saúde podem despertar angústias de modo distinto nesses profissionais. O médico passa menos tempo com os pacientes, mas é quem perante a sociedade detém a maior responsabilidade de cura, apresentando maior sentimento de fracasso e medo de errar ante a morte de seu paciente. Tem sido descrita a defasagem entre a posição hierárquica do profissional de saúde e o tempo que efetivamente despende com o paciente. Quanto mais especializado for, menos tempo gastará com o doente no ambiente hospitalar, o que também ocorre nas situações de morte do paciente, como afirma Moritz7 113 (2003). O relato acima pode ser associado ao fato de que grande parcela dos médicos especialistas possui dificuldades em se relacionarem com seus pacientes, o que permite uma reflexão sobre a falta de capacidade de passar uma má notícia. Além disso, é importante ressaltar que muitos profissionais de saúde não têm a consciência de que os familiares dos enfermos também estão envolvidos em todo o processo. De acordo com Kübler8 (1992), os pacientes ou seus familiares normalmente passam pelos mesmos estágios quando recebem uma má notícia. Esses estágios foram classificados para pacientes que estavam morrendo. Inúmeras outras situações presentes na prática dos profissionais de saúde, como a comunicação de diagnósticos de doenças genéticas, por exemplo, podem fazer com que as pessoas passem por estágios semelhantes. Os estágios são os seguintes: Choque inicial; Negação e isolamento; Raiva; Barganha; Depressão; Aceitação. De acordo com os dados acima estabelecidos, é possível o conhecimento de algumas orientações que são disponibilizadas por alguns autores e estabelecem formas de comportamento de um médico diante da situação de ter que passar uma informação difícil para o paciente. “É muito importante compreender o paciente, ter uma expressão neutra e, em seguida, informar as más notícias de maneira clara e direta. Usar um tom de voz suave, pausado e usar uma linguagem sincera. O profissional deverá assegurar-se que o paciente tenha compreendido a mensagem com clareza. A maioria dos autores sugere o uso de uma linguagem simples, sem muitos termos médicos. Isso não significa, no entanto, que o uso de terminologia específica e adequada não seja também importante para que o paciente possa, por conta própria, encontrar informações sobre sua doença” (Ptacek e Eberhardt9 1996). Tendo em vista toda a preocupação com a qualidade da comunicação, principalmente do médico para com seu paciente, não podemos nos esquecer de que a responsabilidade para passar uma má notícia sempre recai sobre os ombros do médico, mas é importante Medicina Relato de Pesquisa / Research Reports Silva NH, Neman FA. Como comunicar más notícias São Paulo • Science in Health • 2010 set-dez; 1(3): 111-20 ISSN 2176-9095 ressaltar que outros profissionais de saúde como enfermeiros, psicólogos e até mesmo alunos estagiários autorizados pelo hospital podem ser incumbidos para tal ação. A exposição acima permite uma reflexão sobre o preparo de muitos profissionais de saúde, visto que é muito difícil manter o controle emocional, ou até mesmo ter de lidar com reações inesperadas dos indivíduos que recebem má notícia. Método A busca de novos horizontes para um assunto ainda tão desconhecido orientou-nos para um estudo com caráter qualitativo, por pretender analisar essa atividade tão difícil para qualquer profissional da saúde. O trabalho foi realizado em três etapas, as quais consistiram em: coleta dos dados fornecidos pelos profissionais médicos, tabulação das respostas obtidas e elaboração de um protocolo de orientação para os profissionais da saúde habilitados para comunicar más notícias. Para o alcance do objetivo proposto foi utilizado um questionário composto de perguntas abertas e fechadas, as quais foram empregadas para uma população delimitada de médicos que atendem nas instituições de saúde do município de São Paulo, os quais tiveram que transmitir uma notícia de câncer, morte na família, etc. A coleta de dados foi realizada após aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Cidade de São Paulo. Com a análise dos resultados obtidos, foi possível elaborar um protocolo de orientação para os profissionais de saúde habilitados para comunicar más notícias. Apresentação dos resultados Na busca de respostas, após a aplicação do instrumento de coleta de dados, com um total de 20 profissionais médicos, foi possível obter as seguintes informações: Em relação à primeira questão obtivemos os dados a seguir: 1, Em sua opinião, o que é uma má notícia? De acordo com Vandekief1 (2001), Muller2 (2002), Lima3 (2003), más noticias são todas aquelas que causam alguma mudança brusca na vida do paciente. Com 114 isso, este pode vir a desenvolver outras patologias, além daquelas que já o acometeram. Outra definição é que “má notícia pode ser qualquer informação que afeta negativamente a vida futura do individuo” (Buckman4 1992). Baseado no gráfico acima, as opiniões dos diferentes médicos não se desviam completamente das definições utilizadas, ou seja, todas as respostas estão diretamente relacionadas a uma mudança negativa na vida do individuo. 2. Você recebeu alguma informação sobre o assunto durante sua formação acadêmica? O gráfico acima expressa a necessidade da introdução do tema “más notícias” nas grades curriculares das faculdades de medicina. A falta de conhecimento sobre o assunto pode trazer diversos problemas ao paciente, visto que manifestações psíquicas e, até mesmo físicas, estão intimamente ralacionadas à rispidez durante o informe da má notícia. Troncon et al.5 (1998) ressalta que ocorre um visível desinteresse da maioria das faculdades de medicina pelo conhecimento global do paciente, ou seja, os aspectos psicossociais são deixados de lado, prevalecendo fortemente o conhecimento específico e biológico. 3. Você se sente preparado(a) para informar uma má noticia? Medicina Relato de Pesquisa / Research Reports Silva NH, Neman FA. Como comunicar más notícias São Paulo • Science in Health • 2010 set-dez; 1(3): 111-20 ISSN 2176-9095 Mesmo com todas as observações dos dados obtidos, grande parte dos médicos sentem-se preparados e autoconfiantes para passar uma má notícia. Esse fato é muito preocupante, já que o reconhecimento de alguma falha pode ser o primeiro passo para a melhora da qualidade do atendimento médico. 4. Qual a maior dificuldade encontrada na hora de passar uma má notícia? A intimidação após a reação do paciente diante de a uma má notícia pode levar à reflexão sobre o despreparo e a insegurança do médico em contornar situações difíceis e que exijam um maior conhecimento sobre o tema más notícias. 5. Para você, o que é mais importante para o médico no momento de informar a má notícia? De acordo com os diversos trabalhos já descritos, informar uma má notícia aos poucos é uma das melhores atitudes a serem tomadas. 6. Para tomar essa atitude, você leva em consideração o atual estado emocional do paciente? Ver: o gráfico abaixo tem menos partes que as legendas 7. No momento em que o paciente recebe a notícia, você explica todos os riscos da doença que o 115 acomete, bem como sua chance de morte? O gráfico acima leva a crer que, de acordo com os diversos trabalhos descritos sobre o assunto, os médicos estão tomando a decisão mais correta. 8. Já soube de algum paciente que tenha ficado traumatizado após receber uma má notícia de maneira muito ríspida? Os dados encontrados remontam a necessidade de um maior conhecimento sobre o assunto e, além disso, apesar de ser passada a má notícia com informações detalhadas sobre a doença do paciente, podem existir falhas na comunicação entre os médicos Relato de Pesquisa / Research Reports Medicina Silva NH, Neman FA. Como comunicar más notícias São Paulo • Science in Health • 2010 set-dez; 1(3): 111-20 ISSN 2176-9095 e pacientes. 9. Já teve que informar a enfermidade ao paciente em ambientes movimentados e sem privacidade? Os dados acima levam à reflexão sobre a estrutura da maioria dos hospitais do município de São Paulo, os quais não apresentam a estrutura adequada para a atividade em questão. 10. Percebeu alguma diferença de reação do paciente quando passou a notícia em ambiente privativo? 11. Nas instituições de saúde em que você trabalha, existe algum ambiente específico para informar uma má notícia? A falta de conhecimento de um protocolo se reflete no gráfico acima. 15. Você considera que os médicos que atuam nas instituições de saúde do município de São Paulo estão preparados para passar uma má notícia? 12. Conhece algum protocolo relacionado ao assunto? 16. Você gostaria que os alunos de medicina recebessem maiores orientações sobre o assunto? Os dados indicam a necessidade de um maior conhecimento sobre o assunto. 13. Se conhece algum protocolo, você o segue? 14. Em sua opinião, o que teria que mudar nos atuais protocolos para melhorar a relação do médico para com os pacientes diante da necessidade de informar uma má notícia? Podemos refletir sobre a falta de humanização e o excesso de tecnicidade na Medicina, fato que, nos últimos anos, é ou foi uma realidade no meio médico. Troncon et al.5 (1998) ressalta que ocorre um visível desinteresse da maioria das faculdades de medicina 116 Relato de Pesquisa / Research Reports Medicina Silva NH, Neman FA. Como comunicar más notícias São Paulo • Science in Health • 2010 set-dez; 1(3): 111-20 ISSN 2176-9095 pelo conhecimento global do paciente, ou seja, os aspectos psicossociais são deixados de lado, prevalecendo fortemente o conhecimento específico e biológico. 17. Você acredita que a falta de humanização na medicina contribuiu para que os cursos médicos tenham sido desprovidos de maiores esclarecimentos sobre o assunto? 18. Em sua opinião, o que deve ser feito para melhorar a relação entre médico e paciente perante a necessidade do profissional de saúde informar uma má notícia? Quadro 1: respostas mais frequentes Questão 1a Em sua opinião, o que seria má notícia? 2ª Você recebeu alguma informação sobre o assunto durante sua formação acadêmica? Não - 50% 3ª Você se sente preparado(a) para informar uma má noticia? Sim - 65% 4ª Qual a maior dificuldade encontrada na hora de passar uma má notícia? Reação do paciente - 60 % 5ª Para você, o que é mais importante para o médico no momento de informar a má notícia? Informar aos poucos - 50% 6ª Para tomar essa atitude você leva em consideração o atual estado emocional do paciente? Sim - 90% 7ª No momento em que o paciente recebe a notícia, você explica todos os riscos da doença que o acomete, bem como sua chance de morte? “As escolas médicas estão submergindo os estudantes em pormenores opressores sobre conhecimentos especializados e aplicação de tecnologias sofisticadas, restringindo a aprendizagem de habilidades médicas fundamentais, o que pode levar a uma fascinação pela tecnologia, tornando o artefato mais importante que o paciente”. Faz-se necessário, portanto, introduzir com maior determinação temas de bioética na grade curricular dos cursos médicos e ouvir, com atenção (Troncon et al.5 1998). Sim - 95% 8ª Já soube de algum paciente que tenha ficado traumatizado após receber Sim - 60% uma má notícia de maneira muito ríspida? 9ª Já teve que informar a enfermidade ao paciente em ambientes movimentados e sem privacidade? Sim - 90% 10ª Percebeu alguma diferença de reação do paciente quando passou a Sim - 80% notícia em ambiente privativo? 11ª Nas instituições de saúde em que você trabalha, existe algum ambiente Não - 100% específico para informar uma má notícia? 12ª Conhece algum protocolo relacionado ao assunto? 117 Resposta obtida Quando leva a piora da qualidade de vida do paciente - 50% Não - 75% Medicina Relato de Pesquisa / Research Reports Silva NH, Neman FA. Como comunicar más notícias São Paulo • Science in Health • 2010 set-dez; 1(3): 111-20 13ª Se conhece algum protocolo, você o segue? 14ª Em sua opinião, o que teria que mudar nos atuais protocolos para melhorar a relação do médico para com os pacientes diante da necessidade de informar uma má notícia? 15ª Você considera que os médicos que atuam nas instituições de saúde do município de São Paulo estão preparados para passar uma má notícia? 16ª Você gostaria que os alunos de medicina recebessem maiores orientações sobre o assunto? 17ª Você acredita que a falta de humanização na medicina contribuiu para que os cursos médicos tenham sido desprovidos de maiores esclarecimentos sobre o assunto? 18ª Em sua opinião, o que deve ser feito para melhorar a relação entre médico e paciente diante da necessidade do profissional de saúde de informar uma má notícia? ISSN 2176-9095 Não - 80% Nada - 50% Não - 70% Sim - 100% Sim - 90% Introdução do assunto nas universidades - 75% Considerações De acordo com a análise dos gráficos acima, podemos refletir sobre a importância do tema “más notícias” no cotidiano profissional dos médicos. A falta de conhecimento do assunto, devido à não inclusão de disciplinas relacionadas à humanização nas faculdades de Medicina, faz com que a comunicação entre médico e paciente fique prejudicada. De acordo com Quintana et al.10 (2002), essa problemática é pouco explorada nos currículos de Medicina, o que ocasiona uma abordagem inadequada e aumenta desnecessariamente o sofrimento do médico e do paciente, em especial daqueles sem expectativa de cura. Ao lado dessas informações, Ramos et al.11 (2005) propõe a inclusão formal de vivências durante a graduação que recorram a outras estratégias de ensino, como, por exemplo, o emprego de técnicas psicodramáticas. Já há trabalhos nessa linha, mas são experiências esporádicas, sem a força transformadora necessária para aliviar a ansiedade e humanizar o ensino. Os dados obtidos revelam que, apesar de sentir 118 insegurança e medo da reação do paciente diante da má notícia ou então não conhecer nenhum protocolo relacionado ao assunto, a maioria dos médicos sente-se preparada para enfrentar essa difícil situação. Essa é uma grande dualidade, visto que a falta de aceitação do desconhecimento pode levar à falta de novos aprendizados, menor humanização e, consequentemente, um pior atendimento individualizado ao paciente enfermo. A forma com que os médicos transmitem uma má notícia e o quanto expõem a real situação de saúde do paciente também merecem destaque, já que a maioria dos profissionais informa de maneira paulatina e leva em consideração o estado emocional dos indivíduos. Em contraste com essas informações, diversos entrevistados afirmaram conhecer pacientes que receberam a notícia de maneira ríspida e ficaram “traumatizados” após o fato. As considerações de Premi12 (1993) mostram que a preocupação maior dos pesquisadores está centrada na importância (ou não) de informar o paciente o quanto ele deve saber, mas que pouca atenção tem sido dada à capacitação do médico para enfrentar essas situações. Perante todas as considerações acima, a humanização emerge como uma das principais maneiras de melhorar a relação médico-paciente. O papel do médico nesse contexto é essencial, pois uma relação mais harmoniosa, menos científica e mais humana leva a maior credibilidade na relação com a pessoa enferma. A seguir, apresentamos uma proposta para orientação aos profissionais, com o intuito de apoio nessa experiência. 1. Necessidades na graduação: 2. Introdução do tema “comunicação de más notícias” nas grades curriculares das diversas faculdades de medicina. 3. 2- Maior divulgação de protocolos relacionados ao assunto (Spikes). 4. Orientar os alunos de medicina no sentido de maximizar a humanização e melhorar a relação médico-paciente. 5. Maior contato dos alunos de medicina com pacientes portadores de doenças graves, salientando a importância do cuidado especial para com esses indivíduos. 6. Necessidades na atividade profissional: Medicina Relato de Pesquisa / Research Reports Silva NH, Neman FA. Como comunicar más notícias São Paulo • Science in Health • 2010 set-dez; 1(3): 111-20 ISSN 2176-9095 7. Conhecer o que é uma má notícia. 8. Ter conhecimento de algum protocolo de orientação, como o protocolo Spikes, para evitar o medo da reação do paciente. 9. Procurar seguir esses protocolos, no intuito de minimizar o sofrimento do paciente. 10. Informar a notícia aos poucos, evitando a “rispidez” durante a transmissão da informação. 11. Considerar o estado emocional do paciente, ou seja, dar tempo ao paciente para refletir sobre sua atual situação. 12. Demonstrar segurança ao informar a má notícia. 13. Informar todos os detalhes da doença do individuo, bem como sua sobrevida, possíveis tratamentos ou, até mesmo, sua chance de morte. 14. Informar a má notícia em ambiente silencioso e privativo. 15. Maior humanização no tratamento dos pa- 119 cientes, ou seja, menor quantidade de termos técnicos e maior empatia e compreensão. 16. Introdução de cursos preparatórios para médicos do município de São Paulo sobre o tema más notícias. 17. Adequação das entidades de saúde no intuito de manifestarem o interesse em adaptarem salas específicas para a comunicação das más notícias. Agradecimentos Agradeço à professora Fabiana Neman, à qual destino grande parte do crédito deste trabalho. Além disso, confio a meus pais a imensa gratidão de ter a oportunidade de estudar Medicina e poder elaborar trabalhos científicos, com o intuito de auxiliar pacientes e profissionais de saúde. Este trabalho contou com o apoio financeiro da Universidade Cidade de São Paulo. Relato de Pesquisa / Research Reports Medicina Silva NH, Neman FA. Como comunicar más notícias São Paulo • Science in Health • 2010 set-dez; 1(3): 111-20 ISSN 2176-9095 Referências 1. Vandekief GK. Breaking Bad News. American Family Physician, 2001; 64:12. 2. Muller OS. Breaking bad news to patients - The SPIKES approach can make this difficult task easier. Postgrad Med 2002 Sep; 112(3): 15-6. 3. lves de Lima AE. Cómo comunicar malas noticias a nuestros pacientes y no morir en A intento, Rev Argent Cardiol 2003 mayo-jun; 71(3): 217-220. 4. Buckman R. Breaking Bad News: a guide for health care professionals. Baltimore: Johns Hopkins University Press; 1992, p. 15. 5. roncon LE, Cianfrone AR, Martin CC. 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Genebra, 1993. 120 Relato de Pesquisa / Research Reports Enfermagem ISSN 2176-9095 Science in Health 2010 set-dez; 1(3): 121-7 AVALIAÇÃO DO CONHECIMENTO DO PROTOCO BLS POR ALUNOS CONCLUINTES DE GRADUAÇÃO EM ENFERMAGEM* EVALUATION OF THE KNOWLEDGE OF THE STUDENTS OF GRADUATION IN NURSING ON THE PROTOCOL BLS Karina Venâncio* Érika Pensado Bezerra** Viviane de Lima Rocha** Marcos Antonio da Eira Frias*** Resumo ABSTRACT Introdução: A parada cardiorrespiratória é considerada uma situação de emergência e exige avaliação e intervenção imediata para garantir a sobrevida do indivíduo em risco de morte. Conhecer o protocolo BLS e executar cada etapa corretamente aumentam as chances de sucesso no atendimento. Objetivo: Avaliar o conhecimento do aluno do quarto ano da graduação em enfermagem no atendimento de PCR com base no protocolo do BLS. Método: Esta é uma pesquisa de campo de abordagem quantitativa do tipo exploratória e descritiva. A pesquisa foi realizada em uma Instituição de Ensino Superior na Cidade de São Paulo, com 31 alunos de graduação em enfermagem. Para a coleta de dados usamos um instrumento do tipo “check-list”, seguindo a padronização do Basic Life Support. A técnica de reanimação foi realizada em manequim de treinamento. Resultados: Os resultados evidenciam deficiências no conhecimento teórico-prático dos passos do BLS. Do total de participantes do estudo 55% não reconheceram os sinais de PCR, 87% não solicitaram ajuda, 48% posicionaram a vítima em DDH e superfície rígida, 39% realizaram de forma incorreta a verificação de pulso e compressão torácica e 64% não executaram a desfibrilação. Conclusão: Os resultados encontrados apontam uma necessidade maior do aprendizado prático de RCP/BLS pelo aluno durante a graduação em enfermagem. Introduction: Cardiac arrest is considered an emergency and requires immediate assessment and intervention to ensure the survival of the individual risk of death. Meet the BLS protocol and perform each step correctly increase the chance of successful treatment. Objective: To determine the student’s fourth year of undergraduate nursing care in PCRbased protocol BLS. Method: This is a field research approach quantitative exploratory and descriptive. The survey was conducted in a Higher Education Institution in the city of Sao Paulo, with 31 undergraduate students in nursing. To collect data we used a tool such as “check-list”, following the standardization of the Basic Life Support. The technique of resuscitation was performed on the training dummy. Results: The results showed deficiencies in the theoretical and practical knowledge of the steps of the BLS. Among the study participants, 55% did not recognize the signs of cardiac arrest, 87% have not sought help, 48% positioned the patient at DDH and rigid, 39% were incorrectly checking pulse and chest compression and 64% did not perform defibrillation. Conclusion: The results suggest a greater need of practical learning CPR / BLS by the students during their undergraduate nursing. Descriptors: Heart arrest • Resuscitation • Nursing • Education, nursing • Emergencies DESCRITORES: Parada cardíaca • Ressuscitação • Enfermagem • Educação em enfermagem • Emergências. *Texto extraído do Trabalho de Conclusão de Curso – TCC apresentado à Faculdade de Enfermagem da Universidade Cidade de São Paulo – UNICID em dezembro de 2009 para obtenção do Grau de Bacharel em Enfermagem **** **** *** Aluna concluinte do Curso de Graduação em Enfermagem da Universidade Cidade de São Paulo – UNICID. Aluna concluinte do Curso de Graduação em Enfermagem da Universidade Cidade de São Paulo – UNICID. Enfermeiro, Mestre em Enfermagem, Docente do Curso de Graduação em Enfermagem da Universidade Cidade de São Paulo – UNICID. 121 Enfermagem Relato de Pesquisa / Research Reports Venâncio K, Bezerra EP, Rocha VL, Frias MAE. Avaliação do conhecimento do protoco bls por alunos concluintes de graduação em enfermagem. São Paulo • Science in Health • 2010 set-dez; 1(3): 121-7 INTRODUÇÃO Entende-se por Parada Cardiorrespiratória (PCR) a interrupção súbita e brusca da circulação sistêmica e respiratória, comprovada pela ausência de pulso central (carotídeo e femoral), e de movimentos ventilatórios (apneia), definindo-se, assim, a Ressuscitação cardiopulmonar (RCP) como um conjunto de procedimentos realizados após uma PCR, a fim de melhorar as chances de sobrevivência da vítima (Calil et al.1 2007; Guimarães et al.2 2009). O pioneiro da RCP no Brasil foi o Dr. John Cook Lane, em 1960. Quando cursava residência em cirurgia, o Dr. Lane sofreu influência do Dr. Gordon, um dos pioneiros da reanimação moderna. Foi o Dr. Lane quem trouxe ao Brasil o curso prático de RCP, e a partir daí publicou os seus primeiros livros sobre reanimação cardiorrespiratória cerebral. Através de palestras e demonstrações em manequins, Lane difundiu em diversas instituições a finalidade e a técnica do ABC do Suporte Básico de Vida (Guimarães et al.3 2009). O Dr. Ari Timerman, graduado pela Faculdade de Medicina de Sorocaba, em 1976 também desenvolveu vários estudos sobre a RCP, e juntamente com o Dr. Fehér, deu início no Brasil aos cursos no formato da AHA (Tinerman et al.4 2007). AHA é uma Sociedade que se reúne a cada 5 anos em Dallas, Texas, Estados Unidos, para atualizar as diretrizes da RCP. A última atualização foi em 2005. As modificações das diretrizes visam simplificar o papel dos procedimentos do suporte básico de vida como estratégias fundamentais para melhorar a sobrevivência após a PCR. O enfermeiro do serviço de emergência, segundo Calil et al.1 (2007), deve ser capacitado a assumir a liderança em situações de RCP, para desenvolver a atividade com habilidade motora e atitude para julgamentos e tomada de decisões. Para esses mesmos autores, a capacitação e o conhecimento científico são o diferencial nessa situação. Uma situação de emergência é um momento de estresse para todos os profissionais da área da saúde, por isso a capacitação é necessária para se ter sucesso no atendimento, principalmente quando se trata de uma PCR, por isso, ter domínio dos passos do BLS é fundamental. Para Timerman et al. 4 2007, o Suporte Básico de 122 ISSN 2176-9095 Vida inclui etapas diferentes que, realizadas de forma disciplinada, visam melhor qualidade de circulação e oxigenação tecidual, oferecendo chance maior de sobrevida a pacientes, muitas vezes, em risco de vida. Na maioria das vezes, o socorro a essas vítimas inicia fora do ambiente hospitalar, devendo-se deflagrar o suporte básico de vida disciplinado e programado. Sendo assim, este estudo tem como objetivo avaliar o conhecimento do aluno do quarto ano da graduação em enfermagem em relação ao atendimento de uma PCR, com base no protocolo do BLS. MATERIAL E MÉTODO Tipo de pesquisa e local de estudo Trata-se de uma pesquisa de campo de abordagem quantitativa do tipo exploratória e descritiva. O Projeto de Pesquisa foi submetido à apreciação do Comitê de Ética e Pesquisa da Universidade Cidade de São Paulo, tendo sido aprovado. A pesquisa foi realizada em uma Instituição de Ensino Superior localizada na Zona Leste da Cidade de São Paulo, com 31 alunos do último ano da graduação em enfermagem. Critérios de inclusão Ser aluno regularmente matriculado no último ano do Curso de Graduação em Enfermagem, ter disponibilidade e concordar em participar do estudo. Operacionalização da Coleta de Dados Os estudantes foram informados quanto ao objetivo da pesquisa, a forma de participação, a garantia do anonimato e que tinham liberdade total na decisão de participar ou não da pesquisa. Aqueles que optaram por participar deste estudo confirmaram sua participação assinando o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. Após as explicações sobre a pesquisa e assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, cada participante foi, então, orientado para executar a manobra de RCP da forma que julgasse correta. Para a coleta de dados foi elaborado um instrumento do tipo “check-list” (Anexo I), seguindo a padronização do Basic Life Support (BLS) conforme as diretrizes da American Heart Association. Para realização da técnica de RCP, foi utilizado um manequim de treinamento específico para esse fim. A Enfermagem Relato de Pesquisa / Research Reports Venâncio K, Bezerra EP, Rocha VL, Frias MAE. Avaliação do conhecimento do protoco bls por alunos concluintes de graduação em enfermagem. São Paulo • Science in Health • 2010 set-dez; 1(3): 121-7 desinfecção da boca do manequim para realização de respiração boca a boca foi feita com algodão embebido em álcool 70% garantindo, assim, total segurança aos participantes do estudo. A performance dos participantes do estudo na execução de cada item da manobra de RCP foi registrada por um dos pesquisadores no impresso Instrumento de Coleta de Dados, nos itens correspondentes a: desenvolvimento correto, incorreto ou não executou. ISSN 2176-9095 GRÁFICO 1: Reconhece os sinais de parada cardiorrespiratória (PCR). (São Paulo, 2009.) RESULTADOS E DISCUSSÃO Os dados coletados foram analisados em números absolutos e percentuais e apresentados em gráficos. Ressaltamos que na avaliação da performance, a execução incorreta e/ou a não execução de um dos passos do protocolo têm o mesmo peso em termos de avaliação, ou seja, representam a atuação ineficaz e ineficiente do socorrista no atendimento à vítima em situação de emergência com risco de morte iminente; no entanto, entendemos que a execução incorreta mostra que houve uma tentativa de fazer algo. Para o atendimento de uma vítima em PCR, é necessário seguir as diretrizes estabelecidas pela International Liaision Committee on Resuscitation, método conhecido como mnemônico do ABCD. O ABCD da RCP consiste em quatro partes principais: promover a Abertura das vias aéreas; restabelecer e manter Boa respiração; restabelecer e manter a Circulação e fazer a Desfibrilação. O profissional precisa reconhecer e confirmar a PCR; para que isso aconteça, é necessário fazer a avaliação rápida do local e da vítima. Antes de iniciar o atendimento, o socorrista deve avaliar se o local da cena é seguro, para também não se tornar uma vítima. Após esse reconhecimento, deve-se tocar o ombro da vítima levemente, mas com firmeza, e perguntar se está tudo bem. Se não há nenhum tipo de resposta, entende-se que a vítima está inconsciente (American Heart Association5 2006, Serrano et al.6 2008). Os resultados do desempenho no quesito reconhecimento e identificação de parada cardiorrespiratória pelos participantes do estudo podem ser observados no Gráfico 1. 123 O GRÁFICO 1 mostra que, do total de 31 (100%) alunos participantes do estudo, 42% (13) executaram corretamente o primeiro passo do protocolo BLS, 55% (17) não executaram o procedimento e 3% (01) executou de maneira incorreta. A somatória dos resultados não executou e executou incorretamente corresponde a 58% do total. O fato de 58% da população não ter executado ou ter executado de forma incorreta o primeiro passo do suporte básico de vida (SBV), é motivo de preocupação, pois a não identificação dos sinais de PCR por parte do enfermeiro implica em risco de morte do paciente. Para melhorar a taxa de sobrevida por PCR é importante que o enfermeiro reconheça os sinais precoces de alerta de um ataque cardíaco, intervenha de maneira imediata, correta e segura. GRÁFICO 2: Solicita ajuda após verificar a responsividade. (São Paulo, 2009.) Enfermagem Relato de Pesquisa / Research Reports Venâncio K, Bezerra EP, Rocha VL, Frias MAE. Avaliação do conhecimento do protoco bls por alunos concluintes de graduação em enfermagem. São Paulo • Science in Health • 2010 set-dez; 1(3): 121-7 O segundo passo do SBV foi executado corretamente por 3% (01) dos sujeitos, 87% (27) não executaram o procedimento e 10% (03) executaram de maneira incorreta. Nesse segundo item, 97% da população não apresentaram um desempenho adequado; entende-se que, em uma situação real, aumentaria em muito o tempo de chegada da equipe de socorro. A American Heart Association (AHA5 2006) indica uma padronização de condutas que devem ser adotadas na vigência de uma PCR no adulto. O socorrista que reconhece a situação de emergência deve solicitar rapidamente ajuda da equipe de emergência médica e pedir o desfibrilador externo automático (DEA). Durante a solicitação da ajuda, solicitar imediatamente a busca do desfibrilador externo automático (DEA). Caso o profissional esteja sozinho, deve-se incumbir outra pessoa para que faça esse pedido de ajuda. No ambiente hospitalar, de imediato, é feito o pedido do carrinho de atendimento de emergência (American Heart Association5 2006, Serrano et al.6 2008). GRÁFICO 3: Posiciona a vítima para iniciar a avaliação. (São Paulo, 2009.) A representação do desempenho no posicionamento da vítima mostra que 48% (15) da amostra executaram esse passo de forma correta, 29% (09) não executaram o procedimento e 23% (07) executaram de forma incorreta. O Gráfico 3 mostra que 52% não posicionaram ou posicionaram a vítima de forma incorreta. 124 ISSN 2176-9095 A vítima deve ser mantida em DDH (decúbito dorsal horizontal) sobre uma superfície rígida: isso é necessário para o desempenho máximo da massagem cardíaca (American Heart Association5, 2006; Serrano et al.6, 2008), de maneira que, durante as manobras de compressão torácica, haja o contra-ponto que garante a efetividade do procedimento. GRÁFICO 4: Abertura das vias aéreas. (São Paulo, 2009.) No Gráfico 4, se observa que 39% (12) dos sujeitos executaram corretamente o procedimento, 39% (12) não executaram, e 22% (07) executaram de maneira incorreta. Nesse item, 61% dos pesquisados não posicionaram e/ou posicionaram de maneira incorreta a cabeça da vítima. A posição inadequada da cabeça pode bloquear a via aérea e impedir a ventilação adequada em algumas vítimas não responsivas. A abertura das vias aéreas é realizada com a manobra de inclinação da cabeça e elevação do queixo. Para a execução correta desse passo da técnica, o socorrista deve fazer a hiperextensão da cabeça da vítima. A hiperextensão é feita posicionando-se uma mão espalmada na região frontal da vítima e com o dedo indicador e médio da outra mão na região mentoniana a fim de facilitar a inclinação da cabeça para trás. Essa manobra alivia a obstrução da via aérea em uma vítima não responsiva (American Heart Association5 2006, Serrano et al.6 2008). Após o posicionamento da cabeça da vítima, devese avaliar a ventilação. É necessário ver se há elevação e abaixamento do tórax, ouvir se há escape de ar Enfermagem Relato de Pesquisa / Research Reports Venâncio K, Bezerra EP, Rocha VL, Frias MAE. Avaliação do conhecimento do protoco bls por alunos concluintes de graduação em enfermagem. São Paulo • Science in Health • 2010 set-dez; 1(3): 121-7 durante a exalação e sentir o fluxo de ar (American Heart Association5 2006, Serrano et al.6 2008). Na ausência de respiração, o profissional deverá realizar duas ventilações de resgate (1 segundo cada), provocando a elevação do tórax: é importante observar a elevação do tórax à medida que se vai aplicando a ventilação; se não elevar na primeira ventilação, é necessário repetir a manobra de inclinação cabeçaelevação do mento. Durante as ventilações é preciso fornecer uma quantidade de ar suficiente para se conseguir elevar o tórax da vítima e para prevenir a distensão gástrica. O ar expirado contém aproximadamente 17% de oxigênio e 4% de dióxido de carbono, o que é suficiente para fornecer oxigênio para suprir as necessidades da vítima; por isso, o socorrista deve respirar normalmente para aplicar a ventilação. Após as duas ventilações, segue-se para o próximo passo que é iniciar a ventilação da vítima (American Heart Association5 2006, Serrano et al.6 2008). Gráfico 5: Inicia ventilação artificial. (São Paulo, 2009.) O Gráfico 5 mostra que 32% (10) participantes executaram corretamente a ventilação da vítima, 45% (14) não executaram essa manobra, e 23% (07) executaram de forma incorreta. Em relação à ventilação artificial, 68% não executaram e/ou executaram de maneira incorreta. Caso sejam aplicadas ventilações muito rápidas ou com muita força, o ar provavelmente irá para o estômago ao invés de ir para os pulmões. Essa manobra pode causar distensão gástrica e acarretar graves complicações como vômitos, aspiração e pneumonia. 125 ISSN 2176-9095 Gráfico 6: Realiza compressões torácicas. (São Paulo, 2009.) No Gráfico 6 referente às compressões torácicas 23% (07) executaram adequadamente, 29% (09) não executaram o procedimento e 48% (15) executaram incorretamente. No item correspondente à realização de compressões torácicas, 77% não executaram e/ou executaram de maneira incorreta. Nesse passo ocorre a verificação do pulso carotídeo ou femoral. Se não houver pulso, é necessário aplicar ciclos de 30 compressões e duas ventilações: as compressões devem ser fortes e rápidas; a frequência é de 100 compressões por minuto. Para fazer a compressão correta, o socorrista deve localizar o gradeado costal e, a seguir, o apêndice xifoide, demarcar dois dedos logo acima do apêndice xifoide e posicionar a região hipotenar de uma mão com os dedos estendidos e a outra mão sobreposta a esta no centro do tórax entre os mamilos. Manter os braços esticados e posicionar os ombros na direção das mãos, comprimir de 4 a 5 centímetros; ao final de cada compressão, é necessário assegurar-se de que houve o retorno/re-expansão total do tórax. O retorno completo permite que mais sangue encha o coração entre as compressões torácicas. Um ciclo corresponde a uma sequência de 30 compressões e 2 ventilações, e a cada 5 ciclos o socorrista deve verificar o ritmo cardíaco (American Heart Association5 2006, Serrano et al.6 2008). A identificação da necessidade de desfibrilação foi executada de maneira correta por 10% (03) da amostra; 64% (20) não executaram o procedimento e 26% Enfermagem Relato de Pesquisa / Research Reports Venâncio K, Bezerra EP, Rocha VL, Frias MAE. Avaliação do conhecimento do protoco bls por alunos concluintes de graduação em enfermagem. São Paulo • Science in Health • 2010 set-dez; 1(3): 121-7 Gráfico 7: Identifica a necessidade de desfibrilação. (São Paulo, 2009.) (08) executaram de forma incorreta. Quanto ao uso do DEA, 90% não executaram e/ou executaram de maneira incorreta o procedimento. O intervalo desde o colapso até a desfibrilação é um dos mais importantes fatores determinantes da sobrevivência a uma PCR. A desfibrilação precoce é fundamental para as vítimas de parada cardíaca súbita, pois a fibrilação ventricular (FV) é o ritmo inicial mais comum nesses casos (American Heart Association5 2006, Serrano et al.6 2008). O desfibrilador externo automático (DEA) interpreta o ritmo cardíaco e informa a necessidade ou não do uso de choques. Esse aparelho foi desenvolvido para que qualquer pessoa possa utilizá-lo em situação de PCR, pois não requer interpretação de traçado eletrocardiográfico para decidir se é ou não necessário o uso terapêutico da corrente elétrica; já os aparelhos convencionais são usados exclusivamente no ambiente hospitalar (American Heart Association5 2006, Serrano et al.6 2008). CONCLUSÃO Com este estudo, pode-se concluir que, na avaliação da performance dos alunos na execução do BLS, 58% da população não executaram ou executaram de forma incorreta o primeiro passo do suporte básico de vida; no segundo passo do protocolo, 97% da 126 ISSN 2176-9095 população não executaram ou executaram de forma incorreta a solicitação de ajuda; o terceiro passo, posicionamento da vítima, não foi executado ou foi executado de forma incorreta por 52% da amostra; o quarto item, correspondente ao posicionamento da cabeça da vítima, não foi executado ou foi executado de forma incorreta por 61% dos pesquisados. Em relação ao quinto passo, ventilação artificial, 68% não executaram e/ou executaram de maneira incorreta; o sexto item, realização de compressões torácicas, não foi executado e/ou foi executado de maneira incorreta por 77% e no sétimo passo, uso do DEA, 90% não executaram e/ou executaram de maneira incorreta o procedimento. Esses resultados são preocupantes, pois se espera que, ao final do curso, o aluno tenha construído conhecimento e desenvolvido habilidades que lhe permitam enfrentar de maneira rápida, segura, eficiente e eficaz as situações rotineiras ou não do seu dia-a-dia como profissional. Permitir que fosse avaliado e divulgado o resultado do desempenho dos futuros profissionais formados nessa Instituição é um ato de coragem e demonstra o amadurecimento pessoal e profissional da Direção do Curso. Além disso, fica evidente a preocupação real com a qualidade do profissional que deixa a universidade e leva o nome da Instituição. Entendemos que sempre é tempo de rever e aprender, pois ensinar e aprender é um processo dinâmico; sendo assim, sugerimos que os alunos concluintes sejam submetidos a um treinamento sobre BLS antes da conclusão do curso. Entendemos ser relevante investir mais no treinamento em laboratório com situações controladas, onde o aluno possa ser levado a desenvolver os procedimentos, perceber seu desempenho e refazer a técnica até atingir a perfeição desejada. Esperamos com este estudo contribuir para a reflexão dos docentes, independente da área de atuação, pois compreendemos que estudos dessa natureza são importantes, uma vez que mostram a compreensão e o desempenho do aluno em relação ao seu fazer como futuro enfermeiro. Enfermagem Relato de Pesquisa / Research Reports Venâncio K, Bezerra EP, Rocha VL, Frias MAE. Avaliação do conhecimento do protoco bls por alunos concluintes de graduação em enfermagem. São Paulo • Science in Health • 2010 set-dez; 1(3): 121-7 ISSN 2176-9095 Anexo I INSTRUMENTO DE COLETA Item a ser avaliado C NE Reconheceu os sinais de PCR Solicitou ajuda Posicionou o paciente em uma superfície rígida Abertura da VA (extensão da cabeça para trás, deslocando a mandíbula para a frente Respiração (Ver, ouvir, sentir) * não: fazer 2 insuflações pulmonares e profundas, duração 1,5 a 2sg, observando a parede torácica elevar-se com ambu e máscara - Circulação (verificação de pulso carotídea e femoral) * não: Iniciar compressões torácicas 30:2 (localizar porção inferior do esterno; posicionarse verticalmente acima do tórax da vítima com os braços estendidos) Desfibrilação (se em FV/ TV sem pulso) * após choque, fazer 5 ciclos de compressões e ventilações antes de nova verificação de pulso Legenda: C = correto; NE = não executou; I = incorreto REFERÊNCIAS 1. alil, AM, Paranhos WY. O enfermeiro e as situações de Emergências. 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Métodos: Foram selecionados 12 pacientes com diagnóstico de AVE, de ambos os gêneros, entre 40 e 65 anos, e marcha independente. As tarefas consistiam de 4 testes que envolvem as seguintes atividades: marcha simples, marcha com demanda cognitiva, marcha com demanda efetora e marcha com demanda combinada (cognitivo-motora), avaliando-se velocidade e número de passos, durante um percurso de 10 metros. Resultados: Verificou-se que o desempenho nas 4 tarefas propostas, relacionadas tanto ao número de passos quanto à velocidade média, apresentou-se comprometido no grupo experimental (GE) quando comparado ao grupo controle (GC), sendo que a dupla-tarefa que associou demanda cognitiva e motora impactou ainda mais sobre o GE de forma negativa, em ambos os parâmetros avaliados. Não houve diferença no desempenho de pacientes com lesão encefálica à direita e esquerda, nesta amostra. Conclusão: A realização de dupla-tarefa para o paciente com lesão encefálica encontra-se comprometida, sendo que as tarefas que associam caráter cognitivo e motor repercutem em pior desempenho. Introduction: Cognitive and/or motor modification in performance of dual task could be an important indicator of functional situation of a patient during the rehabilitation period. However there is no concrete evidence from the impact of the sort of dual task (cognitive or motor demand) in patients with cerebrovascular injuries. Purpose: Investigating the motor-cognitive interference in stroke hemiparetic patients during the performance of dual tasks. Method: 12 patients with the diagnosis of stroke were selected, both gender, age between 40 and 65 years old and independent gait. The tasks consisted of 4 tests which included the following activities: simple gait, gait with cognitive demand, gait with effecter demand and gait with combined demand (cognitive-motor demand), assessing gait speed and number of steps, during a route of 10 meters. Results: It was verified that the performance in the four suggested tasks, related to the numbers of steps as well as to the gait speed, was damaged in experimental group (EG) when compared to control group (CG), once dual task that associated cognitive and motor demand caused impact in EG in a very negative way in both assessed parameters. There was no difference in performance of patients with right or left cerebral dysfunction, in this sample. Conclusion: The performance of dual tasks for the stroke patient is damaged, and the tasks which associate cognitive and motor structure reverberate in a worse performance. Descriptors: Physical therapy • Gait • Stroke • Rehabilitation • Paresis Descritores: Fisioterapia • Marcha • Acidente Cerebrovascular • Reabilitação • Paresia ** Fisioterapeuta Especialista em Neurofuncional e Profa Dra da Escola de Educação Física e Esporte da Universidade de São Paulo (EEFE-USP) ** Fisioterapeutas graduados pela FMU – São Paulo – SP 128 Relato de Pesquisa /Research Reports Fisioterapia Torriani-Pasin C, Lin K, Arjona M, Silva PY, Lima RZ. Efeitos da dupla tarefa na marcha de pacientes hemiparéticos. São Paulo • Science in Health • 2010 set-dez; 1(3): 128-35 Introdução O Acidente Vascular Encefálico (AVE) é definido pela Organização Mundial de Saúde como uma síndrome de rápido desenvolvimento, com sinais clínicos de perturbação focal ou global da função cerebral, com mais de 24 horas de duração, podendo levar ao óbito, sendo de suposta origem vascular (Wolfe1, 2000). Os sinais e sintomas do AVE variam de acordo com a localização e a extensão da hemorragia ou isquemia, podendo haver hemiplegia completa contralateral com alteração da fala, diminuição da sensibilidade e desvio conjugado dos olhos, déficit sensitivo, sobreposto ao déficit motor contralateral, vertigens, desequilíbrio, afasia, alterações cognitivas, perceptuais e/ou alterações visuais (Chaves2 2000). Nesse contexto, cabe afirmar que, após uma lesão cerebral, alguns indivíduos podem apresentar dificuldades na realização de habilidades motoras e cognitivas, bem como para a aquisição de novas habilidades (Caldas3 2000). Essa dificuldade deve-se, em grande parte, à alteração na capacidade de aprendizagem, relacionada por muitas vezes com a topografia lesional do AVE em território de artéria cerebral medial e anterior (Bond e Morris4 2000). Nesse contexto, já que a capacidade de aprendizagem motora pode estar afetada após o AVE, uma das habilidades que, por conseqüência, também pode estar comprometida é a capacidade de desempenhar atividades combinadas, também denominadas de dupla tarefa. A dupla-tarefa é um método que tem sido utilizado para determinar a demanda atencional de tarefas particulares, sendo que seu desempenho, conhecido como desempenho simultâneo, envolve a execução de uma tarefa primária, que é o foco principal de atenção, e uma tarefa secundária, executada concomitantemente (Teixeira e Alouche5 2007). Segundo Bond e Morris4 (2000), no paciente neurológico essa capacidade de realização de dupla-tarefa encontra-se prejudicada. Para Schmidt e Wrisberg6 (2001), a capacidade de atenção no ser humano, além de ser limitada, apresenta-se de forma seriada em relação à natureza da tarefa executada, pois normalmente focaliza-se primeiro a atenção em uma atividade para depois haver possibilidade de direcionar atenção para duas tarefas ao mesmo tempo. Sendo assim, parece ser uma tarefa muito complexa tentar processar qualquer combina- 129 ISSN 2176-9095 ção dessas modalidades de informação, simultaneamente. Segundo Teixeira e Alouche5 (2007), em circunstâncias normais, a realização concomitante de tarefas motoras e cognitivas é comum e, nessas situações, as atividades motoras são desempenhadas automaticamente, ou seja, não requerem recursos atencionais conscientes. Esse estágio autônomo do desempenho de uma habilidade motora é alcançado a partir de um processo de aprendizagem motora no qual a prática e sua variabilidade levam à formação de programas de ação que permitem aumentar o repertório funcional do ser humano. Essa capacidade funcional encontra-se extremamente limitada em sujeitos pós-AVE, limitando a habilidade de realizar atividades funcionais como andar e autocuidar-se (Horváth et al.7 2001). A habilidade de andar é um fator primordial para determinar se o paciente irá retornar à fase anterior de produtividade após o AVE (Von Schroeder et al.8 1995). Para Shumway-Cook e Woollacott9 (2003), durante a marcha, ao percorrer um ambiente complexo ou cheio de objetos, informações sensoriais são solicitadas para ajudar no controle e na adaptação do andar. Nesse sentido, o comportamento locomotor inclui também a capacidade de iniciar e terminar a locomoção, ajustar e adaptar o andar de maneira a evitar obstáculos e alterar a velocidade e a direção de acordo com o ambiente. Além dessa demanda, a marcha geralmente contextualiza-se como tarefa primária, já que quando se analisa o andar nas atividades diárias, este sempre está associado a uma tarefa secundária, como falar, carregar objetos ou associado a processos mentais internos. Esse acoplamento de tarefa primária e secundária é aprendido e adquirido ao longo da vida com a prática e a experiência (Bond e Morris4 2000). Durante o processo de aquisição de uma habilidade motora, o córtex é totalmente exigido enquanto o processo de aquisição consolida-se. Após a automatização, os movimentos passam a ocorrer na área subcortical (núcleos da base, cerebelo e tálamo) deixando a área cortical livre para processar informações mais complexas. Ou seja, a automatização torna possível a execução de duplas tarefas (Bond e Morris4 2000). Caso haja um prejuízo do desempenho da tarefa primária na execução da dupla tarefa, pode-se afir- Relato de Pesquisa /Research Reports Fisioterapia Torriani-Pasin C, Lin K, Arjona M, Silva PY, Lima RZ. Efeitos da dupla tarefa na marcha de pacientes hemiparéticos. São Paulo • Science in Health • 2010 set-dez; 1(3): 128-35 mar que não há automatização desta tarefa primária, e essa piora no desempenho é denominado de consequência da atividade dupla (Teixeira e Alouche5 2007). Esse prejuízo na tarefa primária e/ou na tarefa secundária ocorre porque as duas tarefas competem por demandas similares para o seu processamento. Sabendo-se do papel fundamental da ativação da área motora suplementar (MAS) e do córtex motor primário (CMP) durante a execução de um ato motor, bem como da necessidade da área frontal do cérebro para viabilizar a construção e execução de uma ação, supõe-se que, para viabilizar o desempenho de uma tarefa com demanda motora e cognitiva haverá acionamento e maior conexão cerebral entre essas áreas e as demais, fato este que pode tornar-se prejudicado após uma lesão encefálica (Camicioli et al.10 1998). Segundo Yang et al.11 (2007), para os indivíduos com alguma lesão neurológica o ato de realizar duas tarefas diferentes simultaneamente ocasiona pior desempenho após um AVE, quando comparado com idosos saudáveis e, ainda, quando indivíduos com AVE realizam alguma tarefa cognitiva simultaneamente com a marcha, ocorre um decréscimo na velocidade, bem como maior desequilíbrio durante a marcha. Nesse contexto, a literatura não apresenta indícios concretos da repercussão de tarefas com demandas motoras e cognitivas associadas em pacientes com lesão cerebral após um AVE. Assim, o objetivo deste estudo é investigar os efeitos da realização de dupla tarefa com demandas cognitivas, motoras e/ou cognitivo-motoras durante a macha em paciente pós-AVE. Métodos A.Local O estudo foi realizado na clínica de fisioterapia do Centro Universitário FMU, local onde os pacientes foram selecionados. B. Casuística Foram selecionados para o grupo experimental (GE) 12 pacientes com idade entre 40 a 65 anos, com história de lesão encefálica unilateral, único episódio de AVE, que possuíam o diagnóstico funcional de hemiparesia e lesão em território de artéria cerebral média ou anterior, apresentando marcha independente sem uso de auxílio externo, com pontuação no Mini Exame do Estado Mental superior a 23 pon- 130 ISSN 2176-9095 tos, com capacidade cognitiva para realizar as tarefas a serem analisadas e que não possuíam alterações músculo-esqueléticas, reumatológicas e cardiorrespiratórias. O grupo controle (GC) constituiu-se de 12 sujeitos saudáveis com idade entre 40 e 65 anos. Os pacientes que apresentaram marcha dependente de recursos externos e alterações cognitivas que comprometessem a compreensão dos testes propostos fizeram parte do grupo de exclusão. O estudo foi aprovado pelo Comitê Ético Interno da Instituição, e foram respeitados os aspectos éticos concernentes à Resolução de nº 196 de 10 de outubro de 1996, que delimita diretrizes e normas regulamentadoras de pesquisas envolvendo seres humanos. A coleta de dados iniciou-se após assinatura de termo de Consentimento Livre e esclarecido, contendo explicações detalhadas sobre o estudo e sua finalidade. C.Materiais Durante o procedimento foram utilizados os seguintes materiais: calculadora convencional, um avental com bolsos bilaterais, uma bola de pingue-pongue e um pedômetro Tech Line. D. Delineamento Após a seleção dos sujeitos foi realizada a avaliação da velocidade da marcha de forma auto-selecionada em uma passarela de 10 metros, sem nenhuma tarefa concorrente, por três vezes consecutivas, a fim de garantir uma média dos valores (Tarefa 1). O método de avaliação foi utilizar a velocidade como uma medida isolada do andar funcional, uma vez que ela é simples, rápida, composta das variáveis temporoespaciais, sendo a avaliação primordial para a análise da marcha humana (Horváth et al.7 2001; Titianova et al.12 2005). Essa mensuração da velocidade de andar auto-selecionada pelo paciente, independentemente do tipo de superfície, é fundamental, pois representa uma pontuação acumulativa da qualidade da confiança e da capacidade exibidas pelo paciente durante o andar. Sequencialmente foi avaliada a marcha no mesmo espaço de 10 metros com a atividade concorrente de demanda cognitiva por três vezes consecutivas, a fim de garantir uma média dos valores (Tarefa 2), na qual o paciente deveria memorizar uma sequência de 5 números por 1 minuto e repeti-la verbalmente, enquanto realizava a marcha. Após essa etapa, avaliou-se a marcha com a atividade concorrente de demanda motora por três Relato de Pesquisa /Research Reports Fisioterapia Torriani-Pasin C, Lin K, Arjona M, Silva PY, Lima RZ. Efeitos da dupla tarefa na marcha de pacientes hemiparéticos. São Paulo • Science in Health • 2010 set-dez; 1(3): 128-35 vezes consecutivas, a fim de garantir uma média dos valores (Tarefa 3). Para isso, enquanto o paciente realizava a marcha de 10 metros, devia pegar uma bola de pingue-pongue situada em um bolso, sendo que havia bolsos bilateralmente, e transferi-la para o outro. Por fim, foi avaliada a atividade concorrente de demandas cognitivas e motoras associadas, por três vezes consecutivas, a fim de garantir uma média dos valores, na qual o paciente, durante a marcha, devia repetir verbalmente a mesma sequência numérica vista anteriormente e ao mesmo tempo digitá-la em uma calculadora (Tarefa 4). As 4 tarefas foram realizadas aleatoriamente de forma que suas execuções eram ordenadas diferentemente para cada sujeito. Os dados foram avaliados por meio das seguintes medidas quantitativas: velocidade e número de passos nas quatro situações avaliadas, tanto na avaliação do GC quanto no GE. E. Análise estatística ISSN 2176-9095 A análise estatística foi realizada com base nos Softwares: SPSS V11.5, Minitab 14 e Excel XP. Para a análise, foram utilizados os testes de MannWhitney e Igualdade de Duas Proporções. Por fim, na complementação da análise descritiva, fez-se uso da técnica de Intervalo de Confiança para a média. A análise dos dados contemplou avaliação intergrupo (Grupos: GC x GE em cada tarefa) e intragrupo (GC e GE nas quatro tarefas) Foi definido para este trabalho um nível de significância de 0,05 (5%) e todos os intervalos de confiança foram construídos com 95% de confiança estatística. Ressalta-se que foram utilizados testes e técnicas estatísticas não paramétricas, porque as condições para a utilização como a normalidade e homogeneidade das variâncias não foram encontradas neste conjunto de dados. Tabela 1 - Dados relativos ao número de passos nas 4 tarefas para GC e GE. Nº Passos Tarefa 1. Marcha Tarefa 2. Marcha com Demanda Cognitiva Tarefa 3. Marcha com Demanda Motora Tarefa 4. Marcha com Demanda Cognitivo-motora GC GE GC GE GC GE GC GE Média Mediana 12,75 27,17 12,50 28,00 13,67 33,50 13,50 35,50 12 23,5 12 23,5 14 26,5 12,5 29,5 Desvio Padrão 2,18 9,20 2,68 9,69 2,15 16,70 3,15 17,21 CV Tamanho 17,1% 33,9% 21,4% 34,6% 15,7% 49,8% 23,3% 48,5% 12 12 12 12 12 12 12 12 CV Tamanho p-valor 0,12 0,26 0,19 0,22 0,19 0,23 0,15 0,23 9,2% 42,4% 17,9% 38,1% 18,2% 46,5% 15,9% 55,6% 12 12 12 12 12 12 12 12 p-valor <0,001* <0,001* <0,001* <0,001* Legenda: CV: coeficiente de variação; GC: grupo controle; GE: grupo experimental Tabela 2 - Dados relativos à velocidade média nas 4 tarefas para GC e GE. Velocidade de Marcha Tarefa 1. Marcha Tarefa 2. Marcha com Demanda Cognitiva Tarefa 3. Marcha com Demanda Motora Tarefa 4. Marcha com Demanda Cognitivo-motora Média Mediana GC GE GC GE GC GE GC GE 1,30 0,61 1,05 0,59 1,04 0,50 0,97 0,41 Desvio Padrão 1,25 0,64 1,06 0,66 1,00 0,55 1,00 0,46 Legenda: CV: coeficiente de variação; GC: grupo-controle; GE: grupo experimental 131 <0,001 <0,001 <0,001 <0,001 Relato de Pesquisa /Research Reports Fisioterapia Torriani-Pasin C, Lin K, Arjona M, Silva PY, Lima RZ. Efeitos da dupla tarefa na marcha de pacientes hemiparéticos. São Paulo • Science in Health • 2010 set-dez; 1(3): 128-35 Resultados Na Tabela 1 apresenta-se a análise intergrupo, referente à comparação do GC e GE, quanto ao desempenho durante as 4 tarefas relacionadas à variável número de passos. A seguir, na Tabela 2, apresenta-se a comparação entre o GC e GE no que se refere à variável velocidade média de marcha durante as execução das 4 tarefas. Nota-se que existe diferença estatisticamente significante (p<0,001) entre o GC e GE tanto para o número de passos quanto para a velocidade média de marcha durante a execução das 4 tarefas. A seguir, ilustra-se a análise intragrupo para cada variável mensurada. Analisando o Gráfico 1, considerando-se que quanto menor o número de passos melhor a execução da tarefa realizada, pode-se observar que no GC as tarefas de melhor desempenho foram as da marcha (Tarefa 1) e a de marcha com demanda cognitiva (Tarefa 2), seguidas da tarefa cognitivo-motora (Tarefa 4) e por último a com demanda motora (Tarefa 3). No GE, a ordem relativa ao melhor desempenho foi a de marcha (Tarefa 1) e marcha com demanda cognitiva Gráfico 1. Valores de média do número de passos realizados pelo GC e GE nas 4 tarefas testadas. Gráfico 2. Valores de média da velocidade média realizados pelo GC e GE nas 4 tarefas testadas. 132 ISSN 2176-9095 Relato de Pesquisa /Research Reports Fisioterapia Torriani-Pasin C, Lin K, Arjona M, Silva PY, Lima RZ. Efeitos da dupla tarefa na marcha de pacientes hemiparéticos. São Paulo • Science in Health • 2010 set-dez; 1(3): 128-35 (Tarefa 2), seguidas pela marcha com demanda motora (Tarefa 3) e, por último, com a demanda cognitivomotora (Tarefa 4), apresentando pior valor. Considerando-se que quanto maior a velocidade média melhor a realização da tarefa (Von Schroeder et al.8, 1995), no Gráfico 2 pode-se notar que para o GC a melhor performance ocorre na tarefa de marcha (Tarefa 1), seguida pela marcha com demanda cognitiva (Tarefa 2), e por último com demanda motora (Tarefa 3) e cognitivo-motora (Tarefa 4), que apresentaram mesmo valor. No GE, a tarefa com demanda cognitiva (Tarefa 2) apresentou melhor resultado, seguido pela tarefa apenas de marcha (Tarefa 1), pela marcha com demanda motora (Tarefa 3) e por último pela marcha com demanda cognitivo-motora (Tarefa 4). Em relação à comparação entre as 4 tarefas no GC (Gráfico 1, 2) observou-se que o fato de desempenhar dupla tarefa, tanto de caráter cognitivo quanto motor impactou de forma pouco significativa em relação ao número de passos, porém, em relação à velocidade nota-se que a realização de tarefa concorrente impactou de forma mais significativa. Já no GE pode-se notar que o desempenho mensurado por meio da velocidade nas 4 tarefas apresentou-se de modo semelhante tanto para o número de passos quanto para a velocidade. Portanto, assim como nos sujeitos-controle, os pacientes hemiparéticos apresentam pior desempenho durante a combinação de tarefa com demandas cognitivo-motoras associadas. Realizou-se uma análise comparativa dos resultados de cada tarefa considerando-se o lado da lesão encefálica (5 pacientes lesão à direita e 5 à esquerda). Em ambos os parâmetros de marcha avaliados, não houve diferença estatisticamente significante entre o desempenho de pacientes com lesão no hemisfério direito e esquerdo em nenhuma das 4 tarefas testadas, e obteve-se o mesmo resultado quando comparados os gêneros masculino e feminino (8 e 4 sujeitos, respectivamente). Discussão O alvo deste estudo é investigar os efeitos da dupla tarefa com demanda cognitiva e motora no desempenho da marcha de pacientes hemiparéticos pós-AVE. Nota-se, neste estudo, que, em relação à velocidade média e ao número de passos, todas as tarefas 133 ISSN 2176-9095 apresentaram diferença estatisticamente significante, sendo que o GC apresentou maior velocidade média e menor número de passos quando comparado com o GE. Durante a realização da dupla tarefa, ambos os grupos apresentaram desempenho prejudicado. Nesse contexto, para Titianova et al.12 (2005), a velocidade da marcha afeta parâmetros espaciais e temporais tanto em sujeitos saudáveis quanto em pacientes, sugerindo que o déficit da marcha poderia ser detectado e observado em relação a essa medida. Portanto, pode-se indicar que o GE apresentou uma marcha mais comprometida, ou seja, houve deterioração da tarefa primária quando acoplada a tarefas secundárias, em relação ao GC. Segundo Camicioli et al.10 (1998), indivíduos saudáveis apresentam dificuldades ao realizar a dupla tarefa durante a marcha no que se refere à quantidade de passos, mas, quando comparados a pacientes neurológicos, esse prejuízo é muito menor, o que corrobora os resultados encontrados. No presente estudo, os pacientes hemiparéticos pós-AVE, não apresentaram disponibilidade total para realizar uma segunda tarefa concomitante à marcha, já que a tarefa central, no caso a marcha, mesmo sendo uma habilidade extremamente praticada antes do evento vascular e inerente ao ser humano, ainda demanda muita atenção de tais pacientes, não favorecendo a disponibilidade de atenção necessária para a combinação de uma segunda tarefa. Com respeito a lesões neurológicas, O´Shea et al.13 (2002) relatam que pacientes com doença de Parkinson apresentam menor número de passos e menor velocidade quando executam dupla tarefa, fato este que também pode ser verificado no presente estudo com a população AVE. Assim, apesar da topografia lesional ser distinta em pacientes hemiparéticos e com Parkinson, pode-se notar que tais comprometimentos neurológicos incapacitam a habilidade de realizar tarefas concorrentes, justificando-se algumas incapacidades funcionais apresentadas pelos mesmos. Voelcker-Rehage et al.14 (2006) realizaram um trabalho e encontraram pouca diferença no desempenho entre idosos e jovens saudáveis, quando executaram isoladamente tarefas cognitivas e motoras, porém, quando, associadas em dupla tarefa, apresentaram grandes diferenças, sendo os idosos mais prejudicados na execução de tarefas concomitantes. Neste estudo, o GE apresentou diferenças estatis- Relato de Pesquisa /Research Reports Fisioterapia Torriani-Pasin C, Lin K, Arjona M, Silva PY, Lima RZ. Efeitos da dupla tarefa na marcha de pacientes hemiparéticos. São Paulo • Science in Health • 2010 set-dez; 1(3): 128-35 ticamente significantes em relação ao GC, independentemente se em única tarefa ou dupla tarefa. Com isso, verifica-se que, além do fator idade, a lesão encefálica provavelmente agrava ainda mais a execução de dupla tarefa. Além disso, de forma semelhante aos achados de Voelcker-Rehage et al.14 (2006), no presente estudo o GC também apresentou desempenho inferior ao realizar dupla tarefa. Segundo Cockburn et al.15 (2003), os efeitos da interferência cognitivo-motora são mais evidentes durante a marcha do que na performance cognitiva, sendo que as atividades de vida diárias incorporam componentes tanto motores quanto cognitivos, ficando praticamente impossível distingui-los. Esse fato salienta a necessidade de comparação do desempenho de tais pacientes em tarefas com demandas predominantemente cognitivas, motoras e cognitivo-motoras. Em um estudo realizado por Roerdink et al.16 (2006), verificou-se que pacientes pós-AVE, quando executam tarefa cognitiva, apresentam deterioração do controle postural (mensurado pelo deslocamento do centro de gravidade), diminuindo a estabilidade local. Além disso, a realização de dupla tarefa faz com que os pacientes aumentem a dimensão do seu centro de gravidade, prejudicando, também, o desempenho de tarefas cognitivas e do controle postural. Segundo Yang et al.11 (2007), as habilidades de andar e executar dupla tarefa são muito importantes para os programas de reabilitação, pois fazem parte de muitas atividades da vida diária. Assim, faz-se necessária a avaliação do desempenho de dupla tarefa em pacientes neurológicos para que tais habilidades possam ser mensuradas, treinadas e novamente mensuradas, visando determinar a capacidade de aprendizagem de dupla tarefa e a efetividade do programa de fisioterapia na reinserção social dos pacientes. Para o GE, a tarefa que propiciou desempenho pior 134 ISSN 2176-9095 foi a com demanda cognitivo-motora, que, segundo Cockburn et al.15 (2003), demanda maior acionamento e conexão cerebral, aumentando a complexidade da tarefa, sendo os efeitos da tarefa concorrente mais evidentes. Essa pode ser a razão pela qual a tarefa cognitivo-motora foi a que mais apresentou-se prejudicada no GE. Já para o GC, a tarefa de pior desempenho foi com demanda motora, o que pode estar relacionado ao fato de a tarefa não apresentar nenhum desafio e ser menos interessante aos indivíduos, o que pode ter resultado em um desempenho inferior quando comparado com as outras tarefas. Por meio da análise dos resultados do presente estudo, pode-se observar que o desempenho de dupla tarefa com demanda cognitiva, quando comparada com demanda motora e/ou demanda cognitivo-motora, apresentou menor significância devido ao fato de os indivíduos selecionados não apresentarem déficit cognitivo ou também por não haver uma dificuldade acentuada na tarefa cognitiva apresentada. Sendo assim, sugere-se que, para os próximos estudos, sejam investigadas tarefas com demandas e níveis de complexidade diferentes para avaliar se realmente essa é a tarefa com menor dificuldade quando comparada com outras tarefas concorrentes. Conclusão Conclui-se que a realização de dupla tarefa para o paciente com lesão encefálica encontra-se comprometida, e as tarefas que associam caráter cognitivo e motor contribuem para um pior desempenho na marcha desses pacientes. A realização da dupla tarefa encontra-se comprometida no GE para número de passos e velocidade, ou seja, há impacto negativo da associação de tarefa cognitiva com a marcha. Relato de Pesquisa /Research Reports Fisioterapia Torriani-Pasin C, Lin K, Arjona M, Silva PY, Lima RZ. Efeitos da dupla tarefa na marcha de pacientes hemiparéticos. São Paulo • Science in Health • 2010 set-dez; 1(3): 128-35 ISSN 2176-9095 Referências 1. Wolfe CD. The impact of stroke. Br Med Bull. 2000;56(2):275-86. 2. haves, MLF. 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Camila Paschoal Bezerra* Wilson Emanuel Fernandes dos Santos** Resumo Abstract O presente artigo tem por objetivo evidenciar a relação existente entre a predisposição biológica para o desenvolvimento das habilidades relacionadas à “inteligência emocional” e os componentes envolvidos na caracterização comportamental da liderança, com a finalidade de demonstrar que, em se tratando de aspectos biológicos como uma das variáveis que interferem diretamente na criação dessas habilidades, o sexo feminino apresenta características cerebrais anatômicas, morfológicas e neurais que permitem uma eficaz articulação da liderança através de seus componentes. A pesquisa foi realizada nas fronteiras interdisciplinares da Administração e da Psicologia, por meio de pesquisa bibliográfica baseada tanto em artigos científicos, revistas científicas e periódicos reconhecidos e validados em sua devida área de atuação, como em pesquisas previamente divulgadas, procurando-se estabelecer conexões claras entre o gerenciamento dos componentes comportamentais e as habilidades do cérebro e, posteriormente, a configuração de perfil de liderança. Com base no evidenciamento e caracterização desses componentes e habilidades e de sua associação com a configuração ao perfil de liderança estabelecido, poderá ser observado como resultado a constatação de que, sendo a inteligência um potencial biopsicológico, flexível e inicialmente influenciado por características anatômicas, morfológicas e neurais, podemos identificar relações entre a predisposição de qualquer indivíduo do sexo feminino e o desenvolvimento de características específicas e decisivas para o surgimento de habilidades envolvidas na construção da liderança. Compreender os aspectos relacionados à liderança permite maior clareza quanto às possibilidades de gerenciamento e definição de objetivos e trajetórias por parte das corporações, bem como um melhor e mais coeso gerenciamento de suas equipes. The present article has for objective to evidence the existent relationship among the biological predisposition for the development of the abilities related to the “emotional intelligence” and the components involved in the behavior characterization of the leadership, with the purpose of demonstrating that, in if treating of biological aspects as one of the variables that they interfere directly in the creation of those abilities, the feminine sex presents anatomical, morphologic cerebral and neural characteristics that allow an effective articulation of the leadership through your components. The research was accomplished in the borders of the Administration and of the Psychology, through bibliographical research based so much on scientific goods, scientific magazines and recognized newspapers and validated in your owed area of performance, as in researches previously published, trying to settle down clear connections between the administration of the behavior components and the abilities of the brain and, later, the configuration of leadership profile. With base in the evidence and characterization of those components and abilities and of your association with the configuration to the established leadership profile, it can be observed as result the verification that, being the intelligence a biological and psychological potential, flexible and initially influenced by characteristics anatomical, morphologic and neural, we can identify relationships among the predisposition of any individual of the feminine sex and the development of specific and decisive characteristics for the appearance of abilities involved in the construction of the leadership. To understand the aspects related to the leadership allows larger clarity with relationship to the administration possibilities and definition of objectives and paths on the part of the corporations, as well as a best and more united administration of your teams. Descritores: Liderança • Inteligência emocional • Diferen- Keywords: Leadership • Emotional intelligence • Sexual dif- ciação sexual. ferentiation. ** Administradora pela Universidade Cidade de São Paulo (UNICID), atua na IBM Brasil - GTS OM&D Team.. ** Docente do curso de Administração da UNICID, Administrador e Sociólogo pela Universidade de São Paulo (USP), possui Mestrado Profissional (MBA) pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) e Especialização em Gestão Bancária pela UNICID, atualmente é Mestrando no Departamento de Sociologia da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo (USP) e desenvolve pesquisas na área de Gestão de Pessoas, especialmente relacionadas às características do trabalho nas organizações contemporâneas. 136 Comunicação Curta /Short Communication Administração Bezerra CP, Santos WEF. Liderança: Uma relação entre predisposição biológica, inteligência emocional e diferenciação sexual. São Paulo • Science in Health • 2010 set-dez; 1(3): 136-44 1. INTRODUÇÃO As considerações aqui propostas são baseadas no conceito da liderança de acordo com a Ciência da Administração. O contexto deste artigo apresenta as relações existentes entre as habilidades presentes para que uma liderança efetivamente ocorra tanto para o sucesso do funcionário como para o êxito das equipes e da organização em questão. A partir disso, procura-se estabelecer a relação entre a predisposição biológica e a conseguinte possibilidade de desenvolvimento das características que definem o que é liderança. Estudos relacionados à diferenciação sexual (ou seja, as diferentes características anatômicas, morfológicas e funcionais que ocorrem entre homens e mulheres devido à sua constituição biológica) também são fontes para a construção deste artigo. Tais diferenças se encontram nos mais variados órgãos e tecidos do corpo humano, definindo diferenças básicas entre os sexos. Justamente pelo fato de que a diferenciação sexual ocorre em todos os tecidos do corpo humano, é vital entendermos o funcionamento do cérebro feminino e como este gerencia as habilidades cognitivas que irão definir e compor a liderança. As habilidades cognitivas demonstradas neste artigo são as habilidades definidas como inteligência emocional e seu entendimento é também de fundamental importância para a construção e compreensão deste artigo. Mais do que isso, compreender os aspectos relacionados à liderança é também conhecer e entender o comportamento humano e, dessa forma, propiciar a utilização dessas informações, tanto no desenvolvimento do potencial humano nas organizações como do delineamento de estratégias organizacionais. 2. MÉTODOS Desenvolve-se a pesquisa pelo método analítico, iniciando-se pela definição conceitual geral dos termos fundamentais dos elementos discutidos (a liderança, o comportamento abordado pela inteligência emocional e a predisposição biológica do cérebro feminino em relação ao comportamento de liderança em questão), seguida pelo desenvolvimento da compreensão do conteúdo de cada componente que caracteriza tais elementos. Por fim, estabelece-se a relação entre esses elementos a partir de seus componentes caracterizadores. 137 ISSN 2176-9095 A pesquisa foi fundamentada em investigação teórica e de resultados empíricos de pesquisas já publicadas, a partir de bibliografia e artigos científicos em periódicos especializados e reconhecidos internacionalmente. 3. RESULTADOS 3.1 A LIDERANÇA E SEUS COMPONENTES “As pessoas são capazes de realizar feitos incríveis. Mas é preciso saber conduzi-las e estimulá-las por meio da liderança e da motivação” (chiavenato, 2007, p. 172). Através dessa afirmação, Chiavenato, autor brasileiro na área de administração de empresas e recursos humanos, e o atual conselheiro no Conselho Regional de Administração do Estado de São Paulo (CRA-SP), descortina os caminhos rumo a um tema de importância vital para a continuidade das organizações e o desenvolvimento da gestão de pessoas: a liderança. Foco de pesquisas no mundo todo, a compreensão da liderança é, para a visão da ciência da Administração, simultaneamente a compreensão do comportamento dos indivíduos e da influência interpessoal sob a ótica das estratégias das organizações. Em se tratando do conceito de liderança, podemos afirmar que liderança é a influência interpessoal exercida numa situação e dirigida através do processo de comunicação humana à consecução de um de diversos objetivos específicos (chiavenato, 1983). Seguindo essa mesma abordagem, temos que “liderança é um relacionamento de influência de pensamentos, crenças e comportamentos. É um relacionamento de visão, valores e responsabilidades compartilhadas” (drucker, 2004, p. 59). Também podemos considerar que “a liderança é, antes de qualquer coisa, a capacidade de inspirar as pessoas” (cortella; mussak, 2009, p. 15). Considerando que a liderança é uma influência interpessoal, é fundamental também compreendermos o conceito de influência: “A influência é uma força psicológica, uma transação interpessoal na qual uma pessoa age de modo a modificar o comportamento de uma outra, de algum modo intencional” (chiavenato, 1983, p. 126). Para que a influência interpessoal característica da liderança efetivamente ocorra, é fundamental que o líder seja capaz de identificar os conflitos existentes em seu grupo ou time, compreendendo as necessida- Comunicação Curta /Short Communication Administração Bezerra CP, Santos WEF. Liderança: Uma relação entre predisposição biológica, inteligência emocional e diferenciação sexual. São Paulo • Science in Health • 2010 set-dez; 1(3): 136-44 des por eles apresentadas e assegurando a compreensão dos objetivos do time, grupo ou da organização, por parte de todos. Essa capacidade do líder em influenciar pessoas e identificar antecipadamente conflitos em prol de um objetivo em comum requer significativa e correta aplicação de habilidades, como o autocontrole e equilíbrio que, por sua vez, são pontos-chaves para a construção e solidificação da chamada estabilidade emocional: estabilidade emocional é associada em manter-se equilibrado sob pressão, estar apto para a resolução de conflitos e ser capaz de digerir feedbacks negativos, tudo para a promoção da eficácia do time (hogan et al., 1994). De fato, estabilidade emocional e compreensão de conflitos permitem que a organização esteja mais bem preparada para o alcance de seus objetivos. O alcance de objetivos a partir da ação coletiva e sinergia de esforços é uma das evidências de que a interdependência entre os seres humanos é natural para sua sobrevivência. Sendo o homem um ser eminentemente social, o estabelecimento de relações sociais é uma necessidade básica e a liderança é um dos aspectos relacionados a essa convivência social. Por ser fruto de uma relação social, a liderança é fundamentalmente dirigida através do processo de comunicação. Logo, a comunicação é de crucial importância para a construção e conseguinte efetividade da liderança. O processo da comunicação no âmbito da liderança também se manifesta como chave para a transmissão e compreensão dos planos de uma organização. “Um executivo eficaz se certifica de que todos entendam tanto seus planos de ação quanto a informação de que necessita” (drucker, 2004, p. 59). Além disso, as relações humanas no ambiente das organizações configuram-se como um elemento fundamental para a solidificação de uma cultura de respeito entre os funcionários e de credibilidade nas equipes. Essa atitude de respeito deve estar, portanto, presente de forma constante no ambiente corporativo e “deve basear-se no princípio do reconhecimento de que os seres humanos são entes possuidores de uma personalidade própria que merece ser respeitada” (balcão; cordeiro, 1967, p. 38). Essa atitude de respeito para com os demais é baseada na compreensão de suas características e necessidades peculiares e “implica uma compreensão 138 ISSN 2176-9095 sadia de que toda pessoa traz consigo, em todas as situações, necessidades materiais, sociais ou psicológicas, que procura satisfazer e que motivam e dirigem o seu comportamento neste ou naquele sentido” (balcão; cordeiro, 1967, p. 38). Isso significa dizer que o desenvolvimento de relações humanas é também dependente do fator de reconhecimento e compreensão do líder para com cada pessoa da sua rede social em seu time e na organização da qual faz parte. Considerando os pontos elucidados até o presente momento, a liderança é definida e caracterizada por um conjunto de 5 (cinco) componentes principais: capacidade de influenciar pessoas; capacidade de motivar (inspirar) pessoas; capacidade de desenvolvimento de relações humanas (sadias e através de comunicação eficaz); equilíbrio (autodisciplina) e capacidade de manutenção de relacionamentos humanos previamente estabelecidos (através da antecipação e resolução de conflitos). Esses cinco componentes extraídos do conceito de liderança, a partir da ciência da Administração podem ser relacionados com os conceitos e componentes fundamentais da chamada “inteligência emocional”. 3.2 A INTELIGÊNCIA EMOCIONAL E SUA RELAÇÃO COM A LIDERANÇA Inicialmente definida em artigos publicados em 1990, pelos psicólogos Jack Mayer da Universidade de New Hapshire, e Peter Salovey da Universidade de Yale, o termo “inteligência emocional” refere-se ao “conjunto de habilidades através das quais as pessoas lidam com suas próprias emoções e com as emoções dos outros” (salovey; mayer, 1990, p. 443). O conceito de inteligência emocional foi popularizado pelo psicólogo Daniel Goleman, em seus livros Emotional Intelligence e Working With Emotional Intelligence, entre outras publicações, em que expande a noção de inteligência emocional para incluir um conjunto de habilidades não cognitivas. Goleman afirma e descreve os cinco principais componentes da inteligência emocional: autoconhecimento ou autodisciplina, equilíbrio ou autoconsciência, motivação, empatia e habilidades sociais (goleman, 1998). Para Goleman (1998), os cinco componentes da inteligência emocional podem ser separados em dois blocos principais, o bloco definido como “habilidades de autogerenciamento”, composto por autoconhe- Comunicação Curta /Short Communication Administração Bezerra CP, Santos WEF. Liderança: Uma relação entre predisposição biológica, inteligência emocional e diferenciação sexual. São Paulo • Science in Health • 2010 set-dez; 1(3): 136-44 ISSN 2176-9095 cimento, equilíbrio e motivação, e o bloco definido como “a habilidade em se relacionar com os outros”, composto pelos dois últimos componentes: a empatia e habilidades sociais. As cinco habilidades são mostradas na tabela abaixo: Podemos observar que as habilidades definidas uma inteligência que revela aspectos introspectivos de reflexão e autocompreensão manifestados na interpretação de sentimentos e emoções, relacionando-se a linguagens que servem de base para entender e executar comportamentos (brennand; vasconcelos, 2005, p. 19). Tabela I – Blocos de habilidades da inteligência emocional. Observando o trecho acima, é possível relacionar a capacidade de gerenciamento dessa habilidade com a interpretação de comportamentos humanos, fator fundamental para o sucesso de uma liderança eficaz. “Para constatá-la, é necessário examinar sua expressividade a partir da linguagem, da música ou de outra forma de expressão que torne possível a observação de sua manifestação” (gardner, 1987, p. 25). Em se tratando de aspectos biológicos e do gerenciamento dessa habilidade pelo cérebro humano, o lobo frontal apresenta-se como responsável tanto pelo desenvolvimento da habilidade em questão como responsável por seu gerenciamento saudável: “um dano na região dos lobos frontais provavelmente produz irritabilidade ou euforia” (gardner, 1987, p. 25). Gur et al. afirmam que: Habilidades Habilidade de Habilidades em se autogerenciamento relacionar com os outros Autoconhecimento empatia (ou autoconsciência) equilíbrio habilidades sociais motivação Fonte: Goleman (1998) pela ciência da Administração como sendo essenciais para a caracterização da liderança, e as habilidades definidas pela Ciência da Psicologia (aqui representadas por Goleman, Salovey e Mayer), também como sendo necessárias para a composição da liderança, convergem. 3.3 O GERENCIAMENTO DA INTELIGÊNCIA EMOCIONAL PELO CÉREBRO FEMININO Uma vez analisado o conceito de liderança segundo a ciência da Administração, bem como as habilidades envolvidas para sua caracterização e sua associação com a inteligência emocional é fundamental a evidenciação da constituição de cada uma dessas cinco habilidades previamente mencionadas e o gerenciamento de cada uma delas pelo cérebro humano. 3.3.1 Autoconhecimento (autoconsciência) O Autoconhecimento ou autoconsciência é a base ou pré-requisito para a existência da inteligência emocional: “A inteligência emocional parte desse prérequisito. Pessoas que dispõem de alto nível de autoconhecimento conhecem suas próprias fraquezas e não têm medo de falar sobre elas” (goleman, 1998). Além de servir de base para o desenvolvimento das outras habilidades componentes da inteligência emocional, essa habilidade também é componente da inteligência intrapessoal. O autoconhecimento é parte integrante da chamada inteligência intrapessoal. A inteligência intrapessoal é 139 [...] diferenças sexuais em volumes regionais nos lobos frontais, em que as regiões orbitais frontais apresentaram-se relativamente mais largas em mulheres do que em homens.” Esses pesquisadores afirmam ainda que, “de fato, volumes frontais reduzidos foram associados com distúrbios de personalidade antissocial (2002, p. 1000). Tomando por base a afirmação de Gardner anteriormente mencionada, bem como a pesquisa realizada pelos pesquisadores norteamericanos, podemos observar que o funcionamento emocional e implicações comportamentais são processados nos lobos frontais no cérebro que, por sua vez, ao apresentar-se menor relaciona-se a distúrbios antissociais. Levando-se em conta que esta região cerebral é maior nas mulheres e que a compreensão de comportamentos está totalmente relacionada a essa região cerebral, podemos, portanto, afirmar que os aspectos biológicos cerebrais femininos ligados aos volumes regionais nos lobos frontais produzem uma predisposição para o desenvolvimento de habilidades relacionadas à inteligência intrapessoal, fundamental para o desenvolvimento da autodisciplina, bem como para a caracterização da liderança. Comunicação Curta /Short Communication Administração Bezerra CP, Santos WEF. Liderança: Uma relação entre predisposição biológica, inteligência emocional e diferenciação sexual. São Paulo • Science in Health • 2010 set-dez; 1(3): 136-44 3.3.2 Equilíbrio (autodisciplina) A inteligência relacionada ao equilíbrio considera que os indivíduos possuidores dessa habilidade sejam capazes de “compreender as expectativas sociais envolvidas em suas ações” (salovey; mayer, 1990, p. 443). Ainda segundo os pesquisadores norteamericanos, “a inteligência autorreguladora é de importância primária para os indivíduos emocionalmente inteligentes. (…) é o controle de impulsos emocionais inaceitáveis segundo a visão pública” (salovey; mayer, 1990, p. 443). Gur et al. constataram que: Nós constatamos que as mulheres (…) apresentam volume orbital aumentado com relação ao próprio volume da amígdala comparado ao de homens, suportando a hipótese de que as mulheres possuem maior volume de tecido disponível para a regulação de entrada da amígdala. Essa descoberta possivelmente explica as diferenças relacionadas ao gênero no que diz respeito ao comportamento emocional, particularmente agressividade (2002, p. 999). Essa descoberta é extremamente importante quando estamos estudando os fatores relacionados às condições que possibilitam a predisposição biológica para a liderança. Gur et al. ainda constatam que: Enquanto fatores ambientais e culturais certamente contribuem para a diferenciação sexual com relação à agressividade, a existência de tais diferenças neuroanatômicas evidenciadas na estrutura cerebral relacionadas à regulação emocional justifica esforços sistemáticos para relacionar o comportamento emocional com substratos neurais. Isso significa dizer que, devido ao tamanho e volume de sua amígdala, de forma geral, as mulheres têm menor tendência à agressividade ou comportamentos que demonstrem agressividade. De forma geral, podemos dizer que esse fato contribui significativamente para o desenvolvimento da capacidade autorreguladora por parte da mulher, auxiliando no processo de controle de impulsos e, consequentemente, auxiliando no processo de desenvolvimento do equilíbrio enquanto componente da inteligência emocional e consequentemente da liderança (2002, p. 1000). 3.3.3 Motivação “A motivação diz respeito à dinâmica do comportamento das pessoas. Motivar significa estimular as 140 ISSN 2176-9095 pessoas a fazer algo ou a se comportar rumo a determinada direção” (chiavenato, 2007, p. 172). Ainda segundo o autor, esse fator é não somente algo importante, como também vital para o desenvolvimento e eficácia da liderança, uma vez que “se há um atributo que todos os líderes eficazes possuem, é a motivação” (chiavenato, 2007, p. 172). Os estudos, aqui pesquisados também evidenciaram a conexão entre motivação, times e desempenho: A motivação para que membros do time performem coletivamente é proveniente do uso simbólico de técnicas de administração pelo líder. Técnicas simbólicas de administração como o uso de estórias, discursos inspiracionais (…) irão efetivamente estimular os indivíduos de forma a inspirá-los a performar de acordo com os valores do time e comportamentos-alvo definidos. [...] através da resolução de conflitos e encorajamento de interações de apoio entre os membros, o líder cria um ambiente de sustentação para os membros. Esse ambiente fornece aos membros do time certa substância de segurança emocional e fornece a base para o esforço coordenado (ashforth; humphrey, 1995, p. 97). Observando o fato de que Ashforth e Humphrey afirmam que o uso de técnicas de administração, como o uso de discursos e estórias, influencia diretamente na capacidade de motivar as pessoas, podemos automaticamente ligar a habilidade em motivar pessoas com a habilidade linguística e verbal. Com base no levantamento dos atributos envolvidos na sustentação da motivação, temos que, “mulheres performam melhor em atividades de reconhecimento emocional rápido, e são mais expressivas” (ashtana; mandal, 1998, p. 182). A atividade de reconhecimento emocional rápido está associada com a capacidade de compreensão de emoções e seu processamento no cérebro. A expressividade está relacionada ao gerenciamento de atributos e técnicas que induzem a manifestações, reflexões e formulações ligadas à áreas da comunicação e articulação linguística. Segundo Sosik e Megerian (1999, p.20), os chamados líderes transformacionais apresentam determinadas características que lhes permitem desenvolver sua inteligência emocional. Entre essas características, citam que a “motivação é atingida através do gerenciamento de conflitos entre membros de um time por seu líder, de forma a nutrir e solidificar as relações Comunicação Curta /Short Communication Administração Bezerra CP, Santos WEF. Liderança: Uma relação entre predisposição biológica, inteligência emocional e diferenciação sexual. São Paulo • Science in Health • 2010 set-dez; 1(3): 136-44 entre os membros” (sosik; megerian, 1999). Quanto aos líderes transformacionais, temos que: Comparadas com líderes masculinos, as líderes femininas são (a) mais transformacionais (...) líderes transformacionais definem objetivos futuros, desenvolvem planos para o atingimento desses objetivos e inovam, mesmo quando a organização está genericamente apresentando sucesso (earli; carli, 2003, p. 817-818). Assim como: [...] seja transformacional ou socializada, a liderança é direcionada rumo ao serviço de interesses coletivos, em que os líderes reconhecem a necessidade de compreensão e demonstram respeito por seus seguidores, intencionando motivá-los através do uso da razão e atrativos emocionais (avolio; bass, 1995, p. 200). Howard Gardner, psicólogo e professor da Harvard Graduate School of Education, afirma que os líderes “devem ter liderança linguística, pois contar suas histórias e confrontá-las com as demais é muito importante” (gardner, 1987, p. 253). A inteligência linguística, “potencial que revela a capacidade do indivíduo de aprender noções dos códigos linguísticos, guardá-los na memória e aplicá-los criativamente” (brennand; vasconcelos, 2005, p. 19) é fator fundamental para a confirmação de uma liderança eficaz. A inteligência linguística “traduz o valor da competência de escrever, interpretar e aplicar palavras em situações de comunicação e se revela no domínio da palavra, tanto representada por códigos escritos marcados em papéis e pedras, quanto na expressão oral da fala” (brennand; vasconcelos, 2005, p. 19). A inteligência linguística é evidenciada por Gardner como “um potencial que não depende de nenhum órgão sensorial especificamente; depende da complexidade de como é disposta no cérebro” (gardner, 1987, p. 50). O resultado quanto ao estudo da produção oral pode ser acompanhado abaixo: A produção oral é uma função fortemente esquerdodominante e que fundamenta-se sobre áreas do lóbulo frontal. (…). São importantes para o acesso às palavras apropriadas e o som da oratória. Trabalhos recentes também identificaram um circuito senso-motor responsável pela oratória no lóbulo temporal posterior esquerdo e sistemas de produção do mesmo. Este circuito está envolvido no desenvolvimento da locução e é responsável por suportar a memória 141 ISSN 2176-9095 verbal de curto prazo. (carey, 1990, p. 31). Gur et al. constatam: Diferenças sexuais (…) foram reportadas na morfologia do corpo caloso. Pelo fato do corpo caloso consistir em fibras de conexão mielínicas, o volume mais denso de corpo caloso presente nas mulheres foi interpretado como responsável por prover melhor comunicação entre os hemisférios cerebral e consequentemente, menor necessidade de especialização funcional dos dois hemisférios. [...] os resultados anatômicos sugerem algum paralelo entre diferenças sexuais em cognição e diferenças na massa cinzenta devido ao fato de ambos, mulheres e seu lado hemisférico esquerdo, responsável pela linguagem, possuírem uma maior porcentagem de massa cinzenta; e mulheres superam os homens em atividades relacionadas à linguagem (2000, p. 999). 3.3.4 Empatia A empatia é particularmente importante hoje, como componente da liderança, devido a, pelo menos, três razões: aumento no uso de times, rápido crescimento da globalização e a crescente necessidade na retenção de talentos (goleman, 1998). Fundamental para as organizações, o desenvolvimento de times torna-se fator decisivo para o sucesso das mesmas: Times são caldeirões de emoções borbulhantes. Normalmente, são responsáveis pelo atingimento de um consenso – difícil suficiente entre duas pessoas e muito mais difícil conforme o número de pessoas aumenta. [...] o líder de um time deve ser capaz de perceber e compreender os pontos de vista de todos os envolvidos. [...] estimular as pessoas a falarem mais abertamente sobre suas frustrações, compreendendo o fundo emocional do time (goleman, 1998, p. 71). Os efeitos da globalização quanto ao desenvolvimento dos negócios em escala mundial também se definem como fator essencial para o sucesso das organizações: Globalização é outra razão pelo aumento da importância de empatia pelos líderes de negócios. O diálogo ‘cross-cultural’ pode levar facilmente a mal-entendidos. A empatia é um antídoto. Pessoas que a possuem estão alerta às sutilidades na linguagem corporal; são capazes de ouvir a mensagem por trás das palavras ditas. Além disso, possuem um conhecimento mais amplo tanto da existência como da importância das diferenças culturais Comunicação Curta /Short Communication Administração Bezerra CP, Santos WEF. Liderança: Uma relação entre predisposição biológica, inteligência emocional e diferenciação sexual. São Paulo • Science in Health • 2010 set-dez; 1(3): 136-44 ISSN 2176-9095 Gur et al. afirmam que: e étnicas (Goleman, 1998, p. 75). Sabbatini considera: Um estudo dirigido pelo Dr. Godfrey Pearlson, da Universidade John Hopkins, Estados Unidos, demonstrou que duas áreas nos lobos frontais e temporais relacionados à linguagem (conhecidos como áreas de Broca e Wernicke, em homenagem a seus descobridores) são significativamente maiores nas mulheres, fornecendo assim um motivo biológico para a notória superioridade mental das mulheres relacionada à linguagem (2000, s/n). Essa constatação é de fundamental importância para a compreensão, desenvolvimento, manutenção e coordenação de novas linguagens e relacionamentos já existentes: por meio da utilização eficaz da linguagem e da compreensão, as diferenças culturais e étnicas advindas da globalização podem manter-se sólidas, intactas e com seu valor preservado. A retenção de talentos e o papel da empatia também foram alvo dos estudos de Goleman: A empatia interpreta um papel chave na retenção de talentos, particularmente na economia da informação de hoje. Líderes sempre necessitaram de empatia para desenvolver e manter boas pessoas, mas hoje as apostas são mais altas. Quando boas pessoas saem, elas levam consigo o conhecimento da empresa (goleman, 1998). Quando consideramos a retenção de talentos, a empatia apresenta-se como base para o desenvolvimento de práticas que sustentam e garantem não somente o desenvolvimento da carreira do funcionário, como também o desenvolvimento da própria organização. Nesse cenário é que mentorização e coaching entram. Tem sido repetidamente demonstrado que, coaching e mentorização compensam não apenas na performance, mas também no aumento de satisfação com relação ao trabalho e diminuição do turnover. Mas o que fazem com que mentorização e coaching funcionem melhor é a natureza do relacionamento. Mentores sensacionais entram na cabeça das pessoas que eles estão mentorizando. Eles percebem como efetivamente fornecer feedback. Eles sabem quando estimular para melhorar a performance e quando segurar. Através da forma pela qual eles motivam seus protegidos, eles demonstram a empatia em ação (goleman, 1998). 142 [...] as implicações comportamentais relacionadas às regiões frontal e orbital relativamente mais largas nas mulheres justificam investigações adicionais baseadas na evidência do papel crítico do córtex frontal orbital no comportamento social, funcionamento emocional e habilidades cognitivas de ordem maior, como argumentação lógica e tomada de decisão (2002, p. 1002). 3.3.5 Habilidade social Pessoas com habilidade social (…) trabalham a partir da consciência de que nada que seja importante é realizado de forma sozinha (goleman, 1998). Goleman ainda afirma que pessoas com habilidade social: Estão aptas para gerenciar times (…) bem como apresentam capacidade de persuasão excelente. Estão orientadas a encontrar soluções. Líderes precisam gerenciar efetivamente seus relacionamentos; nenhum líder é uma ilha. Afinal de contas, o trabalho do líder é conseguir que as coisas sejam feitas através de outras pessoas, e as habilidades sociais permitem que isso seja possível (...). A habilidade social permite que os líderes insiram sua inteligência emocional no ambiente de trabalho (goleman, 1998). Gur et al. constatam: Diferenças relacionadas ao sexo têm sido observadas em medidas neurocomportamentais e estudos neuroanatômicos. Homens e mulheres diferem quanto ao processamento de emoções, incluindo percepção, experiência e expressão (…) (2002, p. 1003). Ruderman et al. constatam: Não importa o quão forte sejam as habilidades intelectuais ou técnicas; os gerentes que se importam pouco em serem cooperativos e contribuem pouco com os membros do grupo, e que não são capazes de suportar pressão, que explodem facilmente e direcionam suas frustrações nos outros membros, e que não são capazes de entender ou apreciar os sentimentos dos outros estão seriamente fadados ao desastre (2001, p. 10). 4. DISCUSSÃO Com base nas pesquisas e observações evidenciadas anteriormente, pode-se afirmar que a constituição do cérebro feminino tendencia o surgimento e o desenvolvimento de habilidades relacionadas à compreensão, processamento e formação do discurso e locução, desenvolvimento verbal, escrito e linguístico, características essas que podem ser empregadas Comunicação Curta /Short Communication Administração Bezerra CP, Santos WEF. Liderança: Uma relação entre predisposição biológica, inteligência emocional e diferenciação sexual. São Paulo • Science in Health • 2010 set-dez; 1(3): 136-44 para a resolução de conflitos, melhor capacidade de compreensão e identificação de comportamentos e emoções, expressividade, solidificação de relacionamentos e desenvolvimentos de discursos inspiracionais, habilidades estas favoráveis ao estabelecimento de um ambiente organizacional que inspire segurança e seja, consequentemente, motivador. Após a evidenciação de uma proximidade entre o gerenciamento de habilidades (que caracterizam o que é liderança pela ciência da Administração) pelo cérebro e a forma de gerenciamento dessas mesmas habilidades pelo cérebro feminino, pode-se estabelecer as seguintes constatações: Tal qual afirma Gardner, a inteligência humana é um “potencial biopsicológico” (gardner, 1987, p. 47). Não menos importante é mencionar que diversas variáveis influenciam o desenvolvimento de habilidades cognitivas e, consequentemente, interferem na cria- ISSN 2176-9095 ção de um ambiente propício para o desenvolvimento da liderança, como os aspectos estruturais, sociais e culturais. No entanto, ao estudar-se uma dessas variáveis separadamente - a predisposição biológica -, tornase possível identificar relações entre a predisposição dos indivíduos do sexo feminino e o desenvolvimento de características específicas e decisivas para o surgimento de habilidades envolvidas na construção da liderança. Compreender os aspectos relacionados à liderança, como suas características principais e sua relação com o êxito dos funcionários, times e organizações, permite maior clareza e gerenciamento de habilidades e objetivos por parte de gerentes e corporações, bem como desenvolvimento de habilidades específicas e essenciais para a liderança tanto para o sucesso do funcionário como o da própria organização. REFERÊNCIAS ASHFORTH, B. C.; HUMPHREY, R. H. Emotions in the workplace: a reappraisal. Humans Relations. v. 48, n. 2, p. 97-125, 1995. ASHTANA, H. S.; MANDAL, M. K. Hemifacial asymmetry in emotion expressions. Behavior Modification. United States. v. 22, n.2, p. 177-183, Apr 1998. VOLIO, B. J.; BASS, B. M. Individual consideration viewed at multiple levels of analysis: A a multi-level framework for examining the diffusion of transformational leadership. The Leadership Quarterly. v. 6, n. 2, p. 199-218, 1995. BALCÃO, Y. F.; CORDEIRO, L. O comportamento humano na empresa. 2.ed. 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Sua incidência e severidade são influenciadas por variáveis associadas ao paciente e ao tratamento a que ele é submetido. A mucosite é consequência de dois mecanismos maiores: toxicidade direta da terapêutica utilizada sobre a mucosa e mielossupressão gerada pelo tratamento. Sua patofisiologia é composta por quatro fases interdependentes: fase inflamatória/ vascular, fase epitelial, fase ulcerativa/bacteriológica e fase de reparação. É considerada fonte potencial de infecções com risco de morte, sendo a principal causa de interrupção de tratamentos antineoplásicos. Algumas intervenções mostraram-se potencialmente efetivas para sua prevenção e tratamento. Entretanto, faz-se necessária a realização de novos estudos clínicos mais bem conduzidos para obtenção de melhor evidência científica acerca do agente terapêutico de escolha para o controle da mucosite bucal, permitindo a realização da quimioterapia e radioterapia do câncer em parâmetros ideais. The increasing intensity of radiation therapy and chemotherapy in the management of cancer has increased the incidence of adverse effects, especially oral mucositis. A bibliographical review was conducted on the definition of oral mucositis, its clinical findings, the incidence, its etiology, the pathofisiology, associated morbidity, prevention and treatment. Current studies define oral mucositis as a very frequent and painful inflammation with ulcers on the oral mucosa that are covered by a pseudo membrane. The incidence and severity of lesions are influenced by patient and treatment variables. Oral mucositis is a result of two major mechanisms: direct toxicity on the mucosa and myelosuppression due to the treatment. Its pathofisiology is composed of four interdependent phases: an initial inflammatory/vascular phase; an epithelial phase; an ulcerative/ bacteriological phase; and a healing phase. It is considered a potential source of life-threatening infection and often is a dose-limiting factor in anticancer therapy. Some interventions have been shown to be potentially effective to prevent and treat oral mucositis. Further intensive research through well-structured clinical trials to obtain the best scientific evidence over the standard therapy of oral mucositis is necessary to attain ideal parameters for radiotherapy and chemotherapy. Descriptors: Mucositis • Drug therapy • Radiotherapy • Therapeutics Descritores: Mucosite • Quimioterapia • Radioterapia • Tratamento. *** Professora da Disciplina de Gestão do Curso de Medicina da Universidade Cidade de São Paulo *** Médicos do Hospital Santa Ana - Santana de Parnaíba *** Médico Estagiário do Hospital Santa Ana - Santana de Parnaíba 145 Mini Revisão/Mini Review Medicina Pinho AP, Misorelli JC, Montelli R, Longato SE. Mucosite no paciente em tratamento de câncer. São Paulo • Science in Health • 2010 set-dez; 1(3): 145-60 O problema da mucosite no câncer As mucosas servem como importante mecanismo de proteção. Essas camadas brandas, lisas e úmidas de células epiteliais e tecido conjuntivo revestem as passagens e cavidades do organismo que têm contato direto ou indireto com o meio externo. As mucosas intactas dos tratos gastrintestinal, urogenital e respiratório têm funções de proteção, sustentação, absorção de nutrientes e secreção de muco, enzimas e sais. O revestimento mucoso é autorrenovante. As células-tronco, que formam uma membrana basal, sofrem replicação e diferenciação formando as diversas células da superfície epitelial. Essas células vivem cerca de 3 a 5 dias, resultando em renovação do revestimento epitelial externo a cada 7 a 14 dias (Sonis et al.1, 2004). Esse padrão de proliferação celular deixa a mucosa extremamente vulnerável a fontes de irritação, traumatismos ou lesão celular, como a causada pelos efeitos citotóxicos do tratamento do câncer. O resultado é a mucosite, temo geral que se refere à inflamação da mucosa. Incidência no Câncer A mucosite oral, denominada às vezes de estomatite, é uma das formas mais comuns e molestas da mucosite no indivíduo com câncer. Essa resposta inflamatória e ulcerativa da mucosa oral decorre dos efeitos fisiológicos de múltiplos agressores, como o câncer e seu tratamento. De todas as pessoas com diagnóstico recente de câncer, 40% virão a apresentar complicações orais relacionadas à doença ou a seu tratamento; dessas complicações, a mais comum é a mucosite. (Rubstein et al.2, 2004) A mucosa oral, revestimento úmido e contínuo da boca, desempenha importante função de proteção. Essa membrana epitelial é parte integrante da defesa de primeira linha do organismo contra o meio ambiente. A mucosa junta-se à pele e ao revestimento do trato gastrintestinal para formar uma barreira completa contra microrganismos externos. As alterações da integridade do revestimento mucoso proporcionam porta de entrada para microrganismos, causando infecção localizada com potencial de disseminar-se através da corrente sanguínea. Assim, a cavidade oral pode servir de porta de entrada para infecções sistêmicas potencialmente letais. (Rubstein 146 ISSN 2176-9095 et al.2, 2004) Essa possibilidade aumenta no indivíduo com comprometimento imunológico decorrente do tratamento do câncer. A capacidade de combater infecções nesse indivíduo é limitada pela diminuição do número de neutrófilos decorrente dos efeitos citotóxicos do tratamento do câncer nas células-tronco da medula óssea. Assim, a flora endógena normal da boca, que inclui bactérias gram-positivas e gram-negativas, fungos e vírus, pode infectar as áreas onde a integridade da mucosa está comprometida. As infecções localizadas podem transmitir-se com facilidade pela corrente sanguínea através dos ricos leitos capilares que perfundem a mucosa, acarretando septicemia. De fato, em estudos tem-se observado relação entre septicemia e infecções orais até em 54% dos indivíduos neutropênicos. (Hadon et al.3, 1996) Em uma instituição, a tendência ascendente a bacteriemia por gram-positivos mostrou relação significativa com o aumento da mucosite oral. (Samerfield et al.4, 2000) Impacto na Qualidade de Vida A mucosa oral também recebe e transmite estímulos táteis, função que confere à boca um papel importante na sensação e nutrição. A mucosite pode alterar os receptores gustativos, causando sensação de gosto desagradável, conhecida como disgeusia, ou ausência da sensação gustativa, denominada ageusia. A mucosite oral quase sempre acompanha-se de dor oral. A dor decorre de exposição do revestimento do epitélio, ulceração e edema. Os neurotransmissores liberados no processo da resposta inflamatória estimulam o vasto leito de fibras nociceptivas da mucosa. A dor oral resultante dificulta a alimentação, a fala e a deglutição. São manifestações e consequências da mucosite oral a ulceração, a xerostomia ou boca seca, a ageusia, a dor, as infecções, o sangramento e a alteração do estado nutricional. As abordagens gerais desses sintomas discutem-se em detalhes em outros capítulos. A mucosite não constitui um simples fenômeno, mas pode encarar-se como componente de um complexo sintomático bastante intrincado. À medida que se acrescentam outros sintomas, aumentam a intensidade e a duração da mucosite. O impacto negativo da mucosite no conforto, na capacidade de alimentarse e comunicar-se e no bem-estar geral do indivíduo pode diminuir significativamente a qualidade de vida. Mini Revisão/Mini Review Medicina Pinho AP, Misorelli JC, Montelli R, Longato SE. Mucosite no paciente em tratamento de câncer. São Paulo • Science in Health • 2010 set-dez; 1(3): 145-60 ISSN 2176-9095 Fatores que Aumentam o Risco de Mucosite Oral no Indivíduo com Câncer Fator de Risco Mecanismo de Ação Estratégias de Prevenção Crianças • Não está bem esclarecido o aumento da prevalência, mas pode dever-se à imaturidade da resposta imunológica, ao aumento da proliferação celular, e à maior prevalência de malignidades hematológicas • Higiene oral frequente e cuidadosa Idosos • Alterações degenerativas: diminuição do fluxo salivar, diminuição da queratinização da mucosa e aumento da prevalência de gengivite • Higiene oral frequente e cuidadosa • Hidratação adequada • Umectantes bucais • Evitar traumatismos • Tratamento dentário da gengivite Exposição a álcool e tabaco • Irritação crônica da mucosa • Evitar ou limitar bebidas alcoólicas e produtos de tabaco, especialmente durante o tratamento Má higiene oral • O aumento de detritos favorece a infecção • Falta de estimulação para melhorar a circulação • Higiene oral frequente e cuidadosa, incluindo escovação da língua e das gengivas Terapêutica com oxigênio • A umidade retirada da mucosa para o oxigênio causa secura do revestimento mucoso • Umidificar o oxigênio • Umectantes orais • Hidratação adequada Aspiração oral ou nasogástrica Alterações do padrão respiratório Certas drogas Anticolinérgicos e anti-histamínicos Fenitoína Corticosteroides • A sonda e o processo de aspiração causam rupturas traumáticas da integridade da mucosa • Minimizar a frequência e a duração das aspirações • A taquipneia e a respiração oral ressecam a mucosa • Higiene oral frequente e cuidadosa • Umidificador de ambiente • Diminuem o fluxo salivar • Hiperplasia gengival • Colonização com fungos • Higiene oral frequente e cuidadosa • Se possível, evitar essas drogas • A movimentação irrita a mucosa e rompe a integridade • Realinhar as dentaduras • Remover as dentaduras à noite e usá-las somente para alimentar-se, até ocorrer a cura • Os irritantes térmicos e químicos inflamam e traumatizam a mucosa • Alimentos leves e macios • Evitar alimentos ácidos, apimentados e condimentados • Deixar os alimentos quentes esfriarem antes de ingeri-los Idade Dentaduras mal ajustadas Alimentos quentes, ácidos ou condimentados Mau estado nutricional Desidratação • Os açúcares refinados aumentam as cáries dentárias • A má nutrição calórico-proteica retarda a cura • As deficiências de vitaminas causam complicações orais • A extração de líquidos da mucosa e dos lábios como mecanismo de proteção acarreta secura e fissuras 147 • Minimizar os açúcares refinados • Dieta cotidiana bem balanceada, incluindo frutas, verduras, grãos e fontes de proteínas • Suplementação vitamínica diária • Ingestão líquida diária mínima de 2000 mL Mini Revisão/Mini Review Medicina Pinho AP, Misorelli JC, Montelli R, Longato SE. Mucosite no paciente em tratamento de câncer. São Paulo • Science in Health • 2010 set-dez; 1(3): 145-60 Etiologia e fisiopatologia Fatores de Risco A mucosite oral constitui problema comum e significativo no indivíduo com câncer. A etiologia da mucosite relaciona-se quer ao câncer em si, quer aos efeitos diretos e indiretos dos tratamentos do câncer. Essas causas primárias intensificam-se em alguns indivíduos pela existência de uma variedade de fatores que aumentam o risco de complicações orais. (Keefe5, 2006) Câncer A mucosa oral pode ser agredida por uma variedade de entidades mórbidas. Os tumores orais, por exemplo, comprometem a integridade da mucosa e, com freqüência, inflamam-se e infectam-se. (Keefe5, 2006) O tipo predominante é o epitelioma espinocelular, responsável por 90% das neoplasias orais. (Keefe et al.6, 2006) Os carcinomas orais, na maioria, diagnosticam-se em estádios avançados e, com freqüência, manifestam-se como massas ulceradas e necróticas. No indivíduo com leucemia, os infartos decorrentes da infiltração de células malignas nos capilares podem acarretar exfoliação da mucosa. É frequente o indivíduo com síndrome da imunodeficiência adquirida (AIDS) apresentar lesões orais de sarcoma de Kaposi ou de linfoma não-Hodgkin, duas neoplasias comuns nessa população. (Peterson et al.7, 2006) As neoplasias orais são responsáveis por menos de 5% de todos os tumores; as causas mais comuns de mucosite oral são os tratamentos do câncer, como a quimioterapia, a radioterapia e o transplante de medula óssea. Quimioterapia Acredita-se que a quimioterapia tenha efeito estomatotóxico direto e indireto. O efeito direto na mucosa oral dá-se em nível celular. O processo de renovação epitelial constante torna a mucosa muito vulnerável aos efeitos dos antineoplásicos. (Jones et al.8, 2006) Muitas dessas drogas causam destruição de células em reprodução ativa, por interferirem no DNA, no RNA ou na síntese de proteínas. São particularmente sensíveis aos efeitos citotóxicos diretos dos antineoplásicos as regiões de proliferação acelerada, como, por exemplo, as células-tronco da mucosa oral. Decorrem redução da produção, diminuição da diferenciação e aceleração do destacamento das 148 ISSN 2176-9095 células epiteliais, levando ao desnudamento da mucosa. (Antony et al.9, 2006) Uma vez rompida a continuidade do revestimento epitelial, a sequência de destruição tecidual, inflamação e infecção acarretam mucosite dolorosa e debilitante. (von Bultzingslowen et al.10, 2006) Acredita-se que o efeito indireto das drogas quimioterápicas ocorra ao ser suprimida a função da medula óssea durante o nadir do tratamento, momento em que são mais baixos os números de plaquetas e granulócitos em decorrência do efeito citotóxico das drogas nas células precursoras da medula óssea. Nesse momento o indivíduo está imunossuprimido e extremamente suscetível a infecções. As pesquisas indicam que o aumento da estomatotoxicidade associa-se à diminuição dos números de granulócitos que ocorre durante o nadir. Acredita-se assim que a estomatotoxicidade indireta seja mediada através da supressão da resposta imunológica. (von Bultzingslowen et al.10, 2006) Quimioterápicos com Alto Potencial de Causarem Estomatite Antimetabólitos Citarabina 5-Fluorouracil Floxuridina Hidroxiureia 6-Mercaptopurina Metotrexato 6-Tioguanina Fármacos que Interagem com o DNA Actinomicina D Amsacrina Cloridrato de procarbazina Daunomicina Doxorrubicina Etoposido Idarrubicina Mitomicina C Mitoxantrona Mitramicina Sulfato de bleomicina Fármacos que Interagem com a Tubulina Docetaxel Paclitaxel Sulfato de vinblastina Sulfato de vincristina Mini Revisão/Mini Review Medicina Pinho AP, Misorelli JC, Montelli R, Longato SE. Mucosite no paciente em tratamento de câncer. São Paulo • Science in Health • 2010 set-dez; 1(3): 145-60 Como nem todas as drogas quimioterápicas causam mucosite, é importante identificar as drogas específicas incluídas no esquema de tratamento. As drogas de potencial estomatotóxico mais alto são os antimetabólitos, certos fármacos que interagem com o DNA, especialmente os antibióticos antineoplásicos, e os fármacos que interagem com a tubulina. (Barasch et al.11, 2006) A mucosite causada pela quimioterapia pode ser profunda. O padrão da mucosite varia, tanto com o esquema farmacológico quanto com o indivíduo. A inflamação decorrente da estomatotoxicidade direta pode ocorrer pela primeira vez na faixa de 2 a 14 dias a partir do momento da administração da droga. A intensidade e a duração variam não somente com os tipos de drogas mas também com a posologia e a frequência de administração. A intensidade da mucosite aumenta com doses mais altas de drogas citotóxicas; até mesmo drogas que em geral não são estomatotóxicas (como a ciclofosfamida, por exemplo) podem causar dano celular à mucosa em altas doses. A duração da mucosite pode prolongar-se com a administração frequente, pois não há tempo para recuperação celular e cura. Na maioria dos casos, administram-se combinações de drogas, e tem havido pouca pesquisa para descrever sistematicamente os padrões de resposta em protocolos variados. Como se descreveu anteriormente, a resposta inflamatória causa diminuição do paladar, dor e dificuldade de engolir. Em geral a resposta intensifica-se quando o indivíduo entra no nadir do tratamento. Sobrevêm ulceração, inflamação grave, infecção e sangramento em decorrência da perda da integridade mucosa, da destruição celular, da neutropenia e da trombocitopenia. A localização cronológica e a duração do nadir variam com o protocolo farmacológico, sendo frequente a quimioterapia de combinação acarretar períodos prolongados de imunossupressão devido à imbricação do nadir de uma droga com o de outra. Radioterapia A radioterapia constitui tratamento localizado do câncer. A mucosite decorre da aplicação de radiação na região da cabeça e do pescoço quando a boca ou as glândulas salivares estão incluídas no campo de tratamento. Sobrevém resposta inflamatória em decorrência da destruição das células mucosas ou glandu- 149 ISSN 2176-9095 lares, influenciada pela profundidade de penetração, pelo total de Gy aplicados, e pelo número e frequência de tratamentos (Migliorati et al.12, 2006). O surgimento, a intensidade e a duração da mucosite variam de indivíduo para indivíduo, mas as mais das vezes o quadro tem início na segunda semana de radioterapia, ou após uma dose de cerca de 2000 cGy. A mucosa no campo de tratamento apresenta-se de início tumefacta e eritematosa, e à medida que o tratamento prossegue torna-se exposta, ulcerada e coberta de exsudato (Jones et al.8, 2006). São comuns a dor e o ardor, agravados por irritantes como alimentos ácidos ou condimentados. A mucosite persiste por várias semanas após concluídos os tratamentos. É frequente ocorrerem infecções secundárias, especialmente candidíase, que prolongam a duração da mucosite. A mucosite pode complicar-se com o declínio dramático da produção salivar quando se irradiam todas as glândulas salivares maiores. A diminuição do fluxo salivar – xerostomia - é de rápida instalação, sobrevindo em geral durante a primeira semana de tratamento. A xerostomia pode ser progressiva e irreversível, com declínio de cerca de 95% da produção salivar em 3 anos após o tratamento (McGuire et al.13, 2006) A xerostomia persistente torna-se efeito colateral danoso, já que. sem adequada e agressiva higiene oral e prevenção de cáries, observa-se uma escalada das cáries dentárias. A radioterapia do câncer oral também causa perda do paladar por danificar as microvilosidades e a superfície exterior das células gustativas. A instalação é rápida e progressiva, ocorrendo ageusia ou cegueira oral após 3000 cGy. A acuidade gustativa em geral melhora no prazo de 2 a 4 meses do tratamento, embora em alguns indivíduos ocorra diminuição permanente da percepção gustativa. Terapêutica de transplante de medula óssea Até 70% dos indivíduos transplantados com medula óssea apresentam complicações orais decorrentes da natureza agressiva e sinérgica das terapêuticas purgativas pré-transplante (McGuire et al.14, 2006). Utilizam-se antes do transplante esquemas de altas doses de antineoplásicos e irradiação corporal total na tentativa de destruir todas as células neoplásicas e induzir aplasia da medula óssea. Alguns dias após o início do tratamento, surgem placas esbranquiçadas, eritema, atrofia e aumento da vascularidade, que Mini Revisão/Mini Review Medicina Pinho AP, Misorelli JC, Montelli R, Longato SE. Mucosite no paciente em tratamento de câncer. São Paulo • Science in Health • 2010 set-dez; 1(3): 145-60 se intensificam progressivamente durante o período pós-transplante. As ulcerações ocorrem, na maioria, em áreas não-queratinizadas, como a língua e a mucosa jugal e labial (McGuire et al.14, 2006). A terapêutica imunossupressora após o transplante e o surgimento da doença enxerto versus hospedeiro (DEVH) prolongam e agravam as complicações orais. São comuns as infecções bacterianas, fúngicas e viróticas. Em decorrência da irradiação, sobrevém xerostomia, presente durante todo o período pós-transplante. A dor que se associa à mucosite atinge seu pico cerca de 2 semanas após o transplante, quando em geral a cavidade oral está infectada e ulcerada. Na DEVH crônica, a mucosa torna-se cronicamente irritada, mosqueada e friável. Há episódios intermitentes de inflamação aguda, frequentemente associada a infecções bacterianas, fúngicas e viróticas. A xerostomia persiste, e o risco de cáries é alto. Terapêutica multímoda As causas da mucosite, na maioria dos indivíduos com câncer, são multifatoriais. A terapêutica moderna do câncer é multímoda - combinam-se tratamentos para produzir o máximo efeito citotóxico. Infelizmente, esse efeito estende-se às células normais, como as da mucosa, acarretando profundos efeitos na mucosa oral. O câncer e seus tratamentos múltiplos interagem com os fatores de risco presentes no indivíduo com câncer. O resultado é exemplificado pelo desafio de se cuidar do indivíduo com tumor oral invasivo que tem história de abuso de álcool, é fumante, tem má higiene bucal e está em terapêutica com oxigênio. A terapêutica multímoda do câncer, consistindo em cirurgia extensa e combinação de radioterapia e quimioterapia, traumatiza a mucosa (lada et al.15, 2006). As sequelas de xerostomia, ulceração, dor e incapacidade de alimentar-se desencadeiam um círculo vicioso e persistente de intensa inflamação e infecção. Avaliação A avaliação completa e sistemática da boca deve fazer parte da avaliação abrangente de todos os indivíduos com câncer. A avaliação sistemática requer equipamento e técnica apropriados. A mucosa oral normal e sadia é rósea, úmida, limpa e intacta. Podem ocorrer: alterações da cor, como palidez, eritema de vários graus, placas esbran- 150 ISSN 2176-9095 Guia Clínico: Procedendo à Avaliação Oral Avaliação Oral 1. Reunir o equipamento: • boa fonte de luz • luvas não estéreis • gaze • abaixador de língua • espelho dentário (opcional) 2. Lavar as mãos. 3. Calçar as luvas não estéreis. 4. Retirar todos os aparelhos dentários. Indagar quanto a ajuste de dentaduras e a alguma área machucada ou dolorosa. 5. Indagar sobre alterações da voz, do paladar, da capacidade de alimentar-se ou engolir, e desconforto. 6. Efetuar sistematicamente cada um dos procedimentos abaixo, usando luz direta para observar umidade, cor, integridade e limpeza: a. Observar o exterior dos lábios. b. Puxar o lábio inferior para baixo e levantar o lábio superior a fim de observar os dentes e o revestimento mucoso do vestíbulo externo. (Nota: verificar a cor e o brilho dos dentes, e a presença de detritos ou cáries.) c. Instruir a pessoa a abrir a boca para poder observar o palato mole e o palato duro. d. Usar um dedo para deslocar e examinar a mucosa do interior das bochechas. e. Observar a quantidade e a qualidade da saliva. (Nota: a saliva normal é rala e aquosa.) f. Examinar o topo da língua. A seguir, solicitar à pessoa que dobre a língua para cima até o palato para se poder observar o lado de baixo da língua. g. Usar a gaze para deslocar a língua para cada lado a fim de observar as faces laterais da língua. h. Solicitar à pessoa que respire fundo para poder se observar a orofaringe, a parte posterior da língua e a úvula. Se essa técnica não permitir visualização adequada, usar o abaixador de língua suavemente e usar o espelho dentário para melhor visualização. 7. Com base nos resultados desta avaliação, pontuar cada categoria no instrumento de avaliação. Mini Revisão/Mini Review Medicina Pinho AP, Misorelli JC, Montelli R, Longato SE. Mucosite no paciente em tratamento de câncer. São Paulo • Science in Health • 2010 set-dez; 1(3): 145-60 quiçadas, ou lesões ou úlceras discrômicas; alterações da umidade, que se refletem em textura e brilho alterados, aumento ou diminuição da quantidade de saliva, e modificação da qualidade e tenacidade das secreções; alterações da limpeza, representadas por acúmulos de detritos e películas, maus odores e mudanças da cor dos dentes; alterações da integridade, como rachaduras, fissuras, úlceras, vesículas, ou lesões isoladas, agrupadas, em placas, confluentes ou generalizadas; alterações da percepção, como diminuição ou ausência do paladar; rouquidão ou diminuição do tom audível e da força da voz; dificuldade de engolir, que pode ser precursora de esofagite; e dor, ardor ou sensação de picada. ISSN 2176-9095 O profissional de enfermagem deve procurar descrever com precisão a qualidade das alterações. O resultado da avaliação deverá ser uma lista específica de diagnósticos de enfermagem ou problemas colaborativos que estão ligados à possível etiologia. Os resultados dessa avaliação física devem então abordar-se no contexto de uma avaliação abrangente, incluindo a triagem dos fatores de risco. O plano de assistência deve guiar-se pelos problemas reais ou potenciais. Um guia de avaliação do tipo do Guia de Avaliação Física da Cavidade Oral proporciona um instrumento para a quantificação da intensidade da mucosite e também para a avaliação da limpeza e umidade orais. Guia da Avaliação Física da Cavidade Oral: Pontuações Numéricas e Descritivas Categoria Lábios Pontuação 1234 1 Lisos, róseos, úmidos e intactos Gengiva e Mucosa Oral 1234 Lisas, róseas, úmidas e intactas Língua 1234 Lisa, rósea, úmida e intacta Dentes 1234 Limpos, sem detritos Saliva 1234 PONTUAÇÃO DE DISFUNÇÃO ORAL TOTAL _____________ 2 Ligeiramente vincados e secos; uma ou mais áreas avermelhadas 3 Secos e um tanto edematosos; pode haver uma ou duas vesículas isoladas; linha ou demarcação inflamatória Pálidas e ligeiramente Secas e um tanto secas; uma ou duas edematosas; eritema lesões isoladas, generalizado; mais que vesículas ou áreas duas lesões isoladas, avermelhadas vesículas ou áreas avermelhadas Ligeiramente seca; Seca e um tanto uma ou duas áreas tumefacta; eritema avermelhadas isoladas; generalizado, mas com papilas proeminentes, a ponta e as papilas particularmente na mais vermelhas; uma ou base duas lesões isoladas ou vesículas Mínimo de detritos, na maioria entre os dentes Quantidade moderada de detritos aderentes à metade do esmalte visível Delgada, aquosa, Aumento da Saliva escassa, que pode abundante quantidade estar um tanto mais espessa que o normal Sem disfunção: 5 Disfunção leve: 6–10 Disfunção moderada: 11–15 Fonte: Beck SL, Yasko, JM. Guidelines for Oral Care (ed 2). Crystal Lake, IL. Sage, 1993. Reproduzido com autorização 151 4 Muito secos e edematosos; todo o lábio inflamado; vesículas ou ulcerações generalizadas Muito secas e edematosas; toda a mucosa muito vermelha e inflamada; múltiplas úlceras confluentes Muito seca e edematosa; espessa e tumefacta; toda a língua muito inflamada; pon-ta muito vermelha e demarcada com pe-lículas; múltiplas vesículas ou úlceras Dentes cobertos de detritos Saliva espessa e filamentosa, viscosa ou mucosa Disfunção grave: 16–20 Mini Revisão/Mini Review Medicina Pinho AP, Misorelli JC, Montelli R, Longato SE. Mucosite no paciente em tratamento de câncer. São Paulo • Science in Health • 2010 set-dez; 1(3): 145-60 O profissional de enfermagem pode utilizar tal instrumento para documentar padrões e avaliar alterações que possam ocorrer em consequência do tratamento do câncer ou de intervenções. Podem-se utilizar para descrever a intensidade da disfunção oral a pontuação numérica e os critérios descritivos verbais (como ‘moderado’, por exemplo). Avaliação Diagnóstica A extensão da avaliação diagnóstica depende do potencial de impacto da mucosite. No indivíduo imunocompetente, a abordagem de primeira linha é a terapêutica empírica com cuidadosa avaliação da melhora. No indivíduo imunocomprometido, é crítica para o diagnóstico acurado a cultura, já que a neutropenia pode impedir a manifestação habitual da inflamação mesmo nas infecções mais comuns. Em particular as infecções fúngicas e herpéticas podem não se manifestar da forma clássica e facilmente passarem despercebidas (Bensadoun et al.16, 2006) A cultura é o único meio preciso de diagnosticar a presença de infecção e identificar o microrganismo causador. Indica-se cultura da cavidade oral em caso de rotura da integridade da mucosa, como uma lesão, vesícula ou úlcera; na presença de mucosite generalizada moderada (pontuação de 11 a 15); ou na presença de exsudato. Podem também ajudar, no diagnóstico de infecções, alterações de sinais vitais como elevação de temperatura e aumento de frequência cardíaca, e achados laboratoriais como anormalidades do hemograma completo (com contagem diferencial de leucócitos). No indivíduo normal, a infecção pode ser indicada ISSN 2176-9095 pelo desvio da contagem diferencial manifestando-se através do aumento do número e da percentagem de granulócitos imaturos. No paciente imunocomprometido, essa tendência pode não evidenciar-se devido ao baixo número de leucócitos. A neutropenia grave (número absoluto de neutrófilos por mm3 inferior a 500) indica risco extremamente alto de infecção. As lesões orais localizadas podem, nesse indivíduo, evoluir para sepse sistêmica potencialmente letal. Graus de Toxicidade No âmbito dos ensaios clínicos oncológicos, há critérios estabelecidos para monitorar os graus de toxicidade (Brennam et al.17, 2006). Tais critérios de gradação constituem apenas um indicador grosseiro do grau de toxicidade, e têm sido alvo de críticas devido à inconsistência das variáveis em cada um dos níveis. Os guias de avaliação oral geram pontuação numérica que pode traduzir-se em pontuação de intensidade da disfunção oral - leve, moderada e grave. Tais pontuações podem projetar-se em gráfico a fim de avaliar os padrões de mucosite com o tempo. Conduta nos sintomas Há muitas abordagens de tratamento da mucosite; nenhum fármaco único demonstrou ser mais eficaz. Não é surpresa a conduta na mucosite variar de instituição para instituição (Trotti et al.18, 2003). O clínico deve personalizar os cuidados para com cada indivíduo baseando-se numa visão dual, qual seja, dos problemas reais e potenciais identificados pela avaliação e pelos objetivos da assistência. Apresentam-se, Diretrizes Clínicas de Prevenção e Conduta na Mucosite Oral PROBLEMA: MUCOSITE, potencial ou real META: MANTER A LIMPEZA E PREVENIR INFECÇÕES META: MANTER A INTEGRIDADE E PROMOVER A CURA DA MUCOSA • Escovar os dentes com escova de cerdas de nylon macias e dentifrício fluoretado com bicarbonato de sódio no prazo de 30 minutos após as refeições e na hora de deitar-se. A escovação antes das refeições pode estimular o apetite. • Limpar e massagear a língua e a mucosa oral com escova de cerdas macias e dentifrício com bicarbonato de sódio após escovar ou retirar dentaduras. Pode-se utilizar um aplicador com ponta esponjosa para limpar os dentes e a língua caso a escovação cause desconforto ou sangramento. • Enxaguar a boca com 30 mL de salina, sal e bicarbonato, água da torneira ou peróxido de hidrogênio a 1,5% por 1 a 2 minutos. Caso se utilize salina ou peróxido, enxaguar com água para intensificar a limpeza mecânica e minimizar o sabor residual. 152 Mini Revisão/Mini Review Medicina Pinho AP, Misorelli JC, Montelli R, Longato SE. Mucosite no paciente em tratamento de câncer. São Paulo • Science in Health • 2010 set-dez; 1(3): 145-60 ISSN 2176-9095 • Retirar e escovar as dentaduras no prazo de 30 minutos após as refeições e na hora de deitar-se, depois deixálas de molho em peróxido de hidrogênio a 1,5% por vários minutos. • Passar fio dental uma vez por dia após a escovação. Não passar fio dental se ele causar dor, se o número de plaquetas por mm3 for inferior a 40 000, ou se o número de leucócitos por mm3 for inferior a 1500. • Usar de especial cautela para evitar aspiração em caso de comprometimento do reflexo nauseoso. • Consumir dieta de alto teor protéico com suplementos vitamínicos. • Aplicar produtos para proteção da mucosa e promoção da cura, como, por exemplo, substratos de antiácidos ou sucralfato. • Manter ingestão ótima de líquidos e nutrientes evitando alimentos irritantes. • Verificar com o médico e nutricionista a necessidade de nutrição entérica ou parenteral. PROBLEMA: XEROSTOMIA, potencial ou real META: UMIDIFICAR A CAVIDADE ORAL • Aplicar umectante (como, por exemplo, gel de petrolato) com frequência nos lábios e na mucosa. Usar lubrificante hidrossolúvel (como, por exemplo, gel K-Y ou Mouth-Moisturizer) no interior da boca se a pessoa estiver usando oxigênio ou se houver perigo de aspiração. • Salvo contraindicação, tomar 300- mL de líquido por dia. • Aplicar frequentemente aerossol, solução ou esfregaço de saliva sintética. • Usar goma de mascar ou balas sem açúcar para estimular o fluxo salivar. • Verificar com o médico a necessidade de epilocarpinol. • Usar umidificador de ambiente. • Caso a xerostomia se prolongue, instituir profilaxia de cáries com fluoreto/ clorexidina diariamente. Nota: Não usar esfregaços de limão ou glicerina, pois são secantes e irritantes. PROBLEMA: DOR RELACIONADA À MUCOSITE META: PROMOVER BEM-ESTAR E MINIMIZAR A DOR • Usar anestésicos tópicos, como, por exemplo, benzocaína ou diclonina, antes das refeições e conforme necessário para o controle da dor. • Evitar irritantes, como o álcool e o tabaco, por exemplo. • Usar analgésicos para o controle da dor: 1,5 h antes das refeições; em intervalos regulares nas 24 horas se a dor for constante. • Evitar alimentos que causem irritação térmica, mecânica ou química. PROBLEMA: INFECÇÃO RELACIONADA À MUCOSITE META: TRATAR A INFECÇÃO • Monitorar a temperatura do paciente a cada 4 horas e comunicar toda elevação acima de 38o C. • Utilizar antibióticos, antifúngicos e antiviróticos, tópicos ou sistêmicos, de acordo com a prescrição. Nota: É crítica no indivíduo imunocomprometido a realização de cultura oral para identificar o microrganismo causador. 153 Mini Revisão/Mini Review Medicina Pinho AP, Misorelli JC, Montelli R, Longato SE. Mucosite no paciente em tratamento de câncer. São Paulo • Science in Health • 2010 set-dez; 1(3): 145-60 ISSN 2176-9095 PROBLEMA: SANGRAMENTO DECORRENTE DA MUCOSITE META: CONTROLAR O SANGRAMENTO • Monitorar os sinais vitais a cada 4 horas. • Avaliar a função plaquetária mediante hemograma completo. • Inspecionar a mucosa e comunicar todo sangramento. • Enxaguar a boca com água gelada e/ou aplicar pressão a uma área de sangramento descontrolado utilizando um pedaço de gaze embebida em água gelada ou um saquinho de chá molhado e congelado. • Verificar com o médico a necessidade de trombina ou ácido aminocaproico. (Usar com cautela em pessoas com trombocitopenia, pois pode ocorrer coagulação intravascular disseminada.) Fonte: Beck SL, Yasko, JM. Guidelines for Oral Care (ed 2). Crystal Lake, IL. Sage, 1993. assim, diretrizes específicas para prevenir e abordar problemas relacionados à mucosite oral no contexto de cinco possíveis problemas e metas. Esta apresentação difere das diretrizes baseadas na intensidade da mucosite e destina-se a facilitar a elaboração de um plano de assistência para ir ao encontro da resposta única do indivíduo ao câncer e seu tratamento. Higiene Oral A melhor forma de se obter higiene oral efetiva é escovando, enxaguando, passando fio dental e umidificando. A escovação requer a utilização de uma escova estreita de cerdas de nylon macias e uma técnica efetiva de aplicação de movimentos curtos, horizontais ou circulares, com pressão suave na junção entre dentes e gengivas (Cella et al.19, 2003). As superfícies oclusais são massageadas com movimentos mais longos; a língua é suavemente escovada para estimular a circulação e remover detritos. A Associação Dentária Americana recomenda creme dental fluoretado para prevenir cáries dentárias. Os cremes dentais de bicarbonato são limpadores efetivos, ajudam a dissolver o muco e reduzem a acidez decorrente da inflamação. O fio dental melhora o processo de limpeza ao remover detritos localizados entre os dentes. Enrola-se fio dental, encerado ou não, ao redor dos dedos, segura-se com firmeza e força-se suavemente para cima e para baixo nas superfícies entre os dentes desde a linha da gengiva até a extremidade de cada dente. São enxaguantes recomendados a água, salina, sal e bicarbonato, e peróxido de hidrogênio de meia potência (Keefe5, 2006). Devem-se evitar enxaguantes 154 bucais comerciais, por conterem altas percentagens de álcool, que pode irritar e ressecar a mucosa (Cleeland et al.20, 2003). A água e a salina são soluções neutras não irritantes que proporcionam enxágue mecânico. Sal e bicarbonato (mistura de água, sal e bicarbonato de sódio) têm ainda a vantagem de diminuírem a acidez, tendo demonstrado eficácia comparável à do peróxido de hidrogênio de meia potência (Dodd et al.21, 2004) Múltiplos estudos têm falado a favor da utilização de peróxido de hidrogênio (Eilers e Epstein22, 2004; Elting et al.23, 2004). que não somente tem efeito limpador mecânico como também quimicamente terapêutico. A peroxidase salivar libera o oxigênio do peróxido, causando reação borbulhante que solta o muco e os detritos. O peróxido de hidrogênio exerce ainda efeito antimicrobiano. A utilização de peróxido, no entanto, tem sido objeto de certa controvérsia no que diz respeito à sua segurança (Miakoswski et al.24, 2004). Não se documentaram efeitos danosos do peróxido de hidrogênio a 1,5% em indivíduos com mucosite. Fazem-se necessárias mais pesquisas para avaliar a segurança e a eficácia do peróxido. A clorexidina pode ser benéfica se a meta for evitar infecções. Atua contra numerosas bactérias e fungos. A preparação disponível comercialmente nos Estados Unidos contém 9,6% de álcool e causa sensação de picada e ardor. Outro importante efeito colateral da clorexidina é a coloração acastanhada dos dentes; essas manchas podem ser removidas com oxidantes e abrasivos. São inconsistentes os achados de pesquisa relacionada à clorexidina (Ilman et al.25, 2005; Kin et al.26, 2005). que embora possa reduzir os potenciais patógenos não tem mostrado eficácia claramente do- Mini Revisão/Mini Review Medicina Pinho AP, Misorelli JC, Montelli R, Longato SE. Mucosite no paciente em tratamento de câncer. São Paulo • Science in Health • 2010 set-dez; 1(3): 145-60 cumentada na redução da mucosite. 25,26,27,28. O fluoreto atua diminuindo a desmineralização e aumentando a remineralização das lesões dentárias. Embora haja controvérsias quanto ao valor dos enxágues diários com fluoreto no adulto, é essencial a aplicação diária de fluoreto tópico na pessoa em alto risco de vir a apresentar cáries dentárias em decorrência de irradiação das glândulas salivares. Os enxágues com clorexidina podem aumentar os efeitos protetores do fluoreto nesses pacientes de alto risco (Peterson e Sonis29, 2004) Há várias formas de se intensificar a umidade da mucosa oral. É essencial a hidratação adequada mediante ingestão frequente de líquidos. Chupar balas ou mascar goma sem açúcar estimula o fluxo salivar. Devem-se aplicar com frequência, especialmente à noite, umectantes como manteiga de cacau, gel de petrolato, bálsamos em bastão ou lubrificantes aquosos nos lábios. As pesquisas documentam a eficácia dos produtos de saliva sintética (Sonis et al.30, 2006) Aerossóis, soluções e esfregaços contendo saliva artificial são agentes neutros que mimetizam a viscosidade e o teor mineral da saliva; é necessário aplicá-los com frequência, por terem efeito de curta duração. A pilocarpina é um sialagogo, que atua por estimulação direta das células das glândulas salivares. Graças aos resultados de ensaios clínicos, essa droga colinérgica tem hoje aprovação para ser usada na xerostomia decorrente de radiação (McGuire31, 2003; Stokman et al.32, 2003). Intervenções Protetoras Podem também utilizar-se, na prevenção e no tratamento da mucosite, intervenções visando proteger as células da mucosa. Uma dessas abordagens é a crioterapia, utilizando sucção de fragmentos de gelo por 5 minutos antes e 25 minutos depois da administração de fluorouracil em bolus. A intenção é minimizar os efeitos citotóxicos do fluorouracil na mucosa por redução da circulação durante os períodos de pico dos níveis sanguíneos. A eficácia dessa intervenção demonstrou-se em vários ensaios clínicos.33,34,35 Embora o risco pareça ser baixo, há indicação de pesquisas adicionais. Outra forma de intervenção é a aplicação tópica de substratos de antiácidos ou suspensão de sucralfato, sal de alumínio básico usado no tratamento de úlceras gástricas. Acredita-se que o sucralfato atue 155 ISSN 2176-9095 formando cobertura de proteção sobre as proteínas de superfície danificadas da mucosa. Pode também aumentar a produção local de prostaglandina E2, intensificando o fluxo sanguíneo e a produção de muco (kouvaris et al.36, 2002). Sua utilização em indivíduos com mucosite tem sido apoiada por relatos de estudos de casos. Em ensaio clínico randomizado em crianças, o sucralfato associou-se a diminuição nãosignificativa da incidência de mucosite. A dor foi significativamente menor no grupo de sucralfato (BenJosef et al.37, 2002). Pesquisas subsequentes falam a favor dos efeitos analgésicos do sucralfato, mas os achados relativos à sua eficácia na redução da mucosite são conflitantes.38,39,40,41 O uso de fatores de crescimento hematológicos tornou-se abordagem padrão na assistência ao paciente em quimioterapia com alto potencial de causar mielossupressão. No momento, a maioria das evidências não falam a favor da utilização de fatores de crescimento na prevenção da mucosite (Migliorati et al.12, 2006). Estão hoje em investigação numerosas outras abordagens para proteger a mucosa. São intervenções de interesse as vitaminas tópicas, as prostaglandinas, as bandagens orais e o alopurinol tópico. Conduta nas Complicações da Mucosite São complicações comuns associadas à mucosite a dor, a infecção e o sangramento. A conduta em cada um desses problemas pode ser de natureza local ou sistêmica. Os anestésicos locais (como, por exemplo, a benzocaína a 20% ou a lidocaína viscosa) e as misturas contendo tais anestésicos (como Orabase, por exemplo) produzem redução temporária da dor. A dormência resultante também diminui a percepção gustativa e térmica. Está hoje em investigação a capsaicina oral em forma de balas para o tratamento da dor oral (Braun et al.42, 2002). As bandagens orais (como, por exemplo, Orahesive) e as formulações de gel que se solidifica formando cobertura oclusiva (como, por exemplo, Zilactin e Oratect) proporcionam alívio significativo da dor, com duração até de 6 horas (Sonis43, 2004). Constitui abordagem sistêmica de conduta na dor aguda e persistente associada à mucosite a administração contínua de analgésicos no decorrer das 24 horas. Recomendam-se na mucosite moderada combinações de drogas opiáceas e não opiáceas, como Mini Revisão/Mini Review Medicina Pinho AP, Misorelli JC, Montelli R, Longato SE. Mucosite no paciente em tratamento de câncer. São Paulo • Science in Health • 2010 set-dez; 1(3): 145-60 acetaminofeno com codeína. Quando não há alívio da dor, ou a mucosite é grave, pode ser necessário administrar doses orais de liberação prolongada ou infusões intravenosas contínuas de morfina até que ocorra a cura. As infecções da cavidade oral podem ser de origem bacteriana, fúngica ou virótica, devendo selecionar-se os antibióticos de acordo com o microrganismo causador. Podem-se aplicar os antibióticos topicamente em pomadas (como, por exemplo, a bacitracina ou o aciclovir), bastões ou pastilhas (como, por exemplo, a nistatina) ou tabletes (como, por exemplo, o clotrimazol). Podem indicar-se também antibióticos sistêmicos sensíveis, especialmente no indivíduo imunocomprometido. No indivíduo soropositivo para herpes simples e em alto risco de imunossupressão, como, por exemplo, antes de um transplante de medula óssea, recomenda-se a utilização profilática do antivirótico aciclovir (Meropol et al.44, 2003). Tem-se relatado também nessa população a utilização profilática de antifúngicos. O risco de sangramento secundário à mucosite é especialmente alto no indivíduo com baixo número de plaquetas (<50 000/mm3). Pode-se obter o controle local do sangramento aplicando-se pressão com gaze embebida em água gelada ou irrigações com água gelada. A vasoconstrição promove a hemostasia. Podem-se utilizar trombina tópica ou xarope de ácido aminocapróico para promover a coagulação (Spielberg et al.45, 2004). A terapêutica sistêmica limita-se a transfusões de plaquetas. À medida que aumenta a intensidade da mucosite, torna-se cada vez mais provável que seja necessário incluir no plano de assistência uma ou mais dessas intervenções; a frequência de intervenções, ademais, deve aumentar em relação com a intensidade. A omissão de cuidados, mesmo por algumas horas, pode anular esforços terapêuticos anteriores. Se a mucosite for leve, recomenda-se higiene oral a cada 2 a 4 horas. Com o aumento da intensidade, podem-se indicar cuidados de hora em hora. É de especial importância prosseguir com os cuidados orais durante a noite a fim de manter os progressos feitos durante o dia. Conduta Dentária Recomenda-se assistência odontológica profissional, incluindo exame, raios X, limpeza, remoção 156 ISSN 2176-9095 de placas e aplicação tópica de fluoreto, pelo menos uma vez por ano. Exame e profilaxia dentária antes do início do tratamento do câncer podem diminuir a possibilidade de complicações orais e melhorar a probabilidade de o paciente vir a tolerar doses ótimas de tratamento. São essenciais o tratamento de cáries e doença periodôntica e a extração de dentes propensos a problemas antes de começar tratamentos de câncer como quimioterapia ou radioterapia de cabeça e pescoço. Uma vez iniciada a terapêutica, a neutropenia e a trombocitopenia constituem contraindicações à manipulação dentária. Uma vez concluída a radioterapia e diminuídos os efeitos colaterais orais agudos, o dentista deve acompanhar o paciente a cada 4 a 8 semanas nos primeiros 6 meses (Aisa et al.46, 2006). Educação do Paciente A educação do paciente deve levar em conta a importância da saúde e higiene oral, e identificar as possíveis causas de disfunções orais. Com o surgimento da mucosite, as abordagens de natureza preventiva devem expandir-se de forma a incluir intervenções que mantenham a integridade e promovam a cura, promovam bem-estar, combatam infecções e controlem sangramentos. Avaliação A avaliação da assistência decorre da verificação contínua da resposta do indivíduo ao tratamento. A utilização consistente de um guia de avaliação numérica proporciona forma definitiva de monitorar a resposta. Também os progressos no sentido de se atingirem as metas da assistência devem monitorar-se e documentar-se. Conclusão A mucosite oral constitui sintoma complexo e significativo no indivíduo com câncer. A abordagem sistemática de avaliação oral facilita a detecção precoce e a contínua avaliação das complicações orais. A indicação de culturas no indivíduo imunossuprimido deve-se ao fato de que as manifestações típicas da infecção podem não ocorrer. A prevenção e a conduta requerem plano de assistência personalizado e abrangente envolvendo o indivíduo e o prestador de assistência na manutenção da higiene oral e no combate a problemas como xerostomia, infecções, sangramento e dor. Mini Revisão/Mini Review Medicina Pinho AP, Misorelli JC, Montelli R, Longato SE. Mucosite no paciente em tratamento de câncer. São Paulo • Science in Health • 2010 set-dez; 1(3): 145-60 ISSN 2176-9095 Referências: 1. S onis ST,Elting LS,Keefe D, et al. Perspectives on cancer therapy-induced mucosal injury: pathogenesis, measurement, epidemiology, and consequences for patients. Cancer. 2004 May; 100( 9 suppl): 1995-2025. 2. Rubenstein EB,Peterson DE,Schubert M, et al. 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Considerando tais questões, esta revisão teve como objetivo reunir informações sobre o transtorno bipolar, incluindo as hipóteses já existentes sobre a causa da doença, bem como de seus sintomas. Bipolar disorder is a devastating major mental illness associated with higher rates of suicide and work loss. This disorder presents many causes but the exact mechanisms underlying its pathophysiology are still not understood. Affected patients present mood alterations characterized by depressive and manic episodes. The main symptoms are excessive excitement, insomnia, appetite disorder, psychotics and suicidal tendencies. This article aims to review information about bipolar disorder and its pathophysiology. Besides, the etiology and main symptoms are discussed. Descritores: Mitocôndrias - Transtorno bipolar Descriptors: Mitochondria - Bipolar disorder ** Professora da Disciplina de Gestão do Curso de Medicina da Universidade Cidade de São Paulo ** Alunos do Curso de Medicina da Universidade Cidade de São Paulo 161 Mini Revisão/Mini-Review Medicina Pinho AP, Domeni JPS, Coca VMC, Longato SE. Fisiopatologia do transtorno afetivo bipolar São Paulo • Science in Health • 2010 set-dez; 1(3): 161-9 Introdução O transtorno afetivo bipolar (TAB) é uma doença crônica que afeta cerca de 1,6% da população (Blazer1 2000, Murray e Lopes2 19997) e tem sido demonstrado que o TAB é um transtorno heterogêneo, com uma ampla variação de sintomatologia e curso (Ackenheil3 2001). Apesar dos avanços nos métodos de pesquisa em psicobiologia e do atual conhecimento sobre os mecanismos de ação dos estabilizadores de humor, a fisiopatologia do TAB está ainda distante de ser completamente entendida. As teorias iniciais a respeito da fisiopatologia do TAB focaram-se particularmente no sistema de neurotransmissão das aminas biogênicas (Ressler4 1999). As manifestações comportamentais e fisiológicas do TAB são complexas e indubitavelmente mediadas por uma cadeia de circuitos neurais interconectados; logo, não é surpreendente que os sistemas cerebrais que receberam maior atenção nos estudos neurobiológicos dos transtornos de humor tenham sido os monoaminérgicos, visto serem extensivamente distribuídos nos circuitos límbico-estriado-córtex préfrontal, regiões que controlam as manifestações comportamentais dos transtornos de humor (Brunello e Tascedda5 2003). Inicialmente, hipotetizou-se que a depressão e a mania resultariam de uma diminuição no transporte de transmissores no neurônio pré-sináptico e/ou nas vesículas sinápticas. As vesículas sinápticas, servindo como sistemas de “tampão”, não seriam capazes de exercer sua função plenamente, e um déficit tanto quanto um superfluxo do neurotransmissor não seria satisfatoriamente contrabalançado. Uma resultante de maior flutuação do transmissor na fenda sináptica poderia, portanto, ser responsável pela flutuação do humor (Blazer1 2000). Entretanto, modelos de TAB focados em um único sistema de neurotransmissor ou neuromodulador não conseguem explicar suficientemente as diversas apresentações clínicas desse transtorno. Diferentes estudos têm demonstrado que a regulação do humor envolve uma interação de múltiplos sistemas e que a maioria dos fármacos efetivos provavelmente não atua sobre um sistema de neurotransmissão particular isoladamente, mas modula o balanço funcional entre os diversos sistemas que 162 ISSN 2176-9095 interagem Chen et al.6 1999). Interações complexas entre sistemas neurais semi-independentes, funcionando harmonicamente, são necessárias para a manutenção do apetite, do sono, da estabilização do peso e do interesse na atividade sexual, funções neuro-vegetativas geralmente alteradas nos transtornos de humor (Davidson et al.7 2002). De fato, estudos pós-mortem demonstraram diminuição significativa de células gliais no córtex préfrontal e sistema límbico e de células neuronais no córtex pré-frontal e hipocampo de indivíduos com TAB, (Rajoska8 2002) corroborando os achados de alterações anatômicas e funcionais observados nos estudos de neuroimagem (Strakowisk et al.9 2000) Além disso, estudos farmacológicos evidenciaram atividade neuroprotetora dos estabilizadores de humor diante de uma série de modelos de neurotoxicidade (Chuang et al.10 2002) e pesquisas recentes identificaram que a ação terapêutica desses fármacos envolve a regulação de diversos sistemas de sinalização intracelulares, segundos mensageiros e regulação da expressão gênica (Li et al.11 2002). Neurobiologia da regulação do humor O processo de geração de estados afetivos complexos, isto é, a resposta sentimental e comportamental diante de diferentes estímulos (eventos estressantes) envolve: 1) a identificação do significado emocional do estímulo (estresse), 2) a produção de um estado afetivo específico em resposta ao estímulo e 3) a regulação da resposta afetiva e comportamental, que envolve a modulação dos processos 1 e 2, passos necessários para a obtenção de uma resposta contextualmente apropriada (Phillips et al.12 2003). Estudos de estimulação e de neuroimagem funcional em animais e humanos, incluindo pacientes com lesões cerebrais focais, demonstraram que a amígdala, o córtex insular e o núcleo caudado participam do processo de identificação do significado emocional do estímulo (passo 1), enquanto que o córtex préfrontal ventrolateral, o córtex orbitofrontal, o córtex insular, o giro cingulado anterior, a amígdala e o estriado participam da resposta afetiva diante dos estímulos (passo 2). A regulação afetiva e comportamental, por sua vez Mini Revisão/Mini-Review Medicina Pinho AP, Domeni JPS, Coca VMC, Longato SE. Fisiopatologia do transtorno afetivo bipolar São Paulo • Science in Health • 2010 set-dez; 1(3): 161-9 (passo 3), é desempenhada pelo córtex pré-frontal dorsolateral e dorsomedial, pelo hipocampo e pelo giro cingulado anterior dorsal. .( Davidson et al.7 2002, Phillips et al.12 2003) Estudos que avaliaram o desempenho de pacientes bipolares em tarefas cognitivas demonstraram prejuízo nos testes de atenção e de memória de trabalho, além de dificuldade de reconhecimento de expressões faciais de medo, tristeza e alegria e tendência a perceber estímulos neutros como particularmente negativos (Phillips et al.13 2003). Esses achados são apoiados pelos estudos pósmortem, que demonstraram diminuição significativa do número e densidade de células neuronais no córtex pré-frontal subgenual, dorsolateral e hipocampo8 e pelos estudos neurofuncionais, que observaram alterações no metabolismo da amígdala, do córtex insular, orbitofrontal e cingulado anterior dorsal e na cabeça do caudado (Phillips et al.13 2003). Em conjunto, esses estudos sugerem que sintomas como labilidade afetiva, ciclagem depressão/mania e distratibilidade, comumente associados ao TAB, podem estar associados a essas alterações em regiões cerebrais envolvidas no processamento das emoções. Neurotransmissores Sistema serotoninérgico A serotonina (5-HT) modula diferentes atividades neuronais e, desse modo, diversas funções fisiológicas e comportamentais, como controle de impulsos, agressividade e tendências suicidas (Shiah e Yathan14 2000). Dessa forma, a diminuição da liberação e da atividade da 5-HT podem estar associadas a algumas anormalidades como ideação suicida, tentativas de suicídio, agressividade e distúrbios do sono, achados frequentes nos transtornos bipolares (Ackenheil3 2001). Desde a década de 70, Prange et al.15 (1974) sugeriram a participação da 5-HT na fisiopatologia do TAB, formulando a hipótese permissiva, na qual um déficit na neurotransmissão serotoninérgica central permitiria a expressão tanto da fase maníaca, quanto da depressiva; contudo, tais fases difeririam em relação aos níveis de catecolaminas (noradrenalina e dopamina) centrais, que estariam elevadas na mania e 163 ISSN 2176-9095 diminuídas na depressão. Além disso, foi demonstrada diminuição dos níveis de ácido 5-hidroxi-indolacético (5-HIAA), principal metabólito da serotonina, no liquido cefalo-raqueano de pacientes maníacos e deprimidos em comparação a controles normais, sugerindo que tanto a mania quanto a depressão estão associadas a uma redução na função serotoninérgica central. Um estudo pós-mortem de cérebros de pacientes com TAB também constatou níveis significativamente menores de 5-HIAA no córtex frontal e parietal, comparados com controles, fornecendo mais uma evidência para a hipótese de diminuição na atividade serotoninérgica central em transtornos bipolares (Young et al.16 1994) Estudos de desafio neuroendócrino, quando analisados em conjunto, sugerem que a atividade pré-sináptica da serotonina no SNC está diminuída, ao passo que a sensibilidade dos receptores pós-sinápticos está aumentada na mania (Shiah e Yathan14 2000). 2. Sistema dopaminérgico Um dos achados mais consistentes em relação ao papel da dopamina na neurobiologia do TAB é o fato de agonistas dopaminérgicos diretos e indiretos simularem episódios de mania ou hipomania em pacientes com transtorno bipolar subjacente ou predisposição ao mesmo.1,5 Ackenheil3 (2001) sugeriu que, embora os resultados não tenham sido consistentes, uma maior atividade dopaminérgica induzida por aumento da liberação, diminuição da capacidade de tamponamento pelas vesículas sinápticas ou pela maior sensibilidade dos receptores dopaminérgicos pode estar associada ao desenvolvimento de sintomas maníacos, enquanto a diminuição da atividade dopaminérgica estaria associada à depressão. 3. Sistema noradrenérgico Estudos descrevem uma subfunção desse sistema nos estados depressivos. Nesses estados, um menor débito de noradrenalina e uma menor sensibilidade dos receptores α 2 são relatados, em contraste com uma tendência de maior atividade da noradrenalina em estados maníacos (Ackenheil3 2001). Nesse sentido, Baumann et al.17 (1999) observaram que indivíduos com TAB apresentaram um maior número de células pigmentadas no locus ceruleus, em Mini Revisão/Mini-Review Medicina Pinho AP, Domeni JPS, Coca VMC, Longato SE. Fisiopatologia do transtorno afetivo bipolar São Paulo • Science in Health • 2010 set-dez; 1(3): 161-9 comparação com pacientes unipolares. Além disso, (Shiah e Yatham.14 2000) sugeriram que uma função serotoninérgica central diminuída, associada a uma função noradrenérgica aumentada, poderia estar envolvida na gênese da mania. Sistema GABAérgico Dados clínicos indicam que um decréscimo na função GABAérgica acompanha os estados maníacos e depressivos, e que agonistas do GABA possuem propriedades antidepressivas e antimaníacas (Petty18 1995) Baixos níveis de GABA foram encontrados no plasma de pacientes bipolares em depressão e mania (Petty et al.19 1993). Sistema glutamatérgico A participação desse sistema na etiologia do TAB tem sido constatada por meio da ação dos estabilizadores do humor sobre a neurotransmissão glutamatérgica. O ácido valproico aumenta a concentração de glutamato em culturas de neurônios e cérebros de animais e também estimula a liberação de glutamato no córtex cerebral do rato. Consequentemente, o aumento do glutamato pode induzir cronicamente mecanismos que mantêm o balanço do glutamato na sinapse por meio de um feedback negativo (Li et al.11 2002). O ácido valproico também modula respostas fisiológicas mediadas por receptores N-metil-D-aspartato (NMDA), a-amino-3-hydroxy-5-metil-4-isoxazol-ácido propiônico (AMPA) e ácido kaínico (KA) (Lenox e Frazer20 2002). A carbamazepina, por outro lado, suprime a liberação de glutamato, reduz a despolarização produzida por NMDA e bloqueia a elevação dos níveis de cálcio intracelular induzida por receptores NMDA e KA. O lítio agudamente aumenta as concentrações de glutamato na sinapse, cronicamente causando upregulation da atividade do transportador. Hipotetiza-se que, eventualmente, ocorra estabilização da neurotransmissão excitatória com o uso crônico de lítio (Li et al.11 2002). Além disso, estudos recentes utilizando a técnica de espectroscopia por ressonância magnética demonstraram in vivo que pacientes bipolares apresentam aumento significativo da concentração de glutamina/glutamato no córtex préfrontal dorsolateral e giro do cíngulo (Michael et al.21 2003, Dager et al.22 2004) 164 ISSN 2176-9095 Sinalização intracelular Apesar da gama de alterações observadas no nível dos neurotransmissores e da interação desses com seus receptores, tem-se demonstrado que anormalidades em rotas de sinalização intracelular estão diretamente relacionadas a uma série de alterações nos sistemas de neurotransmissão (Manji e Lenox23 2000, Bezchlibnyk e Young24 2002). De fato, funções cerebrais de maior complexidade como o comportamento, o humor e a cognição são criticamente dependentes dos processos de transdução de sinal para o seu funcionamento adequado. Além disso, enquanto os efeitos bioquímicos do tratamento de transtornos do humor sobre os neurotransmissores na junção sináptica são imediatos (horas), a resposta clínica ocorre mais tardiamente (dias-semanas), salientando a importância central dos eventos intracelulares, envolvendo a regulação da expressão gênica e a plasticidade celular na regulação do humor (Manji e Lenox23 2000, Bezchlibnyk e Young24 2002, Ghaemi et al.25 1999). Proteínas G (proteínas ligantes de GTP) são moléculas que traduzem o sinal de um receptor transmembrana a ela acoplado para os segundos mensageiros intracelulares. A especificidade da interação do receptor com uma proteína G em particular determina a natureza do mecanismo efetor ao qual o receptor ativado estará acoplado. As proteínas G realizam a transdução de sinal de mais de 80% das moléculas extracelulares de sinalização, incluindo hormônios, neurotransmissores e neuromoduladores. Logo, são interessantes candidatas para anormalidades envolvendo a comunicação entre múltiplos sistemas neurais (Gould e Manji26 2002). Dois estudos iniciais demonstraram um aumento dos níveis da proteína G estimulatória (G) no córtex frontal, temporal e occipital de indivíduos com TAB, (Young et al.27 1991, Young et al.28 1993) enquanto outro estudo demonstrou um aumento da atividade da G, quando estimulada por agonista (Friedman e Wang29 1996) Em um estudo mais recente, foi demonstrado um aumento significativo da G entre os pacientes que não estavam em uso de lítio, mas não houve diferenças entre o total dos pacientes e os voluntários normais, sugerindo uma possível ação do lítio na atividade da G (Dowlatshahi et al.30 1999) Além disso, estudos com marcadores periféricos também demonstraram alterações dos níveis de G em pa- Mini Revisão/Mini-Review Medicina Pinho AP, Domeni JPS, Coca VMC, Longato SE. Fisiopatologia do transtorno afetivo bipolar São Paulo • Science in Health • 2010 set-dez; 1(3): 161-9 cientes com TAB, (Spleiss et al.31 1998, Avissar et al.32 1997, Mitchel et al.33 1997) sugerindo que alterações dessa proteína podem estar envolvidas na fisiopatologia do TAB. Rota de sinalização da adenilato ciclase A adenilato ciclase é uma enzima que converte o ATP no segundo mensageiro AMP cíclico (AMPc). A proteína Gs está envolvida na estimulação da adenilato ciclase, ao passo que a proteína Gi inibe essa enzima, sendo que a maioria dos receptores que regulam a ação do AMPc o fazem através do seu efeito em uma dessas proteínas G. Um efeito central do AMPc é a ativação da proteína quinase A (PKA), uma enzima que regula canais iônicos, elementos do citoesqueleto e fatores de transcrição, constituindo, desse modo, um passo crítico nas modificações neurobiológicas duradouras. Um dos fatores de transcrição fosforilados e modulados pela PKA é a AMPc response element binding protein (CREB), que regula numerosos processos neuronais, incluindo excitação, desenvolvimento e apoptose de neurônios e plasticidade sináptica (Walton e Dragunow34 2000) Estudos pós-mortem e com células periféricas têm demonstrado, com consistência, aumento da atividade da adenilato ciclase, AMPc e da PKA em pacientes com TAB.35-36 Além disso, estudos farmacológicos têm demonstrado que o lítio, ácido valpróico e a carbamazepina possuem ação regulatória nessa via de sinalização (Lenox e Frazer20 2002). Rota de sinalização do fosfatidilinositol A ativação de um receptor acoplado à cascata do fosfatidilinositol (PIP2) estimula uma proteína efetora chamada fosfolipase C, que induz a formação de dois importantes segundos-mensageiros: o diacilglicerol (DAG) e o inositol-1,4,5-trifosfato (IP3). A DAG, por sua vez, ativa a proteína quinase C (PKC), envolvida em processos celulares incluindo secreção, exocitose, expressão gênica, modulação da condução iônica, proliferação celular e down-regulation de receptores extracelulares. O IP3 regula a liberação das reservas de cálcio intracelular armazenadas no retículo endoplasmático. O cálcio liberado interage com numerosas proteínas celulares, incluindo um grupo de receptores sensíveis ao cálcio intracelular denominado cal- 165 ISSN 2176-9095 modulinas (CaM), que ativam proteínas quinases dependentes de calmodulina (CaMK), levando à ativação de canais iônicos, moléculas sinalizadoras, apoptose e fatores de transcrição (Gould e Manji26 2002) Brown et al.37 (1993) observaram níveis aumentados de PIP2 em plaquetas de bipolares maníacos. Esse achado também foi observado na fase depressiva, (Soares et al.38 2001) enquanto outros estudos encontraram níveis diminuídos após tratamento com lítio. (Soares et al.39 2000, Soares et al.40 1999) Da mesma forma, estudos pós-mortem e com células periféricas evidenciaram um aumento dos níveis de PKC em indivíduos com TAB (Wang e Friedman41 1996, Wang et al.42 1999) e subsequente diminuição pelo tratamento com o lítio (Manji et al.43 1993). De fato, a ação do lítio nessa via de sinalização foi demonstrada em dois estudos com espectroscopia por ressonância magnética (ERM), que demonstraram que o lítio diminui significativamente os níveis de myo-inositol, diminuindo, assim, a atividade dessa via de sinalização (Moore et al.44 1999, Davanzo et al.45 2001). Utilizando a técnica de ERM, nosso grupo recentemente demonstrou que bipolares em episódio maníaco apresentam níveis significativamente aumentados de myo-inositol no córtex pré-frontal dorsolateral esquerdo, em comparação a voluntários normais. Regulação da expressão gênica e neuroproteção A regulação das diversas cascatas de sinalização intracelular modula os fatores de transcrição gênica, proteínas que se ligam a genes específicos no DNA, induzindo a formação de novas proteínas envolvidas na plasticidade celular. Dessa forma, alterações em qualquer nível da cascata podem provocar a morte celular através da formação de proteínas pró-apoptóticas ou da diminuição dos fatores de proteção/ sobrevivência celular, como as neurotrofinas e proteínas estabilizadoras do citoesqueleto. Estudos farmacológicos demonstraram com consistência que o lítio aumenta a sobrevivência celular em uma série de modelos de neurotoxicidade.10 Mais especificamente, o lítio promoveu aumento significativo da expressão da bcl-2 e do BDNF, proteínas envolvidas com neuroproteção (Chen e Chuang46 1999, Hashimoto et al.47 1997) e inibição da atividade da GSK3-b, uma proteína associada à apoptose, (Hong et al.48 1997) enquanto o ácido valproico e, mais recen- Mini Revisão/Mini-Review Medicina Pinho AP, Domeni JPS, Coca VMC, Longato SE. Fisiopatologia do transtorno afetivo bipolar São Paulo • Science in Health • 2010 set-dez; 1(3): 161-9 temente, a lamotrigina, também demonstraram efeito inibitório na atividade da GSK3-b (Li et al.49 2002) Além disso, a regulação da estabilidade do RNAm durante a fase de transcrição gênica e formação de novas proteínas é um fator essencial na resposta celular em situações de estresse. Nesse sentido, Chen et al.50 (2001) demonstraram que o lítio e o ácido valproico ISSN 2176-9095 aumentam a expressão da proteína AUH, uma das proteínas que estabilizam o RNAm durante a fase de transcrição; desse modo, esses fármacos são capazes de regular a expressão de múltiplos genes no SNC, efeito este que pode ter um papel central no tratamento de uma doença complexa como o TAB. Referências 1. Blazer DG. Mood disorders: epidemiology. In: Sadock BJ, Sadick VA,editors. Kaplan & Sadock’s comprehensive textbook of psychiatry. 7th ed. Philadelphia: Lippincott Williams & Wilkins, c2000. p. 1298-308. 2. Murray CJ, Lopez AD. Global mortality, disability, and the contribution of risk factors: Global Burden of Disease Study. Lancet. 1997 May; 349(9063):1436-42. 3. ckenheil M. Neurotransmitters and signal transduction processes in bipolar affective A disorders: a synopsis. J Affec Disord. 2001 Jan; 62(1-2):101-11. 4. Ressler KJ, Nemeroff CB. 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Parceria UNICID - Município de Itapira-SP: Relato de experiência exitosa The use of Atraumatic Restorative Treatment (ART) philosophy in partnership between UNICID and Itapira City - SP: Report of a successful experience Gerson Lopes* Vladen Vieira** Resumo Abstract O Programa implica em envolver os alunos de Odontologia no desenvolvimento de ações integradas, nas quais os diversos atores estejam engajados em amplas intervenções para promover saúde, participando no planejamento de ações coletivas, rompendo com a restrita visão técnica e individualista do processo saúde-doença bucal. Visa à formação de um cirurgião-dentista capaz de desempenhar seu papel no âmbito do SUS, com comprometimento social, maior participação em atividades globais, integradas às estruturas acadêmicas. O grande desafio está em superar um modelo centrado no diagnóstico de doenças e orientado para o tratamento invasivo, com tecnologia de alto custo, e, por outro lado, centrar-se no diagnóstico integral, na Promoção da Saúde, na prevenção de doenças e no cuidado vigilante das pessoas da comunidade onde o cirurgião-dentista está inserido. Os movimentos mundiais em prol das mudanças nos projetos educacionais e a valorização recente da Promoção da Saúde podem oferecer um bom roteiro para essa agenda de mudanças. A reorientação dos serviços é um fenômeno observável em várias partes do mundo, já que acompanha a dinâmica mundial de reestruturação de Sistemas Nacionais de Saúde; espera-se que essa ideia-força, já presente no Brasil a partir de 1988, seja capaz de influenciar definitivamente o planejamento político-pedagógico das instituições de ensino e a organização e gestão dos serviços de saúde bucal, repercutindo favoravelmente para a sociedade e para os profissionais da Odontologia. The Program involves the development of integrated actions, where various actors are engaged in extensive interventions to promote health, participating in planning collective actions, breaking with the strict technical and individualistic vision of the health mouth-disease. It aims at training a dentist to be able to play his role in the SUS, with social commitment, greater participation in global activities, integrated into academic structures. The challenge is to overcome a model based on disease diagnosis and treatment oriented invasive, expensive technology and to focus on comprehensive diagnosis in health promotion, disease prevention and care of people in the watchful community where the dentist is inserted. The global movement in support of changes in educational projects and the recent appreciation of the Health Promotion can offer a good script for this change agenda. The redirection of services is a phenomenon observable in many parts of the world, since it follows the global trend of restructuring of National Health Systems and it is hoped that this idea-power, already present in Brazil after 1988, is capable of influencing the final political-pedagogical planning of educational institutions and organization and management of oral health services, impacting positively on society and professionals in dentistry. Descriptors: Dental atraumatic restorative tratament • Health promotion • Oral health. Descritores: Tratamento dentário restaurador sem trauma • Promoção de Saúde • Saúde bucal. ** Mestre em Odontopediatria. Prof. da Universidade Cidade de São Paulo. UNICID ** Especialista e Mestre em Saúde Pública. Coordenador da Atenção Básica do Município de Itapira 170 Odontologia Ponto de Vista /Point Of View ISSN 2176-9095 Lopes G, Vieira V. A utilização da filosofia do Tratamento Restaurador Atraumático (ART) na parceria ensino-serviço. Parceria UNICID - Município de Itapira-SP: Relato de experiência exitosa • São Paulo • Science in Health • 2010 set-dez; 1(3): 170-8 INTRODUÇÃO Desde início do século XX, o Brasil vem apresentando movimentos para modificar estruturas e práticas na área da saúde, inclusive na saúde bucal. Na VII Conferência Nacional de Saúde1 (1980), as conclusões apresentadas, em relação à participação da Odontologia nos serviços básicos de saúde, foram que o modelo de prática e assistência caracterizavase pela ineficácia, ineficiência, descoordenação, má distribuição, baixa cobertura, alta complexidade, enfoque curativo, caráter mercantilista e monopolista e inadequação no preparo de recursos humanos. Tal inadequação é caracterizada pela formação de profissionais de maneira desvinculada das reais necessidades do País, precocemente direcionados para as especialidades e totalmente dissociados das características dos serviços, onde deveriam atuar. Notandose que mesmo quando aborda aspectos técnicos, o faz utilizando-se de mecanismos formais, já superados por procedimentos comprovadamente mais ágeis e de menor custo, como o treinamento ou preparação em serviço. Mais adiante, em 1986, na VIII Conferência Nacional de Saúde2 e 1ª Conferência Nacional de Saúde Bucal, um marco e, certamente um divisor de águas dentro do Movimento pela Reforma Sanitária, foram criadas as bases para as propostas de reestruturação do Sistema de Saúde Brasileiro a serem defendidas na Assembleia Nacional Constituinte, instalada no ano seguinte. O Relatório da Conferência, entre outras propostas, destaca o conceito ampliado de saúde, a qual é colocada como direito de todos e dever do Estado, e, em seu sentido mais abrangente, é resultante das condições de alimentação, habitação, educação, renda, meio ambiente, trabalho, transporte, emprego, lazer, liberdade, acesso e posse da terra e acesso a serviços de saúde. Em 1988, a Assembleia Nacional Constituinte aprovou a nova Constituição Brasileira, incluindo, pela primeira vez, uma seção sobre a Saúde, incorporando, em grande parte, os conceitos e propostas da VIII Conferência Nacional de Saúde2, podendo-se dizer que, na essência, a Constituição adotou a proposta da Reforma Sanitária. A Constituição, no Título VIII (Da Ordem Social), Capítulo II (Da Seguridade Social), Seção II (Da Saúde), no Art. 196 afirma que “A saúde é direito de 171 todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação”. E, no Art. 200, ao Sistema Único de Saúde - SUS compete, além de outras atribuições, “ordenar a formação de recursos humanos na área de saúde”. Em consonância, a Resolução do Conselho Nacional de Educação/Câmara de Educação Superior (CNE/ CES)3 instituiu, em fevereiro de 2002, as Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Graduação em Odontologia, que em seu Art. 3º afirma que “O curso de Graduação em Odontologia tem como perfil do formando egresso/profissional, o Cirurgião-dentista, com formação generalista, humanista, crítica e reflexiva, para atuar em todos os níveis de atenção à saúde, com base no rigor técnico e científico. Capacitado ao exercício de atividades referentes à saúde bucal da população, pautado em princípios éticos, legais e na compreensão da realidade social, cultural e econômica do seu meio, dirigindo sua atuação para a transformação da realidade em benefício da sociedade”. De acordo ainda com essas diretrizes, a formação do cirurgião-dentista tem como objetivos a atuação multiprofissional, interdisciplinar e transdisciplinar como forma de participação e contribuição social, o desenvolvimento da assistência odontológica individual e coletiva, a administração e o planejamento de serviços de saúde comunitária. Em 2004, o relatório final da 3ª Conferência Nacional de Saúde Bucal4 reforça a necessidade de estabelecimento de estágios e convênios afirmando: “Promover a mudança dos cenários de práticas nos cursos de graduação por meio da realização de convênios entre as instituições de ensino superior e as secretarias estaduais e municipais, possibilitando contato direto dos estudantes de Odontologia com a realidade social, incluindo a prestação de serviços odontológicos, durante o período de um ano junto à comunidade carente” (Brasil5, 2007). Visando, então, a aproximação entre a graduação no ensino superior e as necessidades da atenção à saúde, por meio da parceria entre o Ministério da Saúde e o Ministério da Educação, foi lançado em 2005 o Programa Nacional de Reorientação da Formação Profissional em Saúde - Pró-Saúde. Odontologia Ponto de Vista /Point Of View ISSN 2176-9095 Lopes G, Vieira V. A utilização da filosofia do Tratamento Restaurador Atraumático (ART) na parceria ensino-serviço. Parceria UNICID - Município de Itapira-SP: Relato de experiência exitosa • São Paulo • Science in Health • 2010 set-dez; 1(3): 170-8 Busca-se com este programa a intervenção no processo formativo para que os programas de graduação possam deslocar o eixo de formação – centrado na assistência individual prestada em unidades especializadas – usando outro processo em que a formação esteja sintonizada com as necessidades sociais, calcada na proposta de hierarquização das ações de saúde e que levem em conta as dimensões sociais, econômicas e culturais da população. A educação dos profissionais deve ser entendida como processo permanente, que se inicia na graduação, mediante o estabelecimento de parcerias entre as instituições de ensino superior, os serviços de saúde, a comunidade, as entidades e outros setores da sociedade civil e mantida na vida profissional. Buscando a potencialização dessas relações de parcerias, foi criado o Projeto Sorria Itapira, que caminha para a universalização ao realizar ações capazes de transcendência social e setorial. Parceria esta, realizada por meio do Termo de Cooperação Técnica Didática e Científica, celebrada entre a Prefeitura Municipal de Itapira e a Universidade Cidade de São Paulo – UNICID, junto ao curso de Odontologia. Este Projeto implica em envolver os alunos de Odontologia no desenvolvimento de ações integradas, onde os diversos atores estejam engajados em amplas intervenções para promover saúde, participando no planejamento de ações coletivas, rompendo com a restrita visão técnica e individualista do processo saúde-doença bucal. O trabalho de parcerias é hoje apontado como uma das principais armas no combate à desigualdade social e na busca da humanização das sociedades modernas. Este tipo de trabalho traz resultados importantes para as comunidades atendidas e cria aproximações fundamentais para toda a sociedade. A Universidade, no desenvolvimento deste projeto, visa a formação de um cirurgião-dentista capaz de desempenhar seu papel no âmbito do SUS, com comprometimento social, maior participação em atividades globais, integradas às estruturas acadêmicas. Há que se considerar, atualmente, a existência de elementos capazes de dificultar o processo de mudança. De um lado, os estudantes, que, apesar de sensibilizados ao participarem de projetos de saúde bucal coletiva, não são seduzidos totalmente, como fazem as disciplinas clínico-assistenciais. E de outro, os pro- 172 fessores, basicamente especialistas, que apresentam dificuldades que podem estar situadas no campo da resistência ideológica e/ou na insegurança perante o desafio em participar de um processo de mudança no perfil de formação profissional, geralmente pautado em modelo desconectado entre o biológico e o social, para o qual não se sente devidamente preparado. Aspecto este de importância fundamental e que foi abordado na 43º Reunião da Associação Brasileira de Ensino Odontológico – ABENO6 (2008) com o tema “O Dilema do Professor Especialista no Ensino Generalista”. É neste contexto que o programa de parceria ensino-serviço foi criado para contribuir no processo de formação dos alunos de graduação e na melhoria das condições bucais da população atendida. O PROJETO Em março de 2007, com a assinatura do Termo de Cooperação Técnica Didática e Científica entre a Prefeitura Municipal de Itapira e a Universidade Cidade de São Paulo – UNICID, o Coordenador de Saúde Bucal, professores e estudantes do 3° ano do Curso de Odontologia desenvolveram as etapas e estratégias de ação do projeto, baseados na avaliação situacional e epidemiológica do município. Avaliação Situacional e Epidemiológica em Saúde Bucal O Município de Itapira fica localizado no interior do Estado de São Paulo, a 175 km da cidade de São Paulo, com uma população de 68.396 habitantes e 98% de taxa de urbanização em 2007. A saúde bucal no município é universalizada, baseada em ações coletivas (procedimentos coletivos) implantadas em 1992 e de assistência individual, com ações programáticas para pré-escolares, escolares (ensino fundamental e médio), gestantes, adultos e idosos e a urgência é assegurada a todos os cidadãos. Um dos problemas de saúde bucal enfrentado pelo município era o alto índice de cárie dentária em pré-escolares das EMEIs (Escola Municipal de Ensino Infantil), com prevalência do componente cariado, acompanhado pelo fenômeno da “polarização”. Em levantamento epidemiológico realizado em 2005, foi encontrado índice ceo para 5 anos de idade cronológica = 2,15 com a seguinte distribuição per- Odontologia Ponto de Vista /Point Of View ISSN 2176-9095 Lopes G, Vieira V. A utilização da filosofia do Tratamento Restaurador Atraumático (ART) na parceria ensino-serviço. Parceria UNICID - Município de Itapira-SP: Relato de experiência exitosa • São Paulo • Science in Health • 2010 set-dez; 1(3): 170-8 centual de seus componentes: Tabela 1- Distribuição percentual dos componentes do índice de ceo do Município de Itapira, aos 5 anos de idade. 2005 Cariados Obturados Extraídos 62,8% 33,5% 3,7% Baseados nesses dados, nas necessidades de atenção à população e no perfil de formação dos estudantes de Odontologia, o projeto foi assim definido: 1. Público-alvo - Pré-escolares das EMEIs do Município de Itapira - Alunos do 3° ano (5° e 6° semestres) do Curso de Odontologia da UNICID 2. Objetivos 2.1 - Para pré-escolares: - Melhoria do quadro epidemiológico. - Desenvolver ações para crianças matriculadas em escolas de educação infantil, colaborando com o sistema de saúde bucal do município, favorecendo o acesso à assistência devido à alta demanda. - Realizar tratamento das necessidades acumuladas. - Dar maior atenção às crianças identificadas com maior ceo e maiores necessidades de tratamento (grupo polarizado). - Ampliação da cobertura do atendimento aos pré-escolares. 2.2 - Para os alunos do Curso de Odontologia: - Contribuir para a formação de Cirurgiões-dentistas com perfil proposto nas Diretrizes Curriculares Nacionais para os Cursos de Odontologia. - Sensibilização e capacitação dos alunos para trabalhar em Saúde Coletiva, em todos os níveis de prevenção, desenvolvendo as competências, habilidades e conteúdos necessários para esse tipo de atuação. - Desenvolver ações integradas, engajadas em amplas intervenções multissetoriais para promover saúde, participando no planejamento de ações coletivas e/ou influenciando decisões de saúde. - Desenvolver atividades que os capacitem a construir e gerenciar programas em saúde bucal, em to- 173 dos os níveis de prevenção. - Possibilitar o estudo e a realização de trabalhos científicos que deem subsídios para a melhoria da saúde da população envolvida. - Capacitação para estabelecer sistemas de triagem e encaminhamento, identificar e avaliar tendências e realizar estudos comparativos de saúde bucal. - Capacitação para trabalhar com Educação em Saúde, estratégias de utilização do flúor, métodos de controle de placa bacteriana e tratamento restaurador atraumático (ART). 3. Metas A serem atingidas em um período de 6 anos: - redução de 50% no índice CPO aos 12 anos. - assegurar acesso a 100% das crianças matriculadas nas EMEIs. - realizar tratamento em 100% das crianças matriculadas nas EMEIs. - sensibilização de 100% dos alunos de Odontologia para promoção da saúde e prevenção das doenças bucais. - capacitar 100% dos alunos na filosofia do Tratamento Restaurador Atraumático (ART). 4. Seleção de estratégias (metodologia) 4.1- Etapa Preparatória - Avaliação do plano de ensino do curso de graduação em Odontologia da instituição. - Sensibilização e constituição de grupo de professores para coordenação do programa. - Estudo do Sistema Único de Saúde, Epidemiologia, Principais Problemas de Saúde Bucal, Estratégias de Promoção, Prevenção e Recuperação da Saúde Bucal, Elaboração de Programas em Saúde Bucal. 4.2 – Etapa Investigativa ou de Diagnóstico - Avaliação da percepção dos alunos de graduação em relação à saúde coletiva. - Avaliação da expectativa profissional do aluno de graduação. - Avaliação dos índices ceo aos 5 e CPO aos 12 anos de idade. - Avaliação das condições de acesso à atenção em saúde bucal dos pré-escolares. 5. Ações Odontologia Ponto de Vista /Point Of View ISSN 2176-9095 Lopes G, Vieira V. A utilização da filosofia do Tratamento Restaurador Atraumático (ART) na parceria ensino-serviço. Parceria UNICID - Município de Itapira-SP: Relato de experiência exitosa • São Paulo • Science in Health • 2010 set-dez; 1(3): 170-8 - Palestra na Prefeitura de Itapira para todos os estudantes, abordando temas relacionados ao Município: O desenvolvimento do SUS, a implantação do PSF e atuação da Saúde Bucal no serviço. - Visitas técnicas ao Hospital Municipal, a UBS, Pronto Atendimento e Centro de Especialidades Odontológicas. - Visita às EMEIs para análise e planejamento. - Triagem e encaminhamento. - Ações de Educação em Saúde bucal e preventivas (escovação supervisionada e utilização do flúor). - Atendimento clínico em campo – aplicação de ART (restaurações e selantes). 6. Recursos humanos e materiais Os recursos foram definidos de acordo com o contrato de parceria, com atribuições especificas de acordo com as ações. 6.1 - Recursos Humanos: - professores responsáveis pelo programa - alunos do curso de Odontologia (3° ano) - auxiliar odontológica - cirurgião-dentista da rede pública - professores das EMEIs - Coordenador de Saúde Bucal - motorista ção dos professores responsáveis pelo Projeto, Coordenador de Saúde Bucal do Município e estudantes participantes, sendo sugeridos ajustes e correções. 8.2 - dos resultados 8.2.1 - Desenvolvimento de trabalhos científicos Pesquisas sugeridas pelos coordenadores e/ou estudantes, de acordo com objetivos e metas estabelecidas no programa, ou até mesmo por alguma necessidade detectada. 8.2.2 – Plenária Ao final do ano letivo, em reunião com representantes de todos os seguimentos envolvidos (professoras das EMEIs, comunidade escolar, equipes de saúde bucal do Município, coordenadores e estudantes), para avaliação sobre a percepção do projeto, avaliação dos resultados alcançados e elaboração das ações para o ano seguinte. RESULTADOS 6.2 - Recursos Materiais: Instrumental e Material de consumo utilizados para a realização da Técnica de ART, em número e quantidade suficiente para os atendimentos; Equipamento de Proteção Individual e outros (mesas, colchões de ginástica, pias, autoclave); Impressos (Termo de Consentimento Livre e Esclarecido para exame clínico, tratamento e autorização para pesquisa e Ficha de Triagem e Encaminhamento), além de transporte e alimentação. 7. Cronograma As atividades foram programadas de março de 2007 a novembro de 2011, com ações mensais durante o período letivo, contemplando 8 ações anuais. 8. Avaliações 8.1 - do processo De forma contínua e permanente, com a participa- 174 A Estratégia do ART no Projeto Este tipo de trabalho traz resultados importantes para as comunidades atendidas e para os estudantes de Odontologia como forma de aprendizado em diferentes cenários, modificando paradigmas ( Freire et al.7, 2003). Atua na Promoção da Saúde por meio da Educação, com caráter contínuo e permanente partindo da realidade local, e não por ações pontuais (eventos), normalmente de caráter político e descontextualizadas, utilizando-se de palestras, verdadeiros minicursos de Odontologia e com resultados duvidosos a médio e longo prazo (Pauleto et al.8, 2004). E mesmo quando atua em recuperação da saúde, propõe estratégias inovadoras, simples, eficazes e de baixo custo, como neste caso a utilização da filosofia de mínima invasão, com o tratamento restaurador atraumático (ART) de forma estratégica, para diminuição da demanda nas UBS e dos índices de cárie. Com o objetivo da utilização da filosofia ART no Projeto Sorria Itapira, estabeleceu-se um sistema de triagem e encaminhamento, adotando-se critérios de inclusão/exclusão dos procedimentos de restaurações e selantes oclusais. Estavam indicadas restaurações na presença de lesão cariosa envolvendo dentina em uma única face, Odontologia Ponto de Vista /Point Of View ISSN 2176-9095 Lopes G, Vieira V. A utilização da filosofia do Tratamento Restaurador Atraumático (ART) na parceria ensino-serviço. Parceria UNICID - Município de Itapira-SP: Relato de experiência exitosa • São Paulo • Science in Health • 2010 set-dez; 1(3): 170-8 ausência de sintomatologia dolorosa, mobilidade e fístula. E os critérios de exclusão, envolvimento pulpar, presença de dor, abscesso, mobilidade ou fístula e ainda a dúvida no diagnóstico da condição pulpar. Para selamento oclusal dos primeiros molares permanentes, consideraram-se as condições de erupção parcial ou total, superfície hígida, presença de lesão branca e/ou sulcos pigmentados, levando-se em conta ainda o determinante social de risco à cárie dentária. Para todas as crianças foram estabelecidas ações de promoção de saúde bucal por meio da educação e de prevenção, utilizando-se escovação supervisionada e aplicações tópicas de flúor, segundo critérios de risco. As crianças passavam por escovação supervisionada, sendo dirigidas para triagem e nesta foi utilizada ficha especifica desenvolvida para o projeto. Após exame eram encaminhadas para realização do ART no sistema de mutirão em situação de campo. Ou, ainda, de acordo com necessidade de maior comple- xidade de tratamento, referenciadas para a UBS adstrita à EMEI. Os resultados obtidos no período de março de 2007 a junho de 2009 são apresentados na Tabela 2. Portanto, 2004 crianças passaram a ter acesso à atenção em saúde bucal; destas, 1114 receberam procedimentos na filosofia ART e apenas 291 (14,52%) foram referenciadas para serviços de maior complexidade, neste caso para as UBS. Houve, assim, a diminuição da demanda e melhor organização do serviço, além de minimizar tratamentos de maior complexidade como terapias pulpares e exodontias. Quando se comparam os dados epidemiológicos de 2005 e 2007 (tabelas 3 e 4), os números também são animadores: Tabela 3 - Índice de cárie – ceo – para 5 anos de idade Ano ceo 2005 2,15% 2007 1,79% A ções em E ducação, Pr evenção, Recuper ação e Manut enção da S aúde Bucal Educação em Saúde, Prevenção e Manutenção ART (restauração e selante) TRIAGEM UBS (outras necessidades) Figura 1: Esquema da atenção integral do Projeto Sorria Itapira Tabela 2 - Situação alcançada, conforme demonstrado pelos números observados após as 20 ações: Ano Total de crianças Total de crianças sem necessidade de examinadas tratamento Total de crianças com indicação de ART (selantes e restaurações) Total de Total de Total de crianças com selantes restaurações maiores necessidades aplicados realizadas (referenciadas para UBS) 2007 458 231 227 501 515 73 2008 2009* total 1092 454 2004 532 127 890 560 327 1114 1228 238 1967 1307 400 2222 146 72 291 Fonte: Sistema de informações – Projeto Sorria Itapira. *Dados referente ao período de março a junho de 2009. 175 Odontologia Ponto de Vista /Point Of View ISSN 2176-9095 Lopes G, Vieira V. A utilização da filosofia do Tratamento Restaurador Atraumático (ART) na parceria ensino-serviço. Parceria UNICID - Município de Itapira-SP: Relato de experiência exitosa • São Paulo • Science in Health • 2010 set-dez; 1(3): 170-8 Fonte: Sistema de informações – Projeto Sorria Itapira Tabela 4 – Distribuição percentual dos componentes cariados, extraídos e obturados, dos 5 anos de idade, Itapira 2005 e 2007. Componente Cariados Extraídos Obturados 2005 62,8% 3,7% 33,5% 2007 35,7% 64,7% Fonte: Sistema de Informações - Projeto Sorria Itapira Analisando as duas tabelas, observa-se que ações de promoção e prevenção desenvolvidas em outros programas apresentaram resultados positivos com a diminuição do índice ceo e que as ações do Projeto contribuíram para modificar a distribuição dos componentes, levando a um aumento de aproximadamente 50% do componente obturado. Com isso, o programa construído e executado pelos alunos contribuiu para a melhoria na condição de saúde bucal da população atendida, atuando em grande escala, diminuindo a demanda nas UBS, facilitando o acesso dessa população ao tratamento, aumentando a consciência da necessidade de cuidados com a saúde bucal, motivando inclusive responsáveis e professores. Foram apresentados, assim, ótimos resultados por meio da simplicidade da técnica, do baixo custo e da grande efetividade da prática desenvolvida no interior dos espaços sociais, alcançando-se um incomparável ganho epidemiológico e social. Quadro I: Resumo dos objetivos da utilização da filosofia ART no Projeto Sorria Itapira. ART RESTAURAÇÃO SELANTE OBJETIVOS Aumento do acesso a tratamento odontológico Diminuição da demanda nas UBS Diminuição da necessidade de tratamentos de maior complexidade (exodontias, endodontias e restaurações) Diminuição da incidência de cárie oclusal nos primeiros molares permanentes, refletindo no índice CPO aos 12 anos. 176 DISCUSSÃO e CONCLUSÕES O Projeto é uma oportunidade fundamental de consolidação do espaço pedagógico capaz de enfrentar, positivamente, os desafios lançados pelas Diretrizes Curriculares para os Cursos de Graduação em Odontologia. Não se trata de uma proposta nova, mas de uma forma de transformação das práticas de ensino por meio da integração docente assistencial. Aborda o espaço dos serviços públicos de saúde e o mundo do trabalho como aspectos centrais de uma nova prática pedagógica, com potencial para se alcançar um perfil profissional com consciência crítica e capacidade de compreender a realidade e intervir sobre ela. Consegue atuar em todos os níveis de atenção à saúde sem confundir-se com a prática tradicional intramuros, que normalmente dá ênfase aos aspectos tecnicistas e biologicistas sem potência para alcançar as mudanças propostas pelas Diretrizes Curriculares e do Programa Nacional de Reorientação da Formação Profissional em Saúde – Pró-Saúde. A diversificação dos cenários de ensino é tida como essencial para o desenvolvimento do perfil do graduando. É no mundo do trabalho, em contato com diferentes realidades, que se espera que as maiores experiências educativas ocorram. Com isso, o programa contribui para a formação de profissionais capazes de desenvolver uma assistência humanizada e de alta qualidade e resolutibilidade, sendo impactante até mesmo para os custos do SUS (Santos e Westphal9, 1999). O resultado da experiência pelos alunos participantes pode ser avaliado pelo método do Discurso do Sujeito Coletivo (Lefèvre et al.10, 2000), do qual resultou a seguinte fala: “O Projeto Sorria Itapira contribuiu para minha formação profissional em diversos aspectos: Desenvolveu meu senso de coletivo e trabalho em equipe; por trabalhar em cenários diferentes ao da clínica da faculdade, inclusive do próprio consultório odontológico; observar e tratar uma grande diversidade de casos e enfrentar novas situações; aprender a trabalhar de forma simples, devido às limitações de recursos; por meio de treinamento desenvolveu um pouco mais minha habilidade; observar que é possível realizar bons trabalhos com pequenos gastos; ampliou minha visão em relação à realidade da Odontologia, melhorando meu amadurecimento pessoal e profis- Odontologia Ponto de Vista /Point Of View ISSN 2176-9095 Lopes G, Vieira V. A utilização da filosofia do Tratamento Restaurador Atraumático (ART) na parceria ensino-serviço. Parceria UNICID - Município de Itapira-SP: Relato de experiência exitosa • São Paulo • Science in Health • 2010 set-dez; 1(3): 170-8 sional”. Assim, o Projeto apresentou potencial para melhorar a qualidade de vida da população atendida e colaborar na formação do cirurgião-dentista com alguns atributos requeridos para a atuação clínica ampliada e a intervenção familiar e comunitária, com ênfase na Promoção da Saúde, ou seja, deste profissional que o Brasil e outras nações atualmente buscam produzir (Moyses11, 2008). O grande desafio está em superar um modelo centrado no diagnóstico de doenças e orientado para o tratamento invasivo, com tecnologia de alto custo, para outro, centrado no diagnóstico integral, na Promoção da Saúde, na prevenção de doenças e no cuidado vigilante das pessoas da comunidade onde o cirurgião-dentista está inserido. Os movimentos mundiais em prol das mudanças nos projetos educacionais e a valorização recente da Promoção da Saúde podem oferecer um bom roteiro para essa agenda de mudanças. A reorientação dos serviços é um fenômeno observável em várias partes do mundo, já que acompanha a dinâmica mundial de reestruturação de Sistemas Nacionais de Saúde; espera-se que essa ideia-força, já presente no Brasil após 1988, seja capaz de influenciar definitivamente o planejamento político-pedagógico das instituições de ensino e a organização e gestão dos serviços de saúde bucal, repercutindo favoravelmente para a sociedade e para os profissionais da Odontologia. REFERÊNCIAS 1. nais da Conferência Nacional de Saúde. 1980 Março 24-28; Centro de DocumentaA ção do Ministério da saúde; 1980. 280p. 2. nais da Conferência Nacional de Saúde, 1986 março 17-21. Brasília: Centro de DoA cumentação do Ministério da Saúde; 1987. 429p. 3. Brasil. Ministério da Educação. CNE Conselho Nacional de Educação. 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Aspects of stakeholder commitment, educational policy, educational planning strategies and evaluation are briefly discussed. Successes and failures in the governance and leadership of these processes are highlighted. A Imentação de um currículo inovador em uma nova escola bem como uma reforma curricular de uma escola sem fins lucrativos são tarefas difíceis, mas interessante. Duas situações contrastantes experimentadas pelos autores são aqui discutidas, relativas à liderança e questões de governança no ensino de graduação em medicina. Os aspectos relacionados ao compromisso das partes envolvidas, a política educacional, as estratégias de planejamento e avaliação educacional são discutidos brevemente. Os sucessos e fracassos da gestão e liderança desses processos são destacados. Key words: Education, medical, undergraduate • Problem- Palavras-chave: E ducação de graduação em Medicina • Aprendizado baseado em problemas • Liderança • Setor Privado • Setor Público. Based Learning • Leadership • Private sector • Public sector. ** ** UNICID – Universidade Cidade de São Paulo, São Paulo, Brasil. UNIDERP - University for the Development of the State and the Region of Pantanal, Mato Grosso do Sul, Brasil. 179 Ponto de Vista /Point Of View Formação e capacitação na Área da Saúde Machado JLM, Mattos MCI, Vieira JE. Leadership and governance for curriculum change São Paulo • Science in Health • 2010 set-dez; 1(3): 179-86 Introduction Educational hange is moved by the influence of the changes occurring in the world but educational principles cannot be forgotten (Walton1 1993a, Walton2 1993b). Innovation in education is related to the acceptance of logic and based on a deep understanding of the educational principles (Venturelli3 1997). Medical education should be intimately related to a health service provided by a health system. A medical school integrated to its local society would need to consider its focus and attention to the public needs. This means to adapt its curriculum to provide teaching and learning embedded into recognized environments – not just the university hospital. In addition, the requirements for higher health care standards drive professionals to be better prepared in order to fit into a better organised and improved health care system (McGuire4 1989, McMahon5 1992). However, medical schools seems to be slower in their response to these challenges (Fraser6 1991, Boelen7 1991). It has been presented that much of proposed reforms depend upon a strong leader, a dean focused on the cause who will lead the process conscientiously and with wisdom. Every member of staff can represent either the support or the resistance to change (McMahon5 1992, Harden8 1995, Tosteson9 1990). Notwithstanding, new proposals can be stimulated externally by action and policy at a varying levels and has been referred to as “forced change” by Grant and Gale10 (1989). On the other hand, it can come from inside the institutions in the form of monetary incentives to create new educational experiences – like new departments or courses. Implementing a new curriculum and reforming a traditional one: comparisons. Implementing a new curriculum in a brand new school allows the implementation and development of unbiased and futurist staff. They are usually recruited at the beginning of a new school with the opportunity to pursue an ideal program that gives a forward momentum to the group. On the other hand, changing an existing curriculum in a traditional school is a monumental task demanding a major transformation in philosophy and vision within the school. The major challenge seems to engage the staff as a team where there would be 180 ISSN 2176-9095 no initial consensus. Historically, McMaster, Maastricht, and the Harvard Medical School initiated changes in their medical school pedagogy that have influenced the education of medical students around the world. (Neville and Norman11 2007, Ten Cate12 2007, Tosteson9 1990). In Brazil three universities started a curriculum changing process in 1996 with the sponsoring from the Kellogg Foundation. Two of them succeeded implementing a new curriculum. The challenge was to innovate the teaching method in these schools and to have graduates that could take care of the health needs of local communities. In the year 2000, among others, a new medical school was set up allowing the experience of two authors (JLMM and MCIM) with both processes, the formation of a brand new curriculum as well as the reform of a traditional one. Onset of a new course A new course of medicine was created and implemented in a Brazilian private for-profit university in the year 2000. The educational program was collectively structured in order to have the new model of educational strategies and the spirit of innovation incorporated by the staff before the beginning of the course. Dean, coordinators and teachers met frequently for faculty development directed to the challenge of being tutors in a problem-based educational method. Resistance and difficulties in accepting new strategies of teaching appeared in a small percentage of the staff. Some of these teachers were asked to work initially at outpatient clinics, wards and skill laboratories in order to keep their interest, besides their disbelief, and not demising the group. Payment incentives and rewards to the many kinds of educational roles performed by the teachers could be clearly established through an open channel to the superior administration. This enticement improved the recruitment of medical teachers who had to leave their private offices to dedicate part of their time for educational purposes. Curriculum reform On the other hand, the reform of a curriculum in a traditional school would found a very different frame. A curriculum reform in a public institution (not for Ponto de Vista /Point Of View Formação e capacitação na Área da Saúde Machado JLM, Mattos MCI, Vieira JE. Leadership and governance for curriculum change São Paulo • Science in Health • 2010 set-dez; 1(3): 179-86 profit) started with a financial support from Kellog Foundation (The New Initiative – UNI). There was a clear opposition right at the beginning from supporters of their traditional educational strategies. The strong will of the coordinator and his supporters, as well as the Dean and Vice-dean allowed the engagement of a curriculum reform. The UNI program played an important role with the new paradigm for preparing health professionals. It brought together people and institutions that synchronized the university, the community and the health services, and enable the development of teaching and learning methods and the integration of multiprofessional teams (Almeida13 2001). The most important political maneuver was to nominate the UNI program coordinator as also coordinator of undergraduate medical school. This action demonstrated a philosophical harmony between the Dean and undergraduate committee as a way to set the Dean’s leadership skills (Kaufman14 1998, Des Marchais15 1993, Tosteson9 1990). Leadership Development Kaufman14 (1998) relates that at most institutions formal leaders such as deans, educational coordinator and educational committees are not prepared in terms of academic management and are not concerned with the major national and international educational guidelines. Des Marchais15 (1993) during the implementation of a new curriculum at the University of Sherbrooke Faculty of Medicine highlighted the importance of the leadership of the person in charge. According to Fisher and Koch16 (1996) a college president is a transformational individual who can make a dramatic, and positive difference to the life of his institution. Clark17 (1995) regarding leadership and innovation in universities formulated a hypothesis: “Innovating universities depend heavily on leadership at middle and lower levels of management that successfully reconciles the entrepreneurial drives of central leaders with the drives of disparate academic professional groups. In American terms, deans become more critical.” The dean of a medical school The importance of leadership has grown as medical 181 ISSN 2176-9095 education has come under increasing scrutiny. Management skills (institutional assessment, strategic planning, financial stewardship, recruitment and retention of talent) and leadership skills (visioning, maximizing values, building constituency) could be cited. In addition, content knowledge and attitudes (commitment to the success of others, appreciation of institutional culture) are also noted to be valuable qualities for medical school deans (Rich18 2008). Being aware of the main guidelines of medical education and be able to apply what the national policy is recommending should also be the skills that a dean of medical school is expected to have. The process of choosing a Dean would better suit the competence in education, educational management and educational policies. Many of these attributes are supposed to be an intrinsic part of the candidate to become a dean, but usually they are not. Therefore, actions related to these attributes generally are performed in a non professional way. Sachdeva19 (2000) refers that the dean of the school and the dean for education need to convey the vision for change to department chairs and the faculty. Clear articulation of the vision, definition of the expected outcomes, and expression of personal support by institutional leaders will go a long way toward motivating the faculty to consider seriously a proposal for change. The differences in academic empowerment: public and private institutions At public Brazilian institutions the rector, prorectors and other coordinators are elected by the university community. It is not unusual to have the institutional interests set aside in favour of the electors’ will. This is one of the crucial points in public academic administration, since decisions made at the high levels of the organizational structure can find an attitude of non declared resistance. In other words, projects can be impaired at any level of the academic community. On the other hand, in private for-profit institutions the decision is inherent to the owners and a council that defines and legitimates the administrator’s power. Channels of communication between the owners and the academic management group are open to discussion and decisions. When the main adminis- Ponto de Vista /Point Of View Formação e capacitação na Área da Saúde Machado JLM, Mattos MCI, Vieira JE. Leadership and governance for curriculum change São Paulo • Science in Health • 2010 set-dez; 1(3): 179-86 trative guidelines are not followed, a change within administrative levels can be exercised, faster than at public institutions. It is important to emphasize this difference to understand the inner facts related to the implantation of curricular innovations in universities from those institutions. It is obvious that at any of the institutions a process of changing has to be clearly defined and presented to faculty, students and staff. It seems clear that the process of decision could be more dynamic and fast at the private university where economic reasons guide their actions. In general, funding for medical education are not related to the achievement of institutional goals and performance evaluations of institutions. In the United States, funds are tied to welfare programs like Medicare and Medicaid, but not with indicators of teaching and performance of the faculty (Kohn20 2004). In addition, there are usually more financial incentives for research activities than teaching activities. The more conservative economic theories recommend to reduce the costs of education, reducing the costs of teaching hospitals related to medical education, either at the undergraduate level or residency programs. The basis for this argument is that the additional costs allegedly owed to medical education were indeed due to a combination of patient care and research activities (Newhouse and Wilmensky21 2001). In contrast, other economists argue the medical education as a social good, justifying the investment made by society through federal funding of educational programs (Gbadebo and Reinhardt22 2001). Educational Management A new organisational structure is of paramount importance when a school has a new curriculum (Bush231986). The lack of educational management impairs the control of the implementation in such a way that may allow the development of a parallel curriculum. Bloom24 (1988) reviewing 50 years of reforms without change in medical education, refers to the following obstacles: no reduction in departmental autonomy (Table 1), no change in the reward system and no great disruption of the traditional curriculum, maintenance of the status quo, academic promotion based more upon research and clinical service than 182 ISSN 2176-9095 on teaching, and educational innovation being too costly in terms of time, money, and resources. The common source of these obstacles lies mainly in the faculty’s resistance to innovation. This contention could be related to the fact that the scientific mission of academic medicine has displaced its social responsibility to train for health-care needs of most societies (Bloom25 1989). It is noteworthy that in many public Brazilian universities the departmental autonomy prevails, leading to a fragmentation of the power that impairs the implementation of any central decision like the one involving undergraduation. On the other hand, some good qualities result from characteristics of the public universities like the integral tenure to research and community extension activities, characteristics that bring quality to universities (Table 1). In private Brazilian universities some advantages prevail in managing the institution, following the council plans. As emphasis is mainly given to the undergraduate courses, most of the private institutions downsizes research and post-graduation courses. The institution follows the demands for professionals, or the market logic that may prompt the institution’s philosophy to change in accordance to the movement of those demands adopting a matrix model of management (Table 1). Matrix management is not only recommended for education but is in fact frequently used in general administration. The curriculum management may demand a Planning Group committed to study the curriculum, the innovations, and to oversee its implementation. The evaluation of each step should be carried out frequently by a second organized committee, an Evaluation Group that should provide an immediate feedback to staff and students so that problems can be resolved as fast as they appear. The evaluation group should be responsible for quality assurance in medical education in order to promote a balance between the educational program and the methods of teaching and the outcomes of learning (Mennin and Krackov26 1998). The lack of evaluation may lead to a state of independence of departments ultimately allowing teachers to choose “what” and “how” to teach as well as the assessment. A central committee would do more for the overall quality of teaching and learning once Ponto de Vista /Point Of View Formação e capacitação na Área da Saúde Machado JLM, Mattos MCI, Vieira JE. Leadership and governance for curriculum change São Paulo • Science in Health • 2010 set-dez; 1(3): 179-86 an effective monitoring of the process could be implemented. The culture of traditional institutions is that such committees would lessen the department power and limit the freedom of the academic staff. In order to allow new ideas, stakeholders have to be the first group to discuss and even accept the idea of change. They ought to demonstrate to the institution the main reasons for and ways to achieve changes and that the fear of losing power can be replaced by valuable gains from the institution’s image to the society. There are many similarities between educational and entrepreneurial management. Once strategic planning and other necessary groups were established, the responsibilities of each group will be clearly defined and suitable evaluation will guide the process towards the main purpose of the institution. Lessons learned The major obstacles for education change could be identified as resource allocation, structure of the medical faculty, departmental power and the relative reduced importance of educational activities in comparison to research (Leinster & Dangerfield27 1996). 183 ISSN 2176-9095 The implementation of a new curriculum should be followed by educational management. The process of spreading the workload during the first steps of implementation should be shared by all staff and students under the guidance of a leader with institutional power to coordinate the activities. Every step should be known, an approach that would lead to team involvement and the empowerment of each member feeling responsible for new ideas becoming reality. A professional view of educational management should support the whole process beyond implementation. Besides the incentive to research and publish, teaching training and improvement in administration and educational management had to be considered in a same level of importance. A central committee of evaluation would do more for the overall quality of teaching and learning, once monitoring the process was implemented to promote quality. There should be an institutional guidance to encourage medical education oriented to community in the core curriculum. This approach brings undergraduates to recognize the importance of community needs, and to consider the social and political aspects that might improve it. Ponto de Vista /Point Of View Formação e capacitação na Área da Saúde Machado JLM, Mattos MCI, Vieira JE. Leadership and governance for curriculum change São Paulo • Science in Health • 2010 set-dez; 1(3): 179-86 ISSN 2176-9095 Table 1 - Private and public institution dynamic and characteristics Institution Process Project Staff development Private Creation Innovative course Before reform and during implementation for the entire staff. Maintenance for new teachers. Academic management Matrix management. High influence of the owners and council in “academic decisions”. Departments influence in the institutional decisions No departments Leadership Institutional leadership Institutional Focus and Priorities. 1. Undergraduation 2. Services Logic market roles Philosophy of the institution Staff´s liaison Institutional Financial Support for infra-structure and equipments Institutional dynamic Public Reform Reform and adaptation. Before starting the course. Maintenance for new teachers. Departmental, fragmented management Variable influence of individual or corporative interests over institutional. Relative didactic autonomy of departments and possible fragmentation of decisions. Local group leadership 1. Research 2. Services 3. Post-graduation 4. Undergraduation Guided by the professional necessity pointed by the (logic) market Possibility of change Work contract – part time Stable, bureaucracy Tenure contract. Total support Partial support Faster Complexity of decisions due to power fragmentation. 184 Partially guided by the logic market Ponto de Vista /Point Of View Formação e capacitação na Área da Saúde Machado JLM, Mattos MCI, Vieira JE. Leadership and governance for curriculum change São Paulo • Science in Health • 2010 set-dez; 1(3): 179-86 ISSN 2176-9095 References 1. Walton H. Medical education world-wide. A global strategy for medical education. Med Educ 1993 Sep; 27(5):394-8 2. alton H. The changing medical profession: implications for medical education. 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