UNIVERSIDADE ESTADUAL DO MARANHÃO
CENTRO DE CIÊNCIAS EXATAS E NATURAIS
DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA E GEOGRAFIA
CURSO DE HISTÓRIA
MÁRCIA ANDRÉA TEIXEIRA DA SILVA
LIBERDADE DE CULTO: uma abordagem do processo de diminuição às perseguições policiais
em terreiros de Culto Afro-Brasileiro de São Luís na década de 1960.
São Luís
2008
Silva, Márcia Andréa Teixeira da.
Liberdade de culto: uma abordagem do processo de diminuição às
perseguições policiais em terreiros de Culto Afro-Brasileiro em São
Luís na década de 1960 / Márcia Andréa Teixeira da Silva. – São
Luis, 2008.
111 f.: il.
Orientador: Profª. Drª. Ana Livia Bomfim Vieira.
Monografia (Graduação) – Licenciatura em História - Universidade
Estadual do Maranhão, 2008.
1.Terreiros - Perseguição. 2.Religião Afro-Brasileira – São Luís.
3. Representações. I.Título.
CDU: 291.21:398.3(812.1)
MÁRCIA ANDRÉA TEIXEIRA DA SILVA
LIBERDADE DE CULTO: uma abordagem do processo de diminuição às perseguições policiais
em terreiros de Culto Afro-Brasileiro de São Luís na década de 1960
Monografia apresentada ao Curso de História da
Universidade Estadual do Maranhão como
requisito à obtenção do título de Licenciatura em
História.
Orientador (a): Prof.ª Dra. Ana Lívia Bomfim
Vieira
Aprovada em: / /
São Luís
2008
MÁRCIA ANDRÉA TEIXEIRA DA SILVA
LIBERDADE DE CULTO: uma abordagem do processo de diminuição às perseguições policiais
em terreiros de Culto Afro-Brasileiro de São Luís na década de 1960
Monografia apresentada ao Curso de História da
Universidade Estadual do Maranhão como
requisito à obtenção do título de Licenciatura em
História.
Aprovada em: / /
BANCA EXAMINADORA
_______________________________________________
Profª. Dra. Ana Lívia Bomfim Vieira (Orientadora)
Universidade Estadual do Maranhão
________________________________________________
Profª. Dra. Mundicarmo Maria Rocha Ferretti (Co-Orientadora)
Universidade Federal do Maranhão
________________________________________________
Profª. Dra. Adriana Maria de Souza Zierer
Universidade Estadual do Maranhão
Aos meus pais Célia Maria e José Alberto e a
minha avó Maria Áurea (in memoriam) pela
dedicação, amor e carinho contínuos em prol de
minha formação como pessoa.
A todos os adeptos da Religião Afro-Brasileira
que resistem bravamente pela manutenção de
sua identidade cultural.
AGRADECIMENTOS
A Deus, por ter me presenteado com a vida e me dar força e determinação em todos os
momentos, sobretudo nos de superação das dificuldades.
A todos os meus familiares, sobretudo aos tios Bebeto e Betinho, pelo apoio, motivação nos
estudos e torcida pelas conquistas profissionais.
Aos professores do Departamento de História e Educação, pelas instruções e conhecimentos
ministrados ao longo da vida acadêmica.
A professora Ana Lívia Vieira, pela orientação deste trabalho.
A professora Mundicarmo Ferretti, pela atenção, paciência e apoio ao direcionamento da
realização desta pesquisa, além do empréstimo de livros que contribuíram muito para a elaboração
deste trabalho.
Ao professor Adroaldo, pelo apoio a elaboração deste trabalho.
Aos companheiros de curso e aos queridos amigos Ana Rosa, Ângela Saraiva, Elaine Regina,
Léo Batista e Maria da Glória, pessoas muito especiais com quem dividi emoções da vida acadêmica e
construí fortes laços de carinho e amizade.
Aos amigos que conheci na ocasião do estágio na Superintendência de Cultura Popular, em
especial a Ana Paula, Aretha, Briza, Daisy, Darinalva, Diego, Dona Chica, Edmilson, Gonzaga,
Idaiana, Isa, Jandir, João Paulo, Lellya, Lilia, Lili, Luenil, Marco Aurélio, Margareti, Monique,
Ottávio, Rafaela, Sandro, Vanessa, Wilberth e Wilmara, pessoas com quem pude desenvolver relações
de afeto e amizade e aprendi muitas lições para a vida - nos âmbitos profissional e pessoal.
Ao amigo Weeslem, pelo carinho e motivação, além do empréstimo de materiais bibliográficos
importantes para idealização deste estudo.
A amiga Ildes, pela preciosa relação de amizade desde a infância, respeito e confiança em todos
os momentos.
As amigas Leila Regina e Maryluse Coqueiro, pelo carinho, atenção e amizade que se expande
ao longo do tempo.
Ao pesquisador Zacarias Castro, pelo fornecimento de dados de jornais que ajudou muito à
construção deste trabalho.
Aos membros da Federação de Umbanda e Culto Afro-Brasileiro do Maranhão, que
colaboraram na disposição de informações para esta pesquisa, sobretudo a Biné Gomes e Epitácio
Castro, pelo carinho, atenção e fornecimento de documentos da Federação relevantes para este estudo.
Aos entrevistados que se dispuseram a contribuir com seus depoimentos, fornecendo dados
importantes relativos ao objeto de pesquisa em questão.
A todos que colaboraram direta ou indiretamente para a realização deste trabalho monográfico.
“Devemos falar da tradição não como uma necessidade
absoluta e inalterável, mas como metade de uma dialética
em evolução – sendo a outra parte do imperativo da
mudança”.
(Chinua Achebe)
“A manutenção e desdobramento pelas comunidadesterreiros da herança religiosa e cultural permitirão ao
negro e ao afro-brasileiro desenvolver uma forma social
negro-brasileira e especificamente política para afirmar-se
cidadão na sociedade brasileira, recriando-se como
coletividade e individualidade, apesar do racismo, e
etnocentrismo com base na identidade cultural, valores
éticos e estéticos, mesmo diante das adversidades
econômicas e sociais e das limitações políticas e
ideológicas”.
(Dalmir Francisco)
RESUMO
Esta pesquisa se direciona a um estudo acerca das perseguições aos terreiros em São Luís, analisando a
respeito da diminuição das coerções a essas casas de culto durante o período que compreende a década
de 1960. São observados dois elementos que influenciam essa abertura às representações da religião
afro na cidade: fatores políticos no cenário nacional e no estado do Maranhão e a criação da Federação
de Umbanda Espírita e Culto Afro-Brasileiro do Maranhão - entidade institucional que oferece apoio
jurídico aos terreiros a ela filiados, viabilizando suporte legal aos cultos. O trabalho remete-se a uma
perspectiva de estudo das representações culturais dos cultos de matriz africana em São Luís, não sob
o ponto de vista etnográfico, mas a partir do exame de um processo sócio-cultural da redução da
intolerância existente dentro da relação entre religião e Estado.
Palavras-chave: Terreiros - Perseguição. Religião Afro-Brasileira – São Luís. Representações.
ABSTRACT
This research is addressed to a study concerning the persecutions to the yards in Sao Luis, under the
point of view of an approach about the decrease of the coercions to those cult houses during the period
that understands the decade of 1960. Two elements are observed that influence for that opening to the
representations of the afro religion in the city, such as: political factors in the national scenery and in
the state of Maranhao and the creation of the Federation of Umbanda Spirit and Afro-Brazilian Cult of
Maranhao, institutional entity that offers juridical support to the yards to her adopted, making possible
legal support to the cults. The work is sent to a perspective of study of the cultural representations of
the cults of African head office in Sao Luis, not under the point of ethnographic view, but starting from
a socio-cultural process of the reduction of the existent intolerance inside of the relationship between
religion and State.
Key-words: Persecution -Yards. Religion Afro-Brazilian - Sao Luis. Representations.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO............................. ....................................................................................... 10
1 A HISTÓRIA CULTURAL E A RELIGIÃO AFRO-BRASILEIRA ................................ 15
1.1 Opressão e Resistência – O Processo Histórico das perseguições aos terreiros................ 26
2 A RELIGIÃO AFRO-BRASILEIRA EM SÃO LUÍS........................................................ 31
2.1 José Cupertino e a introdução da Umbanda no Maranhão ............................................... 32
2.2 Pai Euclides e a Introdução do Candomblé em São Luís................................................. 35
2.3 Elementos dos Cultos Afro nas festas da Cultura Popular de São Luís ........................... 38
2.3.1 O Tambor de Crioula no Cenário dos cultos Afro ................................................... 39
2.3.2 A Festa do Divino Espírito Santo nos Terreiros....................................................... 42
3 A PERSEGUIÇÃO AOS TERREIROS DO MARANHÃO............................................... 45
3.1 A Diminuição das perseguições policiais em terreiros de culto afro em São Luís............ 53
3.2 Breve abordagem do cenário nacional e internacional da década de 1960 ....................... 58
4 DIMINUIÇÃO DA OPRESSÃO AOS TERREIROS DE SÃO LUÍS NA DÉCADA DE 1960 61
4.1 A Legitimação de Terreiros de Umbanda em São Luís ................................................... 65
4.2 A Criação das Federações de Umbanda e Cultos Afro-Brasileiros ................................. 67
4.3 Influência da Federação de Umbanda Espírita e Culto Afro-Brasileiro do Maranhão à redução das
perseguições aos cultos afro-brasileiros em São Luís............................................................ 69
4.3.1 A Federação de Umbanda Espírita e Culto Afro-Brasileiro do Maranhão ........... 71
4.3.1.1 Os Presidentes da Federação de Umbanda Espírita e Culto Afro-Brasileiro do
Maranhão............................................................................................................................. 72
4.3.1.2 O Corpo Administrativo da Federação de Umbanda Espírita e Culto Afro-Brasileiro do
Maranhão
78
4.3.1.3 Principais Cerimônias da Federação ..................................................................... 81
CONSIDERAÇÕES FINAIS 84
REFERÊNCIAS
88
APÊNDICES
93
ANEXOS
107
APÊNDICES 24
INTRODUÇÃO
A discriminação a cultura negra é algo presente em nossa sociedade desde quando os
portugueses trouxeram os africanos para desenvolver o trabalho escravo nas lavouras de cana-deaçúcar.
As expressões culturais dos negros eram submetidas a
um severo sistema de repressão acionado pelo
colonizador europeu, do qual estabelecia um olhar
etnocêntrico em relação àquelas práticas. Neste âmbito
faz-se necessário destacarmos a importante influência
da Igreja Católica no que tange a coibição das várias
manifestações culturais africanas, essencialmente à
religião.
Diante da necessidade da realização de seus cultos religiosos e em meio à perseguição da Igreja
Católica, os negros mascaravam seus rituais através da utilização de imagens de santos, dando uma
conotação de festa para que não sofressem represálias - o que propiciou a presença do sistema de
práticas doutrinárias heterogêneas - o sincretismo. Neste contexto, vários terreiros ao longo dos anos
adotaram esse mecanismo para realizarem suas manifestações e fugirem das perseguições do Estado.
Tendo em vista o forte quadro de repressão aos terreiros de culto afro na primeira
metade do século XX, propõe-se através deste trabalho uma análise da relevância da Federação de
Umbanda e Culto Afro-Brasileiro do Maranhão - criada na década de 1960, pelo então vereador José
Cupertino - para o processo de diminuição das coibições policiais aos terreiros. Assim tentaremos
verificar as relações de resistências culturais, em que pese à religião afro-brasileira.
O presente trabalho no que se refere à contribuição para a historiografia maranhense, parte do
princípio de estudos do historiador Roger Chartier, que enfatiza os conceitos de práticas e
representações dentro da História Cultural - corrente teórica da qual aborda dentre vários aspectos, às
expressões culturais das classes subalternas além de oferecer grande apreço a cultura popular de
maneira geral.
Desse modo, com o avanço da História Cultural nas últimas três décadas, houve um avanço nas
produções historiográficas destacando objetos com amplas temáticas, que discutem os mais diversos
assuntos, pois ocorre o diálogo com amplas disciplinas o que viabiliza também um amplo leque de
possibilidade nos campos de investigação.
Os estudos da cultura popular, das representações e das práticas discursivas partilhadas pelos
mais diversos setores sociais, são exemplos dos objetos envolvidos com a variada concepção de
cultura, deste modo quando apontamos os estudos da História Cultural, todos esses elementos estão
nela inseridos.
Quanto à discussão acerca de trabalhos voltados para a História Cultural, é necessário destacar
que, os estudos têm sido desenvolvidos no Brasil desde a década de 1970, fazendo que um maior
número de pesquisadores tenham o interesse na produção de estudos que denotem a questão de várias
temáticas dessa corrente, como a cultura popular, por exemplo.
Dessa forma nossa pesquisa atribuiu destaque aos estudos do historiador francês Roger
Chartier, pelo fato deste estabelecer dentro do conceito de práticas, que o indivíduo possui a sua
maneira particular de viver no mundo, identificando um estatuto, uma posição, e com isto se situar no
ambiente a partir de sua concepção simbólica de estar no meio social. Assim, quando é posto pelo
historiador o conceito de representações, verifica-se que para ele, as práticas culturais inserem-se no
modo como o social é colocado através de suas representações simbólicas e com isso, marca a sua
identidade, através de símbolos que os situa na sociedade.
Assim, o presente trabalho se identifica com essa abordagem, uma vez que analisa o processo
de resistência de uma expressão cultural religiosa de grupos étnicos que em sua maioria compõem os
setores mais desfavorecidos economicamente na escala social.
A pesquisa procura analisar a Federação de Umbanda e Culto Afro-Brasileiro do Maranhão em
si, analisando seus mecanismos legais que de alguma maneira passaram a atribuir mais autonomia às
festas realizadas nas casas de culto afro, analisando ainda o contexto histórico nacional e local em
que essa instituição foi criada, com o intuito de perceber o cenário político do momento e seus
possíveis fatores que colaboram para tal acontecimento, possibilitando que não só pesquisadores e
adeptos dessas expressões culturais participem dessas manifestações, mas que a sociedade em geral
repense o seu olhar etnocêntrico em relação à religião afro-brasileira.
Para a realização do trabalho abordando a década de 1960 enquanto um período de grande
repercussão nacional em vários aspectos, sobretudo o período em que percebe-se uma tímida
diminuição das coerções policiais em terreiros de São Luís, e é criada no Maranhão uma instituição
de caráter religioso com o intuito de tornar legais as manifestações em terreiros no estado, foram
realizadas pesquisas em jornais na Biblioteca Pública Benedito Leite, em boletins da Comissão
Maranhense de Folclore na Biblioteca Roldão Lima localizada no Centro de Cultura Popular
Domingos Vieira Filho, e em bibliotecas da Universidade Estadual do Maranhão (UEMA) e
Universidade Federal do Maranhão (UFMA), pesquisando em livros e monografias temas
relacionados ao nosso objeto de estudo.
Fomos também a festas em terreiros da capital com o intuito de assistir às manifestações
religiosas e conversar com membros dessas casas de culto, procurando perceber sua devoção às
entidades espirituais as quais estão ligados. Fomos à festa em homenagem a Iemanjá na praia do
Olho D’água para assistir a esta que é realizada a mais de quarenta anos, com o intuito de ver como
ocorria aquela cerimônia religiosa. Realizamos também entrevistas com algumas pessoas atreladas a
terreiros: esposas de ex-presidentes da Federação de Umbanda e Culto Afro-Brasileiro do Maranhão,
membros dessa instituição e donos de terreiros filiados na tentativa de compreender através dos
depoimentos, a gestão das lideranças que já passaram por lá, como funcionam os mecanismos
burocráticos e as cerimônias religiosas da entidade institucional. Por meio dessas entrevistas
procuramos identificar quais eram as interpretações daquelas pessoas sobre a importância daquela
Federação para os filiados (ver apêndices).
Neste sentido as abordagens feitas neste trabalho estão divididas em quatro capítulos, além
destas questões introdutórias e das considerações finais. O primeiro capítulo trata da História Cultural
e da Religião Afro-Brasileira, abordando brevemente as práticas das expressões da religião afro no
Brasil, e ainda o processo histórico das repressões do Estado para com esses cultos.
O segundo capítulo trata de abordar em linhas gerais, a religião afro-brasileira em São Luís,
destacando brevemente essas expressões a partir de considerações acerca de alguns terreiros antigos e
tradicionais da cidade. Neste capítulo destacamos ainda que sucintamente a trajetória de dois
importantes nomes da religião afro no estado, José Cupertino – falecido pai-de-santo, considerado
por muitos o introdutor da umbanda no estado e fundador da Federação de Umbanda e Culto AfroBrasileiro do Maranhão, e Pai Euclides – líder da Casa Fanti-Ashanti (terreiro localizado no bairro do
Cruzeiro do Anil) e pioneiro no culto do candomblé no Maranhão, Pai Euclides é também um pai-desanto com grande visibilidade na mídia, participando inclusive do documentário Atlântico Negro –
Na Rota dos Orixás, de Renato Barbieri.
Além disso, discutimos ainda a presença do culto afro-brasileiro em algumas manifestações da
cultura popular do estado como o Tambor de Crioula e a Festa do Divino Espírito Santo, por
exemplo.
Deste modo o terceiro capítulo trata das perseguições aos terreiros no Maranhão, sobretudo na
cidade de São Luís, em que procuramos usar matérias de jornais de diferentes momentos históricos,
com o intuito de perceber a incidência de matérias com aquele tipo de conteúdo. Além de
desenvolver uma abordagem que buscou demonstrar que no capítulo posterior haverá uma pequena
diminuição de batidas policiais ao longo da década de 1960, tratamos também de contextualizar esse
momento histórico no cenário nacional e estadual.
E finalmente no quarto capítulo desenvolvemos as idéias acerca da redução de diligências da
polícia nos terreiros e para isso também usamos manchetes de jornal de circulação diária da capital –
Jornal Pequeno, para poder demonstrar que, sobretudo a partir da Ditadura Militar há uma abertura as
expressões da religião afro-brasileira no Brasil, e no Maranhão é possível se perceber que a ação
sistemática de coerção aos terreiros regride, sobretudo aos terreiros de umbanda. E neste contexto
além de serem registrados vários terreiros, principalmente os de umbanda, no Diário Oficial do
estado com seus respectivos estatutos, é registrada ainda a ata de fundação da Federação de Umbanda
e Culto Afro-Brasileiro do Maranhão no ano de 1966, mesmo ano em que assume o governo do
estado José Sarney Costa.
Finalizando o capítulo discutimos aquela Federação com a tentativa de tentar perceber a
relevância da entidade para as casas de culto que a ela estão cadastradas, realizando abordagens sobre
alguns pontos como, por exemplo, pequeno histórico dos presidentes que estiveram à frente daquele
órgão, os membros da atual gestão com seus respectivos cargos e tentamos discutir ainda as
principais cerimônias religiosas realizadas pela Federação.
Ao longo do trabalho utilizamos referências bibliográficas que estiveram presentes através de
citações, e outras que viabilizaram a construção das idéias para elaboração do discurso sobre o objeto
em estudo. Nos apêndices procuramos apresentar parte de nosso direcionamento na construção do
trabalho, inicialmente mostramos os roteiros das entrevistas que realizamos com pessoas ligadas à
religião afro e à Federação, em seguida apresentamos fotos de vários momentos da pesquisa como a
participação em reuniões da Federação e nas cerimônias realizadas por essa instituição.
E finalmente apresentamos nos anexos, fontes importantes como à ata de instalação da
Federação de Umbanda e Culto Afro-Brasileiro do Maranhão juntamente com seu estatuto do ano de
1966, o extrato de Estatuto desta Federação do ano de 1983 com seus respectivos membros naquele
momento, mostramos ainda uma portaria da Secretaria de Segurança Pública do ano de 2001 que
garante a realização de cultos umbandistas em vários locais, além de documentos que fazem parte do
processo de filiação dos terreiros que a ela se cadastram atualmente.
Em linhas gerais, pretendemos com essa pesquisa colaborar com os estudos sobre a intolerância
às expressões religiosas da cultura negra oriunda dos africanos e seus descendentes, pois, apesar das
conquistas alcançadas ao longo dos anos, é ainda muito evidente o preconceito da sociedade a essas
manifestações culturais.
Embora o controle policial aos terreiros de umbanda tenha cessado de maneira mais evidente
no ano de 2001, de acordo com a Portaria n° 007/2001 – ASPLAN/GEGUSPC da Secretaria de
Segurança Pública do Estado (ver apêndice), tivemos o interesse de discutir como na década de 1960,
período em que ocorre a Ditadura Militar, momento de grande intolerância e censura, é também uma
ocasião em que, paradoxalmente vai colaborar no sentido de dar mais liberdade a expressões da
religião afro-brasileira - sobretudo a umbanda.
Neste sentido entende-se que, à produção de trabalhos com essa temática favorece a uma
conscientização da sociedade no que se refere à necessidade de haver mais reverência as diferentes
concepções de cada grupo sócio-cultural de estar no meio em que vivem. De modo que sua crença,
seus valores, seus cultos preservados secularmente por aqueles que lutaram bravamente para terem o
direito de manter sua identidade, possam ser igualmente aceitos e respeitados da mesma maneira que
os demais setores adversos dos cultos afro-brasileiros.
Dessa forma esperamos que este trabalho possa colaborar com a historiografia maranhense, de
maneira que os estudos voltados para objetos culturais com temáticas sumamente realizadas, possam
ser desenvolvidos por diversos campos, uma vez que há muitos aspectos a serem analisados de forma
que esse objeto possa ser notado sobre diferente prisma, com interpretações que viabilizem novas
subjetividades.
1. A HISTÓRIA CULTURAL E A RELIGIÃO AFRO-BRASILEIRA
A História Cultural vem obtendo um espaço considerável na produção historiográfica,
essencialmente por estabelecer enquanto objeto de pesquisa um amplo leque de possibilidades,
viabilizando dessa forma, o diálogo entre as disciplinas e distintos campos de investigação. Por tanto, a
História Cultural dentre outros aspectos caracteriza-se também pela relevância que atribui às diversas
expressões culturais de diferentes segmentos da sociedade - elite e camadas populares.
Para Vainfas (1997), a História Cultural direciona também real preocupação com as
estratificações e conflitos sociais, atentando para o resgate do papel das classes. O autor selecionou
três distintos estudos vinculados à chamada Nova História Cultural: 1)-Os trabalhos em relação às
noções de circularidade cultural sobre religiosidade e feitiçaria de Carlo Ginsburg; 2)-Os conceitos de
práticas, representações e apropriação realizados por Roger Chartier; 3)-A obra de Edward Thompson
“sobre movimentos sociais e cotidiano das classes populares”.
De acordo com Barros (2005), a História Cultural é um campo historiográfico que busca
abraçar múltiplas abordagens de estudo, colocando como objeto principal à “polifônica” concepção de
cultura, na qual o autor aborda os diversos conflitos e antagonismos sócio-culturais.
Em relação a importante contribuição da História Cultural para os objetos de investigação
historiográfica, é necessário destacarmos que a mesma evidenciou-se relativamente há pouco tempo,
tornando-se segundo Vainfas (1997), o refúgio encontrado pela História das Mentalidades, corrente
teórica que sofreu várias críticas de estudiosos na década de 1970.
Para Barros (2005 p. 55):
A História Cultural, campo historiográfico que se torna mais preciso e evidente a
partir das últimas décadas do século XX, mas que tem claros antecedentes desde o
início do século, é particularmente rica no sentido de abrigar no seio diferentes
possibilidades de tratamento por vezes antagônicas. Apenas para antecipar algumas
possibilidades de objetos, faremos notar que ela abre-se a estudos os mais variados,
como a ‘cultura letrada’, as ‘representações’, as práticas discursivas partilhadas por
diversos grupos sociais, os sistemas educativos, a mediação cultural através de
intelectuais, ou quaisquer outros campos atravessados pela polifônica noção de
cultura.
Além de toda essa articulação sobre a diversidade de proposições de assuntos oriundos da
corrente teórica em destaque - Barros (2005) aborda que esta não procura limitar-se a estudos de obras
artísticas e literárias - tradicionais e oficiais que atraem vários historiadores de diversas linhagens
teóricas, marginalizando de certa forma, comportamentos e atitudes do cotidiano que pelo seu caráter
de simplicidade não tem o mesmo reconhecimento enquanto componente da cultura.
O historiador Georges Duby, de acordo com Barros (2005, p. 58), verifica que a História
Cultural estuda como são construídas as produções desses objetos culturais, enfatizando isso para todo
e qualquer alvo deste campo, sem restrição para obras cristalizadas e oficialmente reconhecidas. Para
Barros (2005) a História Cultural abrange enquanto meio de pesquisa, tanto os mecanismos de
produção quanto os de recepção. O autor aponta que esta última está diretamente atrelada a uma forma
de produção cultural. Em linhas gerais ambos fazem parte dos elementos das práticas culturais.
Desta forma, a História Cultural possui uma ampla abordagem de temas e estudos sobre
manifestações populares, como por exemplo: comportamentos, costumes, dentre outros aspectos das
distintas estratificações sócio-culturais. Neste sentido tem-se observado um importante crescimento do
número de fontes que passam a ser utilizadas, diversificando um pouco a metodologia realizada pelos
historiadores que até certo momento tinham no documento oficial, uma ferramenta fundamental para
verificar a verdade precisa de determinado contexto histórico. Atualmente, o conceito de verdade
absoluta tem perdido um pouco de seu espaço, uma vez que, essa questão tem sido refletida e revista,
em função de existirem mecanismos diferentes de interpretações, de momentos e fatos. O uso de
diversas fontes como fotografias, jornais, depoimentos, revistas, dentre outros, oferecem ao historiador
vários olhares enriquecendo a pesquisa sobre o objeto em análise.
O historiador Roger Chartier, que pertence à fase de declínio da História das Mentalidades, em
seu estudo sobre a História Cultural, utiliza os conceitos de práticas, representações e apropriação.
Em relação ao conceito de práticas, Chartier afirma, segundo Vainfas (1997) que é uma maneira
“própria de estar no mundo, significar simbolicamente um estatuto e uma posição”. (VAINFAS, 1997,
p. 154). O historiador francês afirma que o conceito de apropriação objetiva estabelecer uma história
social que se remete às interpretações, atuando às suas devidas determinações essenciais, das quais
para o historiador denotam seu caráter cultural. O conceito de representação é visto enquanto algo
que possibilite a percepção de uma matéria, de algo que na realidade não está presente. Assim,
observa-se a necessidade de abordar o estudo de Chartier neste trabalho, por conta de desenvolvermos
uma abordagem sobre perseguições em terreiros, locais onde é praticada a religião afro-brasileira, que
por sua vez se inclui neste caráter de representação da História Cultural. Neste sentido, tal conceito nos
permite observar várias interpretações que para Chartier (1988), é um conceito que reside em um nível
bem mais elevado em relação o das mentalidades.
A História Cultural francesa, nas décadas de 1960 e 1970, sofreu muitas críticas e segundo
Chartier (1988), foi interpretada enquanto uma história serial quantitativa, durante esse período a
história enquanto disciplina passava por crise intelectual, ficando ameaçada, uma vez que pertencia ao
grupo das disciplinas dominantes. Em meio à tentativa de algumas disciplinas literárias de fragilizar o
campo intelectual da história, houve respostas de alguns teóricos que procuraram realizar um debate a
partir da necessidade de utilização de outros objetos de estudo, para tanto, há um retorno aos primeiros
Annales da década de 1930, através do uso do estudo das ‘utensilagens mentais.’
Em relação ao campo de pesquisa da História Cultural, assim coloca Chartier (1988 p. 15):
As características da História Cultural assim definida, que concilia novos domínios de
investigação com a fidelidade aos postulados da história social, eram como que a
tradução da estratégia da própria disciplina, que visava a apropriação de uma nova
legitimidade científica apoiada em aquisições intelectuais que tinham fortalecido o
seu domínio institucional.
O historiador francês coloca ainda que a História Cultural tem como objetivo central à
identificação de uma realidade social através dos distintos lugares e contextos. Assim o autor aponta
para o uso das representações do mundo social, onde os interesses de um grupo geralmente estão
presentes no discurso ou na postura por ele determinados, ainda que as aspirações instituídas para
utilização das representações sejam imbuídas de um caráter universalizante.
Assim, Chartier (1988, p.17), aponta para o constante choque de interesses que existe no campo
das representações, pois assim como ocorrem conflitos de caráter econômico, os mecanismos sócioculturais também sofrem disputas. Esse processo acontece através da tentativa de imposição de valores
e conceitos de diferentes grupos sociais em demarcar a sua maneira de ver e interpretar o mundo.
Sobre essa questão dos conflitos sócio-culturais das diferentes classes, é necessário atentar para
outros estudos que abordam tal objeto. É o caso do historiador Carlos Ginzburg (Vainfas, 1997), que
destaca, sobretudo, o mecanismo de filtragem da cultura letrada pelas classes subalternas, uma vez que
as pessoas pelas quais integram essas classes remetem-se a um processo de adaptação às condições de
vida em que estão inseridas. Portanto, ainda que Ginzburg não seja o teórico que mais se aproxima de
nossa pesquisa, achamos importante destacar a proposta de seu estudo. O autor defende que o conceito
de Circularidade Cultural reside exatamente neste ponto em que cada estratificação social acolhe à sua
maneira, o seu meio de expressão cultural.
Deste modo, há semelhança neste conflito sócio-cultural no âmbito das representações
colocado por Chartier – com o processo de representação de valores e interpretações que cada classe
social se utiliza.
Em relação a essa questão dos conflitos sócio-culturais em que pese à questão das
representações culturais é necessário destacar que no Brasil, desde o processo de colonização, os
negros e suas expressões culturais sofriam sérias repressões das quais a Igreja Católica influenciava
bastante, essencialmente no que tange a religião, uma vez que era estabelecido pela classe dominante
um olhar etnocêntrico em relação aos cultos africanos.
Dessa forma, ainda que houvesse diversas maneiras de coibir tais práticas religiosas, os negros
se utilizavam de mecanismos que camuflavam o que eles estavam realizando. Eles mascaravam seus
rituais através da utilização de imagens de santos católicos, dando uma conotação de festa para que
não sofressem represálias, o que dentre outros aspectos propiciou a presença do sistema de práticas
doutrinárias heterogêneas – o sincretismo religioso. Deste modo, vários terreiros passaram a adotar ao
longo dos anos essas ações para não serem coibidos pelo Estado.
Assim afirma Mundicarmo Ferretti (2001, pp. 47-48) sobre as repressões aos cultos afrobrasileiros:
[...] a religião afro-brasileira foi vista na Colônia, no Império e mesmo depois da
Proclamação da República como feitiçaria e tornou-se objeto de grande perseguição
policial. A apregoada liberdade religiosa assegurada pela Constituição Republicana
não mudou muito a situação dos terreiros afro-brasileiros, pois, como o
curandeirismo continuou a ser enquadrado entre as contravenções penais, muitas de
suas práticas religiosas podiam ser facilmente apresentadas como ilegais.
Desta forma, vários estudiosos desenvolveram uma série de pesquisas com o intuito de que
houvesse um maior reconhecimento da religião afro-brasileira. De acordo com Mundicarmo Ferretti
(2001, p. 48) havia uma preocupação por parte desses teóricos em abordar o papel de destaque aos
cultos jeje - nagô no âmbito da literatura nacional, dos quais temos Nina Rodrigues, Arthur Ramos,
Edison Carneiro, Roger Bastide dentre outros.
Segundo a pesquisadora, Nina Rodrigues compartilhava da idéia de que o culto nagô era
de fato superior em relação às demais etnias, no entanto via o que era praticado nas casas de
culto como um problema psíquico, avaliando dessa maneira que a religião afro-brasileira não
deveria sofrer perseguição do Estado mediante batidas policiais nos terreiros, “por ser um
problema de saúde pública (...) e não criminal” (FERRETTI, M. 2001).
Além da idéia comum que os teóricos anteriormente citados possuíam em relação à
superioridade nagô sobre as outras etnias africanas, faz-se necessário apontar aspectos particulares do
estudo de cada um, organizado com riqueza de detalhes na obra Encantaria de Barba Soeira – Codó,
capital da magia negra? Da antropóloga Mundicarmo Ferreti.
Para aquela pesquisadora, além da supremacia cultural de alguns povos, sobretudo dos nagôs,
Nina Rodrigues defende ainda que o candomblé da Bahia está a frente da macumba do Rio de Janeiro,
ainda que a mesma seja encarada como uma sobrevivente da cultura dos bantos. Segundo a
antropóloga, Arthur Ramos, assim como Nina Rodrigues, afirma que a religião afro-brasileira
constitui-se enquanto um estado de patologia de seus praticantes (FERRETI, M. 2001, p. 151).
É interessante atentarmos para o discurso de Nina Rodrigues quando ele vai de encontro com as
investidas da polícia nos terreiros, pois para o pesquisador essa é uma questão para ser adotada através
dos trâmites criminalistas, uma vez que enquanto médico, interpreta o transe como distúrbio
patológico, idéia comum a Arthur Ramos.
De acordo com Edson Carneiro – que não concorda com os autores acima citados em relação
ao transe – esse momento de sonambulismo que ocorre nos cultos, deve-se à relação direta com as
forças da natureza, e isto se deve ainda à coreografia e musicalidade desenvolvida ao longo das
manifestações. Um dos mais importantes representantes da defesa da liberdade religiosa dos negros
esteve, em 1937, à frente de um movimento em prol da autonomia das práticas religiosas afrobrasileiras. Assim coloca Mundicarmo Ferretti (2001, p. 49) sobre a participação de Edson Carneiro no
referido movimento:
Em 1937 (...) liderou um manifesto encaminhado ao governador pelos participantes
do II Congresso Afro-Brasileiro (RAMOS, 1971, PP.199-200), solicitando “o
reconhecimento da maioridade das seitas africanas do Estado e o seu conseqüente
direito a se dirigirem por si mesmas”, com base na Constituição de 1934, que
assegurava a liberdade religiosa, e no exemplo do Estado de Pernambuco, onde a
religião dos negros não estava sujeita ao controle policial. No manifesto, as referidas
‘seitas’ foram apresentadas como herança intelectual africana, que em nada
ameaçavam a moral ou a ordem pública (artigo 113 da Constituição Federal), como
fora atestado por Nina Rodrigues, por Arthur Ramos e pelos intelectuais que
participaram do
I e II Congresso Afro-Brasileiro (1934 e 1937) e que expressavam os altos
sentimentos de dignidade humana que elas despertavam nas pessoas sobre quem
influíam.
Carneiro, formado pela faculdade de Direito da Bahia em Ciências Jurídicas e Sociais como
podemos observar, foi também um grande colaborador da religião afro-brasileira desenvolvendo uma
série de estudos sobre a cultura dos negros.
Outro importante pesquisador dos estudos sobre a religião africana foi Roger Bastide,
antropólogo que contribuiu de maneira singular às ciências sociais, tendo o negro na sociedade
brasileira como foco de suas pesquisas, onde abrangem ainda outras regiões do mundo como a
América e a África. O estudioso busca analisar as questões étnicas e culturais dentre outros aspectos da
população negra. É importante destacar ainda, que o pesquisador foi pioneiro em uma série de estudos
sobre o posicionamento etnocêntrico de algumas sociedades em relação a hábitos e costumes de povos
distintos. Mundicarmo Ferretti (2001) cita Bastide e afirma que no Brasil, o antropólogo desenvolveu
pesquisas em vários estados como Bahia, São Paulo, Belém, Maranhão visitando inclusive a capital –
São Luís (FERRETI, M. 2001, p. 51).
Em face do diverso campo de estudo do pesquisador sobre o negro e essencialmente sobre a
questão da religiosidade, destaca-se a distinção que realizava entre o candomblé do nordeste e a
macumba da região sudeste. Para Bastide (1971), a primeira tinha características de um culto puro, isto
é, aspectos de uma religião verdadeira, enquanto que a última era vista por ele como um culto
degenerado por ter adicionado à religião africana influência de elementos de outras práticas
doutrinárias.
No que tange o processo de resistência dos negros às coibições do Estado às suas práticas
culturais, é possível notarmos em Bastide uma abordagem sobre as diversas dificuldades que esses
sofreram e ainda sofrem para manter viva sua tradição e neste aspecto colocando a religião enquanto
foco de suas abordagens. No primeiro volume da obra As Religiões Africanas no Brasil, o sociólogo
francês separa um capítulo para abordar a questão das sobrevivências religiosas africanas, onde se
percebe o quanto os africanos e seus descendentes precisam lutar para garantir a manutenção de suas
práticas culturais. As representações culturais dos negros durante muito tempo sofreram uma dura
pressão dos brancos, essencialmente durante o processo de colonização e nos séculos XVIII e XIX, o
peso do olhar etnocêntrico dos brancos que por não compreenderem a cultura do outro, atribuíam
conceitos e interpretações pejorativas das práticas afro-descendentes.
Neste sentido, é necessário apontarmos para a noção de cultura na qual se compreende
enquanto conjunto de experiências humanas, conhecimentos e costumes adquiridos e acumulados
pelos povos ao longo do tempo, faz-se necessário apontar ainda que as tradições e os valores que
perpassam uma longa trajetória cronológica implicam em particularidades de cada grupo social, os
regionalismos e as distinções devem ser atentamente observados.
Assim, ao pensarmos na questão da tentativa da religião católica em se sobrepor à africana,
percebe-se uma recepção sim por parte dos negros, mas isso não implica em total substituição dos seus
cultos, de suas doutrinas. Em relação a isso, assim coloca Bastide (1971 p. 181): “À sombra da Cruz,
da capela do engenho e da igreja urbana, o culto ancestral continuou, o que levou Nina Rodrigues a
afirmar, no fim do período escravista - a ilusão da catequese”.
É do conhecimento de grande parte da sociedade brasileira sobre o processo de resistência
cultural dos negros ao longo do tempo, uma vez que a identidade de um povo é algo inerente aos
diversos grupos que compõem uma sociedade. Os elementos étnico-culturais, os liames das diferenças,
as características adotadas tradicionalmente, as mediações simbólicas e todo aparato cultural do
africano e de seu descendente - possui um grande peso de valor que o permite ser único,
essencialmente devido sua carga identitária que viabiliza o seu diferencial entre os demais povos, entre
os demais grupos sócio-culturais.
Assim coloca SOARES (2006, p.124) sobre essa questão:
A identidade (...) é o desejo de estabilidade, continuidade, repetição tautológica que
procura criar permanência, previsibilidade, ordem, controle do indeterminado,
contenção das oscilações na e pela forma, maneira de modular o jogo entre o
indeterminado e a estabilidade, entre o ex e o istir.
No que se refere às questões de tradição de práticas folclóricas, culturais; o modo cronológico
com que o indivíduo se desenvolve no seu âmbito social, o autor direciona a uma necessidade do
continuísmo das comunidades em suas representações culturais, como um mecanismo mantenedor de
seus elementos identitários. Neste sentido, compreende-se que os elementos com carga identitária que
constituem determinados aspectos culturais de um povo, de uma nação, perpassam por uma bagagem
simbólica relevante, onde a disposição de normas definidas nos modos de comportamento - possuem
uma relação independente entre si, uma vez que a necessidade do coletivo varia de acordo com o peso
de cada elemento elaborador de sua cultura.
Desse modo, seria interessante pensarmos até que ponto a sobreposição de uma cultura em
relação à outra de fato ocorre. Como exemplo, temos a própria religião católica no contexto da
colonização do Brasil e ao longo dos séculos, com seu posicionamento dominador que nesse aspecto
procurou catequizar os índios, realizou o batismo nos africanos como se esses dois povos não
obtivessem suas próprias categorias simbólicas, culturais, sua própria religião, seus mecanismos
particulares de adoração aos seus deuses. De fato, ainda que a igreja católica enquanto conhecedora da
existência prévia das culturas negra e indígena, em função do caráter dominante que perpassa dentro
do olhar europeu, sente a necessidade de mostrar e impor a sua cultura, a sua religião vista pela mesma
como superior em relação à dos povos que se encontravam no território brasileiro.
O sincretismo religioso neste aspecto pode ser apontado como um tipo de entrosamento
cultural, pois é presente nesse processo uma relação e fusão entre os elementos religiosos das distintas
culturas branca e negra, uma vez que o contato entre si propicia alguns efeitos, resultados de uma
simbiose étnico - cultural.
A História Cultural abrange essa abordagem do conflito que ocorre entre as culturas
antagônicas, além de perceber a inúmera existência de universos culturais que ora podem interar-se,
ora podem confrontar-se. Sobre isso, José D’Assunção Barros (2006), coloca o multifacetado campo
de estudo da cultura no qual, de acordo com o autor, recebe inspiração do termo polifônico com o
Materialismo Histórico, onde a abrangência daquele campo realiza dentro das ciências humanas um
estudo sobre essa questão da pluralidade de ‘práticas’ e ‘representações’ adotadas por mecanismos dos
sistemas simbólicos de cada grupo sócio - cultural. Assim coloca Barros (2006 p.73):
Pensar a Cultura em termos de polifonia é buscar as suas múltiplas vozes, seja para
identificar a interação e o contraste entre extratos culturais diversificados no interior
de uma mesma sociedade, seja examinar o diálogo ou o ‘choque cultural’ entre duas
culturas ou civilizações distintas.
No Brasil a magia praticada pela religião africana nos terreiros foi duramente combatida, e
como vimos desde o período colonial e com a República foi criado pelo Estado, mecanismos legais de
proibição e punição à feitiçaria. De acordo com Yvonne Maggie (1992) o Código Penal de 1890
estipulava em três artigos (156, 157 e 158) a repressão através do controle policial às práticas da
religião afro-brasileira.
Embora o processo de coibição a essas práticas tenha sido bastante intenso, houve uma forte
expansão da religião africana nas regiões brasileiras.
De acordo com Bastide (1971), a demarcação geográfica dos cultos afro-brasileiros pode se
verificar de acordo com a influência de determinadas etnias. Aqui no Maranhão houve hegemonia
daomeana, enquanto da Amazônia ao Pernambuco o indígena demarcou a sua predominância, havendo
inclusive um processo de integração do negro aos cultos indígenas. No estado do Pará e na região
amazônica predominou, segundo Bastide, a Pajelança (embora no primeiro haja forte presença do
Tambor de Mina), no estado do Piauí o Encantamento e nas outras localidades o Catimbó liderava a
religião popular.
Em relação ao Catimbó, o seu esboço tem origem em um culto conhecido como santidade,
ainda no período colonial, onde havia confissões e denúncias de baianos e pernambucanos no Tribunal
da Santa Inquisição. Aliado a alguns elementos da cultura indígena como cantos, coreografias e uso do
tabaco havia também dentro do culto, ressentimentos ora do escravo contra o seu senhor, ora do
homem da terra que via seu espaço tomado pelo colonizador. Nessa abordagem é possível colocar o
Catimbó sob o ponto de vista sociológico como um culto de categoria messiânica. (BASTIDE, 1971,
p. 244). Em função das perseguições o culto antes era chamado de santidade que com o passar dos
anos foi extinto, no entanto através da simbiose do catolicismo com a cultura dos índios permanece
vivo o culto aos caboclos através do Catimbó.
É necessário abordar que o presente trabalho não tem objetivo de desenvolver análise ou
abordagem etnográfica sobre as práticas religiosas afro-brasileiras realizadas em São Luís, cidade na
qual está delimitado nosso recorte espacial, porém sentimos a necessidade de fazermos um rápido
panorama dessa influência religiosa no Brasil, sem, portanto, entrarmos no âmago de cada região.
No que diz respeito à influência dos iorubas em alguns estados brasileiros é interessante
apontarmos para a produção de diversos trabalhos realizados por uma gama de pesquisadores. Neste
sentido a prática religiosa afro-brasileira em estados como Alagoas, Sergipe e Pernambuco, ficou
demarcada pelo Xangô, enquanto na Bahia predominou o Candomblé. Para Bastide (1971), há certa
unidade entre esses dois cultos o que não nos possibilita afirmar que não haja distinções entre os
mesmos, distinções das quais não citaremos no momento.
Na região central do país houve um forte processo de mistura de algumas doutrinas religiosas,
em função da presença da indústria e de uma vida de hábitos urbanos. Surgiu a Macumba com
elementos de várias religiões: indígena, candomblé, espiritismo além do catolicismo popular. Em meio
a este conjunto de doutrinas heterogêneas surge a Umbanda no início do século XX, na qual agrega
muitos seguidores de várias classes sociais, recebendo destaque na classe média, onde os seus
membros procuram através de congressos e discussões, proteção legal para legitimar o culto.
No Rio Grande do Sul, a conservação da religião africana define-se enquanto batuque, culto
que desde a fase imperial do país chegou a adquirir dupla categoria: ora de divertimento, ora enquanto
cerimonial fúnebre. Havia vários registros na polícia do Rio Grande do Sul de batuques no final do
século XIX e início do XX por motivos de perturbação da ordem pública, o que nos permite verificar a
intolerância religiosa naquele Estado. De acordo com o antropólogo, ao longo dos anos o caráter dúbio
do batuque passou por um processo de mudanças. Podemos citar o axexê, cerimônia de caráter fúnebre
que também ocorre no Norte como exemplo deste processo. As características de iniciação de seus
adeptos possuem diferenças em relação ao que há na Bahia, embora haja presença de orixás também
nessa região, mas com distinções étnicas das nações.
Em relação ao nosso estado - o Maranhão - a resistência africana, essencialmente em São Luís
ocorreu pela influência daomeana, havendo ainda a presença de entidades indígenas, caboclas,
estreitando as fronteiras entre o Catimbó e o Tambor de Mina. (BASTIDE, 1971).
Em que pese o tradicionalismo do terreiro mais antigo e fundado por africanos no século XIX,
está à Casa das Minas, local que despertou interesse de muitos antropólogos e pesquisadores no geral,
dos quais produziram importantes trabalhos sobre essa sobrevivência daomeana no Maranhão. É o
caso de Nunes Pereira, Costa Eduardo, Sérgio Ferreti, dentre outros que colaboraram para a produção
de estudos afro-brasileiros sobre este terreiro.
O Tambor de Mina enquanto culto pioneiro no Maranhão tendo em vista a presença até os dias
atuais das centenárias Casa das Minas e Casa de Nagô, não é a única prática religiosa afro-descendente
no território maranhense. Com um grande número de terreiros instalados em vários lugares, existem
ainda outras práticas de culto como é o caso do Terecô, com forte demanda na cidade de Codó, além
de práticas da pajelança, da Umbanda dentre outras manifestações que possuem algumas variações
sincréticas.
Assim, pudemos fazer uma breve abordagem histórico-social dos fenômenos religiosos afrobrasileiros com seus limites de espaço geográfico, isto é, vimos de maneira suscinta às influências da
religião afro em alguns lugares do Brasil e deste modo, é possível abordar a questão da intolerância
religiosa que ao longo dos anos viabilizou coibições dos órgãos federais aos cultos afro, demonstradas
através do próprio código penal do país no início da república. Um exemplo claro disso são os vários
registros nas delegacias de pessoas acusadas de praticar magia, curandeirismo, ou feitiçaria, termos
constantemente direcionados às práticas da religião afro-brasileira.
Uma outra maneira bastante evidente do preconceito a esses cultos são as matérias veiculadas
pela imprensa através dos jornais, onde facilmente era encontrado algo sobre o assunto, isto até
meados da década de 1950 pode ser constatado. Usamos como fonte para essa afirmação o Jornal
Pequeno, periódico usado em nossa pesquisa por evidenciar em suas matérias tais assuntos, dando
grande destaque em suas páginas que normalmente quando eram sobre os cultos afro-descendentes,
estavam nas páginas policiais.
Assim podemos constatar isso na publicação do dia 29 de outubro de 1952 do Jornal Pequeno:
MACUMBEIROS
Recolhidos ao xadrez
Às 11 horas da noite de ontem, a Policia recebeu denuncia de que havia uma
pagelança funcionando abertamente na Floresta, com grande incomodo para o socego
publico.
Dando uma batida no local indicado, a policia apurou que a denuncia era bem
fundamentada.
Na casa do candomblé, as autoridades encontraram 18 assistentes, entre homens e
mulheres, além de José das Neves, proprietário da casa; Pagé chefe Benvindo Santos
que no momento estava atuado com o Caboclo da Pedra Fina, a Sra. Matildes Pereira
e Zulmira Valadão. Na casa havia 3 velas acesas, sendo uma no fundo do quintal,
uma na varanda e uma atráz da porta, esta com o objetivo de impedir a entrada de
estranhos.Havia um altar bem enfeitado, além de muita cana.
Segundo apuramos, José Neves e Benvindo foram presos. As mulheres ficaram
detidas.
1.1 Opressão e Resistência – Processo Histórico das perseguições aos terreiros
Embora já se tenha falado e escrito bastante e ainda se precise falar a respeito da
intolerância sofrida pelas religiões afro-brasileiras (Batuque, Candomblé, Jarê,
Macumba, Tambor de Mina, Terecô, Xangô e outras), não se pode esquecer que elas
conquistaram elevado grau de aceitação e que a perseguição a terreiros é hoje
repudiada pela maioria da população e pode ser punida em nome da lei. Não podemos
afirmar, no entanto, que essas religiões tenham no Brasil, o mesmo “status” que o
catolicismo, que além de já ter sido a religião oficial e obrigatória do país, nos
períodos colonial e imperial, foi imposto pela catequese aos índios e aos escravos
africanos. Não podemos também dizer que elas tenham deixado de ser encaradas por
muitos como inferiores (“irracionais ou primitivas”) e que hoje são tão respeitadas
quanto às outras religiões existentes no país. Mas podemos afirmar que, no Brasil, o
reconhecimento e a aceitação das religiões de raízes africanas têm crescido ano a ano,
embora muito tenha ainda que ser feito para que elas sejam plenamente
respeitadas.(FERRETTI, M.2004, p.19).
O Brasil é um país multifacetado de culturas, a formação do povo brasileiro explica esse amplo
leque de representações simbólicas em que o índio, o negro e o branco protagonizam suas distintas
concepções e pontos de vista, de entender e viver no mundo.
No Maranhão, essa multiculturalidade também está presente nos mais diversos setores
culturais. No campo religioso às práticas culturais denotam certa predominância no âmbito das
camadas populares, onde os cultos afro e a influência do catolicismo popular, “amenizam as
dificuldades da sua realidade social e os aproximam do sagrado, metafísico, com os rituais nos
terreiro” (NUNES, 2006, p. 9). Embora a religião afro-descendente seja uma das mais fortes
demonstrações da identidade cultural dos negros, ela tem passado por um longo processo de
resistência, uma vez que a prática dessas e outras manifestações como o espiritismo, por exemplo,
foram por muito tempo considerados atos ilegais, logo, iam de encontro à ordem pública.
Iremos realizar uma abordagem do processo de perseguição aos terreiros de culto afro, e antes
de nos direcionarmos para a pesquisa em São Luís, faremos breves considerações sobre esse tema em
outros lugares como o estado de Alagoas, por exemplo.
A priori iremos abordar de maneira sucinta o processo histórico de resistência dessas
manifestações religiosas ao longo dos anos.
Segundo Yvonne Maggie (2005, p.36), desde a promulgação do Código Penal de 1890 e ao
longo do século XX, houve denúncias de muitos casos de pessoas que eram acusados de praticar a
magia para fins ilícitos, defrontando a moral da sociedade da época. Neste contexto, muitos eram
acusados de macumbeiros, maus espíritas, ou pais-de-santo, e eram ainda, submetidos ao cárcere, tal
fato, de acordo com a pesquisadora, era comum em muitos estados. Maggie (2005, p. 36) infere que os
litígios criminais instaurados a partir do artigo 157 do Código Penal, demonstra o quanto à sociedade
deslumbrava-se com a crença na magia. Por conta disso, vários espaços museológicos do Brasil inteiro
possuem alguns apetrechos oriundos de terreiros que sofreram invasões da policia e
conseqüentemente, a subtração de muitos de seus pertences simbólicos dos rituais.
Os encalços contra os terreiros acionados pela polícia, assim como a intolerância e o
preconceito aos cultos afro de maneira geral, de fato, não foram acontecimentos de uma só localidade
do país, vários estados da Federação sofreram essas perseguições. A literatura nos revela a freqüência
desses atos através de diversas obras, artigos, dissertações, teses e muitas outras produções
bibliográficas atentando para essa questão sócio-cultural. Em Medo do Feitiço: relações entre magia e
poder no Brasil, de Ivonne Maggie, é possível verificar uma série de processos provenientes de
denúncias feitas contra os praticantes do culto afro. De acordo com a autora, a idéia central da obra é
“investigar as relações entre a crença na magia benéfica, as acusações de feitiçaria e charlatanismo e os
mecanismos reguladores dessas acusações”. (MAGGIE, 1992, p. 22).
A obra revela que a sociedade brasileira desde os tempos de colônia direciona elevada atenção
para a crença na magia, propiciando assim um jogo de elementos imaginários em torno dos poderes de
quem exercia essas práticas. Para tanto, para algumas pessoas, essa crença ocorre em função do uso
consciente ou não desses poderes, pelos indivíduos que tem o dom de usá-los para muitos fins, tais
como: realizar cura de doenças, arrumar marido, causar doença ou mesmo morte ao inimigo, abrir os
caminhos para o trabalho, dentre outros aspectos que perpassam essa ponte maniqueísta dos trabalhos
bons e ruins realizados pelos seus autores. Tais autores comumente encontrados em tendas de
curandeiros, terreiros, centros espíritas, dentre outros. (MAGGIE, 1992, p. 22).
Diante de tantas ações possíveis no seio das práticas da magia, o Estado passou a intervir no
combate aos feiticeiros através de mecanismos reguladores pautados no Código de 1890. Maggie
(1992) aponta o período de 1890 a 1940 como o momento mais intenso das repressões aos terreiros,
justificando para isso a mudança importante que houve nesse Código, essencialmente devido aos
artigos 156, 157 e 1581, os quais formulam energética coação aos curandeiros, feiticeiros,
macumbeiros, espíritas e umbandistas.
Embora houvesse repressão aos cultos afro, Maggie (1992, p.24) apontando Beatriz Góis
Dantas, afirma que existiu proteção de intelectuais da elite local, principalmente aos nagôs puros, que
foram isentos da acusação de impuros por estarem alçados ao status de religião, logo, liberados das
batidas policiais. (MAGGIE, 1992, p.24).
No bojo da questão das coibições aos terreiros em todo o Brasíl, Maggie (1992) discorre vários
processos criminais instaurados por atos ilícitos relativos aos artigos 156, 157 e 158 do Código Penal
anteriormente citado, os processos que são demonstrados na obra, eram do período de 1890 a 1945 e
ocorreram no Rio de Janeiro.
A autora analisa, que a maioria dos processos tratavam da caça aos feiticeiros, segundo ela não
havia uma tentativa por parte das forças estaduais de exterminar com as práticas da magia, mas de
identificar os praticantes da magia maléfica, pois estes eram vistos como criminosos e tinham que
responder e pagar junto à justiça, seus atos vistos enquanto nocivos à sociedade.
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Art. 156 – Exercer a medicina em qualquer dos seus ramos e a arte dentária ou farmácia: praticar a homeopatia a
dosimetria, o hipnotismo ou magnetismo animal, sem estar habilitado segundo as leis e regulamentos.
Penas – prisão celular por um a seis meses e multa de 100$ A 500$000.
Parágrafo único – pelos abusos cometidos no exercício ilegal da medicina em geral, os seus autores sofrerão além das penas
estabelecidas, as que forem impostas aos crimes a que derem causa.
Art. 157 – Praticar o espiritismo, a magia e seus sortilégios, usar talismãs e cartomancias para despertar sentimentos de
ódio e amor, inculcar cura de moléstias curáveis ou incuráveis, enfim para fascinar e subjugar a credulidade pública.
Penas – prisão celular por um a seis meses e multa de 100$ a 500$000.
§1° se por influência ou em conseqüência de qualquer desses meios resultar ao paciente privação ou alteração temporária
ou permanente das faculdades físicas.
Penas – prisão celular por um a seis meses e multa de 200$ a 500$000.
§2° em igual pena, e mais na privação do exercício da profissão por tempo igual ao da condenação incorrerá o médico que
diretamente praticar das artes acima referidas ou assumir responsabilidades por elas.
Art. 158 – Ministrar, ou simplesmente prescrever como meio curativo para uso interno ou externo e sob qualquer forma
preparada, substância de qualquer dos reinos da natureza fazendo, ou exercendo assim o ofício
Um outro importante fato de perseguição a terreiros é o caso que ocorreu no ano de 1912, em
Maceió, capital do estado de Alagoas. Em função de uma conflituosa relação política local, as casas e
tendas de culto afro sofreram um terrível massacre. Uma campanha persecutória da Liga dos
Republicanos contra o governador Euclides Malta, freqüentador de terreiros, foi o suficiente para uma
simultânea destruição de casas de culto afro e de seus pertences, fundamentais para a manutenção da
manifestação religiosa. (NEVES, 2005. p. 25).
Segundo Ulisses Neves (2005, p.27), Euclides Malta chegou a receber o título de papa do
xangô alagoano, por conta de sua forte simpatia com os praticantes daquela religião. O pesquisador
(2005, p. 27) afirma que comentavam que um dos terreiros mais freqüentados pelo político era o de
Tia Marcelina, um dos mais antigos de Maceió.
De acordo com Neves (2005, p. 28), poucos dias antes de Euclides Malta, então governador,
ser deposto, manteve contato com a mãe-de-santo com o intuito de discutir a falta de eficiência dos
trabalhos realizados por Tia Marcelina, uma vez que a oposição continuaria avançando, portanto o
político exigia mais eficácia em seus “afazeres”.
Dos diversos terreiros invadidos durante o período carnavalesco do ano de 1912, em Maceió, o
de Tia Marcelina que para muitos era a mãe-de-santo de Euclides Malta, não teve sorte diferente, na
ocasião da invasão à mãe-de-santo foi duramente agredida fisicamente por policiais, chegando a óbito
dias depois. Muitos dos terreiros que foram invadidos naquele episódio tinham seus filhos, mães e
pais-de-santo ainda em transe mediúnico no momento das invasões, o que revela o teor de violência
dos repressores.
Neste contexto, o “quebra-quebra” não esteve restrito aos terreiros da capital, atingindo
também cidades do interior daquele estado como Pratagi, Atalaia, Santa Luzia do Norte, dentre outros.
Por vários dias ao longo do massacre, os manifestantes passeavam pelas ruas mostrando as
roupas dos pais e mães-de-santo, as imagens e os objetos ritualísticos de um modo geral dos terreiros,
que eram levados até a sede da Liga dos Republicanos onde servia de motivo de zombaria e escárnio
da população. A principal sala daquela sede passou a ser museu, tendo em vista a grande quantidade de
peças que despertava a curiosidade da parte da população. (NEVES, 2005, p. 31)
Diante dessa forte repressão ficou mais raro, anos depois, se ouvir falar em maracatus no
carnaval de Alagoas, uma vez que os seus mestres tiveram receio por serem confundidos com
babalorixás2, então, deslocaram-se para estados vizinhos como Rio de Janeiro e Bahia para fugir das
perseguições.
De um modo geral, as representações culturais de influência africana, em função desse violento
episódio, passaram a diminuir consideravelmente no Estado de Alagoas.
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Babalorixás são os sacerdotes responsáveis pelos terreiros de candomblé, das diversas atribuições dos babalorixás, está a
consulta aos orixás através do jogo de búzios.
Assim assegura Neves (2005, p. 32) acerca dessa alteração sócio-cultural:
As manifestações populares integradas por negros passaram a ser vistas com certa
desconfiança, principalmente os xangôs, os quais continuaram a ser desenvolvidos
pelos poucos remanescentes daquelas antigas casas, que insistiram em permanecer
mantendo no local suas atividades religiosas, mais temendo as punições dos orixás do
que das autoridades policiais. Resultou daí essa nova modalidade de rito mais
discreta, reservada e sem a exuberância de outrora, a qual convencionou chamar de
“Xangô rezado baixo”, em função de dispensar o uso de tambores e zabumbas.
Diante do medo das forças repressoras advindas das autoridades do estado, houve de fato,
severa alteração nos rituais dos xangôs de Alagoas, aquelas humildes pessoas deixaram de usar
alguns apetrechos de ampla serventia nas manifestações religiosas, passando a ter em suas salas,
oratórios com imagens inofensivas de santos católicos, mas que eram consagrados pelos fiéis em
língua africana. O uso de instrumentos musicais e as representações coreográficas deixaram de
acontecer, e os rituais passaram a demonstrar características de uma simples novena, sem causar
qualquer tipo de suspeita as autoridades, tal mudança nos permite compreender o porquê da
denominação “Xangô rezado baixo”. (NEVES, 2005, p. 33).
A literatura local, de acordo com Neves (2005, p. 33), não revelou devida atenção ao caso de
1912, pois não há muitos esclarecimentos acerca do terrível acontecido.
Diante disso, assim aborda Neves (2005, p.33) sobre a insensibilidade dos pesquisadores da
região sobre a repressão aos terreiros na “Operação Xangô3”:
A intolerância religiosa aos cultos de procedência africana como percebemos, possui
seus diversos casos de perseguição em praticamente todas as regiões do Brasil, o caso
de Alagoas nos remete a triste condição dos praticantes do Xangô, os quais sofreram
penalidades não por sua religião causar estranheza aos mais conservadores, mas
principalmente por conta de um contexto sócio-político relativo a uma divergência
partidária e a luta pelo poder de Alagoas.
A presença do governador Euclides Malta em terreiros com o objetivo de estabilizar sua
condição na política e afastar a oposição de seus caminhos seria o fator mais relevante para a invasão
aos terreiros Lamentavelmente, a condição de fragilidade dos Xangôs diante das autoridades
inviabilizou qualquer tipo de retaliação aos causadores de tamanha violência Para tanto, as
circunstâncias históricas que a religião afro precisou enfrentar ao longo do tempo, se utilizando de
paralelismos com a religião católica (que durante muito tempo foi à religião oficial do país) através
do uso de santos dessa religião, assim como a utilização do calendário católico de homenagem aos
santos, tudo isso com o intuito de camuflar o culto as divindades africanas.
3
“Operação Xangô”: uma etnografia de perseguição aos terreiros de Maceió, em 1912, é o nome do artigo idealizado pelo
Doutor em Antropologia Ulisses Neves Rafael, em que realiza uma abordagem acerca do processo de perseguição aos
terreiros de xangô no estado de Alagoas, direcionando sua análise para a cidade de Maceió.
2. A RELIGIÃO AFRO-BRASILEIRA EM SÃO LUÍS
Os estudos Afro-Brasileiros possuem uma tradição
relevante no que tange o número de pesquisadores que ao
longo dos anos buscaram desenvolver importantes trabalhos
acerca dos aspectos étnico-culturais dos africanos e de seus
descendentes. No Maranhão essa tradição teórica e
metodológica é também observada através de importantes
estudos que procuram analisar elementos e signos da
cultura negra presente no Estado, no entanto nosso trabalho
procura delimitar São Luís especificamente, por ser nesta
cidade o foco de nossa pesquisa.
Neste sentido é possível notar que em relação aos trabalhos publicados acerca dos terreiros de São
Luís, a matriarca4 Casa das Minas por ser uma das mais antigas e tradicionais é a mais procurada pelos
pesquisadores de um modo geral.
É importante destacar que não é pretensão de nosso trabalho realizar uma abordagem etnográfica
sobre os terreiros e casas de culto afro de São Luís, uma vez que para isso seria necessário um
conhecimento empírico das festas, dos rituais, de procedimentos específicos de cada terreiro, uma vez
que, cada um possui o seu universo particular. Além de outros aspectos que viabilizariam uma abordagem
mais abrangente e complexa das manifestações religiosas desses locais.
Deste modo, diante de algumas noções e conceitos da corrente teórica que oferece espaço para
trabalhos como este, a Nova História Cultural viabiliza através de seus estudos, que abordemos alguns
aspectos culturais da religião Afro-Brasileira, logo, daremos destaque neste segundo capítulo a alguns
aspectos do cenário ludovicense no âmbito dos cultos de descendência africana.
Diante disso, partimos agora para uma breve consideração de terreiros de São Luís que, de acordo
com Maria do Rosário Santos e Manoel dos Santos Neto (1989, p.19), estão divididos em três categorias.
Primeiramente os autores apontam para os terreiros de mina que possuem lideranças de pessoas que estão
atreladas aos terreiros mais tradicionais como o Terreiro do Egito, (já extinto) da Turquia e a Casa de
Nagô, esta última permitiu que fossem fundadas diversas outras casas de culto na capital e no interior,
sendo responsável por grande número de iniciados no Tambor de Mina. Um segundo conjunto dos
terreiros de São Luís que podemos destacar, são os que se definem enquanto Mina, procurando inspiração
dos terreiros mais antigos, no entanto recebem forte influência da Umbanda em seus rituais. Em relação
ao primeiro aspecto citado como a Casa de Nagô, o Terreiro do Egito e o da Turquia, são intitulados ainda
enquanto terreiros de raiz e certamente neste título possuem mais prestígio em relação às casas mais
4
A Casa das Minas e a Casa de Nagô são denominadas enquanto matriarcas por pesquisadores, pelo fato de possuírem a
tradição de serem lideradas por mulheres.
recentes. E finalmente temos aqueles terreiros que se assumem enquanto terreiro de Umbanda, podendo
ocorrer em alguns casos de esses não atribuírem muito valor e prestígio ao Tambor de Mina.
2.1. José Cupertino e a introdução da Umbanda no Maranhão
A dinâmica das tendências dos terreiros de São Luís passou ao longo dos anos por um processo de
mudanças, tendo em vista que nas primeiras décadas do século XX a Umbanda desponta como uma
religião que já nasce diante de um processo sincrético e de branqueamento, pois em seu conjunto de
adeptos há muitas pessoas de camadas médias da sociedade. Além disso, essa religião procura se definir
como uma doutrina genuinamente nacional por possuir características e muitos símbolos da religião
africana, indígena e católica, além da doutrina do espiritismo kardecista que está bastante presente nessa
religião.
A Umbanda mescla um conjunto de signos das religiões populares como a Macumba - oriunda do
Rio de Janeiro – o Candomblé e o “baixo-espiritismo”5, submetendo-os a um processo de depuração,
reinterpretando-os dentro da lógica do Kardecismo. (MAGNANI, 1986). Desenvolvendo seus primeiros
passos nas décadas iniciais do século XX com Zélio de Morais – seu fundador na cidade do Rio de
Janeiro, a Umbanda propagou-se rapidamente no território brasileiro e chega ao Maranhão por meio de
José Cupertino na década de 1950, neste sentido a Umbanda adquire mais respaldo legal em relação a
outros cultos como a Pajelança, por exemplo.
De acordo com Ferreti, M e Santos (2001, p.20), 6 é possível perceber que José Cupertino deixou
grandes contribuições para a religião Afro-Brasileira através de depoimentos de pessoas deste meio que
normalmente demonstram respeito às questões idealizadas por aquele umbandista que esteve à frente da
fundação da Federação de Umbanda e Cultos Afro do Maranhão, no ano de 1964 - instituição pela qual
oferece suporte legal e muito colabora com os terreiros a ela vinculados.
No que tange as várias ações efetivadas por Cupertino, à festa em louvor a Iemanjá que ocorre na
praia do Olho D’água impreterivelmente no dia 31 de Dezembro em São Luís foi organizada e
desenvolvida por ele na década de 1960, e até os dias atuais, é um dos eventos mais importantes para a
Religião Afro-Brasileira de São Luís, essencialmente para os terreiros de Umbanda de todo o Estado. No
quarto capítulo abordaremos um pouco mais sobre essa manifestação.
Deste modo, de acordo com o atual presidente da Federação de Umbanda e Cultos Afro do
Maranhão – Generval Martimiano Moreira Leite – mais conhecido como Astro de Ogum, aquela é uma
manifestação muito importante, se não a mais tradicional daquela instituição. Segundo ele, é uma festa
5
O baixo-espiritismo é um termo depreciativo para identificar a macumba, é identificado ainda através da presença de
espíritos de velhos escravos e indígenas, que aos poucos irão constituir as categorias de pretos -velhos e caboclos e neste
sentido, integram o quadro mais geral da macumba (prática religiosa afro-brasileira com predominância no Rio de Janeiro),
distanciando-se da versão erudita do espiritismo kardecista. (MAGNANI, 1986, p.24).
6
FERRETTI, Mundicarmo e SANTOS, Rosário. José Cupertino na Religião Afro do Maranhão. Boletim da Comissão
Maranhense de Folclore, n° 20, Agosto de 2001.
que precisa de muitos recursos financeiros, e que nem sempre conta com a ajuda do governo Estadual ou
Municipal.
Sobre a questão dos custos da festa de Iemanjá na praia do Olho D’água assim coloca Astro de
Ogum: “[...] a festa é realmente cara, por causa das caravanas que vem dos interiores, aluguel de
transportes, alimentação, vasos e envolve o estado todo”.
Ainda no período da década de 1950, como conta Sérgio Ferretti,7 e Lindoso,8 José Cupertino
Araújo fundou no bairro do João Paulo a Tenda Espírita Deusa Iara. Naquele tempo, havia um forte
movimento de repressões do Estado acionadas por policiais nas casas de culto Afro-brasileiros, que no
Maranhão inclui às praticas de Cura e Pajelança. E nos dias atuais, é possível verificar ainda que
esporadicamente um registro ou outro em tele-jornais contra terreiros.
A respeito das perseguições policiais em terreiros, assim coloca Santos e Santos Neto (1989,
p.117):
Sabe-se, ainda que os períodos mais fortes da repressão foram os anos que precederam as
grandes guerras mundiais, arrefecendo um pouco entre o período da Revolução de 1930 a
1935. Ma foi com o Estado Novo até 1950, verifica-se o período mais crítico da
repressão em São Luís.Acredita-se que a perseguição tornou-se mais intensa em razão da
própria situação política do país.O presidente Getúlio Vargas baixou uma lei obrigando
todos os terreiros, juntamente com seus responsáveis a registrarem.
A repressão policial nos terreiros de culto Afro foi algo bastante ofensivo para as vodunças, mães e
pais-de-santo e praticantes do culto de modo geral. Portanto, houve a necessidade de algumas casas
mudarem alguns elementos nas estruturas dos cultos em função do assédio da polícia.
Assim coloca Santos e Santos Neto (1989, p.116):
É uma longa história de torturas, humilhações e constrangimentos de magias e represálias,
traduzidas na ação das antigas e austeras mineiras, que sabiam invocar os poderes dos encantados,
para com isso conter a ação policial.
Ainda a respeito de José Cupertino, depoimentos de conhecidos seus afirmam que ele era uma
pessoa de grande carisma e pelo fato de ser conhecido como curador - vidente e realizar sessões espíritas
em sua tenda atraía muitas pessoas de camadas mais favorecidas. Sua fama de curador ia além das
fronteiras do Maranhão, uma vez que várias pessoas de outros estados o procuravam pelos seus trabalhos
no tratamento da saúde. Havia a incorporação de várias entidades espirituais pelo curador e umbandista
como: Beira-Mar, Cigana Diamantina, Rei Sebastião dentre outros. Seus cultos na Tenda Deusa Iara iam
desde as giras de Umbanda que aconteciam aos domingos às sessões de mesa branca, estas nas sextasfeiras, além é claro de outras representações religiosas.
O pai-de-santo e vereador José Cupertino possuía um programa veiculado pela rádio Gurupy que
tratava de assuntos da religião Afro-Brasileira e, sobretudo da Umbanda, obtendo alto índice de audiência.
7
Prof. Dr. em Antropologia pela USP e pesquisador de religiões afro-brasileiras
Concludente do Curso de Jornalismo – UFMA e pesquisador (PIBIC - CNPq) de religiões afro-brasileiras e cultura
popular maranhense.
8
Foram abordados ainda, questões do cotidiano como reivindicações de melhores condições urbanas para o
bairro do João Paulo.
Assim coloca o Jornal Pequeno do dia 25 de Junho de 1966: “Cupertino com a palavra Reivindicação do umbandista a infra-estrutura no bairro do João Paulo, enfatiza a melhoria da iluminação
pública pela ocasião dos festejos juninos”.
Podemos perceber que o então vereador tinha certo respaldo na imprensa devido a sua posição
política, o que viabilizava alguma abertura à Umbanda. Segundo Astro de Ogum que além de gerir a
Federação da qual já citamos, é vereador da câmara municipal de São Luís – sem dúvida nenhuma a
representatividade política permite menos desrespeito e auxilia sutilmente em reivindicações que
envolvam os praticantes da religião afro-descendente.
Em linhas gerais a Umbanda e outros cultos afro possuem certa abertura de suas práticas religiosas
na década de 1960, tal afirmativa pode ser verificada através de matérias veiculadas naquela época. Como
exemplo disso, temos as atas de fundação de vários terreiros da cidade de São Luís, esses documentos
foram por nós observados no Diário Oficial do Estado do Maranhão da década citada. Convém ressaltar
que alguns terreiros já haviam sido fundados em anos anteriores, no entanto seus estatutos são publicados
no Diário Oficial na década de 1960, período em que de acordo com nossa pesquisa no Jornal Pequeno,
não há incidência de batidas policiais em terreiros, talvez por conta da influência da Federação de
Umbanda e Culto Afro-Brasileiro do Maranhão.
Diante do exposto, acredita-se que a abertura das práticas religiosas de origem africana em São
Luís tenha algum elo com a instalação e fundação da Federação de Umbanda e Culto Afro-Brasileiro do
Maranhão em 1964 por José Cupertino de Araújo, neste contexto observamos algumas tendas
umbandistas que tiveram seus estatutos publicados no Diário Oficial de 16 de janeiro de 1967 que eram:
Tenda Umbanda Salão da Boa União, Tenda Umbandista São José e Tenda Umbandista Caboclo Ita.
Além das tendas especificamente identificadas enquanto casas de Umbanda havia ainda outros estatutos
que também foram publicados no Diário Oficial da década de 1960, como o Terreiro de Mina Rei
Sebastião publicado no dia 02 de setembro de 1964, e ainda, o Centro Espiritualista de Tambores Iemanjá,
fundado no dia 08 de dezembro de 1958, no bairro da Fé em Deus. No entanto no periódico citado, o
estatuto dessa entidade data em 15 de maio de 1963. Atualmente esse terreiro é mais conhecido como
Terreiro de Iemanjá que tinha como presidente Jorge Itaci de Oliveira, conhecido pai-de-santo do bairro
da Fé em Deus, ex-presidente da Federação de Umbanda e Culto Afro-Brasileiro do Maranhão, falecido
no ano de 2003.
Em linhas gerais, nota-se que há uma institucionalização de muitos terreiros no período
anteriormente citado, essencialmente os de práticas umbandistas, em função do crescimento dessa religião
no território brasileiro e consequentemente na capital maranhense por intermédio de José Cupertino que
como também já citamos, viabilizou a introdução da doutrina umbandista em São Luís, que rapidamente
proliferou na cidade e no interior do estado, passando a adquirir um respaldo legal diante da sociedade,
além de contar com uma instituição a seu favor – a Federação de Umbanda e Cultos Afro-Brasileiros do
Maranhão – que viabiliza certa garantia ao funcionamento das suas representações religiosas.
2.2. Pai Euclides e a Introdução do Candomblé em São Luís
No Maranhão, as práticas religiosas de origem africana possuem várias nomenclaturas, e
consequentemente cada uma delas tem suas particularidades. As denominações Mina Jeje e Mina Nagô
são as mais antigas e conhecidas no Estado, embora haja outras representações religiosas de procedência
africana que a permeiam a capital e o restante do Maranhão, tais como o Tambor da Mata ou Terecô –
típico da cidade de Codó, o Tambor de Curador da cidade de Cururupu, que não possui muita
proximidade com os cultos jeje e nagô, e é mais relacionado a usos terapêuticos. Integrando-se, de acordo
com pesquisadores, a uma relação sincrética da cultura negra, de origem banto - com a cultura indígena
(FERRETTI, M, 2003, p.119). Destacamos ainda o grande número de terreiros de Umbanda na capital e
no interior do Estado que por sua vez fazem parte do múltiplo universo da religião afro-descendente.
Em meio à predominância da Mina nagô na maioria dos terreiros de São Luís, convém destacar a
existência na capital maranhense da prática do Candomblé – religião de origem africana que realiza cultos
em homenagem aos orixás. No Brasil, o Estado da Bahia é o que mais se destaca na prática dessa religião,
embora tenha recebido um aumento de adeptos ao longo dos anos em todo o país. Na capital maranhense,
a Casa Fanti-Ashanti localizada no bairro do Cruzeiro do Anil, liderada por Euclides Menezes Ferreira –
mais conhecido como Pai Euclides, é um dos principais terreiros que também realiza o referido culto.
Pai Euclides, segundo Mundicarmo Ferretti (2000) realizou o registro de seu terreiro na polícia no
mês de setembro do ano de 1954, com o nome de Tenda de São Jorge de Ueira, sendo inaugurado no ano
de 1958, quando o pai de santo solicitava licença para realizar os cultos. Neste período era bastante
comum que essas casas religiosas fizessem esse tipo de solicitação àquele órgão de segurança pública, no
entanto em alguns casos havia invasão de policiais nestes estabelecimentos em função do preconceito aos
cultos, ou devido ao som dos tambores até altas horas da madrugada.
A manifestação mediúnica de Pai Euclides ocorreu pela primeira vez quando ele tinha apenas sete
anos de idade. Após o transe que teve características violentas, Pai Euclides passou aproximadamente um
mês com febre, de modo que as demais manifestações espirituais alternavam-se entre momentos de
transes calmos e intensos.
De acordo com Mundicarmo Ferretti (2000, p.165), a mãe de Euclides procurou fazer o seu
tratamento através de métodos da Pajelança, pois havia um forte preconceito de homens que participavam
de rituais da Mina, pois estes eram então vistos como homossexuais.
Ao longo dos anos Pai Euclides passou a receber várias entidades como Juracema, Tabajara dentre
outras. Esta última se manifestava com mais freqüência durante esses primeiros momentos de experiência
mediúnica. Euclides Ferreira passou por períodos de dificuldades na sua vida espiritual a ponto de precisar
de ajuda de mães de santo como Maria Pia do Terreiro do Egito que fez sua iniciação naquele no Terreiro
de Mina, iniciação essa realizada as escondidas. (FERRETTI, M, 2000, p.167).
Embora a trajetória de Pai Euclides tenha uma história fascinante no que tange os cultos AfroBrasileiros no Maranhão, não nos aprofundaremos nesta abordagem, pois nosso maior interesse neste
momento trata-se de perceber o pioneirismo do pai de santo na introdução da prática do Candomblé em
São Luís.
Assim, vimos que Pai Euclides desde criança teve contato com as práticas religiosas de
procedência africana e outra, onde passou pela experiência de curador, e pelos estágios do Tambor de
Mina, tendo com esse, aproximação maior e finalmente na década de 1970, teve seus primeiros contatos
com o Candomblé. Em 1966 Pai Euclides viajou para o Estado de Pernambuco, onde permaneceu alguns
meses na cidade de Recife e neste mesmo ano aproxima-se especialmente do Terreiro da Turquia, fundado
por mãe Anastácia, no fim do século XIX. No ano de 1971, após o falecimento dessa mãe de santo, Pai
Euclides passa a ser zelador daquela casa, com o apoio de pessoas ligadas a esta e outras casas de culto
afro, uma vez que temiam a extinção do terreiro, além disso, Pai Euclides recebeu determinação do seu
caboclo Tabajara para assumir tal função.
A Casa Fanti – Ashanti passa a receber as primeiras visitas de pesquisadores na década de 1970,
como a então pós-graduanda em Antropologia do Museu Nacional Regina Prado no ano de 1972; a
pesquisadora Maria Amália Barreto, em 1975, que desenvolveu sua dissertação de mestrado sobre os
voduns no Maranhão e sua tese de doutorado que tratava especificamente daquela casa. (FERRETTI, M,
2000, p.174).
Acerca da presença do Candomblé naquele terreiro, a visita que está diretamente relacionada a
essa questão é a do antropólogo pernambucano Roberto Motta em 1975, visita esta que facilita o acesso
do pai-de-santo nos terreiro de Recife, e neste mesmo ano ambos viajaram para àquela cidade. Através de
Roberto Motta, Pai Euclides foi apresentado a vários praticantes de culto afro daquela região. Assim, os
toques de Candomblé passaram a ser realizados pública e oficialmente na Casa Fanti-Ashanti, no ano de
1980, período em que Pai Euclides “completou seu preceito nagô em Recife e começou a iniciar no nagô
as filhas da casa. Atualmente a Casa Fanti-Ashanti possui dois espaços para os cultos destinados a cada
tipo de prática religiosa, sendo um para toque de Candomblé e outro para toques de Mina” (FERRETTI,
M, 2000, p.176).
Um outro ponto a ser comentado é a grande visibilidade que Pai Euclides possui na mídia
maranhense, havendo inclusive a existência do documentário Atlântico Negro – Na Rota dos Orixás,
produzido por Renato Barbieri em São Paulo em 1997 que contou com a participação do pai-de-santo.
Convém pontuar que apesar de a casa Fanti-Ashanti possuir dois cultos com espaços físicos
distintos, sentimos a necessidade de fazer uma breve abordagem a respeito da introdução do Candomblé
em São Luís por Pai Euclides, uma vez que em relação ao Tambor de Mina já realizamos alguns
comentários em um ítem anterior.
2.3. Elementos dos Cultos Afro nas Festas da Cultura Popular de São Luís
Em São Luís é possível perceber uma grande riqueza de festas oriundas da cultura popular. Ao
longo de nossa pesquisa achamos interessante atentar para duas manifestações que trazem uma forte
influência de elementos da cultura negra que são as seguintes: Tambor de Crioula e Festa do Divino
Espírito Santo, embora a segunda seja de origem portuguesa.
Assim, convém atentar para a questão do estudo da cultura popular que de uma maneira geral
aborda expressões culturais de diversos segmentos da sociedade e de distintas concepções de
representação, discutindo a múltipla concepção de aspectos sócio-culturais como manifestações populares,
hábitos e costumes de determinados grupos sociais que adquirem suas próprias formas de identidade e
seus próprios signos.
No âmbito dessa abordagem Sandra Pesavento (2005), discutindo a História Cultural destaca as
mais diversas abordagens acerca dessa corrente, onde cita Jules Michelet que em suas obras já
demonstravam a presença de abordagens histórico-culturais.
A respeito de Michelet, assim afirma Pesavento (2005, p.19):
O que chamou atenção dos historiadores contemporâneos foi mais propriamente o
esforço levado a efeito por Michelet, de identificar um agente sem rosto – o povo, as
massas - como personagem da história e como protagonista dos acontecimentos, além de
ser detentos daquilo que seria o gérmen da nação.
Ao pensarmos nesse agente sem rosto – o povo, as representações culturais das massas anônimas
tornam-se bastante importante por terem em seus elementos simbólicos a presença de sua identidade
étnica e social. Nesse sentido, durante certo tempo no passado, não se percebia interesse por parte da
aristocracia intelectual do Brasil em estudos da cultura do povo, o Maranhão não fugiu a essa regra. De
acordo com Sérgio Ferretti (2002) as referências bibliográficas referentes às danças folclóricas e do
Tambor de Crioula são bastante reduzidas, o que dificulta estudos e abordagens mais profundas das
origens dessas manifestações.
A respeito dessa questão assim afirma Ferretti (2002, p.21): “Os poucos cronistas e viajantes não
deixaram muitas referências às manifestações populares e os escritores, tradicionalmente numerosas no
Estado, dedicaram mais atenção a temas relacionados com as classes média e aristocrática”.
Sobre o Tambor de Crioula procuraremos discorrer uma breve consideração acerca da presença de
entidades espirituais durante a dança. Faz-se necessário ressaltar que, assim como não havíamos detalhado
características particulares aos cultos do Tambor de Mina, do Candomblé, da Umbanda, da Pajelança e
outras modalidades da religião afro, não é objetivo da presente pesquisa realizar uma abordagem com
detalhes específicos daquela dança, uma vez que priorizamos abordar aspectos sócio-culturais que
direcionem para uma análise das práticas e representações dos terreiros de São Luís, essencialmente no
que tange a questão da intolerância religiosa por parte da sociedade.
No âmbito das representações culturais em que os cultos religiosos de procedência africana estão
presentes, podemos enfatizar a festa do Divino Espírito Santo – oriunda do continente europeu e presente
em vários Estados do Brasil. No Maranhão é encontrada em vários municípios, de modo que em São Luís
e na cidade de Alcântara recebe grande destaque, embora ambas tenham características um pouco
distintas. Na capital do Maranhão a festa está diretamente ligada aos terreiros de Mina, enquanto que em
Alcântara a relação religiosa da festa esta estritamente ligada á Igreja Católica. Abordaremos com mais
riqueza de detalhes essas questões em um item posterior, onde procuraremos demonstrar algumas
características daquela prática cultural.
2.3.1. O Tambor de Crioula no Cenário dos cultos Afro-Brasileiros
No Maranhão o Tambor de Crioula é uma das manifestações culturais de raízes africanas que
possuem um dos maiores índices de popularidade, causando grande admiração do público de um modo
geral.
Segundo Ferretti, (2002, p.119):
O Tambor de Crioula é uma dança popular maranhense, provavelmente de origem
africana, realizada tradicionalmente, por populações de visível ascendência negra.
Como grande número de manifestações folclóricas, tem um cunho também religioso
pelo fato de ser uma das formas de pagamento de promessa a São Benedito.
Assim como várias outras manifestações folclóricas, o Tambor de Crioula também está inserido
no âmbito das festas folclóricas com características que estão entre o sagrado e o profano, uma vez que
além de ser uma dança com atribuições religiosas - realização de pagamento de promessa em
homenagem a São Benedito, também se caracteriza enquanto manifestação de caráter profano, devido
o uso de bebidas alcoólicas pelos participantes dos grupos, os coreiros – tocadores de tambor e as
coreiras – as dançantes. Na dança é comum à presença da punga, que é o momento mais alto da
coreografia, onde as mulheres de acordo com mo ritmo dos tambores se defrontam encostando uma
barriga na outra. Entre os homens existe a presença da pernada, comum no Tambor de Crioula do
interior do Estado, a coreografia é feita como uma espécie de competição corporal em que o coreiro
testa a habilidade do outro. Sérgio Ferretti (2002) compreende que a punga é um componente básico
relacionado com a interação entre os participantes ou um grupo de amigas.
Em relação às apresentações da dança, é corriqueiro que turistas confundam o Tambor de
Crioula com o Tambor de Mina, era possível perceber isso facilmente quando tivemos a experiência de
desenvolver o estágio extracurricular, na Superintendência de Cultura Popular, mais especificamente
no módulo Casa da FÉsta. Na condição de monitora desse espaço museológico, acompanhei várias
pessoas de diversos lugares do Brasil e do mundo e ao levá-las para conhecer às exposições voltadas
para o Tambor de Mina, normalmente alguém fazia alusão ao Tambor de Crioula com o intuito de
identificar similaridades. Quando levava os visitantes à exposição do Tambor de Crioula o mesmo fato
ocorria repetidas vezes, ou seja, era banal o questionamento das diferenças entre as duas
manifestações.
Esta dúvida não ocorre só com turistas de fora do Estado, segundo Sérgio Ferretti (2002, p.119)
isso acontece, devido algumas semelhanças exteriores e comuns a ambas manifestações. E ainda que
haja vários aspectos que estabeleçam diferenças entre as duas representações culturais, segundo Santos
e Santos Neto (1989) o Tambor de Crioula relaciona-se em alguns pontos com o Tambor de Mina.
Assim afirma Santos e Santos Neto (1989, p. 91):
[...] entre o tambor de crioula e o tambor de mina há algo mais profundo que vai além
de uma influência mútua. Pais e mães-de-santo afirmam que algumas entidades
gostam do tambor de crioula, tanto Pretos Velhos como seus filhos ou crias.Por isso,
muitos terreiros de tambor de mina são envolvidos com tambor de crioula, quer em
pagamento de promessas ou como forma de agradar as entidades devotas de São
Benedito.
Sérgio Ferretti (2002, p.122) enfatiza o sincretismo de São Benedito com algumas divindades
africanas e caboclas, e identifica de acordo com Octávio Eduardo que no Maranhão São Benedito é
sincretizado com Verekete, sendo este ainda chefe das cerimônias de muitos terreiros de tambor mina.
A semelhança entre o Tambor de Mina e o Tambor de Crioula está em vários elementos e foi
possível identificarmos isso através dos próprios brincantes que muitas vezes tocam e dançam em
ambos toques de tambores, seja Mina, seja de Crioula. A origem desses participantes é outro fator
comum, muitos são descendentes de ex-escravos, possuem condições sócio-econômicas e culturais
parecidas em que trabalham como pedreiros, estivadores, empregadas domésticas, dentre outros.
Dentro dos terreiros, o Tambor de Crioula serve também para animar as festas religiosas,
Sérgio Ferretti mostra na obra Tambor de Crioula Ritual e Espetáculo, depoimentos de alguns líderes
de terreiro a respeito da presença do Tambor, dentre eles Euclides Ferreira, da Casa Fanti-Ashanti no
Cruzeiro do Anil que diz o seguinte:
São Benedito protege diversas entidades africanas, nagôs como Bossu Doru e
Opelavi, além de Caboclos e Pretos Velhos. Há pessoas fanáticas por Tambor
de Crioula que acabam sendo possuídas por entidades, pois o Tambor de
Crioula é uma tradição africana e quem tem vodum de origem africana acaba
caindo no santo. Ademais, o Tambor de Crioula pertence a um santo católico,
São Benedito, que protege um vodum, Toi Averequete – da tradição Ioruba –
Nagô, como protege outras entidades.Talvez por isso há pessoas que são
possuídas pelo santo quando dançam Tambor de Crioula. (FERRETTI, S, 2002,
p.123)
No ano de 2004 realizamos entrevista com Dona Raimunda, esposa de mestre Felipe – líder de
grupo de Tambor de Crioula em São Luís – que nos falou já ter presenciado incorporação de entidades
na dança, mas disse que isso não era de costume ocorrer, informou-nos ainda que certa vez viu uma
colega sua em estado de transe, segundo Dona Raimunda a mulher era Dona Roxa, a qual não
conhecemos, falou ainda que não gostava de ver essas coisas na brincadeira.
A incorporação de entidades no Tambor de Crioula ocorre segundo Santos e Santos, Neto
(1989, p.91) com mais freqüência em São Luís, mas é possível ver também em cidades como
Pedreiras, Codó e Ipixuna. Convém mencionar que em algumas regiões do Estado não há nenhum tipo
de relação entre Tambor de Crioula e o transe de entidades como em Anajatuba, onde a dança pode ser
realizada por homens que realizam uma coreografia em que a punga é violenta “como que uma prova
de forças, um dançante procurando derrubar o outro”. (SANTOS e SANTOS NETO, 1989, p.91)
É comum que no interior do Estado haja recomendações das pessoas mais idosas para as que
possuem mediunidade de que não dancem o Tambor de Crioula, pois o toque dos instrumentos
propicia o chamado das entidades e sem a assistência de um pai ou mãe-de-santo podem ficar em
estado dificultoso por não haver pessoas que saibam lhe dar com a situação.
Diante do exposto, é delicado dizer que não há nenhuma ligação do Tambor de Crioula com o
culto de entidades, pois como vimos, ainda que seja uma dança da cultura popular com intuito de
divertimento e lazer podendo ainda ser realizada com o objetivo de pagamento de promessa para São
Benedito, à dança popular pode ocorrer dentro dos terreiros para abrilhantar o culto religioso ou para
agradar a entidade homenageada que muitas vezes gosta da brincadeira. É possível ainda vermos a
representação do Tambor de Crioula em praças, frente a hotéis e outros espaços e ocorrer o transe de
algum espírito em um momento desses. Mesmo não sendo habitual tal fato, pudemos perceber que não
é um fato isolado, uma vez que o toque dos tambores reunidos tem uma cadência muito próxima dos
realizados dentro dos terreiros em dias de festa para os caboclos, voduns e orixás.
2.3.2. A Festa do Divino Espírito Santo nos Terreiros
As comemorações em homenagem ao Divino Espírito Santo estão inseridas nos calendários de
eventos dos terreiros de São Luís. É fundamental destacar a presença do sincretismo religioso no
âmbito dessa representação cultural, pois apesar de ser uma festa que tem como protagonista o Divino
Espírito Santo – terceira pessoa da Santíssima Trindade e elemento singular do Cristianismo, a festa
em São Luís está diretamente ligada aos terreiros de culto afro.
A festa é oriunda da Europa, onde possui características particulares de acordo com a cultura de
cada país. Na Alemanha, França e Portugal é possível encontrar a festividade, sendo que é em Portugal
no século XIII que a manifestação é instituída com a forma de festa através da Rainha Isabel de
Aragão, considerada muito religiosa, devota da divindade e muito bondosa aos mais pobres – realizava
ainda a distribuição de esmolas. Em função ao seu grande apreço pela religião católica e pelo Espírito
Santo, mandou construir uma igreja na cidade de Alenquer em homenagem ao Divino.
No Brasil a festa foi introduzida pelos colonizadores e pode ser encontrada atualmente em
diversos estados como São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Paraná, Santa Catarina, Goiás e
Maranhão. Devido à diversidade cultural desses lugares, assim como na Europa cada região possui a
sua peculiaridade dentro dessa representação.
O Divino Espírito Santo no âmbito da perspectiva cristã tem como um dos principais símbolos
uma pomba branca, a divindade é descrita na Bíblia Sagrada no Novo Testamento a qual durante o
Pentecostes9 manifestou-se através de línguas de fogo sobre a cabeça dos apóstolos. Ainda no Novo
Testamento é descrita a representação do Espírito Santo em forma de uma pomba sobrevoando a
cabeça de Jesus Cristo enquanto era batizado por João Batista nas águas do Rio Jordão.
Sobre essa questão, como já vimos, é comum à presença de elementos sincréticos na festa em
São Luís, que distintamente da festa de Alcântara a qual está ligada a Igreja Católica e ausente de
influência dos cultos afro, possui um forte elo com os terreiros, essencialmente o Tambor de Mina.
Dentre os aspectos peculiares da festa em São Luís e também em Alcântara, as caixeiras são
elementos fundamentais – são mulheres com idade de aproximadamente quarenta a setenta anos que
tocam as caixas (tambores), cantam e rezam ladainhas ao longo da festa, estas também desempenham a
atividade de pedir jóia (esmolas) nas casas das comunidades mais próximas para juntar recurso para a
festa. Em linhas gerais, sem a presença dessas mulheres a expressão cultural estará incompleta, uma
vez que elas conhecem todo o roteiro do evento.
De um modo geral, as festas estão atreladas a santos católicos como São Benedito, Santa
Bárbara, Nossa Senhora Santana, São Sebastião, dentre outros. Das muitas festas do Divino em
terreiros de São Luís podemos citar como exemplo às da na Casa das Minas, Casa de Nagô, Terreiro
de Iemanjá, Terreiro da Fé em Deus e Terreiro das Portas Verdes.
No ano de 2006, um grupo de estagiários da Superintendência de Cultura de Cultura Popular,
ao qual eu estava inserida, teve a oportunidade de visitar algumas festas do Divino da capital. Das
casas que visitamos estavam também a Casa de Nagô e a Casa das Minas. Participamos de parte do
início da festividade desta última, assistindo a uma missa na igreja de Nossa Senhora Santana onde
estavam às caixeiras, os membros que representam a corte imperial e demais pessoas ligadas àquela
9
De acordo com a tradição cristã, o Pentecostes representa o Espírito Santo que se manifestou sobre a cabeça dos apóstolos
através de línguas de fogo, após cinqüenta dias da ressurreição de Jesus Cristo.
casa. Ao término da missa seguimos o cortejo até o terreiro que fica localizado na Rua de São
Pantaleão.
Nesse sentido, observamos novamente a presença do sincretismo religioso, uma vez que se
nota uma representação cultural estabelecendo um elo entre duas religiões. É também muito
corriqueiro que a celebração seja realizada para alguma entidade da casa, além disso, existem outras
características na festa que despertam certa curiosidade, pois serve ainda como uma espécie de oráculo
da casa, onde é provável prever questões benéficas ou não ao longo do ano dentro da comunidade do
terreiro que realiza a festa.
Segundo Santos e Santos Neto (1989), o transe em algumas pessoas da casa é um fato natural
neste período, no entanto manifestam-se de maneira discreta podendo ocorrer de a entidade
desenvolver atividades como varrer, lavar louças em prol de um bom andamento da comemoração.
Neste festejo existem algumas casas que realizam atrações culturais diversificadas, e assim
contratam grupos de pagode, seresta, radiolas de reggae, nesta ocasião se for necessário os donos de
terreiros vão à delegacia de costumes para pedir licença à realização desses recursos festivos caso se
estendam até certo horário da noite. Assim, algumas comunidades dos terreiros fazem à
comercialização de vários produtos como bebidas, comidas típicas, com o propósito de arrecadação de
recursos para a manutenção do terreiro.
3 A PERSEGUIÇÃO AOS TERREIROS NO MARANHÃO
A dura perseguição por órgãos oficiais aos praticantes de religião afro-brasileira possui
inúmeros exemplos que poderíamos mencionar, no entanto, não pretendemos nos estender muito aos
casos que ultrapassem as fronteiras de nossa pesquisa, uma vez que nosso objeto está direcionado
para o Maranhão, mais especificamente para a cidade de São Luís.
Assim, é necessário apontar que no século XIX as religiões de origem negra mais antigas, se
formaram no momento em que a religião católica era oficial no país. De acordo com Reginaldo
Prandi (2003), “para se viver no Brasil, mesmo sendo escravo, e principalmente depois, sendo negro
livre, era indispensável antes de mais nada ser católico”. (PRANDI, 2003, p.01).
O fato de naquele contexto o catolicismo ser a religião oficial do país, pressionava os afrodescendentes a participarem de cerimônias como missas, novenas, festejos de santos, e neste sentido
eles passaram a se utilizar disso enquanto camuflagem para manter viva a tradição de sua religião,
viabilizando assim o sincretismo de divindades africanas com santos católicos.
A inflexibilidade do Estado diante da religião afro era demonstrada nas páginas de jornais, e
no Maranhão era possível encontrar matérias do assunto em periódicos da capital e das principais
cidades do interior. Herlinton Rodrigues Nunes10, em artigo publicado no Boletim da Comissão
Maranhense de Folclore da edição de junho de 2006 faz uma abordagem acerca das publicações de
matérias sobre pajelança na imprensa da cidade de Codó no século XIX. O pesquisador explica que
embora a representação religiosa afro-maranhense na cidade de Codó seja conhecida como Terecô,
nos jornais averiguados por ele a nomenclatura encontrada denominava-se pajelança11.
Nunes (2006, p.12) afirma que apesar de a Constituição de 1891 garantir a liberdade religiosa,
o Código de Postura de Codó de 1841 continuaria em vigor punindo as práticas de cura. O artigo 22
da lei n° 241 de 13 de outubro de 1848, ou seja, o Código de Postura de Codó que assim afirma:
“toda e qualquer pessoa que se propuser a curar feitiços, sendo livre pagará multa de vinte mil réis, e
sofrerá oito dias de prisão, e sendo escravo haverá somente lugar a multa que será paga pelo senhor
do dito escravo”. (FERRETTI, M, 2001, p. 35).
É possível notar que esse código data de 1848, período em que ainda estava vigente a
escravidão no país, eis o porquê de haver em seu texto as distinções nas penalidades dos acusados.
Nunes (2006) enumerou catorze matérias as quais o mesmo comenta sobre as coibições aos terreiros.
Assim, o pesquisador não coloca no artigo as matérias com seu conteúdo completo, e sim, como já
afirmamos, comenta as matérias publicadas no jornal pesquisado: “O monitor Codoense”, do período
de 1894 a 1896, articulando assim uma breve abordagem das investidas policiais contra a pajelança
naquela cidade.
Deste modo, pelo fato de não termos o acesso à fonte usada pelo pesquisador, achamos
coerente demonstrarmos abaixo, os devidos comentários de Nunes (2006) sobre as matérias.
10
Professor substituto de História CEFET-MA e colaborador do GP “Religião e Cultura Popular” – DESOC/ UFMA.
A Pajelança é uma prática religiosa associada medicina popular, em que ocorre o transe mediúnico de entidades
espirituais, no ritual são utilizadas plantas e outros recursos terapêuticos, combinando elementos da cultura indígena e
negra, além de elementos do catolicismo popular. Segundo a antropóloga Mundicarmo Ferreti (2004), a Pajelança é
conhecida na capital maranhense antes do Tambor de Mina, possivelmente continuada pelos pajés de Alcântara e Cururupu,
e os líderes do terreiros dessa prática é mais conhecido como curador ou pajé. (FERRETTI, M, 2004, p.28)
11
Dentre essas, selecionamos duas em que o apoio da imprensa torna-se evidente nessa ação
repressiva.
Assim discorre Nunes, sobre as publicações:
Matéria 07: Os Pajés – 12/01/1885.
Esta é uma das maiores matérias encontradas e mostra que a força policial do
município é insuficiente para combater os pajés, que são ali em grande número (o que
pode ter sido exagerado e ser um estratagema para mostrar o poder das instituições no
combate aos pajés). Nessa matéria há uma relação nominal dos pajés com sua
localização. Encontra-se nela acusação de assassinato, direcionado a pajés e apoio à
polícia pela imprensa local, na repressão à pajelança.
Matéria 08: Os Pajés – 26/01/1895.
Fornece também relação de nomes e localidades dos pajés. Chama a atenção das
autoridades para o rigor que deve ser aplicado a seita dos pajés, que pratica algo
misterioso (a pajelança) e os causa de matar libertos com suas bebidas. Embora haja
uma cobrança intensa e um apoio explícito da imprensa à perseguição aos pajés (no
caso do Monitor Codoense), a mesma imprensa que acusa e auxilia a polícia é a
primeira a colocar em descrédito a eficácia das atitudes das autoridades, que parecem
menos combativas do que jornalistas e limitam-se a destiná-los a trabalhos forçados
sugerindo que a pajelança não era crime nos códigos penais.
Como vimos além das autoridades locais se incumbirem de coibir as práticas religiosas
executadas pelos pajés, havia uma outra entidade que colaborava a esta questão - a imprensa – que
também manifestava seu desafeto aos cultos através das matérias veiculadas pelos jornalistas que ora
demonstravam seu repúdio àquela prática religiosa, ora deixava explícita a sua antipatia à inoperância
da polícia.
Deste modo, torna-se ambíguo o posicionamento da imprensa sobre isso, pois nos induz a
interpretar que além do preconceito étnico cultural podemos perceber conflitos políticos imbricados na
atitude da imprensa codoense ao desmoralizar os governantes locais perante a sociedade diante da
ineficiência a punição dos pajés.
Assim, convém abordar que no início de nossa pesquisa tínhamos a pretensão de elaborar um
trabalho pautado no posicionamento da imprensa diante das coibições policiais aos terreiros de cultos
afro-brasileiros, em que pretendíamos observar o discurso desses jornais diante de manchetes com tal
tipo de conteúdo, no entanto o fato de nosso recorte temporal estar direcionado para a década de 1960,
tornou-se inviável tal proposta de pesquisa, uma vez que ao nos depararmos com os jornais desse
período, não encontramos matérias com o tipo discursivo esperado.
Desde o início da formação das religiões de origem africana o processo de perseguição aos
terreiros acontece, e no Maranhão, é possível notar isso em vários jornais da capital e de importantes
cidades do interior, como vimos anteriormente o exemplo da cidade de Codó. Em São Luís,
observamos que na década de 1930 houve intenso movimento de coibições das autoridades locais
contra os terreiros. Pudemos perceber isso através de jornais da época que veiculavam nas páginas dos
casos policiais, às batidas nas casas do culto. A política de higienização das autoridades nas cidades,
impondo mecanismos reguladores de combate aos feiticeiros, remete-se à manutenção da ordem, assim
como procura seguir as diretrizes do Código Penal de 1890 que torna proibida a prática do
curandeirismo, da magia maléfica e do uso ilegal da medicina. (MAGGIE, 1992, p. 22).
O contexto histórico brasileiro do início da década de 1930 coincide com a formação do
movimento umbandista e a ascensão de Getúlio Vargas no poder, através dessa coincidência, muitos
desses religiosos apoiaram Getúlio em sua empreitada política, pregando inclusive seu retrato nas
tendas umbandistas. Embora houvesse esse elo entre Vargas e alguns representantes da umbanda, os
seus terreiros também foram perseguidos pela polícia. Segundo Diamantino Trindade, (1991, p.90)
uma lei sancionada no ano de 1934 estabelecia que a umbanda, o kardecismo, as religiões afrobrasileira, a maçonaria, etc, estariam enquadradas “na seção de Costumes e Diversões do
Departamento de tóxicos e Mistificações do Rio de Janeiro. Essa seção lidava com álcool, drogas, jogo
e prostituição. Essa lei vigorou até 1964”. (TRINDADE, 1991, p.90).
Através dessa lei, os policiais extorquiam pais e mães-de-santo com a justificativa de que os
cultos eram atos subversivos, conjeturavam ainda que essas mesmas práticas tivessem laços com o
comunismo. Diante do forte movimento de “caça as bruxas”, existiam comentários dentro da polícia
que algumas divindades africanas teriam em suas imagens símbolos que representava o comunismo.
Trindade (1991, p.90) destaca que o orixá Ogum, sincretisado com São Jorge no catolicismo, pelo fato
de usar uma capa vermelha seria considerado o Cavaleiro Vermelho, portanto despertava desconfiança
para as autoridades governamentais.
A década de 1930 - como havíamos dito anteriormente, foi um período em que é registrado
um grande número de repressões em várias regiões do Brasíl. Segundo Dantas (1988) essa intensidade
nas perseguições coincide com a construção científica do mito da democracia racial, em que a autora
cita Gilberto Freire (1933), e o avanço da intolerância etnocêntrica que demonstram preconceitos as
práticas da cultura negra.
Reiterando a abordagem das perseguições nos terreiros maranhenses, é possível observar as
ações de repúdio aos cultos afro-brasileiros através de matérias veiculadas nos jornais daquela década,
em que temos como exemplo o Jornal Imparcial, periódico de circulação diária. As matérias que
utilizamos para demonstrar nesse trabalho foram observadas através da monografia Prática Religiosa
Afro-Brasileira; trajetória de vida e luta pela afirmação da identidade religiosa, de Danusa Ribeiro
Soares, defendida em 1999 no curso de Ciências Sociais da Universidade Federal do Maranhão. A
mesma delimitou o período de 1930 a 1933, como recorte temporal de seu trabalho, onde esteve na
redação do jornal para desenvolver a pesquisa.
Dentre as várias matérias apontadas selecionamos apenas quatro, uma para cada ano e
procuramos preservar a maneira que foi escrita, de modo que permaneça a ortografia usada no período.
A saber:
CASOS POLICIAIS – A PAGELANÇA
A pagelança nos subúrbios da cidade está a merecer das autoridades severa vigilância.
Hontem, esteve na polícia José Silvino Gomes, proprietário de uma barraca no João
Paulo. Foi queixar-se contra os feiticeiros Raymundo Nonato e sua mulher Ângela e
Etelvina de tal, esta leprosa, que colocaram à porta de sua venda um chumaço
enfeitiçado, para diminuir o negócio. Seria bom que a polícia continuasse a campanha
encetada há bem poucos tempos pelo delegado do 2° districto e de optimos resultados
para a população. (Jornal O Imparcial - 27/03/1930).
CASOS POLICIAIS – PAGELANÇAS.
Uma das campanhas policiaes que se impõe, por absolutamente necessárias, é a que
deve ser levada a effeito contra os pagés e feiticeiros, domadores de bicho do fundo e
especialistas em coisa feita, essa imensa caterva de macumbeiros que conversam com
o diabo, em noites escuras e propicias de determinadas sextas-feiras. Porque os
adeptos do credo negro, atribuido a São Cipriano, já não imperam tão somente no
interior da ilha, como dantes, tendo estendido o seu raio de ação até às ruas mães
centraes da cidade. Ainda há poucos dias foi preso um pagé que realizava cura à rua
do Outeiro, numa algazarra medonha, que deu motivo ao guarda civil penetrar na casa
e unha-lo. Dizem que à rua da Viração, travessa do Machado e praia do Desterro,
estão installados outros curandeiros que curam espinhela caída com benzidellas de
ramo de arruda e que conjuram mau olhado, pendurando ao pescoço do cliente
‘bentinhos’, contendo a oração do sapo seco ou a reza da cabra preta. (Jornal O
Imparcial - 14/06/1931).
Há fortes indicações nestas matérias de que as autoridades locais empreendiam uma
reforçada articulação contra as religiões afro-brasileiras, além disso, notamos ainda que se repete o
mesmo ocorrido em O Monitor Codoense (1894 a 1896) apontado por Nunes (2006), ou seja, uma
campanha acirrada da imprensa em ‘higienizar socialmente’ a cidade das práticas dos feiticeiros. Deste
modo, a partir do teor dessas matérias veiculadas sobre a intolerância às práticas da religião afrobrasileira, é possível identificar o que é afirmado por Maggie (1992, p. 24) ao demonstrar que as
autoridades não buscavam exterminar com os cultos mediúnicos, e sim prender os feiticeiros que são
responsáveis pela magia que causa o mal.
Diante do controle das autoridades em relação às religiões afro-brasileiras, eram comuns os
pedidos de licença nas delegacias para realização dos cultos.
CASOS POLICIAES – PODE TAMBORILAR.
Noemia Rio Branco Luzitana Cardoso (nome p’ra chuchu), obeve permissão da
polícia para tocar tambor de mina, no Cutim Grande, durante este mez. (Jornal O
Imparcial - 05/01/1932).
A crença na pajelança e em outros cultos afro-brasileiros é uma prática atrelada ao padrão de
mentalidade da sociedade brasileira desde muito tempo, logo observamos que dentro da própria polícia
havia um forte crédito nos efeitos das práticas dessa religião, como podemos ver na seguinte matéria:
CASOS POLICIAES – PARA FEITIÇO SÓ FEITIÇO.
Há pouco era Martinho Souza, que fazia, sem querer, tudo que sua amante desejava,
por meio da reza da cabra preta. Agora é o talhador Antônio José Lima, que apezar de
desprezado pela sua companheira Raymunda Souza, moradora à rua Costa Rodrigues,
n. 7, por mais que queira esquece-la, certas horas, fica doidinho e vae chorar na porta
da casa da mulherzinha. Vai dahi Antônio presumir que Raymunda tenha feito
macumba, pois não pode calcular outra coisa. Raymunda disse que tudo aquilo era
história, porque quem quer bem não maltrata... O delegado aconselhou Antonio a
adquirir a oração ‘Pedra da ara’ que desfaz todo serviço feito, segundo informação de
um curandeiro que esteve preso dias atraz. (Jornal O Imparcial - 03/02/1933).
Deste modo, à sociedade da época acreditava fortemente nos usos das orações e “trabalhos”
que eram realizados pelos praticantes da magia, esse crédito ultrapassa barreiras entre as classes
sociais, uma vez que as camadas populares não são as únicas a direcionarem suas atenções a este tipo
de culto religioso; as manifestações dos pais-de-santo; a sabedoria dos pajés, mas também os mais
diversos extratos sociais, inclusive pessoas de cargos hierarquicamente conceituados na polícia, como
vimos o exemplo do delegado citado pela matéria anteriormente.
Um outro período de intensas coerções as casas de culto afro-brasileiro foi durante o Estado
Novo (1937-1945), o golpe de estado realizado por Getúlio Vargas no ano de 1937 deu poder de
governo aos estados aos interventores, que temiam bastante os movimentos contra o poder central e o
avanço do Partido Comunista, logo aumentou o controle às camadas populares e as elites liberais que
simpatizavam com seus objetivos. Neste sentido muitos intelectuais considerados inimigos políticos
foram presos, um destes foi o etnólogo e folclorista Édison Carneiro que precisou se esconder da
polícia no terreiro Axé Opô Afonjá, sob a guarda de Mãe Aninha. (GONÇALVES, 1994, p.104)
Durante o período do Estado Novo, houve certa ambivalência no que se refere às questões
culturais, essa ambivalência era demonstrada no Maranhão através de ações que viabilizavam fortes
perseguições policiais aos terreiros que eram vistos enquanto práticas nocivas e a margem da ordem
social, mas ao mesmo tempo a reprodução dos tambores da pajelança no imaginário da sociedade,
crescia cada vez mais enquanto representação dos elementos da tradição cultural maranhense. A
religiosidade popular e negra, segundo Almeida (2007, p. 09) durante o período estado novista recebeu
novas perspectivas através de jornais da época como o Diário do Norte que esteve em circulação
durante o período de 1937 a 1945 no Maranhão, e nesse intervalo de tempo procurou ficar isento de
publicar acusações e denúncias de casas de culto afro-brasileiro, e ao contrário de muitos periódicos da
época algumas vezes convidava o público a participar das apresentações do tambor de crioula e das
festas do tambor de mina. O oposto disso era o que acontecia nas páginas de O Globo que além de
auxiliar simbólica e concretamente os membros da polícia na sua caça as bruxas, mantinha a linha
etnocêntrica de preconceito as festas que ocorriam nos terreiros, logo as matérias sobre cultos afrobrasileiros ficavam na seção de Fatos e Queixas ocupando poucas linhas do periódico.
Almeida (2007) cita o historiador Mário Meireles (1980) onde este infere que o Estado Novo
foi um período político muito proveitoso para o Maranhão, apontando para as qualidades do governo
do então interventor federal Paulo Ramos, no entanto, para o historiador Mário Meireles como
comenta Almeida (2007, p.09), o principal responsável pelas questões negativas de retrocesso
administrativo estadual do Maranhão foi o bacharéu Flávio Bezerra, que era conhecido pelos seus
excessos de autoridade. O nome do chefe de polícia era por muitas vezes colocado no jornal O Globo,
segundo Almeida (2007, p.09), como um homem realmente severo e promotor da limpeza social, pois
o delegado esteve à frente das articulações contra diversos terreiros da ilha.
A história de resistência e luta existente no Maranhão pelos praticantes da religião afrobrasileira perpassa uma trajetória de batalhas e constrangimentos no que se refere às batidas policiais
aos terreiros. Apesar de o processo de intolerância religiosa as casas de culto ter um longo percurso, às
manchetes dos jornais do período em que era vigente o Estado Novo, de fato nos remete a interpretar
que foi uma fase bastante difícil para a religião afro-brasileira.
De acordo com Santos e Santos Neto (1989), a intensa coerção deve-se a situação política em
que se encontrava o país, pois o então presidente Getúlio Vargas decretou uma lei em que todos os
terreiros deveriam ser registrados, após essa medida foi desencadeado um assédio maior sobre as casas
de culto afro. Além da violência física contra os praticantes, havia outras ações abusivas como o
confisco de peças simbólicas dos terreiros, e a determinação do Estado para que a polícia cobrasse
altas taxas aos responsáveis dos terreiros para a realização dos cultos.
Ainda a respeito da atuação de Flávio Bezerra diante do processo de perseguição a terreiros, é
importante frisar que as casas mais tradicionais de São Luís, Casa das Minas e Casa de Nagô,
localizadas no centro da cidade estiveram isentas de precisarem se deslocar para zona rural, isto é, para
lugares mais distantes da região urbana. Almeida (2007) cita Dona Celeste, zeladora da Casa das
Minas, que explicou a respeitável atuação de Mãe Andressa, então líder da Casa das Minas durante o
Maranhão estado – novista.
A manutenção das práticas religiosas nos terreiros nesse período muitas vezes era
influenciada pela boa articulação dos chefes das casas com representantes políticos, é o caso de Mãe
Andressa, que segundo Almeida (2007) foi de família de escravos que trabalhou na fazenda da família
do interventor Paulo Ramos. Essa ponte teria sido responsável pela articulação de Mãe Andressa com
o político solicitando a este o não afastamento da casa para localidades mais distantes, como a Casa de
Nagô era próxima e uma está ligada à outra, também não precisou se mudar.
Convém destacar que a ação da polícia diante das perseguições nos terreiros não ocorria de
forma homogênea, havia policiais que não compartilhavam das mesmas opiniões em relação às
dinâmicas culturais e religiosas abordadas pelas autoridades, além disso, o universo da clientela que
freqüentava as casas de culto era bastante diversificado no que tange a condição sócio-econômica de
cada um, para tanto nota-se uma ampla determinação de idéias no que concerne às coerções àquelas
casas. (ALMEIDA, 2007, p.11).
A essa heterogeneidade de demarcações de idéias em relação às práticas e representações da
cultura e religião afro-brasileira, interpretamos enquanto um conjunto de fatores aliados ao padrão de
mentalidade da sociedade da época e do próprio imaginário que perpassa pelo respeito aos
conhecimentos advindos dos pais e mães-de-santo – elementos de fundamental importância para a
manutenção das tradições de práticas culturais que vieram do continente africano. Em meio a uma
gama de elementos repletos de simbologias e representações presentes nos rituais de pajelança, do
tambor de mina, da umbanda dentre outros cultos afro-brasileiros, desperta o interesse de diversos
intelectuais em desenvolver estudos acerca dessa dinâmica religiosa e cultural. Logo, a própria
imprensa ainda que etnocêntrica e preconceituosa, abre os olhos e a curiosidade das pessoas, dos mais
distintos segmentos sociais.
Ainda no período que compreende o Maranhão estado-novista, é crescente a influência do
modernismo, ou seja, este movimento procurava no âmbito das classes populares os elementos para a
cultura nacional, dentre as demonstrações artísticas do movimento no Maranhão esteve evidente
através da pajelança, que no ritmo dos tambores oferece recursos estéticos na construção de poesias
(ALMEIDA, 2007, p. 12).
De um modo geral, é válido inferirmos que o processo de resistência dos negros e seus
descendentes perpassa por uma longa trajetória de luta pela garantia de manutenção de sua tradição
cultural. Deste modo, observamos que apesar de o Estado Novo ser um período político de intensa
repressão aos terreiros, é paradoxalmente segundo Almeida (2007, p.12) um momento em que se dá
“início de um lento e descontínuo, porém crescente processo de reconhecimento social daquelas
manifestações de cultura e conhecimento”.
3.1 A Diminuição das perseguições policiais em terreiros de culto afro em São Luís
Em São Luís, os mecanismos reguladores do governo continuaram executando batidas
policiais nos terreiros durante a década de 1950, e pudemos observar isso por meio de pesquisa
realizada na Biblioteca Benedito Leite através do Jornal Pequeno, porém ao longo da pesquisa,
percebemos que apesar de continuar latente a presença de publicações referentes a terreiros nas
páginas de casos policiais, a incidência vai diminuindo aos poucos comparada ao observado em
décadas anteriores, como a de 1930, por exemplo.
Durante o processo de procura das matérias no referido jornal, observamos que o índice mais
considerável de publicações sobre isso está em maior evidência nos primeiros anos desta década, mais
precisamente nos anos de 1951 e 1953, em que encontramos manchetes destacando a opressão da
polícia a esses cultos, ou seja, na segunda metade desta década os casos no jornal vão se tornando mais
esporádicos. Na realidade, neste periódico não encontramos outras publicações referentes a isso. É
importante inferirmos que, apesar de percebermos uma singela diminuição daqueles casos no
periódico, não convém afirmar que a opressão aos terreiros amenizou. Segundo Santos e Santos Neto
(1989, p.119), o período de terror aos terreiros de São Luís esteve instaurado do ano de 1930 a 1945 e
prolongando-se até o governo de Eugênio de Barros (1951 – 1956).
No Maranhão o contexto político no início dos anos de 1950 esteve marcado por um conjunto
de fatores que denotavam a continuidade do poder político nas mãos do Senador Vitorino Freire,
membro do Partido Social Democrático (PSD) desde a década de 1940, considerado o primeiro grande
oligarca no Maranhão. Segundo inúmeros pesquisadores do período, o forte elo deste político com o
Tribunal Superior Eleitoral (TSE), garantia a manipulação das urnas adversárias e consequentemente
viabilizava a eleição de seus candidatos.
O ano de 1950 era um ano de eleições em que concorriam ao governo do estado Eugênio de
Barros, candidato de Vitorino Freire e Saturnino Belo, candidato das oposições. Eugênio de Barros
venceu as eleições, no entanto a oposição fez diversas reivindicações devido ao resultado, segundo a
oposição fruto de uma ação fraudulenta, tais reivindicações culminaram com a Greve Geral de 1951,
que resultou em um conjunto de manifestações violentas como destruição e quebra-quebra, além de
paralisação de trabalhadores. Após a greve a cidade de São Luís recebeu o apelido de Ilha Rebelde.
Diante dessa breve contextualização histórica do início da década de 1950, partiremos agora
para pontuarmos algumas matérias do Jornal Pequeno, publicadas nos anos de 1951 e 1953, que
demonstram a opressão e o preconceito - direcionados aos terreiros de cultos afro pelas autoridades.
A matéria que destacaremos agora é um pouco extensa, chegando a ocupar duas páginas do
jornal, deste modo procuramos transcrevê-la parcialmente, de maneira que sejam enfatizados os pontos
mais relevantes.
VISITOU JORNAL “PEQUENO UMA PROFISSIONAL” DA “CURA”.
“Mãi Odinéia” contou ao repórter toda sua história (Jornal Pequeno – 18/08/1951)
De nada adianta a ação dos delegados visando acabar com as curas e os “pai de
santo”. No Brasil, a pagelança impera em todos os cantos. Muita gente, sem profissão
definida, vive da macumbaria, graças ao pouco grau de cultura de nossa gente. E o
mais gosado é que mesmo gente instruída se mete em pagelança, incrementando
ainda mais sua prática.
A Macumba no Brasil prolifera como saúva. (...)
A própria polícia já oficializou a cura, pois fornece licença para os tambores de Mina
e na sombra dos tambores de Mina e na sombra dos tambores são feitas as “curas”.
Uma pequena taxa recebida, é suficiente para que os macumbeiros “brinquem” á
vontade.
VISITANDO JORNAL PEQUENO
Há poucos dias chegou á redação deste órgão uma senhora, com intuito de fazer uma
reclamação. Pelo seu aspecto, notamos que se tratava de uma adepta de Nagô. (...)
Tratava se de Djanira Odinéia Pereira Mendonça, filha do velho Quintino José
Pereira, funcionário aposentado do Estado. (...)
Eu sou “Mãi Djanira” que trabalhava na Rádio Difusora do Amazonas. Tenho
também tambor de Mina em Belém do Pará, no bairro do Guamai e em Porto Velho.
(...)
Ao regressar a S.Luís-continuou a profissional da Macumba, já dansei no Pará
Gouveia, no Dona Delfina e estive também brincando no tambor de Dona Vergilia,
em Olho D’agua. Dansei na Cura de Janoca, me espalhei no Angelin, na casa do
Mximiano, na casa de Mai Anastácia, no Outeiro da Cruz e na casa de Odília no
Areal. O delegado de Ribamar não gosta de mim. Chegou a dizer que manda cassar a
licença do tambor onde eu dansar. (...).
Nesta publicação podemos notar o discurso preconceituoso da imprensa ao inferir em alguns
pontos questões que denotam um parecer etnocêntrico acerca das expressões culturais afrodescendentes. Convém ressaltar que, procuramos manter toda a escrita da manchete de acordo com o
publicado, para não comprometer a transcrição da fonte, logo o uso das aspas, assim como outras
peculiaridades da grafia estão seguindo o modo com que foi escrito no jornal naquele período.
Dentre os pontos que percebemos o teor de preconceito mais evidente, destacamos o
seguinte: “muita gente, sem profissão definida, vive da macumbaria, graças ao pouco grau de cultura
de nossa gente”. Nessa pequena parte é notória a questão preconceituosa com que se posiciona a
imprensa diante da religião afro-brasileira, e ainda no final da manchete vimos outro ponto relevante
a ser comentado, a saber: “o delegado de Ribamar não gosta de mim. Chegou a dizer que manda
cassar a licença do tambor onde eu dansar”. Nesse outro momento da matéria fica claro que há uma
articulação de autoridades locais interferindo em atuações de manifestantes do culto afro caso não
gostem das pessoas que executem a representação cultural, para tanto a opressão diante dessas
manifestações religiosas não sofrem intolerância apenas mediante códigos de postura locais, mas
também ocorrem abusos de autoridades de certos delegados que se utilizam de seu cargo para intervir
em questões de antipatia pessoal, o caso do delegado de Ribamar em relação à mãe Odinéia citados
na matéria anteriormente.
Dando continuidade às notícias sobre a intolerância à religião afro-brasileira, destacamos
uma que não possui o mesmo conteúdo das que estávamos encontrando naquele período, trata-se de
um manifestante dos cultos afro, foi o que deduzimos por conta do seu nome peculiar.
MACUMBARIA
JORNAL PEQUENO - 29/08/1951Aruanda se dirigiu ao Jornal Pequeno falando sobre Macumbaria. A propósito de
uma reportagem que publicamos a 18 do corrente, ele diz: “De fato, no Brasil, a
Macumba” muito tem se desenvolvido nestes últimos tempos. Porém, bem pouca
gente, especialmente aqui no norte, se tem dedicado ao estudo do assunto. O que está
faltando é orientação aos “médiuns” ou dirigentes de “terreiros”, “grupos” ou
“centros”, onde de pratica o espiritismo de “Umbanda”.
Depois de dizer que a “Umbanda” em mão de gente boa, é cousa muito boa..Aruanda
acrescenta:
“Os pesquisadores e mui especialmente os médiuns e espíritas devem ler obras como
Umbanda e Quimbanda”, de Lourenço de Braga, “Trabalho de Umbanda” ou Magia
do Pratio, do mesmo autor, etc, etc. além de outras existentes sobre a “Magia
Divina”, para que saiba que o “Espiritismo de Umbanda” é fonte de onde também se
colhe água cristalina.
Nesta notícia o comunicante que se dirigiu ao jornal atenta para a necessidade de que os
manifestantes de dois cultos específicos: a Umbanda e o Espiritismo, procurem estudar um pouco mais
das doutrinas de suas religiões e ainda afirma que “a Umbanda em mão de gente boa, é cousa muito
boa”, sugerindo que a doutrina possui seus poderes para efeitos ruins, Aruanda recomenda ainda obras
de um determinado pesquisador: Lourenço de Braga, enquanto fonte para leituras acerca daqueles
cultos religiosos.
Neste sentido, a partir da leitura dessas duas notícias obtém-se a idéia de que mesmo com o
movimento de coerção aos terreiros naquele período ser algo freqüente, os manifestantes explicitavam
sua indignação às autoridades através da imprensa, e indicavam novas posturas dos praticantes no que
se refere à necessidade de estudos teóricos de sua religião.
Outra reportagem mostrando a prisão de uma praticante da cura foi publicada aos 11 de Junho
de 1953, e o título da matéria era “Outra Curandeira nas Grades”, mas a notícia tratava de um caso
ocorrido no Rio de Janeiro, onde acusada foi presa em flagrante por ordem do Serviço de Repressão a
Tóxicos e Mistificações daquela cidade. Como não se trata de um caso ocorrido em São Luís, não nos
estenderemos aos comentários do fato, porém achamos relevante registrar no trabalho a ocorrência de
mais uma publicação apontando a intolerância às práticas religiosas afro-descendentes.
A reportagem que iremos destacar agora revela a proximidade que pessoas de camadas de
maior poder aquisitivo da sociedade - como políticos - por exemplo, com a religião afro-brasileira.
RECORRE À MACUMBA PESSOAL DO GOVERNO
JORNAL PEQUENO - 22/10/1953
Pedro Brito esteve no “terreiro” de Negreiros
Não confiando no prestígio eleitoral de que já desfrutou, por um descuido do nosso
povo, o sr. Vitorino Freire, aterrorizado pelo fantasma que lhe não sai do pensamento,
quantas vezes se recorde do senhor Afonso Matos, resolveu enviar, ao Turú, anteontem, o seu sobrinho Pedro Brito, afim de consultar o famosíssimo Negreiros.
O jovem bacharel, temeroso de que não fosse eficiente o “trabalho” do Negreiros,
tomou como proteção a companhia de Ali Kan, certo de assim o “serviço” sairia
perfeito, na medida da “encomenda” do senador Vitorino.
Formada a mesa , invocados os “pais dos santos”, sacrificada a galinha preta e posto
para S. Longuinho o guia do terreiro, sentenciando pela boca do Negreiros: -“Vejo
um velho baixo, de pernas finas, com roupa escura e chapéu de atalhar água, neste
momento, ajoelhado num hotel, bem defronte uma igreja, nu da cintura pra baixo,
resando um terço para S. Cosmo e S. Damião.
Em meio à descrição feita por Negreiros, surgiu a voz impaciente do Pedro Brito:
- “É esse mesmo! ... Quer dizer que ele vai vencer?...
- A sentença do guia, pela voz do Negreiros, não se fez esperar:
-
Não! Os “santos” estão mostrando o candidato que vai perder...
A matéria nos revela a forte crença de políticos, nos poderes de representantes da prática da
religião afro-brasileira em São Luís, neste caso - Negreiros - conhecido pai-de-santo do período. Como
vimos, há uma descrição de procedimentos do culto para obtenção de informações do interesse do
cliente – Pedro Brito, sobrinho de Vitorino Freire e, independente do modo como tenha sido realizada
a sessão, a notícia não nos demonstra sinais etnocêntricos e preconceituosos em relação à
representação religiosa do pai-de-santo. Embora aparente exagero em nossa interpretação é possível
notarmos uma sutil abertura da imprensa ao abordar cenas dessas expressões religiosas, através de uma
retórica menos agressiva, uma vez que nas reportagens que mostramos do Jornal O Imparcial dos anos
1930, o discurso preconceituoso ocorria com um fluxo bem mais freqüente.
Ainda em relação às reportagens enfocando a intolerância aos terreiros destacamos esta que
aborda o comentário de um jornalista chamado Theodoro Brasão e Silva, que publicou no periódico
Folha do Norte do estado do Pará, matéria com o título “Codó, a cidade dos paradoxos”. Na
reportagem do Jornal Pequeno titulada: “Macumba e Nudismo imperando em Codó”, há comentários
da matéria de Theodoro que enfatizou a falta de opções de lazer para famílias naquela cidade, além de
fazer uma crítica ao modo como as mulheres daquele lugar se comportam, o mesmo afirma que muitas
possuem “vida fácil”. Como a matéria é longa, perpassa por questões como o nudismo em praias e
outros assuntos que não nos interessa abordar no momento, preferimos transcrever parcialmente a
matéria, onde os pontos mais relevantes comentaremos posteriormente.
MACUMBA E NUDISMO IMPERANDO EM CODÓ
JORNAL PEQUENO - 28/10/1953
(...) Enquanto a elite se retrai, o “terecô”, como ali chamam a macumba, e candomblé,
tocam os seus tambores quase todas as noites. E há danças nos terreiros. Ouvia do
meu quarto, não somente o bater ritmado dos instrumentos de percussão como
também os cantos, essa reminiscência de africanismo que o escravo nos trouxe de
permeio com as suas qualidades de verdadeiro animal de carga e nos deixou numa
marca indeleva de seu fetichismo e de sua credulidade superticiosa. (...)
Apesar desta reportagem não falar de um caso de São Luís, sentimos a necessidade de destacar
o modo pelo qual o referido jornalista se porta diante das expressões religiosas afro-descendentes de
Codó. Lamentavelmente Theodoro foi bastante infeliz em suas afirmações ao caracterizar as
influências culturais dos negros da maneira mais depreciativa possível, essencialmente ao afirmar que
são “qualidades de verdadeiro animal de carga e nos deixou numa marca indeleva de seu fetichismo e
de sua credulidade supersticiosa”.
Ao contrário das matérias anteriores em que não está explícito o teor de preconceito em
relação à religião afro, esta última apesar de o Jornal Pequeno estar comentando uma reportagem
publicada em jornal de veiculação no Pará, não demonstrou nenhuma preocupação da imprensa local
em amenizar o discurso carregado de preconceito e racismo acerca do culto realizado em Codó. Logo,
podemos entender que a passividade diante do assunto infere um lamentável equilíbrio de preconceitos
entre os dois jornais, a saber: Folha do Norte e Jornal Pequeno.
3.2 Breve abordagem do cenário nacional e internacional da década de 1960
A década de 1960 está inserida em um contexto histórico que revela o quanto se tratou de um
período de grande efervescência em inúmeros aspectos sociais, culturais e políticos a serem destacados
no âmbito nacional e internacional. Sobre o prisma da música mundial o rock ganha crescente
popularidade e lança importantes bandas como Beatles e Rolling Stones. O Rock and Roll desponta ao
longo desta época, e remete essa musicalidade a um elo com aquele momento que sugere uma fase de
intensas contestações políticas. O processo de Descolonização da África e a Guerra do Vietnã são
ainda importantes acontecimentos que ocorrem nesta década.
No âmbito nacional, incide ainda uma série de fatos que denotam a relevância da década na
historiografia. No ano de 1960 ocorre a fundação da cidade de Brasília, cidade idealizada pelos
arquitetos Lúcio Costa e Oscar Niemayer, inaugurada por Jucelino Kubtschek, que passou a ser a
capital do país. No ano seguinte Jânio Quadros assume a Presidência da República, tendo em vista sua
renúncia pouco tempo depois, assume o vice João Goulart que é deposto em 1964 pelo Golpe Militar,
sobre o pretexto de suas pretensões comunistas.
No que tange a cultura musical brasileira, houve uma efetiva movimentação acerca dessas
mudanças sociais, logo era comum a composição de letras que retratassem o contexto sócio-político da
época. Um exemplo claro disso eram os diversos festivais de música brasileira que eram mediados por
emissoras de televisão como a TV Record, por exemplo. Vários nomes da Música Popular Brasileira
foram lançados nestes festivais que agitavam o público de todas as idades, programas como “Jovem
Guarda”, veiculado a partir de 1965, com a apresentação dos jovens cantores e ídolos juvenis Roberto
Carlos, Erasmo Carlos e Vanderléia - o programa era líder de audiência e foi um dos grandes
responsáveis em por a música brasileira em sintonia com um emergente fenômeno internacional, o
rock, que por sua vez abriu caminhos para novos padrões de comportamento em todo o mundo.
Outro importante estilo musical que já desenvolvia seu embrião desde a década de 1950 foi a
Bossa Nova, e que esteve bastante ligado ao contexto desenvolvimentista e urbanista do início da
década de 1960. O estilo demarcava um modo mais peculiar de cantar o samba, era o cantar falado, ou
cantar baixinho. Considerado um estilo musical que atraía as elites teve como seus principais
representantes João Gilberto, Antônio Jobim e Vinícius de Morais.
E para finalizarmos essa breve abordagem do cenário musical do período, é necessário
destacarmos ainda o Tropicalismo, movimento que surge através de encontro de vários baianos no
Festival de Música Brasileira, veiculado na TV Record.
O movimento esteve bastante atrelado às propostas lançadas pelos intelectuais de 1920 e 1930,
como Mário de Andrade, Tarsila do Amaral, Anita Malfatti, Oswad de Andrade, dentre outros, os
quais pregavam a Antropofagia, isto é, o ato de digerir a cultura exportada de países como Estados
Unidos e os da Europa, e expeli-las depois, com o intuito de desenvolver uma mesclagem com a
cultura popular e as identidades nacionais, com o objetivo de demonstrar essa heterogeneidade
cultural, o que não nos permite dizer que traz uma cultura menos rica.
Em linhas gerais, embora o Tropicalismo tenha sido bastante criticado na época por não ter o
interesse em compor nas suas letras expressão de contestação político – ideológica comum naquele
momento, os seus representantes defendiam-se através do discurso de que acreditavam no movimento
artístico e estético enquanto objeto revolucionário, capaz de realizar suas devidas mudanças. Os
representantes do Tropicalismo eram Caetano Veloso, Gilberto Gil, tom Zé, Torquato Neto, entre
outros.
Como vimos, o período em destaque esteve de fato marcado por mudanças que culminaram em
um processo de inovações culturais nos mais diversos setores, essencialmente no âmbito musical que
estava bastante receptível as influências externas.
Neste sentido, não podemos deixar de abordar outros fatos conjunturais de extrema relevância,
a exemplo disso, convém abordar o evento político de maior proeminência do período, o Golpe Militar
de 1964.
Como havíamos citado anteriormente, em 1961 Jânio Quadros renuncia a Presidência da
República após apenas sete meses de governo, com isso assume seu posto o vice João Goulart. O
político representava de certa forma o modelo do governo populista adotado por Getúlio Vargas, sua
atuação na presidência esteve marcada por inúmeras crises políticas que se agravaram
consideravelmente ao longo dos anos.
Em suma, diante das diversas tensões presentes no governo de Goulart - das quais não iremos
demonstrar em pormenores, pois não é o objetivo do trabalho - no dia 1° de Abril de 1964 é realizada a
deposição do então presidente, devido um movimento desencadeado por militares, na ocasião assume a
presidência Ranieri Mazzilli, presidente da Câmara dos Deputados. Após aproximadamente uma
semana a cúpula do movimento decretou o Ato Institucional n°1, que conferia ao Congresso o poder
de eleger o novo presidente. Assim o general Humberto de Alencar Castelo Branco tornou-se aos 15
de Abril de 1964 o chefe do estado maior do Exército.
Segundo Freda Indursky (1997, p.15), o Golpe de Estado do ano de 1964 significa uma ruptura
do modelo político lançado por Getúlio Vargas – o Populismo - que teve sua continuidade através do
governo de João Goulart. Assim coloca Indursky (1997, p.197) acerca das várias implicações
resultantes do Golpe Militar:
Dentre as várias conseqüências que lhe seguiram, destaca-se, de imediato, a
suspensão das formas constitucionais de representatividade, substituídas no exercício
do poder pelas Forças Armadas que, pretextando salvar a pátria da corrupção, da
desordem, do desmando e do comunismo, elaboraram a doutrina da segurança e do
desenvolvimento nacionais.
O movimento instaurado pelos militares perpetuou-se no poder durante vinte anos, o que
resultou em uma fase de grande opressão a sociedade, uma vez que, vivia-se um Estado de Ditadura
com o governo autoritário imposto pelos militares.
4. DIMINUIÇÃO DA OPRESSÃO AOS TERREIROS DE SÃO LUÍS NA DÉCADA DE
1960
Diante dessa breve abordagem acerca dos episódios importantes que aconteceram no Brasil e
no mundo no período que compreende a década de 1960, daremos continuidade ao estudo relativo ao
processo de coerção aos terreiros de cultos afro no Maranhão, e neste sentido nossa pesquisa procurou
observar quais seriam as possíveis causas da diminuição de publicações em jornais, de manchetes que
destacavam o cenário das casas de religião afro-brasileira enquanto alvo constante das autoridades
locais, por serem “responsáveis” em perturbar a ordem pública.
Procuramos observar jornais de circulação diária no período que compreende os anos de 1960 a
1969, desse modo o Jornal Pequeno foi nosso principal objeto de análise, no entanto como nosso
objetivo era perceber esse processo de diminuição às perseguições, sentimos a necessidade de
pesquisar períodos anteriores, por tanto observamos outros trabalhos que abordam a mesma temática mas em períodos diversos, como monografias, boletins da Comissão Maranhense de Folclore, dentre
várias outras fontes. Assim, observamos também o referido jornal na década de 1950, e para obtenção
de resultados positivos na pesquisa, nos debruçamos em idas quase diárias à biblioteca Pública
Benedito Leite durante o período de março a setembro de 2007.
A idéia de procurar perceber se houve ou não uma possível diminuição das perseguições aos
terreiros de São Luís, surgiu a partir do momento em que através de algumas leituras, vimos que a
Federação de Umbanda e Culto Afro-Brasileiro do Maranhão (assim é chamada atualmente) havia sido
fundada na década de 1960. Com isso, estabelecemos algumas conjecturas que nos levavam a acreditar
em uma provável abertura às manifestações religiosas afro-brasileiras no Maranhão naquele período,
pois se havia uma entidade institucional ligada às práticas religiosas afro-descendentes nascendo
naquele momento, deduzimos que poderiam existir fatores hegemônicos favorecendo para tais
acontecimentos. Sobre essa questão, abordaremos mais à frente a partir de breve contextualização das
lideranças políticas no período que compreende o momento de fundação daquela entidade.
Para tanto tivemos o objetivo de verificar qual a relevância da instituição aos terreiros a ela
cadastrados, no que tange a questão da sua legitimação perante as autoridades estaduais, ou seja, quais
mecanismos legais iriam favorecer a livre expressão daquelas manifestações religiosas.
A respeito da diminuição das coibições a que nos referimos anteriormente, percebemos que há
uma significativa mudança no que tange à quantidade de matérias veiculadas, ou seja, há um número
menor dessas destacando o preconceito da imprensa e da sociedade de maneira geral, e da punição da
polícia àqueles cultos. Uma outra questão interessante a ser abordada é que encontramos reportagens
que em seus títulos aparentavam falar sobre preconceito com a religião afro-brasileira, no entanto
abordavam casos de charlatanismo dos que se camuflavam enquanto curandeiros, ou diziam estar com
espíritos encantados para extorquirem dinheiro ou cometer ações para interesses próprios, agredindo a
fé daqueles que acreditavam no poder dessas práticas religiosas. Por tanto, não selecionamos essas
matérias, nem iremos transcrevê - las neste trabalho, pelo fato de não estar dentro de nossas pretensões
abordar esses pontos nesta pesquisa.
Nesse sentido, iremos inicialmente demonstrar as notícias selecionadas por nós referentes ao
período estudado, seguindo o mesmo mecanismo de transcrição das manchetes que destacamos
anteriormente, isto é, deixaremos a escrita das notícias exatamente como estavam no periódico de
modo que não venha comprometer seu conteúdo.
Ainda no início do ano de 1960, encontramos uma notícia que fala do aparelho policial que
recebe dinheiro dos responsáveis pelos terreiros para que possam realizar suas festas.
O LÍNGUA DE TRAPO
JORNAL PEQUENO - 23/01/1960
A Polícia recebe dinheiro para que macumbeiros façam suas batucadas e em
conseqüência muita gente fica com os ouvidos azucrinados.
Segundo carta chegada à mesa do Língua de Trapo, o curador de Brasília não
satisfeito com a cantoria até altas horas da noite, resolveu arranjar alguns tambores
que funcionam a partir da meia noite, prolongando-se até as 6 da manhã, num
atentado patente ao sossego público.
Essa matéria nos levou a destacar duas questões pelas quais achamos relevante discutirmos, a
primeira trata do fato de a polícia extorquir dinheiro dos terreiros e só assim haver a permissão para
realização de suas manifestações, a segunda é por conta de não haver um argumento que nos leve a
crer que o motivo da polícia invadir e atrapalhar os cultos nos terreiros, de acordo com essa matéria,
seja em virtude do preconceito para com a prática religiosa ou por qualquer outra razão etnocêntrica, e
sim devido ao fato de as festas terminarem muito tarde, além disso, a sonoridade alta, segundo a
notícia, agride o padrão da ordem pública.
Ainda no início da década já se vê manchete publicando a coerção aos praticantes da religião
afro-brasileira.
“PAJELANÇA NO ALTO DO BODE
JORNAL PEQUENO -23/01/1960
Invocando ‘gente do fundo’ para ‘curar’ um doente – lenço, defumadores, dentes de
alho e vellas”.
O nosso repórter resolveu ontem, às 21 horas dar um gyro pela zona do Matadouro,
porquanto, há dias, tinha sido prevenido por alguns leitores d’ O Globo de que
ultimamente se vinham realizando alli, várias “sessões” de pagelança.
Foi bem sucedida a nossa reportagem. No “Alto do Bode”, em casa de Graciliano, a
macumba estava formada. Não havia maracá, todos cantavam baixinho em redor de
fogereiro. A casa estava cheia de fumaça, ao meio da sala uma mesa com um santo e,
junto deste um lenço grande de cor verde tendo marcadas a um canto a palavra
Francisca, e no centro Veraquete, ambas com linhas encarnada. Ao lado do lenço
duas velas inteiras, uma garrafa de álcool, vários dentes de alho, defumadores, 3
charutos, duas notas de 5$000 e cinco pratas de 1$000.
Tratava-se de curar um homem que alli também se encontrava doente. Os 15$000
eram o pagamento da consulta...
Chefiava o grupo, Faustino dos Anjos, figura bastante conhecida naquellas
redondêsas. Ao lhe perguntarmos o que estava fazendo, encolheu os ombros, passou a
basta cabellereira e falou:
-“Ah! Não tenho explicações, ouviu?” Continuamos apreciando a “festa”. Em de
repente, o carro da polícia veio estragar tudo... Foi um corre-corre horrível. Houve
um que se escondeu até atráz de u’a mala...
O carro ficou cheio. Apezar da escuridão, conseguimos contar 12, sendo seis
mulheres, quatro homens, um menino, uma menina, que vieram para polícia...
E era uma vez a “macumba”...
Essa notícia nos mostra que a opressão a manifestações religiosas como a pajelança, permanece
ocorrendo ao longo dos anos, o que nos leva a perceber que por mais severas que sejam as autoridades
no que tange essas expressões culturais, estas permanecem com sua trajetória de resistência apesar de
todas essas adversidades.
Embora pareça contraditório, no mesmo dia, mês e ano, vimos uma notícia que revela uma
demonstração de abertura aos terreiros afirmando que os mesmos passarão a ser legalizados.
TERREIROS DE MINA SERÃO LEGALIZADOS – 180 TERREIROS
JORNAL PEQUENO-24/05/1961
O delegado José Maria Tupinambá Moscoso, titular da Delegacia Auxiliar, continua
insistindo na legalização de todos os terreiro de mina e tendas espíritas. A medida,
segundo aquela autoridade policial, é para todo e Estado. Disse-nos Moscoso que
somente em São Luís existem cêrca de 180 terreiros de mina e todos só poderão
funcionar, a partir de mês de curso, e devidamente legalizados.
A tentativa de legalização dos terreiros pelo delegado José Maria Tupinambá Moscoso como
está posto na matéria, nos permite observar que o movimento existente dentro da polícia de coerção a
esses espaços religiosos, é um movimento de caráter heterogêneo (NUNES, 2006). Convém lembrar
que durante o governo do interventor Paulo Ramos, o delegado Flávio Bezerra era um dos mais
terríveis inimigos dos pais e mães – de - santo devido sua atuante ação contra os cultos afro de São
Luís, mas nem por isso todos os policiais da época concordavam com as ações do delegado, assim
verifica-se que a postura dos profissionais da polícia divergiam entre si, diante das questões acerca da
religião afro-brasileira.
Neste sentido, embora tenhamos discutido desde o início do trabalho a questão do processo das
perseguições policiais aos terreiros de culto afro, de uma maneira geral, a diminuição dessas
perseguições em que procuramos pesquisar nas mais diversas referências, nos permite destacar,
sobretudo, uma mudança para os umbandistas desde o final da Ditadura Vargas, os quais tiveram mais
liberdade para praticar sua religião (TRINDADE, 1991, p.93).
Na realidade, segundo Trindade (1991, p. 91), a umbanda avança bastante a partir de 1945, o
que propicia uma participação maior desses adeptos em setores representativos da sociedade, inclusive
na política, pois em virtude do número considerável de umbandistas crescendo naquele momento, era
possível colocar no poder candidatos de sua religião.
No Maranhão, um dos vereadores que compunha a câmara municipal na década de 1960, era o
umbandista José Cupertino, que foi o primeiro vereador umbandista do Maranhão, e além do cargo
político possuía um programa na rádio Gurupy, em que realizava convites ao público para os festejos
nos terreiros, e fazia ainda reclamações por melhorias nos bairros no que se refere à urbanização,
dentre outros aspectos.
Voltando para a demonstração das reportagens no Jornal Pequeno, encontramos uma que
destaca exatamente uma reclamação do vereador a questões de melhoria urbanística. Em função do
péssimo estado de conservação da página que se encontrava esta matéria, não pudemos identificar
todos os termos ali escritos, logo achamos mais coerente não transcrevermos a matéria aqui e somente
fazer um breve resumo da mesma.
A notícia tem como título Cupertino com a Palavra, publicada em 25 de junho de 1966, e
destaca a reivindicação do vereador por uma melhor iluminação no bairro do João Paulo, enfatizando a
necessidade disso para a realização das apresentações juninas no bairro.
Além de desenvolver um trabalho voltado para melhoria dos bairros de São Luís de uma
maneira geral, o vereador buscava em seus projetos melhores condições de vida para a população mais
carente12.
No que tange a uma razoável diminuição das perseguições a religião afro, a manchete que nos
chamou bastante atenção foi esta que mostraremos a seguir:
QUIMBANDA
JORNAL PEQUENO - 24/03/1966
Olho mau, inveja ou ódio. Se você for vítima, procure a Casa de Umbanda Ogum
Beira Mar, a Rua da Vitória n° 17, João Paulo escolha o Talismã e o Defumador de
Defesa.
Deste modo, a manchete revela que embora ainda continue a intolerância àquelas práticas
religiosas, há uma certa abertura no sentido de que haja o anúncio de seus trabalhos e endereço para
12
FERRETTI, Sérgio e LINDOSO, Gerson Carlos Pereira. Religiões Afro-Maranhenses no Cenário Político-a trajetória de
três pais-de-santo na Câmara Municipal de São Luís. XXVII Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação.
que a sociedade possa conhecer suas atividades através da imprensa, entendemos com essa notícia que
lentamente vai se desencadeando uma tímida liberdade de expressão aos manifestantes da religião
afro-brasileira em São Luís.
Desta forma, enquanto encontramos somente essa propaganda de um terreiro anunciando seus
serviços na Quimbanda, era bastante recorrente no período de 1950 a 1960, encontrarmos anúncios de
festejos católicos no jornal pesquisado, logo tomando-se como exemplo contextos anteriores, é
necessário estabelecer comparações que nos remetem a perceber uma pequena mudança no cenário das
representações da religião afro-brasileira, isto é, atenuam-se os preconceitos explícitos na imprensa
comuns outrora.
4.1 A Legitimação de Terreiros de Umbanda em São Luís
Assim, após discutirmos a pequena retração do número de matérias sobre intolerância aos
terreiros - sobretudo na década de 1960, é necessário relembrar que há um considerável número de
casas de umbanda sendo registradas no mesmo período. Como vimos no capítulo anterior, várias casas
de culto afro são registradas (e nem todos eram de umbanda) e tem publicado seus estatutos no Diário
Oficial do Estado.
Ao nos depararmos com esse material, percebemos que eram dados valiosíssimos que só
ratificavam nossas inquietações acerca do tema proposto neste trabalho. Embora já tenhamos citado
alguns destes terreiros no capítulo anterior, colocaremos agora os nomes de todos encontrados:
Associação Ogum Otá, Tenda Umbanda Salão da Boa União, Tenda Umbandista São José, Tenda
Umbandista Caboclo Ita, Tenda Umbandista José Tupinambá, Tenda de Umbanda Salão da Boa
União, Tenda Umbandista São Cosme e Damião, Terreiro de Mina Rei Sebastião e Centro
Espiritualista de Tambores Iemanjá.
Segundo Gonçalves (1994, p. 114) a umbanda inspira-se em associações civis com o objetivo
de estabelecer sua organização sócio-religiosa, desse modo os terreiros passam a se constituir a partir
da elaboração de estatutos que discorriam os devidos cargos como presidente, secretário, tesoureiro
além de outras seções como o conselho de rituais, por exemplo. Com a elaboração organizacional, os
sócios de cada associação devem pagar uma taxa para a manutenção da entidade.
Desse modo podemos perceber que a publicação dos estatutos das casas de culto é uma
expressão clara do processo de legitimação dessa religião na década de 1960. Apesar de a coerção as
casas de religião afro de São Luís ter continuado - como percebemos através das matérias citadas -
com o fim da Ditadura de Vargas em 1945, têm início o processo de redemocratização e a perseguição
aos terreiros de Umbanda diminui severamente13.
Neste sentido, a Igreja Católica passa a dialogar com as religiões não cristãs através de um
pluralismo litúrgico e passa a reconhecer a umbanda enquanto religião. Infelizmente com isso não
podemos dizer que o preconceito tenha acabado interinamente, no entanto viabilizou um momento
mais ameno para essa e outras expressões de religião afro-brasileira.
Afirmar que houve uma certa tranqüilidade de expressões da umbanda e de outras religiões
afro-brasileiras no período que compreende a década de 1960, é coerente a partir do momento em que
leva-se em consideração que durante a Ditadura Militar a umbanda é institucionalizada enquanto
religião. Vagner Gonçalves (1994, p. 117) cita Diana Brown que assim se refere a isso:
(...) a ditadura apoiou os ganhos políticos e sociais alcançados nos 15 anos anteriores
e auxiliou a sua institucionalização. Foi sob a ditadura militar que o registro dos
centros de umbanda passou da jurisdição policial para a civil [em cartório], que a
umbanda foi reconhecida como religião no censo oficial, e que muitos dos seus
feriados religiosos foram incorporados aos calendários públicos locais e nacionais, de
caráter oficial.
A permissão legal para efetuar suas representações religiosas e o apoio do governo foram
importantes conquistas da religião, deste modo com o seu avanço pelo Brasil alguns aspectos positivos
foram rapidamente notados, no Maranhão houve os reflexos dessas conquistas de âmbito nacional,
logo partiremos agora para abordar um dos elementos desses reflexos - a Federação de Umbanda e
Culto Afro -Brasileiro do Maranhão enquanto órgão que colabora com a legalização do funcionamento
dos terreiros de São Luís.
4.2 A Criação das Federações de Umbanda e Cultos Afro-Brasileiros
O Maranhão é um estado brasileiro com um dos maiores índices de população negra, logo o
contingente de expressões da religião afro-descendente é algo bastante recorrente, com isso já era de se
esperar o grande número de terreiros em todo o estado.
As práticas religiosas afro-brasileiras no estado possuem uma certa diversidade, como exemplo
podemos citar o tambor de curador que está mais associado a práticas terapêuticas, o terecô mais
praticado na cidade de Codó, o tambor de mina, tema de diversos trabalhos de pesquisadores, dentre
outros. Em relação ao tambor de curador, convém destacar que este chega a São Luís depois do tambor
13
JENSEN, Tina Gudrun. Discursos sobre as religiões afro-brasileiras - Da desafricanização para a reafricanização.
Disponível em http://www.pucsp.br. Acesso em 20 de Dezembro de 2007.
de mina, devido à pajelança ser bastante perseguida pela polícia, em função de não ser considerada
uma religião, mas prática de curandeirismo14.
Neste contexto, muitos curandeiros passam a responder enquanto umbandistas para fugir da
repressão policial.
Voltando a questão da organização institucional a qual nos referíamos, a umbanda através de
inspiração das federações kardecistas passa a criar suas próprias federações, sendo que a primeira é
criada por vários umbandistas, dentre eles Zélio de Morais, no ano de 1939 no Rio de Janeiro, que era
chamada de União Espírita do Brasil, responsável pela articulação do Primeiro Congresso do
Espiritismo de Umbanda que ocorre no ano de 1941. (GONÇALVES, 1994, p.115)
A partir da década de 1940, a religião prolifera-se em vários estados, como São Paulo e Porto
Alegre e no Maranhão chega por volta da década de 1960, através de José Cupertino que conheceu a
umbanda no Rio de Janeiro e a trouxe para seu estado com o intuito de oferecer aos curadores um
respaldo legal15.
Com a institucionalização da umbanda e a criação das federações, a religião desenvolve um
processo de maior respeito diante das autoridades policiais, uma vez que o objetivo principal das
federações dentre vários aspectos é fornecer assistência jurídica aos terreiros que a ela estiverem
cadastrados, isto é, respalda-los legalmente perante as perseguições policiais, além de realizar
patrocínio de cerimônias coletivas, fiscalizar os terreiros filiados e até mesmo impor algumas
regulamentações aos rituais – em relação a essa questão abordaremos mais detalhadamente as funções
dos membros da Federação de Umbanda e Culto Afro-Brasileiro do Maranhão no próximo item.
Ao longo dos anos com o processo de legitimação perante a sociedade e setores
governamentais, a umbanda aos poucos vai alcançando o seu espaço inclusive em cerimônias coletivas
em espaços públicos, como a festa realizada anualmente em homenagem a Iemanjá, entidade espiritual
conhecida como rainha do mar. No ano de 1967 essa data foi aclamada como o dia dos umbandistas
(GONÇALVES, 1994, p.115).
Faz-se necessário abordar que esse processo de legitimação que a umbanda recebe na década de
1960 tem amplas relações com o contexto político nacional. A Ditadura Militar reconhece oficialmente
a umbanda enquanto religião, devido este regime político está diretamente voltado ao projeto
nacionalista e entendemos que o fato de a umbanda ser intitulada enquanto uma religião genuinamente
brasileira - ainda que tenha suas influências externas - esteja notadamente inserida nessa ideologia
desse sistema político.
14
e
FERRETTI, M. Retoma trabalho elaborado para apresentação na XXV Conférence de la Société
Internationale de Sociologie des Religions (SISR) - Séssion Thématique: Les Religions afro-americaines
aujourd´hui: permanences et transformations (Université Catholique de Leuven - Bélgica, 26-30/7/1999).
15
FERRETTI, M e SANTOS, Rosário. José Cupertino na Religião afro do Maranhão. Boletim da Comissão Maranhense de
Folclore n° 20. 2001.
Uma outra questão relevante a ser apontada, é que a umbanda vai ampliando aos poucos suas
bases políticas, aproveitando o clientelismo eleitoral vigente naquele contexto o que a favorece no que
tange o antagonismo efetivo entre a Ditadura Militar e alguns setores mais radicais da Igreja Católica –
grande inimiga da umbanda – que realizavam movimentos de oposição ao governo. (GONÇALVES,
1994, p.116)
É importante relembrar que com o fim do Estado Novo, período bastante difícil para os setores
da religião afro-brasileira, há o enaltecimento da cultura popular e dos valores negros, efetuado pelas
elites intelectuais e artísticas daquela época, nesse sentido a definição de identidade nacional vai
alcançando maior espaço e com a Ditadura Militar e seu apoio a umbanda, algumas brechas vão se
construindo para que ocorra a continuidade das práticas religiosas negras - sem que as mesmas - sejam
alvo de perseguição das autoridades policiais.
No entanto, é necessário que não venhamos a cometer o equívoco de afirmar que aquele
sistema político foi benevolente a essas expressões culturais, logo analisamos que o apoio da Ditadura
Militar à legitimação da umbanda foi bastante motivado em virtude do governo se utilizar daquela
religião para manipular as massas, propiciando desconforto aos setores que realizavam oposição ao
regime, sobretudo a Igreja Católica, que não aceitava a legitimação daquela religião.
4.3 Influência da Federação de Umbanda e Culto Afro-Brasileiro do Maranhão à redução
das perseguições aos cultos afro-brasileiros em São Luís
Com o aumento no número de devotos em todo o país, a umbanda vai ao longo dos anos da
década de 1960 e 1970 expandindo-se com grande força, e neste sentido as federações umbandistas
vão se constituindo em vários estados. Segundo Trindade (1991, p.93), essas entidades procuram
uniformizar o culto, propondo questões peculiares da orientação doutrinária, o que provoca conflitos gerando a disputa das federações pelos terreiros, os quais se filiavam a que estivesse mais condizente
com seu padrão de doutrina e ritual.
No Maranhão, a fundação da Federação de Umbanda e Culto Afro-Brasileiro do Maranhão
ocorreu na década de 1960, pelo primeiro vereador umbandista do Maranhão – José Cupertino, o
mesmo introdutor da religião no estado.
O ano de 1966 em que é registrado no Diário Oficial do estado a ata de fundação da entidade
coincide com um momento muito importante na política maranhense, pois neste mesmo ano assume o
governo do estado José Sarney Costa, “eleito com ampla maioria de votos no pleito de 3 de outubro de
1965 pelas Oposições Coligadas, num processo em que contou com o beneplácito da recém instalada
Ditadura Militar”. (CABRAL, 2006, p.21)
Como vimos a pouco, com a instalação da Ditadura Militar no Brasil, há uma redução às
perseguições nos terreiros de umbanda, porém no Maranhão mineiros e curadores continuam sendo
perseguidos pela polícia. (FERRETTI, M, 2001, p.45).
Ao contrário do que imaginamos no início da pesquisa, com a fundação da Federação de
Umbanda e Cultos Afro do Maranhão, não acaba o processo de coibição aos terreiros, o controle e
manipulação da policia a essas casas de culto continua a ocorrer. De acordo com Ferretti, M. (2001,
p.45), há grande possibilidade de essa redução ter ocorrido a partir do governo de José Sarney, pois em
sua atuação governamental são incentivados os interesses pela cultura popular, e pelo turismo. A
pesquisadora cita Jorge de Itacy16, que afirmou ter realizado juntamente com outros manifestantes de
seu terreiro, uma apresentação de dança de tambor de mina para o então presidente Marechal Castelo
Branco, para o pai-de-santo essa abertura foi decorrente da atuação da Federação.
Dessa forma, mesmo com a instalação de uma federação na defesa da liberdade dos cultos afro,
sobretudo da umbanda - há conjecturas de que o governo de José Sarney (1966-1970) tenha sido
favorável às manifestações da religião afro-brasileira no Maranhão.
A questão da proximidade do político com os cultos afro esteve mais evidente na mídia
nacional, quando foi ao ar no ano de 1994, no programa Domingo 10 - da Rede Bandeirantes
apresentado pela jornalista Marília Gabriela – que apresentou uma matéria sobre magia negra em
Codó. (FERRETTI, M, 2001, p. 87). No decorrer da reportagem houve insinuações da ligação do
senador do Amapá, José Sarney, com um importante pai-de-santo daquela cidade, Wilson Nonato de
Souza, mais conhecido como Bita do Barão, chefe da Tenda Espírita de umbanda Rainha de Iemanjá.
Dentre as várias questões abordadas nessa reportagem, José Sarney foi acusado por jornalistas de ter
solicitado algum trabalho no Maranhão de magia negra, para ascender à presidência. No período em
que foi divulgada a reportagem, esta foi interpretada enquanto uma tentativa de desmoralizá-lo no
cenário político nacional. (FERRETTI, M, 2001, p. 87).
Os indícios da forte ligação do político com a religião afro não acabam aí, a obra “Encantaria
de ‘Barba Soeira’ – Codó, capital da magia negra?” da antropóloga Mundicarmo Ferretti, explana com
riqueza de detalhes a matéria realizada pela TV Bandeirantes, tendo em vista os vários pontos
colocados pela mesma é posto um momento em que há uma conversa com Bita do Barão e este apesar
de “desconversar”, segundo o narrador da reportagem, sobre seu envolvimento com a morte de
Tancredo Neves, afirma que José Sarney deu a este pai-de-santo o título de comendador, além disso,
afirmou que “Sarney é muito amigo da religião, está sempre pedindo um ‘axezinho’ para o santo e que
não cai nunca, sempre sobe”.(FERRETTI, M, 2001, p. 87).
16
Ex-presidente da Federação de Umbanda e Culto Afro-Brasileiro do Maranhão e pai-de-santo do terreiro de Iemanjá
localizado no bairro da Fé em Deus, Jorge Itaci morreu em julho de 2003.
Ainda que a reportagem da Bandeirantes tenha especulado as relações de José Sarney com a
religião afro-brasileira praticada em Codó, nos parece coincidir muito no que tange a abertura dos
cultos afro durante o seu cargo de governador.
Assim, é possível observar diante disso e de todo o levantamento realizado através das fontes
encontradas, uma possível diminuição das coibições aos terreiros de São Luís, pois um outro detalhe
importante a ser destacado é que durante o mandato na prefeitura de Epitácio Cafeteira, esta redução às
perseguições aos terreiros também pode ser notada. (FERRETTI, M, 2001, p. 45).
Diante dessa abordagem acerca da provável abertura aos terreiros em São Luís na década de
1960, sobretudo a partir de dois acontecimentos importantes nesta década. Em 1966 assume o governo
do estado do Maranhão José Sarney e no mesmo ano é publicada a ata de fundação da Federação de
Umbanda e Culto Afro-Brasileiro do Maranhão, esta que foi criada no ano de 1964. Neste sentido
partiremos agora para explicar um pouco do que pudemos conhecer desta entidade que funciona a mais
de quarenta anos e oferece suporte jurídico aos terreiros filiados.
4.3.1 A Federação de Umbanda e Culto Afro-Brasileiro do Maranhão
Neste item reservamos o espaço para abordar um pouco de nosso contato com a Federação
Espírita Umbandista e Culto Afro – Brasileiro do Maranhão, onde temos o objetivo de citar quais
foram os presidentes, quais são as funções de cada membro, e ainda destacaremos as principais
cerimônias realizadas por ela.
Para entender o funcionamento dessa entidade, nos dispusemos a participar de algumas de suas
reuniões, que ocorrem geralmente a cada último sábado de cada mês, e nelas são discutidas questões
acerca da necessidade dos terreiros. No mês de março de 2007 participamos da reunião que ocorreu no
Parque Folclórico da Vila Palmeira e percebemos que há um procedimento religioso antes de se iniciar
as pautas, é feita a oração do Pai Nosso, Ave-Maria, Salve-Rainha e, além disso, é cantado o hino da
umbanda. No final dos comentários realizados pelo presidente do órgão - o vereador Astro de Ogum observamos que aos poucos os líderes dos terreiros se aproximavam e comentavam suas necessidades.
Participamos ainda das reuniões que discutiam a homenagem a Iemanjá no dia 31 de dezembro, no
entanto falaremos sobre isso mais à frente, visto que daremos início a uma breve abordagem sobre os
presidentes da Federação.
4.3.1.1 Os Presidentes da Federação de Umbanda e Culto Afro-Brasileiro do Maranhão
Em relação a José Cupertino de Araújo, fundador e primeiro presidente dessa entidade, além de
ser conhecido pelos seus trabalhos voltados a cura, foi vereador e procurou atuar em prol de bairros
mais carentes da sociedade. Neste contexto conversamos com Rita Pereira da Silva - viúva dele e José
Raimundo Pereira da Silva - filho dele, com o intuito de conhecer um pouco mais de sua vida. Ao
longo de nossa conversa percebi que foi ratificado o que já havíamos lido, pois segundo Dona Rita,
José Cupertino era uma pessoa muito prestativa, estava sempre pronto a ajudar aos que o procuravam.
Assim ela nos afirmou:
Ele era muito bom, mesmo. Se morresse uma pessoa e pedisse lá onde eu morava, eu
mandava dizer pra ele, ele mandava o caixão na hora. Ele fez muita caridade, muita!
Ele fazia distribuição de cestas básicas lá no terreiro dele. Eu tenho um filho que
puxou pra ele, é igualzinho a ele17.
Além de suas obras de caridade, o que mais lhe tornou bastante conhecido, foi por conta de ele
ser um grande curador, conhecido entre várias camadas da sociedade, atendendo sua clientela em seu
terreiro localizado no bairro do João Paulo. De acordo com seu filho José Raimundo, a fama de José
Cupertino foi acontecendo porque tinham pessoas de classes elevadas que conseguiram ficar curadas
com ele, e assim o nome dele foi sendo cada vez mais conhecido. Raimundo nos disse ainda que
Cupertino realizava o atendimento a sua clientela de maneira muito organizada.
Assim nos disse: “ele tinha um consultório, as pessoas ficavam, tinha a ordem lá de chamada,
tinha um rapaz que trabalhava lá que distribuía as senhas para as pessoas. (...) ele tinha funcionários
que trabalhava com ele”18.
José Cupertino teve uma carreira política em que foi vereador durante muitos anos, e nesse
sentido se empenhou muito pela melhoria dos bairros, sobretudo o bairro do João Paulo. De acordo
com José Raimundo, o vereador foi o principal responsável pela feira que existe hoje naquele bairro,
nos disse ainda da existência de uma escola também localizada no João Paulo, que era mantida por ele
e atualmente leva o seu nome. José Cupertino esteve à frente da Federação por volta de vinte anos e
segundo José Raimundo, só abandonou o posto por estar doente e não se sentir mais em condições de
continuar naquela atividade. Em julho de 1984 morre devido a problemas renais e cardíacos, seu
terreiro foi fechado e parte de seus pertences foram doados ao Centro de Cultura Popular Domingos
Vieira Filho, e seu tambor de choro – ritual fúnebre- foi realizado um ano depois por Jorge Itaci.
Inicialmente tínhamos enquanto objetivo para esse item, fazer uma abordagem sobre a atuação
de José Cupertino na presidência da Federação de Umbanda e Culto Afro-Brasileiro do Maranhão,
destacando desde o ano em que este assumiu, até o momento em que passa seu mandato para o
próximo presidente, no entanto não foi possível em virtude da ausência de referências que nos
possibilitasse a tal coisa.
Diante disso passamos agora para destacar um pouco da trajetória do pai-de-santo Jorge Itaci de
Oliveira, mais conhecido como Jorge Babalaô, que assumiu a presidência dessa Federação, e
17
Entrevista realizada no dia 02 de Dezembro de 2007 com Rita Pereira da Silva, viúva de José Cupertino, falecido
umbandista do Maranhão.
18
Entrevista realizada dia 02 de Dezembro de 2007 com José Raimundo Pereira da Silva, filho de José Cupertino.
novamente não temos data específica para registrar sua posse, pois não conseguimos coletar esses
dados com os membros dessa instituição.
Jorge Babalaô foi um importante pai-de-santo que realizava suas práticas no tambor de mina,
em seu terreiro localizado na Travessa da Fé em Deus no Monte Castelo. Jorge Babalaô possuía
muitos conhecimentos dos fundamentos da Mina, obtidos através de Maria Pia, mãe-de-santo do
Terreiro do Egito.
Foi professor de Educação Física no Colégio Henrique de La Roque, atuou como presidente da
Federação de Umbanda e Culto Afro–Brasileiro do Maranhão, foi diretor do Museu Cafua das Mercês,
além de possuir dotes de artes plásticas pintando quadros com grande talento, um exemplo disso são os
quadros dos orixás que são cultuados em sua casa em exposição no Centro de Cultura Popular
Domingos Vieira Filho, tais quadros foram doados por Jorge a esse órgão19.
O alto nível de informações e conhecimentos acerca dos cultos afro, o incentivou a escrever o
livro “Orixá e Voduns no Tambor de Mina”, logo era comum que Jorge fosse uma pessoa bastante
solicitada em congressos e encontros de temática da religião afro-brasileira. O reconhecimento de tanta
dedicação às expressões culturais da religião afro-brasileira pode ser observado através de títulos que
ele recebeu, onde podemos citar como exemplo o título de Embaixador da Nação Mina, dado pela
Federação Paranaense de Umbanda e Cultos Afro-Brasileiros, e ainda recebeu outras condecorações
como a medalha do Mérito Timbira, oferecida pela ex-governadora Roseana Sarney no ano de 1999 e
a medalha Simão Estácio da Silveira, da Câmara Municipal de São Luís, no ano de 2002.
No que tange a sua entrada na Federação, procuramos conversar com dona Raimunda Silva de
Oliveira, viúva de Jorge Babalaô, com o intuito de identificar alguma coisa de como foi sua atuação
enquanto líder daquela entidade. Segundo ela, Jorge esteve à frente do órgão durante cerca de vinte
anos, pois teria assumido por volta de meados da década de 1970.
Ao longo da conversa, dona Raimunda nos disse que a presidência da Federação não era nada
fácil para Jorge, em virtude da dificuldade de arrecadação de recursos para oferecer algum auxílio ao
órgão e até mesmo algum tipo de ajuda aos terreiros. Neste sentido, ela nos falou que ele tinha muita
dificuldade para pedir auxílio a líderes políticos, uma vez que não sentia - se à vontade para isso.
Logo, segundo dona Raimunda, Jorge saiu da presidência em função de questões como esta de não ter
habilidade para conseguir ajuda junto a lideranças governamentais.
Dessa forma, assim dona Raimunda nos afirmou:
Ele deixou a presidência porque ele não sabia pedir, Jorge era uma pessoa que ele não
sabia pedir nada pra ninguém. Ele não sabia exigir de político, ele dizia que não tinha
tempo pra ficar correndo atrás de político, de ficar indo, exigindo, político nunca
pode fazer nada.
19
FERRETTI, M. Jorge Itaci – O Jorge Babalaô, Boletim da Comissão Maranhense de Folclore n°26. 2003.
Assim, a entrevista da nos afirmou ainda que, percebe uma mudança atualmente na gestão da
Federação, pois verifica que o atual presidente – Astro de Ogum - consegue organizar eventos
importantes da entidade, demonstrando que na época do seu marido as coisas eram bem diferentes.
Sobre isso, assim ele nos disse:
Hoje eu vejo assim que Astro assim como presidente da Federação, ás vezes
consegue tanta coisa que eu observo assim, vejo é que através da Federação ele
consegue dinheiro para fazer isto, aquilo, pra fazer festival de praia, Jorge nunca fez
isso.
O festival na praia que a entrevistada se referiu, é a homenagem a Iemanjá realizada
anualmente no dia 31 de dezembro pela Federação, e sobre essa festa ela nos falou que Jorge também
realizava, mas segundo ela, a única coisa que ele conseguia era ônibus para levar os manifestantes,
nada mais20.
Ainda em relação a este evento religioso, ela nos falou que Jorge não gostava muito, pois
acontecia de algumas pessoas que não faziam parte da manifestação entrar na roda entre os
manifestantes, tornando a homenagem desorganizada.
Pouco nos foi dito sobre a trajetória de Jorge Babalaô na presidência da Federação, mas quando
questionamos o porquê do afastamento dele da presidência da entidade, dona Raimunda nos disse que
o pai-de-santo falava a ela que essa função tinha uma responsabilidade muito grande e ele não queria
continuar exercendo aquela atividade. Dentre os vários aspectos apontados por Dona Raimunda, à
parte burocrática do órgão foi um dos motivos do pedido de saída dele da Federação.
Assim ela nos falou: “porque ele disse que não dava mais pra ele, era só trabalho e o resultado
não tinha nenhum. O pessoal vinha muito aqui, era muita responsabilidade”.
Dessa forma, Jorge se afasta da Federação passando seu posto para José Pinheiro, e continua
seu caminho dentro da religião afro-brasileira, essencialmente na Mina, deixando de herança além de
toda sua rica colaboração a cultura popular e a religião no Maranhão, o DVD Imbarabô, falando do
terreiro de Iemanjá e da religião afro em São Luís, porém Jorge não chega a assistir o lançamento, pois
morre pouco tempo antes, em julho do ano de 2003.
Dando continuidade a abordagem acerca dos outros presidentes da Federação de Umbanda e
Culto Afro-Brasileiro do Maranhão, infelizmente não temos o que abordar sobre a atuação de José
Pinheiro na presidência daquela entidade, pois no período em que iríamos coletar a entrevista com ele,
setembro de 2007, o mesmo veio a óbito. Quando realizamos a entrevista com Astro de Ogum, atual
presidente daquela instituição, perguntamos sobre José Pinheiro e sobre seu trabalho naquela entidade
e Astro nos falou em linhas gerais que o ex-presidente da Federação era seu compadre, disse-nos ainda
20
Entrevista realizada no dia 30 de Janeiro de 2007 com Raimunda Silva de Oliveira, viúva de Jorge Itaci.
que ele era uma pessoa muito boa, de caráter extraordinário e que havia colaborado bastante com o
trabalho na Federação.
Neste contexto, tivemos a informação que a esposa de José Pinheiro, dona Socorro trabalhava
naquela entidade, fator que contribuiria para nossa pesquisa, mas assim que seu marido faleceu, Astro
de Ogum deu a ela uma licença devido o frágil estágio emocional da mesma naquele momento, diante
de tal situação achamos inoportuno procurá-la para nos fornecer alguma entrevista falando sobre seu
marido, e por esse motivo nosso trabalho fica com este débito.
Dessa forma, passemos então para abordar um pouco sobre o atual presidente da entidade em
destaque. Generval Martimiano Moreira Leite, mais conhecido como Astro de Ogum, é vereador pelo
Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB), e já está em seu segundo mandato na câmara
municipal, sua atuação política está bastante voltada para o bairro do Barreto, que tem na maioria de
seus moradores pessoas de baixa renda, e está também localizado o terreiro de Astro em que este
realiza suas obrigações e festas de religião, a umbanda21.
Além da atuação política e de estar à frente da Federação, Astro é também envolvido com
movimentos artísticos e culturais, estando na coordenação do Parque Folclórico da Vila Palmeira,
dentre os eventos importantes que ocorreram neste local, podemos citar o I Encontro de Umbandistas e
Culto Afro-Brasileiros do Maranhão, realizado em 2001 através da Federação de Umbanda e Culto
Afro-Brasileiro do Maranhão, e pelo vereador Astro de Ogum.
Em setembro de 2007 realizamos uma entrevista com Astro, em que procuramos questionar um
pouco sobre os mecanismos de funcionamento da Federação atualmente.
Ao longo da entrevista, Astro nos informou que sua entrada na direção da entidade ocorreu
devido a o pedido do ex-presidente José Pinheiro que já se encontrava cansado de idade avançada, que
Astro assumisse a presidência e assim aconteceu por volta do ano de 1998, e naquele momento Astro
já era vice-presidente, logo teria que dar continuidade ao mandato de José Pinheiro.
Percebemos que Astro de Ogum é bastante chateado com algumas igrejas evangélicas, pois
segundo ele elas são muito preconceituosas e simulam situações pelas quais não ocorrem de fato. Citou
os supostos exorcismos de entidades espirituais nos cultos das igrejas, e em relação a isso, assim nos
afirmou:
Entidade é coisa séria, eu te garanto que tudo aquilo não passa de uma armação,
nenhuma entidade vai ali. Não existe isso, o ambiente deles é as matas, são os rios, as
cachoeiras, os templos deles, aonde ta os tambores. O quê que eles vão fazer lá, o
quê? Você não vê que isso é uma tremenda palhaçada?22
21
FERRETTI, Sérgio e LINDOSO, Gerson Carlos Pereira. Religiões Afro-Maranhenses no Cenário Político-a trajetória de
três pais-de-santo na Câmara Municipal de São Luís. XXVII Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação.
22
Entrevista realizada dia 21 de Setembro de 2007 com Generval Martimiano Moreira Leite – mais conhecido como Astro
de Ogum, atual presidente da Federação de Umbanda e Culto Afro-Brasileiro do Maranhão.
Em relação à questão de sua atuação política influenciando nos recursos disponibilizados a
Federação, ele nos disse que as coisas são muito difíceis, mas devido o fato de ele estar na câmara
municipal de vereadores, é possível perceber algumas conquistas. Um exemplo disso foi à escolta da
polícia durante a Procissão dos Orixás, evento tradicional da Federação que ocorre anualmente no dia
08 de setembro. No que tange apoio financeiro para os principais eventos da entidade tentamos
identificar quais são os governantes que apóiam com mais veemência a Federação, e percebemos que
Astro tem um carinho especial pela ex-governadora Roseana Sarney. Segundo ele, ela apoiava bastante
às manifestações da religião afro. Assim ele nos disse sobre isso:
Quando ela tava no governo, agente não tinha problema com a festa de Iemanjá, não
tinha problema com a procissão. Eu acho que religião nenhuma não tinha problema
com ela, porque ela ajudava todas as religiões, A Roseana era de todos e eu espero
que o Dr. Jackson também seja assim, de todos.
Em linhas gerais diante desse depoimento, é possível notar a simpatia da ex-governadora com a
religião afro, uma vez que quando entrevistamos dona Raimunda de Oliveira, viúva de Jorge Itaci,
percebemos que ela também demonstrou que aquela líder política tinha boas relações com o pai-desanto.
Em linhas gerais, em que pese à atuação do vereador na entidade em destaque, é possível que
haja um grande carisma dos filiados ao órgão, em relação ao atual presidente Astro de Ogum, que
encontra-se em seu terceiro mandato na presidência da Federação de Umbanda
e Culto Afro-
Brasileiro do Maranhão e, de acordo com o que percebemos quando estivemos presente em algumas
reuniões daquela instituição, é que existe um carinho muito grande de muitos líderes de terreiros
cadastrados a Federação pelo vereador. Assim nos falou dona Maria de Fátima Costa, responsável pelo
terreiro de mina Itamansuá, sobre o umbandista: “Astro é um dos melhores presidentes que esta
instituição já teve, pois ajuda muita gente que precisa, doa cestas básicas, ajuda nas festas dos terreiros,
ele é uma pessoa muito bondosa”23.
Dessa forma, analisa-se que, essa instituição além de ser responsável em dar suporte jurídico e
apoio aos terreiros, possui ainda a função de trabalhar em prol da religião afro-brasileira no Maranhão,
estando muito voltada para ações de caridade no âmbito de seus adeptos. Neste sentido, é inevitável
não atentarmos para as distinções que ocorreram entre cada mandato dos presidentes citados, pois
dessas lideranças, os que assumem um cargo político - neste caso o cargo de vereador assumido por
José Cupertino, e Astro de Ogum, viabiliza um apoio bastante relevante para um trabalho mais efetivo
dentro da instituição, no que tange o alcance de recursos para ajudar a Federação.
23
Entrevista realizada dia 24 de Novembro de 2007 com Maria de Fátima Costa Carvalho, responsável pelo Terreiro de
Mina Itamansuá.
4.3.1.2 O Corpo Administrativo da Federação de Umbanda
e Culto Afro-Brasileiro do
Maranhão
A expansão das federações de umbanda no Brasil tem maior evidência na década de 1940
(GONÇALVES, 1994, p.115) como vimos, pode ser considerada como um fator de legitimação da
religião para que não sofram perseguição da polícia. Além da importância desse suporte jurídico que
estas instituições devem ter, existe ainda todo um corpo administrativo que está disposto
hierarquicamente com as suas respectivas funções. A Federação de Umbanda e Culto Afro-Brasileiro
do Maranhão não é diferente, realizando suas reuniões a cada último sábado, reúne-se com os
membros do corpo administrativo do órgão e seus respectivos filiados para discutir suas principais
necessidades, calendários de festas e neste sentido, os membros do corpo administrativo se fazem
presentes e ficam dispostos em uma mesa que geralmente ocupam uma mesa juntamente com o
presidente
Com a ajuda de Epitácio - um dos membros da instituição, pudemos identificar o cargo de
todos daquela federação, logo, enumeramos cada função, o que não implica que estejam em uma
ordem hierárquica. Assim estão dispostas as devidas colocações dos membros:
1- Presidente: Generval Martimiano Moreira Leite, Astro de Ogum – do Terreiro Ogum com
Iansã.
2- Vice – presidente: João Gualberto (não conseguimos o nome completo), mais conhecido
como Joãozinho da Vila Nova – do Terreiro Pai Oxalá e Mãe Oxum.
3- Esta função divide-se em dois momentos. 1ª Secretário (a) - Maria do Socorro Pinheiro –
do Terreiro Pedra Mirá, afastada temporariamente devido à morte de seu marido, o expresidente da Federação – José Pinheiro. Atualmente quem assume seu cargo é Epitácio de
Jesus Castro. 2ª Secretário (a) - Teresinha Frazão Forte – do Terreiro Templo dos Orixás
4- Assim como a função de secretário, esta também está dividida em dois momentos. 1º
Tesoureiro (a) – José de Ribamar Nascimento Araújo - do terreiro Ogum com Iansã. 2ª
Tesoureiro (a) – Maria do Carmo Santos, mais conhecida como mãe santinha - da Tenda
São José.
5- Diretor do Conselho Fiscal – Epitácio de Jesus Castro – do Terreiro de Mina Rei Sebastião.
6- Diretor do Conselho de Ritual – Leopoldo Nunes Neto – da Tenda Divino Mestre.
7- Diretor Distrital dos Interiores – Fernando Sólon – do Terreiro Légua Bogi Buá.
8- Diretor do Setor de Comunicação e Assuntos Culturais – Benedito Basílio Gomes Filho,
responde também por Biné Gomes de Averequête, Abinocô24 do terreiro de Iemanjá- do
terreiro de Iemanjá.
24
Segundo Biné Gomes, o termo abinocô do terreiro de Iemanjá significa os olhos de Iemanjá.
9- Acessoría Jurídica – Mário Batista. Esta acessoria é composta de outros advogados que não
foi possível identificar os nomes.
Além dessas funções existe ainda, segundo Epitácio, a atribuição dos delegados distritais que
são responsáveis pela documentação dos municípios, em que nos citou como exemplo, Bita do Barão
enquanto responsável por essa questão na cidade de Codó.
Diante das funções que englobam a instituição em destaque, conversamos com algumas
pessoas que nos falaram um pouco sobre suas responsabilidades. No entanto delimitamos para abordar
somente três, tendo em vista a necessidade de observar quais mecanismos necessários nas suas
atuações. As funções são as do Diretor do Setor de Comunicação e Assuntos Culturais, Diretor de
Conselho Fiscal e Diretor de Assuntos e Rituais.
Primeiramente em relação à função do Diretor do Setor de Comunicação e Assuntos Culturais,
assumido por Biné Gomes, podemos afirmar que ele atua na elaboração de projetos da Federação,
organiza e articula juntamente com outros membros, cerimônias religiosas da instituição como a
Procissão dos Orixás e a homenagem a Iemanjá no final do ano. Além disso, Biné nos falou que
participa de eventos com temáticas étnicas voltadas para a questão do negro, representando a
Federação de Umbanda e Culto Afro-Brasileiro do Maranhão, tais como congressos, seminários e
fóruns que abordem também a religiosidade afro-descendente.
A função do Diretor do Conselho Fiscal, tendo como responsável Epitácio Castro, é
basicamente a de visitar os terreiros novos, e ver se estes estão a desenvolver suas atividades
religiosas.
Sobre isso assim nos falou Epitácio:
À parte da fiscalização eu tenho que ir nos terreiros, principalmente os terreiros novos
quando vão abrir, para eu ver a origem da pessoa, quem é o pai-de-santo, se os
trabalhos estão bem feitos, se está preparado para aquela função. Aí de lá eu vou até o
Conselho de Ritual, aí quando eu chego no Conselho Ritual eu digo a Pai Leopoldo,
ele vai para lá também, faz a avaliação, aí sim, aí a casa será aberta25.
Como vimos, a uma avaliação nos terreiros mais recentes no sentido de observar se condizem
com a questão própria de um terreiro, e neste sentido entendemos que essa avaliação ocorre nos
terreiros que estão filiados a Federação. Dentre esses pontos do setor fiscal da Federação, tentamos
identificar como funcionavam as taxas pagas pelos filiados à instituição. Sobre isso Epitácio nos disse
que o atual presidente, Astro de Ogum havia deliberado os valores pagos pelos responsáveis pelos
terreiros, pois de acordo Epitácio, Astro afirmou que essas pessoas não tinham condições de pagar uma
taxa mensal por serem pessoas muito carentes que muitas vezes não tinham sequer o alimento, logo
ficaria complicado para manter essa cobrança.
25
Entrevista realizada dia 12 de dezembro de 2007 com Epitácio de Jesus Castro, líder do Terreiro de Mina Rei Sebastião e
diretor do Conselho Fiscal da Federação de Umbanda e Culto Afro-Brasileiro do Maranhão.
Neste sentido Epitácio nos falou ainda que a Federação realiza a distribuição de cestas básicas
periodicamente aos ligados a entidade. Com relação às taxas, ele nos disse que são valores simbólicos
pagos anualmente, e segundo ele só foram pagos devido o repasse do custo com o papel, feito pelo
presidente.
As taxas são equivalentes à filiação, ou seja, quando o adepto vai tirar documentação pela
primeira vez, documentação essa que consiste nos seguintes itens: diploma – que viabiliza a filiação do
terreiro a Federação, no valor de R$ 50,00 anuais; alvará certidão – que ampara legalmente as festas
religiosas dos terreiros; licença – que garante ao terreiro a realização de cerimônia religiosa das 20:00
às 02:00 horas e a carteira de identificação do pai-de-santo cadastrado a Federação. Ainda em relação
às taxas, é feito o recadastramento anual, em que é realizado pelo valor de R$ 20,00 e por último a
licença para realização de festas, como citamos anteriormente, sendo cobrado o valor de R$ 20,00,
também anualmente.
Dando continuidade às atribuições dos membros da Federação, no que se refere à função do
Diretor do Conselho de Ritual, em que Leopoldo responde, tem como função, segundo ele, observar os
rituais nos terreiros, saber quem realizou a formação do pai-de-santo, identificar quais são os guias que
regem a casa, ou seja, quais são as entidades espirituais que direcionam as cerimônias no terreiro, além
disso, o Diretor do Conselho de Ritual, juntamente com o presidente da Federação que assina a ficha
de cadastro e as autorizações dos terreiros para realização de festas.
Uma outra questão abordada por Leopoldo foi que este também realiza palestras nos terreiros,
com o intuito de conscientizar os manifestantes a não abusarem do uso de bebidas alcoólicas durante
as cerimônias para que não venham comprometer os rituais, e que possam dessa forma tirar proveito
dos ensinamentos dos guias – os mentores espirituais.
Deste modo, é possível perceber que na instituição, além das questões fiscais necessárias para o
controle burocrático do órgão, existe ainda o setor responsável pelos assuntos referentes aos rituais dos
terreiros, de modo às homenagens as entidades espirituais possam estar seguindo os devidos
mecanismos peculiares da representação religiosa.
Em que pese à função do presidente, está basicamente voltada para a coordenação de todos os
cargos que citamos anteriormente, e também pela questão de viabilizar a documentação necessária
para que os terreiros estejam legalmente autorizados a desenvolver suas atividades religiosas.
Neste sentido iremos agora fazer uma breve abordagem acerca das principais manifestações
organizadas pela Federação de Umbanda e Culto Afro-Brasileiro do Maranhão que são a Procissão
dos Orixás e a festa de Iemanjá.
4.3.1.3 Principais Cerimônias da Federação
A Procissão dos Orixás e a homenagem a Iemanjá são manifestações que ocorrem há cerca de
quarenta anos através da Federação de Umbanda e Culto Afro-Brasileiro do Maranhão. São realizadas
segundo Astro de Ogum, desde a primeira gestão de instituição com o então presidente desta, José
Cupertino.
A Procissão dos Orixás ocorre no dia 08 de setembro, data em que se comemora o aniversário
de São Luís. Para os adeptos da religião afro-brasileira que participam da festa, o evento representa
uma homenagem a São Luís IX, Rei de França, santo católico consagrado no dia 25 de Agosto no
calendário católico, mas que na encantaria maranhense festeja Dom Luís, entidade espiritual conhecida
nos terreiros como um encantado nobre, como um rei francês (FERRETTI, M, 2003, p.160).
É possível que muitos adeptos da religião afro-brasileira no Maranhão atribuam a Procissão
dos Orixás como uma homenagem a Dom Luís, como se houvesse alguma relação sincrética entre o
São Luís IX e o Dom Luís da encantaria, porém Mundicarmo Ferretti (2003, p.160) cita José Pinheiro,
ex-presidente da Federação de Umbanda e Culto Afro-Brasileiro do Maranhão, em que este coloca
que não se faz homenagem a Dom Luís nesse dia porque ele é festejado no dia 25 de Agosto.
Sem nos atermos muito a essa questão, o fato é que a Procissão dos Orixás leva centenas de
pessoas ligadas a terreiros da capital e do interior do estado, em que os adeptos carregam a imagem do
São Luís Rei de França e de São Sebastião, santo muito prestigiado nos terreiros maranhenses. No ano
passado tivemos a oportunidade de participar desta bonita festa que movimentou as ruas do centro de
São Luís, onde a concentração ocorreu em frente o prédio da prefeitura, e o percurso se estendeu pela
Praça João Lisboa, Rua da Palma, em frente ao Convento das Mercês e terminou em frente à Igreja do
Desterro – a mais antiga do estado. Neste local foram realizados rituais como lavagem das escadas da
igreja e a quebra de potes que carregavam flores e haviam sido transportados pelos adeptos ao longo
da procissão.
Segundo manifestantes de terreiros que acompanhavam o itinerário, esse ritual representa
oferendas ao santo e pedido de realizações e alcance de graças pessoais. Além do toque dos
instrumentos acompanhados de cânticos da religião, houve uma homenagem a José Pinheiro, expresidente da Federação que havia falecido no mês de julho daquele ano.
No âmbito dessa abordagem destacaremos agora a festa de Iemanjá, outro importante evento
dessa Federação. A festa para Iemanjá é realizada desde a década de 1960 em São Luís, iniciada por
José Cupertino, primeiro presidente daquela Federação, sendo comemorada até os dias atuais pelos
umbandistas maranhenses e alguns adeptos do tambor de mina e outras manifestações da religião afrobrasileira. Embora as casas de culto afro mais antigas de São Luís não prestigiem a manifestação, pelo
fato de não ser um ambiente muito peculiar dos rituais nos terreiros existe um número muito grande de
pessoas que participam da festa que em São Luís é organizada pela Federação26.
A festa consiste em realizar homenagem a Iemanjá, orixá considerada rainha dos mares, onde
são feitos oferendas com jarros cheios de flores, perfumes, pentes, sabonetes e outros utensílios de
beleza, pois de acordo com adeptos da religião, ela é muito vaidosa, no sincretismo religioso Iemanjá
corresponde a Maria – mãe de Jesus, comumente denominada como Nossa Senhora nos terreiros.
No ano passado procuramos acompanhar as reuniões da Federação quando estava próximo
deste evento, e verificamos que estavam com um número maior de pessoas em relação as anteriores
que havíamos participado, de acordo com membros da Federação isso acontecia devido à ajuda de
custo que os donos dos terreiros recebiam para participar da festa, essa ajuda servia para auxiliar na
confecção da indumentária a ser usada na festa ou outras necessidades do terreiro, logo isso
intensificava a participação nas reuniões.
A festa em homenagem a Iemanjá ocorre na praia do Olho D’água, e fomos até lá para
prestigiá-la com o intuito de observar como ocorria a cerimônia. Inicialmente a maioria dos
manifestantes aguardava a chegada do presidente Astro de Ogum para que fosse iniciada a festa, depôs
de algum tempo por volta das 22:40 da noite as homenagens tiveram início com a reunião dos
manifestantes devidamente trajados para o ritual que foram organizados por aquele presidente, houve a
presença de repórteres que entrevistaram aquela liderança e pouco depois teve início os hinos e toques
dos instrumentos do ritual. Percebemos que alguns manifestantes receberam entidades espirituais ao
longo da festa, mas na estranhamos visto que na Procissão dos Orixás já havíamos presenciado
situação similar.
A meia-noite, momento mais esperado os manifestantes pegaram jarros com flores que estavam
dispostos nas proximidades doados pela Federação e levaram ao mar para fazerem suas devidas
oferendas e obrigações a Iemanjá, houve ainda queima de fogos de artifício que iluminaram mais ainda
aquela noite, que para nós foi uma experiência muito interessante, digna de ser repetida diante da
beleza daquela manifestação.
Em síntese, convém ressaltar que a Federação de Umbanda Espírita e Culto Afro-Brasileiros do
Maranhão possui centenas de terreiros cadastrados no interior e na capital – e na festa de Iemanjá é
possível verificar que há uma organização do evento, pois quando se iniciam os toques e os cânticos
não verificamos desrespeito de delinqüentes ou marginais para com a manifestação, muito pelo
contrário, a população da comunidade assiste atenta a cerimônia, demonstrando respeito ao ritual.
Dessa forma, por mais que às expressões da religião afro-brasileira sofram intolerâncias e perseguições
desde muito tempo, elas têm alcançado aos poucos seu espaço e o respeito da sociedade nos dias
atuais.
26
FERRETTI, M. 31 de dezembro – Dia de Festa no Mar. Boletim Saravá Umbanda n° 5, nov, 1999.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Diante do que foi exposto, nota-se que as relações entre a religião afro-brasileira e alguns
setores da sociedade, desde muito tempo foram conflituosas em virtude de não se enquadrarem ao
modelo dos cultos religiosos praticados predominantemente no Brasil, como o cristianismo cultuado
desde períodos mais remotos na Igreja Católica e em igrejas evangélicas, nestas últimas um pouco
depois – assim como outros fatores que também favoreceram a essa difícil afinidade.
A posição de inferioridade que as expressões da cultura negra estiveram submetidas ao longo
de séculos é um exemplo da opressão que seus cultos religiosos sofreram. Os códigos penais que
inculcavam na sociedade o conceito pejorativo aos espaços religiosos dos afro-descendentes sejam
terreiros de mina, candomblé, xangô, umbanda e muitos outros cultos oriundos da religião de matriz
africana, podem ser citados enquanto modelos de práticas que pelo Estado ficaram marginalizadas dos
moldes das religiões mais aceitas pela sociedade.
Muitos movimentos de caráter étnico-cultural foram organizados desde a primeira metade do
século XX por vários intelectuais defensores da cultura negra, movimentos como congressos,
seminários e encontros acadêmicos que buscavam discutir contra o preconceito e rotulação daquelas
expressões culturais, atentaram para a necessidade de que houvesse a estagnação das perseguições do
estado e da população que de um modo geral, constantemente se posicionavam de forma intolerante
contra os cultos da religião afro-brasileira.
No Brasil os afro-descendentes passam por um conjunto de ações em que intercalam os vários
tipos de violências desenvolvidas contra seus valores, suas crenças, sua simbologia, enfim sua maneira
própria de manter seus elementos culturais. Quando afirmamos os vários tipos de violência, nos
referimos à violência física, a violência simbólica, verbal, as agressões aos patrimônios culturais e
outras que podem estar nas lacunas de pequenas atitudes.
A própria subtração de elementos fundamentais para a realização de algumas manifestações,
quando através da ação de policiais são levados para delegacias e posteriormente poderiam virar lixo,
certamente se fossem objetos de religiões com mais aceitação nacional, seria vista enquanto uma ação
de caráter vândalo, e teria possivelmente outra reação da população. Essas subtrações referem-se ao
processo das diligências policiais aos terreiros e nestas, era comum que fossem levados símbolos
importantes daquelas casas de culto, e neste sentido, em vários locais do Brasil alguns daqueles
elementos passaram a ser doados a espaços museológicos com temáticas da cultura popular.
Ainda com relação à violência direcionada aos terreiros, é importante frisar que durante muitos
anos as punições aos afro-descendentes responsáveis por realizar toques de tambor com caráter
cerimonial religioso, eram penas pesadas em que pese prisões, penas que poderiam ser liquidadas
através de pagamento em dinheiro, ou por meio de violências físicas, como chicotadas, por exemplo.
Embora tenha sido mais comum à violência física no período em que ainda eram vigentes a Colônia e
o Império, mesmo na República a desrespeitosa ação contra as religiões de matriz africana, permanece
devido a estas não estarem atreladas ao padrão das religiões cristãs, sejam elas católicas ou
protestantes.
Normalmente o fato de essas práticas estarem ligadas a processos místicos, em que pese o uso
de diversos elementos culturais oriundos da mesclagem das etnias que formam o povo brasileiro - a
saber: o índio, o negro e o branco é outro fator que prepondera no que se refere ao preconceito. Deste
modo, práticas como a do curandeirismo, em que são usadas plantas medicinais e técnicas terapêuticas
– práticas comuns entre indígenas e etnias africanas foi motivo de serem enquadradas no Código Penal
de 1890, uma vez que pelo fato de realizar também a cura de doenças incomodava a classe dos
médicos, com isso essa ação esteve denominada enquanto prática do uso indevido da medicina, o que
levou muitos adeptos a prisão.
Um outro estigma que esses religiosos carregam é a relação de sua religião com seitas
demoníacas, esse fator tem sido o responsável pela grande parcela de preconceito das pessoas que
desconhecem os cultos afro-brasileiros, no entanto parte da responsabilidade dessa marca trazida pelos
intelectuais ao longo dos anos é da Igreja Católica, instituição que durante muito tempo esteve à frente
de idéias retrógradas e dissimuladas acerca de entidades espirituais das cerimônias religiosas dos afrodescendentes, um exemplo disso a ser citado, foi à relação construída por essa instituição com o orixá
Exu, que dentre as suas características na mitologia africana é visto como o orixá mensageiro que
estabelece comunicação entre o mundo material e o mundo espiritual, sendo direcionado a ele as
primeiras oferendas nos rituais, sobretudo os de candomblé e de umbanda, para que tudo possa ocorrer
bem ao longo da manifestação religiosa.
Mas pelo fato de essa entidade espiritual ser bastante audaciosa, sensual e indecente, é
comumente relacionado com a figura do diabo, devido como já afirmamos a relação estabelecida pela
Igreja Católica, relação essa não aceita pelos adeptos do Candomblé uma vez que na sua concepção
não, existe a personificação da figura do mal em um único orixá, assim como ocorre na ideologia
cristã, visto que de acordo com pesquisadores conceituados no assunto todos os orixás possuem essa
dualidade de aspectos positivos e negativos, fator muito parecido com o que ocorre entre os seres
humanos.
Em virtude dessas e outras questões elaboradas e construídas por diferentes contextos
históricos, as representações da religião afro-brasileira tiveram por diversas vezes suas cerimônias
interrompidas pelas autoridades governamentais, sendo alvo de manchetes de jornais do estado do
Maranhão. Assim pudemos verificar que, às conexões estabelecidas entre a imprensa e as ocorrências
de determinados momentos, fazem parte de uma construção ideológica em que prepondera a noção de
cultura que cada sociedade em sua respectiva época adquire acerca de determinadas construções e
expressões da cultura.
Por tanto, além da elaboração de encontros nacionais como os congressos de religião afro e de
cultura popular discutindo novas perspectivas para essa prática, apesar de terem influenciado a
diminuição da coerção aos terreiros, não conseguimos perceber que tenham sido suficientes para uma
ruptura ao processo de perseguição as casas de culto.
Com o contexto do início da Ditadura Militar na década de 1960 uma categoria da religião afrobrasileira, a umbanda, é apoiada por aquele regime, através de alianças políticas que pretendiam tirar
do caminho um inimigo comum, a Igreja Católica, com isso as expressões daquela prática recebem
mais abertura, e em São Luís vimos que com a fundação da Federação de Umbanda e Culto AfroBrasileiro do Maranhão as coibições aos terreiros diminuem, sobretudo com o governo de José Sarney,
que de acordo com a literatura além de ser simpatizante da religião afro-brasileira e freqüentar terreiros
do interior do estado do Maranhão, investe no setor turístico incitando a valorização das expressões da
cultura popular.
Assim, ainda que não haja mais coerções aos terreiros de São Luís por autoridades policiais
desde algum tempo, e quando ocorrem são casos esporádicos voltados para festas com radiolas com
sonoridades muito altas que perturbem vizinhos da comunidade em que o terreiro está inserido,
tentamos demonstrar através desse trabalho que a década de 1960 foi um importante momento em que
a influência de lideranças política nacional e estadual no Maranhão viabilizou, a nosso ver um
favorável cenário para a realização de certa forma mais livre, das manifestações religiosas afrodescendentes e, apesar de os terreiros de umbanda serem os mais afetados nessa abertura em virtude da
existência de uma instituição que lhes permita o aparato jurídico para funcionamento de suas casas,
outras que pratiquem a religião afro, também podem filiar-se a ela, até por que na própria denominação
do órgão existe essa abertura, ou seja, o título dessa responde por Federação de Umbanda Espírita e
Culto Afro-Brasileiro, logo à parte em que denomina culto afro-brasileiro já nos permite afirmar que
os terreiros de tambor de mina, terecô, dentre outras representações religiosas dessa natureza podem
estar ligados àquela Federação.
Dessa forma, espera-se que as considerações acerca do estudo sobre o possível processo de
diminuição da repressão aos terreiros de São Luís durante a década de 1960, sejam interpretadas com
uma pesquisa que tratou de buscar através de conjecturas avaliadas a partir de referências
bibliográficas, documentos e entrevistas, que nos levaram a discutir elementos que norteiam a idéia de
redução de intolerância à religião afro-brasileira nesta cidade, durante o período citado - o que não nos
permite afirmar que seja um trabalho com pretensões de linhas exclusivas de interpretação, ou que
busquem tratar o assunto como verdades excepcionais, até porque a temática em destaque viabiliza a
outras explanações que possam reafirmar este trabalho ou realizar a construção de outras abordagens
com análises distintas do presente estudo.
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CASTRO, Epitácio de Jesus. Entrevista concedida a Márcia Andréa Teixeira da Silva. São Luís,
22 dez. 2007.
GOMES, Natividade Sousa. Entrevista concedida a Márcia Andréa Teixeira da Silva. São Luís, 24
nov. 2007.
LEITE, Generval Martimiano Moreira. Entrevista concedida a Márcia Andréa Teixeira da Silva.
São Luís, 21 set. 2007.
NETO, Leopoldo Nunes. Entrevista concedida a Márcia Andréa Teixeira da Silva. São Luís, 13
mar. 2008.
PINTO, Rita Pereira. Entrevista concedida a Márcia Andréa Teixeira da Silva. São Luís, 02 DEZ.
2007.
OLIVEIRA, Raimunda Silva de. Entrevista concedida a Márcia Andréa Teixeira da Silva. São
Luís, 30 jan. 2008.
SILVA, José Raimundo Pereira da. Entrevista concedida a Márcia Andréa Teixeira da Silva. São
Luís, 02 DEZ. 2007.
APÊNDICES
APÊNDICE A – ROTEIRO DE ENTREVISTAS
NOME:
IDADE:
PROFISSÃO:
ENDEREÇO:
GENERVAL MARTIMIANO MOREIRA LEITE (Astro de Ogum)27
1. Há quanto tempo você assumiu a presidência da Federação de Umbanda e Cultos Afros do
Maranhão?
2. Como é para você desempenhar a presidência dessa instituição?
3. Quais são as principais dificuldades nessa gestão?
4. Você sofre preconceitos na Câmara Municipal de vereadores em virtude de sua religião?
5. No seu ponto de vista, o fato de você ser vereador ajuda que haja certo apoio do Governo para
a Federação?
6. Quais critérios são necessários para o terreiro filiar-se à Federação?
7. Quais são os membros que compõem o corpo administrativo da Federação de Umbanda e
Cultos Afros do Maranhão? Como funcionam as atribuições desses membros?
8. No seu ponto de vista, como foi a atuação dos presidentes que já passaram pela Federação?
9. Quais os principais eventos e cerimônias realizados por esta entidade?
10. O que representa a Federação de Umbanda e Cultos Afro-Brasileiros do Maranhão para o
estado? E em seu ponto de vista, o que ela representa para os terreiros a ela filiados?
NOME:
IDADE:
PROFISSÃO:
ENDEREÇO:
EPITÁCIO DE JESUS CASTRO28 e
LEOPOLDO NUNES NETO29
1.
Quais são as suas atribuições dentro da Federação de Umbanda e Cultos Afro do Maranhão?
2.
Quais são as principais dificuldades do cargo?
27
28
29
Atual presidente da Federação de Umbanda Espírita e Culto Afro – Brasileiro do Maranhão.
Diretor do Conselho Fiscal da Federação de Umbanda e Cultos Afro-brasileiros do Maranhão.
Diretor do Conselho de Ritual da Federação de Umbanda e Cultos Afro-brasileiros do Maranhão.
3.
Quais são os critérios burocráticos para os terreiros estarem filiados a esta instituição? Existem
taxas de pagamentos pelos filiados?
4.
Quais são as principais dificuldades no cargo?
5.
Por que a Procissão dos Orixás e a Festa de Iemanjá são as principais cerimônias da Federação?
6.
Qual a importância da Federação para os terreiros do Maranhão?
NOME:
IDADE:
PROFISSÃO:
ENDEREÇO:
JOSÉ PEREIRA DA SILVA30.
1.
Em seu ponto de vista, como foi para José Cupertino administrar a Federação de Umbanda e
Culto Afro-Brasileiro do Maranhão? Durante quanto tempo ele ficou na presidência?
2.
Durante a trajetória dele na religião afro, você presenciou alguma interrupção da polícia no
terreiro dele?
3.
Como foi para ele administrar a Federação de Umbanda e Culto Afro-Brasileiro do Maranhão?
Durante quanto tempo ele ficou?
4.
30
Ele dizia a você se tinha dificuldades na administração da Federação, quais eram as principais?
Filho de José Cupertino - falecido umbandista e 1° presidente da Federação de Umbanda e Culto Afro-Brasileiro do
Maranhão.
5.
Por que ele não quis continuar no cargo?
6.
Ele recebia recursos financeiros para a federação?
7.
Havia algum apoio político a ele para os eventos e cerimônias religiosas da Federação?
8.
Você acha que o fato de José Cupertino ter sido vereador ajudava ele, no sentido de receber
apoio a Federação?
9.
No seu ponto de vista, como foi a vida dele dentro da religião afro no Maranhão?
NOME:
IDADE:
PROFISSÃO:
ENDEREÇO:
MARIA DE FÁTIMA COSTA CARVALHO e
NATIVIDADE SOUSA31
1.
Como é o nome do seu terreiro?
2.
Há quanto tempo você está filiada a essa Federação?
3.
Por que você acha importante está filiada a ela?
4.
Na sua opinião, como é a atuação do atual presidente desta Federação?
5.
Depois de estar cadastrada a Federação de Umbanda e Culto Afro-Brasileiro do Maranhão, seu
terreiro já sofreu alguma interrupção de festa pela polícia?
31
6.
O que a religião afro representa na sua vida?
7.
Na sua opinião, como é a atuação do atual presidente desta Federação?
Filiadas à Federação de Umbanda e Culto Afro-Brasileiro do Maranhão.
NOME:
IDADE:
PROFISSÃO:
ENDEREÇO:
RAIMUNDA SILVA DE OLIVEIRA32
1. Como foi para ele administrar a Federação de Umbanda e Culto Afro-Brasileiro do Maranhão?
Durante quanto tempo ele ficou na presidência?
2. Durante a trajetória dele na religião afro, você presenciou alguma interrupção da polícia no
terreiro de Iemanjá?
3. Como foi para ele administrar a Federação de Umbanda e Culto Afro-Brasileiro do Maranhão?
Durante quanto tempo ele ficou?
4. Ele dizia a você se tinha dificuldades na administração, quais eram as principais?
5. Por que ele não quis continuar no cargo?
6. Ele recebia recursos financeiros para a Federação?
7. Havia algum apoio político a ele para os eventos e cerimônias religiosas da Federação?
8. No seu ponto de vista, como foi a vida dele dentro da religião afro no Maranhão
32
Viúva do pai-de-santo Jorge Itaci de Oliveira - Ex-presidente da Federação de Umbanda e Culto Afro-Brasileiro do
Maranhão.
NOME:
IDADE:
PROFISSÃO:
ENDEREÇO:
RITA PEREIRA PINTO33
1.
Como foi o seu contato com a vida religiosa de José Cupertino?
2.
Como foi para ele administrar a Federação de Umbanda e Culto Afro-Brasileiro do Maranhão?
Durante quanto tempo ele ficou na presidência?
3.
Durante a trajetória dele na religião afro, você presenciou alguma interrupção da polícia no
terreiro de Iemanjá?
4.
Como foi para ele administrar a Federação de Umbanda e Culto Afro-Brasileiro do Maranhão?
Durante quanto tempo ele ficou?
5.
Ele dizia a você se tinha dificuldades na administração, quais eram as principais?
6.
Por que ele não quis continuar no cargo?
7.
Ele recebia recursos financeiros para a Federação?
8.
Havia algum apoio político a ele para os eventos e cerimônias religiosas da Federação?
9.
No seu ponto de vista, como foi a vida dele dentro da religião afro no Maranhão?
33
Ex-mulher de José Cupertino - falecido umbandista e 1° presidente da Federação de Umbanda e Culto Afro-Brasileiro do
Maranhão.
APÊNDICE B - FOTOS
Foto 01. Líderes de terreiros em reunião da Federação de Umbanda e Culto Afro-Brasileiro do
Maranhão (no Terreiro Ogum com Iansã – no bairro do Barreto).
Fonte: Márcia Andréa Teixeira da Silva (17 dez. 2007).
Foto 02 – Mesa composta por membros da Federação de Umbanda e Culto Afro-Brasileiro do
Maranhão (no Terreiro Ogum com Iansã – no bairro do Barreto).
Fonte: Márcia Andréa Teixeira da Silva (24 nov.2007).
Foto 03 - Concentração de adeptos da Religião Afro-Brasileira do Maranhão em frente à
Prefeitura de São Luís para a Procissão dos Orixás.
Fonte: Márcia Andréa Teixeira da Silva (08 set. 2007).
Foto 04 – Procissão dos Orixás pelas ruas de São Luís.
Fonte: Márcia Andréa Teixeira da Silva (08 set. 2007).
Foto 05 – Imagens de São Sebastião e São Luís Rei de França (santos homenageados na
Procissão dos Orixás) na Igreja do Desterro.
Fonte: Márcia Andréa Teixeira da Silva (08 set. 2007).
Foto 06 - Chegada da Procissão dos Orixás em frente à Igreja do Desterro.
Fonte: Márcia Andréa Teixeira da Silva (08 set. 2007).
Foto 07 – Altar decorado com imagens de santos católicos e entidades da Religião AfroBrasileira na praia do Olho D’ água na ocasião da homenagem a Iemanjá.
Fonte: Márcia Andréa Teixeira da Silva (31 dez. 2007).
Foto 08 – Vasos que posteriormente foram levados ao mar em homenagem a Iemanjá na praia
do Olho D’água.
Fonte: Márcia Andréa Teixeira da Silva (31 dez. 2007).
Foto 09 – Adeptos da Religião Afro-Brasileira aguardando o início da cerimônia em homenagem
a Iemanjá, na praia do Olho D’água.
Fonte: Márcia Andréa Teixeira da Silva (31 dez. 2007)
Foto 10 – Adeptos da Religião Afro-brasileira na festa em homenagem a Iemanjá na praia do
Olho D’água.
Fonte: Márcia Andréa Teixeira da Silva (31 dez. 2007).
ANEXOS
ANEXOS – A
ATA DE INSTALAÇÃO DA FEDERAÇÃO DE UMBANDA E CULTOS AFROBRASILEIROS DO MARANHÃO
DIÁRIO OFICIAL - ABRIL DE 1966.
ANEXO – B
EXTRATO DE ESTATUTO DA FEDERAÇÃO DE UMBANDA E CULTOS AFROBRASILEIROS DO MARANHÃO
DIÁRIO OFICIAL - FEVEREIRO DE 1982.
ANEXO – C
PORTARIA N° 007/2001 – ASPLAN/GEJUSPC GARANTINDO O FUNCIONAMENTO DE
ATIVIDADES RELIGIOSAS UMBANDISTAS EM DETERMINADOS LOCAIS E
HORÁRIOS FISCALIZADOS PELA FEDERAÇÃO DE UMBANDA E CULTOS AFROBRASILEIROS DO MARANHÃO
ANEXO – D
DOCUMENTAÇÃO DA FEDERAÇÃO DE UMBANDA ESPÍRITA E CULTO AFROBRASILEIRO DO MARANHÃO REFERENTE AOS SEUS FILIADOS
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Márcia Andréa Teixeira da Silva - Outros Tempos