Estratégia empresarial e desenvolvimento econômico:
o caso da Companhia Vale do Rio Doce (CVRD).
Autoria: Marta Zorzal e Silva
Resumo
A forma como a CVRD gerou desenvolvimento e transformou as regiões de sua área de
influência direta, ao longo de seus quase 55 anos de existência como estatal, é o tema desse
artigo. Tendo por objetivo conhecer os fatores políticos e institucionais que estiveram na raiz
do sucesso da Vale, examina-se as principais estratégias da empresa visando a vencer os
desafios que fizeram parte de sua história. A análise revelou a presença de cinco etapas
distintas na escalada de crescimento da empresa, as quais refletem mudanças qualitativas de
patamar tanto em termos tecnológicos como administrativos e empresariais. Tais mudanças
têm como fulcro um amplo inter-relacionamento constituído pela estatal com empresas
privadas, cuja sinergia produziu um profundo “entrelaçamento” com o setor industrial e de
serviços tanto no mercado nacional como no internacional. Esta estratégia a transformou
desde muito cedo numa empresa com características de global player o que permitiu que ela
crescesse e se multiplicasse por caminhos diversos.
Palavras chave: Estado desenvolvimentista; regulação; estratégia empresarial, empresas
estatais.
1 INTRODUÇÃO
A ação da Companhia Vale do Rio Doce (CVRD) na trajetória de crescimento da economia
brasileira, pós guerra, é o tema deste artigo. Focalizo sobretudo o impacto causado pela
atuação da Companhia no desenvolvimento socioeconômico das regiões de sua área de
influência direta – Espírito Santo e Minas Gerais, no Sudeste, e Amazonas, Pará e Maranhão,
no Norte – ao longo de seus quase 55 anos de existência como estatal.
Conhecer os fatores políticos e institucionais que estiveram na raiz do sucesso da CVRD em
gerar crescimento e mudança econômica, assim como, as suas principais estratégias
objetivando vencer os gigantescos desafios que fizeram parte de sua história foi um dos
objetivos centrais da pesquisa que realizei sobre a Companhia. Tal investigação esteve
vinculada ao tema da crise e do processo de reforma do Estado desenvolvimentista brasileiro,
cuja centralidade no debate contemporâneo colocou em evidência o tema da mudança na
natureza de suas atribuições. O estudo do processo de reforma do Estado foi abordado a partir
da perspectiva dos processos de desregulamentação e de privatização. Para tanto, foi
escolhido o caso da CVRD como referente empírico. O resultado da pesquisa constituiu-se em
tese de doutorado em Ciência Política defendida no departamento de Ciência Política da
Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo, em janeiro
de 2001.
Uma das razões que contribuiu para que a privatização da Vale se constituísse em objeto de
estudo com muitas veredas por explorar, dentro do recorte analítico que estabeleci, esteve na
relativa ausência de estudos sobre a empresa. A trajetória de crescimento e a forma como se
efetivaram as relações políticas e institucionais da CVRD com o Estado, na fase
desenvolvimentista, ainda não haviam sido exploradas. Assim, apesar de o tema da
privatização ter se constituído no foco mais geral da pesquisa, um dos ângulos da análise
1
esteve voltado para a forma de regulação das relações entre empresa estatal e Estado; e para o
caráter da ação estratégica das estatais no contexto do desenvolvimento capitalista
retardatário, característico do Brasil. Essas análises visaram a destacar o padrão de relações e
os mecanismos de regulação da relação estatal/Estado e estatal/mercado e suas modificações
ao longo do tempo, antes da crise e reforma do Estado ocorrida a partir dos anos 80. O
objetivo deste artigo é apresentar de forma sucinta as reflexões e analises realizadas sobre
estas duas vertentes analíticas..
Deste ângulo, o artigo examina o papel estratégico atribuído à estatal no cenário do
desenvolvimento econômico e a forma como a empresa deu vida a este papel, gerando
crescimento e transformação econômica em sua área de influência direta. Mostra que o know
how e a expertise técnica desenvolvidas e acumuladas pela empresa e, sobretudo, os vínculos
e conexões estabelecidos com o mercado internacional, nesse percurso, permitiram à CVRD,
tanto aproveitar novas e ricas janelas de oportunidades, como navegar olimpicamente em
águas tranqüilas, apesar das diversas crises vividas pela economia brasileira.
Focalizando os nexos e conexões constituídos pela estatal, tanto na direção do mercado como
no âmbito do Estado, no contexto da industrialização por substituição de importações,
ocorrida no pós guerra, o artigo está organizado em quatro seções, além desta introdução. A
segunda apresenta em linhas gerais os traços característicos do Estado desenvolvimentista
constituído no Brasil. A terceira mostra a ação estratégica da CVRD neste contexto, e a
quarta traz as principais conclusões.
2
ESTADO DESENVOLVIMENTISTA
A institucionalização do padrão de relações Estado/mercado na América Latina conformou
em alguns países, em especial, no Brasil e no México a predominância de determinada
modalidade de intervenção estatal que tem sido apreendida pela idéia de Estado
desenvolvimentista.
A teorização em torno da noção de Estado desenvolvimentista surgiu muito recentemente no
âmbito da teoria política comparada ligada aos estudos que visam explicar o desenvolvimento
industrial acelerado do Japão e demais países do Leste Asiático, no pós-guerra, em confronto
com países ocidentais desenvolvidos, como uma teoria de médio alcance. Essa literatura,
geralmente situa a obra de Chalmers Johnson “MITI and the Japanese Miracle: The Growth
of Industrial Policy, 1925-1975”, publicada em 1982, como sendo pioneira no revigoramento
das teses desenvolvimentistas.
Embora os termos desenvolvimentista, nacional-desenvolvimentismo e Estado
desenvolvimentista tenham um amplo lastro no debate das ciências sociais e econômicas
sobre o problema do desenvolvimento da América Latina, não se chegou a produzir uma
coerente sistematização teórica em torno da idéia de Estado desenvolvimentista neste debate.
Entre nós predominou muito mais um discurso desenvolvimentista preconizando a
necessidade da industrialização e da intervenção do Estado para promovê-la, do que uma
formulação das características essenciais deste tipo de Estado e de suas relações com a
economia e com a política.
Sem entrar em considerações sobre os termos deste debate e seu efeitos sobre os traços
característicos dos tipos de estados constituídos tanto na América Latina como no Leste
Asiático, é importante destacar que a idéia de Estado Desenvolvimentista tem suas raízes
vinculadas a realidades históricas profundamente distintas, tanto no tempo como no espaço: a
América Latina, pós crise dos anos 30, e o Leste Asiático no contexto da bipolaridade LesteOeste.
2
Na verdade, o que essas formulações tem em comum é uma construção feita a partir da
observação de realidades empíricas distintas e nelas as práticas constituídas visando adequar
meios para obter fins racionalmente defensáveis, tais como a construção do Estado e da
autonomia nacional, calcadas numa estratégia de desenvolvimento econômico.
Resumidamente, a idéia de Estado desenvolvimentista especifica uma modalidade de relação
entre Estado e Mercado característica do desenvolvimento capitalista tardio, em que o Estado,
via intervenção no mercado, assume a tarefa de instaurar a ordem industrial moderna. Ou,
segundo a formulação oriunda dos países do Leste Asiático, são considerados
desenvolvimentistas, àqueles Estados capitalistas que desempenharam um papel estratégico
no controle das forças de mercado internas e internacionais e na sua utilização em favor de
um interesse econômico nacional (White & Wade, apud Evans, 1993, p. 117). Como Johnson
(1982) sublinha, a principal prioridade da ação estatal, atualizada permanentemente, é o
desenvolvimento econômico definido em termos de crescimento, produtividade e
competitividade mais do que em termos de bem estar. Tais metas são construídas a partir de
referências econômicas externas que provêem modelos à administração pública.
A legitimidade para esta modalidade de ação estatal foi construída a partir das teorias do
desenvolvimento. Estas produzidas, sobretudo no pós-guerra, sistematizaram a idéia de que os
aparatos de Estado podiam ser usados para promover o desenvolvimento capitalista nos países
periféricos. O principal encargo do Estado era acelerar a industrialização, mas também se
esperava que desempenhasse um papel na modernização da agricultura e no fornecimento de
infra-estrutura necessária à urbanização (Evans, 1993, p. 107).
Embora as trajetórias de cada um dos países que seguiram essa modalidade contenham
especificidades que os singularizam frente aos demais, pode-se afirmar que a dimensão
econômica dos processos sociais, expressa na premissa do desenvolvimento industrial,
assumiu status predominante na capacidade estratégica dos Estados e dos governos para
administrar o exercício político – de conflito e de cooperação – no interior das diversas
sociedades e nas sua relações com o sistema internacional (Contreras, 1994, p. 11).
Em que pese o fato do período pós-guerra ter sido marcado, em termos do desenvolvimento
capitalista, em geral, pela hegemonia do consenso keynesiano, o que produziu, além de muitas
variantes empíricas, quer nos países desenvolvidos quer nos países em desenvolvimento, uma
ativa e crescente intervenção do Estado na economia, tal quadro ideológico e intelectual
reforçou os fundamentos intervencionistas da estratégia desenvolvimentista tanto nos países
da América Latina como nos do Leste Asiático. Assim, apesar das diferenças entre estes
países (Asiáticos e Latinos), o traço comum que permite considerá-los enquanto pertencentes
a uma mesma categoria analítica está no caráter intervencionista da relação Estado/mercado.
Todavia, no contexto da superposição das crises externas e internas, dos anos 70 e 80, tais
fundamentos ideológicos foram colocados em xeque, assim como, a modalidade de
intervenção estatal que viabilizou a expansão do capitalismo no Brasil. Nesse movimento, a
idéia de Estado desenvolvimentista, fundada no suposto papel estratégico do Estado como
indutor da transformação socioeconômica, foi considerada anacrônica. Ao mesmo tempo em
que os termos intervenção e regulação assumiram conotações distintas no debate, na medida
em que trazem por substrato sentidos que os remetem a teorizações que postulam papéis
diametralmente opostos para a ação estatal. A noção de regulação assumiu conotação
positiva, associada à idéia de Reforma do Estado, enquanto que intervenção, associada à idéia
de Welfare State e de Estado Desenvolvimentista, passou a expressar o inverso.
Enfim, sintetizando e delimitando, é para a modalidade de intervenção do Estado
Desenvolvimentista constituído no Brasil que as atenções desta artigo estão voltadas. O tema
central aglutinador é o processo através do qual foi forjado um marco institucional e uma
3
dinâmica reguladora das relações Estado/mercado, e nesse âmbito as características das
relações e conexões constituídas entre empresa estatal, Estado e mercado no Brasil.
Meu principal argumento é o de que em países como os da América Latina e, sobretudo no
Brasil, o padrão de regulação das relações entre estes agentes, se visto da ótica do tipo
clássico de Estado capitalista, tal como o originário no mundo anglo-saxão, era muito
precário, ou simplesmente não existia.
Com isto quero dizer que nesta esfera de atividades e relações predominava uma dinâmica
semelhante àquela verificada nos Estados desenvolvimentistas constituídos no Leste Asiático,
porém com as particularidades próprias do caso brasileiro. Isto é, do ponto de vista da
institucionalização do sistema político se produziu, no Brasil, um híbrido institucional
(Santos, 1993). Tal formação híbrida resultou, de um lado, da seqüência em que a ordem
industrial e a sociedade de massa foram instauradas e, de outro, do papel assumido pela
política social neste processo. Como conseqüência, pelo menos quatro padrões institucionais
de relações estruturam os laços entre sociedade e Estado. São eles: o clientelismo, o
corporativismo, o insulamento burocrático e o universalismo de procedimentos (Nunes,
1997). Além disso, do ponto de vista da dimensão legisladora e regulatória do Estado a
interação entre essas várias dimensões institucionais produziu formas distintas de incidência
dos mecanismos reguladores nas diversas esferas de relações entre sociedade e Estado. Sobre
este aspecto há um relativo consenso na literatura no sentido de que determinadas esferas são
super reguladas (ex. Estado/mercado de trabalho), enquanto que outras são sub reguladas (ex.
Estado/empresas públicas). Tais particularidades têm conduzido os comparativistas a agregar
novos adjetivos ao termo Estado para descrever o tipo constituído no Brasil, tais como:
“Estado desenvolvimentista intermediário” (Evans, 1993, 1995), Estado desarrollista
(Schneider, 1999), entre outras, para dizer que não se trata de um caso tipo ideal no sentido
weberiano do termo.
Como mostrarei, na conclusão, a análise a partir desta perspectiva revelou traços importantes
que marcaram a trajetória do Estado brasileiro nas suas relações com a economia e com a
política. O foco sobre o caso da Companhia Vale do Rio Doce, cujo percurso histórico
vincula-se à trajetória da era desenvolvimentista ajudou a lançou luz sobre as conexões e teias
de relações constituídas entre o Estado, a estatal e o mercado ao longo do período. A
descrição, a seguir, das principais etapas de crescimento da empresa centrada nas dimensões
estratégicas das mudanças empreendidas face aos desafios enfrentados, seja no âmbito
político institucional, seja no mercado em geral, tem a intenção de mostrar, em grandes linhas,
a forma como a empresa lidou com estes aspectos.
3 A
AÇÃO ESTRATÉGICA
DESENVOLVIMENTISTA
DA
CVRD
COMO
CONTRAFACE
DO
ESTADO
Não cabe explorar aqui os antecedentes históricos e toda a batalha política sobre a questão
mineral e sua vinculação com a emergência do Estado desenvolvimentista no Brasil. Apenas
registrar que, no limiar dos anos 40, tais questões conduziram à decisão política no sentido de
desvincular o problema da instalação da siderurgia da questão da exploração do minério de
ferro através da criação de duas organizações estatais distintas: a CSN e a CVRD. Esses
conflitos haviam se estendido durante toda primeira metade do século XX e, na conjuntura da
Segunda Guerra, foram equacionadas via acordos de guerra entre Brasil, Estados Unidos e
Inglaterra, conhecidos como Acordos de Washington, assinados em 1942. Estes, entre outras
determinações, definiram as bases para a organização de uma Companhia para a mineração e
exportação do minério de ferro brasileiro.
4
Com estes acordos, o Presidente Getúlio Vargas, por meio do Decreto-Lei nº. 4.352, de 1º. de
junho de 1942, definiu as bases para a organização e estruturação da Companhia Vale do Rio
Doce. Como conseqüência, as Companhias Brasileiras de Mineração e Siderurgia e a Itabira
de Mineração S/A, naquele momento pertencentes ao grupo de Percival Farquhar, e a Estrada
de Ferro Vitória a Minas1 foram encampadas, os acionistas indenizados pelo governo, e os
contratos em vigor rescindidos. Os bens pertencentes a estas empresas foram incorporados ao
patrimônio da União e passaram a ser administrados e gerenciados pela Companhia recém
criada.
Constituída sob os imperativos da guerra, a CVRD nasceu institucionalmente vinculada as
nações que respaldaram sua criação. Vínculos estes impressos no arranjo institucional que
estabeleceu as bases organizacionais da empresa, na medida em que foi definida uma
estrutura gerencial binacional, em que brasileiros e norte-americanos deveriam dividir entre si
as atividades de direção e controle da empresa. Como resultado uma série de dificuldades e
restrições nasceram junto com a empresa. Além disso, o fim da guerra, pouco tempo depois,
viria agravar ainda mais as suas possibilidades de alavancagem operacional.
Resumidamente, a primeira década de vida da Vale foi marcada por vulnerabilidades e
restrições diversas ao empreendimento2. Tais fatores, a conduziriam, ao final dos anos 40, a
uma situação pré falimentar e de graves limites, na medida em que muito pouco havia se
avançado em termos da construção de sua infra-estrutura operacional. Situação esta, de
dificuldades diversas que em nada poderiam prenunciar os desdobramentos virtuosos que a
empresa passaria a espelhar nas décadas subsequentes.
Os anos 50, no entanto, marcam uma fase de inflexão e de virada definitiva na história da
empresa. Primeiro, a situação gerencial seria resolvida via redefinição dos seus estatutos3.
Segundo, a conjuntura favorável no mercado transoceânico de minério de ferro, propiciada
pela guerra da Coréia, ao lado de uma arrojada estratégia gerencial no sentido de consolidá-la
como grande estatal capaz de gerar divisas para a nação, mudaria definitivamente o perfil da
empresa. Esta estratégia conduziria a CVRD a realizar maciços investimentos integrados em
infra-estrutura operacional – reconstrução da ferrovia, do porto de Vitória e aparelhamento da
minas – e administravo-gerencial cuja resultante, ao mesmo tempo em que gerou as condições
para seu crescimento transformaria, no longo prazo, radicalmente o perfil socioeconômico dos
municípios e, em alguns casos até de unidades estaduais4, de sua área de influência.
Os anos 60, caracterizam a etapa de integração vertical e de implantação da logística de
transporte de carga de longa distância. Respaldada pelo crescimento e autonomia gerencial e
financeira conquistada na fase anterior, a empresa realizou um intenso movimento de
integração vertical, dominando todos os elos de sua cadeia produtiva – desde a produção e
transporte do minério, passando pela venda até a entrega do produto para o consumidor final –
sem intermediários. Além disto, realizaria, no limiar dos anos 60, os primeiros contratos de
longo prazo com as empresas japoneses de siderurgia. Por meio destes foram constituídos, no
dizer de Eliezer Batista, uma verdadeira ponte entre o Brasil e Japão. Viabilizou, com esta
estratégia, a modernização de toda sua infra-estrutura operacional de transporte, ao mesmo
tempo em que se tornou pioneira em termos mundiais na área de logística de transporte de
longa distância, revolucionando os padrões da época. Tal logística fundou-se na construção de
navios para cargas combinadas (óleo/minério) de grande capacidade5, e na construção de
portos simétricos em condições operacionais equivalentes para receber os referidos navios
tanto no Brasil como no Japão. Como resultante foi construído, no Brasil, o Porto do Tubarão,
em Vitória-ES, e constituída a subsidiária DOCENAVE para transportar o minério de ferro da
empresa.
5
Importante destacar que desta conexão com o Japão, construída numa conjuntura crítica de
decolagem do processo reestruração produtiva da indústria do aço, cuja consolidação nas
décadas subsequentes provocaria desconcentração na geografia mundial de produção do aço,
a CVRD acabaria inserida no fulcro deste processo. Como resultante, a empresa daria volta
por cima na situação de crise que se desenhava no mercado ferrífero no limiar dos anos 60,
afirmando sua posição de líder no mercado transoceânico de minério de ferro. Ao mesmo
tempo, a engenharia da logística de transportes, definida para solucionar problemas mútuos,
porém distintos dos dois países, foi a grande invenção que revolucionou o transporte
marítimo, a indústria naval e o sistema portuário então existente.
Na seqüência, viria a etapa de diversificação e conglomeração da empresa que, ao lado da
abertura de novas janelas de oportunidades no norte do país, especificou os rumos estratégicos
da CVRD nos anos 70 e 80. Tendo já assegurado sua posição de líder no mercado mundial de
ferro e, desfrutando, no plano interno, de ampla autonomia gerencial e financeira, ela moveuse, desde o final da década de 60, no sentido da diversificação e conglomeração, via
constituição de diversas empresas coligadas e associadas. Posteriormente, em meados dos 70,
ampliou seu raio de atuação entrando nas áreas de minerais não ferrosos e de madeira e
celulose. A realização deste percurso se fez basicamente via constituição de joint-ventures,
como resultante, a empresa passou a funcionar como holding, a partir de então.
A ampliação do seu raio de ação teve como importante vetor o ingresso da Companhia na
região Amazônica, em meados dos anos 60, via grandes investimentos em pesquisa e
prospecção mineral, realizados através da subsidiária DOCEGEO. Com esta estratégia abriu
novas e ricas janelas de oportunidades as quais se materializariam nas décadas seguintes via
implementação de dois megas projetos de investimentos. O primeiro, executado nos anos 70,
por determinação do Governo Médice, consistiu na organização e viabilização de um amplo
consórcio multinacional para implantação do complexo minero-industrial para exploração de
bauxita e produção de alumina/alumínio na Amazônia. Com a execução deste projeto a
CVRD consolidaria sua atuação tanto na área dos não ferrosos como na região amazônica, ao
mesmo tempo em que pavimentaria seu caminho para constituição do Sistema Norte de
exploração mineral. Este se efetivaria a partir da implantação do complexo mina-ferroviaporto para mineração e exportação da produção oriunda das ricas jazidas de minério de ferro,
manganês, ouro e outros metais. Conhecido como projeto Ferro Carajás foi implantado, no
início do anos 80, apesar da conjuntura de crises que marcou aqueles anos, consumando,
assim, o segundo mega projeto na Amazônia. Cumpre destacar que a implantação destes
projetos se efetivou em moldes similares aqueles vigentes no Sistema Sul, cuja dinâmica mais
geral estrutura-se via sistemas integrados de produção, articulados pela logística de
transportes da empresa.
O início dos 90 marcam a fase de reformulação radical das estruturas de gerência, que passam
a funcionar como áreas de negócios e, também, o período de preparação da empresa para
entrar na agenda da política de privatizações.
Como resultado, ao longo de seus quase 55 anos de existência, enquanto estatal, a empresa
constituiu um amplo leque de atividades que vão desde o setor agrícola, passando pela
indústria tradicional e de ponta, setores de infra-estrutura e de serviços, até a agenda
financeira. Nessa trajetória, a empresa transformou-se num grande conglomerado, constituído
por 52 empresas, cuja composição se organiza através de quatro tipos de empreendimentos: a)
operações próprias, b) empresas controladas, c) empresas coligadas, e d) participações
estratégicas. Estes empreendimentos abrangem sete segmentos econômicos incluindo
operações produtivas e de serviços, os quais no início dos anos noventa foram organizados em
7 áreas de negócios. São elas:
6
ÁREAS DE NEGÓCIO
4
Nº. EMPRESAS POR ÁREA
01
Minério de Ferro, Pelotas e Manganês
9 empresas
02
Transportes e Operações Portuárias
10 empresas
03
Metalurgia e Siderurgia
9 empresas
04
Bauxita, Alumina e Alumínio
6 empresas
05
Pesquisa Mineral e Minerais Não Ferrosos
7 empresas
06
Madeira, Celulose e Papel
5 empresas
07
Escritórios Comerciais
6 empresas
TOTAL
52 empresas
CONCLUSÕES
A partir dos anos 30, sob a direção de Getúlio Vargas, com forte apoio dos militares, a face
institucional do Estado brasileiro foi modificada via criação de novos órgãos, mudanças
qualitativas nos gastos do governo e na relação Estado/Mercado. A partir de então iniciou-se o
processo de construção da estrutura institucional que caracterizou o Estado
desenvolvimentista brasileiro. No âmbito da reforma do Estado implementada foram criados
novos ministérios, especialmente os ligados a regulação do mercado de trabalho e a promoção
do desenvolvimento industrial, assim como, foram criados diversos conselhos, autarquias e
empresas estatais visando a abarcar a expansão da agenda de demandas que a industrialização
tardia passava a impor. Ao mesmo tempo, uma nova engenharia fiscal e financeira foi gestada
para dar conta do aumento dos gastos e investimentos que cresceram na esteira deste
processo. O novo modelo fiscal criado consistiu na fórmula: Fundo Fiscal + Receita
Vinculada + Entidade Autônoma (Prado, 1994).
A forma como se equacionou o problema da mudança institucional naquela conjuntura de
crises e de mudanças econômicas acabou gerando um Estado que incorporou a dualidade
presente na persistente tensão entre permanência e mudança, ressaltada anteriormente. Esta
caracterizou a trajetória desenvolvimentista brasileira, entre os anos de 1940 a 80,
considerados de pleno funcionamento deste modelo.
O preço da transição sem rupturas, da perspectiva da construção dos elos e conexões entre
Estado e sociedade, como já foi demostrado pela literatura pertinente6, foi a produção de uma
institucionalidade dual. Os pares destas dualidade podem ser visualizados, seja na edificação
do sistema de regulação e controle; seja na produção de um aparato organizacional
dicotômico, resumido na fórmula: administração direta, de um lado, e administração indireta
de outro; seja na forma de incorporação política das elites e das massas; seja no redesenho do
pacto federativo da nação.
Do ponto de vista da constituição dos aparatos de intervenção e de regulação da relação
Estado/mercado, tal estratégia conduziu a formação de bolsões de eficiência no interior da
burocracia estatal. Assim, ao invés de uma profunda reforma visando a dotar a estrutura
institucional do Estado, em construção, de uma efetiva autonomia assentada na sociedade, se
realizou reformas parciais que combinou elementos de conservação e de mudança. A
dualidade produzida na dinâmica de funcionamento do Estado, constituiu o traço singular que
define o caráter intermediário do caso brasileiro, de acordo com Evans (1993, 1995).
7
A análise de como foram construídas as teias de relações entre o setor produtivo estatal e o
mercado, e neste âmbito a forma como foram amalgamadas as relações simbióticas entre
Estado e mercado, à luz do caso da CVRD, evidenciou características institucionais que
moldaram tanto a ação intervencionista direta como a regulação mais geral dessa relação, no
período de vigência da estratégia desenvolvimentista.
Foi possível demonstrar, nos termos descritos por Evans (1995), o papel de “bolsão de
eficiência” exercido pela Vale ao longo dessa trajetória. Os impactos sinérgicos que
promoveu crescimento e expansão econômica nos estados da federação sob sua área de
influência direta, tanto no Sistema Sul como no Sistema Norte, atestam o caráter de agência
de desenvolvimento exercido pela empresa neste período. Atestam também a hipótese de que
é nas características do Estado Desenvolvimentista de tipo intermediário constituído no
Brasil, e na natureza dos vínculos institucionais estabelecidos entre este tipo de Estado e a
CVRD que se encontram as razões que explicam o fato de a empresa ter se tornado um bolsão
de eficiência no contexto da expansão capitalista brasileira. Ademais, é somente
considerando a natureza dual da estrutura institucional do Estado que se tornam inteligíveis as
ações estratégicas do Estado via empresas estatais, assim como, a forma como se processou a
regulação dessa relação. Também nela reside os nexos que explicam a forma como foram
equacionados os conflitos resultantes das tensões entre as diferentes frações do capital –
nacional, multinacional e estatal –, ao longo desta trajetória. Como resultante, se produziu
uma institucionalidade que exacerbou a tendência à crescente autonomização das empresas
estatais.
Tal tendência, no caso da CVRD, se reforçou duplamente. Primeiro, por suas atividades
estarem ligadas ao mercado externo, o que a obrigou a submissão às regras deste mercado.
Competência, competitividade e boa dose de astúcia eram condições sine qua non para a
empresa sobreviver e sobrepujar concorrentes melhor posicionados quando de seu ingresso
em cena. Segundo, por atuar na extração e exportação de minério de ferro. De um lado, esta
matéria prima foi perdendo importância estratégica para o desenvolvimento industrial e, de
outro, se tornou super abundante no contexto mundial, em razão de descobertas de ferro na
Austrália e África do Sul, nos anos 60. Fatos estes que obrigaram a empresa a realizar
investimentos maciços em logística de transportes e em desenvolvimento tecnológico, tanto
para encurtar as distâncias dos mercados para torna-se competitiva, como para tornar seu
produto básico – minério de ferro – diversificado, para atender as novas demandas de
reestruturação produtiva que se processava na indústria do aço.
Ao lado destes fatores emanados do jogo das forças do mercado estão aqueles resultantes das
determinações e regulações do Estado brasileiro. Estes últimos expressos em termos de
diretrizes e do papel reservado à empresa no contexto da estratégia desenvolvimentista. Na
conjuntura da industrialização retardatária e simultânea afirmação do Estado nacional
brasileiro, a criação da CSN (1941) e da CVRD (1942), funcionou como importante ícone no
advento do novo modelo de Estado que emergia, assim como, na afirmação do discurso
nacional-desenvolvimentista como guia e elemento de legitimação da estratégia
intervencionista do Estado.
O novo formato de ação do Estado, via intervenção direta, no imediato pós guerra, quando os
temas nacionalistas estavam mais do que exacerbados, acabou por conformar uma área de
atividades e relações geridas pelo Estado; através da constituição de um bloco de empresas
estatais – CSN, CVRD e PETROBRAS – capaz de contra-arrestar a cobiça dos interesses externos
sobre os recursos minerais brasileiros. Como conseqüência, tais “condições ambientais”
gerais, nos termos definidos por Michael Loriaux (1999), deu aos primeiros dirigentes da
empresa a energia vital que os motivou a lutar pela afirmação da empresa enquanto estatal,
num primeiro momento, assim como, amalgamou uma forte coesão interna e um espírito de
8
corpo, traduzido em força e solidariedade interna, movidas para superar os mais árduos
obstáculos, nas décadas subsequentes.
Esta energia e coesão interna, permanentemente reafirmada, pelo menos até os anos oitenta,
conduziu a empresa a auto afirmar-se, via construção de uma forte auto-regulação interna7.
Com isso, ela obteve condições para consolidar-se enquanto grande empresa exportadora,
num contexto adverso, principalmente, em termos das distâncias dos principais mercados
consumidores de seus produtos e de reestruturação da indústria siderúrgica ocorrida a partir
dos anos 60.
Se, além disso, se levar em conta que, no período dos anos 40 a 70, o desenvolvimentismo se
constituía numa ideologia que conferia a industrialização um alto grau de prioridade, mais do
que a qualquer outra meta societal, e atribuía ao Estado a tarefa de promovê-la (Schneider,
1999), tem-se a exata dimensão do que representava o sucesso daqueles empreendimentos
estatais pioneiros, seja do ponto de vista microempresarial seja da perspectiva da estratégia de
desenvolvimento do Estado-nação.
Deste ângulo, tornam-se claras as tarefas específicas que o Estado desenvolvimentista
emergente conferiu à Companhia Vale do Rio Doce desde o seu nascedouro, qual seja, ... a de
gerar divisas e, assim, ser um instrumento de desenvolvimento do país (Eliezer Batista, 1985).
Assim, se da confluência das restrições e possibilidades, externas e internas, emergiu o
imperativo que moveu a ação do Estado na provisão de bens e serviços, este se materializou
via ação empresarial estatal. Ao mesmo tempo em que, neste diapasão, foram sendo
constantemente ampliado e repactuado os graus de autonomia financeira, gerencial e
sobretudo estratégica das estatais. Esta última, no sentido da formulação de suas próprias
diretrizes empresariais de crescimento.
A CVRD, ao cumprir sua tarefa na construção da modernidade industrial brasileira, agiu
buscando eficácia, rentabilidade e crescimento constante. Dessa forma conquistou patamares
crescentes de autonomia. As análises efetuadas atestam sobremaneira a dimensão de sua
autonomia estratégica, o que garantiu a linha de continuidade de sua expansão empresarial em
consonância com os rumos das transformações mais gerais do sistema capitalista, sobretudo,
no âmbito das mudanças tecnológicas. Revelam, por outro lado, a contraface da ação
empresarial do Estado via empresas estatais, permitindo decifrar os nexos e as teias de
relações constitutivas da estratégia desenvolvimentista que conduziu os rumos da ação
interventora do Estado. Tal estratégia, na verdade, estruturou a dinâmica relacional empresa
estatal/governo, cujo amalgama permitiu sobrepujar a transitoriedade dos governos, vistos
como coalizões de forças políticas conjunturais circunscritas a um dado período
governamental.
Esses nexos, radicam-se em duas dimensões básicas do Estado desenvolvimentista. Primeiro,
na existência de uma certa “ambição moral para o desenvolvimento”, no sentido que Loriaux
(1999) dá a esta expressão neste tipo de relação Estado/sociedade. Em essência, significa a
presença de uma incorporação normativa, para usar o poder interventor do Estado para guiar o
investimento de forma a promover uma certa visão compartilhada em termos de rumos da
economia nacional8. Essa visão esteve calcada no discurso desenvolvimentista, atribuindo à
industrialização o papel de carro chefe à conquista de padrões de crescimento e consumo
idêntico àqueles observados nas economias avançadas. Como tal se constituiu no mote mais
geral que moveu tanto a intelligentsia econômica e militar brasileira, como também, o
empresariado e as demais classes sociais, especialmente, as classes médias, neste rumo.
Produziu, assim, o substrato que deu sentido e continuidade a essa estratégia.
Se no plano das percepções, o desenvolvimentismo sinalizou os rumos, no plano tático, a
garantia de continuidade da ação esteve, em grande medida, a cargo das estatais, enquanto
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estruturas estáveis, cuja permanência no tempo as diferenciam da provisoriedade dos
governos. Embora, empresa estatal e governo caracterize duas esferas de relações distintas
que demarcam o caráter da estrutura institucional dual do Estado brasileiro, elas se constituem
enquanto faces da mesma moeda.
É exatamente nessa estrutura que reside a chave para compreender a lógica da relação
empresa estatal/Estado, no Brasil. O aparato constituído, do ponto de vista de sua unidade, é
uma entidade dual, ao mesmo tempo: forte e fraco, eficaz e ineficaz, ágil e lento, enfim ...,
polaridades que tem sido ressaltadas pela literatura, e que se poderia acrescentar outras. Mas,
o que importa reter é que, nessa constituição dual, mediando entre duas áreas de atividades e
relações distintas, está o nexo que explica sua lógica e seus mecanismos. Portanto, o nexo
que explica, de um lado, sua força e sucesso, onde as estatais do setor produtivo sobressaíram;
de outro, sua fragilidade e fracasso, sobretudo, no âmbito da política social ampliando as
desigualdades e exclusão social, que marcou o percurso excludente e elitista do período.
Outro aspecto que deve ser ressaltado é relativo a regulação e controle das estatais, cuja lógica
deve ser compreendida nos marcos do desenvolvimentismo acelerado. Esta orientação
definiu, no plano estratégico, o raio de ação mais geral para as empresas estatais. Portanto, o
horizonte e espaço de ação sinalizado, o qual continha por substrato a idéia de que as estatais
deveriam funcionar como se empresas privadas fossem.
Como Trebat (1983) sublinhou, esta concepção, do ponto de vista do controle público,
portanto, da regulação das atividades das estatais, significava a não necessidade de criar
agências especificas destinadas a supervisioná-las. O pressuposto era de que elas deveriam
ser julgadas por seus resultados, pelas suas habilidades em caminhar de tal forma a eliminar
inteiramente a dependência financeira do governo. Como resultante, ao longo de toda
trajetória desenvolvimentista, não se fez nenhum esforço para averiguar se, por exemplo, o
plano orçamentário das empresas públicas refletia uma preocupação com custos, ou se os
planos de investimentos eram racionais, ou ainda, se os seus excedentes financeiros (lucros)
eram tão elevados quanto poderiam ser.
Esse fato, ao lado da ambigüidade resultante da institucionalidade dual do Estado brasileiro,
produziu um modelo que ficou a meio caminho, por isso denominado de intermediário. Traço
este observado nas mais diversas dimensões. Seja nos mecanismos reguladores fragmentados,
incapazes de ordenar e disciplinar a ação estatal, seja na formação de uma estrutura
burocrática coesa capaz de realizar uma efetiva articulação Estado/mercado em termos de
desenvolvimento, principal diferença em relação aos países Asiáticos. A conseqüência
danosa é que o Estado brasileiro, sob o ponto de vista da regulação e mesmo da direção
“falava por muitas vozes” (Trebat, 1983). Com isto, se produziu fragmentação da autoridade
refletindo-se na não coordenação ordenada das metas e decisões políticas. Do ponto de vista
da intervenção direta, permitiu a crescente expansão das empresas estatais para os mais
diversos setores.
Estas características aliadas ao fato de que para as empresas estatais estavam reservadas
atividades distintas daquelas que deveriam ser realizadas pelo governo, através da
administração direta, completa a natureza do âmbito institucional onde as estatais detinham
ampla autonomia para definir suas próprias estratégias empresariais. A forma como cada
estatal dos diversos ramos industriais e de serviços processou e materializou as diretrizes mais
gerais da orientação desenvolvimentista, neste contexto, esteve em grande medida nas mãos
dos dirigentes que durante este percurso deu substância e conteúdo a ação empresarial do
Estado.
O caso da Companhia Vale do Rio Doce, demonstra que a empresa agiu verdadeiramente
“como se empresa privada fosse”, num horizonte de futuro definido com um alto grau de
10
abrangência e elasticidade, em termos dos limites de até onde deveria avançar com metas e
estratégias empresariais próprias a perseguir. A idéia introjetada pela burocracia empresarial
de que a empresa deveria crescer e tornar-se competitiva para gerar divisas visando alimentar
o desenvolvimento industrial brasileiro, mais do que indicou que ela deveria caminhar com as
próprias pernas e, ainda, gerar excedente para contrabalançar as contas do balanço de
pagamentos. Cumprindo tal missão estaria colaborando para o desenvolvimento industrial da
nação e dessa forma contribuindo para superar o atraso do país.
A ambição moral para o desenvolvimento que alimentou as várias gerações de dirigentes da
CVRD, não ficou só na geração de divisas. Desde a década de cinqüenta disseminaram e
fortaleceram a idéia de que a empresa deveria ser uma autêntica agência de desenvolvimento,
agindo no sentido de fecundar novos investimentos. Ou seja, no dizer de Eliezer Batista,
torna-se uma autêntica “incubadora de novas empresas” e, dessa forma, gerar empregos,
renda e crescimento econômico e social, enfim, desenvolvimento. Este é um traço forte que
caracteriza a estratégia da CVRD ao longo de sua trajetória de quase 55 anos enquanto estatal.
Caminho este que a conduziu a constituir um patrimônio próprio invejável sobre todos os
aspectos. Ou seja, parafraseando a fala de um trabalhador das minas de Itabira-MG: a Vale é
uma empresa que nasceu pequena, pobre que nem nós, e hoje, é esse monstro que está aí”.
Enfim, concluindo, a sinergia resultante do profundo “entrelaçamento” com mercado interno
e externo e, principalmente, com a experiência japonesa de desenvolvimento, permitiu a
empresa crescer e se multiplicar por caminhos e áreas de atividades diversas. Caminhos estes
que, de um ponto de vista restrito, seria inusitado prever como atividade típica de uma
empresa exportadora de minérios, cuja função mais óbvia atribuída foi a de extrair, vender e
transportar minério de ferro de um ponto a outro do planeta.
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Humanas, Universidade de São Paulo.
1
A ferrovia Vitória–Minas foi constituída em 1901, por empresários capixabas e mineiros, para escoar a
produção agrícola do vale do rio Doce. Havia iniciado sua construção em 1903 com um traçado projetado para
Vitória-ES a Peçanha-MG, depois mudou para Vitória a Diamantina. Em 1942 contava com apenas 313 Km
construídos.
2
Os anos 40 foram consumidos na administração dos conflitos resultantes das ambigüidades de direção contidas
no decreto de criação. O Artigo 6º, Inciso 3º, define que a diretoria seria constituída de 5 membros, composta por
um presidente de nacionalidade brasileira, dois diretores de nacionalidade norte-americana e dois de
nacionalidade brasileira. Este conflitos, somados ao fim da guerra, em 45, reduziu a urgência da necessidade de
minério de ferro, ameaçando a sobrevivência da empresa.
3
O novo estatuto definindo que toda a diretoria seria constituída por brasileiros foi aprovado na Assembléia
Geral Extraordinária realizada em 07/02/50.
4
O Estado do Espírito Santo exemplifica este processo, na medida em que a dinâmica do crescimento
econômico estadual, a partir dos anos 60, passou a estar estreitamente vinculada aos impactos das estratégias de
expansão da Vale em seu território.
5
À época o maior graneleiro tinha capacidade para transportar 35 mil toneladas. Com os acordos com o Japão
foram construídos navios para transportar 100 mil toneladas e, posteriormente, ampliados para 250 e 300 mil/t.
Hoje as dimensões dos navios estão limitadas em 500 mil toneladas.
6
Ver, entre outros, Sônia Draibe, (1985); Wanderley G. dos Santos (1993); Brasílio Sallum Jr. (1995, 1996),
José L. Fiori (1993, 1995), Nunes (1997).
7
Auto-regulação entendida em termos genéricos de autodisciplina e de regulação de padrões de comportamento
dos membros da organização, tal como definidos por Baggot (1989) e Boddewyn (1985).
8
Loriaux, apud Woo-Cumings (1999, p. 24). Isso não significa inexistência de conflitos entre projetos
alternativos de desenvolvimento no plano interno.
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Estratégia empresarial e desenvolvimento econômico