Atividades e atos administrativos Aulas 03 e 04 Discricionariedade e vinculação Conceito jurídico indeterminado Caso gerador Ticio foi multado por trafegar acima do limite de velocidade Limite de velocidade foi fixado em regulamento, a partir de previsão da lei (Código Nacional de Trânsito) Como se justifica que essa matéria seja objeto de regulametação infra-legal? Quais os limites ao Administrador no exercício de competência regulamentar? Caso Gerador Código Nacional de Trânsito Art. 61. A velocidade máxima permitida para a via será indicada por meio de sinalização, obedecidas suas características técnicas e as condições do trânsito. §1º. Onde não existir sinalização regulamentadora, a velocidade máxima será de: I – nas vias urbanas: a) oitenta quilômetros por hora, nas vias de trânsito rápido;(...) II – nas vias rurais: 1) nas rodovias, cento e dez quilômetros para automóveis, caminhonetas motocicletas; 2) Noventa quilômetros por hora, para ônibus e microônibus; 3) Oitenta quilômetros por hora, para demais veículos;b) nas estradas, sessenta quilômetros por hora. §2º. O órgão ou entidade de trânsito ou rodoviário local com circunscrição sobre a via poderá regulamentar por meio de sinalização velocidades superiores ou inferiores àquelas estabelecidas no parágrafo anterior. O que é discricionariedade? Classicamente: exercício, pelo administrador, de juízo de conveniência e oportunidade no que concerne ao interesse público, nas margens de liberdade conferidas pela lei Conceito em crescente desprestígio, à luz do dever de motivação e da funcionalização do direito administrativo Discricionariedade e vinculação Na vinculação, todos os elementos do ato administrativo já estão definidos na lei Na discricionariedade, há espaço para juízo de valor pelo Administrador (“mérito do ato administrativo”) Decisão é subjetiva, nos limites da lei, e não pode ser revista pelo PJ Princípio da responsividade É decorrência da noção de Estado democrático Liame entre a vontade popular e a racionalidade pública => dever de responder adequadamente às demandas da cidadania (Diogo de Figueiredo Moreira Neto) Importância da publicidade e da transparência dos atos administrativos para permitir o controle da responsividade Pode o poder judiciário rever o mérito do ato administrativo? Doutrina clássica: o mérito do ato administrativo (conveniência + oportunidade) é insindicável, sob pena de violação do princípio da separação dos poderes Doutrina contemporânea: não refuta a tese acima, mas sustenta que é possível um controle principiológico do ato administrativo discricionário à luz especialmente da razoabilidade e da proporcionalidade Revisão judicial do ato administrativo Teoria excesso competência) de poder (controle da Teoria do abuso de poder / desvio de finalidade (controle da finalidade) Teoria dos motivos determinantes (controle dos motivos) Discricionariedade e conceito jurídico indeterminado Conceito jurídico indeterminado => interpretação / aplicação da lei Sendo uma questão de interpretação, haveria uma única solução => sindicabilidade pelo PJ, à luz da motivação Para outra corrente: zona de certeza negativa zona de certeza positiva zona de penumbra => espaço de escolha do administrador, insindicável pelo PJ (mesmas considerações acerca do juízo discricionário – revisão ‘principiológica’) STJ, EDcl no MS 12.689/DF EMBARGOS DECLARATÓRIOS. MANDADO DE SEGURANÇA. SERVIDOR PÚBLICO. DEMISSÃO. TIPIFICAÇÃO: PREVALECIMENTO ABUSIVO DA CONDIÇÃO DE FUNCIONÁRIO PÚBLICO. CONCEITO JURÍDICO INDETERMINADO. I- A infração disciplinar consistente em o servidor público "prevalecer-se, abusivamente, da condição de funcionário policial" (43 e inciso XLVIII da Lei nº 4.878/65) encerra um conceito jurídico indeterminado, o qual deve ser interpretado a partir dos elementos de cada caso concreto. Descabe, portanto, interpretação apriorística acerca do juízo de aplicação. II- Na espécie, a caracterização da condição abusiva de funcionário público independia da obtenção de vantagem ilícita. Embargos declaratórios acolhidos sem efeito infringente. (EDcl no MS 12.689/DF, Rel. Ministro FELIX FISCHER, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 13.02.2008, DJe 18.03.2008 ) Considere a seguinte situação Juiz deseja ser removido para outra comarca, na qual há uma vaga Requisito para remoção, de acordo com as normas estaduais, é “dois anos na entrância, salvo interesse público relevante, devidamente justificado” Conselho da Magistratura nega o pedido, sob a alegação de que o juiz, embora estivesse há dois anos na mesma entrância, não estava há dois anos na mesma comarca, o que contrariaria o interesse público. Juiz impetra mandado de segurança, sob alegação de violação do princípio da legalidade Decisão de 2ª instância - TJRS “Mandado de segurança. Remoção. Juiz de direito. A antiguidade na entrância não é condição absoluta para a remoção, podendo ser excepcionada pelo interesse público. Art. 37 da LC estadual 6929/75. Margem para a discricionariedade da Administração. Critério do exercício mínimo de doze meses na comarca para a concessão de remoção voluntária, ou seja, confinamento anual. Impetrante que se removera há pouco mais de cinco messe e que busca nova remoção. O só cumprimento de dois anos na entrância não é o único pressuposto avaliável, concorrendo, também, o interesse público. Art. 8º do assento regimental n. 1/88 que excepciona a antiguidade, quando houver interesse público justificado, como ocorreu no caso, pela autoridade administrativa. Mérito administrativo. Ausência de direito líquido e certo. “Mandamus” indeferido. Voto vencido.” Decisão de 2ª instância - TJRS Trecho do voto do Desembargador Relator: “Não assiste razão ao Recorrente quando afirma que o único fundamento para o indeferimento do seu pedido de remoção foi a falta de tempo de permanência na comarca. O fato de o Recorrente contar com pouco tempo de jurisdição, na sua atual comarca, foi fundamental para o indeferimento do seu pedido de remoção, mas porque referida remoção foi considerada pelo Conselho da Magistratura prejudicial e inconveniente ao serviço forense. E os critérios de conveniência e oportunidade não podem ser discutidos pelo Judiciário, que deve apenas se ater ao controle da legalidade do ato impugnado. No caso em tela, o ato do Conselho da Magistratura não foi ilegal ou arbitrário, como alega o Recorrente.” STJ, RMS 19.590/RS RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA. INDEFERIMENTO DE PEDIDO DE REMOÇÃO. INEXISTÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO QUE DEMONSTRE O INTERESSE PÚBLICO. CRITÉRIO DE ANTIGUIDADE MANTIDO. RECURSO PROVIDO. I - O assento regimental nº 1/88, no art. 8º, estabelece o critério de antiguidade para a remoção de magistrado, no caso de mais de um interessado pleitear a remoção para uma única vaga. Critério não absoluto, haja vista a disposição: "salvo relevante interesse público, devidamente justificado". II - Viabilidade do controle do Poder Judiciário acerca de conceitos jurídicos indeterminados e do motivo do ato administrativo. III- Ausência de demonstração de prejuízo ao serviço forense a justificar o afastamento do critério de antiguidade. V - Recurso ordinário provido. (RMS 19.590/RS, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 02.02.2006, DJ 20.03.2006 p. 310) Trecho do voto do Rel Min. Felix Fischer “Ocorre que esse critério – antiguidade – não pretendeu ser absoluto, pois se criou uma exceção por meio da disposição ‘salvo relevante interesse público, devidamente justificado. Para o Tribunal a quo, essa ressalva confere ao administrador a chamada discricionariedade e, por conseguinte, inviabiliza a ‘intromissão’ do PJ no que tange ao mérito administrativo. Todavia, penso que se deve melhor examinar a natureza da assertiva ‘relevante interesse público’. Para mim, trata-se do chamado conceito jurídico indeterminado, ou como prefere o e. Ministro Eros Grau, ‘termos indeterminados de conceito’. (...).” Isenção de controle (discricionariedade) vs. dificuldade de controle (conceito jurídico indeterminado => só há uma solução) Trecho do voto do Rel Min. Felix Fischer “Veja-se que o fato de o conceito jurídico indeterminado resultar em uma modalidade de vinculação administrativa não engessa a atividade administrativa, vez que possibilita a adequação às peculiaridades de cada concreto. (...) Assim, não há outro exame a fazer senão o dos próprios motivos apresentados pelo Conselho da Magistratura, quando indeferiu o pedido do recorrente, com vistas a se verificar se, de fato, adotou-se a solução adequada. (...) Aspecto que me pareceu importante para a análise das razões apresentadas refere-se ao fato de que não foi apontado dado concreto que demonstrasse, na vida profissional do impetrante, qualquer prejuízo ao serviço forense. (...) Trecho do voto do Rel Min. Felix Fischer Assim, e considerando que inexiste requisito legal que exija a permanência de um ano na comarca para fins de remoção; considerando a inexistência de qualquer dado concreto que demonstrasse o ‘relevante interesse público’ a justificar o afastamento do critério de antiguidade; e, considerando que o impetrante preenche os requisitos legais para fins de remoção, dou provimento ao recurso ordinário, concedendo a ordem, para deferir a remoção do concorrente para a comarca da capital.” STJ, RMS 19.210/RS RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. AVALIAÇÃO EM ESTÁGIO PROBATÓRIO. DEVIDA MOTIVAÇÃO. INOCORRÊNCIA. AVALIAÇÃO QUADRIMESTRAL NÃO OBSERVADA. I - Acarreta a nulidade do ato de exoneração a não observância do comando legal que impõe avaliações quadrimestrais mediante relatório circunstanciado. II - Não atende a exigência de devida motivação imposta aos atos administrativos a indicação de conceitos jurídicos indeterminados, em relação aos quais a Administração limitou-se a conceituar o desempenho de servidor em estágio probatório como bom, regular ou ruim, sem, todavia, apresentar os elementos que conduziram a esse conceito. Recurso ordinário provido. (RMS 19.210/RS, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 14.03.2005, DJ 10.04.2006 p. 235) Discricionariedade técnica Na discricionariedade técnica, há propriamente juízo discricionário? Duas correntes Sim, desde que haja mais de uma solução tecnicamente viável Não, porque sempre haverá 01 melhor técnica, não havendo espaço para juízo subjetivo STJ, AgRg no RMS 20.200/PA ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. IMPEDIMENTO DE RELATOR. INOVAÇÃO RECURSAL. NÃO-CABIMENTO. CONCURSO PÚBLICO. REEXAME DE PROVA SUBJETIVA. IMPOSSIBILIDADE. PRECEDENTES. AGRAVO IMPROVIDO. (...). 2. A banca examinadora de concurso público elabora e avalia as provas com discricionariedade técnica. Assim, não há como o Poder Judiciário atuar para proceder à reavaliação da correção das provas realizadas, mormente quando adotados os mesmos critérios para todos os candidatos. 3. Hipótese que não se cuida de mero erro material, considerado aquele perceptível de plano, sem maiores indagações. Conclusão a respeito do direito líquido e certo invocado demandaria análise pormenorizada da resposta dada pelo recorrente à prova subjetiva, não apenas em confronto com a legislação processual, mas também com a orientação doutrinária a respeito do tema, o que não se insere, como referido acima, no âmbito de atuação do Poder Judiciário. 4. Demonstrado que a hipótese não se afasta dos demais casos já apreciados por esta Corte, não há óbice para que o relator, em decisão monocrática, negue seguimento ao recurso, com base no art. 557 do CPC. 5. Agravo regimental improvido. (AgRg no RMS 20.200/PA, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, QUINTA TURMA, julgado em 25.10.2007, DJ 17.12.2007 p. 225) Caso gerador ADMINISTRATIVO - CÓDIGO DE TRÂNSITO BRASILEIRO - LIMITE DE VELOCIDADE DAS VIAS DE TRÂNSITO CRITÉRIOS DE FIXAÇÃO - DISCRICIONARIEDADE DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA - NÃO OBSERVÂNCIA DO LIMITE ESTABELECIDO - MULTA - PROCEDÊNCIA. - Os critérios adotados pela administração pública para fixação dos limites de velocidades nas vias de trânsito estão relacionadas à discricionariedade estabelecida no próprio CTB, não cabendo ao Poder Judiciário, salvo em caso de ilegalidade ou manifesto abuso de autoridade, adentrar no mérito do ato administrativo que os instituiu. - Recurso especial conhecido e provido. (REsp 588253/RJ, Rel. Ministro FRANCISCO PEÇANHA MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 18.08.2005, DJ 17.10.2005 p. 249) Caso gerador Rodovia com previsão de 40 km/h Motorista ao trafegar na madrugada a 54 km/h foi multado em lombada eletrônica, tendo se insurgido contra a multa, por ofensa à proporcionalidade => medida não era necessária para o fim de reduzir acidentes de trânsito Decisão de 2ª instância (TJRS) "MANDADO DE SEGURANÇA. ADMINISTRATIVO. INFRAÇÃO DE TRÂNSITO. EXCESSO DE VELOCIDADE EM RODOVIA DE MADRUGADA. 54 KM. EQUIPAMENTO ELETRÔNICO. LOMBADA. PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE. NULIDADE. 1. A atividade administrativa, no campo do chamado poder de polícia do trânsito, está submetida não só às normas legais como aos princípios gerais de direito administrativo dentre os quais o da proporcionalidade. As medidas administrativas restritivas não podem ir além do mínimo necessário para a satisfação da finalidade pública. 2. Ausente motivo suficiente para justificar a manutenção da redução de velocidade, em rodovia, a 40 km por hora também durante a madrugada, a multa aplicada pela infração - trafegar a 54 km - constatada por equipamento eletrônico (lombada) não guarda proporção com o fim colimado, que é o da segurança do trânsito. 3. Nulidade reconhecida. 4. Recurso provido." STJ, REsp 451.242 ADMINISTRATIVO. INFRAÇÃO DE TRÂNSITO. EXCESSO DE VELOCIDADE DETECTADO POR EQUIPAMENTO ELETRÔNICO. MULTA. CABIMENTO. PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE INAPLICÁVEL. INTERESSE PÚBLICO QUE SE SOBREPÕE AO PARTICULAR. 1. O Código de Trânsito Brasileiro permite ao administrador, no exercício do seu poder de polícia, insindicável pelo Judiciário, regular a velocidade considerando o local e o horário de tráfego. Em conseqüência, não malfere a lei o ato administrativo de polícia que fixa esses limites, porquanto a razoabilidade ou proporcionalidade da velocidade admitida é fruto da técnica do administrador, cuja aferição escapa ao poder judicante na esfera do recurso especial, quer pela invasão da matéria fática, quer pela intromissão indevida no âmbito do administrador. REsp 451.242 2. Os redutores eletrônicos de velocidade, em regra, sob a forma de "pardais" e barreiras eletrônicas, são frutos de acentuada preocupação da Administração Pública com os alarmantes índices de acidentes de trânsito causados pelo excesso de velocidade dos condutores de veículos automotores, mercê de legitimados pelo Código de Trânsito Brasileiro. 3. A atitude do condutor de veículo em ultrapassar a velocidade estabelecida pela administração no exercício do seu poder de polícia desautoriza o cancelamento da multa ao pálio da proporcionalidade, posto implicar essa investida substituição do administrador pelo Judiciário. Supremacia do interesse público. 4. Recurso especial provido. (REsp 451.242/RS, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 11.02.2003, DJ 10.03.2003 p. 113) Caso gerador 7o, inciso XIV, da Lei nº. 9.782/99: Art. 7º. Compete à ANVISA: (...) XIV - interditar, como medida de vigilância sanitária, os locais de fabricação, controle, importação, armazenamento, distribuição e venda de produtos e de prestação de serviços relativos à saúde, em caso de violação da legislação pertinente ou de risco iminente à saúde. Caso Gerador Medicamento produzido e comercializado a partir de utilização de técnica não experimentada no país A ANVISA opta por não paralisar imediatamente a produção e conferir prazo para esclarecimentos MP ingressa com ação requerendo interdição do estabelecimento por violação do direito saúde Pode o Judiciário rever a decisão da ANVISA? Se sim, em que situações? A sua decisão seria distinta caso houvesse resolução da ANVISA obrigando ao prévio cadastro de novas técnicas de medicamento?