MBA – GESTÃO ESTRATÉGICA DE EMPRESAS E NEGÓCIOS
QUALIDADE DE VIDA NO TRABALHO
Egnaldo Sarmento dos Santos
Bruno Gobbi Silva
Prof. Pedro Carlos de Carvalho
INTRODUÇÃO
Não se pode falar em qualidade de produtos e serviços se aqueles que vão
produzi-losnão têm qualidade de vida no trabalho. (FERNANDES, 1996).
Na cultura organizacional contemporânea, o tema Qualidade de Vida (QV)
obteve grande importância, recebendo a denominação de Qualidade de Vida no
Trabalho (QVT). Os recentes seminários, congressos ou fóruns destinados a Recursos
Humanos e Gestão de Pessoas abordam a Qualidade de Vida como um elemento
diferenciador para a sobrevivência das organizações e dos trabalhadores.
A Qualidade de Vida teve tamanha repercussão nos últimos tempos, que há
associações voltadas aos estudos e à disseminação das políticas de QV/QVT que têm
sido aplicadas pelas organizações. A Associação Brasileira de Qualidade de Vida –
ABQV realizará em outubro o VII Congresso Brasileiro de Qualidade de Vida e há doze
anos consecutivos promove o Prêmio Nacional de Qualidade de Vida - PNQV, bastante
disputado por empresas públicas, privadas e outras entidades. Na capital federal foi
instituído o Dia da Qualidade de Vida, comemorado em 23 de setembro, cujo
precursor da iniciativa foi o Instituto Brasileiro de Qualidade de Vida – IBQV, outra
entidade representativa da área.
A Gestão da Qualidade de Vida do Trabalho representa, atualmente, uma
condição estratégica de competitividade das empresas no mercado global, vez que a
produtividade dos empregados associa-se a um nível satisfatório de qualidade de vida
em seu ambiente de trabalho.
Descreve-se aqui as estratégias de QV e QVT em diferentes organizações,
tendo por base sua conceitualização. Neste contexto, o escrito estrutura-se
primeiramente numa revisão teórica sobre a Qualidade de Vida (QV), a Qualidade de
Vida no Trabalho (QVT), Estratégia e Vantagem Competitiva, dando seqüência a uma
leitura sobre a Gestão Estratégica da Qualidade de Vida no Trabalho, onde é proposto
um modelo baseado nas diferentes formas de avaliação da QVT, com indicadores
próprios.
A fim de ilustrar as estratégias de QV e QVT que as organizações têm utilizado,
foram coletados dados secundários de sete empresas que foram premiadas nos dois
últimos anos por sua atuação em ações globais de QVT. Através da apresentação e
interpretação dos programas de QVT que foram implementados por esta amostragem
de empresas, pretende-se avaliar o quanto a Gestão da QVT assume um papel
estratégico na Gestão de Recursos Humanos.
FUNDAMENTOS DA QUALIDADE DE VIDA (QV)
CONCEITOS SOBRE QUALIDADE DE VIDA
A noção de Qualidade de Vida é eminentemente humana, e abrange muitos
significados que refletem conhecimentos, experiências, e valores de indivíduos e
coletividades (SCHMIDT,2004). A Organização Mundial de Saúde (OMS) considera
que a Qualidade de Vida (QV) engloba as seguintes dimensões: saúde física, saúde
psicológica, nível de independência, relações sociaise meio ambiente. Esse órgão
define a Qualidade de Vida como
uma percepção do indivíduo de sua posição na vida no contexto da cultura e
sistema de valores em que ele vive e em relação aos seus objetivos,
expectativas, padrões e preocupações. É um conceito de limites extensos e
influenciados numa maneira complexa pela saúde física, estado psicológico,
crenças pessoais, relacionamentos sociais e suas relações com características
relevantes do meio ambiente” (WHOQOL GROUP, 1995).
Outra definição de QV é proposta por Ferrans e Powers (1985): a sensação de
bem-estar de uma pessoa, que deriva da satisfação com as áreas da vida que são
importantes para ela.
Existem definições amplas, como as descritas acima, e outras mais restritas e
específicas, como as desenvolvidas no setor de saúde, cuja acepção vai além de estar
com a ausência momentânea de qualquer doença. Conforme definição adotada pela
OMS, “a saúde não seria apenas a ausência de doença, mas também o completo
bem-estar biológico, psicológico e social”.
A expressão QV também tem sido comumente utilizada na linguagem popular,
nos meios de comunicação, nas campanhas publicitárias e políticas, e com grande
freqüência, somente os aspectos objetivos são considerados, ou seja, são descritos os
fatores ambientais e sociais, tais como a qualidade do ar, nível socioeconômico e
educacional ligados às condições de vida externa (FLANEGAN, 1982).
Para Minayo, Hartz e Buzz (2000), quando se empregam somente indicadores
econômicos ou sociodemográficos, a aprensão da realidade, do bem-estar ou da
qualidade de vida de um grupo, comunidade ou nação pode estar limitado. Por isso,
além de conhecer os indicadores objetivos como sexo, idade, salário ou renda,
ocupação, tipo de moradia, prática de lazer, entre outros, e os indicadores subjetivos
situacionais, como oferta de emprego, oportunidade de lazer, de tratamento médicohospitalar, de educação formal, de transporte, entre outros, é fundamental conhecer a
percepção, pensamento e avaliações subjetivas que as pessoas têm de si mesmas e
de vários componentes materiais reconhecidos como base social da qualidade de
vida. Assim, a qualidade de vida deve congregar os componentes de bemestar
objetivo e bem-estar subjetivo.
Sintetizando as definições existentes, a Qualidade de Vida pode ser
considerada comoa satisfação com o bem-estar físico e mental, relação com outras
pessoas, envolvimento em atividades sociais, comunitárias e físicas, desenvolvimento
e enriquecimento pessoal, recreação, e independência para realização de atividades
(FLANAGAN, 1982; BURCKHARDT ET al., 1989; SCHMIDT, 2004).
FORMAS DE MENSURAR A QV
A mensuração da qualidade de vida é complexa e situacional, e envolve a
utilização de instrumentos genéricos e específicos. Dentre os instrumentos genéricos
comumente aplicados, podemos citar o da Organização Mundial da Saúde (OMS), que
desenvolveu o WHOQOL100, um questionário com 100 perguntas que avaliam a
intensidade, a capacidade, freqüência e avaliação dos seis domínios que o compõem:
físico (dor e desconforto, energia e fadiga, sono e repouso), psicológico (sentimentos
positivos, pensar, aprender, memória e concentração, auto-estima, imagem corporal e
aparência e sentimentos negativos), nível de independência (mobilidade, atividades da
vida cotidiana, dependência de medicação ou de tratamentos e capacidade de
trabalho), relações sociais (relações pessoais, apoio social e atividade sexual),
ambiente (segurança física e proteção, ambiente no lar, recursos financeiros, cuidados
de saúde e sociais: disponibilidade e qualidade, oportunidades de adquirir novas
informações e habilidades, participação em/oportunidades de recreação/lazer,
ambiente físico: poluição/ruído/trânsito/clima), e aspectos espirituais/religião/crenças
pessoais (FLECK et al. 1999). O WHOQOL Bref (quadro 1) é uma versão abreviada do
primeiro, com 26 questões, que avaliam quatro domínios: físico, psicológico, relações
sociais e meio ambiente (FLECK et al., 2000) .
A Escala de Qualidade de Vida de Flanegan foi desenvolvida pelo psicólogo
americano John Flanegan, na metade da década de 70, e avalia a satisfação de
indivíduos em relação a cinco dimensões: bem-estar físico e mental, relação com
outras pessoas, envolvimento com atividades sociais, comunitárias e cívicas,
desenvolvimento e enriquecimento pessoal e recreação (Flanegan,1982). Esta escala
foi modificada por Carol Burckhardt (1989), denominando-se Escala Adaptada de
Qualidade de Vida de Flanegan (quadro 2), sendo comumente utilizada em estudos
sobre qualidade de vida em adultos.
A QUALIDADE DE VIDA NO TRABALHO (QVT)
A Qualidade de Vida no Tabalho (QVT) trata-se de uma linha de pesquisa que
se orienta por estudar os aspectos ligados ao bem-estar das pessoas em situação de
trabalho. Bastante desenvolvida em alguns países da Europa, nos Estados Unidos e
no Canadá, seu foco de investigação visa ao questionamento das formas a serem
adotadas para que “os cargos se mostrem mais produtivos e satisfatórios, com
vantagem para as pessoas e organizações, mediante a reformulação do desenho de
cargos e postos de trabalho” (Walton, 1975).
O conceito de QVT é abrangente e não consensual, necessitando ser definido
com clareza (Fernandes, 1996), pois como enfatizam Werther; Davis (1983), os cargos
e postos de trabalho representam não apenas uma fonte de renda para os
trabalhadores, mas também um meio de satisfazerem suas necessidades de toda
ordem, com reflexos evidentes em sua qualidade de vida. As reformulações do
trabalho constituem o objetivo principal das ações implicadas na QVT, visando garantir
maior eficácia e produtividade aliadas ao atendimento básico das necessidades dos
trabalhadores. Para Walton (1975), a QVT tem como meta “gerar uma organização
mais humanizada, na qual o trabalho envolve, simultaneamente, relativo grau de
responsabilidade e de autonomia a nível de cargo, recebimento de recursos de
feedback sobre o desempenho, com tarefas adequadas, variedade, enriquecimento do
trabalho e com ênfase no desenvolvimento pessoal do indivíduo”.
Como as empresas têm que ser constantemente competitivas no mercado
global, só atingirão suas metas de produtividade através do comprometimento dos
empregados, advindo de sua satisfação com o trabalho. Quando não é levado em
conta o fator humano, o desempenho do cliente interno, que é o empregado, fica
comprometido pelos baixos níveis de satisfação, afetando o atendimento às exigências
do cliente externo, o que inviabiliza as estratégias voltadas para a melhoria da
qualidade dos produtos e serviços (FERNANDES, 1996).
Os problemas ligados à insatisfação no trabalho têm conseqüências que geram
um aumento do absenteísmo, diminuição do rendimento, alta rotatividade nos postos
de trabalho, reclamações freqüentes, e doenças psicossomáticas, sobremaneira
causadas pelo estresse ocupacional. Estas repercursões na saúde física e mental dos
trabalhadores implicam na queda da rentabilidade empresarial.
A conceituação de QVT que se orienta em função do Detaylorisme (WALTON,
1974), procura resgatar valores humanísticos e ambientais negligenciados pelas
sociedades industrializadas em favor do avanço tecnológico, da produtividade e do
crescimento econômico. Em 1976, este autor propõe um modelo conceitual composto
de oito categorias com o objetivo de avaliar a QVT nas organizações.
Para Limongi-França (1996), a QVT é o conjunto das ações de uma empresa
no sentido de implantar melhorias e inovações gerenciais, tecnológicas e estruturais
no ambiente de trabalho, e envolve as seguintes áreas de conhecimento científico:
saúde, ecologia, ergonomia, psicologia, sociologia, economia, administração e
engenharia. A autora situa dois movimentos principais na gestão da qualidade de vida
no trabalho: um individual, caracterizado pelo aprofundamento da compreensão a
respeito do estresse e das doenças associadas às condições do ambiente de trabalho,
e um organizacional, referindo-se à expansão do conceito de qualidade total, que
deixa de restringir-se a processos e a produtos para abranger aspectos
comportamentais e satisfação de expectativas individuais, visando à concretização dos
resultados da empresa.
Sobre o estresse, Rodrigues (1992) concluiu que não há qualidade de vida no
trabalho se as condições em que se trabalha não permitem viver em nível tolerável de
estresse, de preferência tendo como meta o eustresse (o lado bom do estresse), e não
o distresse, tensão nociva que gera os distúrbios psicossomáticos. Para LimongiFrança e Arrelano (2002), o estresse é vivido no trabalho pela capacidade de
adaptação, na qual sempre está envolvido o equilíbrio obtido entre exigências e
capacidade. Se o equilíbrio for atingido, obter-se-á o bemestar; se for negativo, gerará
diferentes graus de incerteza, conflitos e sensação de desamparo. Neste contexto, o
estresse talvez se constitua na melhor medida do estado de bem-estar da pessoa, já
que a qualidade de vida no trabalho é individualizada por meio de suas diferentes
manifestações de estresse.
No tocante aos modelos que identificam fatores determinantes da QVT nas
organizações, uma das dificuldades para investigar a qualidade de vida reside na
“diversidade das preferências humanas e diferenças individuais dos valores pessoais e
o grau de importância que cada trabalhador dá às suas necessidades, implicando
provavelmente em elevado custo operacional”(Quirino e Xavier, 1986)
Vários autores, começando pelos clássicos Maslow (1954) e Herzberg (1968),
desenvolveram modelos que se ocuparam com os fatores motivacionais ligados às
necessidades humanas: fisiológicas, de segurança, de vida social, de estima e de
auto-realização, esta última correspondendo à maximização das habilidades e do
potencial humano. Um outro modelo de indicadores da qualidade de vida no trabalho é
o de Westley, adaptado por Ruschel (1993) (quadro abaixo). Segundo este autor, “os
problemas políticos trariam a insegurança; o econômico, a injustiça; o psicológco, a
alienação, e o sociológico, a anomia”.
ESTRATÉGIA E VANTAGEM COMPETITIVA
CONSIDERAÇÕES GERAIS
A definição de estratégia é complexa, mas há um certo consenso sobre suas
principais dimensões. De modo geral, a estratégia posiciona uma organização para a
obtenção de vantagem competitiva, envolvendo escolhas a respeito de que setores
participar, quais produtos e serviços oferecer e como alocar recursos corporativos.
Seu objetivo principal é criar valor para acionistas e outros stakeholders ao
proporcionar valor para o cliente (KLUYVER e PEARCE, 2006).
O pensamento estratégico evoluiu significativamente nos últimos cinqüenta
anos, em função do ambiente competitivo atual, reflexo da globalização da economia e
da revolução tecnológica. O seu foco foi redirecionado da economia industrial para
uma perspectiva baseada em recursos, e desta, para uma perspectiva de capital
humano e intelectual (quadro abaixo).
A perspectiva inicial da economia industrial sustentava que as influências
ambientais eram as determinantes primárias do sucesso de uma empresa, e a
competitividade de setores ou segmentos mais atraentes e o controle dos recursos
estrategicamente importantes, como o capital financeiro, ditavam as oportunidades
estratégicas (BARLETT e GHOSHAL, 2002). Com a globalização e a revolução
tecnológica, surgiu uma perspectiva de desenvolvimento de estratégia baseada em
recursos, que definiu o pensamento estratégico como a construção de competências
essenciais (PRAHALAD e HAMEL, 1990). Houve então uma mudança de ênfase: em
vez de capturar valor econômico, o valor é criado pelo desenvolvimento e
aperfeiçoamento de recursos e capacidades fundamentais. O foco atual no capital
humano e intelectual como recurso estratégico fundamental de uma empresa é uma
extensão natural da perspectiva baseada em recursos. Para boa parte das empresas,
o acesso a recursos físicos ou financeiros já não representa mais um impedimento
para o crescimento, mas sim a ausência de pessoas ou do conhecimento. (BARLETT e
GHOSHAL, 2002)
O pensamento estratégico, por sua vez, concentra-se em seguir abordagens
diferentes para entregar valor ao cliente/acionista e em escolher conjuntos diferentes
de atividades que não podem facilmente ser imitados, fornecendo assim a base para
uma vantagem competitiva duradoura. (KLUYVER e PEARCE, 2006).
A teoria da Visão Baseada em Recursos (VBR) atribui à dimensão interna da
empresa, ou seja, aos seus recursos e capacidades, um papel significativo para a
obtenção de singularidade e diversificação. Para a teoria da VBR, os recursos podem
ser tangíveis (recursos físicos e estrutura) e intangíveis (recursos humanos, marca,
conhecimento tácito, gestão e outros). Para Barney (1991), criador da VBR, uma
empresa obtém vantagens sustentáveis quando utiliza seus recursos para criar
estratégias de valor que sejam únicas e que os concorrentes não consigam copiar.
Neste contexto, os recursos devem ter quatro atributos: terem valor de mercado,
serem raros, devem ser imperfeitamente imitáveis e insubstituíveis.
Por outro lado, os fatores externos também são determinantes na definição da
estratégia a ser adota por uma empresa. O modelo de análise de indústria proposto
por Porter (1980) tem sido amplamente utilizado no entendimento do ambiente
externo. Ele baseia-se na avaliação de cinco forças competitivas: ameaça de novos
estreantes, poder de negociação dos fornecedores, poder de negociação dos clientes,
ameaça de produtos substitutos e competição intra-indústria.
ESTRATÉGIA E QUALIDADE DE VIDA NO TRABALHO (QVT)
A importância crescente do capital humano como fonte de vantagem
competitiva tem encorajado as empresas a adotarem estratégias focadas em atrair,
motivar, recompensar e reter as pessoas certas, em todos os níveis da organização. É
caro substituir conhecimento e talento e hoje, as condições competitivas do mercado
têm que estar alinhadas à preocupação com os funcionários, clientes e acionistas. A
cultura corporativa de uma empresa é um sistema compartilhado de valores e crenças
entre os funcionários, oferecendo orientação sobre como pensar e agir. Devido a seu
efeito acentuado sobre o comportamento e a eficácia dos funcionários, as empresas
estão cada vez mais reconhecendo que a cultura corporativa pode diferenciá-las dos
concorrentes.
Em conseqüência, amplia-se a complexidade da Gestão de Recursos
Humanos nas organizações, que deve exercer uma função estratégica, no sentido de
fazer do fator humano um diferencial de competitividade e qualidade. Neste quadro,
legitimam-se os esforços da Qualidade de Vida no Trabalho (QVT), como “a gestão
dinâmica e contingencial de fatores físicos, tecnológicos e sociopsicológicos que
afetam a cultuta e renovam o clima organizacional, refletindose no bem-estar do
trabalhador e na produtividade das empresas” (FERNANDES, 1990).
A implantação estratégica de um programa de QVT, embora seja única a cada
empresa, a título de sistematização, requer o estabelecimento de algumas fases que,
independentemente das características particulares, aplicam-se a todas as empresas.
A tipologia delineada pela equipe de estudos sobre a Qualidade de Vida no Trabalho,
Canadá (JOHNSTON; ALEXANDER e ROBIN, 1981), propõe fases específicas para o
desenvolvimento de experiências com QVT.
Alguns autores têm feito recomendações sobre a implantação de programas de
QVT. Guest (1979) considera a competência de nível gerencial como condição básica
de tais programas. De acordo com seu ponto de vista, além da competência, o
comprometimento da alta administração com os objetivos do programa de QVT é vital
para o êxito de tais intervenções. Outro ponto crucial reside na preparação dos
gerentes para as mudanças decorrentes da implantação do programa, por envolverem
um espaço maior para a participação dos empregados e incluírem novas modalidades
de tomada de decisão nos moldes do estilo consultivo.
Fernandes (1996) faz as seguintes recomendações sobre a implementação dos
programas de QVT: não fiquem limitados a certos grupos na organização, mas
envolvam todos os níveis e áreas; não devem ser implantados sem um conhecimento
teórico e técnico do assunto, fundamentado na lieratura especializada; sejam
implantados a partir de uma necessidade da organização, e não inspirados pela moda;
incluam estratégias de resolução dos problemas organizacionais, aravés de métodos
participativos; procurem envolver melhorias no meio-ambiente de trabalho em termos
físicos, mas sem descuidar de aspectos tecnológicos e psicossociais; o sistema de
recompensas seja reestruturado, de modo que os ganhos advindos da participação
sejam partilhados pelos empregados; as pessoas sejam treinadas para nova
abordagem de resolução de problemas e, especialmente as chefias, para aceitarem a
participação dos empregados; se efetivem mudanças no comportamento
administrativo e na natureza do clima das organizações, de modo a aprimorar a cultura
organizacional. Os dados apresentados a seguir fazem parte de pesquisa de campo
realizada por Limongi-França (1996) sobre indicadores empresariais de qualidade de
vida no trabalho, em 20 empresas fabris com até 500 funcionários, e cerfificadas pelo
ISO 9000.
FONTE: adaptado de Limongi-França (1996)
METODOLOGIA DE PESQUISA
Algumas empresas têm se destacado na implementação de Programas de
Qualidade de Vida, e, devido à importância que o tema adquiriu ultimamente,
receberam ampla divulgação na mídia ou foram reconhecidas por suas políticas
através de premiações.
Um dos prêmios de destaque na área é o Prêmio Nacional de Qualidade de
Vida- PNQV, promovido pela Associação Brasileira de Qualidade de Vida-ABQV, e
que já se encontra na decima-segunda edição. Este prêmio tem por objetivo estimular
o desenvolvimento e a implantação de Programas de Qualidade de Vida nas
instituições, premiando organizações que realizam ações inovadoras neste âmbito de
atuação, e que tenham êxito na melhoria da qualidade de vida de seus colaboradores.
As categorias de premiação são programa global (conjunto de ações), prêmio micro e
pequena empresa, e prêmio ação específica (ABQV).
A fim de demonstrar e analisar os programas de qualidade de vida que as
empresas têm implantado, foi realizado uma pesquisa documental com dados
secundários, tendo-se por amostra sete instituições que foram premiadas com o
PNQV, na categoria Ação Global, nos últimos dois anos: Belgo Mineira, Emater-RN,
Inmetro, Siemens, Elektro, Motorola, e a ABB.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
BMS – BELGO MINEIRA SISTEMAS
A empresa Belgo Mineira, do ramo de Telecomunicações e Tecnologia, foi
premiada em 2006 pelo “Programa Bem-Estar BMS”. O programa, implantado pela
área de Recursos Humanos, visa promover o bem-estar de seu grupo de profissionais,
seja nos momentos em que ele está no trabalho, seja quando está fora dele. Para
isso, foram criadas ações, de participação voluntária, voltadas para o estímulo do
bem-estar em diferentes aspectos da vida dos colaboradores na empresa.
Especificamente, os objetivos do programa são: conscientizar sobre a importância da
saúde física e mental, promovendo, a partir de um conjunto de ações permanentes, a
mudança do estilo de vida dos colaboradores, de forma que eles possam viver mais e
melhor; desenvolver o potencial humano mental, emocional e espiritual, com a
conquista de autoconfiança, otimismo e positividade; promover maior integração entre
os colaboradores de diferentes funções; promover maior equilíbrio entre trabalho e
vida pessoal; e manter os colaboradores mais saudáveis, aptos, equilibrados e
motivados para enfrentar melhor o trabalho e suas pressões.
EMATER – RN
O Instituto de Assistência Técnica e Extensão Rural do Rio Grande do Norte Emater- RN é um órgão público estadual. Em 2006 foi premiado pela ABQV, com o
“Programa Ser-Viver”, cujo coordenador é o Diretor Técnico do órgão, que conta com
uma equipe multidisciplinar de dez servidores alocados no Projeto Qualidade de Vida.
Para a implantação inicial deste, foi contratada uma consultora especializada em QVT.
O programa contempla, através de projetos específicos e integrados, eventos alusivos
a datas importantes às áreas sociais e de saúde, a conscientização e sensibilização
para a melhoria do estilo de vida, a realização de atividades que estimulam o
envolvimento do funcionário e familiares em atividades saudáveis, alem do
monitoramento à qualidade da saúde física e mental e às condições ergonômicas no
trabalho. Há ações de atenção psicossocial, de segurança no trabalho, de cultura, de
lazer e de saúde, articuladas em quatro ancoras: saúde, segurança no trabalho,
integração social e responsabilidade social.
INMETRO
Com o projeto “Qualidade de Vida no Trabalho”, o Inmetro (Instituto Nacional
de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial), uma autarquia da administração
pública federal, foi premiado em 2006 com o PNQV . Este projeto está inserido no
planejamento estratégico da instituição, e foi implantado pela Diretoria de
Administração e Finanças. O programa consiste em agregar sub-programas que
objetivam atuar nos mais variados aspectos que proporcionem a melhoria do bemestar físico, mental e sócio-ambiental dos servidores e colaboradores, contemplando
ações de saúde nos seguintes tópicos: exames médicos ocupacionais, reeducação
alimentar (para controle da hipertensão, diabetes, dislipidemia e obesidade), ginástica
laboral, saúde bucal, saúde da mulher, fitovida, campanha da vacinação, fisioterapia
no trabalho, prevenção de doençcas infecto-contagiosas e sexualmente
transmissíveis, e combate à dependência química.
SIEMENS
A Siemens, empresa do mercado eletroeletrônico, foi premiada em 2006 pela
ABQV como “Programa de Qualidade de Vida Bem-Te-Vi”. O programa foi
implementado pela área de Saúde e Segurança no Trabalho, com um olhar para
outros fatores além da saúde e segurança, como os sociopsicológicos que interferem
na cultura, no clima da organização e na produtividade. Assim, o programa foi
estruturado considerando quaro pilares: saúde física e mental, motivação,
conscientização e meio ambiente. Iniciou com um diagnostico (distribuição e
determinantes dos fatores de risco). Depois, foram identificados e classificados os
fatores com potencial para influenciar ou mudar o ambiente. Houve um estudo das
ações anteriores, obstáculos, sucessos e fracassos e, então, foram priorizadas as
ações de intervenção, que foram baseadas nos quatro pilares descritos. Algumas
ações do Bem-Te-Vi incluem o combate a hábitos como o sedentarismo, a
alimentação rápida e desbalanceada, o tabagismo e o estresse.
ELEKTRO
A Elektro é uma distribuidora de energia elétrica. Seu programa “Estar Bem
Elektro” foi premiado com o PNQV em 2005. Consiste em promover a valorização do
indivíduo e a melhoria da saúde, segurança e qualidade de vida dos colaboradores
através de uma Gestão Integrada de Saúde, Segurança e Qualidade de Vida, com
uma filosofia e metodologia de abordagem inovadoras, baseadas na visão holística do
ser humano - o homem visto em todas as dimensões. Passou a ser fundamentado em
três vertentes: Movimento; Saúde e Segurança, e Cultura. O Estar Bem tem por
objetivo garantir a qualidade de vida e o bem-estar dos colaboradores, proporcionando
oportunidades culturais, desenvolvimento de habilidades artísticas, benefícios com a
atividade física, orientação sobre alimentação saudável e cuidados com a saúde. A
empresa investiu em ações para diminuir os Indicadores Críticos de Saúde
constatados nos exames médicos de 2003: metade dos colaboradores apresentava
sobrepeso, outros 15% eram obesos, 42% registravam colesterol alto e 35% estavam
com triglicérides alto, enquanto que a hipertensão atingia 10% dos funcionários. A
Elektro também registrava um aumento dos empregados afastados por doenças,
acidentes com afastamento e absenteísmo.
Foram estabelecidas metas anuais de redução de 5% para cada Indicador de
Saúde, e o público-alvo envolvia 2.539 colaboradores, mais os 2.300 funcionários das
empresas contratadas, familiares e a comunidade. Para o Programa, em 2005 foram
investidos R$ 2 milhões. Como resultados, houve uma diminuição de 40% de
hipertensos, 28% nos colaboradores com triglicérides alto e 24% controlaram o
colesterol. Os colaboradores com sobrepeso diminuíram em 8% e os obesos em 5%.
O Programa Anti-tabagismo propiciou uma diminuição de 25% no número de fumantes
e a redução de 31% dos cigarros consumidos. Em termos da segurança, a empresa
teve, pela primeira vez, um ano inteiro sem acidentes com afastamento. O número de
acidentes sem afastamento caiu de 33 em 2003 para 21 em 2004.
A taxa de freqüência dos acidentes diminuiu de 7,17 em 2003 para 4,4 em
2004. E os acidentes com veículos, que em 2002 representavam 53% dos acidentes
na empresa, reduziram 22% em 2003 e 62% em 2004.
MOTOROLA
A empresa Motorola, do ramo de Telecomunicações e Tecnologia, foi premiada
pela ABQV em 2005, por seu Programa “Motoviva”, implantado pela área de Recursos
Humanos. O programa integra ações de capacitação do funcionário para o
autogerenciamento da saúde e ações que mantenham um Ambiente de Suporte
Saudável. A partir de um levantamento epidemiológico consistente, foram
estabelecidos o perfil de saúde e estilo de vida da população. O “Motoviva” tem o
objetivo de integrar ações que sensibilizem e conscientizem o funcionário para a
adoção de um estilo de vida saudável, através dos seguintes conceitos: a saúde pode
ser obtida através do equilíbrio entre as suas diferentes dimensões; a busca por este
equilíbrio é dinâmica e necessária; as escolhas saudáveis são a chave para a saúde; e
a chave para a mudança está em sí mesmo. A visão do programa é ter pessoas com
alta performance, e a missão é contribuir com os objetivos de negócio provendo aos
funcionários ferramentas para um estilo de vida saudável, através de políticas,
educação, ambiente e recursos favoráveis. O programa contempla ações que
abrangem os funcionários (2.700) e parcialmente os colaboradores (aproximadamente
2.000).
Algumas ações são extendidas aos familiares ou os envolvem indiretamente.
Os processos envolvidos no “Motoviva” englobam um diagnóstico, realizado no exame
médico periódico, onde é disponibilizado um questionário informatizado de saúde e
estilo de vida, no qual se levantam diferentes indicadores relacionados à saúde fiísica,
social, emocional, profissional, intelectual, entre outras. As prioridades do programa
são estabelecidas a partir deste levantamento. Itens como sedentarismo, obesidade e
estresse têm sido o foco das ações do programa. Além dos indicadores internos, os
indicaodores externos determinados pelas referências da Organização Mundial da
Saúde também norteiam as ações do Programa.
ABB
A ABB – Asea Brown Boveri, empresa do segmento de tecnologia e automação
foi premiada em 2005 com o PNQV . A empresa não disponibilizou as informaçòes no
sítio da ABQV, mas dados sobre seu programa de QVT foram encontrados em uma
Newsteller da Sala 21 Eventos, neste relato: “Os primeiros passos do Programa de
Qualidade de Vida na ABB foram dados no ano de 1998, quando colaboradores e
profissionais técnicos definiram uma estratégia ampla calcada em três pilares: saúde
integral, esporte e lazer. O objetivo era oferecer aos funcionários um leque de opções
para que eles se mantivessem em equilíbrio físico, mental, social e espiritual. De
acordo com a coordenação desses projetos, os resultados têm apresentado índices
positivos. Numa pesquisa realizada com os colaboradores, 94% admitiram que as
atividades físicas têm ajudado a diminuir as dores do corpo; na mesma pesquisa, 52%
relatam que tiveram um aumento na concentração do trabalho.
DISCUSSÃO SOBRE OS PROGRAMAS DE QVT APRESENTADOS
Analisando os dados dos casos apresentados, pode-se deduzir, de um modo
geral, que todas as empresas respaldaram-se num referencial teórico consistente para
implementarem seus programas de QVT, sendo que uma delas contratou uma
consultoria especializada para elaborar o diagnóstico e capacitar o grupo de trabalho
na operacionalização do programa. Percebe-se o envolvimento da alta direção das
empresas nos programas, sendo que em duas delas foram implantados pela Diretoria
(Técnica e de Administração e Finanças).
Nos demais casos, em duas empresas a área de Recursos Humanos é
responsável, em uma empresa a área de Saúde e Segurança no Trabalho, e em outra,
a área de Saúde, Segurança e Qualidade de Vida. Uma das instituições tem o
programa de QVT inserido em seu Planejamento Estratégico, e uma outra atribui ao
programa a missão de contribuir com os objetivos de negócio, visando ter pessoas de
alta performance na empresa.
Quanto à definição de Qualidade de Vida adotada pelas empresas, em linha
geral é referenciado o contexto de saúde física e mental, passando pelas vertentes de
saúde social, emocional, profissional, intelectual, espiritual e outras, de cunho
psicossocial. Três das empresas projetam a promoção de um “estilo de vida saudável”
nos programas. Sobre os indicadores de QV considerados, pode-se observar em
algumas empresas a elaboração de um diagnóstico tendo por parâmetro indicadores
internos, em sua maioria aplicados através de exames médicos periódicos e
questionários. Também houve menção de uma empresa em mesclar os indicadores
internos com os externos, referenciados pela Organização Mundial da Saúde
(WHOQOL Group).
As ações contempladas pelos programas de QV descritos envolvem o
monitoramento da saúde física e mental, com aplicação de exames periódicos,
reeducação alimentar, ginástica laboral e fisioterapia no trabalho, saúde bucal, saúde
da mulher, combate ao estresse e ao sedentarismo, campanhas de vacinação,
prevenção de doenças infecto-contagiosas e DST, combate ao tabagismo e à
dependência química, campanhas de segurança no trabalho para a prevenção de
acidentes, estudo das condições ergonômicas no trabalho, promoção de atividades de
cultura, de lazer e de responsabilidade social, estudo da cultura e do clima
organizacional, promoção de eventos alusivos a datas importantes, no âmbito social e
de saúde, e outras, como terapias holísticas.
No tocante à mensuração dos resultados auferidos com os programas, duas
das empresas divulgaram números significativos, indicando a validação e a eficácia
das ações de QVT.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Como pode-se constatar pelos dados das empresas e organizações que
implementaram Programas de Qualidade de Vida no Trabalho (QVT), esta vem
ganhando expressão crescente no ambiente empresarial dentro das estratégias de
gestão de pessoas. A Gestão Estratégica da Qualidade de Vida no Trabalho (QVT) é
motivada por diversos fatores: aumentar a produtividade, garantir a competitividade,
modernizar a gestão de pessoas, trabalhar a imagem institucional em face da
exigência da responsabilidade social, cobrada dos clientes e da comunidade.
Novos desafios se impõem à QVT, principalmente no tocante ao
comprometimento da alta direção no estabelecimento sistemático, contínuo e
mensurável de suas estratégias. No entanto, deparamo-nos com indícios de que as
empresas têm dado importância significativa à qualidade de vida do trabalhador – hoje
seu maior ativo – implantando programas e ações que demonstram resultados
eficazes na humanização do ambiente de trabalho.
REFERÊNCIAS
BARLETT, Christopher A.; GHOSHAL, Sumantra. Building competitive advantage through
people. Management Review, Cambrige, Sloan, v.43, n.2, 2002.
BOM SUCESSO, Edina de Paula. Relações interpessoais e qualidade de vida no
trabalho. Rio de Janeiro: Qualitymark, 2002.
BURCKHARDT, C. S.; WOODS, S. L.; SCHULTZ, A. A.; ZIEBARTH, D. M. Quality of life
in adults with chronic illness: a psychometric study. New York: Res. Nursing Health,
1989. V.12.
FERRANS, C. E.; POWER, M. J. Quality of life index: development and psychometric
properties. Germantown, Adv. Nurs. Sci, v.8, n.1, 1985.
FERNANDES, Eda Conte. Qualidade de vida no trabalho – como medir para melhorar.
São Paulo: Casa da Qualidade, 1996.
FLECK, Marcelo Pio de Almeida et al. Aplicação da versão em português do instrumento
de avaliação da qualidade de vida da organização mundial da saúde (WHOQOL 100).
Revista Saúde Pública, São Paulo, v.33, 1999.
____et al. Aplicação da versão em português do instrumento abreviado de avaliação da
qualidade de vida (WHOQOL – bref.). Revista da Saúde Pública, São Paulo, v.34, 2000.
KLUYVER, Cornelis A. de; PEARCE, John A. II. Estratégia: uma visão executiva. São
Paulo: Pearson Prentice Hall, 2006.
LIMONGI-FRANÇA, Ana Cristina. Qualidade de vida no trabalho – conceitos e práticas
nas empresas da sociedade pós-industrial. São Paulo: Atlas, 2003.
LIMONGI-FRANÇA, Ana Cristina; ARRELANO, Eliete Bernal. Qualidade de Vida no
Trabalho. In: _____. As pessoas na organização. São Paulo: Editora Gente, 2002.
MARTINS, Gilberto de Andrade. Manual para elaboração de monografias e
dissertações. São Paulo: Atlas, 2000.
Download

Egnaldo Sarmento dos Santos Bruno Gobbi Silva Prof. Pedro Carlos