O MANIFESTO DOS PIONEIROS DA EDUCAÇÃO NOVA Mara Elisa Capovilla Martins de Macedo Sidnéia Macarini Martins Contexto histórico e ideologia da educação da época: 1930-1945 - Segunda República ou Governo Provisório Governo Constitucional – de 1934 a 1937 Governo Autoritário – de 1937 a 1945 Para Severino(1986) – o período de 1889 a 1964 consolidação da ideologia liberal Para Saviani(2004) – propõe como período de regulamentação nacional do ensino e do ideário pedagógico renovador. A Educação passou a ser vista como propulsora do processo com a função de instrumento para a reconstrução nacional e promoção social: 1924 – criação da ABE – Associação Brasileira de Educação; 1930 – formação do Ministério dos Negócios de Educação e Saúde Pública; 1934 – Promulgação da Constituição – estabelecendo necessidade de um Plano Nacional de Educação, da gratuidade e obrigatoriedade do ensino elementar e proposições de inúmeras reformas educacionais. Duas vertentes de pensamento polarizaram os debates sobre educação: Igreja – iniciativa privada, elitista, doutrina religiosa na escola, separação por sexo, ensino particular e responsabilidade da família quanto à educação. X Renovadores – Movimento Escola Nova - escola pública, laica, gratuita e obrigatória com um plano nacional de educação. a Constituição de 34 atendeu tanto aos renovadores – defendem a educação com direito de todos e deveres do estado, quanto aos católicos, ao prever o ensino religioso facultativo na escola pública. 1932 – Renovadores apresentaram Plano de Reconstrução Nacional – Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova, fruto de movimento por reformas educacionais tendo à frente Fernando de Azevedo e outros 26 educadores com idéias pedagógicas dos Estados Unidos da América e Europa para adequação do ensino ao desenvolvimento capitalista industrial – novos métodos educacionais se contrapondo à escola tradicional. REFORMAS 1931 – Reforma Francisco Campos – estruturou e centralizou para a administração federal os cursos superiores; dividiu o ensino secundário em 02 ciclos – fundamental de 05 anos e outro complementar de 02 anos – obrigatórios para ingresso no ensino superior e criou ensino comercial médio profissionalizante. Ensino secundário – privilégio das classes médias, pois até 1940, a maioria de escolas por alunos de 12 a 18 anos era de iniciativa privada. Nos anos 30 havia só uma escola secundária em São Paulo São Paulo foi o precursor dos cursos primários, responsabilidade do estado, que por influência dos escolanovistas foram feitas mudanças nas disciplinas e inovações pedagógicas, porém o programa dessas escolas pouco mudou até 1968. Mesmo com o aumento no número de matrículas, a demanda não foi atendida – após 1930, continua a ampliação de vagas nas escolas primárias nas cidades de São Paulo, porém a maioria dos alunos não freqüentou os cursos primários. Em 1930, 54,4% dos alunos estavam fora da escola elementar. A partir de 1940, em São Paulo, estado e prefeitura iniciaram sucessivos convênios para a construção e manutenção de grupos escolares. Em 1940 - Gustavo Capanema, Ministro da Educação, implementou a reforma educacional: Leis Orgânicas do Ensino, estruturando o ensino industrial que dividia o ensino secundário em 02 ciclos: ginasial e secundário (clássico, científico e normal). Até 1940, o ensino primário e os cursos de formação de professores não estavam contidos nas leis educacionais. Em 1946, já no fim do Estado Novo, o ensino primário foi organizado com diretrizes gerais, ficando na responsabilidade dos estados, criou-se o ensino supletivo primário o Fundo Nacional do Ensino Primário para adequar os recursos e fixaram-se as diretrizes para o ensino normal. Os projetos educacionais da época, apesar de desencontros nos objetivos, promoveram diretrizes nacionais para a escolarização da população apesar da persistência do modelo dualista do ensino: um para o povo outro para a elite, condicionantes do sistema social produtivo e organização social presentes no ideal de educação preconizado e nas limitações do projeto educativo. Considerações acerca do Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova Bruna Michelman Oscar Teixeira Cláudia Denardi Machado Objetivo do Manifesto: Traçar diretrizes de uma nova política nacional de educação e ensino em todos os níveis, aspectos e modalidades . O Manifesto representa uma síntese e uma tentativa de avanço sobre propostas novas de educação. A reconstituição educacional no Brasil – ao povo e ao governo Novos ideais para a educação: Transferir do plano administrativo para o político social, a solução dos problemas escolares. A Educação se realiza pela “ação extensa e intensiva da escola sobre o indivíduo e deste sobre si mesmo”, produzindo-se por uma evolução contínua, favorecida e estimulada por todas as forças organizadas de cultura e de educação. FINALIDADES DA EDUCAÇÃO Educação Nova - escola como meio social – ideal de solidariedade, serviço social e cooperação. Romper com a velha estrutura do serviço educacional, desprendendo-se dos interesses de classes, deixando de constituir privilégio determinado pela condição econômica e social do sujeito para se organizar para a coletividade. A educação nova tem sua finalidade alargada para além dos limites das classes, assumindo feição mais humana, assumindo sua função social = formar a “hierarquia democrática” pela “hierarquia das capacidades” com oportunidades iguais de educação, com objetivo de organizar, desenvolver meios de ações com o fim de dirigir o desenvolvimento natural e integral do ser humano em cada uma de suas etapas de crescimento. O Estado em face da Educação a. Educação: uma função social e eminentemente pública A família ainda é o “quadro natural que sustenta socialmente o indivíduo, com o meio moral em que se disciplinam as tendências, onde nascem, começam a desenvolver-se e continuam a entreteremse as suas aspirações para o ideal”. Assim o Estado deve assentar o trabalho da educação no apoio que ela (família) dá à escola e na colaboração efetiva entre pais e professores, estabelecendo relações entre essas duas forças sociais – a família e a escola b. A questão da escola única Educação integral através de um plano geral de educação que torne a escola acessível a todos. Escola igual para todos é o princípio comum e único onde as reformas pedagógicas estão intimamente ligadas com a reconstrução fundamental das relações sociais. c. A laicidade - acima de crenças e disputas religiosas, alheia a todo o dogmatismo sectário; gratuidade – acessível a todos os cidadãos; obrigatoriedade – não dá para ser obrigatório sem que seja gratuito. Deve se estender até os 18 anos; coeducação – comum para homens e mulheres. A FUNÇÃO EDUCACIONAL a)A unidade da função educacional -formação integral do ser. b) A autonomia da função educacional - a escola necessita de autonomia técnica, administrativa e econômica, construída a partir da responsabilidade dos técnicos e educadores, administradores pelos órgãos do ensino através de sua direção. c) A descentralização - “A unidade pressupõe multiplicidade” através de uma obra metódica e coordenada, de acordo com um plano comum, eficiência tanto em intensidade como em extensão. A Constituição deve conter definição de atribuição e deveres dos fundamentos da educação nacional, favorecendo assim, a nacionalidade como força viva, em espírito comum num regime livre de intercâmbio, solidariedade e cooperação. O PROCESSO EDUCATIVO A nova doutrina considera a função educacional como uma função complexa de ações e reações em que o espírito cresce de dentro para fora, substitui o mecanismo (do modelo da escola tradicional) pela vida (atividade funcional) e transfere para a criança e para o respeito de sua (individualidade) personalidade o eixo da escola e o centro de gravidade do problema da educação. considerando os processos mentais com “funções vitais” e não como processos em si mesmos, ela os subordina à vida, como meio de utilizá-la e de satisfazer suas múltiplas necessidades materiais e espirituais . Nova escola – novo conceito educacional A escola deve oferecer ao sujeito um meio vivo e natural (contextualização), favorável ao intercâmbio de reações e experiências, em que ela, vivendo a sua própria vida, generosa e bela de criança, seja levada “ao trabalho e à ação por meios naturais que a vida suscita quando o trabalho e a ação convêm aos seus interesses e às suas necessidades”. Nova concepção de escola – não mais passiva, intelectualista e verbalista – a atividade está na base de todos os seus trabalhos, tendo como elemento principal o “interesse” (fator psicológico), que é a primeira condição de uma atividade espontânea e o estímulo constante ao educando a buscar todos os recursos ao seu alcance, “graças à força de atração das necessidades profundamente sentidas”. Interesse = fonte de inspiração das atividades escolares. PLANO DE RECONSTRUÇÃO EDUCACIONAL a. As linhas gerais do plano: radical transformação da educação pública através da unidade do fim geral da educação, princípios e métodos comuns a todos os graus e instituições educativas, reforçando para todos os meios a intenção e o valor social da escola, sem negar a arte, a literatura e os valores culturais. b. Ponto nevrálgico da questão: estrutura do plano educacional (Escola infantil/pré-primário – primário – secundário – superior/universitário) respeitando os 4 períodos do desenvolvimento natural do ser humano, desenvolvendo a atividade criadora do aluno desde a préescola até o superior. Respeito a personalidade integral do aluno, através do desenvolvimento de sua faculdade produtora e de seu poder criador, numa continuidade ininterrupta dos estudos. c. O conceito moderno da Universidade e o problema universitário no Brasil: a educação superior deve tender à formação profissional e técnica, assim como à formação de pesquisadores em todos os ramos de conhecimento humano. Deve contribuir para o aperfeiçoamento constante do saber humano. Deve ter tríplice função: 1- elaboradora ou criadora da ciência (investigação); 2- docente ou transmissora de conhecimento (ciência feita); 3- vulgarizadora ou popularizadora das ciências e das artes. d. O problema dos melhores: A universidade se encontra no ápice de todas as instituições educativas – formação das elites de pensadores, sábios, cientistas, técnicos e educadores; elevando ao máximo o desenvolvimento dos indivíduos dentro de suas aptidões naturais e selecionando os mais capazes, lhes dando bastante força para exercer influência efetiva na sociedade e afetar a consciência social. Dessa elite deve fazer parte todo professorado do Brasil. A preparação dos professores é descuidada como se para tal, não fosse preciso preparação profissional. Todos os professores, de todos os graus, deverão ter a preparação em escolas secundárias e formar seu espírito pedagógico, conjuntamente em cursos universitários. A formação universitária é o único meio de elevar o professor em verticalidade e cultura. O papel da escola na vida e na sua função social Concepção da escola como instituição social, limitada na sua ação educativa, pela pluralidade e diversidade das forças que concorrem ao movimento das sociedades. Cada escola, seja qual for seu grau, deve reunir em torno de si as famílias dos alunos, estimular sociedades de ex-alunos, numa cooperação social entre os pais, professores, empresas e todas as demais instituições diretamente intervenção na obra da educação. A democracia um programa de longos deveres “nova política educacional, com sentido unitário e de base científicas” exige longo tempo para que se modifiquem pontos de vista e as atitudes em face aos problemas educacionais. As únicas revoluções fecundas são as que se fazem ou se consolidam pela educação. De todos os deveres que do Estado, o que exige maior dedicação e justifica maior sacrifício é a educação, que, dando ao povo a consciência de si mesmo e de seus destinos e a força para afirmar-se e realizá-los, entretém, cultiva e perpetua a identidade da consciência nacional, na sua comunhão íntima com a consciência humana. Fernando Azevedo, Afrânio Pusioto, Anísio Teixeira, Júlio de mesquita Filho, Cecília Meireles e outros. CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1934 Presidência da República Casa Civil Subchefia para Assuntos Jurídicos CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA DOS ESTADOS UNIDOS DO BRASIL (DE 16 DE JULHO DE 1934) Nós, os representantes do povo brasileiro, pondo a nossa confiança em Deus, reunidos em Assembléia Nacional Constituinte para organizar um regime democrático, que assegure à Nação a unidade, a liberdade, a justiça e o bemestar social e econômico, decretamos e promulgamos a seguinte CONSTITUIÇÃO DA REPúBLICA DOS ESTADOS UNIDOS DO BRASIL CAPÍTULO II Da Educação e da Cultura Art 149 - A educação é direito de todos e deve ser ministrada, pela família e pelos Poderes Públicos, cumprindo a estes proporcioná-la a brasileiros e a estrangeiros domiciliados no País, de modo que possibilite eficientes fatores da vida moral e econômica da Nação, e desenvolva num espírito brasileiro a consciência da solidariedade humana. Art 150 - Compete à União: a) fixar o plano nacional de educação, compreensivo do ensino de todos os graus e ramos, comuns e especializados; e coordenar e fiscalizar a sua execução, em todo o território do País; b) determinar as condições de reconhecimento oficial dos estabelecimentos de ensino secundário e complementar deste e dos institutos de ensino superior, exercendo sobre eles a necessária fiscalização; e) exercer ação supletiva, onde se faça necessária, por deficiência de iniciativa ou de recursos e estimular a obra educativa em todo o País, por meio de estudos, inquéritos, demonstrações e subvenções. Parágrafo único - O plano nacional de educação constante de lei federal, nos termos dos arts. 5º, nº XIV, e 39, nº 8, letras a e e , só se poderá renovar em prazos determinados, e obedecerá às seguintes normas: a) ensino primário integral gratuito e de freqüência obrigatória extensivo aos adultos; b) tendência à gratuidade do ensino educativo ulterior ao primário, a fim de o tornar mais acessível; c) liberdade de ensino em todos os graus e ramos, observadas as prescrições da legislação federal e da estadual; d) ensino, nos estabelecimentos particulares, ministrado no idioma pátrio, salvo o de línguas estrangeiras; e) limitação da matrícula à capacidade didática do estabelecimento e seleção por meio de provas de inteligência e aproveitamento, ou por processos objetivos apropriados à finalidade do curso; f) reconhecimento dos estabelecimentos particulares de ensino somente quando assegurarem. a seus professores a estabilidade, enquanto bem servirem, e uma remuneração condigna. Art 153 - O ensino religioso será de freqüência facultativa e ministrado de acordo com os princípios da confissão religiosa do aluno manifestada pelos pais ou responsáveis e constituirá matéria dos horários nas escolas públicas primárias, secundárias, profissionais e normais. Art 154 - Os estabelecimentos particulares de educação, gratuita primária ou profissional, oficialmente considerados idôneos, serão isentos de qualquer tributo. Art 155 - É garantida a liberdade de cátedra. Art 156 - A União e os Municípios aplicarão nunca menos de dez por cento, e os Estados e o Distrito Federal nunca menos de vinte por cento, da renda resultante dos impostos na manutenção e no desenvolvimento dos sistemas educativos. Parágrafo único - Para a realização do ensino nas zonas rurais, a União reservará no mínimo, vinte por cento das cotas destinadas à educação no respectivo orçamento anual. . Art 157 - A União, os Estados e o Distrito Federal reservarão uma parte dos seus patrimônios territoriais para a formação dos respectivos fundos de educação. § 1º - As sobras das dotações orçamentárias acrescidas das doações, percentagens sobre o produto de vendas de terras públicas, taxas especiais e outros recursos financeiros, constituirão, na União, nos Estados e nos Municípios, esses fundos especiais, que serão aplicados exclusivamente em obras educativas, determinadas em lei. § 2º - Parte dos mesmos fundos se aplicará em auxílios a alunos necessitados, mediante fornecimento gratuito de material escolar, bolsas de estudo, assistência alimentar, dentária e médica, e para vilegiaturas Capa da Revista Educação Jan/fev/mar 1932 , na qual foi publicado o Manifesto da Escola Nova