1 A CARACTERIZAÇÃO DA TERCEIRIZAÇÃO E O DIREITO DO TRABALHO: SÚMULA 331 TST. Luciana Silva Ceolin Wolfe 1 RESUMO O presente artigo é escrito sob o âmbito das ciências jurídicas, com enfoque específico no direito do trabalho. Seu objetivo é “identificar a caracterização de terceirização e efeitos jurídico-legais”. Metodologicamente é caracterizado como uma pesquisa explicativa/analítica e bibliográfica, a qual usa procedimentos bibliográficos com técnicas de coleta documental e observação indireta. Os dados são coletados em obras que envolvem a terceirização sob o âmbito da administração, sendo prevalentes, entretanto, as de enfoque jurídico. São utilizados livros, periódicos e artigos disponibilizados na internet, e após tratamento crítico e análise qualitativa dos dados, monta-se o texto final sob o método dedutivo. Feitas as exposições e as análises dos dados, toma-se os efeitos jurídicos acerca da terceirização, e, então, observa-se equidade e os efeitos legais. Conclui-se que há uma evolução nas formas de contratação de mão-de-obra, de modo que as empresas buscam cada vez mais a modernização com a finalidade de tornarem-se mais aptas para enfrentar seus concorrentes, sendo a terceirização uma tendência atual. As conclusões não esgotam este assunto. PALAVRAS-CHAVE: Direito do Trabalho; terceirização; súmula 331 TST. INTRODUÇÃO A terceirização no Brasil surge aproximadamente na década de 1980, juntamente com os movimentos da qualidade e da vantagem competitiva. Parte do princípio de que as empresas terceirizadas são especializadas em uma realização de tarefas, as quais que podem ser prestadas às empresas que não as têm como atividades-fim. 1 Bacharel em Administração de Empresas (Universidade Tuiuti do Paraná). Pós-Graduada em Controladoria (FAE Business School). Acadêmica do 10º período do Curso de Direito (Faculdades Integradas do Brasil - Unibrasil). 2 Pelo lado administrativo, nota-se que a terceirização apresenta-se no cenário produtivo como uma moderna técnica de gestão. Prevê a redução de custos, a descentralização de atividades, o aumento da qualidade do produto/serviço final, a produção com base em diversos centros menores e a produção como um sistema de rede. Já pelo lado jurídico, observa-se que existem controvérsias sobre a terceirização. De um lado existem aqueles que a tomam como geradora de desemprego e como detrimentos aos direitos dos trabalhadores, e de outro, aqueles que a tomam como geradora de empregos especializados, e como forma de impulsionar a criação de sociedades comerciais de trabalho temporário. Sob os contextos apresentados, o artigo fica delimitado ao âmbito jurídico. Mais especificamente enfoca o direito do trabalho, delimitando a terceirização como ponto de estudo. Não pretende defender uma ou outra linha jurídica, mas sim chegar às análises que venham a responder à problemática: Quais as características da terceirização e seus efeitos no âmbito jurídico? Vista a questão de pesquisa, e justificando a importância e relevância do trato do tema por efeitos da sociedade e da ciência, segue-se o artigo. A sociedade poderá ser beneficiada por questões informativas, visto que poderá decidir por apoiar ou não a terceirização. Já pelo lado da ciência, o benefício é a produção bibliográfica, uma contribuição ao estágio atual do conhecimento. Metodologicamente, o artigo tem objetivo exploratório e segue o método dedutivo. Parte de uma estratégia de pesquisa bibliográfica e utiliza técnicas de coleta documental/observação indireta. As fontes usadas são secundárias (livros, periódicos e artigos científicos disponibilizados via Internet), e a análise dos dados é feita qualitativa. O objetivo principal do trabalho é “identificar a caracterização de terceirização e efeitos jurídico-legais”. Para tanto, são lançados três objetivos específicos. O primeiro objetivo específico é “Identificar a caracterização da terceirização”. O segundo é “Analisar a Súmula 331 do TST”. E o terceiro é “Identificar as ilicitudes, os efeitos jurídicos e a equitatividade proveniente da relação de terceirização”. 3 O estudo proposto visa mostrar a terceirização sob os enfoques administrativos e jurídicos. Parte-se do princípio que não é possível vê-la sem entender seus conceitos e características de gestão, e também que não pode se tratar dela sem entender seu enquadramento legal (causas e conseqüências). Além de tudo, são apresentados os aspectos legais que lhe aproximam e lhe afastam de simulações à CLT (Consolidação das Leis do Trabalho). E por fim, como o artigo não busca esgotar o assunto, fazem-se sugestões para trabalhos futuros. 1 TERCEIRIZAÇÃO Entenda-se a terceirização como uma alternativa produtiva em evolução, que desde a década de 1950, nos Estados Unidos, vem se apresentando como uma técnica de administração empresarial.2 No Brasil, a terceirização começou a ser implantada e desenvolvida por advento de multinacionais, principalmente na década de 1980, sendo conhecida então, aproximadamente no ano de 1989, como contratação de terceiros. O objetivo da “terceirização” já era de reduzir custos, assim como gerar aumento de qualidade, eficiência, especialização, eficácia e produtividade.3 Neste sentido, e vista como uma estratégia de implantação, a terceirização, ou outsourcing, no inglês4, consiste em se contratar terceiros para atividades-meio da empresa, ou seja, para atividades que não sejam o seu objeto principal.5. Na terceirização “o trabalho é realizado para uma empresa, mas contratado de maneira imediata por outra.” 6. Segundo Lívio Antônio GIOSA, isso se caracteriza como uma técnica moderna de administração, visto que a empresa terceirizada faz a mediação entre o tomador de serviços e a mão-de-obra terceirizada propriamente 2 LEIRIUA; Jerônimo Souto; SARATT, Newton Dornelles. Terceirização: uma alternativa de flexibilidade empresarial. 8. ed. São Paulo: Gente, 1995. p. 22. 3 QUEIROZ, Carlos Alberto Ramos Soares de. Manual e terceirização. 9. ed. São Paulo: STS, 1998. p. 63. 4 GIOSA, Lívio Antônio. Terceirização: uma abordagem estratégica. 5. ed. São Paulo: Pioneira, 1997. p. 13. 5 MARTINS, Sérgio Pinto. A terceirização e o direito do trabalho. São Paulo: Atlas, 2001. p. 23. 6 MARCELINO, Paula. Afinal, o que é terceirização? Em busca de ferramentas de análise e de ação política. Revista Pegada eletrônica, v. 8, n. 2, p. 56-60, Dez. 2007. p. 57. 4 dita.7 O tomador de serviços tem mais tempo para controlar e gerir o seu próprio negócio, o que acarreta melhorias no mesmo. Para Amauri Mascaro NASCIMENTO, a descentralização das atividades da empresa, sendo estas realizadas em vários centros de serviços, possibilita a empresa focar-se mais em sua atividade-fim. Num caráter evolutivo, e de acordo com Giovanni ALVES, expõe que a terceirização antes abrangia os serviços de apoio e hoje tende a atingir atividades vinculadas à esfera da produção. As empresas terceirizadas tendem a concentrar seus esforços na especialização, e desta forma, buscam vantagens competitivas.8 Visto todo esse contexto, e enfocando a questão do direito, constatam-se eixos de discussão. O primeiro é com relação às discussões existentes entre atividades-meio e fim da empresa9. O segundo é com relação ao uso da terceirização em atividades diversas das já regulamentadas (áreas de limpeza e segurança), conforme a Lei 6019/74 e Decreto-Lei nº. 73841/74 respectivamente. O terceiro é com relação às simulações e tentativas de fraudes à CLT, com o propósito de enriquecimento ilícito e dissimulação do vínculo empregatício. E o quarto é com relação à responsabilidade subsidiária do tomador de serviços. Após esses pontos problemáticos supra-expostos (eixos principais de discussão), que devem ser tratados com a devida cautela, Sérgio Pinto MARTINS reforça que quando praticada dentro de todos os parâmetros legais pertinentes à matéria, a terceirização é uma alternativa moderna de produção.10 2 CARACTERIZAÇÃO 7 GONÇALVES, Vera Olímpia. Terceirização: trabalho temporário: orientação ao tomador de serviços. Brasília: TEM, SIT, 2001. p. 31. 8 ALVES, Giovanni. Reestruturação produtiva, novas qualificações e empregabilidade. Reestruturação produtiva, gestão da força de trabalho e educação. IV SIMPÓSIO TRABALHO E EDUCAÇÃO, ago. 2007. p 205-206. 9 ROBERTELLA, Luiz Carlos Amorim. Terceirização: tendências em doutrina e jurisprudência. Revista Trabalho & Doutrina, São Paulo, p. 30-35, 1999. p. 34. 10 MARTINS, Sérgio Pinto. Terceirização nas relações trabalhistas e desemprego. Disponível em: <http://www.aspr.com.br/arquivos/Junho%20n%2049.pdf> Acesso em: 02 ago. 2008. 5 Para a caracterização da terceirização, demanda, consoante Luiz Alberto de VARGAS e Almir Goulart da SILVEIRA, que sejam observadas as seguintes condições: a) relação entre empresas idôneas, com capacidade econômica incontestável, de modo que deve ser imprescindível que a empresa contratada assuma os riscos do negócio e tenha condições econômicas de honrar seus compromissos com os trabalhadores; b) restrinja-se a serviços especializados, como os de vigilância, asseio e conservação, refeições, assistência técnica, etc., não se justificando a utilização de mão-de-obra não especializada, por já ser um indício a respeito da ilicitude da terceirização. c) que os serviços terceirizados sejam sempre ligados a atividade-meio da empresa e não a atividade-fim. d) que a prestação do serviço seja dirigida pela empresa locadora, que os trabalhadores sejam subordinados aos empregados desta e não aos prepostos da 11 empresa locatária. Parte-se, então, do pressuposto de que uma terceirizada deve ser especialista em um serviço sob o risco de ser enquadrada como empresa locadora de mão-de-obra. E ainda que deve somente se vincular com um tomador de serviços em suas atividades-meio. O dispositivo que prevê isso é a Súmula 331 do TST. 3 SÚMULA 331 TST No Brasil, existem basicamente quatro dispositivos que norteiam juridicamente a terceirização: (a) Lei 6019/74 (Trabalho Temporário); (b) Lei 7102/83 (Serviço de Vigilância); (c) TST – Súmula 256 – vincula o empregado da empresa prestadora de serviços com o tomador – hoje cancelada, mas que ainda se aplica às situações anteriores à Constituição de 1988; (d) TST – Súmula 331 – vincula a contratação de trabalhadores por empresa interposta.12 O Enunciado 331 do Tribunal Superior do Trabalho (TST), de 4 de Janeiro de 1994: TST Enunciado nº. 331 - Contrato de Prestação de Serviços – Legalidade I - A contratação de trabalhadores por empresa interposta é ilegal, formando-se o vínculo diretamente com o 11 VARGAS, Luiz Alberto de; SILVEIRA, Almir Goulart da. Terceirização e o enunciado 331 DO TST. Breves considerações. Disponível em: <http://lavargas.sites.uol.com.br/terceira.html> Acesso em: 20 nov. 2008. 12 GIOSA, Lívio Antonio. Terceirização: uma abordagem estratégica. 3. ed. São Paulo: Pioneira, 1994. p. 11-15; 101-110. 6 tomador dos serviços, salvo no caso de trabalho temporário (Lei nº. 6.019, de 03.01.1974). II - A contratação irregular de trabalhador, mediante empresa interposta, não gera vínculo de emprego com os órgãos da administração pública direta, indireta ou fundacional (art. 37, II, da CF/1988). III - Não forma vínculo de emprego com o tomador a contratação de serviços de vigilância (Lei nº. 7.102, de 20-06-1983), de conservação e limpeza, bem como a de serviços especializados ligados à atividade-meio do tomador, desde que inexistente a pessoalidade e a subordinação direta. IV - O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica a responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços, quanto àquelas obrigações, inclusive quanto aos órgãos da administração direta, das autarquias, das fundações públicas, das empresas públicas e das sociedades de economia mista, desde que hajam participado da relação processual e constem também do título 13 executivo judicial. Tal enunciado procura explicar a terceirização diferenciando atividades-fim e atividades-meio segundo a essencialidade ou não dos serviços da empresa tomadora dos serviços terceirizados. Conforme a Súmula, as atividades que integram o objeto social de uma empresa indicam sua atividade-fim, enquanto as atividades que não integram o objeto social são consideradas atividades-meio. A princípio, tudo pode ser terceirizado, segundo o ponto de vista empresarial, desde que as atividades terceirizadas não sejam as atividades-fim. O Tribunal Superior do Trabalho editou o Enunciado n° 256 sobre a legalidade dos contratos de prestação de serviço, e o Enunciado n° 331 ampliou a liberdade em se terceirizar, consagrando-se como uma tendência flexibilizadora, viabilizando a terceirização nos serviços de vigilância (Lei n° 7102/83), e nos serviços de conservação e limpeza e em outros tipos de serviços especializados ligados à atividade-meio do tomador, desde que inexistente a pessoalidade e a subordinação direta (requisitos do artigo 3° da CLT). De acordo com o enunciado nº 331 do TST, a terceirização é legal quando há um contrato de serviços, em que a tomadora transfere a sua atividade-meio para uma empresa terceirizada. Conforme o inciso I, do mesmo Enunciado, é proibida a contratação de trabalhadores por empresa interposta, exceto nos casos de trabalho temporário. Caso isso não aconteça, a tomadora de serviços se responsabilizará pelo reconhecimento da relação de emprego, será a empregadora na forma dos artigos 2º e 3º da CLT. Pelo inciso III do mesmo enunciado, não existe vínculo de emprego com o tomador de serviços quando as atividades forem de vigilância, conservação e 13 TST ENUNCIADO. Disponível em: <http://www.advquintella.com.br/comunica/artigos/ art010_31102008.html> Acesso em: 25 nov. 2008. 7 limpeza e outras relacionadas a atividades meio. Observa-se, porém, que o tomador não deve caracterizar subordinação e solicitar pessoalidade dos empregados da terceirizada. O inciso IV do Enunciado nº 331 do TST apregoa que a falta de pagamento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, acarreta a responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços, inclusive quanto aos órgãos da administração direta, das autarquias, das fundações públicas, das empresas públicas e das sociedades de economia mista, desde que hajam participado da relação processual e constem também do título executivo judicial. Ressaltando-se o inciso II do mesmo enunciado que exclui o vínculo de emprego com os órgãos da administração pública direta, indireta ou fundacional quando da contratação irregular de trabalhador, mediante empresa interposta (art. 37, II, da CF/1988). 4 ILICITUDES NA TERCEIRIZAÇÃO E SEUS EFEITOS JURÍDICOS. De acordo com Alice Monteiro de BARROS, devem-se ter cuidados jurídicos especiais à questão da Terceirização. A terceirização requer cautela do ponto de vista econômico, pois implica planejamento de produtividade, qualidade e custos. Os cuidados devem ser redobrados do ponto de vista jurídico, porquanto a adoção de mão-de-obra terceirizada poderá implicar reconhecimento direto de vínculo empregatício com a tomadora de serviços, na hipótese de fraude, ou 14 responsabilidade subsidiária dessa ultima, quando inadimplente a prestadora de serviços. O art. 9º da CLT declara nulos de pleno direito os atos praticados com o objetivo de desvirtuar, impedir ou fraudar a aplicação dos preceitos contidos na Consolidação15; o que vale é a realidade. No Direito do Trabalho, o princípio da primazia da realidade, de modo que a realidade dos fatos é mais importante que os aspectos formais que envolvem as contratações.16 Se for constatada a tentativa real 14 BARROS, Alice Monteiro de. Curso de Direito do Trabalho. 5. ed. rev. e ampl. São Paulo: LTr, 2009. p. 452. 15 Art. 9º - “Serão nulos de pleno direito os atos praticados com o objetivo de desvirtuar, impedir ou fraudar a aplicação dos preceitos contidos na presente Consolidação.” 16 QUINTELLA, Lucia Meirelles C. Barreto. Terceirização e as conseqüências para a empresa. Disponível em: <http://www.advquintella.com.br/comunica/artigos/art010_31102008.pdf> Acesso em: 15 jan. 2009. 8 de fraude da CLT por meio do nome terceirização, não existe contrato que torne esta verdadeira. Sobre os efeitos da terceirização ilícita, diz-se que são todos aqueles oriundos de tentativas de fraude à CLT. Dentre eles, os mais comuns são o reconhecimento do vínculo empregatício e o salário equitativo conforme a Lei nº 6.019/74 – art. 12, “a”. Faz-se necessário, então, a caracterização de vínculo empregatício e suas conseqüências, dado ser o vínculo empregatício o vínculo legal entre Empregadores e empregados, segundo condições da CLT, entendendo o empregador como prevê o Art. 2º da CLT. Art. 2º - Considera-se empregador a empresa, individual ou coletiva, que, assumindo os riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de serviço. § 1º - Equiparam-se ao empregador, para os efeitos exclusivos da relação de emprego, os profissionais liberais, as instituições de beneficência, as associações recreativas ou outras instituições sem fins lucrativos, que admitirem trabalhadores como empregados. § 2º Sempre que uma ou mais empresas, tendo, embora, cada uma delas, personalidade jurídica própria, estiverem sob a direção, controle ou administração de outra, constituindo grupo industrial, comercial ou de qualquer outra atividade econômica, serão, para os efeitos da relação de emprego, solidariamente responsáveis a empresa principal e cada uma das subordinadas. E como empregado, o que o mesmo diploma prevê em seu artigo 3º: Art. 3º - Considera-se empregado toda pessoa física que prestar serviços de natureza não eventual a empregador, sob a dependência deste e mediante salário. Parágrafo único - Não haverá distinções relativas à espécie de emprego e à condição de trabalhador, nem entre o trabalho intelectual, técnico e manual. (Parágrafo incluído pela Lei nº. 4.072, de 16-061962). Fecham-se os pré-requisitos para se entender as condições da CLT que caracterizam o vínculo empregatício (pessoalidade, subordinação, habitualidade e onerosidade) Conforme Larissa da Silva SCARABELIM e Hamilton Luiz SCARABELIM, os requisitos supramencionados podem ser assim entendidos17: a) Pessoalidade: 17 SCARABELIM, Larissa da Silva; SCARABELIM, Hamilton Luiz. Direito do trabalho. Campinas: Copola, 1998. p. 32. 9 A Pessoalidade apresenta-se como requisito indispensável à questão do vínculo empregatício, consoante artigo 2º da CLT. Neste sentido, o empregado deve prestar serviços pessoalmente ao seu empregador e sob a subordinação dele. Notase fato semelhante nas relações de trabalho e de consumo, em que a pessoalidade não aparece como elemento obrigatório. Uma consulta com um médico, com um engenheiro ou com profissionais afins não caracteriza uma relação de emprego, mas sim uma relação de consumo. Observa-se nessas situações, porém que, apesar da pessoalidade não ser obrigatória, ela geralmente se faz presente. Desse modo, e levando-se em conta o caráter intuitu personae em relação à pessoa do empregado, encerra-se a questão da pessoalidade entendendo-se o seu caráter essencial. O trabalho deve ser prestado por pessoa física, diretamente sem auxiliares ou empregados. b) Subordinação: A Subordinação (Dependência) é a característica singular da relação de emprego. De um lado o empregador aplicando sobre o empregado uma dependência econômica, disciplinar, técnica e hierárquica; de outro, o empregado na sua função operacional de cumprir ordens. Ressalta-se sobre este contexto que nem toda a subordinação está diretamente relacionada à subordinação hierárquica, ou de cumprimento de ordens. Nota-se que as subordinações técnica e econômica tornamse tão relevantes quanto a hierárquica, visto que o empregado fica “preso” ao empregador por questões de recursos e de técnicas laborais. Pode não receber ordens, mas dentro deste contexto, não pode realizar suas ações sem a previsão de um recebimento certo ou sem a utilização de técnicas e instrumentos que lhe viabilizem para tal. Entremeios a essa discussão, parece clara a diferenciação entre a relação de emprego e a relação de trabalho pela subordinação jurídica. Conforme José Antônio Ribeiro de Oliveira SILVA, um autônomo presta o seu serviço como um profissional independente. Faz seu serviço como um profissional prático em seu labor, não precisando submeter-se a ordens de ninguém para tal.18 Parte-se do 18 SILVA, José Antônio Ribeiro de Oliveira. Relação de trabalho: em busca de um critério científico para a definição das relações de trabalho abrangidas pela nova competência da justiça especializada. Revista do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região. Disponível em: <http://www.trt15.jus.br/escola_da_magistratura/Rev26Art4.pdf> Acesso em: 05 ago. 2008. 10 pressuposto que as questões técnicas, econômicas e disciplinares, referentes ao serviço do autônomo já são de seu conhecimento, e que ele não precisa de outrem para tais princípios estabelecer. Consoante frisa SILVA, um trabalhador autônomo é quem exerce uma atividade econômica sob os riscos dela e sendo o proprietário dos instrumentos de trabalho (não-alteridade).19 Por fim, diz-se que esta discussão sobre a subordinação estende-se para outras questões. Faz-se necessário daí as correlações e devidas discussões acerca da relação laboral entre empregado x autônomo, ou empregado x eventual. c) Habitualidade: A Habitualidade pode ser vista segundo quatro teorias: a) teoria do evento – o trabalhador é contratado para uma tarefa certa (acontecimento, obra, serviço específico); b) teoria dos fins da empresa – o trabalhador é contratado para tarefameio do tomador de serviços; c) teoria da descontinuidade – o trabalhador é contratado para serviço eventual; d) teoria da fixação jurídica na empresa – o trabalhador não se fixa a um tomador de serviços como fonte de trabalho.20 Dessa forma e tendo-se em vista que a continuidade é necessária para a caracterização da relação de emprego, ressalva-se o fato de os trabalhadores eventuais ou afins, desde que os serviços prestados tenham continuidade, (por mais breve que seja), poderem reclamar seus direitos (trabalhistas ou civis) na Justiça do Trabalho. Neste sentido, José Affonso DALLEGRAVE NETO expõe que “a fim de que a delimitação do conceito de relação de trabalho não fique apenas a cargo da doutrina e da jurisprudência, impende aprovar o Projeto de Lei que tramita no Congresso Nacional” 21 , que altera o artigo 652 da CLT, nele introduzindo um parágrafo com o seguinte teor: Artigo 652 (...) § 1º: Compete ainda ao juiz do trabalho processar e julgar os litígios decorrentes de relações de trabalho que, não configurando vínculo de emprego, envolvam: I – representante comercial autônomo e tomador de serviços; II – corretor e tomador de serviços; III – transportador autônomo e empresa de transporte ou usuário de serviços; IV – 19 Idem. Idem. 21 DALLEGRAVE NETO, José Affonso. Primeiras linhas sobre a nova competência da Justiça do Trabalho fixada pela reforma do Judiciário (EC Nº. 45/2004). In: COUTINHO, Grijalbo Fernandes; FAVA, Marcos Neves (Coords.). Nova Competência da Justiça do Trabalho. São Paulo: LTR, 2005. p. 28. 20 11 empreiteiro e subempreiteiro, ou qualquer destes e o dono da obra, nos contratos de pequena empreitada, sempre que os primeiros concorrerem pessoalmente com seu trabalho para a execução dos serviços, ainda que mediante o concurso de terceiros; V – parceiro ou arrendatário rural e proprietário; VI – cooperativas de trabalho e seus associados; VII – cooperativas de trabalho ou seus associados e os respectivos tomadores de serviços. d) Onerosidade A Onerosidade visa à remuneração ou à compensação ao empregado que, não se submetendo ao risco, espera do empregador a renda certa e pré-estabelecida. Neste sentido, o trabalho será necessariamente oneroso não somente na relação de emprego, mas também na relação de consumo, em que não se admite o trabalho gratuito, ex vi do artigo 3º, § 2º, da Lei nº. 8.078/90, segundo o qual o serviço consumido é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração. Conforme finaliza SILVA, a onerosidade não se presta à distinção entre a relação de emprego e a relação de trabalho, tampouco desta em contraposição à relação de consumo. 22 Visto o enquadramento nestes requisitos, e então caracterizado o vínculo empregatício, o tomador de serviços cria obrigações trabalhistas com os empregados da terceirizada. Como ele incorreu em erro ou teve má-fé, acaba ficando sujeito, de acordo com Paulo MELCHOR (SEBRAE), às seguintes medidas por parte dos empregados: a) Reclamação trabalhista proposta pelos empregados na Justiça do Trabalho. b) Autuação por parte dos fiscais do trabalho, que incidirá por empregado sem registro. c) Nova autuação caso não seja regularizada a situação que gerou a primeira autuação. d) Proposição de ação criminal e de encerramento da sociedade (empresa, cooperativa e associação) por parte do Ministério Público do Trabalho, caso constate fraude contra os direitos trabalhistas. e) Autuação dos fiscais da Previdência Social. f) Assumirá os riscos de acidentes do trabalho por não oferecer o seguro previdenciário; 23 etc. Estes são os efeitos jurídicos de uma terceirização ilícita, inerentes à caracterização de vínculo empregatício. Segundo Sérgio Pinto MARTINS, a terceirização assim apresenta as vantagens de geração de novas empresas e empregos, como também aumenta a 22 SILVA, José Antônio Ribeiro de Oliveira. Op. cit. SEBRAE MG. Terceirização de serviços. Disponível em: <http://www.sebrae mg.com.br/arquivos/parasuaempresa/saibamais/terceirizacao_servicos_2.pdf> Acesso em: 25 jan. 2009. 23 12 arrecadação pública (impostos na área de serviços); como desvantagens, apresenta detrimentos aos direitos do trabalhador em uma relação de emprego 24. CONSIDERAÇÕES FINAIS Tem-se que o mercado mundial torna-se cada vez mais globalizado a partir do chamado processo de reestruturação produtiva, e dentre as transformações ocorridas, a polivalência exigida de trabalhadores qualificados acabou por trazer uma maior objetividade laboral, de modo que o trabalhador moderno passou a ser aquele que executa as tarefas sem identidade profissional. Neste contexto, da necessidade de transformações nos meios produtivos, a fim de economizar e aproveitar melhor os recursos, visando ao aumento da competitividade nas organizações, é que surgem estratégias de gestão, como a terceirização, implementadas nas mais diversas partes do mundo e setores da economia. As empresas buscam cada vez mais a modernização com a finalidade de tornarem-se mais aptas para enfrentar seus concorrentes, sendo a terceirização uma tendência atual, que busca alcançar maior produtividade, elevar o nível de qualidade e reduzir custos, para assim sobreviver em ambientes de alta competitividade. A terceirização, neste viés, passou a ser uma ferramenta importante no sentido de o tomador de serviço passar a ter mais tempo para controlar e gerir o seu próprio negócio, deixando a execução para terceiros de atividade-meio da empresa. A tendência de flexibilização da relação de emprego parece indicar ampla possibilidade de acolhimento progressivo de formas mais aprimoradas de terceirização. Por fim, percebe-se, uma evidente evolução com a absorção de novas formas de contratação de mão-de-obra, que acabam por se perfazerem por meio da Súmula 331 do TST, a qual uniformizou os entendimentos sobre a terceirização, acolhendo o fornecimento lícito de mão-de-obra quando não configurada a 24 MARTINS, Sérgio Pinto. Terceirização... Op. cit., p. 46. 13 existência de relação de pessoalidade e de subordinação direta entre o tomador de serviço e o empregado terceirizado. Assim, visto que este artigo não buscou esgotar o assunto, sugere-se uma analise mais profunda, a fim de conhecer e relacionar a estrutura das organizações brasileiras diante do cenário mundial que se apresenta, já que existindo a transferência de um processo para terceiros, as empresas passam a ter que gerenciar as atividades realizadas por outros e pelos seus, a fim de atingirem melhores níveis de serviço e qualidade. 14 REFERÊNCIAS ALVES, Giovanni. Reestruturação produtiva, novas qualificações e empregabilidade. Reestruturação produtiva, gestão da força de trabalho e educação. IV SIMPÓSIO TRABALHO E EDUCAÇÃO, ago. 2007. p 205-206. BARROS, Alice Monteiro de. Curso de Direito do Trabalho. 5. ed. rev. e ampl. São Paulo: LTr, 2009. DALLEGRAVE NETO, José Affonso. Primeiras linhas sobre a nova competência da Justiça do Trabalho fixada pela reforma do Judiciário (EC Nº. 45/2004). In: COUTINHO, Grijalbo Fernandes; FAVA, Marcos Neves (Coords.). Nova Competência da Justiça do Trabalho. São Paulo: LTR, 2005. p. 28. GIOSA, Lívio Antonio. Terceirização: uma abordagem estratégica. 3. ed. São Paulo: Pioneira, 1994. GIOSA, Lívio Antônio. Terceirização: uma abordagem estratégica. 5. ed. São Paulo: Pioneira, 1997. GONÇALVES, Vera Olímpia. Terceirização: trabalho temporário: orientação ao tomador de serviços. Brasília: TEM, SIT, 2001. LEIRIUA; Jerônimo Souto; SARATT, Newton Dornelles. Terceirização: uma alternativa de flexibilidade empresarial. 8. ed. São Paulo: Gente, 1995. MARCELINO, Paula. Afinal, o que é terceirização? Em busca de ferramentas de análise e de ação política. Revista Pegada eletrônica, v. 8, n. 2, p. 56-60, Dez. 2007. MARTINS, Sérgio Pinto. A terceirização e o direito do trabalho. São Paulo: Atlas, 2001. MARTINS, Sérgio Pinto. Terceirização nas relações trabalhistas e desemprego. Disponível em: <http://www.aspr.com.br/arquivos/Junho%20n%2049.pdf> Acesso em: 02 ago. 2008. QUEIROZ, Carlos Alberto Ramos Soares de. Manual e terceirização. 9. ed. 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