UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI
CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS DE SÃO JOSÉ – SC
CURSO DE DIREITO – NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA
FLÁVIA DE AZEVEDO SILVA BATISTA
ASSÉDIO MORAL NA RELAÇÃO DE EMPREGO: O QUANTUM INDENIZATÓRIO
FRENTE AOS TRIBUNAIS
SÃO JOSÉ
2009
FLÁVIA DE AZEVEDO SILVA BATISTA
ASSÉDIO MORAL NA RELAÇÃO DE EMPREGO: O QUANTUM INDENIZATÓRIO
FRENTE AOS TRIBUNAIS
Monografia apresentada como requisito
parcial para obtenção do título de
Bacharel em Direito, pela Universidade do
Vale do Itajaí, Centro de Educação São
José.
Orientadora: Profª. MSc. Solange Lúcia
Heck Kool
SÃO JOSÉ
2009
FLÁVIA DE AZEVEDO SILVA BATISTA
ASSÉDIO MORAL NAS RELAÇÕES DE EMPREGO:
O QUANTUM INDENIZATÓRIO FRENTE AOS TRIBUNAIS
Esta monografia foi julgada adequada para obtenção do título de Bacharel em
Direito e aprovada pelo Curso de Direito da Universidade do Vale do Itajaí, Centro
de Educação de São José.
Área de Concentração: Direito do Trabalho
São José, 17 de junho de 2009.
Profª. MSc. Solange Lúcia Heck Kool
UNIVALI- CE de São José
Orientadora
Prof. MSc. Dirajaia Esse Pruner
UNIVALI- CE de São José
Membro
Prof. MSc. Elisabete Wayne Nogueira
UNIVALI- CE de São José
Membro
TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE
Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo aporte
ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do Vale do
Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e a Orientadora de
toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo.
São José, 17 de junho de 2009.
Flávia de Azevedo Silva Batista
Graduanda
Dedico este trabalho ao meu esposo
Pierre, presente de Deus para mim, pelo
amor,
compreensão,
companheirismo,
motivação e por fazer dos meus dias os
mais felizes.
AGRADECIMENTOS
Eu não teria palavras suficientes para agradecer a Deus, pelo cuidado, infinito
amor e por guiar meus passos.
Agradeço também à minha família, em especial a meus pais, pelo amor
incondicional, pelas orações e por não medirem esforços para que eu chegasse até
aqui.
Ao meu esposo Pierre, por ter aceitado se privar de minha companhia pelos
estudos, concedendo a mim a oportunidade de me realizar ainda mais.
À minha orientadora e professora MSc. Solange Lúcia Heck Kool, por todo
conhecimento passado, pelas excelentes supervisões e pela paciência.
As coisas que o olho não viu, e o ouvido
não ouviu, e não subiram ao coração do
homem, são as que Deus preparou para
os que o amam.
1° Coríntios 2:9
ROL DE ABREVIATURAS E SIGLAS
Art. - Artigo
CC - Código Civil Brasileiro de 2002
CF
- Constituição da República Federativa do Brasil de 1988
CLT - Consolidação das Leis do Trabalho
CP - Código Penal
EC - Emenda Constitucional
Inc. - Inciso
STF - Supremo Tribunal Federal
STJ - Superior Tribunal de Justiça
TRT - Tribunal Regional do Trabalho
TST - Tribunal Superior de Trabalho
RESUMO
A presente pesquisa tem como principal objetivo a análise do quantum indenizatório
no assédio moral. O tema proposto remonta aos primórdios das relações de
emprego, embora sejam recentes as pesquisas acerca do assunto. Apresentar-se-á
uma análise sob a luz da legislação, doutrina, bem como jurisprudências sobre o
assunto proposto, com o escopo de elucidar os requisitos para caracterização da
valoração da indenização devida nos casos de agressão advinda do assédio moral.
Para melhor compreensão do tema, no primeiro capítulo, faz-se uma abordagem
sobre a conceitualização de contrato de trabalho, os sujeitos do contrato de trabalho,
classificações, e requisitos. Em seguida, o segundo capítulo aponta os princípios
gerais e específicos do Direito do Trabalho. Por fim, o terceiro capítulo abordará o
assédio moral sob a ótica do Direito do Trabalho, apresentando conceitos,
diferenciação entre assédio moral e dano moral, e entre assédio moral e assédio
sexual; definição da responsabilidade do empregador; classificação dos tipos de
assédio moral e julgados sobre o tema proposto para maior entendimento da
formação do quantum indenizatório.
Palavras-chave: Assédio Moral. Dano Moral. Quantum Indenizatório. Empregado.
Empregador.
SUMÁRIO
1
INTRODUÇÃO ....................................................................................... 12
2
CONTRATO DE TRABALHO E CONTRATO DE EMPREGO .............. 16
2.1
DIFERENÇAS ENTRE CONTRATO DE EMPREGO E CONTRATO
DE TRABALHO ...................................................................................... 17
2.2
ELEMENTOS
CARACTERIZADORES
DO
CONTRATO
DE
TRABALHO ............................................................................................ 19
2.2.1
De Direito Privado ................................................................................ 19
2.2.2
Pessoalidade......................................................................................... 19
2.2.3
Sinalagmático ....................................................................................... 20
2.2.4
Consensualidade.................................................................................. 21
2.2.5
Sucessivo.............................................................................................. 22
2.2.6
Subordinação........................................................................................ 22
2.2.7
Onerosidade.......................................................................................... 23
2.3
REQUISITOS DO CONTRATO DE TRABALHO.................................... 24
2.3.1
Capacidade ........................................................................................... 24
2.3.2
Quanto ao Objeto ................................................................................. 25
2.3.3
Quanto à Forma .................................................................................... 26
2.3.4
Quanto à Duração................................................................................. 27
2.4
TEORIAS SOBRE O CONTRATO DE TRABALHO ............................... 28
2.4.1
Teoria Contratualista............................................................................ 28
2.4.2
Teoria Anticontratualista ..................................................................... 29
2.5
SUJEITOS DO CONTRATO DE TRABALHO ........................................ 29
2.5.1
Empregado............................................................................................ 30
2.5.1.1
Requisitos do Empregado ...................................................................... 30
2.5.1.1.1 Pessoa Física ......................................................................................... 30
2.5.1.1.2 Onerosidade........................................................................................... 31
2.5.1.1.3 Pessoalidade .......................................................................................... 31
2.5.1.1.4 Subordinação ......................................................................................... 32
2.5.1.1.5 Não-Eventualidade ................................................................................. 34
2.6
EMPREGADOR...................................................................................... 34
2.6.1
Os Poderes do Empregador ................................................................ 35
2.6.2
Poder de Organização do Empregador .............................................. 36
2.6.3
Poder de Controle do Empregador ..................................................... 37
2.6.4
Poder Disciplinar do Empregador....................................................... 38
3
PRINCÍPIOS GERAIS E ESPECÍFICOS APLICÁVEIS AO DIREITO
DO TRABALHO ..................................................................................... 40
3.1
PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS GERAIS .......................................... 41
3.1.1
Princípio Constitucional da Não-Discriminação................................ 42
3.1.2
Princípio da Tipificação Legal de Ilícitos e Penas ............................. 43
3.1.3
Princípio Constitucional do Duplo Grau de Jurisdição .................... 45
3.1.4
Princípio Constitucional da Dignidade da Pessoa Humana ............. 46
3.2
PRINCÍPIOS ESPECÍFICOS DO DIREITO DO TRABALHO ................. 47
3.2.1
Princípio da Proteção........................................................................... 47
3.2.1.1
Princípio In Dubio pro Operario .............................................................. 49
3.2.1.2
Princípio da Norma Mais Favorável........................................................ 50
3.2.1.3
Princípio da Condição Mais Benéfica ..................................................... 51
3.2.2
Princípio da Irrenunciabilidade dos Direitos...................................... 52
3.2.3
Princípio da Primazia da Realidade .................................................... 54
3.2.4
Princípio da Continuidade da Relação de Emprego.......................... 56
3.2.5
Princípio da Lealdade e Boa-fé ........................................................... 57
3.2.6
Princípio da Razoabilidade .................................................................. 58
3.2.7
Princípio do Maior Rendimento........................................................... 59
3.2.8
Princípio da Indisponibilidade dos Direitos Trabalhistas................. 60
3.2.9
Princípio da Não-Alteração Contratual............................................... 61
4
ASSÉDIO MORAL – O QUANTUM INDENIZATÓRIO FRENTE AOS
TRIBUNAIS ............................................................................................ 63
4.1
ASSÉDIO MORAL.................................................................................. 63
4.2
CARACTERÍSTICAS DO ASSÉDIO MORAL......................................... 64
4.3
DANO MORAL ....................................................................................... 65
4.4
DISTINÇÃO ENTRE ASSÉDIO MORAL E DANO MORAL.................... 68
4.5
RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO EMPREGADOR........................ 68
4.6
DISTINÇÃO ENTRE ASSÉDIO MORAL E ASSÉDIO SEXUAL ............. 71
4.7
FORMAS DE REPARAÇÃO DO ASSÉDIO MORAL TRABALHISTA .... 73
4.8
O “QUANTUM” INDENIZATÓRIO DO ASSÉDIO MORAL ..................... 74
4.9
ENTENDIMENTO JURISPRUDENCIAL SOBRE O ASSÉDIO MORAL
E O QUANTUM INDENIZATÓRIO ......................................................... 76
4.10
COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA LABORAL.............................................. 81
4.11
CLASSIFICAÇÃO DO ASSÉDIO MORAL.............................................. 82
4.11.1
Assédio Moral Vertical Ascendente.................................................... 82
4.11.2
Assédio Moral Vertical Descendente.................................................. 83
4.11.3
Assédio Moral Horizontal .................................................................... 84
4.11.4
Assédio Moral Misto............................................................................. 85
4.12
MÉTODOS DO ASSÉDIO MORAL – ESTRATÉGIAS DO AGRESSOR 86
4.13
CONSEQUÊNCIAS DO ASSÉDIO MORAL ........................................... 88
5
CONCLUSÃO ........................................................................................ 91
REFERÊNCIAS...................................................................................... 94
12
1 INTRODUÇÃO
Esta obra é um convite à reflexão sobre assédio moral na relação
empregatícia. Nunca se falou tanto em assédio moral quanto atualmente. O objetivo
do estudo realizado encontra-se fielmente direcionado em demonstrar o universo do
assédio moral no direito do trabalho, apontar as hipóteses cabíveis que caracterizam
o dano moral sofrido pelo assédio moral na relação de emprego e quais são os
meios utilizados para o arbitramento da indenização.
O escopo do presente trabalho não é esgotar o assunto ou mesmo dissecar
todas as normas jurídicas que disciplinam assédio moral, particularmente a
obrigação de indenizar em decorrência do assédio moral, praticado na relação
empregatícia.
Embora o tema proposto não seja considerado um tema novo e pouco
abordado ou que traga grandes novidades, o que levou a essa escolha foi a forma
como é avaliado o dano causado pelo assédio moral, ou seja, a formação do
quantum indenizatório, prova disso a abundante bibliografia, artigos e discussões
existentes relativos ao assédio moral na relação de emprego, tornando o assunto de
interesse geral. É certo que não se busca, através desse trabalho, o esgotamento do
tema, mas sim tratar sobre a proteção de um dos mais nobres e importantes bens
jurídicos que um ser humano pode possuir: sua moral e dignidade no meio social, e
especificamente na relação de emprego.
Objeto de estudo de vários pesquisadores nos últimos anos, o assédio moral
tem atraído a atenção de trabalhadores, psicólogos, operadores do direito,
autoridades
e
demais
pessoas
interessadas
pelo
mundo
do
trabalho.
Assédio moral é um assunto extremamente polêmico e de interesse geral, e não se
pode discutir dano moral sem antes falar sobre a responsabilidade civil,
especialmente a do empregador, sobre os atos do empregado. Fala-se até em
“indústria do dano moral” e até mesmo fonte de enriquecimento ilícito. Houve muita
resistência dos Tribunais e da doutrina pátrios no tocante a este assunto, porém
esse quadro foi mudado, adequando-se ao cotidiano da sociedade.
Prima-se pela dignidade da pessoa humana e, por esse motivo, o assédio
moral tem sido considerado um dos temas que mais geram polêmicas nas
discussões entre os operadores do direito.
13
O motivo predominante do número crescente de ações pleiteando tal Direito
deve-se à relação de subordinação entre empregado e empregador, que pode ser
considerada um campo fértil e propício para a caracterização do dano.
O tema escolhido pode ser considerado atual, polêmico e de grande
discussão. Busca-se, na pesquisa científica, a forma como os Tribunais têm-se
portado diante do quantum indenizatório, ou seja, a quantificação do assédio nas
relações de trabalho e o arbitramento da indenização de um modo geral, assim
como o modo de prevenção relativo ao enriquecimento ilícito nesses casos.
A abordagem da pesquisa realizada é objeto de extensa discussão doutrinária
e jurisprudencial, com uma diversidade de posicionamentos, variedades estas que
se pretende demonstrar ao longo do trabalho. Diante disto, é considerada hipótese
deste trabalho: se a falta de legislação específica sobre assédio moral no Brasil
impede a tutela do trabalhador na exposição de tal agressão.
A metodologia utilizada privilegia o método dedutivo, que, segundo o
professor Cesar L. Pasold consiste na “forma de pesquisar e identificar as partes de
um fenômeno colecionando-as de modo a fazer uma percepção ou conclusão geral”
(PASSOLD, 2003, p. 103).
Será utilizado o método de pesquisa indireta, utilizando-se da consulta da
doutrina, jurisprudência e artigos eletrônicos, bem como a legislação vigente sobre o
assunto.
Para melhor desenvolvimento do tema proposto, o presente trabalho foi
dividido em três capítulos, partindo do contrato de trabalho, trazendo uma visão
panorâmica do assunto, até chegar às decisões mais recentes relacionadas ao
assunto proposto.
No primeiro capítulo, abordar-se-á o contrato de trabalho nas relações de
emprego, a diferença entre contrato de trabalho e contrato de emprego, embora este
trabalho tenha tratado ambas as expressões como se sinônimas fossem. Também,
apontar-se-ão os elementos caracterizadores do trabalho, tais como de direito
privado, a pessoalidade, sinalagmático, consensualidade, sucessivo, oneroso, bem
como os requisitos do contrato de trabalho, tais como capacidade, objeto, forma e
duração da relação empregatícia. Buscar-se-ão também as teorias sobre o contrato
de trabalho, em que surgem duas correntes, sendo a contratualista, que entende
que a relação de emprego é decorrente do acordo das vontades do empregado e do
empregador, e a anticontratualista, que nega a relação contratual na relação
14
empregatícia. Por fim, foram apresentados os sujeitos da relação de emprego, o
empregado e o empregador, bem como suas características.
No segundo capítulo, tratar-se-á dos princípios aplicáveis no direito do
trabalho, os princípios gerais e específicos do direito do trabalho, primeiramente os
constitucionais gerais aplicados, ou seja, os que não são exclusivos do direito do
trabalho, tais como o princípio da não-discriminação, da tipificação geral do direito,
do duplo grau de jurisdição, o princípio da dignidade da pessoa humana, o princípio
da boa-fé e o princípio da razoabilidade. Os princípios específicos, que serão
demonstrados através do princípio da proteção in dubio pro operario, quais sejam,
da norma mais favorável, da condição mais benéfica, da irrenunciabilidade dos
direitos, primazia da realidade, continuidade da relação de emprego, maior
rendimento, economia e celeridade, e, por fim, o princípio da não alteração
contratual.
No terceiro capítulo, apresentar-se-á o assédio moral de uma forma bastante
aprofundada, apontando toda problemática da agressão voltada para a relação
jurídica
existente
entre
empregado
e
empregador.
Serão
apontadas
as
características do assédio moral, bem como será apresentada uma abordagem
sobre o dano moral e sua distinção do assédio moral, institutos que, muitas vezes,
são confundidos, da mesma forma que o assédio moral e o assédio sexual o são.
Apresentar-se-á também a responsabilidade objetiva do empregador, bem como a
competência da Justiça laboral para o julgamento desta questão. O terceiro capítulo
ainda apresentará as classificações do assédio moral, sendo o assédio moral
vertical ascendente aquele praticado por um ou mais subordinados contra um
superior hierárquico, o assédio moral vertical descendente, que é praticado pelo
superior hierárquico contra seu subordinado, o assédio moral horizontal, que ocorre
entre pessoas do mesmo patamar hierárquico, e, por fim, o assédio moral misto, que
parte de vários agressores do mesmo patamar hierárquico e pelo superior
hierárquico (horizontal e vertical) contra a vítima. Este capítulo apontará, ainda, os
métodos existentes de assédio moral, bem como as estratégias do agressor a fim de
fragilizar a vítima, através de gritos, insultos, ridicularizações das mais diversas,
furtando, desta forma, seu prestígio social, afetando diversas áreas, como a vida em
sociedade, familiar, seu psicológico, vida profissional, etc., ferindo principalmente
seu bem maior, sua dignidade.
15
Por último, encerra-se a presente pesquisa com a conclusão, trazendo uma
análise geral do trabalho, pretendendo-se responder ao problema da pesquisa
conforme exposto anteriormente.
16
2 CONTRATO DE TRABALHO E CONTRATO DE EMPREGO
A relação existente no contrato jurídico é marcada pelo acordo de interesses
existente entre duas ou mais pessoas em relação à determinada coisa. Maria
Helena Diniz entende contrato como o acordo de duas ou mais vontades, sempre
sob preceitos da lei, com o escopo de estabelecer uma regulamentação de
interesses entres as partes em adquirir, modificar ou extinguir relações jurídicas de
natureza patrimonial (DINIZ, 2005, p. 410).
Quando se fala em contrato, alguns princípios devem ser observados.
Américo Plá Rodriguez, afirma que “são as idéias fundamentais e informadoras da
organização jurídica trabalhista” (apud BRANDÃO, 2000, p. 31).
Colhe-se do expedido anteriormente que princípios são fundamentos básicos
nos quais se assentam os fundamentos jurídicos, são os pontos básicos que servem
como pilares dos estatutos jurídicos.
Leciona Eduardo Gabriel Saad que “Na interpretação do contrato há de se
averiguar, além do sentido da declaração (“volunta spectanda”), a verdadeira
intenção das partes.” (SAAD, 2000, p. 127).
Pelo prescrito acima, as partes têm liberdade na estipulação do que melhor
lhes convenha, são livres para acordar, são livres para contratar, na medida em que
se exerça a função social do contrato.
Registra-se ainda o princípio da obrigatoriedade, regido pelo pacta sunt
servanda, conforme leciona Sérgio Pinto Martins:
O princípio da boa-fé nos contratos é aplicável em qualquer contrato,
seja no Direito Civil (art. 422 do CC) ou no Comercial, mas também
no Direito do Trabalho. Assim não se pode dizer que se trata de um
princípio específico do Direito do Trabalho, como quer Américo Plá
Rodriguez (1999:305). Todo e qualquer contrato deve ter por base a
boa-fé. O empregado deve cumprir sua parte no contrato de trabalho,
desempenhando normalmente suas atividades, enquanto o
empregador deve cumprir com suas obrigações, daí se falar numa
lealdade recíproca (RODRIGUEZ, 1999, apud MARTINS, 2005).
Vê-se, pelo apontado, que as partes deverão agir de maneira correta,
eticamente, com vontade de não lesar o próximo, não obter enriquecimento ilícito ou
sem causa, agir conforme o direito e a justiça, o que significa que os pactos devem
ser cumpridos: o negócio jurídico bilateral tem o escopo de gerar obrigações entre
as partes, sempre em observância ao princípio da boa-fé.
17
Quanto à configuração do contrato de trabalho, ensina Cláudio Mascarenhas
Brandão que é preciso que o prestador de serviço seja subordinado e que a
atividade executada seja, para o empregador, necessária e permanente. O
doutrinador ainda menciona o art. 3° da CLT para a definição: “toda pessoa física
que prestar serviços de natureza não eventual a empregador, sob dependência
deste e mediante salário.” (BRANDÃO, 2000, p. 37).
Observa-se do supracitado que contrato tem efeito de criar obrigações, ou
seja, existe um dever, uma garantia das relações jurídicas, conforme será apontado
adiante no presente trabalho.
2.1 DIFERENÇAS ENTRE CONTRATO DE EMPREGO E CONTRATO DE
TRABALHO
Ambas as expressões são encontradas na legislação brasileira como se
sinônimos fossem, porém, segundo a doutrina, os termos corretos a serem utilizados
seriam o de contrato de emprego e relação de emprego.
Amauri Mascaro Nascimento explana sobre o contrato de trabalho:
O contrato de trabalho impõe-se tanto como uma necessidade
subjetivista de afirmação de liberdade de trabalho, como também de
uma afirmação de justiça social sob cujos princípios devem
enquadrar. É uma afirmação de liberdade de trabalho, porque
modifica o relacionamento do trabalhador com o destinatário do
trabalho, e sob esse prisma é inegável a sua importância, uma vez
que põe fim ao regime de escravidão, de servidão e de outras formas
de trabalho forçado nas quais o ser humano é constrangido a prestar
serviços subordinados. Com o seu advento, o homem passa a ter o
direito de dirigir sua própria vida como senhor de si mesmo, podendo
oferecer seu trabalho ou deixar de fazê-lo a determinado
empregador, ao qual não está irrestritamente vinculado. Significa,
portanto, um ideal de humanismo na preservação da dignidade do
homem que trabalha e uma forma de liberdade pessoal
consubstanciada a livre escolha do emprego (NASCIMENTO, 2005,
p. 508).
Observa-se, pelo apontado, que o contrato de trabalho advém da liberdade do
trabalhador em prestar seu serviço, pondo fim à idéia de escravidão ou servidão,
trazendo ao trabalhador certa independência.
18
Ainda sobre a diferenciação entre relação de emprego e relação de trabalho,
destaca-se, para Sérgio Pinto Martins:
Relação de trabalho é gênero, que compreende o trabalho
autônomo, eventual, avulso etc. Relação de emprego trata do
trabalho subordinado do empregado em relação ao empregador. A
CLT disciplina a relação de empregados. A Justiça do Trabalho, de
modo geral, julga questões de empregados (MARTINS, 2005, p.
114).
No direito do trabalho, o conceito sobre contrato de trabalho é trazido pela
CLT, que estabelece que “Art. 442 Contrato individual de trabalho é o acordo tácito
ou expresso correspondente à relação de emprego” (BRASIL, 2008, p. 904).
Sobre a evolução das relações de trabalho, Arnaldo Sussekind aponta:
A evolução das relações de trabalho entre os homens sob o prisma
da sociologia e do direito obsta o enquadramento do vínculo do
empregado entre as clássicas fórmulas construídas pelos romanos
ou consagrados no Código de Napoleão. Ao jurista contemporâneo
não mais interessa, sob este prisma, a distinção entre a locattio
operis, que visava ao resultado do trabalho contratado, e a locattio
operarum, que tinha por fim a locação da energia humana do
trabalho, pois, como bem assinala GALLART FOLCH, hoje não
existe grande diferença entre o que presta serviço ou executa uma
obra, sempre que o façam para um empregador e sob a dependência
deste (SUSSEKIND, 2004, p. 227).
Conforme se pode observar, a origem do contrato de trabalho vem do locattio
operarum, considerada antigamente como a própria tradução, uma espécie de
locação de serviços existente no Direito Romano, em que uma parte se obrigava a
executar determinada tarefa, em contraprestação a uma determinada remuneração
previamente fixada.
Embora já mencionado, vale lembrar que a legislação brasileira considera as
expressões relação de emprego e relação de trabalho como se fossem sinônimos,
sendo a distinção trazida apenas pela doutrina. Assim, daqui em diante, o presente
trabalho tratará ambas as expressões como sinônimas, ou seja, relação de trabalho
como relação de emprego.
19
2.2 ELEMENTOS CARACTERIZADORES DO CONTRATO DE TRABALHO
De acordo com Cesar P. S. Machado Junior, de modo geral, com pequenas
adaptações, os autores indicam como características do contrato de trabalho: de
direito privado; pessoalidade em relação à pessoa do empregado; sinalagmático,
com obrigações contrárias e equivalentes; consensual, visto que não exige forma
especial para sua validade; sucessivo, uma vez que seu elemento típico é a
continuidade e duração; e oneroso, já que a prestação de trabalho corresponde ao
pagamento de salário ao subordinado (MACHADO JUNIOR, 1999, p. 185).
2.2.1 De Direito Privado
De direito privado, quando o vínculo é estabelecido entre as partes, conforme
leciona Arnaldo Sussekind:
De modo geral, existem poucas discrepâncias entre os doutrinadores
ao enumerarem as características jurídicas do contrato de trabalho.
Para nós ele é de direito privado, pois o seu vínculo é estabelecido
entre o trabalhador e a pessoa natural ou jurídica que o contrata, nos
campos das relações de direito privado (SUSSEKIND, 2004, p. 231).
Tem-se, portanto, que o contrato de trabalho é de direito privado, ou seja, um
vínculo pactuado entre empregado e empregador.
2.2.2 Pessoalidade
Pessoalidade também é considerada um dos elementos caracterizadores do
contrato de trabalho. Sobre a presente característica, leciona Amauri Mascaro
Nascimento:
O contrato de trabalho é ajustado em função de determinada pessoa.
Neste sentido é que se diz que o contrato de trabalho é intuitu
personae. O trabalho com o qual o empregador tem o direito de
contar é de determinada e específica pessoa e não outra. Assim, não
pode o empregado, por sua iniciativa, fazer-se substituir por outra
20
pessoa, sem o consentimento do empregador. Eis o que dizer da
pessoalidade. Não havendo pessoalidade, descaracteriza-se a
relação de emprego (NASCIMENTO, 2007, p. 154).
Outrossim, infere-se que pessoalidade pode ser considerada a situação em
que não é permitido que o empregado se faça substituir por outra pessoa, sem o
consentimento do empregado. O contrato de trabalho é intuitu personae, ou seja,
poderá ser realizado somente por determinada pessoa.
A Juíza Eneida Melo Correia de Araújo traz à baila alguns aspectos
ensejadores a respeito do elemento caracterizador de pessoalidade:
Uma das características do contrato de trabalho é a pessoalidade.
Esse elemento pode ser entendido como o comprometimento do
sujeito, empregado, perante o empregador, em que o trabalhador
prestará, pessoalmente, os serviços ao tomador. A execução dos
serviços não deve ser conferida a terceiros, cabendo àquele que se
vinculou a efetiva prestação de serviços. O empregador, ao ligar-se
ao empregado, o faz considerando as condições pessoais, morais e
profissionais deste. E o empregado, firmando o negócio jurídico, tem
como objetivo colocar suas energias à disposição do outro sujeito, de
forma remunerada, geralmente para sobreviver (ARAÚJO, 2003, p.
54).
Extrai-se do exposto sobre a pessoalidade que as partes, no contrato do
trabalho, assumem obrigações especiais, de natureza individual, considerando tal
característica como elemento definidor da relação jurídica.
2.2.3 Sinalagmático
Sinalagmático também é considerado como característica do contrato de
trabalho. Neste sentido, ensina Arnaldo Sussekind que as partes obrigam-se entre
si, visando à satisfação de prestações recíprocas que se equivalem (SUSSEKIND,
2004, p. 232).
Ainda nessa esteira, colhe-se o entendimento de Eneida Melo Correia de
Araújo:
O sinalagma que essa relação jurídica estabelece acha-se no dever
de o empregado executar serviços para o empregador, de forma
subordinada, ou seja, mediante sua direção, e, de outro lado, na
obrigação do empregador de remunerar o trabalhador pelo dispêndio
de suas energias ou, mesmo, por estar à sua disposição,
aguardando ordens. Este aspecto diz respeito ao fato de ser o
21
contrato de trabalho um negócio jurídico intuito personae em relação
ao trabalhador (ARAÚJO, 2003, p. 53).
Conforme se pode observar, sinalagmático ou perfeito é quando se faz
necessária a dependência recíproca de obrigações, a bilateralidade que estabelece
a vontade de ambas as partes, que se obrigam reciprocamente.
2.2.4 Consensualidade
Forma consensual também é considerada como elemento caracterizador do
contrato de trabalho. Para os doutrinadores Orlando Gomes e Elson Gottschalk, o
requisito consenso no contrato de trabalho é usado como declaração de vontade, e
nada mais é do que a declaração de vontade das partes, ou seja, a intenção de cada
parte (GOMES; GOTTSCHALK, 2002, p. 149)
O consentimento, segundo César P. S. Machado Jr, poderá ser expresso ou
tácito, para o qual não se exige regra, ou qualquer formalidade no sentido de sua
realização (MACHADO JUNIOR, 1999, p. 187).
Sobre a forma consensual, Sérgio Pinto Martins trouxe à tona seu
posicionamento, ao afirmar:
A segunda característica do contrato de trabalho é a
consensualidade, significando a necessidade do assentimento
verbal, ou escrito ou tácito para configuração do vínculo jurídico.
Entenda-se que a relação de emprego prescindindo da vontade
manifestada não dispensa, todavia, a concordância ou o desejo de
trabalhar para determinada pessoa. Nota-se, de outro lado, o declínio
da autonomia da vontade, no contrato de trabalho, na proporção do
gradativo aumento do intervencionismo estatal, fenômeno próprio da
época e que não se confina aos limites da relação jurídica trabalhista
(MARTINS, 2000, p. 52).
Conforme citação anterior, a consensualidade significa a vontade das partes,
a concordância, o desejo de trabalhar para determinada pessoa. Importante
ressaltar, nesta questão, a dispensa de maiores formalidades em sua constituição.
22
2.2.5 Sucessivo
Sucessivo ou contínuo também são características que devem ser
consideradas como características do contrato de trabalho. Sobre esse aspecto,
leciona Sérgio Pinto Martins:
O contrato de trabalho é um pacto de trato sucessivo. Exige a
continuidade da prestação dos serviços. Se há eventualidade do
trabalho, inexiste o contrato de trabalho. Certos contratos se
exaurem com uma única prestação, como ocorre com a compra e
venda, em que, entregue a coisa e pago o preço, há o término da
relação obrigacional. No contrato de trabalho não é isso que ocorre,
pois há um trato sucessivo na relação entre as partes, que perdura
no tempo. (MARTINS, 2000, p. 52).
Vê-se, pelo apontado, sucessivo ou contínuo, que o contrato executado deva
obedecer ao princípio da continuidade, que será abordado no capítulo posterior. A
continuidade é elemento caracterizador trazido pelo art. 3° da CLT, que será tratado
mais adiante, neste capítulo.
2.2.6 Subordinação
Outro elemento caracterizador de destaque no contrato de trabalho é a
subordinação. Sobre o assunto, Paulo Emílio Ribeiro de Vilhena é enfático ao
afirmar:
Insista-se: a subordinação é uma forma de exteriorizar-se a relação
de trabalho, que se preenche de atos entre pessoas. As condutas do
prestador e as do credor de trabalho como se sucedem em ondas,
em afluxos e refluxos, em que se intensificam ou se esmaecem suas
expectativas, diante do que deva ser executado. Mesmo o
trabalhador que se intitula subordinado tem as suas condutas
inteiramente absorvidas pelo credor de trabalho. A assim admitir,
estar-se-á suprimindo o elemento vontade de uma das partes do
contrato o que, por princípio, o descaracteriza como suposto jurídico
(VILHENA, 1999, p. 477).
Nota-se, pelo prescrito acima, que, no aspecto da subordinação, na relação
de emprego, a pessoa do empregador é detentora de poderes, como organização,
controles e disciplinares, tema este que se abordará mais adiante, ao tratar-se dos
23
elementos caracterizadores do empregado. Sendo assim, a existência da
subordinação na relação de emprego corresponde ao empregado submeter-se às
ordens do empregador, dentro dos limites permitidos.
2.2.7 Onerosidade
Onerosidade também é considerada elemento caracterizador do contrato de
trabalho. É abordado com maestria por Marcos Abílio Domingues:
Com a onerosidade, que se revela pela obrigação de pagar salário, a
relação de emprego pressupõe um trabalho não gratuito. Diverso não
poderia ser, posto que, de regra, com o contrato individual de
trabalho o empregado obtém os meios para sua sobrevivência em
família (DOMINGUES, 2000, p. 19).
Nota-se que a onerosidade como característica do contrato de trabalho se dá
na existência da obrigação do trabalhador prestar seu serviço, e a contraprestação
desta obrigação é o pagamento do salário.
Alguns autores também apontam como características do contrato de trabalho
a alteridade, a adesão, e o comutativo, conforme explicações adiante.
Alteridade é considerada como elemento caracterizador por Sérgio Pinto
Martins, que declara:
O empregado presta serviços por conta alheia (alteridade). Alteridade
vem de alteritas, de alter, outro. É um trabalho sem assunção de
qualquer risco pelo trabalhador. O empregado pode participar dos
lucros da empresa, mas não dos prejuízos. Quando está prestando
um serviço para si ou por conta própria, não será empregado,
podendo apenas ocorrer a realização de um trabalho, ou a
configuração de um trabalho autônomo. É requisito do contrato de
trabalho o empregado prestar serviços por conta alheia e não por
conta própria (MARTINS, 2005, p. 128).
Verifica-se, conforme citação, que a alteridade se faz na prestação de serviço
por conta alheia; não há qualquer risco do trabalhador.
Sobre a adesão, leciona Amauri Mascaro Nascimento que é um aspecto distintivo do
contrato de trabalho, no sentido de se constituir por mera adesão do trabalhador às
condições de trabalho instituídas pela empresa, quer pelo regulamento desta, quer
por imposição do Estado (NASCIMENTO, 2005, p. 509).
24
Observa-se, pelo exposto, que a adesão também é considerada como
elemento caracterizador do contrato de trabalho, em que o empregado adere às
condições de trabalho instituídas pela empresa.
No tocante à natureza contratual da relação de emprego, Francesco Santoro
Passarelli traz à baila que a relação é constituída exclusivamente do encontro das
duas vontades, do empregador e do empregado, lembrando, portanto, que a
disciplina depende de fontes estranhas ao contrato, como a lei, a norma coletiva e o
regulamento da empresa. Afirma o renomado doutrinador italiano que o contrato de
trabalho é considerado um contrato de adesão, dessa forma restringindo a vontade
de uma das partes, o empregado. Afirma ainda que os dois instrumentos, o contrato
coletivo e o contrato de adesão, operam juntos no ato constitutivo da relação de
trabalho, perdurando a vontade das partes na relação de emprego (PASSARELLI,
1973, p. 87).
Comutativo também é considerado característica do contrato de trabalho,
segundo Cláudio Mascarenhas Brandão, porque das obrigações contratuais para as
partes contratantes resultam obrigações equivalentes (BRANDÃO, 2000, p. 42).
Tal característica, conforme preceito acima mencionado, seria o salário pago
pelo empregador corresponde ao trabalho realizado pelo empregado.
2.3 REQUISITOS DO CONTRATO DE TRABALHO
Segundo César P. S. Machado Jr, são considerados como requisitos
essenciais de todo o contrato de emprego, a capacidade dos contratantes, objeto
lícito e a forma prescrita ou não defesa em lei. (MACHADO JUNIOR, 1999, p. 190).
2.3.1 Capacidade
No tocante à capacidade no contrato de trabalho, esclarece Arnaldo
Sussekind:
25
Cumpre não confundir a incapacidade para celebrar contrato de
trabalho com a representação ou a assistência que suprem a
vontade do absoluto ou relativamente incapaz. Até porque as normas
proibitivas visam à proteção social do incapaz. Assim por exemplo a
manifestação favorável de quem exerce o pater poder não manifestar
a proibição do trabalho do menor de 16 anos, salvo como aprendiz,
se tiver mais de 14. Contudo o Juiz de Menores poderá autorizar o
trabalho de menor de 18 anos em teatros, cinemas, boates e
estabelecimento análogos, assim como em circos, nas funções de
acrobata, saltimbanco, ginasta e semelhantes, desde que a sua
participação não prejudique a sua formação moral e seja
indispensável à sua subsistência ou à de seus pais, avós ou irmãos
(arts. 405. § 3°, a e b e 406 CLT) (SUSSEKIND, 2004, p. 243).
Observa-se, do apontado, que as normas proibitivas para o trabalho do
incapaz têm o escopo de proteção do mesmo. Aponta ainda que o menor de 16
(dezesseis) anos poderá trabalhar como aprendiz.
Cesar P. S. Machado Jr. ensina que a idade mínima para o trabalho é de 16
(dezesseis) anos; essa é a regra. O trabalhador entre 18 (dezoito) e 16 (dezesseis)
anos é relativamente capaz, e, por isso, deve ser assistido por seu responsável para
a realização do contrato de emprego, inclusive para a expedição da carteira de
trabalho, além de o art. 408 da CLT possibilitar, ao responsável, pleitear a rescisão
contratual, quando a prestação de serviços acarretar prejuízos físicos ou morais ao
menor (MACHADO JUNIOR, 1999, p. 190).
Vale destacar que a idade de 24 (vinte e quatro) anos para os aprendizes foi
ampliada com o advento da Medida Provisória n° 251 de 14/05/2005, convertida na
Lei n° 11.180 de 23/09/2005, que permite que os contratos, que antes eram
encerrados quando o jovem completava 18 (dezoito) anos, possam ser prorrogados.
2.3.2 Quanto ao Objeto
Quanto ao objeto, da mesma forma que o Código Civil, deve ser lícito. Ao
contratar alguém para trabalhar, a atividade do empregado não pode ser ilícita, sob
pena de tornar o contrato nulo. Esclarece sobre o assunto Amauri Mascaro
Nascimento, ao afirmar que, se o objeto da relação de emprego é ilícito ou imoral, a
consequência será a sua ineficácia (NASCIMENTO, 2005, p. 515).
Novamente, busca-se, nas palavras de Sérgio Pinto Martins:
26
O objeto direto do contrato de trabalho é a prestação de serviço
subordinado e não eventual do empregado ao empregador, mediante
o pagamento de salário. O trabalho autônomo prestado a uma
pessoa física ou jurídica não gera o contrato de trabalho, pois não há
o elemento subordinação (MARTINS, 2005, p. 127).
Tem-se, portanto, que o objeto do contrato de trabalho é a prestação de
serviços ou a mão-de-obra, de maneira subordinada e não eventual, de forma lícita,
prestada pelo trabalhador ao empregador.
2.3.3 Quanto à Forma
O contrato individual de trabalho prescinde de forma, que pode ser expressa
ou tácita, conforme aborda de forma concisa Arnaldo Sussekind:
Como já registramos, a forma prescrita ou não proibida em lei é
essencial à validade do ato jurídico. A legislação do trabalho, em
regra, não prescreve forma especial para a celebração do contrato
de trabalho. Ao contrário, estatui que o vínculo contratual nasce de
um acordo tácito ou expresso, podendo este ser verbal ou escrito
(art. 443 da CLT). Há, porém algumas exceções. É o que ocorre, por
exemplo, com o contrato de artistas e atletas profissionais ou de
tripulantes de embarcações marítimas, cuja legislação exige
instrumento escrito registrado no órgão competente, o contrato de
aprendizagem deve ser ajustado por escrito e por prazo não superior
a dois anos, devidamente registrado na Carteira de Trabalho do
menor (art. 428 da CLT); com o contrato a termo de que cogitam a
Lei n° 9601 de 1998, que pressupõe regulamentação por convenção
ou acordo coletivo aplicável à empresa contratante (SUSSEKIND,
2005, p. 244).
Colhe-se, do expedido anteriormente, que o contrato individual de trabalho
prescinde de forma, que pode ser expressa ou tácita. O expresso é aquele em que
as partes combinam uma execução, podendo ser dada oralmente ou por escrito.
Tácito quando não há manifestação de vontade; significa que se pode contratar um
empregado sem nunca precisar falar com ele.
Amauri Mascaro Nascimento, menciona que o ajuste tácito é caracterizado
pela inexistência de palavras escritas ou orais. É aquele depreendido em
decorrência de um comportamento, ou seja, a prestação de serviços de alguém,
sem oposição de outrem para quem é dirigida. Afirma ainda que tácito é o que não é
expresso, assim como explica a frase popular: “quem cala consente”. Explica
27
também que, dentre as restrições de direitos, exige-se forma específica e solene do
documento escrito, para prova de existência do contrato, ou de algumas cláusulas,
contratos escritos de trabalho temporário ou do estágio, do artista, de aprendizagem,
e, como exemplo de cláusulas contratuais, os de compensação da jornada de
trabalho (apud MACHADO JUNIOR, 1999, p. 193-194).
Tem-se, portanto, que as formas de constituição das relações de emprego
poderão ser expressas ou tácitas, subdividindo-se as expressas em orais ou
escritas.
2.3.4 Quanto à Duração
Quanto à duração, a relação contratual do trabalho classifica-se em contrato
por tempo indeterminado e contrato por tempo determinado, de acordo com a
declaração de Orlando Gomes e Elson Gottschalk:
A mais importante classificação do contrato de trabalho é a que se
funda na sua duração. [...] Como a própria denominação está a
indicar, o contrato de trabalho por tempo indeterminado é aquele em
que as partes, ao celebrá-lo, não estipulam a duração, não prefixam
o seu tempo extintivo. O contrato de trabalho por tempo determinado
é, ao contrário, aquele em que os contraentes, explícita ou
implicitamente, limitam sua duração, predeterminam seu fim. De
acordo com o costume universalmente adotado, a modalidade do
contrato por tempo indeterminado constitui a regra geral. É que a
indeterminação da duração deriva de um dos caracteres do contrato
de trabalho (GOMES; GOTTSCHALK, 2002, p. 158).
Ainda, referindo-se à duração, aponta Amauri Mascaro Nascimento que se
classifica por tempo indeterminado e por tempo determinado, entre ambas situandose a de temporada, nas quais o trabalho tem duração intermitente (NASCIMENTO,
2005, p. 529).
Conforme citação supra, observa-se que os contratos de trabalho também
são caracterizados quanto à duração, tendo como regra o contrato por tempo
indeterminado (conforme art. 403 da CLT), ou seja, aquele em que as partes não
predeterminam sua durabilidade.
28
2.4 TEORIAS SOBRE O CONTRATO DE TRABALHO
Há duas teorias conceituadas que regem o âmbito da relação trabalhista:
teoria contratualista e teoria anticontratualista. Segundo Sérgio Pinto Martins, tais
teorias têm o escopo de justificar o vínculo entre empregado e empregador na
relação de trabalho (MARTINS, 2005, p. 122).
2.4.1 Teoria Contratualista
A teoria contratualista, como o próprio nome identifica, considera como
contrato toda relação entre empregado e empregador, e é trazida por Amauri
Mascaro Nascimento, a seguir:
[...] o empregado é visto como alguém que vende o seu trabalho por
um preço pago pelo empregador que é o salário; a sociedade
(Chatelain, Villey etc.) porque há uma combinação de esforços em
prol de um objetivo comum, que é a produção; e o mandato,
(Troplong etc.) sendo o empregado o mandatário do empregador
(NASCIMENTO, 2005, p. 529).
Conforme mencionado, a teoria contratualista defende que a relação entre
empregado e empregador está ligada ao contrato porque ambas as partes são
agentes e sujeitos de direitos e obrigações. Aqui a vontade das partes é expressa,
causa principal que constitui o vínculo empregatício.
Sobre a teoria contratualista, leciona Jorge Luiz Souto Maior, afirmando que,
pela teoria contratual, mesmo com a limitação da vontade na formação das regras
contratuais, em virtude do forte dirigismo contratual, o ato essencial da vinculação
dá-se mediante o ajuste de vontade das partes, mesmo que tácito, demonstrando
dessa forma a natureza contratual do vínculo (MAIOR, 2000, p. 299).
Como se pode depreender, o contrato de trabalho surge como uma espécie
de contrato de compra e venda, em que o trabalhador vende seu trabalho e recebe
como preço a remuneração que lhe é de direito.
29
2.4.2 Teoria Anticontratualista
A segunda teoria é chamada de anticontratualista. Para esta corrente, é
imprescindível um ato de vontade do trabalhador para ser um dos pólos da relação
de trabalho, conforme esclarece Eduardo Gabriel Saad, que condena tal teoria e
abraça decididamente a teoria contratualista na relação de trabalho. Para ele, não
há harmonia com a dignidade da pessoa humana do trabalhador na teoria em que a
relação de trabalho não deriva de um contrato. Reúnem-se, nesta corrente, os que
negam a natureza contratual do vínculo entre empregado e empregador. O contrato
celebrado numa relação trabalhista é caracterizado, tão-somente, por uma
vinculação institucional (SAAD, 2000, p. 119).
Colhe-se, dos ensinamentos de Marcos Abílio Domingues, a análise sobre a
relação entre empregado e empregador:
O vínculo entre empregado e empregador surge com o engajamento
do primeiro no ambiente do trabalho. Este ato desencadeia a
aplicação do estatuto previamente representado pelo regulamento da
empresa e pelas leis estatais preexistentes, já pela teoria da
instituição, independente da vontade das partes, a relação é regulada
por um conjunto de regras que prevalece no meio social. Este
conjunto de regras que incide sobre a relação entre empregado e
empregador é a própria empresa, que se destaca como instituição
acima daqueles que a compõem, determinando um comportamento
padrão em torno do empreendimento (DOMINGUES, 2000, p. 15).
Conforme menção acima, para esta teoria é necessária a vontade do
trabalhador, negando, desta forma, a natureza contratual existente na relação entre
empregador e obreiro.
2.5 SUJEITOS DO CONTRATO DE TRABALHO
São sujeitos, no contrato de trabalho, o empregador e o empregado. Ambos
os sujeitos do contrato de trabalho possuem obrigações e direitos, e algumas
características pertinentes ao assunto serão abordadas nos próximos tópicos.
30
2.5.1 Empregado
O artigo 3° da CLT estabelece a definição para empregado: “Art. 3°
Considera-se empregado toda pessoa física que prestar serviços de natureza não
eventual a empregador, sob dependência deste e mediante salário” (BRASIL, 2008,
p. 873).
Na definição de Sérgio Pinto Martins: “Empregado é, portanto, a pessoa física
que presta serviços de natureza contínua a empregador, pessoalmente, sob
subordinação e mediante pagamento de salário.” (MARTINS, 2005, p. 63).
Tratar-se-á, adiante, dos requisitos do empregado, baseando-se nos
conceitos retroelencados.
2.5.1.1 Requisitos do Empregado
Alguns requisitos legais devem ser observados quando no tocante à definição
de empregado, conforme a CLT determina no art. 3°, mencionado anteriormente.
Portanto, são requisitos do empregado: pessoa física, onerosidade, pessoalidade,
subordinação e não-eventualidade, conforme segue:
2.5.1.1.1 Pessoa Física
É requisito indispensável para a caracterização do empregado, conforme
lecionam Orlando Gomes e Elson Gottschalk:
A Consolidação das Leis do Trabalho define-o como toda pessoa
física que prestar serviços de natureza não eventual a empregador,
sob a dependência deste e mediante salário. Só a pessoa natural
pode ser empregada. Uma pessoa jurídica não pode ter essa
qualidade. [...] As pessoas jurídicas, dada a sua natureza, são
incapazes de prestar um serviço. Como observa Passarelli, inábeis
para produzir próprio sob dependência de outra pessoa, as pessoas
jurídicas são absolutamente privadas da capacidade jurídica de
trabalho, e por isso não podem assumir a posição de devedoras de
31
trabalho subordinado. Para que alguém assuma a condição de
empregado, não há restrições decorrentes de sexo, de cor, do estado
civil, da idade, da graduação ou da categoria (GOMES;
GOTTSCHALK, 2002, p. 69).
Conforme citação supra, o empregado tem que ser pessoa física ou pessoa
natural, titular de direitos e deveres. Para o contrato de trabalho, faz-se necessário
que o empregado seja pessoa física.
2.5.1.1.2 Onerosidade
Outro requisito é a onerosidade, ou seja, a imposição de ônus. Novamente,
busca-se nas palavras de Amauri Mascaro Nascimento:
Assim, o empregado que originariamente teria como seus os frutos
do seu trabalho, pelo contrato de trabalho transfere essa titularidade
ao destinatário ou empregador, recebendo uma retribuição, daí o
caráter oneroso do trabalho regulamentado pelas normas jurídicas
trabalhistas. De um lado, a denominada alienação ou trabalho por
conta alheia, de outro lado, a remuneração ou salário pago porque
há essa alienação (NASCIMENTO, 2005, p. 595).
Outrossim, infere-se do apontado acima que onerosidade não é o fato de se
pagar o empregado, mas o direito que a pessoa tem de receber determinado ônus.
Essa característica se deve pelo direito que o empregado tem de receber a
retribuição pelo serviço que presta, ou seja, pelo trabalho desenvolvido.
2.5.1.1.3 Pessoalidade
Sobre a pessoalidade, Orlando Gomes diz ser uma das notas típicas da
prestação de trabalho, sendo inadmissível que outrem a realize, não podendo o
empregado prestar serviços por intermédio de outrem; só poderá ser substituído se
houver o consentimento do empregador. Lembra ainda que tal obrigação de prestar
serviços é, para o empregado, personalíssima e intransmissível (GOMES;
GOTTSCHALK, 2002, p. 71).
32
O indivíduo deve pessoalmente exercer os serviços, não podendo se fazer
representar por outra pessoa na prestação pessoal do serviço. César P. S. Machado
Junior adverte que:
O contrato de emprego, assim, é realizado de modo intuitu personae
com a pessoa do empregado, pelo que não são admitidas
substituições na pessoa que desenvolve seus serviços, salvo com a
autorização do seu empregador. Se o empregado é constantemente
substituído por outro, sem dúvida, o fato representará o nascimento
de outro contrato de emprego com o substituto e o empregador
(MACHADO JUNIOR, 1999, p. 117).
Observa-se, portanto, que o empregador conta com os serviços de certa e
determinada pessoa, e tais serviços não podem ser executados por outra pessoa
que não a contratada O contrato de trabalho é ajustado em função de determinada
pessoa, ou seja, intuitu personae.
2.5.1.1.4 Subordinação
A subordinação é o grande elemento diferenciador de uma relação de
emprego. Segundo Arnaldo Sussekind, o art. 3° da CLT, que traz o conceito de
empregado, alude à dependência, sem esclarecer se tal dependência é de caráter
econômico, social, técnico ou hierárquico. Afirma o autor que a subordinação
hierárquica, abordada mais adiante, resulta na subordinação jurídica inerente ao
empregado desde o momento da celebração do contrato de trabalho (SUSSEKIND,
2004, p. 216).
Neste sentido, afirma Eduardo Gabriel Saad:
A desobediência às normas fixadas pelo empregador caracteriza a
indisciplina ou a insubordinação, faltas graves devidamente
analisadas noutro local deste livro. O que ressaltamos, desde já, é
que tais irregularidades dão origem a sanções que vão da simples
advertência à despedida sem indenização. (SAAD, 2000, p. 183).
Colhe-se do expedido anteriormente que o obreiro deve obedecer às regras
determinadas pelo empregador, ou seja, daí extrai-se o requisito subordinação
existente na figura do empregado, que, se vier a desrespeitar tais imposições, estará
sujeito a sanções, que poderão ser aplicadas pelo empregador.
33
Vê-se ainda que o elemento caracterizador da subordinação decorre de a
pessoa trabalhar recebendo ordens.
Apontar-se-ão
algumas
espécies
de
subordinação
abordadas
pelos
doutrinadores. Dentre elas:
a) Subordinação Técnica - Explica Sérgio Pinto Martins: “A subordinação
técnica tem o sentido de que o empregado dependeria das determinações
técnicas do empregador, de como tecnicamente o trabalho deveria ser
desenvolvido. Assim estaria sob as ordens do empregador.” (MARTINS,
2005, p. 167).
Conforme citação supra, é uma ocorrência dada em que o empregado não
tem conhecimento técnico do serviço que vai executar e, por isso,
depende de orientação de seu empregador.
b) Subordinação Hierárquica - Sobre esse aspecto, colhem-se novamente as
palavras de Sérgio Pinto Martins: “A subordinação hierárquica significa a
situação do trabalhador na empresa, por se achar inserido no âmbito da
organização empresária, recebendo ordens de superiores e reportando-se
a essas pessoas.” (MARTINS, 2005, p. 168).
Assim, em decorrência de o empregado obedecer às ordens de seu
empregador ou de seus prepostos, fica caracterizada a subordinação
hierárquica.
c) Subordinação Econômica - Conforme Arnaldo Sussekind:
O instrumento jurídico, em virtude do qual o empregador contrata o
trabalho alheio, prescinde do estado de dependência econômica do
trabalhador àquele, para que haja relação de emprego. O empregado
poderá, inclusive, ser economicamente mais forte do que o seu
empregador, e nem por isso deixará de haver um contrato de
trabalho subordinado. A dependência econômica do operário ao
patrão foi um dos fundamentos históricos da legislação do trabalho
(SUSSEKIND, 2004, p. 217).
Soma-se aos conceitos a observação capitaneada por Paulo Emílio Ribeiro
de Vilhena: “A subordinação é, portanto, um quid, interceptado na conduta das
partes em um contrato de atividade e que, como suporte fático, fisionomiza esse
contrato de trabalho” (VILHENA, 1999, p. 471).
Pode-se concluir dos conceitos supraelencados que a subordinação, em seus
diversos aspectos, é uma característica inerente à relação de trabalho.
34
2.5.1.1.5 Não-Eventualidade
Não-eventualidade é o requisito do empregado trazido pela legislação
trabalhista brasileira, conforme menciona Amauri Mascaro Nascimento:
Já o empregado destina o seu trabalho de modo constante,
inalterável e permanente a um destinatário, de modo a manter uma
constância no desenvolvimento da sua atividade em prol da mesma
organização, suficiente para que um elo jurídico seja mantido,
resultante, muitas vezes, dessa continuidade (NASCIMENTO, 2005,
p. 598).
Portanto, não-eventualidade é o mesmo que dizer que o trabalhador exerce
suas funções de modo habitual, ou seja, frequentemente, permanente, de
continuidade.
2.6 EMPREGADOR
O art. 2° da CLT traz o conceito de empregador: “Art. 2° Considera-se
empregador a empresa, individual ou coletiva, que, assumindo os riscos da atividade
econômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de serviços” (BRASIL,
2008, p. 873).
A leitura do artigo acima citado define a conceituação de empregador como a
pessoa (física ou jurídica) que tiver interesse e capital disponível para aplicar em um
empreendimento, e, assumindo os riscos da atividade econômica, admitir, assalariar
e dirigir prestação pessoal de serviços.
Para Amauri Mascaro Nascimento:
Será empregador todo ente para quem uma pessoa física prestar
serviços continuados, subordinados e assalariados. É por meio da
figura do empregado que se chegará ao empregador,
independentemente da estrutura jurídica que tiver. (NASCIMENTO,
2007, p. 617).
Observa-se que o empregador é aquele que assume o risco da atividade
econômica. Mas existem empresas que não têm atividade econômica, como as
entidades beneficentes, ou sem fins lucrativos, ou os profissionais liberais, ou seja,
35
aquele que pode exercer sua profissão sem o auxílio de outrem, como o médico, o
advogado, o engenheiro, o contabilista etc.
Estabelece ainda o artigo 2° da CLT que:
Art. 2°, §2° Sempre que uma ou mais empresas, tendo, embora,
cada uma delas, personalidade jurídica própria, estiver sobre a
direção, controle ou administração de outra, constituindo grupo
industrial, comercial ou de qualquer outra atividade econômica,
serão, para os efeitos da relação de emprego, solidariamente
responsáveis à empresa principal e cada uma das subordinadas
(BRASIL, 2008, p. 873).
Nota-se, portanto, que existe uma garantia ao empregado de cobrar, tanto da
empresa principal como das subordinadas, quando elas pertencerem ao mesmo
grupo econômico, pois elas são solidariamente responsáveis. Neste aspecto, Sérgio
Pinto Martins resume:
É mister examinar se o grupo de empresas é o empregador único. A
teoria da solidariedade passiva entende que não, pois existe apenas
responsabilidade comum entre as empresas. A teoria da
solidariedade ativa entende que o empregador é um só (o grupo),
sendo que o empregado que trabalha para uma empresa presta
serviços para o grupo todo. Entendo que o § 2° do artigo 2° da CLT
consagra o empregador único. O grupo é o empregador. O
empregado pode ser transferido de uma empresa para outra do
grupo, contando o respectivo tempo de serviço em cada uma delas
(acessio temporis) (MARTINS, 2005, p. 64).
Vê-se que sendo o grupo econômico, este detém a responsabilidade
solidária, passando a figurar no direito do trabalho um único empregador.
2.6.1 Os Poderes do Empregador
A relação de subordinação do empregado decorre de alguns poderes
inerentes ao empregador, ou seja, estão ligados ao poder de direção do
empregador.
Na visão de César P. S. Machado Junior, tão importante quanto à definição
de empregador, ou até mais, é a análise de seu poder diretivo, uma vez que o art. 2°
da CLT é claro ao definir o empregador como aquele que dirige a prestação de
serviços. Para o autor, tais poderes são considerados como a parte ativa da
subordinação (MACHADO JUNIOR, 1999, p. 150).
36
Tem-se, portanto, que os poderes de direção são a faculdade atribuída ao
empregador de determinar o modo da atividade do empregado que, em decorrência
do contrato de trabalho, deve ser exercida. Há um fundamento legal, no art. 2° da
CLT, citado anteriormente, que define o empregador como aquele que dirige a
prestação pessoal dos serviços de seus empregados.
Os poderes de direção do empregador são divididos em três: o de
organização, de controle e disciplinar, que serão demonstrados a seguir.
2.6.2 Poder de Organização do Empregador
É a faculdade de o empregador organizar a sua atividade e os fins
econômicos visados pelo empreendimento.
Para Eduardo Gabriel Saad, “Em conceito mais amplo, o poder de direção do
empregador é o conjunto de umas tantas faculdades jurídicas que lhe permite
organizar econômica e tecnicamente a empresa.” (SAAD, 2000, p. 149).
Observa-se então o poder de organização inerente ao empregador, aquele
que vai organizar a forma de produzir, de comprar, de vender de operacionalizar etc.
O empregador determina a estrutura jurídica a ser adotada pela empresa. O
empregador organiza as funções dos empregados e dispõe o regulamento da
empresa contendo normas disciplinares, a que se sujeitarão os empregados.
Novamente, busca-se nas palavras de Sérgio Pinto Martins:
O empregador tem todo direito de organizar seu empreendimento,
decorre até mesmo do direito de propriedade. Estabelecerá o
empregador qual a atividade que será desenvolvida: agrícola,
comercial, industrial, de serviços, etc. A estrutura jurídica também
será determinada pelo empregador, que estabelecerá o melhor
desenvolvimento de suas atividades mediante sociedade limitada,
por ações, etc. O empregador determinará o número de funcionários
de que precisa, o cargo, funções, local e horário de trabalho, etc.
Dentro do poder de organização, encontraremos a possibilidade de o
empregador regulamentar o trabalho, elaborando o regulamento da
empresa (MARTINS, 2005, p. 227).
Conforme citação supra, nota-se o poder de organização existente na pessoa
do empregador, porém é válido ressaltar que tal poder não poderá sobrepor os
limites impostos pela lei. Para proteger o empregado, há uma crescente limitação
37
imposta por leis, convenções coletivas e sentenças normativas que restringem o
poder do empregador.
2.6.3 Poder de Controle do Empregador
O poder de controle também é considerado forma de poder de direção do
empregador. Em sua definição de empregador como sujeito do contrato de trabalho,
Arnaldo Sussekind (2004, p. 191) afirma que empregador é aquele que dirige a
prestação de serviços de um ou mais trabalhadores, numa relação jurídica, em que
estes ficam subordinados ao seu poder de comando, poder este adquirido junto ao
risco da atividade para que foram contratados.
Sobre o poder de controle, assinala Sérgio Pinto Martins:
O empregador tem o direito de fiscalizar e controlar as atividades de
seus empregados. Os empregados poderão ser revistados no final
de expediente. A revista do empregado é uma forma de salvaguarda
do patrimônio da empresa. Não poderá ser a revista feita de maneira
abusiva ou vexatória, ou seja, deverá ser moderada. Vedada será a
revista que violar a intimidade do empregado (art. 5°, X, da
Constituição), além do que ninguém será submetido a tratamento
desumano ou degradante (art. 5°, III, da Lei Magna). A revista não
pode ser realizada em local não apropriado e na presença de
clientes, pois se torna vexatória (SUSSEKIND, 2005, p. 227).
Conforme citação supra, o poder de controle se dá no que diz a respeito à
fiscalização da atividade do empregado, isto é, o controle exercido na atividade do
empregado, como ao fiscalizar a entrada do empregado com revista na portaria,
monitoramento de setores, monitorar atividades do empregado no computador,
marcação de cartão de ponto etc. Justifica-se, uma vez que, sem controle, o
empregador não pode ter ciência de que, em contrapartida ao salário que paga,
recebe os serviços dos empregados. No entanto, o controle terá que ser moderado,
respeitoso, suficiente para que os seus objetivos sejam atingidos, sem se tornar
absurdo e abusivo da dignidade do trabalhador e sempre dentro dos limites
determinados pela lei.
38
2.6.4 Poder Disciplinar do Empregador
Na visão de Eduardo Gabriel Saad, “No uso do poder disciplinar, o
empregador pune os trabalhadores que cometem faltas previstas em lei, em pacto
coletivo ou no contrato de trabalho.” (SAAD, 2000, p. 149).
Nota-se que algumas regras foram adotadas devido às jurisprudências e
outros julgados: perempção de faltas antigas; relação de causalidade entre a falta e
a sanção; relação direta entre a falta e o ambiente de trabalho; a proibição da
despedida injuriosa; a gravidade da justa-causa; a vedação de punir com o
retrocesso; a prescrição das multas como forma de sanção; proporcionalidade entre
a falta e a sanção (o tipo de punição disciplinar é aberto, isto é, varia de empregador
para empregador, de local para local, de empresa para empresa. A punição deve ter
proporcionalidade; a proibição, dosagem da pena pelo juiz.
Sérgio Pinto Martins afirma sobre o poder disciplinar:
O poder de punição do empregador deve ser exercido com boa-fé. O
objetivo da punição deve ser pedagógico, de mostrar ao funcionário
que está errado e que não deve cometer novamente a mesma falta.
O uso do poder de punição por parte do empregador em desacordo
com suas finalidades implica excesso ou abuso de poder. É claro que
o Poder Judiciário poderá controlar a pena aplicada pelo
empregador, como ocorreria se o empregado não tivesse cometido a
falta ou a falta fosse inexistente (MARTINS, 2005, p. 229).
Conforme citação anterior considera-se poder disciplinar o poder do
empregador de impor sanções disciplinares aos seus empregados, sem afastar-se
do objetivo maior de aprendizagem, para que faltas cotidianas, dentro do contrato de
trabalho, não voltem a ser cometidas.
Para Délio Maranhão, o poder disciplinar do empregador decorre porque o
empregador organiza uma atividade econômica, e não pelo fato de estabelecer
determinada relação jurídica com determinado empregado. Desta relação, decorre a
sujeição do empregado ao empregador, ao poder disciplinar que o domina
(MARANHÃO, 1971, p. 60).
O professor italiano Francesco Santoro Passarelli leciona que o poder
disciplinar estabelece o critério da proporção entre a sanção e a infração. Tal poder
diretivo será aplicado segundo a gravidade da infração, quando violar qualquer um
39
dos deveres de comportamento do empregado: da obrigação de trabalho, da
obrigação de fidelidade e do dever de obediência (PASSARELLI, 1973, p. 137).
Soma-se aos conceitos retroelencados a observação capitaneada por Cláudio
Mascarenhas Brandão, sobre os poderes diretivos e disciplinares do empregador,
afirmando que o presente poder decorre da relação hierarquizada, característica do
contrato de trabalho, poder este inerente ao empregador, que possui autonomia para
aplicar sanções em decorrência da violação, praticada pelo empregado, das
obrigações que decorrem do contrato firmado (BRANDÃO, 2000, p. 68).
Conclui-se, portanto, que tais poderes servem para auxiliar o empregador
frente à prestação de serviços de seus empregados, caracterizando sua função
diretiva na relação de emprego.
Abordados os principais temas acerca do contrato de trabalho e suas
peculiaridades, não restam dúvidas de que a relação existente entre empregado e
empregador deverá ser pautada no respeito, ética e bom senso de ambas as partes.
Para isso, existem os princípios, que visam cumprir a função do direito. Para maior
entendimento da questão, passar-se-á a estudá-los no capítulo que segue.
40
3 PRINCÍPIOS GERAIS E ESPECÍFICOS APLICÁVEIS AO DIREITO DO
TRABALHO
O presente capítulo busca apresentar os princípios norteadores do direito
laboral e suas peculiaridades.
De acordo com Eduardo Gabriel Saad, princípios são considerados idéias
fundamentais e informadoras da ordem jurídica. Alguns, tutelados pela Constituição,
integram os direitos e garantias fundamentais de toda pessoa, como a dignidade, a
liberdade, a igualdade, a honra etc. (SAAD, 2000, p. 64).
Sobre os princípios, determina a CLT:
Art. 8° As autoridades administrativas e a Justiça do Trabalho, na
falta de disposições legais ou contratuais, decidirão conforme o caso,
pela jurisprudência, por analogia, por equidade e outros princípios de
direito, principalmente do direito do trabalho, e, ainda, de acordo com
os usos e costumes, o direito comparado, mas sempre de maneira
que nenhum interesse de classe ou particular prevaleça sobre o
interesse público (BRASIL, 2008, p. 783).
Conforme artigo anterior, os dispositivos na lei determinam que, na falta de
disposições legais, as questões trabalhistas podem ser resolvidas segundo os
princípios gerais do direito, bem como do direito do trabalho, ficando assim
solucionada qualquer dúvida que surja no tocante à eficácia normativa dos princípios
reconhecidos pelo ordenamento jurídico pátrio.
Os princípios constitucionais do direito do trabalho dividem-se em gerais e
específicos.
Daí a classificação dos princípios em univalentes, aplicáveis a todas
as ciências, como o princípio da identidade – o ser é, o não-ser não
é; princípios plurivalentes, aplicáveis em algumas ciências, como o
princípio da causalidade, das ciências físicas; e o princípio da
imputabilidade, das ciências sociais; princípios monovalentes, que
são os princípios de uma ciência jurídica; e os princípios setoriais,
que são os de um ramo da ciência, podendo-se usar, também, a
expressão para designar os princípios próprios de um setor
(NASCIMENTO, 2008, p. 106).
Tem-se, portanto, que os princípios constitucionais gerais do direito do
trabalho são aqueles aplicáveis a todo direito, e os princípios constitucionais
específicos aplicados somente ao direito do trabalho.
41
3.1 PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS GERAIS
Sobre os princípios constitucionais gerais, Luis de Pinho Pedreira da Silva
aborda que existem duas espécies de princípios jurídicos: os gerais de direito e os
princípios especiais de uma disciplina jurídica. Aponta ainda que, em relação aos
princípios, existem os expressos, aqueles que estão positivados, ou seja, que
podem ser encontrados no sistema jurídico; e os princípios gerais não expressos ou
tácitos, ou seja, aqueles formulados pelo próprio intérprete (SILVA, 1999, p. 15).
Portanto, de acordo com a citação supra, os princípios constitucionais gerais
do direito devem ser aplicados no âmbito do direito do trabalho. Tais princípios têm
força de fonte do direito do trabalho.
Ainda nessa esteira, colhe-se o entendimento de Sérgio Pinto Martins de que
determinados princípios de Direito Civil são aplicáveis no Direito do Trabalho,
lembrando que os princípios de contrato fazem lei entre as partes, decorrendo disso
o pacta sunt servanda, que significa que os acordos devem sem cumpridos. Lembra
ainda do princípio da exceptio non adimpleti contractus (NASCIMENTO, 2005, p.
95).
Conforme apontado anteriormente, nenhum dos contratantes pode exigir o
implemento de sua obrigação antes de cumprir sua parte no pactuado. Certo afirmar
que há valores que pertencem a todos os ramos do direito, como, por exemplo, o
respeito à dignidade da pessoa humana, a boa-fé nos contratos, a proibição do
abuso de direito, o enriquecimento sem causa, a função social do direito, entre
outros.
Além dos princípios constitucionais gerais do direito, ressaltam-se os
princípios constitucionais do direito do trabalho absolutos ou relativos. São normas
próprias do direito do trabalho, conforme especificação dos arts. 7° 8° e 9° da CF,
que dizem respeito ao direito individual e ao direito coletivo, conforme segue:
a) Direito à liberdade sindical: “Art. 8°: É livre a associação profissional ou
sindical [...].” (BRASIL, 2008, p. 12).
b) Direito à greve: “Art. 9°: É assegurado o direito de greve, competindo aos
trabalhadores decidir sobre a oportunidade de exercê-lo e sobre os interesses
que devam por meio dele defender”. (BRASIL, 2008, p. 12).
42
c) Direito à proteção contra dispensa arbitrária: “Art. 7°, II: São direitos dos
trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua
condição social: [...] II – seguro-desemprego, em caso de desemprego
involuntário” (BRASIL, 2008, p. 12).
Observa-se, portanto, que, de modo geral, alguns princípios gerais do direito
e outros específicos do trabalho têm aplicação no direito do trabalho e nas diferentes
questões que suscita. Alguns são princípios e garantias asseguradas a toda pessoa,
mas que protegem, também, aquelas que figuram nas relações individuais e
coletivas de trabalho.
Conclui-se, portanto, que os princípios gerais são aplicáveis a todo ramo do
direito, aplicados então no direito do trabalho, para maior garantia da organização
das normas jurídicas.
3.1.1 Princípio Constitucional da Não-Discriminação
Sobre o princípio constitucional da não-discriminação, Arnaldo Sussekind
afirma:
O princípio da não-discriminação, que proíbe diferença de critério de
admissão, de exercício de funções e salário por motivo de sexo,
idade, cor ou estado civil (art. 7°, XXX), ou de critérios de admissão e
de salários em razão de deficiência física (art. 7° XXXI) e, bem
assim, que se distinga, na aplicação das normas gerais, entre os
respectivos profissionais (art. 7°, XXXII). Este princípio, consagrado
pelo Direito Internacional, deve, entretanto, ser aplicado tendo em
conta que não fere a isonomia tratar-se desigualmente situações
desiguais (SUSSEKIND, 2004, p. 115).
Observa-se, da citação acima, que o princípio da não-discriminação está
intimamente ligado com o princípio constitucional da igualdade, aquele que assegura
a igualdade entre as pessoas independentemente das suas condições; ser tratado
com igualdade é uma garantia constitucional. O direito do trabalho, que tanto se
preocupa com as condições do trabalhador, não seria diferente. Tal princípio, assim
como tantos outros, acompanham o empregado em seu contrato de trabalho, dando
mais segurança e garantia de um tratamento digno.
Colhe-se ainda das palavras de Arnaldo Sussekind que tal princípio, que
proíbe a diferença nos critérios de admissão do empregado, de exercício de funções
43
e de salário por motivo de sexo, idade cor ou estado civil (art. 7° XXX), ou critério de
admissão e de salário em razão de deficiência física (art. 7° XXXI), visa protegê-lo e
garantir seu direito de igualdade (SUSSEKIND, 1999, p 154).
Tem-se, portanto, que o princípio constitucional da não-discriminação pautase pela igualdade das pessoas independentemente de suas características
pessoais, ou seja, todos deverão ser tratados com respeito.
3.1.2 Princípio da Tipificação Legal de Ilícitos e Penas
Certos atos são considerados como justificadores da rescisão do contrato de
trabalho existente entre empregador e empregado.
Cláudio Mascarenhas Brandão aborda que a lei não enumera as penalidades
que podem ser aplicadas ao empregado, mas a doutrina e a jurisprudência contam a
advertência, a suspensão e a dispensa por justa causa, sendo considerada a forma
mais grave esta última. Lembra o juiz trabalhista que a advertência é aplicada nos
casos de menor gravidade, a suspensão, cabível nas hipóteses de maior gravidade,
corresponde à suspensão da atividade imposta ao empregado, por determinado
período, com perda da remuneração respectiva e exclusão do tempo de serviço do
trabalhador. Explica, por fim, que a despedida por justa causa equivale à extinção do
contrato por ato faltoso do empregado (BRANDÃO, 2000, p. 69).
Os artigos 482 e 483 da CLT enumeram as situações que consitituem motivos
para a rescisão do contrato de trabalho, tanto pelo empregador como pelo
empregado. São elas:
Art. 482 Constituem justa causa para rescisão do contrato de
trabalho pelo empregador:
a) Ato de improbidade;
b) Incontinência de conduta ou mau procedimento;
c) Negociação habitual por conta própria ou alheia sem permissão
do empregador, e quando consistir ato de concorrência à
empresa para a qual trabalha o empregado, ou for prejudicial ao
serviço;
d) Condenação criminal do empregado, passada em julgado, caso
não tenha havido suspensão da execução da pena;
e) Desídia no desempenho das respectivas funções;
f) Embriaguez habitual ou em serviço;
g) Violação de segredo da empresa;
h) Ato de indisciplina ou insubordinação;
44
i)
j)
Abandono de emprego
Ato lesivo da honra ou boa fama praticado no serviço contra
qualquer pessoa, ou ofensas físicas, nas mesmas condições,
salvo no caso de legítima defesa, própria ou de outrem;
k) Ato lesivo da honra ou boa fama ou ofensas físicas praticadas
contra o empregador e superiores hierárquicos, salvo em caso de
legítima defesa, própria ou de outrem;
l) Práticas constantes de jogos de azar.
Parágrafo único. Constitui igualmente justa causa para dispensa de
empregado a prática, devidamente comprovada em inquérito
administrativo, de atos atentatórios de segurança nacional (BRASIL,
2008, p. 909).
Observa-se, pelo apontado, que é permitida a rescisão do contrato do
trabalho por justa causa, por parte do empregador, decorrente de atos faltosos do
empregado, justificando assim o fim do contrato. São possíveis penalidades
aplicáveis às partes no contrato de trabalho.
Art. 483. O empregado poderá considerar rescindido o contrato e
pleitear a devida indenização quando:
a) Forem exigidos serviços superiores às suas forças, defesos por
lei, contrários aos bons costumes, ou alheios ao contrato;
b) For tratado pelo empregador ou seus superiores hierárquicos
com rigor excessivo;
c) Correr perigo manifesto de mal considerável;
d) Não cumprir o empregador as obrigações do contrato;
e) Praticar o empregador ou seus prepostos, contra ele ou pessoas
de sua família, ato lesivo da honra e boa fama;
f) O empregador ou seus prepostos ofenderem-no fisicamente,
salvo em caso de legítima defesa, própria ou de outrem;
g) O empregador reduzir seu trabalho, sendo este por peça ou
tarefa, de forma a afetar sensivelmente a importância dos
salários.
§ 1°. O empregado poderá suspender a prestação dos serviços ou
rescindir o contrato quando tiver de desempenhar obrigações legais,
incompatíveis com a continuação do serviço.
§ 2°. No caso de morte do empregador constituído em empresa
individual, é facultado ao empregado rescindir o contrato de trabalho.
§3°. Nas hipóteses das letras d e g, poderá o empregador pleitear
rescisão de seu contrato de trabalho e o pagamento das respectivas
indenizações, permanecendo ou não no serviço até final decisão do
processo (BRASIL, 2008, p. 909).
Observa-se que, da mesma forma, poderá o empregado rescindir o contrato
de trabalho por justa causa, caso haja a prática de faltas graves previstas em lei.
Poderá o empregado pleitear as indenizações que lhe são de direito. Trazem o
presente artigo as causas que ensejam a rescisão do contrato de trabalho de forma
atípica, ou seja, a partir da vontade do empregado.
No ponto de vista do doutrinador Maurício Godinho Delgado:
45
Tal princípio é adotado fundamentalmente na fixação das figuras de
justas causas obreiras e empresariais (ilustrativamente, arts. 482 e
483 CLT) e em algumas penalidades legalmente previstas, em
especial suspensão e dispensa por justa causa (se não quiser
mencionar também, neste rol, a rescisão contratual indireta).
Contudo a aplicabilidade do princípio não é absoluta no ramo
justrabalhista: a penalidade de advertência, por exemplo, não se
encontra prevista na CLT. Trata-se de punição essencialmente criada
pelo costume trabalhista e não pela legislação heterônoma estatal
(poucos diplomas legais referem-se à advertência ou admoestação
verbal ou escrita: como exceções houve a antiga Lei de Greve, n.
4.330/64, e há a mais recente Lei n. 8.630/93, que trata do trabalho
em portos e capitanias) (DELGADO, 2007, p. 194).
Têm-se, portanto, que, como o princípio da tipificação legal de ilícitos e penas
não é um princípio de aplicação absoluta no direito do trabalho, ou seja, não é uma
regra considerada absoluta, tendo em vista que certas penalidades, como a
advertência, por exemplo, não são regras positivadas nos dispositivos legais, as
aplicações referentes ao presente princípio nada mais são do que uma prática
costumeira no direito do trabalho.
3.1.3 Princípio Constitucional do Duplo Grau de Jurisdição
O presente princípio é garantido na CF, que determina que “Art. 5°, LV – aos
litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são
assegurados o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela
inerentes (BRASIL, 2008, p. 10).
Sobre o princípio do duplo grau de jurisdição, Renato Saraiva versa que este
princípio impõe a obrigatoriedade de duas ou mais instâncias, judiciais ou
administrativas, conforme o caso específico, que garantam às partes a devolução da
matéria apreciada à instância superior (SARAIVA, 2007, p. 41).
Conforme apontado, surge do presente princípio a possibilidade de reexame
e reapreciação da sentença definitiva, realizada pela instância superior, mediante
recurso da decisão do órgão de instância inferior.
46
3.1.4 Princípio Constitucional da Dignidade da Pessoa Humana
O princípio da dignidade da pessoa humana está assegurado na CF de 1988:
Art. 1° A República Federativa do Brasil, formada pela União
indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constituise em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:
[...]
III- a dignidade da pessoa humana (BRASIL, 2008, p. 10).
A dignidade da pessoa humana é fundamento da República Federativa do
Brasil, trazendo a idéia de que o Estado determina que todos sejam tratados de
forma digna, independente de quem seja. No ponto de vista de Eneida Melo Correa
de Araújo:
É importante para o Estado que o homem tenha trabalho e que
realize com respeito a sua dignidade e cidadania. Outrossim, o
resultado dessa atividade possibilita o bem-estar, a segurança e a
sobrevivência do trabalhador e daqueles que dele diretamente
dependem. Atende ainda ao progresso econômico (ARAÚJO, 2003,
p. 36).
No mesmo sentido, relata Maurício Godinho Delgado que a Constituição
Federal de 1988 traz, dentre seus inúmeros preceitos, uma disposição de suas
normas de maneira a iniciar pela dignidade da pessoa humana, firmando deste
modo princípios basilares para o ordenamento jurídico (DELGADO, 2007, p. 76).
Englobam-se neste princípio valores essenciais para a vida humana,
reportando deste modo a comandos diretores fundamentais para as relações entre
sujeitos de direto, agregados ao princípio da razoabilidade/proporcionalidade e ao
princípio da boa-fé.
Novamente, busca-se, nas palavras de Américo Plá Rodriguez, que o
contrato de trabalho pressupõe atividade humana prolongada ao longo do tempo.
Eis, portanto, a necessidade da dignidade procedente da natureza humana, devendo
se primar pelo elemento puramente intelectual e especulativo, como pode ser o texto
de um contrato (RODRIGUEZ, 1978, p. 227).
Conforme se observa das considerações acima elencadas, o presente
princípio está intimamente ligado com o tema central deste trabalho, tendo em vista
que a agressão advinda do assédio moral fere a dignidade da pessoa humana,
conforme exposto neste tópico.
47
3.2 PRINCÍPIOS ESPECÍFICOS DO DIREITO DO TRABALHO
Segundo Alfredo J. Ruprecht, os princípios que norteiam o direito do trabalho
estabelecem as diretrizes para a justa aplicação do direito, não impedindo que tais
princípios sejam utilizados como meios interpretativos, embora não seja essa a sua
principal função (RUPRECHET, 1995, p. 5).
Nota-se, portanto, que princípios específicos têm o escopo de proteger o
trabalhador, tendo em vista a condição de desvantagem em que se encontra, frente
a outro polo do contrato de trabalho, o empregador, que tem consigo os poderes de
direção, apontados no capítulo anterior deste trabalho. Afinal, esse é o real sentido
do direito do trabalho: a tutela dos direitos do trabalhador (RODRIGUEZ, 1978, p.
34).
O presente trabalho adotará os princípios elencados por Américo Plá
Rodriguez, um dos principais doutrinadores acerca do tema. Para ele, dentre os
princípios do direito do trabalho, há o princípio da proteção, que se subdivide em
três: in dubio pro operario, aplicação da norma mais favorável e aplicação da norma
mais benéfica; princípio da irrenunciabilidade dos direitos; princípio da continuidade
da relação de emprego; princípio da primazia da realidade, princípio da
razoabilidade e princípio da boa-fé, sendo o último abordado no tópico anterior.
Também serão abordados os princípios do maior rendimento, princípio da economia
e celeridade, o princípio da indisponibilidade dos direitos trabalhistas, bem como o
princípio da não alteração contratual, princípios estes também encontrados na
doutrina acerca do assunto (RODRIGUEZ, 1978, p. 23).
3.2.1 Princípio da Proteção
Sobre o princípio da proteção, declara com proficiência Eneida Melo Correia
de Araújo:
O princípio da Proteção ao Trabalhador é o mais importante dos
princípios do Direito do Trabalho. Configura-se em um postulado
48
universal de natureza trabalhista, posto que orientou a criação desse
ramo jurídico em todos os países democráticos. Parte do
pressuposto de que as partes celebrantes do contrato de trabalho
acham-se em posição de desigualdade jurídica, haja vista que são
diferentes economicamente, fazendo-se necessário criar normas
capazes de mitigar esse desequilíbrio (ARAÚJO, 2003, p. 182).
Partindo da citação acima, considera-se o presente princípio uma forma de
compensar a superioridade econômica do empregador em relação ao empregado,
trazendo maior equilíbrio entre as partes contratantes.
Sobre esse aspecto, ensina Amauri Mascaro Nascimento que o princípio da
proteção foi criado pelo direito do trabalho, cumprindo um importante papel para
aspectos relativos aos direitos de personalidade da pessoa que trabalha
subordinadamente numa organização alheia e como forma de compensar a
inferioridade em que se encontra o empregado no contrato de trabalho, pela sua
posição de dependência ao empregador, precisando assim a tutela jurídica (PLÁ
RODRIGUEZ apud NASCIMENTO, 2008, p.110).
Considera-se, então, que o princípio da proteção é de igualar os desiguais,
trazendo um equilíbrio entre as partes contratantes.
Segundo a teoria de Américo Plá Rodriguez, o princípio da proteção,
desmembra-se em três outros princípios, sendo eles: in dubio pro operario, que
significa que, na dúvida, o julgador deverá pender para o operário; deve prevalecer a
norma mais favorável ao trabalhador, sendo necessária a preservação da condição
da norma mais benéfica ao trabalhador, teoria esta do direito adquirido.
Ainda sobre o princípio da proteção, destaque para os ensinamentos de Luis
de Pinho Pedreira da Silva, que esclarece que:
O motivo dessa proteção é a inferioridade do contratante amparado
em face do outro, cuja superioridade lhe permite, ou a um organismo
que o represente, impor unilateralmente as cláusulas do contrato,
que o primeiro não tem a possibilidade de discutir, cabendo-lhe
aceitá-las ou recusá-las em bloco (SILVA, 1999, p. 23).
Diante desse quadro, observa-se que há uma condição em que o candidato
ao emprego não tem a possibilidade de negociar as condições do contrato do
trabalho, e tal condição se estende sobre todo o período da relação laboral, e disso
decorre um desequilíbrio entre as partes contratantes.
Inerente ao contratante estão os poderes diretivos já discutidos no capítulo
anterior, daí a função do princípio da proteção, que tem o escopo de trazer tal
equilíbrio necessário.
49
Traz à baila alguns aspectos ensejadores sobre o princípio da proteção
Renato Saraiva, ao declarar que o presente princípio não significa que o juiz do
trabalho instituirá privilégios processuais ao trabalhador, tratando-o de forma
desigual da parte contrária. O magistrado apenas respeitará os preceitos legais
trabalhistas vigentes, que visam proteger o obreiro hipossuficiente, respeitando o
princípio da igualdade das partes, garantindo desta forma a isonomia em relação ao
empregador, ou seja, tratamento igual aos iguais e desigual aos desiguais, na
medida das suas desigualdades (SARAIVA, 2007, p. 46).
Traz Américo Plá Rodriguez o princípio da proteção como referência ao
critério fundamental que orienta o direito do trabalho, inspirando-se num propósito de
igualdade, amparando de um modo preferencial o trabalhador, sendo assim o
sentido de proteção para tentar “equilibrar” a balança, diminuindo a desigualdade
entre as partes, função esta primordial do direito (RODRIGUEZ, 1978, p. 27).
Lembra o doutrinador que o legislador não poderia manter a ficção de
igualdade das partes no contrato de trabalho e, deste modo, inclinou-se para uma
compensação de desigualdade econômica desfavorável ao trabalhador com uma
proteção jurídica a ele favorável. Lembra ainda, de modo humano, que o propósito
fundamental do direito do trabalho é nivelar as desigualdades.
3.2.1.1 Princípio In Dubio pro Operario
Arnaldo Sussekind leciona sobre o princípio in dubio pro operario:
O princípio in dubio pro operario, que aconselha o intérprete a
escolher, entre duas ou mais interpretações viáveis, a mais favorável
ao trabalhador, desde que não afronte a nítida manifestação do
legislador, nem se trate de matéria probatória (SUSSEKIND, 2004, p.
113).
Baseado no registro acima, prega tal princípio que, no caso em que houver
dúvida, a decisão deverá pender mais para o trabalhador.
Ainda segundo o doutrinador, diante de várias interpretações dadas à
determinada norma jurídica, ou se houver dúvida referente à sua interpretação,
poderá o juiz interpretar de forma mais favorável ao trabalhador, cumprindo assim o
caráter tutelar do direito do trabalho.
50
Em contraposição, Sérgio Pinto Martins afirma que tal princípio não se aplica
integralmente ao processo do trabalho, tendo em vista que deverá o julgador,
quando houver dúvida, decidir a favor do trabalhador, mas verificar quem tem o ônus
da prova no caso concreto, de acordo com as especificações do art. 333 do CPC e
do art. 818 da CLT (MARTINS, 2005, p. 97).
Art. 333 CPC. O ônus da prova incumbe:
I – ao autor, quando ao fato constitutivo do seu direito;
II – ao réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou
extintivo do direito do autor.
[...]
Art. 818 CLT. A prova das alegações incumbe à parte que as fizer
(BRASIL, 2009, p. 947).
Referindo-se à aplicação do in dubio pro operario, Jorge Luiz Souto Maior
(2000, p. 295) leciona que sua aplicação não tem conotação processual, ou seja,
não deve servir para que disponha ao empregado um direito que ele não possua,
pois o processo deve ser suficiente para proporcionar-lhe o que é de seu direito.
Afirma ainda que o juiz não deve julgar com dúvida.
Conforme registro anterior, havendo dúvida sobre algum aspecto referente a
uma relação de trabalho, havendo falta de prova específica, manda que prevaleça a
presunção que for mais favorável ao trabalhador. Se o trabalhador precisar fazer
prova de seu vínculo na empresa, e o empregador admitir que o empregado
trabalhou, mas só como prestador de serviços, há presunção de que ele era
empregado.
3.2.1.2 Princípio da Norma Mais Favorável
Para Eduardo Gabriel Saad, quando houver várias normas jurídicas aplicáveis
a uma mesma situação, prefere-se aquela mais favorável ao trabalhador (SAAD,
2000, p. 65).
Lembra o doutrinador que este princípio muito se relaciona com o princípio
apontado anteriormente, o in dubio pro operario.
Segundo ele, havendo conflito de interesses, terá aplicação a norma que
atenda melhor aos interesses do empregado. Este princípio é aplicado na
elaboração de novas leis, na hierarquia e no ato interpretativo. Quanto à elaboração,
51
as novas leis devem dispor no sentido de aperfeiçoar o sistema, favorecendo o
trabalhador, e só nos casos excepcionais afastar-se deste sentido. As leis
trabalhistas devem contribuir para a melhoria da condição social do trabalhador.
O princípio do favor laboratoris, no direito processual do trabalho, se
compreendido como princípio de elaboração desse direito, é viável,
uma vez que existem, efetivamente, normas na estrutura do
processo trabalhista que visam compensar a inferioridade econômica
do trabalhador, que acaba por se refletir na sua condição de parte no
processo. Reflexos estão no arquivamento do processo, quando o
empregado não comparece à audiência, diferente da penalidade que
sofre o empregador ausente, que é a condenação à revelia; no ônus
da prova, segundo a doutrina e a jurisprudência, mais acentuado
para o empregador; por ser quem se ache mais bem aparelhado para
a produção das provas; na intervenção do juiz para verificar a
verdade. Bastam estes aspectos para mostrar que há uma aplicação
estrutural do princípio da norma mais favorável no processo
trabalhista, mas não a ponto de estabelecer um desequilíbrio capaz
de afetar o princípio da igualdade das partes, básico no processo,
mesmo porque não se pode confundir direito material (direito do
trabalho) com direito processual (direito processual do trabalho)
(NASCIMENTO, 2008, p. 110).
Conforme leciona o doutrinador supracitado, o presente princípio, assim como
outros referidos neste capítulo, encontra-se na função compensadora de diminuir a
diferença existente entre as partes na relação laboral, cumprindo dessa forma o
papel do direito em trazer o equilíbrio entre as partes.
3.2.1.3 Princípio da Condição Mais Benéfica
Estabelece o princípio em comento, também conhecido como princípio do
direito adquirido, que uma vantagem já adquirida não pode ser reduzida; devem-se
respeitar os direitos adquiridos, conforme leciona Sérgio Pinto Martins:
A condição mais benéfica ao trabalhador deve ser entendida como o
fato de que vantagens já conquistadas, que são mais benéficas ao
trabalhador, não podem ser modificadas para pior. É a aplicação da
regra do direito adquirido (art. 5°, XXXVI, da CF), do fato de o
trabalhador já ter conquistado certo direito, que não pode ser
modificado, no sentido de se outorgar uma condição desfavorável ao
obreiro. Ao menor aprendiz é garantido o salário mínimo horário,
salvo condição mais favorável (§ 2° do art. 428 da CLT) (MARTINS,
2005, p. 97).
52
Observa-se, da citação supra, que o princípio da condição mais benéfica tem
a função de resolver o problema da aplicação da norma jurídica trabalhista no
tempo, quando a norma cronologicamente posterior modifica ou suprime um direito
concedido pela norma anterior revogada, caso em que, para resguardar os direitos
do trabalhador diante das transformações prejudiciais que podem afetá-lo, deve
enunciar-se a ser preservada a condição de trabalho mais benéfica, como forma de
direito adquirido.
Ainda sobre o princípio da condição mais benéfica, ensina Eduardo Gabriel
Saad que este princípio incide nos casos em que uma lei ou regulamento interno
modificam-se para melhor as condições de uma situação jurídica anterior (SAAD,
2000, p. 65).
Para o doutrinador, tais atos jurídicos retroagem porque beneficiam o
trabalhador, porque alteram o pactuado anteriormente. Se as condições anteriores
forem mais favoráveis, ficam elas mantidas a despeito da nova regulamentação.
Leciona Jorge Luiz Souto Maior (2000, p. 297) que, para o presente princípio,
uma lei posterior não pode diminuir as condições de trabalho já auferidas pelo
empregado.
Amauri Mascaro Nascimento trouxe à tona o posicionamento de Conture,
esclarecendo que o primeiro princípio fundamental do processo trabalhista é relativo
ao fim a que se propõe, como “procedimento lógico de corrigir desigualdades”,
criando outras desigualdades. Para o doutrinador, o direito processual do trabalho é
elaborado totalmente com o propósito de evitar que a parte mais poderosa no
processo possa desviar e entorpecer os fins da justiça (NASCIMENTO, 2008, p.
112).
Observa-se, portanto, que os princípios destinados à proteção do trabalhador
determinam, na maioria das vezes, que prevaleçam as condições mais vantajosas
para o trabalhador, relacionadas ao contrato de trabalho.
3.2.2 Princípio da Irrenunciabilidade dos Direitos
O empregado não pode renunciar aos seus direitos. Nem antes, nem durante
e nem depois da vigência do seu contrato de trabalho. Leis de ordem pública ou
53
imperativa não constituem objeto de renúncia ou transação, conforme ensina
Arnaldo Sussekind:
Daí decorre o princípio da irrenunciabilidade (indisponibilidade ou
inderrogabilidade), consagrado no Brasil pelo art. 9° da CLT, que é
intenso na formação e no curso da relação de emprego, e que se não
confunde com a transação, quando há res dubia ou res litigiosa no
momento ou após a cessação do contrato de trabalho. A partir dos
anos 80, entretanto, como vimos na Primeira Parte deste livro (Cap.
II, Seção X), muitos países flexibilizaram a aplicação das normas
legais trabalhistas, e abriram fendas no princípio da
irrenunciabilidade. Na maior parte das vezes, como no Brasil, além
da adoção de disposições legais flexíveis, permite a alteração das
condições de trabalho restritas a determinadas hipóteses, quase
sempre mediante a participação de sindicatos representativos dos
trabalhadores (SUSSEKIND, 2004, p. 112).
Vê-se, pelo apontado, que o princípio em questão tem por finalidade
fortalecer as conquistas conferidas pelo ordenamento jurídico, diante das
fragilidades do trabalhador, que poderia abrir mão de um direito sem, contudo,
recusar a possibilidade de transações. Assim, se o empregado renunciar ao direito
de férias em dobro devido ao atraso do pagamento dessas no prazo de concessão,
não surtirá efeito a renúncia. Esse princípio serve para invalidar atos patronais
destinados a reduzir vantagens do trabalhador, ainda que com o consentimento
formal deste.
Neste sentido, dispõe Sérgio Pinto Martins que o obreiro só poderá renunciar
a seus direitos se estiver em juízo, na presença do magistrado, pois, sendo assim,
não se pode dizer que o empregado esteja sendo forçado a fazê-lo. Se ainda estiver
na empresa, não será permitido ao trabalhador renunciar seus direitos trabalhistas,
pois poderia dar ensejos a fraudes. Ressalta o doutrinador a possibilidade de o
trabalhador transigir, fazendo concessões recíprocas, importando, assim, um ato
bilateral. Não se fala em transação no que diz respeito às verbas rescisórias, pois
estas são consideradas irrenunciáveis, disposição esta pré-estabelecida pelo
Enunciado 276 do TST. Diferencia o doutrinador ainda que transação envolve
concessões recíprocas, sendo, portanto, bilateral. Já a renúncia é unilateral, tendo
em vista que objetiva a transação prevenir litígios (MARTINS, 2005, p. 98).
Francesco Santoro Passarelli leciona que são inválidas as renúncias e
transações que têm por objeto os direitos indicados, tanto se esses negócios são
concluídos no ato da constituição da relação de trabalho ou durante a mesma, como
se são celebrados após sua cessação. Tal impedimento é justificado em face da
54
necessidade de reforçar a posição do trabalhador frente ao empregador,
assegurando a igualdade das duas posições (PASSARELLI, 1973, p. 199).
Ainda sobre o princípio da irrenunciabilidade do direito, esclarece Alfredo J.
Ruprechet que o principal objetivo do direito do trabalho é a tutela dos direitos dos
trabalhadores, para que não sejam diminuídos frente aos poderes inerentes ao
empregador. Dessa forma, ressalta o doutrinador, limita-se à autonomia da vontade,
tornando o direito mais social, mais humano. As regras são de ordem pública sendo
que o trabalho humano deve ser devidamente respeitado e protegido na pessoa de
quem executa, e dessa forma a tutela do direito implica impedir que o trabalhador
renuncie a certos direitos legais, sendo que, se vier a acontecer, a renúncia será
considerada nula por violar garantias e benefícios que estabelece (RUPRECHET,
1995, p. 29).
3.2.3 Princípio da Primazia da Realidade
Arnaldo Sussekind aborda a questão do princípio da primazia da realidade
afirmando que a relação objetiva evidenciada pelos fatos define a verdadeira relação
jurídica estipulada pelos contratantes; ainda que sob capa simulada, não
corresponde à realidade. Vale lembrar que tal princípio é tutelado pela CLT, em seu
art. 9°: “Serão nulos de pleno direito os atos praticados com o objetivo de desvirtuar,
impedir ou fraudar a aplicação dos preceitos contidos na presente Consolidação”
(SUSSEKIND, 2004, p. 114).
Colhe-se do expedido anteriormente que não importam as cláusulas de um
contrato de trabalho, mas sim o que o empregador faz. Os fatos é que são
relevantes. Para que se figure uma relação de emprego, o que prevalece é o fato
ocorrido, a realidade, e não simplesmente o contrato escrito como acordo bilateral. O
princípio da primazia da realidade prioriza a verdade real diante da verdade formal.
No contrato de trabalho, se houver discrepância entre seu conteúdo
e o que realmente faz o trabalhador, há que se levar em conta o que
este realiza na prática. Em nenhuma hipótese, o que se escreveu ou
se estipulou num contrato há de sobrepujar as condições reais em
que é prestado o serviço. É claro que as considerações têm
subjacente a certeza de que o contrato-realidade é mais vantajoso ao
trabalhador do que aquele formalizado num documento. Pode ocorrer
55
o contrário, hipótese em que há de prevalecer o contrato escrito
(SAAD, 2000, p. 68).
Observa-se, pelo apontado, que, na interpretação dos fatos revelados por
documentos de relações trabalhistas, o intérprete deverá agir com cautela e verificar
se o conteúdo do documento coincide com a realidade dos fatos, tal como
ocorreram. E estes, não aqueles, prevalecem. O papel como documento escrito
(taquigrafado ou manuscrito) aceita qualquer coisa. Porém, o direito do trabalho não
se pauta somente em documentos, mas, sobretudo, nos fatos realmente ocorridos.
Prevalece a realidade sobre as dúvidas relacionadas ao direito do trabalho,
descartando-se as formalidades que se presumem fraudulentas.
Américo Plá Rodriguez trouxe à tona seu posicionamento, ao afirmar que o
princípio da primazia da realidade sustenta que o contrato de trabalho é um contratorealidade, e que, no direito do trabalho, requer uma prestação efetiva neste sentido,
devendo sempre primar pela realidade dos fatos sobre os aspectos formais. O
contrato de trabalho, enquanto contrato-realidade, baseia-se nas condições reais de
prestação de serviços independentemente do que tenha sido pactuado, com a
limitação de que tais condições não poderão reduzir privilégios que se contenham na
lei, na convenção ou acordo coletivo (RODRIGUEZ, 1978, p. 210).
Para o jurista, o direito do trabalho regula o trabalho, isto é, a atividade e não
o documento. Desta maneira, fica obrigado a reproduzir fielmente a realidade dos
fatos, citando, por fim, os dizeres de uma decisão jurisprudencial argentina: ‘Frente à
verdade formal, deve prevalecer a verdade real’.
O princípio da busca da verdade real, assim chamado pelo doutrinador
Renato Saraiva, que o considera derivado do princípio da primazia da realidade, é
apontado ao dispor que os tribunais trabalhistas terão ampla liberdade na direção do
processo e cuidarão pelo rápido andamento da causa, podendo determinar qualquer
diligência necessária ao esclarecimento delas. O fundamento deste princípio é
baseado no art. 765 da CLT (SARAIVA, 2007, 47).
Ainda sobre o princípio da primazia da realidade, Jorge Luiz Souto Maior
(2000, p. 300) traz à baila a pertinência da figura do contrato-realidade, pois não
nega a natureza contratual do vínculo e, ao mesmo tempo, preserva o interesse
público da caracterização da relação de emprego, como efeito da vinculação, sem
se investigar a vontade das partes.
56
Em síntese, o princípio da primazia da realidade é a busca da realidade dos
fatos em proteção ao trabalhador frente ao empregador, e muitas vezes deixando de
lado a formalidade existente na relação laboral.
3.2.4 Princípio da Continuidade da Relação de Emprego
O princípio da continuidade da relação de emprego advém da característica
do empregado como sujeito do contrato de trabalho, conforme se mencionou no
capítulo anterior. Também é conhecido como não-eventual, em que o trabalhador
exerce suas funções de modo habitual, ou seja, freqüentemente, permanente, de
continuidade. É um elemento caracterizador sobre o empregado, trazido pela
legislação trabalhista brasileira.
Eneida Melo Correia de Araújo aponta:
Trata-se de outro princípio universal do Direito do Trabalho. Em
razão dele, é regra geral que as partes celebrem contratos sem
determinação de prazo. Os contratos por prazo indeterminado trazem
uma perspectiva de continuidade, de inserção e de possibilidade de
profissionalização do trabalhador (ARAÚJO, 2003, p. 189).
Conforme exposto anteriormente, o princípio da continuidade da relação de
emprego visa tão somente à tutela dos interesses do trabalhador, garantindo uma
condição de trabalho mais digna e mais segura.
Ainda nesta esteira, colhe-se o entendimento de Eduardo Gabriel Saad
quando diz que, na raiz do princípio da continuidade, também chamado pelo
doutrinador como princípio da estabilidade, existe o interesse do assalariado em
conservar-se vinculado à empresa por todo o tempo (SAAD, 2000, p. 67).
Soma-se aos conceitos retroelencados a observação capitaneada por Alfredo
J. Ruprecht:
O princípio da continuidade do contrato aplica-se fundamentalmente
em beneficio do trabalhador. Uma vez que seu objetivo é evitar que
este perca seu emprego, só pode ser esgrimido por ele. Assim como
o empregador não pode, de maneira alguma, impedir que o
trabalhador faça uso desse princípio, tampouco pode utilizar em seu
favor, impedindo a saída do trabalhador. Apesar disso, esse princípio
opera também da parte patronal. (RUPRECHET, 1995, p. 72).
57
Pode-se ainda encontrar na lei a presença deste princípio no que tange ao
contrato de trabalho. O art. 7° da Constituição da República Federativa do Brasil
versa sobre a proteção ao contrato de trabalho contra despedida arbitrária ou sem
justa causa, no direito à participação nos lucros ou resultados, e estabelece uma
indenização de caráter compensatório para dispensar sem justa causa.
Art. 7° São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de
outros que visem à melhoria de sua condição social:
I – relação de emprego protegida contra despedida arbitrária ou sem
justa causa, nos termos de lei complementar, que preverá
indenização compensatória, dentre outros direitos; (BRASIL, 2008, p.
12).
Extrai-se, pelo exposto neste tópico, que tal princípio visa amparar o
trabalhador que presta seus serviços de modo contínuo, habitual e frequente,
permitindo que o mesmo tenha uma maior estabilidade dentro do contrato de
trabalho.
3.2.5 Princípio da Lealdade e Boa-fé
Para
Américo
Plá
Rodriguez,
o
princípio
da
boa-fé
alcança
uma
obrigatoriedade aos contratantes, exigindo, de certa forma, que as partes devam
cumprir lealmente as suas obrigações, lembrando que a boa-fé não é uma norma,
mas um princípio fundamental, ou seja, algo que devemos admitir como premissa de
todo ordenamento jurídico (RODRIGUEZ, 1978, p. 262).
Observa-se, portanto, que o significado objetivo deste princípio está no
cumprimento honesto e escrupuloso das obrigações contratuais, achando-se as
partes obrigadas a uma lealdade recíproca, de conduta completamente leal,
precisamente para que a confiança fique justificada. Para o doutrinador, a boa-fé e a
lealdade apontam a conduta da pessoa, de quem se espera cumprir realmente com
o seu dever, pressupondo, portanto, uma característica de honestidade e honradez.
Art. 14 CPC “São deveres das partes e de todos aqueles que de qualquer
forma participam do processo [...] II- proceder com lealdade e boa-fé” (BRASIL,
2008, p. 402).
58
Conforme apontado, o presente princípio está pautado no art. 14, II do CPC,
que determina como dever das partes e de todos aqueles que, de qualquer forma,
participam do processo proceder com lealdade e boa-fé, devendo agir com
probidade.
Sob o ponto de vista de Maurício Godinho Delgado, os elementos que
constituem o presente princípio estão inseridos em distintas normas justrabalhistas,
no que se refere aos limites impostos à conduta de uma parte em confronto com o
interesse da outra parte contratual DELGADO, 2007, p. 192).
Lembra o doutrinador algumas situações no direito do trabalho, de modo a
ilustrar a efetividade do princípio em exame, como, por exemplo, a incontinência de
conduta, mau procedimento, desídia e negociação desleal, apontadas no art. 482 da
CLT, que resultam na justa causa obreira por parte do empregador; bem como as
situações que apontam faltas do empregador, tais como a exigência de serviços
superiores às forças do trabalhador, tratamento do empregador com rigor excessivo
ou, ainda, a redução substantiva de oferta de trabalho quando aquele for
remunerado à base exclusiva de produção, situações que resultam na justa causa
do empregador, conforme preceito do art. 483 da CLT.
3.2.6 Princípio da Razoabilidade
O princípio constitucional da razoabilidade encontra-se elencado no art.5° da
CF:
Art. 5°, LCCVII: A todos, no âmbito judicial e administrativo, são
assegurados a razoável duração do processo e os meios que
garantam a celeridade de sua tramitação (BRASIL, 2008, p. 10).
Conforme apontado, para o princípio da razoabilidade, o juízo deverá pautarse no bom senso para formação do seu juízo de valor.
Colhe-se das palavras de Maurício Godinho Delgado que o princípio da
razoabilidade é aplicável em qualquer segmento jurídico, e atualmente aplicado ao
ramo justrabalhista. Para ele, as condutas humanas devem ser avaliadas segundo
critério associativo de verdade, sensatez e ponderação, em conjunto com a
prudência e a viabilidade aparente do caso concreto (DELGADO, 2007, p. 193).
59
O princípio da razoabilidade também pode ser conhecido como princípio da
racionalidade, segundo Américo Plá Rodriguez:
Por sua vez, razoabilidade é a qualidade do razoável. E razoável é
definido como regulado, o justo, o conforme a razão. O próprio
dicionário equipara ambas as expressões ao indicar como sinônimo:
racional. De modo que, na verdade, ambas as palavras são
equivalentes. Contudo a palavra racional costuma ser utilizada com
maior freqüência para referir-se ao ser dotado de razão e a palavra
razoável costuma ser reservada para aludir às atitudes conforme a
razão. Por isso, sem fazer questão fundamental, referimos a palavra
razoabilidade porque se ajusta melhor ao sentido a que nos
referimos, ao usar essa expressão. O ser racional pode não atuar
razoavelmente, se se deixa levar pela paixão ou pelo interesse
desmedido. E queremos aludir à suposição – que é uma em que
repousa o Direito do Trabalho – de que as partes em matéria
trabalhista atuam – ou, melhor dizendo, devem atuar –
razoavelmente, quer dizer, conforme a razão (RODRIGUEZ, 1978, p.
245, grifo do autor).
Assim, o princípio em exame aponta para que as partes hajam de modo
razoável nas questões da justiça decorrentes do bom senso e sensatez.
3.2.7 Princípio do Maior Rendimento
Sobre o princípio do maior rendimento, Alfredo J. Ruprecht é enfático ao
declarar:
Esse princípio, embora aparentemente esteja mais voltado para que
os trabalhadores cumpram sua obrigação de forma eficiente, alcança
igualmente os empregadores. Sobre o assunto diz Borrajo Dacruz: ‘A
responsabilidade alcança o empresário como diretor da unidade
econômica produtiva, mas alcança também o trabalhador e suas
possíveis organizações. Para esse efeito, o Estado regulamenta
essas matérias com normas que não podem ser desconhecidas das
partes da contratação individual nem da negociação coletiva; quer
dizer, voltar a limitar-se a autonomia privada com preceitos jurídicopúblicos, mas agora em benefício do interesse geral, da função da
direção e da organização empresarial, da produtividade etc.
(DACRUZ, apud RUPRECHET, 1995, p. 89).
Pelo prescrito acima, o princípio do rendimento determina uma maior
produtividade, resultando assim num maior aperfeiçoamento, demonstrando, dessa
forma, maior capacidade e eficiência com uma coordenação adequada.
60
Do mesmo raciocínio comunga Maurício Godinho Delgado, ao apontar que o
princípio do rendimento tem relação à leal contraprestação ou simplesmente ao bom
rendimento (GODINHO, 2007, p. 214).
Para o doutrinador, o presente princípio está intimamente ligado a dois outros
princípios abordados anteriormente: o princípio da lealdade e boa-fé.
Em suma, o princípio em comento não funciona exclusivamente para o
trabalhador, atingindo também o empregador, não importando um maior exercício
laboral para o empregado, mas incentivo para que este produza melhor suas
atividades.
3.2.8 Princípio da Indisponibilidade dos Direitos Trabalhistas
Sobre o princípio da indisponibilidade dos direitos trabalhistas, leciona
Maurício Godinho Delgado que o presente princípio traduz a inviabilidade técnicojurídica do trabalhador: ‘abrir mão’ das suas garantias como trabalhador, através
simplesmente de uma manifestação de vontade (DELGADO, 2002, p. 201).
Nota-se do apontado que, embora o princípio em questão muito se
assemelhe com o princípio da irrenunciabilidade anteriormente discutido neste
capítulo, o princípio da indisponibilidade dos direitos trabalhistas se diferencia por
trata-se de um ato bilateral, em que há uma transação, enquanto aquele é
considerado ato unilateral.
Eneida Melo Correia de Araújo aponta que normas de socialização foram
adotadas para que houvesse mais equilíbrio nas relações de trabalho. Com isso, o
homem é respeitado como possuidor de individualidade e personalidade, garantindo
desse modo a justiça contratual. Lembra ainda que as normas jurídicas trabalhistas
não poderão ser individualmente afastadas para atender aos interesses do
empregador (ARAÚJO, 2003, 185).
Pode-se concluir, dos conceitos acima abordados, que o princípio da
indisponibilidade dos direitos trabalhistas versa sobre a indisponibilidade que o
trabalhador tem de despojar-se dos direitos que lhe são assegurados.
61
3.2.9 Princípio da Não-Alteração Contratual
Para o presente princípio, a CLT dedicou um capítulo exclusivo que trata do
assunto:
Art. 468: Nos contratos individuais de trabalho só é lícita a alteração
das respectivas condições por mútuo consentimento, e ainda assim
desde que não resultem, direta ou indiretamente, prejuízos ao
empregado, sob pena de nulidade da cláusula infringente desta
garantia (BRASIL, 2008, p. 906).
Observa-se que o princípio da não-alteração contratual assegura ao
empregado que o contrato de trabalho só poderá ser alterado unilateralmente pelo
empregador, desde que esta alteração não venha de forma alguma agravar a sua
condição no presente contrato, ou seja, a legislação trabalhista só aceita, regra
geral, alterações contratuais se forem para beneficiar o empregado.
Sobre o princípio constitucional da não-alteração contratual, ensina Arnaldo
Sussekind:
Este dispositivo, de considerável importância na execução dos
contratos de trabalho, partiu do pressuposto de que somente coagido
ou induzido a erro o empregado concorda com alterações contratuais
em seu prejuízo (SUSSEKIND, 2004, p. 318).
Sérgio Pinto Martins traz à baila que o princípio, também chamado de
imodificabilidade do contrato do trabalho, é uma forma de intervenção do Estado em
relação ao contrato de trabalho, visando tutelar o empregador, considerada a parte
mais fraca da relação contratual, evitando ser prejudicado. Daí a necessidade da
intervenção estatal através de uma norma de ordem pública, que restringe, de certa
forma, a autonomia da vontade dos polos do contrato de trabalho (MARTINS, 2005,
p. 333).
Esclarece ainda mais o autor (MARTINS, 2005, p. 333) que a alteração só
será possível diante de algumas situações, sendo elas: se houver mútuo
consentimento e desde que não haja prejuízo ao trabalhador. No entanto, se
prevista no contrato coletivo de trabalho e no acordo coletivo de trabalho, até mesmo
a redução salarial será aceita.
Tal princípio é apresentado por Marcos Abílio Domingues, que aponta como
fundamento deste princípio dois aspetos, sendo o primeiro em relação ao poder
diretivo do empregador, e o segundo baseado na característica do empregador, que
62
assume os riscos da atividade econômica, e, por estas situações, deve contar com
prerrogativas que tornem possível tomar decisões que preservem a continuidade do
empreendimento, ainda que aparentemente violem os direitos individuais do
empregado (DOMINGUES, 2003, p. 114).
Como se pode notar, o presente princípio tutela pela imodificabilidade
unilateral do contrato do trabalho, sendo válida tão somente a alteração com o
consentimento do trabalhador e desde que não lhe cause prejuízo direto ou indireto.
Estabelecidos os esclarecimentos acerca do contrato de trabalho no primeiro
capítulo, bem como os princípios norteadores desta relação abordados no segundo
capítulo, passar-se-á a estudar o assédio moral e o quantum indenizatório frente aos
Tribunais, tema central do presente trabalho.
63
4 ASSÉDIO MORAL – O QUANTUM INDENIZATÓRIO FRENTE AOS TRIBUNAIS
O presente capítulo tem o escopo de apresentar conceitos acerca do instituto
do assédio moral, suas características e modalidades, bem como demonstrar quais
parâmetros que os tribunais têm apresentado para a fixação do quantum
indenizatório, ou seja, a quantificação do assédio nas relações de trabalho. Esta é a
viga mestra do presente trabalho, haja vista que todos os pontos abordados giram
em torno deste instituto.
4.1 ASSÉDIO MORAL
O assédio moral não é um problema exclusivo da área trabalhista. É
encontrado nas mais diversas áreas. Para melhor entendimento, apontar-se-ão,
adiante, conceitos acerca do assunto, primeiramente de uma forma genérica e
posteriormente mais voltada às relações de emprego.
Aponta José Osmir Fiorelli o conceito trazido, pelo dicionário Aurélio, sobre
assédio, que significa “insistência inoportuna, junto de alguém, com perguntas,
propostas, pretensões, etc.” e pelo dicionário Houaiss, que define assédio como
“insistência impertinente, perseguição, sugestão ou pretensão constantes em
relação a alguém” (FIORELLI, 2007, p. 31).
O presente trabalho, conforme já mencionado, trata do assédio moral nas
relações de emprego, tendo como assediado, geralmente, a figura do empregado,
não sendo descartada a possibilidade de o empregador também sofrer tal abuso, e
ainda o assédio moral horizontal, que ocorre entre empregados, conforme se tratará
adiante.
Seguem, portanto, conceitos sobre assédio moral, sob a ótica das relações
empregatícias.
Para Marie-France Hirigoyen:
O assédio moral no trabalho é definido como qualquer conduta
abusiva (gesto, palavra, comportamento, atitude [...] que atende, por
sua repetição ou sistematização, contra a dignidade ou integridade
64
psíquica ou física de uma pessoa, ameaçando seu emprego ou
degradando o clima de trabalho (HIRIGOYEN, 2002, p. 17).
Do mesmo raciocínio comunga Hádassa Dolores Bonilha Ferreira:
[...] o assédio moral não se restringe ao ambiente físico do trabalho,
envolve não apenas o espaço físico no qual a atividade laboral é
desenvolvida, mas todo o clima psicológico que possa surgir em
razão dessa atividade do empregado assediado. Todavia, é
imprescindível que o processo assediador seja praticado durante o
exercício do trabalho, não se confundindo com questões pessoais
que possam aparecer dentro do ambiente de trabalho (FERREIRA,
2004, p. 43).
Soma-se aos conceitos retroelencados o conceito apontado por Regina Célia
Rufino:
É a exposição dos trabalhadores e trabalhadoras a situações
humilhantes e constrangedoras repetitivas e prolongadas durante a
jornada de trabalho e no exercício das suas funções, sendo mais
comuns em relações hierárquicas autoritárias e assimétricas, em que
predominam condutas negativas, relações desumanas e aéticas de
longa duração, de um ou mais chefes dirigida a um ou mais
subordinado(s), desestabilizando a relação da vítima com o ambiente
de trabalho e a organização, forçando-o a desistir do emprego
(RUFINO, 2006, p. 60).
Tem-se, portanto, o assédio moral como ato que tem por objetivo afetar a
dignidade da pessoa através dos mais diversos tipos de humilhações, degradando
desta forma o ambiente de trabalho.
4.2 CARACTERÍSTICAS DO ASSÉDIO MORAL
Para Regina Célia Rufino, o tema central deste trabalho é caracterizado pela
perversão moral praticada através de atos de humilhações, deboches, abusos,
hostilidades, pressão e desprezo, por parte do ofensor, violando assim a dignidade
da pessoa humana, estando ligados às diversas ciências, como psicologia,
sociologia, direito e medicina do trabalho, despertando principalmente a área
jurídica. Lembra a autora que tal violência precisa ocorrer de forma reiterada,
podendo ocorrer em diversas modalidades nas relações jurídicas, família, escola ou
trabalho (RUFINO, 2006, p. 15).
65
Observa-se, pelo apontado, que o assédio ofende a dignidade do assediado.
São diversas as atitudes que levam à diminuição do seu prestígio social.
Sobre a caracterização do assédio moral, apontam Fábio Tomás de Souza e
Normando Augusto Cavalcanti Junior:
Conclui-se, portanto, que o assédio moral pode caracterizar-se das
mais diversas formas, inclusive, iniciando-se de forma dissimulada,
por meio de um controle obsessivo, que redunda em contínuas
repreensões disciplinares por atitudes irrelevantes. Outra tática
utilizada pelo agressor é a colocação da vítima em situações de
isolamento, quer físico quer pessoal (SOUZA; CAVALCANTI
JUNIOR, 2006, p. 29).
Hádassa Dolores Bonilha Ferreira afirma que o assédio moral nas relações de
emprego decorre de características advindas da política de gestão da empresa.
Afirma ainda que o assédio moral tende a igualar os indivíduos, recusando aceitá-lo
como ele realmente é, seja por sua sexualidade, raça, cultura ou religião. Outra
característica apontada pelo autor é a rivalidade estimulada pelas empresas entre os
empregados (FERREIRA, 2004, p. 63).
Na mesma linha, ensina José Osmir Fiorelli que, no processo do assédio
moral, o agressor vale-se de comportamentos destinados a minar o relacionamento
interpessoal do assediado, como a privação dos elementos afetivos, que o convívio
com os colegas proporciona, aumentando ainda mais a fragilização do adversário
(FIORELLI; FIORELLI; MALHADAS JUNIOR, 2007, p. 124).
Com forme se nota, o reconhecimento do assédio moral é uma grande
conquista para os trabalhadores brasileiros, que veio frear o abuso de poder, muitas
vezes praticado pelos superiores hierárquicos, trazendo o equilíbrio tão necessário
entre as partes contratantes na relação de emprego.
4.3 DANO MORAL
Faz-se necessária a conceituação de dano moral, tendo em vista o estreito
vínculo existente entre este e o assédio moral.
Para Valdir Florindo, a definição de dano moral decorre da lesão à honra, à
dor, sentimento ou física, ou seja, aquilo que afeta a paz interior do ser humano, ou,
66
ainda, a ofensa que gera um mal, com fortes abalos na personalidade do indivíduo
(FLORINDO, 1999, p. 41).
Colhe-se do expedido anteriormente que o dano moral advém de uma lesão
extrapatrimonial. De fato, acredita o supracitado autor (FLORINDO, 1999, p. 41) ser
o dano moral algo mais que a dor, angústia, desgosto, aflição espiritual, humilhação
ou complexo que sofre a vítima do evento danoso, tendo por consequência o dano.
Ensina o professor Luiz de Pinho Pedreira da Silva que dano moral define-se
pelo resultado prejudicial causador da lesão de algum dos bens ou direitos
referentes ao âmbito restritamente pessoal, pelo qual se fará jus ao ressarcimento
por via satisfatória sob o critério de equidade do juiz (SILVA, 1998, p. 69).
Pertinente também o conceito trazido pelo CC, que traz em seu artigo 186
que
“Aquele que por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência,
violar direito ou causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato
ilícito” (BRASIL, 2008, p. 183).
Como se nota, não há falar-se em dano sem falar em responsabilidade civil,
sendo que tais institutos estão intimamente ligados, tendo em vista que o dano é
considerado pela doutrina, conforme citações retroelencadas, como parte dos
requisitos ou pressupostos da responsabilidade civil, assunto que se tratará mais
adiante.
No Brasil, o dano moral foi devidamente reconhecido com o advento da CF,
em 1988, cessando qualquer dúvida quanto à reparalidade do dano moral e
assegurando o direito à indenização compensatória a todo aquele que vier a sofrer
um abalo dos seus valores morais, por sua vez, ser prestada pelo causador da
lesão.
Na CF em seu art. 5°, V e X traz que:
Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer
natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes
no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à
segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
[...]
V - é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo,
além da indenização por dano material, moral ou à imagem;
[...]
X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a
imagem das pessoas, assegurado o direito à indenização pelo dano
material ou moral decorrente de sua violação; (BRASIL, 2008, p. 8).
67
No Direito do Trabalho, encontram-se menções sobre o dano moral no art.
482, alíneas ‘j’ e ‘k’, bem como no art. 483, alínea ‘e’, da CLT:
Art.482: Constituem justa causa para rescisão do contrato de
trabalho pelo empregador:
[...]
j) ato lesivo a honra ou da boa fama praticado no serviço contra
qualquer pessoa, ou ofensas físicas, nas mesmas condições, salvo
em caso de legítima defesa, própria ou de outrem;
k) ato lesivo a honra ou boa fama ou ofensas físicas praticadas
contra empregador e superiores hierárquicos, salvo em caso de
legítima defesa, própria ou de outrem (BRASIL, 2008, p. 909).
Art. 483: O empregado poderá considerar rescindido o seu contrato e
pleitear a devida indenização quando:
[...]
d) praticar o empregador ou seus prepostos contra ele ou pessoas de
sua família, atos lesivos da honra e boa fama (BRASIL, 2008, p.
909).
Portanto, quando a CLT fala em ato lesivo a honra e boa fama, está
enquadrando juridicamente esta conduta nas hipóteses de dano moral.
De acordo com o que leciona Odonoel Urbano Gonçalves, o poder disciplinar
do empregador deve ser exercido com moderação. É necessário que haja motivo
que justifique tal atitude. Para o doutrinador, caso o trabalhador sinta-se prejudicado,
poderá ajuizar ação trabalhista para pleitear reparação do dano. Neste caso, a
Justiça do Trabalho analisará as provas produzidas, julgará as controvérsias e
julgará se o empregador deverá ou não ser punido (GONÇALVES, 1993, p. 21).
Para Yussef Said Cahali, o dano moral deve ser caracterizado pelos seus
próprios elementos, bem como a privação ou diminuição daqueles bens que têm
valor precípuo na vida de um homem, que são a paz, a tranquilidade de espírito a
liberdade individual, a integridade individual, a integridade física, a honra e os
demais sagrados afetos. Lembra o autor a possibilidade de o dano afetar a parte
social do patrimônio moral, como, por exemplo, a honra, a reputação, e o dano que
atinge a parte afetiva do patrimônio moral, como a dor, a tristeza e a saudade, dano
moral que provoca direta ou indiretamente o dano patrimonial, como a cicatriz
deformante, e o dano moral puro, assim chamado aquele decorrente da dor, tristeza
etc. (CAHALI, 2005, p. 22).
68
4.4 DISTINÇÃO ENTRE ASSÉDIO MORAL E DANO MORAL
Sobre a diferenciação entre assédio moral e dano moral, leciona o professor
Rodolfo Pamplona Filho:
Embora ambos os interesses violados sejam direitos da
personalidade, não há que se confundir as duas condutas lesivas,
embora seja possível visualizar, na conduta reiterada do assédio
sexual, a prática de atos que também atentam contra a integridade
psicológica da vítima. Já a noção de dano moral, definitivamente, não
pode ser confundida com o assédio. De fato, o assédio, seja sexual
ou moral, é uma conduta humana, como elemento caracterizador
indispensável da responsabilidade civil, que gera potencialmente
danos,
que
podem
ser
tanto
materializados,
quanto
extrapatrimoniais. O dano moral é justamente este dano
extrapatrimonial que pode ser gerado pelo assédio, ou seja, a
violação de um direito da personalidade, causada pela conduta
reprovável ora analisada (PAMPLONA FILHO, 2006).
Como se pode depreender, tal diferenciação entre assédio moral e dano
moral se faz necessária, tendo em vista que jamais podem ser confundidas. Cada
uma delas tem sua caracterização, ou seja, o assédio moral é caracterizado pela
responsabilidade civil, é gerador de danos, que podem ser materiais ou
extrapatrimoniais.
A diferenciação entre dano patrimonial e dano moral, também chamada de
extrapatrimonial, é apontada por Yussef Said Cahali. Descreve o autor que a
expressão dano moral deve ser reservada exclusivamente para designar o agravo
que não produz qualquer efeito patrimonial; ainda que mediante repercussão, o dano
deixa de ser extrapatrimonial (CAHALI, 2005, p. 22).
4.5 RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO EMPREGADOR
Conforme já dito, não há falar-se em dano sem falar em responsabilidade
civil, sendo que tais institutos estão intimamente ligados, tendo em vista que o dano
é considerado, pela doutrina, como parte dos requisitos ou pressupostos da
responsabilidade civil.
69
A violência moral no trabalho não é um fenômeno novo, considerada, por
alguns doutrinadores, tão antiga como o trabalho. Tal modalidade de agressão vem
aumentando, fenômeno decorrente das novas relações de trabalho
Pertinentes se fazem alguns apontamentos acerca da responsabilidade civil
do empregado.
Estabelece a súmula 341 do STF que “É presumida a culpa do patrão ou
comitente pelo ato culposo do empregado ou preposto” (BRASIL, 2008, p. 1678).
Sobre esta questão, leciona Regina Célia Pezzuto Rufino sobre a previsão da
solidariedade da responsabilidade civil. A lei procura fazer com que os
empregadores ajam com prevenção contra o assédio moral dentro de suas
empresas, de modo a vigiar, instruir e selecionar seus empregados, a fim de evitar
prejuízos futuros (RUFINO, 2006, p. 101).
Sobre responsabilidade civil, leciona Enoque Ribeiro dos Santos:
A rigor, o que se aprecia em sede de responsabilidade civil é a
conduta do agente, pessoa jurídica ou física, isto é, a concatenação
ou a sequência de atos ou fatos que produza efeitos geralmente
lesivos no patrimônio material ou extrapatrimonial do ofendido.
Apenas um único ato pode ser capaz de gerar por si só a obrigação
ou o dever de indenizar. No campo da responsabilidade civil, o que
nos interessa é a identificação da conduta comissiva ou omissiva que
produz o dever de indenizar. Nesse domínio uma pessoa é
responsável quando é capaz de sofrer uma sanção,
independentemente de ter cometido um ato ilícito ou antijurídico
pessoalmente. Nesse âmbito, a responsabilidade pode ser direta,
quando liga o próprio causador do dano ao ilícito, ou indireta, quando
o terceiro que comete o ato ou a sequência de atos lesivos a outrem
é, de uma ou de outra forma, ligado ao ofensor, de acordo com o
ordenamento jurídico (SANTOS E., 2007, p. 18).
Pelo prescrito acima, para haver responsabilidade civil por um dano, é
necessária a ação ou omissão do agente ou de um terceiro que por ele seja
responsável, nexo de causalidade entre as condutas e o dano. É imprescindível que
haja dano para a configuração da responsabilidade civil, sendo ele considerado
como o elemento mais importante. Aqui se fala apenas do dano indenizável, ou seja,
aquele que, de alguma forma, causa uma diminuição patrimonial ao indivíduo em
relação a um ato ilícito (contratual ou extracontratual) praticado por outrem.
O artigo 927, parágrafo único, do CC, aponta os requisitos para a
caracterização da responsabilidade civil objetiva:
Art. 927. Aquele, que, por ato ilícito (arts.186 e 187), causar dano a
outrem, fica obrigado a repará-lo.
70
Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano,
independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou
quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano
implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem (BRASIL,
2008, p. 232).
Tal modalidade de responsabilidade é característica inerente do empregador,
conforme
leciona
Adriano
Staley
Rocha
de
Souza,
que
exemplifica
a
responsabilidade objetiva como a de o dono de um cão que assume a
responsabilidade do risco de seu animal de estimação vir a atacar alguém,
causando-lhe ferimentos. No dia em que isto ocorrer, a responsabilidade do dono
será justificada perante a vítima como uma presunção de culpabilidade. Afirma ainda
o autor que essa também é a responsabilidade do patrão de indenizar seu
empregado ferido no trabalho, salvo culpa exclusiva da vítima. Tal modalidade de
culpa, aponta, implica responsabilidade objetiva (STANLEY, 2001, p. 35).
Buscam-se, novamente, as palavras acerca da responsabilidade objetiva de
Enoque Ribeiro dos Santos, que aponta:
Uma das grandes inovações do Novo Código Civil foi a
contemplação da responsabilidade objetiva, presente em várias leis,
que desconsidera a noção de culpabilidade. A tendência
jurisprudencial do alargamento do conceito de culpa, sob o prisma do
dever genérico de não prejudicar, possibilitou a criação da Teoria do
Risco, em várias configurações.
Por essa teoria, o sujeito responsável por riscos inerentes à atividade
econômica ou perigos que uma atuação possa promover deve arcar
com a indenização, mesmo que envide todos os esforços no sentido
de evitar o dano. Já que o sujeito é privilegiado pelas vantagens ou
benefícios do negócio ou atividade, deve responder por possíveis
indenizações que essa atividade possa ocasionar. A legislação dos
acidentes de trabalho constitui o exemplo claro da teoria da
responsabilidade objetiva (SANTOS E., 2007, p. 18).
Vê-se, pelo apontado, que a responsabilidade objetiva decorre da presunção
pelo risco contido na atitude geradora do dano. Vale lembrar que a responsabilidade
objetiva é exceção no ordenamento jurídico pátrio, e dá-se pela não necessidade de
caracterização de culpa ou dolo, pois a existência do dano e o nexo causal entre
este e o ato do agente bastam para o surgimento da responsabilidade e sua
consequente reparação.
O direito de regressão por atos causados pelo seu empregado é tutelado ao
empregador, conforme demonstra o CC, citado na decisão n°00148-2007-003-15-006 RO trabalhista do TRT da 15° Região:
71
Todavia, é certo que o ordenamento jurídico civil, sensível a essa
situação, assegura, àquele que reparou o dano de outrem, direito
regressivo de reembolso da soma indenizatória que despendeu,
conforme o disposto no artigo 934 do mesmo estatuto, in verbis:
Art. 934. Aquele que ressarcir o dano causado por outrem pode
reaver o que houver pago daquele por quem pagou, salvo se o
causador do dano for descendente seu, absoluta ou relativamente
incapaz (BRASIL, 2007).
Conforme se nota da decisão supracitada, embora o empregador possua
responsabilidade objetiva pelos atos praticados pelo seu empregado dentro do
estabelecimento, o mesmo terá direito à regressão dos prejuízos causados por ele
decorrentes de seus atos no ambiente do trabalho.
4.6 DISTINÇÃO ENTRE ASSÉDIO MORAL E ASSÉDIO SEXUAL
Faz-se necessária uma diferenciação no tocante ao assédio moral e assédio
sexual, tendo em vista que muitas vezes tais institutos são confundidos, porém
alguns aspectos devem ser trazidos à luz para o real conceito de cada um.
O tipo penal do assédio sexual está descrito no art. 216 – A do CP, que
estabelece:
Art. 219 Constranger alguém com o intuito de obter vantagem ou
favorecimento sexual, prevalecendo-se o agente da sua condição de
superior hierárquico ou ascendência inerentes ao exercício de
emprego cargo ou função (BRASIL, 2008, p. 570).
Damásio E. de Jesus traz à baila a perspectiva da Organização Mundial do
Trabalho, que considera somente caracterizado o assédio sexual na presença de
algumas características, quais sejam: quando ficar determinado ser esta uma
condição para que seja mantido o emprego, interferir em questões relativas a
promoções na empresa, ou quando prejudicar o rendimento profissional do
assediado, quando houver humilhações, insultos, ou intimidações à vítima (JESUS,
2002, p. 46).
Sobre conceito de assédio sexual, descreve Ernesto Lippmann:
É o pedido de favores sexuais pelo superior hierárquico, com
promessa de tratamento diferenciado em caso de aceitação e/ou de
ameaças, ou atitudes concretas de represálias no caso de recusa,
como perda de emprego, ou de benefícios. É necessário que haja
uma ameaça concreta de demissão do emprego, ou perda de
72
promoções, ou de outros prejuízos, como a transferência indevida
(LIPPMAN, 2001, p. 16).
Aponta o autor (LIPPMAN, 2001, p. 16) que o assédio sexual decorre da ação
do superior hierárquico, seguida de chantagens e ameaças caso haja recusa do
assediado. Segue ainda o autor:
É caracterizado pela insistência e inoportunidade. É a “cantada”
desfigurada pelo abuso de poder, que ofende a honra e a dignidade
do assediado. Fundamental para que seja caracterizado é a
superioridade hierárquica do assediante, que deve ser o chefe, um
funcionário superior ao assediado, ou sócio da empresa. É
necessário que o assediante tenha poderes para influenciar na
carreira, ou nas condições de trabalho do assediado, que passa a ser
ameaçado com a dispensa, transferência, perda de oportunidade de
promoções, de referencias, etc., com promessas de obtenção de
vantagens e favorecimentos caso ceda o assediante (LIPPMAN,
2001, p. 16).
Michael Rubinstein declara que assédio sexual “é um termo novo para
descrever um velho problema”. Leciona o doutrinador que o assédio supõe uma
conduta sexual não desejada, e considera-se indesejada a conduta de conotação
sexual quando o assediado inequivocamente manifesta oposição às propostas do
agressor. Afirma ainda que o assédio sexual é consequência de uma posição de
poder, de que seu detentor abusa, apontando ainda que as mulheres são as maiores
vítimas de tais abusos, em razão das posições ocupadas e funções laborais
inferiores (apud SILVA, 1998, p. 92).
Sobre assédio sexual, aponta Aloysio Santos:
Mantido durante muitos anos como uma espécie de “mal-entendido”
entre colegas de trabalho – embora a coerção masculina, uma forma
primitiva de molestação sexual, já fosse uma atitude conhecida dos
estudiosos de comportamento humano no passado – a coisa tomou
tamanha proporção, nos últimos dez anos, que já não dá mais para
fingir que não está acontecendo. Tudo leva a crer que o assédio
sexual seja mesmo uma nova versão do que se convencionou
chamar coerção masculina, que se caracterizou pelo comportamento
eminentemente discriminatório do homem que se considerava
superior à mulher e que a molestava, como se ela estivesse sempre
disponível, por pertencer a classes sociais mais baixas (SANTOS, A.,
1999, p. 23).
O professor Rodolfo Pamplona Filho explana, de forma brilhante, o assédio
sexual: “[...] como toda conduta de natureza sexual não desejada que, embora
repelida pelo destinatário, é continuadamente reiterada, cercando-lhe a liberdade
sexual.” (PAMPLONA, 2001, p. 35).
73
Observa-se, pelo apontado, que, dentre os prejuízos trazidos pelo assédio
sexual, estão o de violação ao princípio de livre disposição do próprio corpo,
profundo constrangimento, além do abalo psicológico, entre outras consequências
mais danosas.
4.7 FORMAS DE REPARAÇÃO DO ASSÉDIO MORAL TRABALHISTA
De acordo com Hádassa Dolores, são formas de reparação do assédio moral
aquelas com o intuito de combater o fenômeno do dano moral, oferecendo à vítima
duas opções, consistindo a primeira apenas na interrupção do processo destruidor
mediante ação trabalhista, em que o trabalhador pleiteará, nos casos cabíveis, o
reconhecimento da justa causa do empregador. A segunda seria a conversão dos
danos sofridos pelo processo de assédio moral em indenização de danos morais
(FERREIRA, 2004, p. 115).
Busca-se, novamente, nas palavras de Enoque Ribeiro dos Santos, acerca
das formas de reparação. Sendo assim, aponta o referido professor que existem
dois modos de sanção, o in natura, que poderá constituir numa retratação,
contrapublicação, ou publicação de sentença, ou seja, numa retroação do danificado
à sua situação anterior ao dano. A outra forma apontada seria a sanção pecuniária,
sendo esta a que mais prevalece na jurisprudência; seria a indenização, ou seja, o
pagamento, em dinheiro, da quantia proporcional ao agravo, mas não equivalente,
por ser impossível tal equivalência (SANTOS, 1998, p. 173-174).
Tem-se, portanto, que a reparação do assédio moral poderá ser aferida em
forma de retratação ou um pedido de desculpas, a justa causa do empregador, e,
por fim, a indenização, sendo considerada a forma mais comum de retratação, sob a
qual está assentada a viga mestra do presente trabalho, conforme segue.
74
4.8 O “QUANTUM” INDENIZATÓRIO DO ASSÉDIO MORAL
São intermináveis as discussões acerca da indenização do assédio moral,
razão por que da escolha do tema central do presente trabalho. Trata-se de uma
árdua tarefa, tendo em vista o aspecto subjetivo de que se trata.
Conforme apontado anteriormente, o CC prevê a identificação do dano, bem
como a responsabilidade civil de seus causadores, e, por consequência, a
indenização do dano causado, seja o dano material ou moral.
A ação de compensação do assédio moral deve ser pleiteada sob
fundamentos do art. 5° da CF, inc. X, que assegura que
“Art.
5°,
X:
São
invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas,
assegurado o direito à indenização pelo dano moral ou material decorrente de sua
violação” (BRASIL, 2008, p. 8).
Leciona Hádassa Dolores Bonilha Ferreira que, para a determinação do
direito de indenização por danos morais ocasionados por processo de assédio
moral, a ocorrência das condutas assediadoras e a do dano moral puro bastam, não
sendo necessária a presença das consequências na saúde do trabalhador, pois as
condutas assediadoras funcionam como critério objetivo para determinar a
responsabilidade pelos danos morais (FERREIRA, 2004, p. 118).
Os autores Paulo Peli e Paulo Teixeira afirmam que, como o dano moral não
tem parâmetros fixados na lei, a sua estimativa deverá ser baseada conforme a
situação, comprovada nos autos, do autor e réu. Consideram, ainda, que, além do
caráter reparador e punitivo, fixa-se a indenização de acordo com a gravidade e a
extensão do pretenso dano, e que o arbitramento do valor é exclusivo do juiz que
julga a causa, que cuida para que tal valor não se converta em enriquecimento
indevido (PELI; TEIXEIRA, 2006, p. 104).
Sobre o quantum indenizatório, expõe Enoque Ribeiro dos Santos:
Nossa recomendação quanto à determinação do quantum
indenizatório, oriundo de Danos Morais Trabalhistas, permeia-se em
uma situação híbrida, através do qual o magistrado continua a deter
o poder discricionário, subjetivo, de arbitrar a indenização, porém,
dentro dos seguintes parâmetros básicos:
Dano Moral Trabalhista, de natureza gravíssima – De 501 a 1000
salários mínimos ou até 10 (dez) vezes o “quantum indenizatório”.
Este quantum seria calculado, tendo-se por base o ressarcimento
integral de todo o período de afastamento, incluindo-se as
75
indenizações das remunerações devidas (salários, férias, 13° salário,
etc.), corrigidas monetariamente, acrescidas dos juros legais.
Dano Moral Trabalhista, de natureza “grave” – Entre 201 a 500
salários mínimos ou até cinco (5) vezes o “quantum indenizatório”,
acima referido.
Dano Moral Trabalhista “leve” – Até 200 salários mínimos, a critério
do magistrado, após sopesadas todas as circunstâncias do fato
lesivo, posição social do lesado e lesante, etc. (SANTOS E., 1998, p.
197).
Ainda sobre o quantum indenizatório, Ernesto Lipmman sugere que o
magistrado, na sua avaliação referente ao aspecto compensatório, utilize-se de
perícia realizada por um psiquiatra ou psicólogo, para uma avaliação profunda dos
prejuízos sofridos pelo assediado, segundo seu sofrimento individual, determinando
o grau de sintomas gerados pela tensão, que podem ser variados, como problemas
na saúde física ou mental, bem como a perda da produtividade profissional
(LIPMMAN, 2001, p. 45).
Sobre a reparação do assédio moral, leciona Rodolfo Pamplona Filho:
De fato, o cerceamento dos valores da dignidade e da liberdade fere
profundamente um âmbito da personalidade do ser humano que não
pode ser reduzido pecuniariamente. A fórmula encontrada pelo
ordenamento jurídico para reparar tal dano foi a possibilidade jurídica
de estipulação de uma compensação, não necessariamente
pecuniária (apesar de ser, frequentemente, a mais adotada), para
tentar amenizar a dor sofrida pela vítima. Esta sanção pelo dano
moral poderá, inclusive, consistir em uma retratação ou desagravo
público, o que, de certa forma, também compensa a dor sentida pela
vítima. Assim sendo, a reparação civil por danos morais é
constantemente invocada quando se fala em assédio moral,
havendo, inclusive, quem denuncie a existência de uma "indústria"
de milionárias indenizações por danos morais (PAMPLONA FILHO,
2006).
Extrai-se, do exposto neste tópico, que o assédio moral, além de ofender a
dignidade do assediado, levando-o à diminuição do prestígio social, não deverá ser
analisado de forma genérica, ou seja, faz-se necessária uma avaliação específica do
grau dos danos causados, para então determinar o quantum indenizatório.
Vale lembrar que é possível a cumulação de pedido no que tange à ação
compensatória de dano moral e dano material, em face da Súmula 37 do STJ: “São
cumuláveis as indenizações por dano material e dano moral oriundas do mesmo
fato” (BRASIL, 2008, p. 1693).
A prescrição da indenização é apontada por Hádassa Dolores Bonilha
Ferreira, que destaca duas correntes predominantes na doutrina. A primeira, que
76
defende que a prescrição da indenização deve ser entendida de acordo com o art.
205 do CC, ou seja, de dez anos, e a segunda corrente, que defende que o prazo
prescricional é trabalhista, previsto no art. 7°, inc. XXIX, da CF, ou seja, dois anos
para reclamar os últimos cinco anos trabalhados (FERREIRA, 2004).
4.9 ENTENDIMENTO JURISPRUDENCIAL SOBRE O ASSÉDIO MORAL E O
QUANTUM INDENIZATÓRIO
Para fins de elucidação das incidências de condenação do pagamento de
indenizações por assédio moral, conveniente se faz a transcrição de alguns
Acórdãos que condenam a reparação por assédio moral.
No presente trabalho, utilizar-se-ão decisões dos Tribunais de Santa Catarina
(12° Região), Distrito Federal/Tocantins (10° Região), Campinas/SP (15° Região) e
Rio Grande do Sul (4° Região), conforme exposto a seguir.
O TRT da 15° Região, Processo Nº 00090-2008-132-15-00-5 RO, de
20/3/2009, tratou o tema da seguinte forma:
Restando comprovado que o empregador, mediante ato do seu
preposto, praticou deliberadamente ato ofensivo à moral do
trabalhador, têm-se presentes os elementos objetivos justificadores
da indenização correspondente, decorrentes da imposição de
práticas constrangedoras no ambiente de trabalho, que extrapolam
os limites do poder disciplinar e diretivo do empregador, maculando a
esfera íntima do empregado. Por outro lado, insurge-se a Recorrente
quanto ao valor da indenização arbitrada em R$ 8.300,00 (oito mil e
trezentos reais), por considerá-la excessiva. A indenização por dano
moral não tem a finalidade de enriquecer ou empobrecer as partes
envolvidas, nem de apagar os efeitos da lesão, mas sim de reparar
os danos. Neste sentido, entendo que o quantum indenizatório fixado
na r. sentença, observou o princípio da razoabilidade, a extensão do
dano, o grau de culpabilidade e a capacidade econômica da
empresa, sendo suficiente para atingir o efeito pedagógico da
condenação.
Mantém-se (BRASIL, 2009).
Observa-se que o referido processo trata de um ato de assédio moral
praticado pelo preposto, e o empregador, que possui responsabilidade objetiva,
conforme mencionado anteriormente, responde pelos atos de seu empregado. Já o
valor da indenização foi arbitrado considerando-se o princípio da razoabilidade, na
77
extensão do dano e na capacidade econômica da empresa, condenando-a com
intuito pedagógico, valorando em R$ 8.300,00 (oito mil e trezentos reais).
Na mesma linha, o mesmo Tribunal decide através do Acórdão nº 005482007-097-15-00-2 de 25/04/2008:
Considerando que o arbitramento da indenização por dano moral
deve estar calcado em fatores jurídicos, éticos e morais, deve o
julgador buscar parâmetros práticos nos autos com vistas a
satisfazer a reparação, além de impingir caráter punitivo ao
empregador, sem, contudo, se afastar da zona de equilíbrio.
Neste sentido, entendo que o quantum indenizatório fixado na r.
sentença (R$ 8.000,00) observou o princípio da razoabilidade, a
extensão do dano experimentado pelo autor, o grau de culpabilidade
e a capacidade econômica da empresa, visando atingir o efeito
pedagógico da condenação.
Nego provimento.
Do exposto, decido conhecer do recurso ordinário interposto pela
reclamada e negar-lhe provimento (BRASIL, 2008).
No caso em exame, a decisão foi mantida tendo em vista que foi entendido
que a fixação do quantum indenizatório obedeceu aos critérios do princípio da
razoabilidade, extensão do dano, grau de culpabilidade, capacidade econômica e o
escopo de atingir o efeito pedagógico e punitivo da condenação, além de coibir o
empregador de praticar novamente atos dessa natureza.
O Acórdão do Tribunal da 12° Região reformou a decisão através do RO
02532-2007-029-12-00-2 -18, de 23/04/2009, acerca do valor da indenização por
assédio moral, conforme segue:
Assim, frente à gravidade do ato patronal, expondo a saúde física e
emocional do reclamante a uma enorme gama de problemas, que em
casos extremos poderia ocasionar até mesmo a sua morte, tenho
que o valor arbitrado pelo juízo a quo (R$ 10.000,00) se mostra
insuficiente, tanto para o atingimento do fim ressarcitório, quanto do
fim pedagógico, mormente se considerando a remuneração do autor
(o valor fixado é pouco maior que 2,5 vezes o salário hora
multiplicado por 220), razão pela qual aumento o valor da
indenização para R$ 50.000,00 (BRASIL, 2009).
Observa-se, da decisão supra, que o empregado impugnou valor arbitrado da
condenação por assédio moral, frente à gravidade da conduta empregadora. O
Tribunal Regional da 12° Região acolheu o pedido do recorrente aumentando o
quantum indenizatório, que antes fora arbitrado no valor de R$ 10.000,00 (dez mil
reais), para R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais), pois o valor anterior foi considerado
insuficiente para compensar o dano sofrido frente aos fatos apresentados.
78
O mesmo Tribunal aponta o caráter didático-pedagógico-punitivo do
fenômeno, uma vez que vê não há uma regra para fixação do quantum indenizatório.
É o que se extrai do RO 03745-2007-031-12-00-8 -6:
Quanto ao valor pleiteado para a indenização por danos morais não
há regra fixa, devendo ser consideradas a ofensa perpetrada e a
condição cultural, social e econômica dos envolvidos, bem como o
caráter didático-pedagógico-punitivo da condenação de modo que
repugne o ato, traga conforto ao espírito do ofendido e desencoraje o
ofensor à nova violação (BRASIL, 2009).
Tem-se, portanto, que, embora o Brasil não possua legislação pertinente ao
assédio moral, tal lacuna normativa não tem impedido os Tribunais de prestar a
efetiva tutela jurisdicional às vítimas do assédio moral, utilizando-se de alguns
critérios para a formação do quantum indenizatório, tais como capacidade
econômica das partes, extensão do dano, de modo que não venha empobrecer nem
enriquecer nenhuma das partes.
Transcreve-se o Acórdão do Tribunal da 15° Região, decisão de 19/09/2008,
Processo n° 00148-2007-003-15-00-6 RO:
Com efeito, é certo que a doutrina não estipula critérios matemáticos.
Isso porque a indenização pelo dano moral, no mais das vezes, não
está atrelada à extensão do prejuízo econômico. O escopo, na
espécie, é de cunho satisfativo para o ofendido e punitivo para o
ofensor, de modo a dissuadi-lo de igual e novo atentado, cabendo,
ao magistrado, ao fixar o montante reparatório, considerar a
gravidade da lesão (culpa ou dolo do agente agressor), a situação
econômica do lesante, bem como as circunstâncias em que
ocorreram os fatos. Conquanto possível que a fixação do valor da
reparação por dano moral sujeite-se ao controle da Instância
Revisora quando se apresentar, de um lado, manifestamente irrisório
ou, de outro, visivelmente exorbitante, na hipótese, considerando
exorbitante a pretensão formulada na inicial (200 x a última
remuneração - R$ 1301,89), tenho como razoável o valor arbitrado
na origem (R$ 54.679,38), correspondente ao valor do último salário
pelo nº de meses de serviço, pautando-se não só pela especial
observância ao princípio da razoabilidade e a natureza pedagógica
da sanção, bem como pelo porte do reclamado, pelo que fica
mantido o julgado originário (BRASIL, 2009).
Vislumbra-se que, embora não exista legislação para fixação do arbitramento
do quantum indenizatório, a decisão em tela pretende trazer o caráter punitivo e
preventivo da indenização do assédio moral, entendendo que não há pretensão de
enriquecimento ilícito, bem como atenção à situação econômica das partes
envolvidas, ao princípio da razoabilidade, à gravidade da lesão, entre outras
informações consideradas pertinentes. Observa-se desta decisão um critério
79
diferenciado para fixação do quantum indenizatório, pois o Tribunal manteve o valor
da condenação utilizando o valor do salário como parâmetro, pelo número de meses
de serviço, totalizando R$ 54.679,38 (cinquenta e quatro mil seiscentos e setenta e
nove reais e trinta e oito centavos).
O Tribunal da 4° região, através do Acórdão 006-2007-014-00-2 RO, proferido
em 17/07/2008, assim se manifestou:
Embora não tenham sido comprovadas na íntegra as alegações
deduzidas na inicial, restou demonstrado que o reclamante era
tratado sistematicamente de forma depreciativa, pois a testemunha
refere que o Sr. Toninho e as nutricionistas diziam que o autor tinha
um lado “afeminado”, “bixa” ou “gay”. Tais comentários não são
condizentes com o ambiente de trabalho e que, da forma como
formulados tenham configurado assédio moral, tolerado pelo
empregador, segundo sentença transitada em julgado no aspecto. A
gravidade do assédio moral se encontra justamente no seu caráter
discriminatório e na sua repetição ao longo do contrato de trabalho,
expondo o reclamante de forma reiterada à situação humilhante e
vexatória. Portanto, a nosso sentir, o valor fixado a título de
indenização, R$ 5.000,00, não é suficiente para reparar o dano
sofrido nem mesmo para sancionar a conduta omissiva do
empregador em tolerar o assédio moral dentro da empresa. Por outro
lado, o valor da indenização não deve acarretar o enriquecimento
sem causa do ofendido nem extrapolar as condições econômicas do
ofensor. Em razão disso, tem-se que a quantia pretendida pelo autor,
R$ 100.000,00, apresenta-se excessiva, de modo que a indenização
deve ser aumentada para R$ 10.000,00.
Portanto, dá-se provimento parcial ao recurso para majorar a
indenização por dano moral para R$ 10.000,00 (dez mil reais)
(BRASIL, 2009).
Vislumbra-se, da decisão citada, que a vítima do assédio moral encontrava-se
insatisfeita com o valor da indenização do dano causado pelo assédio, de R$
5.000,00 (cinco mil reais), sendo que fora pleiteado o valor de R$100.000,00 (cem
mil reais). O valor solicitado foi entendido como um valor exorbitante pelo Tribunal,
que também entendeu que o valor fixado pela sentença não era suficiente para
compensar o dano sofrido; dessa forma, majorou para R$ 10.000,00 (dez mil reais).
Por fim, tem-se, a decisão do TRT da 10° Região, através do Acórdão
n°00938-2008-006-10-00-9 RO, da data de 23/04/2009, que decide:
Analisando-se, pois, o contexto fático produzido nos autos, a
remuneração do Reclamante, a capacidade econômica do
Reclamado, a magnitude do dano e o grau de culpa do ofensor,
estabeleço a condenação imposta a título de reparação por dano
moral em R$ 15.000,00 (quinze mil reais), uma vez que esse valor
não acarreta o enriquecimento ilícito do empregado; possui caráter
punitivo ou pedagógico, atende à teoria do desestímulo; apresenta
inegável feição ressarcitória e, por fim, leva em conta a baixa
80
gravidade do dano experimentado pelo Reclamante. Recurso
parcialmente provido, para estabelecer a condenação imposta a título
de reparação por dano moral, fixando- a em R$ 15.000,00 (quinze mil
reais). CONCLUSÃO Pelo exposto, conheço do Recurso Ordinário e,
no mérito, dou-lhe parcial provimento, para estabelecer a
condenação imposta a título de reparação por dano moral, a cargo
das Reclamadas, sendo a segunda - TAM Linhas Aéreas, em caráter
subsidiário, fixando-a em R$ 15.000,00 (quinze mil reais), tudo nos
termos da fundamentação. É o meu voto (BRASIL, 2009).
Observa-se, da decisão em tela, que, para a fixação do quantum
indenizatório,
observaram-se
critérios
acerca
da
razoabilidade
e
da
proporcionalidade, além de considerar o fator de desestímulo que a indenização por
dano moral acarreta, e também o fator pedagógico. Ressalta ainda que não há como
se dimensionar com segurança o volume da ofensa sofrida; também não há como se
quantificar o pagamento dessa ofensa, pois a dor moral não tem preço. O valor foi
arbitrado em R$ 15.000,00 (quinze mil reais), de modo que possa proporcionar a
certeza de que o ato ofensor não fique impune e que sirva de desestímulo a práticas
que possam retirar do trabalhador a sua dignidade.
Da leitura das decisões apresentadas, denota-se que os Tribunais têm
reconhecido o assédio moral, arbitrando indenizações compensatórias para os
danos causados. Os critérios utilizados para a formação do quantum indenizatório
são baseados no princípio da razoabilidade e da proporcionalidade, com o caráter
punitivo-pedagógico, ou seja, de modo que possa proporcionar a certeza de que o
ato do ofensor não fique impune, e que sirva de desestímulo a práticas que possam
retirar do trabalhador sua dignidade. Também é observado se o dano causado foi
suficiente para afetar a personalidade do trabalhador (extensão do dano), bem como
se o valor da indenização tem finalidade de enriquecer ou empobrecer as partes
envolvidas.
É certo que não há como dimensionar com segurança o volume da ofensa
sofrida pela vítima, não há como quantificar o dano causado, pois a dor moral não
tem preço. Dessa forma, o quantum indenizatório servirá apenas como uma forma
compensadora do dano sofrido.
81
4.10 COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA LABORAL
A Constituição Republicana Federativa Brasileira, por intermédio do art. 114,
empreendeu à Justiça Laboral a seguinte competência:
Art. 114 - Compete à Justiça do Trabalho processar e julgar:
(Alterado pela EC- 45-2004)
I - as ações oriundas da relação de trabalho, abrangidos os entes de
direito público externo e da administração pública direta e indireta da
União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios;
II - as ações que envolvam exercício do direito de greve;
III - as ações sobre representação sindical, entre sindicatos, entre
sindicatos e trabalhadores, e entre sindicatos e empregadores;
IV - os mandados de segurança, habeas corpus e habeas data,
quando o ato questionado envolver matéria sujeita à sua jurisdição;
V - os conflitos de competência entre órgãos com jurisdição
trabalhista, ressalvado o disposto no art. 102, I, "o";
Art. 102, I, "o", Supremo Tribunal Federal - CF
VI - as ações de indenização por dano moral ou patrimonial,
decorrentes da relação de trabalho;
VII - as ações relativas às penalidades administrativas impostas aos
empregadores pelos órgãos de fiscalização das relações de trabalho;
VIII - a execução, de ofício, das contribuições sociais previstas no art.
195, I, "a", e II, e seus acréscimos legais, decorrentes das sentenças
que proferir;
Art. 195, I, "a", e II, Disposições Gerais - Seguridade Social - CF
IX - outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho, na
forma da lei (BRASIL, 2008, p. 42).
Observa-se, pelo apontado, que a Justiça do Trabalho tem competência não
só para conciliar e julgar os dissídios individuais e coletivos entre trabalhadores e
empregadores, mas também nas demais controvérsias decorrentes da relação de
trabalho, pondo fim às polêmicas sobre o assunto. Por algum período, muito se
discutia se essa competência abrangia ou não a competência de dirimir questões de
dano moral, porém a Emenda Constitucional de 2004 definitivamente determinou
que sim; dentre as competências da Justiça do Trabalho, está a de dirimir questões
relativas ao dano moral.
O professor Luiz de Pinho Pedreira da Silva, de forma categórica, afirma que
o objetivo do direito do trabalho é assegurar o respeito à dignidade do trabalhador, e
a lesão causada exige reparação (SILVA, 1998, p. 52).
Valdir Floriano, antes disso, já dizia que é competência da Justiça do
Trabalho a apreciação do dano moral originário da relação de emprego ou
decorrente dela (FLORINDO, 1999, p. 129).
82
Registram-se, também, as palavras trazidas pelo autor Décio Sebastião
Daione, que, antes da EC 2004, não concordava com os autores que defendiam a
competência da Justiça do Trabalho para dirimir questões acerca de dano moral na
relação de emprego.
[...] não são todas as matérias decorrentes de uma relação de
trabalho ou de emprego que se constituem competência da Justiça
do Trabalho, caso contrário seria admitir o absurdo de ser
competente também para conhecer e decidir sobre um homicídio,
que teve origem numa dessas relações (DAIDONE, 2001, p. 48).
Portanto, colhe-se, das citações retroelencadas, bem como do que determina
a CF, que compete à Justiça Laboral dirimir qualquer conflito sobre dano moral na
relação de emprego ou decorrente dela.
4.11 CLASSIFICAÇÃO DO ASSÉDIO MORAL
Marie-France Hirigoyen classifica o assédio moral na relação de emprego,
distribuindo-os segundo a origem do assédio, nas modalidades: vertical ascendente,
vertical descendente, horizontal e misto (HIRIGOYEN, 2002, p. 115).
4.11.1 Assédio Moral Vertical Ascendente
Aponta a pesquisadora Marie-France Hirigoyen o assédio moral ascendente
como aquele advindo de um superior pelo(s) subordinado(s), que pode ser, do
mesmo modo, destrutivo. De acordo com a autora, o assédio moral ascendente é
aquele que decorre de um superior assediado por seu(s) subordinado(s). Aponta a
autora, como exemplo dessa modalidade de assédio, a falsa alegação de assédio
sexual, ou reações coletivas de grupos, ou seja, a união do grupo subordinado a fim
de prejudicar ou boicotar o superior hierárquico (HIRIGOYEN, 2002, p. 115).
Sob o mesmo prisma, conceitua o professor Rodolfo Pamplona Filho:
Por sua vez, vertical ascendente será, quando o hierarquicamente
inferior agir com intuito de assediar o seu superior. Esta violência de
"baixo para cima" não é tão rara como se possa imaginar, a primeira
83
vista. Como exemplos, podemos citar situações em que alguém é
designado para um cargo de confiança, sem a ciência de seus novos
subordinados (que, muitas vezes, esperavam a promoção de um
colega para tal posto). No serviço público, em especial, em que os
trabalhadores, em muitos casos, gozam de estabilidade no posto de
trabalho, esta modalidade se dá com maior freqüência do que na
iniciativa privada (PAMPLONA FILHO, 2006).
Conclui-se, dos conceitos retroelencados, que o assédio moral ascendente
decorre da agressão sofrida pelo superior hierárquico, advinda do(s) subordinado(s).
4.11.2 Assédio Moral Vertical Descendente
Denominado por Marie-France Hirigoyen como o assédio moral advindo da
hierarquia, é considerado pela pesquisadora como responsável pela maioria dos
assédios existentes. Segundo ela, o assédio moral advindo de um superior
hierárquico é mais prejudicial que os demais, tendo em vista que há mais dificuldade
para a vítima achar a solução, e, em decorrência disto, ela se isola. Salienta ainda
que a própria relação de subordinação existente na relação de emprego já traz uma
característica desigual, e, dessa forma, o assediante (superior hierárquico) efetiva o
abuso sentindo prazer em submeter o outro à agressão (HIRIGOYEN, 2002, p. 112).
Conforme consideração suprareferida, a prática do assédio moral vertical
descendente é caracterizada pelo assédio praticado pelo superior hierárquico contra
seu subordinado, considerado o mais comum e o mais prejudicial em relação aos
demais assédios.
Neste panorama, adiciona Marie-France Hirgoyen:
A relação mais comum, como já mencionado, é a relação
descendente, ou assimétrica, na qual o assédio moral emana da
hierarquia. Dentro dessa relação, as causas que levam ao processo
assediador são diversas, conforme destaca Hirigoyen: há o objetivo
puro e simples de eliminar-se a vítima para valorizar o próprio poder
(do agressor); há, também, a finalidade de levar a vítima a pedir
demissão, o que eliminaria custos adicionais e impediria
procedimentos judiciais; e, ainda, há a própria gestão de empresa
que incentiva e aprova o assédio moral como meio de administrar
seus empregados. Nessa relação, as conseqüências na saúde da
vítima são piores, pois a dificuldade de achar uma solução tende a
aumentar o estresse e a ansiedade (apud FERREIRA, 2004, p. 51).
84
Para o professor Rodolfo Pamplona Filho, esta modalidade de assédio é a
mais frequentemente praticada nas relações de emprego, chamada de vertical
descendente em razão do sentido adotado pela conduta que decorre, dada a
desigualdade entre os sujeitos envolvidos; é praticada pelo superior hierárquico, com
o escopo de agredir seu(s) subordinado(s) (PAMPLONA FILHO, 2006).
Tem-se, portanto, que o assédio moral vertical descendente decorre da
relação de desigualdade existente da relação laboral, sendo este um campo fértil
para tal prática.
Sobre o assédio moral vertical descendente aponta Regina Célia Pezzuto
Rufino:
Assim, o que se verifica no assédio vertical é a utilização do poder de
chefia para fins de verdadeiro abuso de direito do poder diretivo
disciplinar, bem como para esquivar-se de conseqüências
trabalhistas. Tal é o exemplo do empregador que, para não ter que
arcar com as despesas de uma dispensa imotivada de um
funcionário, tenta convencê-lo a demitir-se, ou cria situações
constrangedoras, como retirar sua autonomia no departamento,
isolá-lo do ambiente, para que o empregado sinta-se de algum modo
culpado pela situação, pedindo sua demissão (RUFINO, 2006, p. 78).
Por fim, configura-se o assédio moral vertical descendente a prática da
agressão de modo contínuo, advinda de um superior hierárquico, considerada como
a mais freqüente agressão moral existente nas relações de emprego, por causa da
relação de subordinação existente no vínculo empregatício.
4.11.3 Assédio Moral Horizontal
Este tipo de assédio é considerado por Marie-France Hirigoyen como o
assédio frequente entre vários empregados que disputam o mesmo cargo ou
promoção, ou seja, é o assédio moral que vem dos colegas, companheiros de
trabalho (HIRIGOYEN, 2002, p. 113).
De acordo com a pesquisadora suprareferida, o assédio moral horizontal é
desenvolvido entre colegas do mesmo patamar hierárquico
Leciona Rodolfo Pamplona Filho acerca do assédio moral horizontal:
Já o assédio horizontal é aquele praticado entre sujeitos que estejam
no mesmo nível hierárquico, sem nenhuma relação de subordinação
85
entre si. Frise-se que, assim como no vertical, a conduta assediadora
pode ser exercida por uma ou mais pessoas contra um trabalhador
ou um grupo destes, desde que, seja este grupo determinado ou
determinável, não se admitindo a indeterminabilidade subjetiva
(exemplo: toda a coletividade). Afinal, a conduta hostil e excludente
do assédio moral, diante de sua característica danosa, será sempre
dirigida a um funcionário específico ou a um grupo determinado para
atingir sua finalidade (PAMPLONA FILHO, 2006).
Neste contexto, acrescenta Regina Célia Pezzuto Rufino que o assédio
horizontal é aquele desencadeado pelos próprios colegas de trabalho, resultado do
medo causado pela competitividade, busca por maiores resultados na produtividade
provocados pela globalização da economia, trazendo consigo uma onda de
exclusão, desigualdades e injustiças, gerando um clima repleto de agressividades.
Ressalta ainda que, no caso de assédio entre colegas de mesmo grau hierárquico,
poderá a vítima pleitear seus direitos indenizatórios pelos danos sofridos, sem
prejuízos dos efeitos legais inerentes às demais consequências no contrato de
trabalho.
Conforme explicação acima, as causas mais comuns desse tipo de assédio
estão na disputa existente entre colegas do mesmo nível hierárquico diante da
corrida pelo melhor posto ou maior prestígio ou posição dentro da empresa.
Hádassa Dolores Bonilha Ferreira confirma esta versão ao declarar:
A relação pode ser estabelecida, ainda, na forma horizontal, ou
simétrica, quando o assédio é desenvolvido entre os colegas de
trabalho. Geralmente ocorre quando dois empregados disputam a
obtenção de um mesmo cargo ou promoção (FERREIRA, 2004, p.
51).
Assim, considera-se o assédio moral horizontal aquele advindo dos próprios
colegas de trabalho, do mesmo patamar hierárquico, geralmente decorrente da
competição dentro da própria empresa.
4.11.4 Assédio Moral Misto
Marie-France Hirigoyen denomina assédio moral misto aquele em que a
vítima torna-se rejeitada por todo o grupo, ou seja, é uma mistura entre o assédio
moral vertical e o assédio moral horizontal, fazendo-se necessária a identificação do
86
agressor principal. Aponta a pesquisadora que a pessoa se acha em posição de
bode expiatório, sendo considerada responsável por tudo que dê errado
(HIRIGOYEN, 2002, p. 114).
Sobre o assédio moral misto, assim comenta Rodolfo Pamplona Filho:
Já o assédio moral misto exige a presença de pelo menos três
sujeitos: o assediador vertical, o assediador horizontal e a vítima.
Pode-se dizer que o assediado é atingido por "todos os lados",
situação esta que, por certo, em condições normais, se torna
insustentável em tempo reduzido (PAMPLONA FILHO, 2006).
Conclui-se, portanto, que o assédio moral misto é aquele advindo de uma
mistura dos assédios mencionados anteriormente: o assédio moral vertical e o
assédio moral horizontal.
Cumpre
ressaltar
que,
conforme
já
mencionado
no
item
3.5,
a
responsabilidade do empregador é objetiva, ou seja, é presumida a culpa do patrão
pelos atos de seus empregados, sendo ele também responsável pela obrigação de
indenizar.
4.12 MÉTODOS DO ASSÉDIO MORAL – ESTRATÉGIAS DO AGRESSOR
São métodos do assédio moral, ou estratégias utilizadas pelo agressor,
condutas que geram certa fragilidade à vítima, conforme afirma Regina Célia
Pezzuto Rufino, que ainda destaca alguns desses atos: fragilizar, ridicularizar,
inferiorizar,
menosprezar,
culpabilizar
ou
responsabilizar
publicamente,
desestabilizar a vítima emocionalmente e profissionalmente, entre outras atitudes
(RUFINO, 2006, p. 44).
Ainda sobre métodos do assédio moral, aponta Hádassa Dolores Bonilha
Ferreira:
No estudo das condutas e métodos utilizados para assediar
moralmente alguém, surgem inúmeras possibilidades mas elas
acabam sempre sendo enquadradas em uma forma específica de
assédio moral. O pesquisador sueco Heinz Leymann destacou, em
seu Leymann Inventory of psychological Terrorization (Lipt), quarenta
e cinco condutas diferentes de assédio moral. Todavia, em conclusão
à sua pesquisa, resumiu-se em cinco: impossibilitar uma
comunicação direta; isolar a vítima, atacar a reputação da vítima;
degradar as condições de trabalho e atacar diretamente a saúde da
vítima com uma efetiva violência (FERREIRA, 2004, p. 64).
87
Colhem-se, do expedido anteriormente, algumas das diversas maneiras de
condutas geradoras do assédio moral.
Os autores Paulo Peli e Paulo Teixeira destacam como formas de agressão
moral a manipulação, na qual o agressor cria situações em que a vítima chega ao
ponto de pedir demissão; a imposição de culpa, em que o agressor aterroriza a
vítima através do sentimento de culpa, com situações em que esta não consegue
reagir; a intimidação, que se dá através de pressão psicológica, com gritos, insultos
e criação de situações fantasiosas; a humilhação, através da ridicularização, ironia,
desmoralização, ataque à dignidade pessoal e profissional; e a punição, através de
imposição de castigos que levem à fragilização da vítima (PELI; TEIXEIRA, 2006, p.
74).
Marie-France Hirigoyen divide em quatro categorias os métodos de assédio
moral, sendo eles:
Deterioração proposital das condições de trabalho (contestações
sistemáticas de todas as decisões tomadas pela pessoa visada,
críticas exageradas ou injustas ao seu trabalho, atribuição
sistemática de tarefas superiores a suas competências, instruções
impossíveis de serem cumpridas, que a coloquem em dificuldade [...].
Neste caso, age-se de maneira a colocar a pessoa visada de modo a
parecer incompetente; pode-se com isso dirigir-lhe toda espécie de
críticas e, eventualmente, encontrar pretextos para mandá-la
embora. Em geral, essas atitudes são as primeiras visíveis quando o
assédio moral vem de cima para baixo (HIRIGOYEN, 2002, p. 107).
José Osmir Fiorelli leciona que uma das estratégias é a destruição da
reputação do assediado, disseminando comentários pejorativos, como “vagabundo”,
“mulherengo”, “lésbica”, “ignorante”, escolhidos a partir de situações isoladas de seu
comportamento. Aponta, ainda, que a sociedade é ágil para denegrir a imagem de
quem quer que seja, e extremamente lenta para restaurá-la, quando o faz
(FIORELLI, 2007, p. 113).
Observam-se, do apontado, as mais diversas formas de estratégias do
agressor com o intuito de desmoralizar a vítima, caracterizando-se, portanto, o
assédio moral. São condutas que desqualificam a vítima, expondo-a ao
constrangimento e trazendo prejuízos de diversas ordens, conforme tratará o tópico
seguinte.
88
4.13 CONSEQUÊNCIAS DO ASSÉDIO MORAL
Consideram-se consequências do assédio moral as lesões resultantes do ato
praticado pelo agressor, conforme aponta Hádassa Dolores Bonilha Ferreira, que
também afirma que tais consequências não se limitam tão-somente à saúde do
trabalhador, mas também atingem a esfera social da vida da vítima, bem como
consequências econômicas do fenômeno sobre o empregado, a empresa e a
sociedade (FERREIRA, 2004, p. 69).
Marie-France Hirigoyen aponta como consequência do traumatismo:
Todas as vítimas, com raríssimas exceções, experimentam uma
desestabilização permanente. Em todas as outras formas de
sofrimento no trabalho e, em particular, no caso de uma pressão
profissional excessivamente forte, quando cessa o estímulo, cessa
também o sofrimento, e a pessoa consegue recuperar o estado
normal. O assédio moral, ao contrário, deixa seqüelas marcantes que
podem evoluir do estresse pós-traumático até uma sensação de
vergonha decorrente ou mesmo modificações duradouras de
personalidade. A desvalorização persiste, mesmo que a pessoa
esteja afastada de seu agressor. Ela é refém de uma cicatriz
psicológica que a torna frágil, medrosa e descrente de tudo e de
todos (HIRIGOYEN, 2002, p. 164).
Conforme citação supra, as consequências do assédio moral poderão resultar
em lesões físicas e psíquicas, desestabilizando a vítima, causando-lhe profundos
traumas, e, além disso, estender-se até mesmo após o fim da agressão, ou seja, o
sofrimento da vítima não acabará no mesmo momento em que cessar o assédio.
Rodolfo Pamplona Filho complementa:
As conseqüências mais dramáticas do assédio são reservadas, sem
sombra de qualquer dúvida, para a vítima da conduta abusiva
reiterada (e rejeitada) de natureza psicológica. De fato, em primeiro
lugar, a própria interferência na relação de trabalho em si gera,
quase sempre, um evidente prejuízo no rendimento do(a)
trabalhador(a), pois cria um ambiente laboral inadequado, com
extrema pressão psicológica (PAMPLONA FILHO, 2006).
Conforme citação supra, observa-se que os resultados do assédio moral
prejudicam o assediado de diversas maneiras, seja física, profissional e até mesmo
psicologicamente, resultando disso prejuízos das mais diversas espécies. O mesmo
autor adiciona que a propagação do assédio afeta a intimidade da vítima, causandolhe eventuais complicações, como, por exemplo: a recusa de promoções,
transferência de setor e até mesmo uma despedida direta. Ressalta ainda que a
89
agressão decorrente do assédio, seja em qualquer espécie, ofende a vítima na sua
dignidade (PAMPLONA FILHO, 2006).
Sob o mesmo prisma, os autores Fábio Tomás de Souza e Normando
Augusto Cavalcanti Junior afirmam que as agressões repetitivas podem gerar
perdas de autoestima ao ponto de comprometer sua identidade, dignidade e
relações afetivas sociais, ocasionando graves danos à saúde física e mental,
passível da evolução da incapacidade laborativa, desemprego ou até a morte.
Apontam também, como consequências do processo perverso, a destruição do
sentimento de utilidade da pessoa, bem como resultados prejudiciais das empresas,
que sofrem com a queda da produtividade, aumento do custo social decorrente das
indenizações por doenças, aposentadorias precoces e tratamentos médicos das
vítimas da agressão moral (SOUZA; CAVALCANTI JUNIOR, 2006, p. 31).
Observa-se, do apontado, que os prejuízos não afetam somente a vítima da
agressão, mas também a empresa, ou seja, a pessoa agredida manifesta seu
sofrimento de diversas formas, sejam elas físicas ou psíquicas. Tal prejuízo também
é sofrido pela empresa, que sofrerá com a incapacidade laborativa da vítima do
assédio moral.
A sociedade também sofre com o dano gerado pelo assédio moral, conforme
especifica Regina Célia Pezzuto Rufino, ao mencionar que o mal-estar gerado pela
violência moral desencadeia uma série de traumas e complexos que atrapalharão
seu comportamento como cidadão, tornando-se, por decorrência disso, alguém que
perde toda a ilusão, vitalidade e autoconfiança. Sendo assim, com o indivíduo
abalado de tal forma, a sociedade sofre os reflexos de mais um desempregado,
inquieto e inseguro, podendo tornar-se um alcoólatra ou drogado, cometedor de
condutas imorais e reprovadoras. Afirma ainda a autora que, nos casos mais graves,
o estado depressivo pode levar ao suicídio, ou seja, um dano não só prejudicial à
saúde, podendo terminar de uma forma trágica e fatal (RUFINO, 2006, p. 87).
Conclui-se, das citações retro elencadas, que as consequências sofridas pelo
assédio moral não são exclusivas da vítima, atingindo também a empresa com
consequências econômicas e até mesmo na esfera social.
Com estas considerações, encerra-se o presente capítulo. Após, apresentase a conclusão, finalizando o presente trabalho acadêmico.
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91
5 CONCLUSÃO
Conforme demonstrado neste trabalho, sob diferentes aspectos, seja através
da doutrina, da jurisprudência e da legislação vigente, o assédio moral é um dano,
tutelado pelo direito e passível de indenização como forma de reparação deste dano.
Tema central de diversas pesquisas, o assédio moral não é um problema
novo nas relações de emprego. Há quem o considere tão antigo como o trabalho,
porém os estudos sobre o tema proposto são recentes.
Iniciou-se a pesquisa com considerações acerca do contrato de trabalho,
suas características e requisitos. Desde então, é nítido que, na relação de emprego,
não há uma igualdade absoluta das partes, tendo em vista que os poderes inerentes
ao empregador trazem certa vantagem sobre o empregado, para o qual, dentro de
diversas características, destaca-se a subordinação à parte oposta do contrato.
Diante disso, tem-se o contrato de trabalho como um campo fértil para a prática do
assédio moral.
Ainda nesta linha, verificaram-se os princípios do direito do trabalho, tanto os
gerais como os específicos; princípios estes norteadores do contrato de trabalho,
que estabelece diretrizes para a justa aplicação do direito, bem como para proteger
o trabalhador, tendo em vista a condição de desvantagem em que este se encontra.
Partiu-se, portanto, da análise específica do assédio moral nas relações de
emprego, que é caracterizado como qualquer conduta repetitiva que atente contra a
dignidade física ou psíquica de uma pessoa; no caso do contrato do trabalho, que
fere moralmente o trabalhador, através de situações humilhantes e constrangedoras,
das mais diversas formas possíveis, levando à diminuição do seu prestígio social,
autoestima e degradação da dignidade.
Entre os métodos utilizados pelo assediador, encontram-se gritos, insultos,
ridicularizações, isolamento, ironia, desmoralização, comentários pejorativos, entre
outros, ou seja, todos com o objetivo de atacar a dignidade pessoal e profissional da
vítima.
As consequências do assédio moral são as mais prejudiciais possíveis,
afetando a vítima não só em seu ambiente de trabalho, mas em toda sua vida. Tais
conseqüências, muitas vezes, são irreversíveis, conforme o grau do traumatismo,
chegando por vezes ao suicídio.
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Verifica-se ainda a importância da distinção entre assédio moral e dano
moral, sendo considerado que tais institutos possuem características diferenciadas.
Muitas vezes, tal confusão se dá porque tais figuras são associadas uma à outra,
tanto na doutrina, como na jurisprudência.
Surge, então, a grande questão deste trabalho: a forma de valoração do dano
sofrido decorrente do assédio moral. Diante dos prejuízos que a vítima sofre, como
poderá ser compensada? Sabe-se muito bem que um assédio moral jamais poderá
ser reparado na sua totalidade. O Brasil ainda sofre com a falta de legislação sobre
o assunto, porém, conforme estudo dos entendimentos jurisprudenciais apontados
(foram pesquisadas decisões dos Tribunais de Santa Catarina, do Rio Grande do
Sul, do Distrito Federal/Tocantins e de Campinas/SP), observou-se o cuidado dos
Tribunais sobre o assunto em questão, ou seja, a lacuna existente em nosso
ordenamento jurídico não impede que a vítima do assédio moral receba a tutela
merecida.
A hipótese do presente trabalho, apresentada inicialmente, questiona se a
falta de legislação específica sobre assédio moral no trabalho impede a tutela do
empregado, vítima da agressão. Observa-se, da pesquisa, que, muito embora ainda
não exista legislação específica que fundamente o quantum indenizatório sobre o
assédio moral nas relações de emprego, a agressão é plenamente reconhecida
pelos Tribunais brasileiros, baseados na doutrina e na jurisprudência, com o intuito
de compensar a agressão sofrida através do assédio moral, agressão esta que
desvaloriza o trabalho humano, haja vista que lhe furta toda a dignidade,
contrariando a ordem jurídica, ferindo as garantias constitucionais vigentes, bem
como as garantias, direitos e liberdades alcançados pelos trabalhadores deste país,
respondendo à hipótese do presente trabalho.
Assim, como resposta ao problema de como vem sendo aplicado o quantum
indenizatório e quais os critérios para sua apuração/aplicação, tem-se que as
indenizações são baseadas no princípio da razoabilidade, pautando-se no bom
senso, prudência, ponderação e sensatez no que diz respeito à formação do
quantum indenizatório do assédio moral sofrido dentro da relação trabalhista. Tal
cuidado é necessário, para que não haja enriquecimento ilícito decorrente do
assédio moral. Para isso, são analisados alguns aspectos, tais como a extensão do
dano, o grau de culpabilidade, as condições econômicas das partes, além do caráter
punitivo-pedagógico, a fim de prevenir que a agressão se repita.
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Desta feita, conclui-se que o quantum indenizatório, embora não haja regra
fixa para tal formação, é arbitrado pelos Tribunais, em decorrência da observação de
diversos aspectos, quais sejam, a condição sócio-econômica das partes, a fim de
evitar o enriquecimento ilícito; o princípio da razoabilidade; o grau e extensão do
dano causado, suficiente para atingir o caráter punitivo-pedagógico da condenação,
nunca para pagar o dano sofrido, mas apenas como forma compensadora da
agressão sofrida.
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