374 Informação sobre as pesquisas com seres humanos no Brasil: fragmentação e falta de transparência V Mostra de Pesquisa da PósGraduação Apresentador: Selma Rodrigues Petterle, doutoranda Orientador: Prof. Dr. Ingo Wolfgang Sarlet Programa de Pós Graduação em Direito – Doutorado Faculdade de Direito, PUCRS Resumo O presente estudo analisa o sistema de informação sobre as pesquisas envolvendo seres humanos no Brasil, questionando se há, e em que medida, déficit de eficácia e efetividade dos direitos fundamentais. Introdução A pesquisa científica na área da saúde proporcionou o desenvolvimento de novas drogas, novas terapias, novas técnicas cirúrgicas, e até mesmo do que se tem designado de farmacogenética/farmacogenômica (SANDRIM, 2008), o que indica que as pesquisas continuarão a aportar valiosas contribuições para o diagnóstico e tratamento de doenças. Com o aprofundamento dos estudos será possível avaliar até mesmo qual o nível de resposta individual de cada paciente a uma determinada droga, a exemplo de estudo que verifica, em pacientes com transtorno de déficit de atenção, existir uma resposta diferente ao tratamento com metilfenidato, de acordo a característica genética da pessoa (SILVA, 2009). Todavia, com os horizontes abertos pelas pesquisas biomédicas de ponta aprofunda-se também a discussão a respeito dos benefícios e riscos das novas tecnologias para a pessoa humana, na nova era tecnológica, no caso, a proteção das pessoas que participam desses estudos. O tema assume contornos ainda mais especiais quando é de conhecimento público que a pesquisa é cada vez mais dependente de recursos privados (a exemplo das pesquisas financiadas pela indústria farmacêutica e biotecnológica), estando cada vez mais presente o risco de se reduzir a pessoa a mero objeto, violando-se de tal sorte a própria dignidade, por definição incompatível com qualquer tipo de instrumentalização e/ou coisificação de qualquer ser humano. V Mostra de Pesquisa da Pós-Graduação – PUCRS, 2010 375 Paradoxalmente, portanto, essas mesmas pesquisas poderão representar reais ameaças à dignidade e aos direitos fundamentais em geral. Nesse contexto, assume relevo também a questão do direito/dever de informação, notadamente a informação relativa às pesquisas científicas envolvendo seres humanos no Brasil. Nessa medida, não há como falar em fiscalização estatal e social sem o alicerce de um sistema de informação fidedigno, para que se efetive, no plano concreto, o acompanhamento da pesquisa por todos, e não apenas do Estado e dos atores envolvidos diretamente na pesquisa. Metodologia Quanto à metodologia de abordagem, utilizou-se predominantemente o raciocínio dedutivo, sem que isso signifique a exclusão do raciocínio indutivo, visto serem linhas argumentativas e formas complementares de construção do pensamento. Quanto às técnicas de pesquisa utilizadas, além das fontes doutrinárias nacionais e estrangeiras, analisaram-se os textos constitucionais e legais, bem como os projetos de lei em tramitação, complementando com jurisprudência pertinente. Resultados (ou Resultados e Discussão) No caso brasileiro há, atualmente, o SISNEP, Sistema Nacional de Informações Sobre Ética em Pesquisa (Ministério da Saúde/ Conselho Nacional de Saúde), alicerçado em aprovação nos Comitês institucionais de Ética em Pesquisa e na Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (sistema CEP/CONEP), que, pela informação fragmentada disponível, está a indicar a falta de transparência da informação pública hoje disponível. Conclusão Resta saber se a futura “Plataforma Brasil”, que substituirá o sistema atual, unificando os registros relativos às pesquisas envolvendo seres humanos, e se o futuro Registro Brasileiro de Ensaios Clínicos (REBRAC), que foram concebidos justamente para tentar superar o déficit de informação no Brasil, trarão resposta adequadas ao problema. Referências ALEXY, Robert. Teoria de los Derechos Fundamentales. Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 1997. BARBAS, Stela Marcos de Almeida Neves. Direito ao Patrimônio Genético. 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