Universidade Federal da Paraíba – UFPB
Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes – CCHLA
Departamento de Psicologia
Doutorado Integrado em Psicologia Social
LILIAN KELLY DE SOUSA GALVÃO
Desenvolvimento moral e empatia:
Medidas, correlatos e intervenções educacionais
João Pessoa
2010
i
LILIAN KELLY DE SOUSA GALVÃO
Desenvolvimento moral e empatia:
Medidas, correlatos e intervenções educacionais
Tese apresentada ao Programa de Pósgraduação em Psicologia Social da
Universidade Federal da Paraíba, como
parte dos requisitos para obtenção do grau
de Doutora em Psicologia Social.
Orientadora: Prof.ª Dr.ª Cleonice Pereira dos Santos Camino
João Pessoa
2010
ii
FOLHA DE APROVAÇÃO
Nome: Galvão, Lilian Kelly de Sousa
Título: Desenvolvimento moral e empatia: Medidas, correlatos e intervenções educacionais
Tese apresentada à Universidade Federal da Paraíba
como requisito parcial para a obtenção do título de
Doutora em Psicologia Social.
Aprovada em: 10 de Setembro de 2010.
Banca Examinadora
Profa. Dra. Cleonice P. dos S. Camino (Orientadora)
Instituição: UFPB
Assinatura: _________________________________________________________
Prof. Dr. Valdiney Veloso Gouveia
Instituição: UFPB
Assinatura: _________________________________________________________
Prof. Dr. Leonardo Rodrigues Sampaio
Instituição: UNIVASF
Assinatura: _________________________________________________________
Profa. Dra. Maria da Graça Bompastor Borges Dias
Instituição: UFPE
Assinatura: _________________________________________________________
Profa. Dra. Sílvia Helena Koller
Instituição: UFRGS
Assinatura: _________________________________________________________
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iii
“Ouvistes que foi dito: Olho por olho e dente por dente. Eu, porém, vos digo...
se qualquer te bater na face direita, oferece-lhe também a outra...
Ouviste que foi dito: Amarás o teu próximo e aborrecerás o teu inimigo.
Eu, porém, vos digo: Amai os vossos inimigos, bendizei os que vos maldizem, fazei o bem aos que vos
odeiam e orai pelos que vos maltratam e vos perseguem.”
Sr. Jesus Cristo (Mt 5:38-44)
3
iv
Ao Sr. Jesus Cristo, inspiração dos meus princípios morais e éticos
A minha mainha e ao meu painho, meus grandes tesouros
Ao meu mozinho, fonte de meu equilíbrio
4
v
AGRADECIMENTOS
“Não me canso de dizer, não me canso de falar:
Grandes coisas o Senhor tem feito em minha vida!”
Considero a elaboração de uma tese um produto coletivo, embora sua redação,
responsabilidade e stress sejam, predominantemente, do/a aluno/a de doutorado e de seu/sua
orientador/a. Dentro dessa perspectiva, divido a autoria deste trabalho com todas as pessoas
que citarei a seguir, como uma forma singela de dizer: muito obrigada!
À professora Cleonice Camino, orientadora mui amada, por fazer parte de toda a minha
trajetória acadêmica e por ter construído, ao meu lado, esta tese;
Ao professor Valdiney Gouveia, por sua amizade e pelas suas valiosas orientações, que só
aumentaram a minha admiração pela sua capacidade de fazer pesquisa e formar
pesquisadores;
Ao professor Leonardo Sampaio, por ter construído, juntamente com a professora Cleonice,
o primeiro esboço desta tese e por ter aceitado avaliá-la;
Às professoras, Maria da Graça Dias e Sílvia Koller, pela disponibilidade para participar da
avaliação deste trabalho e, principalmente, pelas contribuições para o seu aprimoramento;
Aos/às professores/as do programa de Pós-graduação em Psicologia Social, que me
ofereceram importantes ensinamentos no campo da psicologia e do método de pesquisa;
A todos/as os/as professores/as, ex-integrantes e atuais integrantes do Núcleo de Pesquisa
em Desenvolvimento Moral (NPDSM), por todas as contribuições oferecidas para a
construção desta tese e pela amizade construída ao longo dos anos;
Aos/às colegas de Doutorado, Nilton, Rildésia, Ionara e Mônica, companheiros/as de
caminhada, pelo carinho e ajuda ao longo desta jornada; especialmente a Nilton que
contribuiu com a aplicação de questionários e com as análises estatísticas;
À professora Luciana K. de Souza, pela sua prontidão em me enviar dilemas morais,
construídos ou traduzidos pela ilustríssima professora Ângela Biaggio (in memoriam) e
colaboradores;
A todos/as os/as colegas de trabalho da UFCG, pela amizade e apoio. Sem a compreensão
de vocês esta tese não teria sido concluída;
Às minhas monitoras, Regiane, Rutanny, Wigna, Zaíra e ao meu orientando de monografia,
Leonardo, por sempre serem meus fiéis colaboradores;
Aos/às meus/minhas amados/as alunos/as da UFCG e inesquecíveis ex-alunos/as da UFRN,
que sempre torceram pelo meu sucesso; especialmente a aqueles/as que me ajudaram na
aplicação dos instrumentos de pesquisa do primeiro estudo;
A todos/as os/as participantes desta pesquisa, em especial aos/as alunos/as que fizeram
parte do programa de intervenção por darem um brilho todo especial a minha vida e a esta
tese;
5
vi
À direção, aos/às funcionários/as e aos/às professores/as das escolas onde foram realizados
os estudos apresentados nesta tese, pela atenção, disponibilidade e compreensão;
E, finalmente, aos sustentáculos da minha vida:
- Ao meu Deus, que sempre guia os meus passos e faz infinitamente mais daquilo que penso
ou sonho;
- Aos meus pais, Marta e Bastos, por acreditarem em mim e por sempre me incentivarem a ir
mais longe;
- Ao meu mozinho, Iran, pelo amor, companheirismo, dedicação e por trazer à minha vida
paz e equilíbrio;
- Aos meus avós, Moisés (meu escritor favorito!) e Inaldir (in memoriam), e, Tomaz e Idalice
(in memoriam), pelo modelo moral e ético de vida;
- Aos meus irmãos, Mércia, Charles e Gabriella, a meus sobrinhos, Halwmerson, Julhinhos e
Luan, e a meus cunhados, Julius, Marília e Rômulo, por tudo aquilo que vocês são em minha
vida;
- Aos meus sogros, Nice e Raimundo (in memoriam), a meus/minhas cunhados/as, Vera,
Vilma, Nickson, Val, Iraque e Paulinha, e a meu sobrinho de coração, Nickolas, pelos gestos
incansáveis de carinho e amor;
- Aos/às meus/minhas amigos/as, Célia, Cida, Deliane, Gina, Kátia, Marina, Mona e
Paulinho, pela amizade desprendida, mesmo que, algumas vezes, à kilometros de distância;
- Aos/as meus/minhas irmãos/as e amigos/as da Comunidade Cristã Logos pelas orações e
pela doce comunhão que me fortalecem a cada momento;
Enfim, a todas as pessoas que contribuíram direta ou indiretamente para a consecução dessa
tese e que, porventura, possam não ter sido citadas anteriormente, meus sinceros
agradecimentos!
6
vii
RESUMO
Galvão, L. K de S. (2010). Desenvolvimento moral e empatia: Medidas, correlatos e
intervenções educacionais. Tese de Doutorado, Pós-graduação em Psicologia Social,
Universidade Federal da Paraíba, João Pessoa-PB.
No campo da Educação Moral, Kohlberg, juntamente com Blatt, delinearam uma prática
pedagógica, que utiliza a discussão de dilemas morais, para promover o desenvolvimento
moral. Contudo, alguns autores, como M. Hoffman, criticaram essa proposta por considerar
que ela negligenciava os aspectos afetivos relacionados à moral. Diante dessa crítica, esta tese
tem como objetivo principal verificar se existem diferenças entre os efeitos de uma técnica de
intervenção “racional-discursiva” e uma técnica “racional-afetiva”. Para tanto, foram
realizados três estudos. O primeiro objetivou elaborar e testar a adequação de instrumentos
para medir o raciocínio moral e a empatia. Neste, participaram 200 estudantes, que
responderam aos instrumentos Dilemas da Vida Real e Escala de Empatia focada em Grupos18 itens (EEG-18). No que se refere aos Dilemas da Vida Real, os dados indicaram que o
instrumento proposto conseguiu diferenciar estágios de desenvolvimento moral. Em relação à
EEG-18, os dados indicaram que a escala conseguiu discriminar diferentes graus de empatia e
apresentou uma estrutura multifatorial, tendo um Alfa médio de 0,68. O segundo estudo
objetivou reformular e validar a Escala de Empatia focada em Grupos, bem como validar o
instrumento denominado Dilemas da Vida Real. Neste, participaram 206 estudantes do ensino
médio, que responderam aos Dilemas da Vida Real e a EEG-27 (versão reformulada), além de
outros dois instrumentos, já validados no Brasil – o Defining Issues Test (DIT) e o
Interpersonal Reactivity Index (IRI), tendo em vista a realização de uma validade
convergente. No que se refere à EEG-27, os resultados da análise de componentes principais
identificaram quatro fatores, com um Alfa médio de 0,73. Uma análise fatorial confirmatória,
com uma segunda amostra, revelou indicadores psicométricos aceitáveis para o modelo
tetrafatorial. Em relação aos Dilemas da Vida Real, os resultados indicaram o predomínio de
respostas típicas dos primeiros estágios de desenvolvimento moral. No que tange à validade
convergente, verificaram-se correlações significativas entre os instrumentos criados e os
instrumentos já validados no Brasil. Por fim, o terceiro estudo, refere-se a uma pesquisa
quase-experimental, cujo objetivo central coincide com o objetivo principal da presente tese.
Neste, participaram 36 estudantes, distribuídos em três grupos que foram submetidos,
respectivamente, a três condições experimentais: condição 1 (técnica “racional-discursiva”) –
os participantes, de diferentes estágios de julgamento moral, discutiram dilemas morais, sob a
coordenação de um facilitador; condição 2 (técnica “racional-afetiva”) – os participantes,
além de discutirem dilemas morais, foram estimulados a desenvolverem a empatia, mediante
o uso de técnicas do psicodrama; e condição 3 (grupo de controle). Como instrumentos de
medida (antes e depois da intervenção) foram utilizados os instrumentos: Dilemas da Vida
Real, DIT, EEG-27 e o IRI. Os resultados, de um modo geral, revelaram que o grupo
submetido à técnica de intervenção “racional-afetiva” evoluiu mais do que o grupo submetido
à intervenção “racional-discursiva”, tanto no estágio de desenvolvimento moral, quanto no
grau de empatia; o grupo submetido à técnica de intervenção “racional-discursiva” evoluiu
mais do que o grupo de controle no estágio de desenvolvimento moral; e o grupo de controle
não apresentou evolução nos dois tipos de desenvolvimento avaliado (moral e empático).
Palavras-chave: desenvolvimento moral, empatia, medidas, intervenção
7
viii
ABSTRACT
Galvão, L. K. de S. (2010). Moral development and empathy: Measures, correlates and
educational interventions. Ph.D. Dissertation, Graduate Program in Social Psychology,
Federal University of Paraíba, João Pessoa-PB.
Kohlberg and Blatt have outlined a methodological practice in the field of Moral Education
concerning the discussion of moral dilemmas enhancing moral development. Nevertheless,
authors like M. Hoffman, criticized this proposal because they thought it overlooked
affecitive aspects related to morality. In response to this criticism, this thesis aims at studying
if there are differences between the effects of a “rational-discursive” intervention techinque
and a “rational-affective” one. Three studies were carried out for this effect. The first of these
was aimed at devising and testing the adequacy of tools to assess moral reasoning and
empathy. 200 students participated in it and they responded to the tools Real Life Dilemmas
and Empathy Scale focused on Groups –18 items (EEG-18). As far as Real Life Dilemmas are
concerned, results indicated that the tools proposed managed to identify different stages of
moral development. As regards EEG-18 results indicated that the scale could discriminate
different levels of empathy and presented a multifactorial structure with an average Alfa of
0,68. The second study aimed at remaking and validating the Empathy Scale focused on
Groups, as well as validating the Real Life Dilemma tools. 206 high-school students
participated in this and responded to the Real Life Dilemma and to EEG-27 (a revised
version), as well as two further tools which have been validated in Brazil – the Defining
Issues Test (DIT) and the Interpersonal Reactivity Index (IRI), aiming at reaching a
converging validity. Regarding EEG-27, the results of the analysis of major components
identified four factors, with an average Alfa of ,73. A subsequent factorial analysis with a
second sample revealed psychometric indexes acceptable for the tetrafactorial model.
Regarding Real Life Dilemmas, the results indicated the predominance of typical answers to
the first stages of moral development. Regarding the converging validity, significant
correlations between the tools created and those validated in Brazil were found. Last, the third
study is concerned with a quasi-experimental research whose central object coincides with the
main object of this thesis. 36 students participated in this study and they were divided into
three groups which underwent, respectively, three experimental conditions: condition 1 (the
“rational-discursive” technique) – the students involved, having different levels of moral
judgement, discussed moral dilemmas, under the supervision of a coordinator; condition 2
(the “rational-affective” technique) – the group involved both discussed the moral dilemmas
and were stimulated to develop empathy, by using psychodrama techniques; condition 3
(control group). As measuring techniques (before and after the intervention) the following
tools were used: Real Life Dilemmas, DIT, EEG-27 and IRI. As a whole, the results revealed
that the group to which the “rational affective” intervention was applied evolved faster than
those under the “rational-discursive” intervention, both in terms of moral development, and
empathy: the group tested by the “rational-discursive” intervention developed more than the
control group regarding moral development; and the control group did not develop in the two
types of developments tested (moral and empathic).
Key words: moral development, empathy, measures, intervention.
8
ix
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 – Análise dos Componentes Principais da EEG-18 (cinco fatores) ....................133
Tabela 2 – Análise dos Componentes Principais da EEG-18 (três fatores) .......................137
Tabela 3 – Análise dos Componentes Principais da EEG-27..............................................155
Tabela 4 – Comparação dos modelos alternativos da estrutura fatorial da EEG-27 ...........160
Tabela 5 – Coeficientes de correlação de Pearson entre as sub-escalas do Interpersonal
Reactivity Index (IRI) ..........................................................................................................166
Tabela 6 – Coeficientes de correlação de Pearson entre as sub-escalas do Interpersonal
Reactivity Index (IRI) e os Fatores da Escala de Empatia focada em Grupos (EEG-27)...167
Tabela 7 – Coeficientes de correlação de Pearson entre o DIT e os Dilemas da Vida Real
.............................................................................................................................................168
Tabela 8 – Coeficientes de correlação de Pearson entre os instrumentos de desenvolvimento
moral (DIT e Dilemas da Vida Real) e os de empatia (IRI e EEG-27)...............................168
Tabela 9 – Lista de sujeitos selecionados, por grupo de intervenção, com os seus respectivos
resultados do pré-teste .........................................................................................................179
Tabela 10 – Distribuição dos respondentes por estágios de desenvolvimento moral, obtidos no
DIT (pós-teste), em função do grupo de intervenção ..........................................................190
Tabela 11 – Distribuição dos respondentes por estágios de desenvolvimento moral, obtidos no
Dilema de Sadam Hussein (pós-teste), em função do grupo de intervenção ......................191
Tabela 12 – Distribuição dos respondentes por estágios de desenvolvimento moral, obtidos no
Dilema de João Hélio (pós-teste), em função do grupo de intervenção ..............................192
Tabela 13 – Comparação de médias obtidas, pelos grupos experimentais, no pré e no póstestes em relação aos componentes da EEG........................................................................194
Tabela 14 – Comparação de médias obtidas, pelos grupos experimentais, no pré e no póstestes em relação às sub-escalas do IRI ...............................................................................195
9
x
LISTA DE FIGURAS
Quadro 1 – Estágios de desenvolvimento moral de Kohlberg ............................................33
Quadro 2 – Categorias, estágios, exemplos e percentuais de respostas à questão “Você acha
que Sadam Hussein deveria ter sido executado? Por quê?” ................................................127
Quadro 3 – Categorias, estágios, exemplos e percentuais de respostas à questão “Você está de
acordo que haja uma redução na idade em que o adolescente seja punido? Por quê?”.......130
Quadro 4 – Categorias, estágios, exemplos e percentuais de respostas à questão “Você acha
que Sadam Hussein deveria ter sido executado? Por quê?” ................................................162
Quadro 5 – Categorias, estágios, exemplos e percentuais de respostas à questão “Você está de
acordo que haja uma redução na idade em que o adolescente seja punido? Por quê?”.......164
Quadro 6 – Idéias subjacentes às condições experimentais: autores, foco, técnica, recursos
(meios), questões norteadoras e participantes .....................................................................184
Quadro 7 – Categorias, exemplos e freqüências de respostas à questão “Depois que você
entrou no projeto de intervenção, você consegue perceber alguma mudança na sua forma de
pensar questões morais?” ....................................................................................................197
Quadro 8 – Categorias, exemplos e freqüências de respostas à questão “Depois que você
entrou no projeto de intervenção, você consegue perceber alguma mudança na sua forma de
sentir questões morais?”......................................................................................................198
Quadro 9 – Categorias, exemplos e freqüências de respostas à questão “Depois que você
entrou no projeto de intervenção, você consegue perceber alguma mudança na sua forma de se
comportar?”.........................................................................................................................199
Figura 1 – Porcentagens das categorias de respostas, classificadas por estágio de julgamento
moral, à questão “Você acha que Sadam Hussein deveria ter sido executado?”, em função do
grau de escolaridade dos participantes ................................................................................128
Figura 2 – Porcentagens das categorias de respostas à questão “Você acha que Sadam Hussein
deveria ter sido executado?”, em função do grau de escolaridade dos participantes .........131
Figura 3 – Pontuação média bruta dos participantes no DIT ..............................................164
Figura 4 – Predominância do estágio de Desenvolvimento Moral, medido pelo DIT ........165
Figura 5 – Hipóteses acerca dos efeitos das técnicas de intervenção moral........................177
10
xi
LISTA DE SIGLAS
AG
Angústia Pessoal
AGFI
Adjusted Goodness-of-Fit Index
AIDS
Acquired Immune Deficiency Syndrome
ANOVA
Analysis of Variance
BIREME
Biblioteca Regional de Medicina
CAIC
Consistent Akaike Information Criterion
CAPES
Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior
CE
Consideração Empática
CFI
Comparative Fit Index
CNS
Conselho Nacional de Saúde
CP
Componentes Principais
DIT
Defining Issues Test
DP
Desvio Padrão
ECVI
Expected Cross-Validation Index
EECA
Escala de Empatia para Crianças e Adolescentes
EEG-18
Escala de Empatia focada em Grupos – 18 itens
EEG-27
Escala de Empatia focada em Grupos – 27 itens
EFS
Escala Fatorial de Socialização
ERI
Ethical Reasoning Inventory
EUA
Estados Unidos da América
fMRI
functional Magnetic Resonance Imaging
GFI
Goodness-of-Fit Index
GL
Graus de Liberdade
HES
Hogan Empathy Scale
IC
Intervalo de Confiança
ICM
Índices de Comportamento Moral
IRI
Interpersonal Reactivity Index
KMO
Kaiser-Meyer-Olkin
M
Média
MANOVA
Multivariete Analysis of Variance
MEC
Ministério da Educação e do Desporto
MJI
Moral Judgement Interview
11
xii
NPDSM
Núcleo de Pesquisa em Desenvolvimento Sócio-moral
ONG
Organização Não Governamental
PCNs
Parâmetros Curriculares Nacionais
PTE
Programa de Treinamento da Empatia
QMEE
Questionnaire Measure of Emotional Empathy
RMSEA
Root-Mean-Square Error of Approximation
RS
Rio Grande do Sul
SciELO
Scientific Electronic Library Online
SEF
Secretaria da Educação Fundamental
SP
São Paulo
SPSS
Statistical Package Social Sciences
SROM
Sociomoral Reflection Objective Measure
THI
Teste das Histórias Incompletas
TP
Tomada de Perspectiva
TRA
Técnica “racional-afetiva”
TRD
Técnica “racional-discursiva”
UNIVASF
Universidade Federal do Vale do São Francisco
UFCG
Universidade Federal de Campina Grande
UFPB
Universidade Federal da Paraíba
UFPE
Universidade Federal de Pernambuco
UFRN
Universidade Federal do Rio Grande do Norte
UFRG
Universidade Federal do Rio Grande do Sul
USP
Universidade de São Paulo
Y.E.S.
Your Excellence in School
12
xiii
SUMÁRIO
EPÍGRAFE ............................................................................................................................ iii
DEDICATÓRIA .................................................................................................................... iv
AGRADECIMENTOS .......................................................................................................... v
RESUMO................................................................................................................................ vii
ABSTRACT ........................................................................................................................... viii
LISTA DE TABELAS........................................................................................................... ix
LISTA DE FIGURAS............................................................................................................ x
LISTA DE SIGLAS............................................................................................................... xi
INTRODUÇÃO ......................................................................................................................17
CAPÍTULO I – DESENVOLVIMENTO MORAL.............................................................22
1.1. Breve percurso histórico sobre a noção de moral..........................................................23
1.2. A perspectiva de Piaget .................................................................................................26
1.3. A perspectiva de Kohlberg ............................................................................................29
1.4. Críticas a teoria kohlberguiana ......................................................................................35
1.5. A avaliação no campo da moralidade e estudos empíricos ...........................................40
1.6. Educação moral e estudos empíricos.............................................................................52
1.7. Considerações sobre o capítulo .....................................................................................68
CAPÍTULO II – EMPATIA ..................................................................................................72
2.1. Breve percurso histórico sobre a noção de empatia ......................................................73
2.2. A perspectiva de Hoffman.............................................................................................78
2.3. A avaliação da empatia..................................................................................................83
2.4. Estudos empíricos..........................................................................................................85
2.5. Considerações sobre o capítulo .....................................................................................94
13
CAPÍTULO III – MORAL E EMPATIA ............................................................................98
3.1. Considerações teóricas ..................................................................................................99
3.2. Estudos empíricos........................................................................................................103
3.3. Considerações sobre o capítulo ...................................................................................113
CAPÍTULO IV – ESTUDO 1: CONSTRUÇÃO DE INSTRUMENTOS .......................116
4.1. Objetivos específicos...................................................................................................117
4.2. Hipóteses .....................................................................................................................117
4.3. Método.........................................................................................................................121
4.3.1. Participantes.........................................................................................................121
4.3.2. Instrumentos .........................................................................................................121
4.3.3. Procedimento........................................................................................................123
4.3.4. Análise dos dados .................................................................................................124
4.4. Resultados....................................................................................................................125
4.4.1. Dilemas da Vida Real ...........................................................................................125
4.4.2. Escala de Empatia focada em Grupos .................................................................132
4.5. Discussão parcial .........................................................................................................138
CAPÍTULO V – ESTUDO 2: REFORMULAÇÃO E VALIDAÇÃO DA ESCALA DE
EMPATIA FOCADA EM GRUPOS E VALIDAÇÃO DOS DILEMAS DA VIDA REAL
................................................................................................................................................144
5.1. Objetivos específicos...................................................................................................145
5.2. Hipóteses .....................................................................................................................145
5.3. Método.........................................................................................................................149
5.3.1. Participantes.........................................................................................................149
5.3.2. Instrumento...........................................................................................................149
5.3.3. Procedimento........................................................................................................152
5.3.4. Análise dos dados .................................................................................................153
5.4. Resultados....................................................................................................................154
5.4.1. Escala de Empatia focada em Grupos (EEG) ......................................................154
5.4.2. Dilemas da Vida Real ...........................................................................................162
5.4.3. Defining Issues Test (DIT) – O prisioneiro foragido ...........................................164
14
5.4.4. Interpersonal Reactivity Index (IRI).....................................................................165
5.4.5. Validade Convergente ..........................................................................................166
5.5. Discussão parcial .........................................................................................................169
CAPÍTULO VI – ESTUDO 3: EDUCAÇÃO MORAL ....................................................175
6.1. Objetivo .......................................................................................................................176
6.2. Hipóteses .....................................................................................................................176
6.3. Método.........................................................................................................................178
6.3.1. Participantes.........................................................................................................178
6.3.2. Delineamento........................................................................................................180
6.3.3. Instrumentos .........................................................................................................184
6.3.4. Procedimento........................................................................................................185
6.3.5. Análise dos dados .................................................................................................187
6.4. Resultados....................................................................................................................188
6.4.1. Desenvolvimento moral ........................................................................................188
6.4.2. Empatia.................................................................................................................192
6.4.3. Desejabilidade social ...........................................................................................195
6.4.4. Efeito da intervenção segundo a opinião dos participantes ................................196
6.4.5. Diário de Campo ..................................................................................................199
6.5. Discussão parcial .........................................................................................................201
CAPÍTULO VII – DISCUSSÃO GERAL E CONSIDERAÇÕES FINAIS....................210
REFERÊNCIAS ...................................................................................................................218
APÊNDICES .........................................................................................................................237
Apêndice I – Instrumentos utilizados no Estudo 1.............................................................238
Apêndice II – Instrumentos utilizados nos Estudos 2 e 3...................................................241
Apêndice III – Folha de Apuração do DIT.........................................................................247
Apêndice IV – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido...........................................249
Apêndice V – Cronograma de Atividades: Estudo 3..........................................................256
Apêndice VI – Dilemas Selecionados: Estudo 3 ................................................................262
Apêndice VII – Filmes e Vídeos do Youtube selecionados: Estudo 3...............................267
15
Apêndice VIII – Técnicas do Psicodrama selecionadas: Estudo 3.....................................270
Apêndice IX – Diário de Campo: Estudo 3........................................................................272
16
INTRODUÇÃO
17
O estudo da moralidade tem sido alvo de interesse de diversos pesquisadores e
teóricos da área da Psicologia, merecendo destaque Lawrence Kohlberg, que é, de acordo com
uma pesquisa realizada por Alencar (2003) na base de dados Psyclit, o estudioso que mais tem
influenciado, nas últimas três décadas, os trabalhos realizados no âmbito da Psicologia do
desenvolvimento moral.
Essencialmente, conforme será visto no capítulo a seguir, a tipologia do
desenvolvimento moral de Kohlberg é composta por seis estágios seqüenciados agrupados em
três níveis: Nível I – pré-convencional, que inclui o estágio 1 (moralidade de evitar o castigo e
da obediência) e o estágio 2 (individualismo ou trocas instrumentais); Nível II –
convencional, que inclui o estágio 3 (expectativas inter-pessoais mútuas) e estágio 4 (ordem
social); e Nível III – pós-convencional, que inclui o estágio 5 (acordo social e consenso) e o
estágio 6 (princípios éticos universais).
Essa seqüência de estágios, segundo demonstrou Snarey (1985), com base em uma
revisão de mais de 40 pesquisas realizadas em 27 culturas, se mantém nas várias culturas, com
algumas nuances que, de acordo com a análise de Biaggio (1997), não ameaçam a idéia de
universalidade que Kohlberg preconizou.
No Brasil, a teoria de Kohlberg tornou-se conhecida por meio dos trabalhos de
Biaggio (1976) e difundiu-se, de acordo com Biaggio e Monteiro (1998), a partir de três
grandes grupos de pesquisa que desenvolvem, sistematicamente, estudos sobre o assunto: o
grupo da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), o da Universidade Federal da
Paraíba (UFPB) e o da Universidade de São Paulo (USP). E, pode-se dizer que esses estudos
18
comprovam a presença dos estágios de julgamento moral, semelhante ao que foi descrito por
Kohlberg, conforme a revisão realizada por Biaggio e Monteiro (1998) e por Camino e Luna
(2005).
Outro ponto que merece ser mencionado acerca da teoria do desenvolvimento moral
de Kohlberg é o de sua aplicação. No final da década de 60, Kohlberg delineou uma prática
pedagógica, que foi consolidada por Blatt e Kohlberg (1975), para desenvolver nas pessoas a
capacidade de raciocinar sobre os valores morais, mediante a suposição de que a discussão de
questões morais favoreceria o desenvolvimento do raciocínio. Basicamente, essa prática
pedagógica consiste na formação de grupos, com pessoas de diferentes estágios de
desenvolvimento moral, para discutir dilemas, durante várias sessões, com a colaboração de
um coordenador que chama a atenção dos participantes para argumentos típicos do estágio
imediatamente superior àquele em que se encontra a discussão, com o objetivo de criar um
desequilíbrio cognitivo. Geralmente, a eficácia da técnica é avaliada por meio do
planejamento experimental, com grupo de controle e grupo experimental, com pré-teste e pósteste.
Essa técnica tem tido êxito em promover o desenvolvimento de um estágio para outro
hierarquicamente superior, conforme tem sido constatado em programas de educação moral
no âmbito internacional (Berkowitz, 1985; Blatt & Kohlberg, 1975; Gibbs, Arnold, Ahlborn
& Chessman, 1984) e nacional (Biaggio, 1985; Dias, 1992; Lins & Camino, 1993; Rique &
Camino, 1997; Rodrigues, 1976).
Contudo, apesar do considerável sucesso do programa de intervenção de educação
moral de Kohlberg, alguns autores (Araújo, 2000; Camino & Luna, 2005; Hoffman, 1994;
Kristjánsson, 2004; Lima, 2004; Ruiz & Vallejos, 1999) têm criticado o paradigma
kohlberguiano, por considerar que Kohlberg não dá a devida importância aos aspectos
afetivos relacionados à moral. E, ademais, os resultados de pesquisas de Gilligan (1982) e
19
Garaigordobil (2004), entre outros, têm apontado para a necessidade de que os programas de
educação moral não estimulem apenas aspectos cognitivos (como o de Blatt & Kohlberg,
1975), mas que sejam, concomitantemente, trabalhados aspectos afetivos relacionados à
moralidade.
Em relação a essas críticas, alguns métodos de intervenção têm combinado atividades
voltadas para a promoção de conflitos sócio-cognitivos com a utilização de jogos de
dramatização (Bouchard, 2000) e de narrativas (Verducci, 2000a, 2000b; Vitz, 1990).
Dentre os autores que criticam o paradigma cognitivista presente nas teorias de
Kohlberg, destaca-se Martin L. Hoffman. Hoffman (1990), assim como Kohlberg, parte de
uma perspectiva desenvolvimentista e defende a existência de estágios de desenvolvimento
cognitivo e afetivo. Segundo Hoffman, a cognição tem um papel muito importante para a
construção das noções morais. Contudo, para ele, é a afetividade, por meio da empatia, que
mobiliza o indivíduo para atuar moralmente e para se engajar em comportamentos pró-sociais.
No Brasil, o campo de pesquisas sobre o desenvolvimento moral é bastante amplo e
alguns trabalhos têm demonstrado a relação entre empatia e moralidade (Camino, Camino &
Leyens, 1996; Sampaio, Monte, Camino & Roazzi, 2008), mas a transposição desses achados
para programas kohlberguianos de intervenção ainda não se efetuou, conforme revisão
bibliográfica realizada no presente trabalho. Considerando essa lacuna é que a presente tese
encontra sua principal justificativa.
Além disso, esta tese dá continuidade às pesquisas que foram desenvolvidos no Núcleo
de Pesquisa em Desenvolvimento Sócio-Moral (NPDSM/UFPB) (Dias, 1992; Lins & Camino,
1993; Rique & Camino, 1997) e, de maneira mais direta, aos estudos realizados por Camino,
Camino e Leyens (1996) e Sampaio, Monte, Camino e Roazzi (2008), que encontraram,
conforme já foi pontuado, relação entre empatia e moralidade.
20
Mais precisamente, esta tese tem como objetivo primordial verificar se existem
diferenças entre os efeitos de uma técnica de intervenção “racional-discursiva” e uma técnica
“racional-afetiva”, na qual, além de serem utilizados os procedimentos elaborados por Blatt e
Kohlberg (1975), é estimulado o desenvolvimento da empatia, para a promoção do
desenvolvimento moral. Além desse objetivo, foram estabelecidos objetivos intermediários
relativos à elaboração e à validação de dois instrumentos: Dilemas da Vida Real e Escala de
Empatia focada em Grupos.
Tendo em vista a concretização desses objetivos, esta tese está estruturada em sete
capítulos. O primeiro será consagrado à discussão teórica da idéia de moral, dando-se ênfase
às teorias de Piaget e Kohlberg, e à apresentação de pesquisas realizadas acerca dessa
temática. O segundo será destinado ao debate teórico sobre a empatia, dando-se destaque à
teoria de Martin Hoffman e à apresentação dos trabalhos empíricos sobre o referido tema. O
terceiro capítulo procurará relacionar, teórica e empiricamente, as idéias acerca da moral e da
empatia. O quarto descreverá um estudo referente à construção dos instrumentos
denominados Dilemas da Vida Real e Escala de Empatia focada em Grupos. O quinto será
voltado para validação desses instrumentos. O sexto capítulo será dedicado a prática de
intervenção moral. Por sua vez, o último capítulo destina-se a uma discussão geral dos
resultados encontrados frente à revisão da literatura apresentada.
21
CAPÍTULO I – DESENVOLVIMENTO MORAL
22
Ser “moral” implica pensar nos outros, em qualquer outro, na humanidade...
Ser “moral” implica ter vontade: querer e raciocinar além do próprio eu...
Ser “moral” implica, às vezes, perder vantagens imediatas para si, em prol de outros que nunca
conheceremos...
Às vezes, implica até sermos revolucionários, sermos contrários as leis que nos humilham, as leis que nos
tornam submissos, sem dignidade...
Kant
Muitos dos episódios de violência, veiculados pela mídia, que revelam ações
desumanas levam o senso comum, assim como a comunidade acadêmica, a refletir acerca da
moral humana. Na realidade, a preocupação com a moralidade humana não se restringe à
época atual. Este é um debate antigo, que permeia as reflexões de muitos filósofos,
psicólogos, sociólogos e pedagogos, entre outros que tentam compreender o ser humano.
Dentre os autores que se debruçaram sobre a questão da moralidade, destacar-se-á,
neste capítulo, Piaget e Kohlberg. O primeiro por ser considerado aquele que desencadeou
uma série de estudos sobre a moralidade dentro do enfoque cognitivista-construtivista, e o
segundo por ser considerado o autor que mais influenciou, a partir de 1970, os estudos em
Psicologia do desenvolvimento moral. Contudo, antes da apresentação dos referidos autores,
considera-se relevante fazer um breve percurso histórico sobre a noção de moralidade.
1.1. Breve percurso histórico sobre a noção de moral
A palavra moral tem sua origem no latim mos, moris, que significa "maneira de se
comportar regulada" e de moralis, morale, adjetivo que se refere ao que é "relativo aos
costumes" (Vázquez, 2002). A moral é definida, no dicionário Aurélio, como um “conjunto
de regras de conduta consideradas como válidas, quer de modo absoluto para qualquer tempo
ou lugar, quer para grupo ou pessoa determinada (...)” (Ferreira, 2005, p. 604). Todavia, como
se sabe, a definição do que é moral não é algo fácil. Trata-se de um conceito que, no decorrer
23
da história, sofreu variações em conformidade com o tempo, o local e os autores que o
elaboraram.
Conforme comentam Aranha e Martins (1993), as primeiras reflexões sobre a moral
foram sistematizadas pelos filósofos gregos, que defendiam uma concepção moral reflexiva,
estabelecida a partir de convenções humanas, independente de crença religiosa e baseada no
pressuposto de que a moral são virtudes passíveis de serem alcançadas quando o homem é ou
torna-se sábio. Na Psicologia, o estudo da moralidade começou a se destacar recentemente, se
comparado ao de outras áreas de conhecimento.
A preocupação com os problemas morais está presente na obra de Freud desde o
primeiro momento. Para Freud, a moral é vista, sobretudo, como elaborada durante o
desenvolvimento filogenético e o desenvolvimento ontogenético. Nos Três ensaios sobre a
sexualidade (Freud, 1905/1976), Freud focaliza a censura moral por meio de mecanismos de
inibição, considerados também como barreiras e defesas. Esses mecanismos impediriam a
criança de realizar suas pulsões sexuais parciais, quando a satisfação dessas pulsões pudesse
vir a causar mais desprazer do que prazer. Com o desenvolvimento de sua teoria, ao retornar a
questão moral, Freud (1923/1976) introduz a idéia de superego para explicar a forma como as
pessoas passam a controlar as suas pulsões. O superego emerge para resolução do Complexo
de Édipo. No final do período fálico, quando frente ao desejo da criança de ter a sua mãe e
frente à percepção de que a figura paterna é um obstáculo para a satisfação desse desejo,
surgem na criança sentimentos de hostilidade contra o pai, o desejo de suprimi-lo, e de par
com este desejo, emergem medos sobre a forma de uma ameaça de castração. É este conjunto
de sentimentos que Freud denominou de Complexo de Édipo. O Complexo de Édipo tende a
se intensificar, e, diante das impossibilidades de satisfazer os seus desejos e para evitar o
sentimento de medo, a solução encontrada pela criança reside na identificação com o pai, na
repressão dos sentimentos e na interiorização das normas adotadas pela figura paterna. Após
24
formado, o superego se apropria dos valores religiosos e sublimes e passa orientar o eu sobre
o que deve e não deve ser feito, tendo assim uma função avaliativa. Porém, o superego só se
solidifica na adolescência, após a passagem pelo período denominado por Freud de latência.
A teoria comportamental apresenta, basicamente, duas vertentes de estudo sobre a
moralidade que se destacam: a Teoria da Aprendizagem Social (Bandura, 1969/1979, 1999) e
a Análise do Comportamento (Skinner, 1974/1982, 1953/1989). Skinner (1974/1982) atribui a
aprendizagem de comportamentos morais às contingências ambientais. Em sua análise, os
comportamentos morais são frutos do ambiente e são controlados por regras mantidas sob o
domínio de antecedentes verbais, sob a forma de instruções, ou por regras mantidas por suas
conseqüências diretas. Bandura (1969/1979), por sua vez, se esquiva dos pressupostos da
teoria comportamental clássica e descarta a possibilidade de se poder explicar à aquisição de
comportamentos morais apenas a partir do processo de reforçamento, punição e do reflexo
condicionado. Nos seus trabalhos ele destaca o papel da imitação na aprendizagem de
comportamentos pró-sociais (Bandura & Huston, 1961).
Note-se que tanto para a teoria comportamental quanto para a teoria psicanalítica, a
moral é vista como algo que vem de fora e que é internalizado. No primeiro caso por
intermédio da imitação ou de outras contingências ambientais, no segundo, pela ação do outro
na construção do superego. É apenas com o construtivismo de Piaget e com o enfoque
kohlberguiano que se ressalta o papel do ser humano como um agente do processo moral, que
tem a capacidade de julgar algo como certo e errado.
Na análise de Camino e Luna (2005), Piaget e Kohlberg divergem das visões
comportamentalista e psicanalítica na medida em que, embora considerem em suas teorias
acerca da moral que há um processo interveniente representacional que é aprendido,
concebem a aprendizagem de comportamentos morais como algo vinculado à formação das
estruturas cognitivas e decorrente de um processo dinâmico pelo qual o sujeito reconstrói
25
internamente suas ações no mundo. As teorias de Piaget e Kohlberg serão apresentadas a
seguir, nos tópicos 1.2. e 1.3.
1.2. A perspectiva de Piaget
O estudo de Piaget (1932/1994) sobre o desenvolvimento moral pode ser
particularmente encontrado em sua obra O julgamento moral na criança. Este texto pode ser
entendido como a primeira tentativa de Piaget de submeter suas idéias sobre a moral a uma
verificação empírica. Neste trabalho, o epistemólogo relata pesquisas realizadas com
diferentes crianças e adolescentes acerca de suas concepções sobre três aspectos do
desenvolvimento moral: as regras morais, o julgamento moral e a noção de justiça.
De um modo geral, em todos os aspectos estudados, Piaget observou a evolução de
duas grandes estruturas que ontogeneticamente se sucedem na medida em que a criança se
torna mais velha e mostra-se menos egocêntrica: a da moral heterônoma e a da moral
autônoma. A moral heterônoma, fruto das limitações intelectuais da criança do período da
primeira infância e da coação do adulto, caracteriza-se pela obediência e pelo respeito
unilateral. Contrariamente, a moral autônoma, produto dos avanços cognitivos, das relações
sociais igualitárias e da argumentação racional, típica do início da adolescência, caracteriza-se
pela cooperação e pelo respeito recíproco.
No que se refere às regras, Piaget (1932/1994), a partir da observação de como as
crianças jogam e de perguntas feitas no curso de jogos espontâneos (como o de bolinhas de
gude), dirigiu suas constatações no sentido de explicar de que forma as crianças se ajustam às
regras (ou seja, como as praticam) e de que forma adquirem consciência e domínio dessas
regras (Piaget, 1932/1994). Em relação à prática das regras, Piaget identificou quatro estágios:
26
(1) no primeiro estágio (0-2 anos), identificado como estágio motor, as crianças não fazem
uso das regras e se detêm a uma manipulação motora e individual do objeto da brincadeira;
(2) no segundo estágio (2-5 anos), denominado de egocêntrico, as crianças aceitam as regras
apresentadas e jogam imitando o exemplo, porém ainda jogam para si, mesmo quando em
grupo, e utilizam as regras individualmente; (3) no terceiro estágio (a partir dos 7/8 anos),
identificado como o estágio da cooperação nascente, as crianças procuram vencer o outro, o
que promove a necessidade de sistematização da regra, mas, ainda prevalece uma
diferenciação considerável no que se refere à informação de qual é a regra geral do jogo; (4)
no quarto estágio (a partir dos 11/12 anos), compreendido como o estágio da codificação das
regras, as regras são definidas e entendidas de forma detalhada por todos os jogadores, pois
agora as regras fazem parte da sociedade. Quanto à consciência das regras, Piaget identificou
três: (1) no primeiro estágio, a criança ao brincar não manifesta noção de regra ou consciência
moral, e depende simplesmente da regularidade motriz, fundamentadas nos gestos de
repetição imitativa; (2) no segundo estágio, a regra é considerada como sagrada e imutável, de
origem adulta e de essência eterna e, nesse sentido, toda modificação proposta é considerada
pela criança como uma transgressão; (3) no terceiro estágio, a regra é considerada como uma
lei imposta pelo consentimento mútuo, cujo respeito é obrigatório, mas, nesse caso, existe
uma permissividade de mudança da regra, desde que haja consenso. Note-se que, utilizando a
lógica das estruturas ontogenéticas de heteronomia e de autonomia, na transição de um
estágio para o outro, a criança faz um percurso que a conduz de uma amoralidade, passando
por uma heteronomia moral até chegar à desejada autonomia moral.
A partir das respostas das crianças a dilemas morais, Piaget teorizou acerca do
julgamento moral. Nesse caso, ele apresentou uma série de histórias hipotéticas que
descreviam ações em termos de intenções antagônicas (boas ou más), associados às
conseqüências menos graves para a intenção má. Ao analisar as respostas das crianças, Piaget
27
distinguiu dois tipos de julgamentos: julgamento pelas conseqüências (responsabilidade
objetiva) e julgamento pelas intenções (responsabilidade subjetiva). O primeiro é típico de
crianças mais novas que avaliam os atos pelas suas conseqüências, e não por sua intenção.
Para essas, quanto maior o “estrago” da ação, maior será a responsabilidade do agente, mesmo
que seja de forma não intencional, pois o mais importante é obedecer aos mais velhos, ser
agradável e ser aceita por eles. O segundo é fruto da descentração cognitiva, quando a criança
começa a perceber a intencionalidade dos atos e dá-se conta das conseqüências distintas que
as ações possuem. No julgamento pelas intenções, o que importa não é o tamanho do
“estrago” da ação, mas o fato da pessoa ter tido ou não intenção de causar um dano. Note-se
que subjacente a esses dois tipos de julgamentos estão, respectivamente, as estruturas
ontológicas de heteronomia e de autonomia.
No que tange a noção de justiça, Piaget, por meio de dilemas morais que
problematizam a questão do que é uma sanção justa e do que é uma distribuição justa,
destacou três tipos: a justiça imanente, a justiça retributiva e a justiça distributiva. A primeira,
a justiça imanente, baseia-se no princípio de que as regras devem ser acatadas e obedecidas
simplesmente por serem regras e, além disso, desobedecê-las pode acarretar acidentes físicos
ou problemas desagradáveis, determinados por Deus ou por uma autoridade. A segunda, a
justiça retributiva, está relacionada à idéia de sanção, em que o ato deve ser corrigido com
uma punição. Na justiça retributiva, há dois tipos de sansões, a expiatória, que está
relacionada à coação adulta e a proporcionalidade entre o sofrimento imposto e a gravidade da
falta, e a por reciprocidade, que é mais desenvolvida e tem por objetivo fazer com que o
indivíduo compreenda o significado da falta. No que se refere à justiça distributiva, os estudos
de Piaget revelaram a existência de três períodos evolutivos: no primeiro período, a criança
fundamenta seu julgamento distributivo no respeito unilateral e na obediência e, dessa forma,
considera justa uma distribuição que esteja de acordo com as determinações estabelecidas
28
pelas figuras de autoridade; no segundo período, a criança se guia pelo princípio do
igualitarismo absoluto e considera justa uma distribuição em que todos recebam exatamente o
mesmo benefício ou punição; no terceiro período, por sua vez, a criança baseia seu
julgamento distributivo no princípio da eqüidade, o que significa dizer que nesse período
existe uma ponderação das condições e características individuais das pessoas que se
beneficiarão com a distribuição.
Complementando as idéias empíricas e teóricas contidas no livro O Julgamento moral
na criança, Piaget escreveu, também, Os procedimentos de educação moral (1930/1996), O
espírito de solidariedade e a colaboração internacional (1931/1998), É possível uma
educação para a paz? (1934a/1998), Observações psicológicas sobre o self-government
(1934b/1998), A educação da liberdade (1945/1998), entre outros. Nesses textos ele realiza
discussões acerca do papel da cooperação, da reciprocidade e da moral autônoma,
relacionando esses conceitos à questão da educação moral. Neste sentido, esses trabalhos
serão apresentados no tópico 1.6., que se dedica à explanação do tema educação moral.
1.3. A perspectiva de Kohlberg
Lawrence Kohlberg, psicólogo estadunidense, contemporâneo de Piaget, se dedicou a
estudar o desenvolvimento moral, retomando e aperfeiçoando, conforme relata o próprio
Kohlberg (1969), a idéia de justiça de Sócrates e Platão e as teorias cognitivodesenvolvimentistas de Baldwin (1906, citado por Kohlberg, 1969), Dewey (1930, citado por
Kohlberg, 1969), Mead (1934, citado por Kohlberg, 1969), Piaget (1948/1998) e Loenvinger
(1966, citado por Kohlberg, 1969).
29
Kohlberg, em sua tese de doutorado, realizou estudos longitudinais nos Estados
Unidos, utilizando-se de dilemas morais, nos quais solicitava aos participantes que
apontassem soluções para os dilemas e justificassem suas respostas. De um modo geral, os
dilemas expunham os entrevistados a situações limites, o que remetia a profundas dúvidas
sobre a opção mais correta que se deveria tomar. A título de ilustração, segue-se o dilema do
Prisioneiro Foragido, que será utilizado no segundo e terceiro estudos na presente tese de
doutorado. É importante registrar que o dilema do Prisioneiro Foragido compõe o Moral
Judgment Interview (MJI), instrumento criado por Kohlberg (1964), e foi utilizado por Rest
(1975) como um dos seis dilemas constituintes do instrumento denominado Defining Issues
Test (DIT).
Um homem foi condenado à prisão por dez anos. Depois de um ano, porém, ele fugiu da
cadeia, mudou-se para uma região nova do país, e tomou o nome de Simões. Durante oito anos
ele trabalhou duro, tanto que conseguiu economizar dinheiro suficiente para ter seu próprio
negócio. Ele era muito gentil com seus fregueses, pagava altos salários a seus empregados e
dava muito dos seus lucros pessoais para obras de caridade. Um certo dia, dona Cida, uma
velha vizinha, reconheceu-o como o homem que tinha fugido da prisão, e a quem a polícia
estava procurando. Dona Cida deveria entregar o Sr. Simões à Polícia? Por que? (tradução de
Camino & Luna, 1989).
Kohlberg, após análise dos dados de suas pesquisas, desdobra as fases preconizadas
por Piaget em três níveis de julgamento moral, denominados pré-convencional, convencional
e pós-convencional. Esses níveis, por sua vez, foram subdivididos, por ele, em seis estágios,
conforme será apresentado a seguir.
O nível pré-convencional, onde se situam os estágios 1 e 2, corresponde à perspectiva
sócio-moral individual concreta. Para os integrantes deste nível, as regras são externas ao eu.
Não existe ainda a percepção convencional das regras. Estariam neste nível moral a maioria
das crianças até os nove anos de idade, alguns adolescentes e muitos adolescentes e adultos
criminosos (Colby & Kohlberg, 1984).
O estágio 1, denominado por Colby e Kohlberg (1987) de moralidade heterônoma, é
caracterizado pela obediência às regras e à autoridade – o certo é evitar infringir as regras,
30
obedecer por obedecer e evitar causar danos físicos a pessoas e propriedades. Isto é, o que
define se algo está certo ou errado é a autoridade, não a cooperação entre iguais. É neste
sentido que Kohlberg (1981), em uma edição anterior, define o estágio 1, como o estágio de
orientação à obediência. Há, também, neste estágio, uma perspectiva egocêntrica, pois o
sujeito não considera o interesse dos outros ou não reconhece que o ponto de vista deles difere
do seu.
O estágio 2, por sua vez, denominado de moralidade individualista instrumental ou
orientação relativista instrumental (Kohlberg, 1981), caracteriza-se por uma perspectiva
individualista concreta, onde o certo é agir para satisfazer os interesses e necessidades
próprias e deixar que os outros façam o mesmo, ou ainda, o certo é uma troca igual, uma
transação, um acordo.
No nível convencional, que abarca os estágios 3 e 4, o justo e o injusto não se
confundem mais com o que leva à recompensa ou ao castigo. Este nível se caracteriza pela
conformidade às normas sociais e morais vigentes. Neste caso, o eu se identifica com as
expectativas dos outros e há consciência e respeito quanto à convencionalidade das regras, já
internalizadas, vistas como necessárias e decorrentes das relações de cooperação. Assim, o
indivíduo que está no nível de moralidade convencional é aquele que procura viver conforme
as regras estabelecidas, com o que é socialmente aceito e compartilhado pela maioria,
respeitando a ordem estabelecida. Portanto, há uma tendência a agir de modo a ser bem visto
aos olhos dos outros. É o nível da maioria dos adolescentes e adultos da sociedade norteamericana (Colby & Kohlberg, 1984) e de outras sociedades, inclusive a brasileira (Biaggio,
1976).
O estágio 3 do nível convencional corresponde à moralidade normativa interpessoal,
para a qual as expectativas familiares ou do grupo é que contam. Existe, neste caso, uma
preocupação em desempenhar o papel de uma pessoa boa (amável), preocupar-se com os
31
outros e seus sentimentos, ser leal e manter a confiança dos parceiros, estar motivado a seguir
as regras e expectativas. Nesse estágio, o indivíduo tem a necessidade de ser bom e correto
aos seus olhos e aos olhos dos outros, é o estágio da regra de ouro: aja com os outros como
gostaria que eles agissem com você.
O estágio 4 é o da moralidade do sistema social, que já foi denominado por Kohlberg
(1981) de orientação da manutenção social. O sujeito busca fazer seu dever na sociedade,
apoiar a ordem social, manter o bem-estar da sociedade ou do grupo; ademais, valoriza o
cumprimento dos deveres com os quais concordou e apóia as leis.
Finalmente, no nível pós-convencional, que inclui os estágios 5 e 6, o indivíduo
diferencia o eu das regras e expectativas dos outros e define seus valores em função dos
princípios que internalizou. Este nível é alcançado, conforme cita Colby e Kohlberg (1984),
por uma minoria dos adultos e geralmente só depois dos 20 ou 25 anos de idade.
O estágio 5 corresponde à moralidade dos direitos humanos e do bem-estar social,
antes denominada orientação do contrato social (Kohlberg, 1981). Neste estágio, o direito, os
valores e os contratos sociais básicos de uma sociedade são sustentados, mesmo quando em
conflito com regras e leis concretas de um grupo. Há, neste caso, o reconhecimento de que os
valores variam de cultura para cultura, mas que existem valores e direitos não relativos como
os direitos à vida e à liberdade que devem ser defendidos sempre. Nesta ótica, pode-se dizer
que o sujeito valoriza o ponto de vista da lei, mas sempre conta com a possibilidade de mudar
a lei em função de considerações racionais ou de utilidade social. Quando não há lei, a
obrigação é definida pela livre concordância ou pelo contrato entre as partes.
O estágio 6 corresponde à moralidade dos princípios éticos gerais, universalizáveis,
reversíveis e prescritivos, antes denominada orientação do princípio ético universal
(Kohlberg, 1981). Sua perspectiva é o princípio ético universal de justiça que engloba os
seguintes conceitos: dignidade inviolável da humanidade, liberdade, solidariedade e
32
igualdade. Quanto as Leis, elas são válidas se seguirem estes princípios; se os violarem, não
se deve obedecê-las, pois o princípio é superior à lei; os princípios têm validade
independentemente da autoridade de grupos ou pessoas que os sustentem, bem como da
identificação do sujeito com tais pessoas e grupos. Neste caso, o certo é definido por uma
decisão de consciência (autônoma, racional, lógica e coerente) e o que conta são princípios
éticos abstratos, não regras morais concretas.
É importante registrar que Kohlberg, Levine e Hewer (1983) questionaram a
existência do estágio 6, quando eles verificaram a ausência de evidências empíricas que
comprovassem sua existência; por outro lado, eles justificaram a necessidade de continuar a
postulá-lo enquanto construto teórico por percebê-lo como um estágio final.
Os estágios morais preconizados por Kohlberg estão resumidos no Quadro 1.
Quadro 1. Estágios de desenvolvimento moral de Kohlberg
Estágio 1
Moral heterônoma
Estágio 2
Propósito instrumental e
troca
NÍVEL I: PRÉ-CONVENCIONAL
Evitar quebrar normas com base na punição e na obediência e evitar danos
físicos às pessoas e à propriedade.
Seguir normas apenas quando for de interesse imediato de alguém; agir para
satisfazer seus próprios interesses e necessidades e deixar que os outros façam
o mesmo.
NÍVEL II: CONVENCIONAL
Estágio 3
Expectativas interpessoais
mútuas
Pôr em prática o que é esperado pelas pessoas próximas a você ou o que as
pessoas geralmente esperam das outras em seus papéis de filho, irmão, amigo
etc. “Ser bom” significa manter relações mútuas, tais como confiança, lealdade,
respeito e gratidão.
Estágio 4
Ordem social
Estágio 5
Acordo social e consenso
Estágio 6
Princípios éticos universais
Cumprir os deveres reais com os quais você pactuou. As leis devem ser
mantidas, exceto em casos extremos onde elas entrem em conflito com outros
deveres sociais estabelecidos.
NIVEL III: PÓS-CONVENCIONAL
Manter as normas relativas aos grupos, quando provenientes de um contrato
social. Valores não-relativos e corretos, como a vida e a liberdade, entretanto,
deveriam ser mantidos em qualquer sociedade indiferentemente da opinião da
maioria.
Seguir princípios éticos auto-escolhidos. Quando as leis violam estes
princípios, a pessoa deste estágio age de acordo com o princípio. Os princípios
são universais de justiça: a igualdade dos direitos humanos e o respeito pela
dignidade dos seres humanos como pessoas individuais.
Nota: Adaptado de Kohlberg (1976, citado por Lickona, 1976)
33
Sobre os estágios morais, Kohlberg ainda afirma que a seqüência dos mesmos aparece
em todas as culturas, o que tem sido confirmado em pesquisas realizadas por Colby e
Kohlberg (1984) e em uma revisão, realizada por Snarey (1985), de mais de 40 pesquisas
referentes a 27 culturas, que dão evidência para a noção de que a seqüência de estágios se
mantém nas várias culturas, com algumas nuances, atribuídas a fatores culturais, mas que não
ameaçam a idéia de universalidade defendida por Kohlberg.
Além da idéia do universalismo dos estágios, Kohlberg (1969), com base nos
pressupostos de Piaget (1960, citado por Kohlberg, 1969) acerca do desenvolvimento
cognitivo e em suas pesquisas realizadas entre 1958 e 1978, sustenta as seguintes afirmações
acerca dos estágios:
(1) o desenvolvimento cognitivo (pensamento lógico) é condição necessária, ainda que
não suficiente, para o desenvolvimento moral;
(2) o desenvolvimento envolve transformações das estruturas cognitivas;
(3) as transformações das estruturas são resultados de interações entre o sujeito e o meio
ambiente;
(4) as estruturas desenvolvem-se mediante um processo de equilibração;
(5) a justiça é a essência do desenvolvimento moral;
(6) a seqüência dos estágios morais é hierárquica e invariante;
(7) pode-se parar em qualquer estágio moral, em qualquer idade, porém o
desenvolvimento continua, prossegue a partir do estágio que parou, sem pular ou
inverter a ordem dos seguintes;
(8) ao atingir o nível mais avançado de organização, o indivíduo prefere agir com base
neste nível, o que não significa que o pensamento do estágio anterior desapareceu;
(9) as condições sociais, culturais e religiosas não interferem na natureza seqüencial dos
estágios, apenas na velocidade com que se evolui e no ponto máximo que se atinge.
34
Note-se que as considerações de Kohlberg pontuadas acima, mais precisamente a idéia
de universalidade e de seqüencialidade dos estágios de desenvolvimento moral, ao mesmo
tempo em que são um dos pontos mais fundamentais da teoria de Kohlberg, são também as
idéias mais criticadas na literatura. No próximo tópico, este debate será retomado com a
apresentação de outras perspectivas acerca do desenvolvimento moral.
1.4. Críticas a teoria kohlberguiana
Outras perspectivas foram levantadas acerca do desenvolvimento moral, algumas delas
pelos próprios orientandos de doutorado de Kohlberg. Esses autores além de acrescentarem e
refinarem a teoria kohlberguiana, teceram algumas críticas e contestaram suas idéias.
Inicialmente, destacar-se-á Turiel (1983), o primeiro orientando de doutorado de
Kohlberg, que discordou da idéia kohlberguiana (1984) de que as pessoas primeiro passam
pelo nível pré-convencional (moral heterônoma), para depois atingirem o convencional
(internalização das normas sociais), para, só depois, alcançarem o nível pós-convencional
(princípios autônomos de consciência). A partir desta crítica Turiel propôs a existência de três
domínios, que se desenvolvem paralelamente, desde a infância: o pessoal (aquele em que a
escolha não tem implicações sociais nem morais, como o corte de cabelo que uma pessoa
adota), o convencional (aquele que se refere às regras sociais arbitrárias, como a maneira de
comer com talheres) e o moral (aquele que implica na consideração do bem e do mal da outra
pessoa). Na concepção de Turiel (1983), crianças pré-escolares já são capazes de diferenciar
meras convenções sociais de princípios morais obrigatórios (semelhante ao que Kohlberg
chama de pensamento pós-convencional), conforme este exemplo: derrubar uma criança do
35
balanço é considerado mais grave do que comer com as mãos, mesmo por crianças do
maternal.
O orientando de Turiel, por sua vez, Larry Nucci, em seus estudos (Nucci, Camino &
Sapiro, 1996; Nucci, Turiel & Encarnación-Gawrich, 1983) apoiou as idéias de Turiel e
constatou que a distinção entre convenção e moralidade aparece desde cedo nas mais
diferentes culturas, segundo resultados encontrados em mais de 50 estudos desenvolvidos
desde 1975 (Nucci, 2001). Essas pesquisas indicaram que tanto crianças, como adolescentes e
adultos tratam violações da moralidade, tais como causar mal a outra pessoa, como erradas,
independente de existir uma norma estabelecida. Note-se que esta distinção entre moralidade
e convenção foi obtida no Brasil (Nucci, Camino & Sapiro, 1996), assim como nas Ilhas
Virgens (Nucci, Turiel & Encarnación-Gawrich, 1983), Índia, Israel, Coréia, Nigéria, Zâmbia,
dentre outros contextos culturais (Nucci, 2001).
O antropólogo Richard Shweder, juntamente com seus colaboradores (Shweder,
Mahapatra & Miller, 1987), analisando a questão da cultura de uma perspectiva oposta a dos
kohlberguianos e neokohlberguianos, ressalta que as diferenças culturais explicam maior
variância do que os domínios de Turiel ou os estágios de Kohlberg, argumentando que
encontrou evidências que os participantes indianos não distinguem transgressões
convencionais das morais: considera-se tão grave uma viúva comer peixe quanto machucar
uma criança, empurrando-a do balanço. Apoiando esses resultados, Haidt, Koller e Dias
(1993), usando histórias como a de uma família que come o seu cachorro de estimação, depois
que o cão foi morto por um carro, constataram que o julgamento moral varia em função da
cultura. Contudo, de forma surpreendente, as diferenças culturais entre as classes sociais
dentro de cada país foram maiores do que as diferenças entre os países (EUA x Brasil). A
respeito da crítica do antropólogo e seus colaboradores, Kohlberg, Levine e Hewer (1983) a
rebatem afirmando que apesar das aparentes diferenças culturais, a moral possui uma mesma
36
base racional, revelada em diferentes estudos realizados em várias culturas, nos quais se
verificou a ordem invariante e progressiva dos estágios morais.
Simpson (1974, citado por Kohlberg, Levine & Hewer, 1983), por sua vez, critica a
teoria kohlberguiana nos seguintes aspectos: (1) a falta de evidência empírica para comprovar
a seqüência de estágios em várias culturas; (2) a ausência dos estágios 5 e 6 nas culturas
orientais; (3) a possibilidade dos estágios 5 e 6 não refletirem uma estrutura do pensamento,
mas sim uma sofisticação lingüística; e (4) a possibilidade de ocorrerem falhas de avaliação
pelo fato do conteúdo de dilemas morais não serem familiares aos sujeitos testados e não
provocarem o conflito esperado. Em relação a essas críticas, Kohlberg et al. (1983) defendemse afirmando que: os estágios 5 e 6 não precisam ser e não são culturalmente universais; o
fato de não atingir o pensamento pós-convencional também é observado na cultura ocidental;
o estágio 5 também foi encontrado em vários países orientais. Sobre a crítica da linguagem
sofisticada atrelada ao pensamento pós-convencional, Kohlberg et al. (1983) comentam que o
sistema de avaliação aberto não exclui respostas simples sem sofisticação lingüística, desde
que se enquadre no pensamento pós-convencional. Em relação à crítica sobre a nãofamiliaridade do conteúdo de dilemas morais, Kohlberg et al. (1983) rebatem dizendo que em
pesquisas transculturais foram realizadas adaptações dos dilemas.
Sullivan (1977, citado por Kohlberg, Levine & Hewer, 1983) também aponta uma
série de críticas à teoria kohlberguiana, dentre as quais dar-se-á destaque a apenas uma que
está mais diretamente relacionada a presente tese: a teoria é insuficiente por não considerar
fatores como emoção e imaginação moral. Em relação a esta crítica, Kohlberg et al. (1983),
consideram-na construtiva e afirmam concordar com Sullivan sobre o papel dos processos
afetivos na construção do julgamento moral, devendo, neste sentido, ser ampliada para
estudos que contemplem aspectos afetivos.
37
Também criticando a negligência da teoria de Kohlberg em relação às questões
afetivas, Hoffman (1991) chama a atenção para a necessidade de incorporar a motivação e a
empatia na análise de questões morais. Embora ele não negue que a reflexão também esteja
presente no processo de deliberação moral, em sua perspectiva, é a motivação e a empatia que
determinam, em muitos casos, como o indivíduo deve agir em situações da vida real.
Apoiando a defesa de Sullivan e Hoffman sobre o papel da afetividade no
desenvolvimento moral, Camino (2009) considera oportuno o questionamento sobre a
ausência de componentes afetivos na avaliação do raciocínio moral. De acordo com essa
autora, mesmo que o interesse maior seja a análise do raciocínio, não se pode esquecer a
influência da afetividade sobre o julgamento moral – o que já foi encontrado em estudos
empíricos (Camino, Camino & Leyens, 1996; Sampaio, Monte, Camino & Roazzi, 2008).
Também fundamentada em pesquisas realizadas sob sua orientação, Camino (2009)
critica a idéia do avanço do pensamento moral de um estágio para outro, defendido por
Kohlberg (1969). Em estudos realizados por Camino e colaboradores (Lins & Camino, 1993;
Rique & Camino, 2007), contrariando a teoria kohlberguiana, os autores observaram, por
intermédio da educação moral, que era possível, durante o período de um ano, que
adolescentes e jovens adultos avançassem mais de dois estágios de desenvolvimento moral.
Gilligan (1982), por sua vez, fazendo uma análise dos estágios morais kohlberguianos
em função do gênero, põe em cheque a questão do universalismo da teoria kohlberguiana. Na
sua perspectiva, os homens tendem a ver a moralidade como uma questão de justiça, baseada
em princípios abstratos e raciocínios que permitem tratar todos os indivíduos justamente, e as
mulheres vêem a moralidade em termos da compaixão, das relações humanas e das
responsabilidades especiais para com aqueles a quem se estima. Na leitura de Gilligan (1982)
não se pode falar em mais ou menos moral, mas em morais diferentes. Ademais, Gilligan
destaca críticas metodológicas que levaram a dados empíricos que demonstraram
38
equivocadamente a superioridade do pensamento moral masculino. Sobre as críticas teóricas
da autora, Kohlberg, Levine e Hewer (1983) julgam pertinente sua ponderação acerca de uma
outra orientação moral voltada para o cuidado, típica das mulheres, contudo, eles rebatem sua
crítica metodológica, lembrando que: (1) foram realizados outros estudos em que se incluiu a
amostra feminina; e (2) foram realizadas reformulações no sistema de avaliação do MJI, no
sentido de priorizar o raciocínio moral e não seu conteúdo.
Para finalizar, tem-se James Rest, o autor de um dos instrumentos que será utilizado
nesta tese – Defining Issues Test (DIT). Rest (1976) levanta algumas críticas a teoria
kohlberguiana da moral, dentre as quais destaca-se aqui a referente ao desenvolvimento
moral, defendido por Kohlberg como ocorrendo em uma seqüência invariante de estágios
sucessivos, sem mistura de estágios. Em lugar da seqüência hierarquizada de estágios puros,
Rest (1976) preconiza uma seqüência formada por um estágio dominante e outros estágios
adjacentes. Em relação a essa seqüência, Rest, Navaez e Thoma (1999) apresentam evidências
empíricas, a partir de uma amostra de 45.800 participantes, usando o instrumento DIT. Além
dessas evidências, as pesquisas com o DIT revelaram que: (1) o pensamento pós-convencional
existe; (2) o DIT se estrutura em três fatores, coerentes com a teoria kohlberguiana – interesse
pessoal, manutenção das normas e pensamento pós-convencional; (3) estudos transculturais
revelam que o pensamento pós-convencional não é uma exclusividade das elites acadêmicas
ocidentais; (4) estudos de intervenção comprovam a ontogênese para cima.
Até o presente momento, foi apresentado um breve percurso historio sobre a noção de
moral, dando destaque as teorias de Piaget e Kohlberg, bem como as sugestões e críticas à
teoria kohlberguiana. Nas próximas seções serão apresentados e discutidos tópicos mais
relacionados ao plano empírico, dando-se destaque a avaliação no campo da moralidade e a
educação moral.
39
1.5. A avaliação no campo da moralidade e estudos empíricos
A psicologia moral, graças à preocupação com a verificação empírica dos fenômenos,
tem contribuído para a elaboração de uma série de instrumentos de avaliação, o que permite,
na análise de Cronbach (1996), que a psicologia moral não seja apenas uma filosofia
introspectiva do componente psicológico do fenômeno moral.
O primeiro estudo da moralidade foi atribuído a Osborne (1894, citado por Escrivã,
Pérez-Delgado & Brotons, 1991), que, com o objetivo de descobrir o conhecimento ético de
crianças, utilizou um questionário semi-estruturado que pedia aos participantes que
indicassem que ações deveriam ter uma criança com a finalidade de ser chamada boa ou má.
Os resultados indicaram que as normas eram mais importantes para avaliar o bem e o mal do
que qualquer outro critério específico e a obediência e a verdade eram os aspectos mais
salientes do sistema ético das crianças.
Quatro anos depois, Sharp (1898, citado por Escrivã, Pérez-Delgado & Brotons, 1991)
publicou um estudo que tinha por finalidade introduzir um método objetivo para estudar os
problemas morais. O instrumento proposto por Sharp era composto por dez situações
hipotéticas que buscavam avaliar crenças morais, conforme a exemplificada a seguir:
Há alguns anos, em um descarrilamento de trem, uma senhora caiu entre os escombros de
modo que foi impossível escapar. Seu marido, que podia ter saído com um certo esforço,
decidiu deliberadamente permanecer junto a sua esposa e morreu com ela, para ajudá-la e darlhe consolo mediante sua presença nos seus últimos momentos. Ela, como supomos, não era
consciente da possibilidade de seu marido poder escapar, de outro modo não teria aceitado a
sua presença (Sharp, 1898, citado por Escrivã, Pérez-Delgado & Brotons, 1991).
Neste instrumento, Sharp (1898, citado por Escrivã, Pérez-Delgado & Brotons, 1991)
manipulava os determinantes motivacionais da ação, mediante proposições, e pedia que os
participantes contestassem os problemas morais implicados e justificassem seus
posicionamentos. No caso exemplificado, eram apresentadas proposições do tipo: “Se o
40
marido fosse um cientista, consciente de que estava a ponto de solucionar o problema do
telégrafo elétrico”; “Se o marido fosse um artista de talento excepcional”.
Após a apresentação desses dois estudos clássicos que antecederam 1900, pode-se
organizar, segundo Escrivã, Pérez-Delgado e Brotons (1991), os estudos acerca do fenômeno
moral em três grandes períodos, de acordo com o uso predominante de um tipo de
instrumento.
O primeiro período, que vai de 1900 a 1930, se caracteriza pelo predomínio do uso de
instrumentos do tipo lápis e papel, voltados para diferenciar crianças e adolescentes “normais”
de crianças e adolescentes com tendências delitivas (Brotemarkle, 1922; Fernald, 1912; Kohs,
1922; Lowe & Shimberg, 1925; Maller, 1944; Pressey & Pressey, 1919).
O segundo período, que vai de 1930 a 1950, se caracteriza por um debate mais teórico
acerca do tema e, de forma paralela, ressalta uma mudança no tipo de instrumento utilizado
nas pesquisas. A publicação do livro O juízo moral da criança (Piaget, 1932/1994) reflete
bem este período de teorização acerca das questões morais e de ascensão de novos
instrumentos de pesquisa: enquanto os instrumentos do tipo lápis e papel se fixavam no
conteúdo dos pensamentos morais, Piaget se focou em como se forma este pensamento e, para
tanto, fez uso de entrevistas clínicas. Tem-se também, nesta fase, a introdução do tema
moralidade no contexto dos modelos psicanalíticos e neoconductivistas, que não buscavam
diferenças, como no período anterior, entre delinqüentes e não delinqüentes, procuravam, na
verdade, estudar e avaliar a personalidade dos sujeitos “normais” (Escrivã, Pérez-Delgado &
Brotons, 1991).
O terceiro período (1950 a 1960) é caracterizado pelo uso de técnicas projetivas,
especificamente criadas para medir dimensões morais relevantes para a compreensão do
desenvolvimento do superego e da internalização das normas. Para ilustrar esta técnica, temse o estudo de Allinsmith e Greening (1955), no qual se pedia aos participantes que
41
terminassem uma história que incluía a violação de proibições sociais contra a agressão. Outra
técnica para medir o superego é o IES (Id, Ego e Superego), que inclui quatro sub-testes semiprojetivos.
Nas décadas de 60 e 70 houve, segundo Camino (1979), o predomínio de enfoques
teóricos e estudos empíricos vinculados as visões behavioristas e da teoria da aprendizagem,
destacando-se aqui Eysenck (1960, citado por Camino, 1979), Aronfreid (1965, 1968, citado
por Camino, 1979), Bandura (1969/1979) e Ross (1975, citado por Camino, 1979), que
utilizavam para avaliar a moral, sobretudo, observações em situação de laboratório.
Apenas a partir da década de 80, com a maior divulgação da teoria kohlberguiana que
havia, na verdade, iniciado na década de 50, que começaram a ganhar relevo os instrumentos
de medida do desenvolvimento do raciocínio moral. De acordo com um levantamento
realizado por Díez-Calatrava (1989, citado por Escrivã, Pérez-Delgado & Brotons, 1991), no
período de 1981-1985, destacaram-se o Defining Issues Test (DIT) de Rest (utilizado em 31
dos 103 estudos analisados) e o Moral Judgment Interview (MJI) de Kohlberg (utilizado em
16 dos 103 estudos analisados). Ainda se destacou, nesse período, entre os instrumentos de
avaliação do raciocínio moral, o Sociomoral Reflection Objective Measure (SROM) de Gibbs
et al. (1984).
O MJI é um instrumento criado para avaliar a estrutura do pensamento moral e é
apresentado por Colby e Kohlberg (1987) de três formas paralelas: A, B e C. Cada uma dessas
formas é constituída por três dilemas hipotéticos que colocam o entrevistado frente à escolha
de valores conflitantes. Os dilemas são seguidos por nove a doze questões que procuram obter
justificativas morais aos dilemas. No Brasil, esses dilemas foram adaptados por Biaggio
(1975, citado por Biaggio, 2002).
O DIT, um dos instrumentos que será utilizado na presente tese, é um instrumento
objetivo, que operacionaliza os estágios 2, 3, 4, 5 e 6 da tipologia kohlberguiana. Ele é
42
composto por seis dilemas, sendo três retirados do MJI: O dilema de Heinz, o do Médico e o
do Prisioneiro Foragido, e três retirados da dissertação de mestrado de Lockwood (1970,
citado por Rest 1983): A ocupação pelos estudantes, O proprietários da oficina e O
jornalzinho. Para cada dilema, o participante deve: (1) emitir um juízo geral sobre o que
deveria ser feito em relação ao dilema avaliado; (2) assinalar a importância que concede a
cada uma das 12 proposições que são apresentas para resolução do problema; e (3) eleger as
quatro proposições que ele considera mais importante das 12 avaliadas anteriormente. É
importante dizer que o DIT não é um instrumento para avaliar a estrutura do pensamento
moral, mas sim seu conteúdo – mais precisamente, a preferência das pessoas por
determinados pensamentos. Rest (1975) justificou a importância de seu instrumento dizendo
que as pessoas, quando estão diante de um dilema moral, procuram a opinião do outro, em
lugar de atuarem com base em seus próprios julgamentos.
A validade e fidedignidade do DIT foram calculadas com uma amostra de 45856
participantes entre 1986 e 1993, sendo constatado, de acordo com o que pontuaram Rest e
cols. (1999): confiabilidade comprovada, mediante a observância dos índices de consistência
interna apropriados e dos resultados de teste-reteste e dos resultados no Guttman;
diferenciação de grupos em relação a medidas mais altas ou mais baixas de julgamento moral,
merecendo destaque as diferenças encontradas em função da variável nível educacional; uma
mudança significativa ascendente em estudos longitudinais; sensibilidade em intervenções
direcionadas à Educação moral, com pré e pós testes; correlações positivas entre os escores do
DIT com outras medidas de julgamento moral; correlações entre os escores do DIT com
medidas de comportamento pró-social ou anti-social e com atitudes de escolhas políticas. No
Brasil, o DIT foi traduzido e adaptado por Bulzneck (1975) e reformulado por Camino e Luna
(1989). Na atualidade já existe uma versão mais atualizada do DIT, denominada DIT-2, de
Rest e Navaez (1998), cuja adaptação para o contexto brasileiro foi realizada por Biaggio,
43
Shimizu e Martinez (2001), mas que ainda é pouco utilizada quando comparada a versão
original do DIT.
O SROM, de John Gibbs, apresenta dois dilemas retirados do MJI, seguidos de
perguntas de múltipla escolha, em que cada alternativa corresponde a um estágio de
julgamento moral (1-5, pois Gibbs não propôs alternativas relacionadas ao estágio 6, por ser
raramente encontrado na população). Este instrumento foi adaptado para o contexto brasileiro
por Biaggio (1989, citado por Biaggio, 2002). Biaggio e Barreto (1991), por sua vez, criaram
uma versão visual do SROM, tendo em vista atender as necessidades das pessoas mais jovens
e com um grau de escolaridade menor.
Ao comparar esses três instrumentos (MJI, DIT e SROM), Biaggio (2002) comenta
que o DIT é o instrumento que produz os maiores escores, tendo em vista que sua estrutura
favorece essa superioridade em relação aos demais: não existem itens de estágio 1, há duas
possibilidades de estágio 5 e uma possibilidade de estágio 6 (que inexiste no SROM e é difícil
de ser encontrado por meio do MJI). E, o MJI é o instrumento que apresenta menores escores,
uma vez que parece ser mais fácil reconhecer um estágio como mais adequado, como se faz
no DIT e no SROM, do que produzi-lo por intermédio de uma resposta aberta, como é feito
no MJI.
Apesar da inegável importância desses três instrumentos (MJI, DIT e SROM) para a
avaliação do raciocínio moral, eles são criticados por Yussen (1977) e por Lickona (1978)
pelo fato de se centrarem em dilemas hipotéticos ou em situações demasiadamente abstratas.
Particularmente Yussen afirma que os dilemas hipotéticos pouco descrevem problemas que as
pessoas julgam importantes. Lickona, por sua vez, argumenta que o dilema hipotético é um
recurso limitado e superficial, que tem pouca relação com a vida real. Em função dessas e de
outras críticas, na presente tese, além de se utilizar o DIT, serão elaborados e utilizados dois
dilemas que tratam de temas veiculados pela mídia com personagens reais e conhecidos da
44
população, a saber: o dilema de Sadam Hussein, em que se ressalta a questão da pena de
morte e o dilema de João Hélio, em que se problematiza a questão da redução da maioridade
penal.
A pena de morte foi escolhida por ser um tema moral que tem gerado importantes
debates filosóficos (Kant, Hegel e Schopenhauer) e sociopolíticos (Beccaria, 1764/2003;
Bobbio, 2004) e por tratar-se de uma medida punitiva cuja aplicabilidade tem sido cogitada
pelos poderes legislativos do Brasil. A redução da maioridade penal, apesar de não ter
suscitado discussões filosóficas, nem sociopolíticas, é um tema que, no cenário brasileiro, tem
despertado a atenção de juristas, políticos e acadêmicos: de um lado, existem aqueles que
apóiam a redução da maioridade penal e argumentam, como por exemplo, que é a impunidade
que aumenta a criminalidade e, neste sentido, buscam e lutam pela mudança na lei penal
brasileira (Campos & Souza, 2007); do outro, existem aqueles que se posicionam contrário à
redução e afirmam, por exemplo, que a redução da maioridade penal não diminuirá a
violência, pois o problema é social e não jurídico (Monteiro, 2003). Além disso, diante do
posicionamento de algumas autoridades brasileiras frente à adoção da pena de morte e da
redução da maioridade penal e frente a alguns dados empíricos que mostram uma tendência
de parte da população brasileira a se manifestar de forma favorável a adesão dessas medidas
(Datafolha, 2006; Galvão, Feitosa, Santos & Camino, 2007; Laranjeiras, 2007; Menin, 2005),
julga-se relevante saber como os jovens se posicionam a este respeito.
A seguir serão apresentadas pesquisas realizadas com o MJI, com o DIT e com o
SROM que procuram demonstrar a validade de alguns dos pressupostos de Kohlberg (1969),
como o da universalidade e o da seqüencialidade dos estágios; bem como pesquisas realizadas
sobre a pena de morte e redução da maioridade penal; e, finalmente pesquisas que apresentam
a relação entre a moral e outras variáveis psicossociais. A maioria dessas pesquisas foi
extraída de um levantamento realizado na base de dados do Periódicos Capes, em Junho de
45
2010, tendo como palavra-chave “moral”. Do número significativo de trabalhos encontrados
(PsycINFO = 29235, BIREME = 21164 e Scielo Brasil = 523), apenas serão apresentados
àqueles que se relacionam de alguma forma com a presente tese; ademais, serão excluídos os
estudos que já foram citados ou serão citados em um outro contexto mais pertinente; e, serão
incluídos os estudos que se relacionem com este trabalho, mesmo que não estejam indexados
na base de dados pesquisada.
Kohlberg (1984) realizou uma pesquisa longitudinal, em que os participantes foram
testados com 10, 13 e 16 anos, por meio do MJI, entre os anos de 1956 e 1977. Os resultados
indicaram que, com exceção de um participante, todos avançaram em seus raciocínios morais,
sempre para o estágio adjacente, não havendo pulo de estágios, o que apoiou a idéia de
Kohlberg de seqüencialidade.
Kohlberg (1967, citado por Kohlberg, 1969) realizou um estudo transversal com
jovens do sexo masculino de três faixas etárias, 10, 13 e 16 anos de diferentes culturas
(Taiwan, Grã-Bretanha, México, Yucatán, Turquia e Estados Unidos), utilizando como
instrumento o MJI. Os resultados indicaram que as freqüências de respostas aos estágios 3 e 4
aumentaram dos 10 aos 16 anos, havendo, entretanto, algumas nuances em função do país: no
México e em Taiwan as freqüências do estágio 3 foram mais elevadas; na Turquia e em
Yucatán as do estágio 1, e apenas nos EUA, as freqüências do estágio 5 foram mais altas aos
16 anos.
Kohlberg, Snarey e Reimer (1984) relataram uma pesquisa longitudinal com 92
participantes, de 12 a 26 anos, tanto do sexo masculino, quanto do sexo feminino, residentes
em um kibutz em Israel, utilizando o MJI. Os resultados dessa pesquisa revelaram que, com a
idade, houve avanço em 65,6% dos casos, nenhuma mudança em 28,1% dos casos e regressão
em apenas 6,3% dos casos; além disso, os autores também mencionaram que constataram
consistência nas respostas dos sujeitos: 94% dos participantes raciocinaram em um só estágio
46
ou em dois adjacentes e 6% incluíram em seus raciocínios três estágios adjacentes. Além
disso, esses autores compararam os resultados dessa pesquisa com aqueles obtidos em dois
outros kibutz (um nos Estados Unidos e outro na Turquia) por Colby e Kohlberg (1978, citado
por Kohlberg et al., 1984) e por Nisan e Kohlberg (1982, citado por Kohlberg et al., 1984),
utilizando o MJI. Dessa comparação os autores concluíram que: as freqüências de respostas
do estágio 1, 1/2 e 2 desapareciam com o avanço da idade; as freqüências de respostas do
estágio 2/3 prevaleciam entre os 13 e 18 anos e diminuíam nas idades mais avançadas; as
freqüências de respostas do estágio 3/4 predominavam nas idades dos 16 aos 26 anos; as
freqüências de respostas ao estágios 4 e 4/5 aumentavam com a idade, porém foram inferiores
as do estágio 3/4; não apareciam freqüência aos estágios 5 e 6.
Em um estudo longitudinal, utilizando o MJI, Walker, Gustafson e Hennig (2001)
investigaram a transição de um estágio para o outro. Os resultados encontrados comprovaram
a existência dos estágios propostos por Kohlberg e sua hierarquização, o que já tinha sido
apontado por Snarey (1985), quando ele realizou uma meta-análise com 45 estudos que
utilizaram a abordagem teórica de Kohlberg.
No Brasil, Biaggio (1975, citado por Biaggio, 2002) realizou um estudo em que
comparou os escores médios de maturidade moral de estudantes universitários brasileiros e
norte-americanos, verificados por intermédio do MJI. Os resultados revelaram que não houve
diferença entre as médias dos dois grupos, mas, ao analisar as freqüências de respostas por
estágio, a autora verificou diferenças em função da cultura: enquanto os brasileiros
concentraram suas respostas nos estágios 2, 3 e 5, os norte-americanos concentraram suas
respostas no estágio 4.
Em um outro estudo com o MJI, Biaggio (1976) comparou o raciocínio moral de
crianças e adolescentes brasileiros de 10, 13 e 18 anos com o de crianças e adolescentes norteamericanos de uma pesquisa realizada por Kohlberg (1969). Os resultados demonstraram que
47
tanto na amostra brasileira quando na norte-americana as respostas de estágios 1 e 2
diminuíram com o avanço da idade e as respostas de estágios 4 e 5 aumentaram com a idade.
Porém, na amostra brasileira prevaleceu o estágio 3 nas três faixas etárias e na amostra norteamericana prevaleceu, a partir dos 16 anos, o estágio 5.
Rest e outros pesquisadores (McColgan, Rest & Pruitt, 1983), utilizando o DIT e o
MJI, compararam o julgamento moral de adolescentes presos por cometerem crimes e o de
adolescentes não delinqüentes. Os resultados do DIT revelaram diferenças entre os grupos de
adolescentes não revelados pelo MJI.
Em um estudo longitudinal que durou 10 anos, Rest (1994), utilizando o DIT como
instrumento de medida, constatou que a seqüência dos estágios morais evolui em função da
idade, mas principalmente em função do grau de escolaridade. Conforme comentou Rest
(1994, p. 15): “ao longo da educação formal, os escores dos sujeitos no DIT aumentam, e,
quando os sujeitos interrompem a sua educação formal, os seus escores de julgamento moral
também estacionam”.
Bzuneck (1975, 1979), no Brasil, utilizando o DIT como instrumento de pesquisa,
realizou duas pesquisas de corte transversal, com jovens delinqüentes e não delinqüentes,
constatando igualmente que o nível convencional prevalece nesse grupo. Os resultados desses
estudos revelaram que os escores médios dos não delinqüentes ao estágio 4 foram
significativamente superiores ao dos delinqüentes.
Para testar a seqüencialidade dos estágios morais, utilizando o DIT, Camino, Luna,
Alves, Silva e Rique (1988), realizaram uma pesquisa com estudantes secundaristas (ou seja,
de ensino médio) e universitários. Os resultados revelaram que, com o avanço da
escolaridade, houve uma diminuição significativa das médias dos estágios 2, 3 e 4 e o
aumento significativo dos estágios 5 e 6.
48
Camino, Rique e Araújo (1993), por sua vez, em um estudo longitudinal, constataram,
utilizando o DIT como medida de avaliação, que com o avanço da idade, não houve mudança
na freqüência das respostas do estágio 2, mas houve um aumento significativo na média das
respostas do estágio 3 e um decréscimo na média do estágio 4.
Também para verificar a seqüencialidade dos estágios, Ribeiro (1996), utilizando o
DIT, em uma pesquisa com adolescentes entre 11 e 19 anos, constatou uma diminuição
significativa dos escores médios dos participantes nos estágios 3 e 4 e aumento significativo
dos escores médios dos estágios 5 e 6.
Mais recentemente, analisando a adequabilidade do DIT para o contexto brasileiro,
Shimizu (2004), a partir de uma amostra de 621 estudantes do ensino fundamental e médio,
constatou que, apesar dos índices estatísticos brasileiros serem inferiores a àqueles obtidos nas
versões originais americanas do DIT, o teste é válido para o contexto brasileiro. A maior
pontuação média dos jovens concentrou-se no Estágio 4, sendo que houve algumas variações
em função das variáveis status socioeconômico, nível educacional e região de procedência.
No que tange ao uso do SROM, Gibbs, Basinger e Fuller (1992), constataram
percentagens significativamente mais elevadas de delinqüentes ou jovens com conduta antisocial nos estágios 1 e 2, quando comparados a outros jovens.
No Brasil, utilizando o SROM, destaca-se aqui o estudo de Biaggio e Barreto (1991),
com 40 crianças e adolescentes, entre 9 e 17 anos, do sexo masculino, que freqüentavam as
ruas. Dessas crianças e adolescentes, 20 dormiam em albergue. Os resultados revelaram
escores elevados nos estágios 2 e 3 e nenhuma diferença significativa entre os dois grupos.
No que se refere às pesquisas realizadas acerca da pena de morte e redução da
maioridade penal, constata-se sobretudo uma favorabilidade a essas medidas. Em uma
pesquisa realizada pelo Datafolha, em 2006, 84% dos brasileiros demonstraram apoiar a
redução da maioridade penal e 51% disseram ser favoráveis à pena de morte. Especialmente
49
em relação à redução da maioridade penal, Menin (2005), em uma pesquisa realizada com
adolescentes de escola pública e privada, constatou que 74% dos participantes da escola
pública e 54% dos da escola privada mostraram-se favoráveis à redução da idade para punir
infrações na lei. No que tange especificamente a pena de morte, Laranjeiras (2007) também
encontrou um índice considerável de favorabilidade à pena de morte: 37% dos estudantes
entrevistados concordou com a pena de morte e 27% afirmou que dependendo do crime eles
eram favoráveis a pena de morte. Laranjeiras ainda verificou que 63% dos participantes se
mostraram favoráveis a execução de Sadam Hussein, ao serem indagados particularmente a
respeito da sua morte. Por outro lado, contrariando, de certa forma, os estudos apresentados
neste parágrafo, Galvão, Feitosa, Santos e Camino (2007) verificaram, em uma pesquisa
realizada com adolescentes em ressocialização e com meninos em condição de rua (população
diretamente atingida caso ocorra uma mudança na lei), que a favorabilidade em relação à
redução da maioridade penal e pena de morte é mínima: 15% dos em ressocialização e 26,3%
daqueles em condição de rua mostraram-se favoráveis à redução da maioridade penal e apenas
18,8% dos adolescentes em ressocialização e 23,8% daqueles em condição de rua mostraramse favoráveis à pena de morte.
Em todos os estudos supramencionados, com exceção do da Datafolha, os
participantes foram solicitados a justificar suas respostas quanto à favorabilidade ou não em
relação à pena de morte (Galvão et al., 2007; Laranjeiras, 2007) e a redução da maioridade
penal (Galvão et al., 2007; Menin, 2005). Essas justificativas foram, por sua vez,
categorizadas. No que tange especificamente a pena de morte, Laranjeiras (2007) organizou
as respostas dos participantes em torno das seguintes categorias: Matou, tem que morrer,
Solução para o crime, Prisão não resolve, Punição Justa, Segunda Chance, Crimes contra a
humanidade, Penas alternativas e Direito à vida; enquanto Galvão et al. (2007) elencaram, a
partir das justificativas dos participantes, as seguintes categorias: Punição retaliativa, Servir
50
de Exemplo, Amenizar sofrimento, Pagar na Cadeia, Justiça Divina, Direito à vida, Nova
oportunidade e Morte de um inocente. No que concerne especialmente à redução da
maioridade penal, Menin (2005) organizou as respostas dos participantes em torno das
seguintes idéias: O adolescente sabe o que é certo e errado, Se pode votar, pode ser punido,
Cometeu um crime, deve ser punido, Deveria ser punido no lugar dos pais, Para a situação
não piorar, O jovem é imaturo e A prisão tem conseqüências nefastas; já Galvão et al.
organizaram as respostas em torno das seguintes categorias: Punição justa, Serve de exemplo,
Responsabilidade do menor, Má influência do adulto, Pena alternativa, Experiência negativa e
Ausência de discernimento.
Note-se que alguns estudos têm sido realizados para investigar a opinião e/ou
representação que se tem acerca da pena de morte (Galvão et al., 2007; Laranjeiras, 2007) e
redução da maioridade penal (Galvão et al., 2007; Menin, 2005), contudo, nenhum desses
estudos faz uma análise das respostas em função dos estágios de desenvolvimento moral dos
participantes. E, é exatamente este tipo de análise que este estudo se propõe realizar em
relação aos temas pena de morte e redução da maioridade penal (ver Capítulo IV).
No que se refere à relação entre variáveis e o raciocínio moral, Agerström, Möller e
Archer (2006), ao avaliarem o MJI, constataram a influência do gênero (mulheres
apresentaram níveis mais elevados de moralidade do cuidado do que os homens) e da
personalidade afetiva do participante sobre as resoluções morais dadas a dilemas.
Schonert-Reichl (1999) observaram que o raciocínio moral está direta e
significativamente relacionado ao número de amigos próximos que o adolescente possui, a
comportamentos pró-sociais, assim como a atividades de socialização em meninas.
Também preocupados com a relação entre variáveis, Lepre e Martins (2009)
investigaram a relação entre o uso abusivo de álcool e o raciocínio moral em estudantes do
ensino médio. Os participantes foram selecionados por meio da aplicação do AUDIT (The
51
Alcohol Use Disorder Identification Test), e, posteriormente, responderam ao Moral
Judgment Interview (MJI). Os resultados obtidos revelaram níveis e estágios morais aquém
dos esperados: dos alunos que fazem uso abusivo de álcool, 56% encontram-se no nível préconvencional (13% no estágio 1 e 87% no estágio 2) e 44% encontram-se no nível
convencional (100% no estágio 3).
Ferreira (2007), por sua vez, investigou, em sua dissertação de mestrado, a influência
das redes sociais de relacionamento na internet e da inteligência no desenvolvimento moral de
adolescentes. Participaram da pesquisa 157 alunos do ensino médio de uma instituição pública
de Belo Horizonte, com idades entre 14 e 19 anos. Utilizou-se como instrumentos um
questionário para mapear o perfil do adolescente usuário das redes sociais na internet, o DIT
para avaliar o desenvolvimento moral e o G-36 para medir a inteligência. Os resultados
revelaram no que diz respeito ao DIT que 0,6% dos participantes estavam no estágio 1, 1,3%
no estágio 2, 15,9% no estágio 3, 45,9% no estágio 4 e 23,5% no estágio P. Não se encontrou
correlação entre o nível intelectual e o nível de raciocínio moral, nem se encontrou relação
entre esta última variável e o uso das redes sociais de relacionamento da internet.
No próximo tópico dar-se-á destaque a questão da educação moral, explicitando três
grandes modelos de educação moral, com ênfase no modelo que se enquadra as teorias de
Piaget e de Kohlberg.
1.6. Educação moral e estudos empíricos
O debate sobre o ensino da moral vem desde a antiguidade. Em um de seus mais
importantes diálogos, o Mênon, Platão questiona:
A virtude é coisa que se ensina? Ou não é coisa que se ensina, mas que se adquire pelo
exercício? Ou nem coisa que se adquire pelo exercício nem coisa que se aprende, mas algo que
advém aos homens por natureza ou por alguma outra maneira?
52
Historicamente, na perspectiva de Buxarrais (1997), pode-se distinguir três modelos de
educação moral. O primeiro modelo delega à educação moral a tarefa de levar os indivíduos a
seguir valores e normas que são considerados, por um poder autoritário, os melhores. Esses
valores e normas, por sua vez, são imutáveis e não são passíveis de debate ou questionamento.
O segundo modelo, ressalta que não há o que ensinar em termos de moralidade, já que, ao
contrário do primeiro modelo, os valores e normas morais são percebidos como relativos e
como sendo construídos individualmente. O terceiro e último modelo destacado por Buxarrais
(1997), defende a construção racional e autônoma de valores. É nesta perspectiva que se
enquadram as teorias acerca da educação moral de Piaget (1932/1994) e de Kohlberg (1992),
que fundamentam a presente tese e serão apresentadas a seguir.
As idéias de Piaget acerca da educação moral constituem, ainda hoje, a parte menos
conhecida de sua obra, e, quantitativamente, menos expressiva. O que não significa dizer que
essa parte seja menos relevante que as demais.
Um texto pouco citado aqui no Brasil, que debate a questão da educação moral, escrito
por Piaget em 1930, chama-se Os procedimentos de educação moral. Neste texto, que foi
escrito antes do seu mais famoso livro sobre a moralidade – O julgamento moral na criança –,
Piaget se posiciona de forma favorável a necessidade de se educar moralmente, no sentido de
promover a construção de personalidades autônomas aptas à cooperação.
Em Os procedimentos de educação moral, Piaget explicita a relevância da interação
na educação moral, dando ênfase, em seu discurso, as relações de coação e de cooperação. A
primeira, a de coação, é caracterizada por um respeito unilateral que implica em uma
desigualdade de poderes: é o respeito do pequeno pelo grande, da criança pelo adulto, do
caçula pelo irmão mais velho. É a partir desta relação, na análise de Piaget, que a criança
conhece seus deveres e regras, e adquire noções sobre o bem e o mal, o certo e o errado. A
53
segunda relação, a de cooperação, é caracterizada pelo respeito mútuo e, neste sentido, os
indivíduos que estão em contato se consideram iguais e se respeitam mutuamente.
No que se refere aos procedimentos de educação moral, título do texto, Piaget
(1930/1996) comenta acerca de duas possibilidades: os procedimentos verbais e os métodos
ativos.
A primeira possibilidade, os procedimentos verbais ou “lição moral”, é questionada
por Piaget (1930/1996). Na sua análise, todos os procedimentos orais têm em comum o fato
de serem impostos pelos educadores por meio da coação e do respeito unilateral. Neste
sentido, Piaget comenta que a criança, por não viver ou se envolver na situação apregoada no
discurso, não compreende o seu significado, mas, mesmo assim, aceita a “lição” como medo
da punição ou ainda da perda do afeto.
Por outro lado, Piaget (1930/1996) comenta que a “lição de moral” não é totalmente
inválida. Ela pode ser válida quando é a criança que pede explicação para determinadas
situações que lhe causam desequilíbrio, pois, é apenas em um contexto semelhante a este que
o procedimento verbal pode conseguir tocá-la, levando-a a refletir. O que vale, nesta situação,
não é a imposição de um decreto, mas a construção de um contrato.
A segunda possibilidade, o método ativo de educação moral, é considerada, por Piaget
(1930/1996), a mais efetiva. Neste caso, a criança participa de experiências morais,
proporcionadas pela escola, por meio de um ambiente de cooperação e respeito mútuo. A
educação moral dar-se-ia, na análise de Piaget (1930/1996), paulatinamente em todos os
ambientes do sistema escolar; não constituindo, portanto, uma matéria especial de ensino.
Na perspectiva do método ativo, Piaget (1930/1996) defende a idéia de que somente
uma vida social entre os próprios alunos – o “self government”, com o maior distanciamento
possível da autoridade do professor e em paralelo à educação intelectual, pode conduzir a
“uma certa forma de consciência intelectual e de consciência moral distanciada da anomia,
54
peculiar ao egocentrismo, e da heteronomia das pressões exteriores porque ele realiza a
autonomia adaptando-se à reciprocidade” (Piaget, 1974, p. 60). Para esclarecer, o “self
government” consiste na criação das leis por parte dos alunos, pois somente por meio da
experiência é que eles compreenderão o que é obediência à regra, adesão ao grupo social e
responsabilidade social (Piaget, 1930/1996, p. 22).
Confrontando os dois procedimentos de educação moral citados – método verbal e
método ativo, Piaget contesta a eficácia do primeiro:
Quem será o melhor cidadão ou o espírito racional e moralmente livre? Aquele que tenha
ouvido falar, mesmo que com entusiasmo, da pátria e das realidades espirituais, ou aquele que
tenha vivido numa república escolar o respeito à solidariedade e a necessidade das leis?
(Piaget, 1930/1996, p. 13)
Em um outro texto, chamado O espírito de solidariedade e a colaboração
internacional (1931/1998), publicado um ano depois de Os procedimentos de educação moral
(1930/1996), Piaget retoma a idéia de que os métodos orais não são suficientes para
desenvolver o espírito de solidariedade. Segundo Piaget (1931/1998), para que a criança
desenvolva a solidariedade é necessária uma vivência pessoal e coletiva, que transcenda o
discurso.
Já no texto Observações psicológicas sobre o self-government (1934b/1998), Piaget
retoma a idéia do self-government e afirma que este é "um procedimento de educação social
que tende, como todos os outros, a ensinar os indivíduos a saírem de seu egocentrismo para
colaborar entre si e a se submeter às regras comuns" (Piaget, 1934b/1998, p.126). Também
neste texto, Piaget afirma ser necessário que as crianças realizem atividades grupais de
cooperação, onde aprendam a idéia de respeito mútuo para que possam construir seu autogoverno (autonomia).
Em É possível uma educação para a paz? (1934a/1998), Piaget volta a refletir acerca
das relações internacionais, comentadas em seu texto O espírito de solidariedade e a
colaboração internacional (1931/1998). Nesses dois textos fica claro que Piaget se preocupou
55
com questões morais que vão além do plano individual. Ele fala da dificuldade em se educar
para paz em um mundo de guerra, desconfiança, medo e disputa por fronteiras. Na análise de
Piaget, para que seja viável uma educação para a paz é necessário que sejam trabalhadas as
posições egocêntricas das crianças em relação aos estrangeiros; levando-as a se interessar e
compreender o outro. Esta colocação de Piaget, apoiada em outros conceitos de sua teoria
(como reciprocidade e descentração), leva a autora dessa tese, juntamente com sua
orientadora, a supor que para este autor a educação moral envolve o exercício da empatia.
Finalmente, em A educação da liberdade (1945/1998), Piaget retrata a idéia de que
somente quando a educação consegue fazer prevalecer a cooperação, em detrimento da
coerção, a liberdade individual é alcançada. Lembrando que liberdade para Piaget é sinônimo
de autonomia.
Dentro desta perspectiva, poder-se-ia resumir que educar moralmente seria, na teoria
piagetiana, propiciar à criança situações onde ela possa vivenciar a cooperação, a
reciprocidade e o respeito mútuo e assim, construir a sua autonomia. Essa idéia Piagetiana de
que a construção de uma verdadeira moral – a moral autônoma – não resulta da mera
apropriação de valores, também foi defendida por Kohlberg.
Kohlberg, juntamente com seu orientando de doutorado, Blatt, trabalhou diretamente a
questão da educação moral. Mais precisamente, esses autores criaram uma técnica de
discussão de dilemas morais em grupo, visando a promoção do desenvolvimento moral (Blatt
& Kohlberg, 1975). Eles supunham que a prática de resolução de problemas morais,
fundamentada na interação entre os estudantes, favoreceria o desenvolvimento do raciocínio,
pois, na análise deles, argumentos de estágio moral mais avançado promoveria um conflito
cognitivo cuja solução mais adequada decorreria da apropriação dos argumentos morais
superiores. É interessante registrar que este conceito de conflito cognitivo é o mesmo adotado
na teoria de Piaget quando ele discute a questão do desequilíbrio (Inhelder & Piaget, 1958).
56
Para testar suas suposições, Blatt e Kohlberg (1975) realizaram dois estudos. Em
ambos, eles utilizaram o Moral Judgment Interview (MJI) como medida de pré e pós-teste e
formaram grupos de discussão de dilemas morais com participantes de diferentes estágios
morais. As discussões aconteceram durante seis meses, em encontros semanais. Nessas
reuniões, os autores propunham dilemas hipotéticos, ouviam a opinião dos participantes, e,
em seguida, chamavam a atenção para a resposta de estágio mais elevado. No final do período
de seis meses, constataram que a maioria das crianças tinha avançado moralmente, quando
comparadas as crianças do grupo de controle.
É relevante comentar que, na época que Blatt e Kohlberg (1975) propuseram esta
forma de educação moral, nos EUA os programas baseavam-se numa educação moral com
perfil de doutrinação, denominada de educação de caráter, onde a autoridade era centrada no
professor e os procedimentos consistiam em transmissão verbal de códigos, valores e normas,
assim como prestação de serviço que demonstrasse virtudes.
Com a constatação da eficácia da técnica de Blatt e Kohlberg (1975), a nova forma de
intervenção ganhou bastante popularidade (Berkowitz, 1985; Gibbs, Arnold, Ahlborn &
Chessman, 1984), inclusive no Brasil (Biaggio, 1985; Dias, 1992; Lins & Camino, 1993;
Rique & Camino, 1997). Note-se que a técnica de Blatt e Kohlberg além de se mostrar eficaz
para acelerar o desenvolvimento do raciocínio moral, permite, diferentemente do simples
ensinamento verbal, a manutenção a longo prazo do desenvolvimento moral. A esse respeito,
Rest (1986) comenta que o raciocínio moral de um indivíduo, com a intervenção, pode
evoluir, aproximadamente, durante quatro ou cinco anos, quando comparado ao de um outro
indivíduo da mesma idade que não participou de um projeto de educação moral.
Arbuthnot e Faust (1981) sistematizaram o modelo de educação de Blatt e Kohlberg
(1975) em seis fases ou passos: (1) formar pequenos grupos baseados no estágio de
57
raciocínio; (2) Preparar dilemas; (3) Criar um apropriado clima psicológico; (4) Iniciar a
discussão apresentando os dilemas; (5) Guiar a discussão; (6) Finalizar a discussão.
Na primeira fase (formar grupos baseados no estágio de raciocínio moral), Arbuthnot e
Faust (1981) sugerem que se deve buscar um número igual de sujeitos por estágio, onde se
deve contemplar pelo menos três estágios morais consecutivos dominantes. Arbuthnot e Faust
(1981) ainda indicam que os grupos devem ter entre 8 e 12 indivíduos, com idades
semelhantes.
Na segunda fase (preparar dilemas), Arbuthnot e Faust (1981) propõem que sejam
criados dilemas que permitam provocar conflitos cognitivos e que sejam adequados à
habilidade intelectual dos estudantes. De antemão, conforme comentam Arbuthnot e Faust
(1981), deve-se antecipar as possibilidades de respostas possíveis, construir elaborações que
possam ser utilizadas para provocar desacordos entre os indivíduos de diferentes estágios e
preparar os contra argumentos para todos os níveis do grupo e para um nível acima do grupo
superior. É interessante mencionar, que no caso da criação de Dilemas, Dias (1992) sugere
que os temas dos dilemas sejam indicados pelo próprio grupo de intervenção.
Na terceira fase (criar um clima psicológico apropriado), Arbuthnot e Faust (1981)
comentam que o educador moral deve esclarecer que não existem respostas certas e erradas e
que a função do educador moral é apenas a de intermediar as discussões. Deve ainda destacar
a importância do respeito mútuo, da liberdade de expressão e de crença.
Na quarta fase (iniciar a discussão), Arbuthnot e Faust (1981) recomendam que se
facilite o debate entre indivíduos do grupo do nível inferior de raciocínio com os de nível
imediatamente superior, no sentido de promover conflito cognitivo. A este respeito, é
importante mencionar o estudo realizado por Rest, Turiel e Kohlberg (1969) que revelou que
crianças rejeitavam (embora compreendessem) o discurso abaixo de seu pensamento e não
compreendiam as mensagens que estavam dois estágios acima, demonstrando que o raciocínio
58
de estágio imediatamente superior é melhor assimilado. Arbuthnot e Faust (1981) também
alertam que se deve assegurar a absoluta compreensão do dilema, sugerindo que o facilitador
resuma as principais idéias do dilema e se coloque a disposição dos participantes para maiores
esclarecimentos. Arbuthnot e Faust (1981) ainda propõem que primeiro se apresente os
dilemas ao grande grupo, depois se forme grupos pequenos de discussão que deverão, após
debate, expressar suas opiniões.
Na quinta fase (guiar as discussões), Arbuthnot e Faust (1981) indicam que se deve
oferecer oportunidade de expressão à maior quantidade de indivíduos possíveis, criando o
desequilíbrio ou a consciência da inadequação do nível inferior de raciocínio. Deve-se
conduzir as discussões fazendo com que os participantes, passo a passo, evoluam até que
cheguem ao nível mais alto do grupo. No final, pode-se ainda apresentar um argumento
imediatamente superior ao nível mais avançado do grupo, com o objetivo de se criar o
desequilíbrio cognitivo.
Na sexta e última fase (Finalizar a discussão), Arbuthnot e Faust (1981) sugerem que a
discussão deve ser concluída uma vez que o grupo tenha prosseguido passo a passo,
ascendendo pelos estágios.
Tendo como base a técnica de Arbuthnot e Faust (1981), descrita anteriormente fase a
fase, Biaggio (1983, 1985, 1988), Dias (1992), Lins e Camino (1993) e Rique e Camino
(1997) realizaram intervenções em escolas brasileiras.
Biaggio (1983), em um estudo piloto, com a finalidade de preparar professores e
orientadores educacionais para serem facilitadores morais, coordenou grupos de discussão de
dilemas morais e, neste primeiro trabalho, a técnica mostrou-se eficaz, com o avanço
significativo de estágios de desenvolvimento moral.
Duas orientadoras educacionais que participaram do grupo de debate do estudo
supramencionado aplicaram a técnica em seus alunos (Biaggio, 1985), uma na turma da 7a
59
série e outra na turma da 8a série. Os resultados encontrados no pós-teste, realizado na turma
da 7a série, revelaram um aumento no escore médio de julgamento moral. A este respeito
Biaggio (1985) faz uma ressalva interessante acerca desta evolução: apesar das médias do
estágio 4 terem aumentado significativamente após oito sessões de discussões de dilemas, “a
maioria dos sujeitos apresenta elementos de estágio 3 e de estágio 5, e não necessariamente 4,
o que não fica aparente nos escores médios” (p.198). Os resultados do pós-teste dos alunos da
8a série, revelaram que tanto o grupo de discussão, quanto o de controle apresentaram ganhos
no nível de julgamento moral, o que foi devido, na análise de Biaggio, provavelmente, a não
equivalência no pré-teste (Biaggio, 1988). Nesta pesquisa, Biaggio comenta que os alunos
resistiram discutir os dilemas levados pelas coordenadoras, reivindicando dilemas trazidos por
eles.
Uma terceira experiência foi citada em Biaggio (1985), desta vez a técnica de debates
de dilemas morais envolveu universitários. Neste caso, em metade dos 10 encontros foram
utilizados dilemas descritos em Blatt, Colby e Speicher (1974) e na outra metade, dilemas
brasileiros, elaborados pelo núcleo de pesquisa de Biaggio. Os resultados revelaram ganhos
em termos de julgamento moral, com a constatação de que é importante considerar o interesse
dos participantes na escolha dos dilemas (Biaggio, 1985).
Dias (1992) realizou seu projeto de educação moral com estudantes da 6a série do
ensino fundamental (denominado atualmente no Brasil de 7o ano do ensino fundamental),
durante 4 meses, que totalizaram 24 sessões de 1 hora/aula de discussão de dilemas morais.
Os alunos do grupo experimental e do grupo de controle foram avaliados antes e depois da
intervenção por meio do DIT. Os resultados demonstraram que o índice de raciocínio pósconvencional foi significativamente superior ao do grupo de controle (que assistia aulas de
Educação moral e cívica ministradas por um professor da escola).
60
Lins e Camino (1993) realizaram sua intervenção com estudantes universitários, em
encontros semanais de 50 minutos de duração, que duraram 7 meses. Neste caso, foram
formados dois grupos: um de Exposição (onde eram apresentadas as teoria de
desenvolvimento moral de Piaget e Kohlberg) e um grupo de debate (onde eram realizadas
discussões de dilemas morais). Ambos os grupos foram avaliados antes e depois da
intervenção por meio do DIT. Os resultados revelaram que o debate favoreceu o
desenvolvimento moral e a simples exposição teórica não.
Rique e Camino (1997) realizaram sua proposta de educação moral com estudantes de
14 a 16 anos de idade, da 8a série do ensino fundamental (denominado atualmente no Brasil
de 9o ano). Os autores objetivaram, além de investigar o desenvolvimento moral, verificar a
influência do nível de consistência do pensamento moral no avanço esperado do raciocínio
moral. Tanto o grupo de intervenção quanto o de controle foram avaliados antes e depois da
intervenção por meio do DIT. Os resultados indicaram que os alunos do grupo experimental
apresentaram as médias mais altas no pós-teste quando comparados aos do grupo de controle;
e, os resultados ainda demonstraram que o único grupo que apresentou avanço, quando foram
comparadas as médias antes e depois, foi o grupo experimental inconsistente, o que revelou,
na análise de Rique e Camino (1997), que o momento mais oportuno para se fazer intervenção
é aquele em que o sujeito demonstra inconsistência no seu julgamento moral.
Souza (2008), por sua vez, realizou uma intervenção junto a universitários de
psicologia, com objetivos didáticos, não se propondo promover, especificamente, o
amadurecimento moral. Neste trabalho, a autora estimulou os alunos a elaborarem dilemas
morais hipotéticos ou reais sobre o tema que quisessem, assim como a elaborarem dilemas
que envolvessem o psicólogo e sua profissão. Com esta proposta, a autora pode propiciar aos
seus alunos a aprendizagem de uma importante teoria do desenvolvimento cognitivo, a
vivência da técnica de desenvolvimento moral, o exercício da criação de dilemas morais
61
(tanto no âmbito geral como profissional) e a discussão de temas morais e éticos, tanto da
esfera universal quanto ético profissional específico da Psicologia.
Uma forma de intervenção um pouco mais ambiciosa e, por isso, mais difícil de
efetivação, corresponde à proposta kohlberguiana da criação de uma comunidade justa. Mais
do que desenvolver individualmente os estudantes, Kohlberg propôs uma mudança na
estrutura do ambiente escolar, com a promoção da democratização das decisões e o debate de
dilemas morais reais do cotidiano escolar.
Em seu trabalho sobre “a comunidade justa”, em um kibbutz em Israel, Kohlberg,
Power, Higgins (1989/1997) observaram que o forte senso de comunidade tinha uma
influência direta no desenvolvimento moral das crianças do kibbutz. Mais precisamente, a
ligação social, o senso de coletivismo, o cuidado com o outro e com o grupo, o papel
democrático do professor foram constatações elencadas no kibbutz que serviram de inspiração
para Kohlberg desenvolver um método de prática democrática coletivista, que teve como
primeiro palco de atuação uma penitenciária feminina.
Kohlberg, Hickey e Scharf (1980) criaram a primeira comunidade justa, no presídio
feminino de Niantic State Farm, nos EUA. Neste trabalho, eles constataram que a eficácia do
programa estava sendo posto à prova pela atmosfera da prisão. Diante disto, os autores
tentaram mudanças na estrutura das relações sociais do presídio, com a inclusão do pessoal da
segurança nas discussões para a criação de acordos. Após a intervenção, Kohlberg, Hickey e
Scharf (1980) encontraram maior coerência entre o pensamento e a prática das detentas.
Em 1974, Kohlberg transpôs a sua idéia de comunidade justa, realizada no presídio
feminino de Niantic State Farm, para a Escola de Cluster, sendo, portanto, a primeira
comunidade justa na escola.
Na escola de Cluster, conforme relata Reimer (1989/1997), professores e alunos eram
considerados membros iguais, com os mesmos direitos e privilégios, e comungavam do
62
mesmo projeto: construir uma comunidade justa. Neste sentido, a igualdade referia-se a uma
mudança de postura tanto dos alunos, quanto dos professores. Os docentes eram convidados a
não mais impor regras unilateralmente, assim como, a se submeter à vigilância e à disciplina
da comunidade para fatos como atrasos, perda do controle, linguagem rude ou abusiva, etc.
No caso da violação das regras, os professores, de forma semelhante aos alunos, eram
conduzidos a um Comitê de Disciplina. Sobre a violação das regras por parte dos professores,
Reimer (1989/1997) descreve um incidente em que um professor, Norman, foi levado ao
Comitê de Disciplina, acusado de pisar e quebrar o gravador de um aluno. No relato está
escrito que o professor se defende dizendo que havia dito várias vezes a um aluno que parasse
de tocar o gravador alto; sua perda de controle deu-se quando o aluno foi até a frente, por trás
do professor, e, de repente, tocou a música em alto volume no seu ouvido. Ao analisar o fato,
o Comitê de Disciplina empatizou com Norman, mas, apesar disso, achou que ele tinha
reagido exageradamente. Assim sendo, recomendaram que Norman dividisse o custo do
conserto do gravador com o aluno. Sobre este caso, é interessante registrar a fala de um dos
alunos, que revela que havia uma tentativa de se julgar com justiça, independente do grupo de
pertença:
"Esta foi a primeira vez que Norman fez esse tipo de coisa, tá ok. E ele admitiu que foi uma
coisa fora do comum para um adulto e professor... Mas ele admitiu, e está sentado aqui, como
qualquer outro... Ele é humano como nós, e sujeito a emoções também. E ele tem sua vida lá
fora, também, e tem uma vida pessoal. E pensem nisso, nessa escola todo mundo é igual, etc.,
mas vocês esquecem que os professores também..." (Aluno de Cluster).
A Escola de Cluster obteve, segundo a avaliação de Power (1979), sucesso, no sentido
de criar estágios relativamente altos na atmosfera moral que, inclusive, se refletiram na
mudança de comportamento dos alunos e professores em termos de relacionamento
interpessoal. Mas, por outro lado, a escola de Cluster vivenciou dificuldades, uma das quais
Reimer (1989/1997) destaca é a de falta de consenso sobre a proibição do consumo de drogas.
Para a maioria dos alunos a regra parecia justa, porém, para outros, feria o direito de liberdade
63
individual. A grande dificuldade enfrentada foi demonstrar que o consumo de drogas
prejudicava a comunidade na medida em que violava o princípio de respeito mútuo e
eqüidade. Somente após muita discussão, os alunos concluíram que a liberdade individual não
podia ferir o direito moral dos outros.
Uma outra experiência de comunidade justa aconteceu na Escola Scarsdale, nos
arredores de Nova York (Codding, 1989/1997). De forma semelhante à escola de Cluster, em
Scarsdale havia reuniões semanais com alunos e professores para a tomada de decisão. O
maior problema enfrentado na Escola de Scarsdale, conforme relata Codding (1989/1997), foi
o da homogeneidade de sua população por não haver variedade de pontos de vista para serem
confrontados.
Na cidade do meio-oeste americano, Power, orientando de doutorado de Kohlberg,
desenvolveu a experiência de comunidade justa em um programa intitulado Y.E.S. (“Your
Excellence in School”). O público alvo desta experiência eram adolescentes de risco,
encaminhados por pais e professores ou que se apresentavam voluntariamente por ter ouvido
falar do programa por colegas participantes. É interessante notar que dos 32 estudantes,
apenas três eram do sexo feminino.
O programa Y.E.S. congregava alunos e professores que seguiam um estatuto,
elaborado e votado democraticamente, onde estavam explicitadas as regras de funcionamento
da comunidade. O grupo elegia a cada dois meses uma diretoria, composta por presidente(a),
vice-presidente(a), secretário(a) e tesoureiro(a). Ainda existiam diversos comitês, como o do
jornalzinho, o de relações públicas, e o mais atuante – o comitê de justiça ("fairness
committee"). Este último era composto de um professor e cinco alunos, com o objetivo de
propor penalidades e recuperações a serem aplicadas aos membros do grupo que
desobedeciam as regras acordadas. Essas recomendações eram votadas por todo o grupo, e as
64
penalidades podiam variar desde tarefas, tais como limpeza da sala, até a expulsão do
estudante do programa Y.E.S.
No Brasil, Biaggio (1997) desenvolveu uma adaptação do modelo de “comunidade
justa” em Porto Alegre. Antes de iniciar o programa, Biaggio menciona que os professores,
diretores e coordenadores participaram de palestras e discussões sobre a teoria de Kohlberg e
sua aplicabilidade. Ademais, menciona que buscou capacitar professores para prepará-los e
motivá-los a coordenar discussões de dilemas com conteúdos ecológicos e realizou um estudo
piloto com alunos da oitava série (9o ano). No entanto, como lamenta Biaggio, muitas
dificuldades foram explicitadas no decorrer do desenvolvimento do programa, tais como:
dificuldade em reunir os professores, que, por baixas condições salariais, lecionavam em
várias escolas; paralisação parcial dos professores visando melhorias salariais, que atrasou o
cronograma do projeto; dificuldades financeiras para realização de mudanças significativas na
escola, como por exemplo, a desistência de uma decisão democrática de oferecer lanches mais
saudáveis para os alunos (como frutas e queijos) por motivos econômicos.
Mais recentemente, no Brasil, Barreto, Oliveira, Andrade e Dias (2009) utilizaram a
técnica de educação moral intitulada “comunidade justa” em uma ONG localizada em Niterói
(RJ-Brasil), que atende crianças e adolescentes em situação de risco, residentes em periferias,
com a finalidade de oferecer reforço escolar e reinserção daqueles que abandonaram a escola.
Foram realizadas discussões de dilemas hipotéticos em grupo e foi estimulado o aprendizado
cooperativo e o treinamento para resolução de conflitos do cotidiano escolar. Os resultados
foram avaliados mediante o SROM, com pré e pós-testes. Não houve diferença significativa
entre as medidas antes e depois da intervenção, nem os autores constataram diferença de
desenvolvimento moral em função do gênero. Por outro lado, ao realizar uma avaliação do
programa, os autores contataram que os avaliadores de forma consensual julgaram o programa
65
de intervenção como sendo eficiente para a redução de conflitos no interior da instituição e
para promover mudança de atitudes dos alunos dentro e fora da ONG.
Dentro de uma perspectiva diferente das apresentadas até agora, Paone, Packman,
Maddux e Rothman (2008) investigaram se intervenções na forma de terapia de grupo
facilitavam o desenvolvimento do raciocínio moral de jovens em situação de risco. Os autores
constaram, com a comparação dos resultados de pré e pós-testes no DIT, uma diferença
significativa entre os grupos experimental e controle, o que os levaram a inferir que a
interação social estabelecida na terapia de grupo ajuda no desenvolvimento do raciocínio
moral.
Por fim, é relevante comentar que à questão da educação moral no Brasil, recebeu uma
atenção especial no texto dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs). Para esclarecer, os
PCNs foi publicado em 1997, pelo Ministério da Educação e do Desporto (MEC), por meio da
Secretaria de Educação Fundamental (SEF), numa coleção de dez volumes contendo
orientações curriculares para o desenvolvimento do ensino fundamental no país.
No que se refere à educação moral, os PCNs propõem que os educadores trabalhem
transversalmente, no ensino infantil, fundamental e médio, com temas relacionados à ética,
visando o desenvolvimento do exercício da cidadania. Na prática, os PCNs propõem que não
se crie uma disciplina específica voltada para a educação moral, mas que esta educação seja
incorporada nas áreas já existentes – Português, Matemática, História, Geografia, etc. Neste
sentido, os PCNs contrariam a proposta de Blatt e Kohlberg (1975) de se ter um horário
especial para se discutir dilemas morais, mas, por outro lado, se assemelha, em certo sentido,
a proposta da comunidade justa quando afirma:
O ensino da ética não pressupõe espaço de aula reservado aos temas morais; trata-se de
democratizar as relações entre os membros da escola, cada um podendo participar da
elaboração das regras, das discussões e das tomadas de decisão a respeito de problemas
concretamente ocorridos na instituição (PCNs, 1997, p. 66).
66
Sabe-se, contudo, que a proposta supramencionada, que está explicitada nos PCNs,
está distante de ser realidade na maioria das escolas brasileiras. É exatamente com o intuito de
viabilizar o objetivo dos PCNs de tornar a Escola um espaço para o desenvolvimento do
exercício da cidadania, que foram avaliados, nesta tese, modelos de intervenção moral
(Capítulo VI).
Na realidade, a proposta de educação moral criada e testada nesta tese (ver Capítulo
VI) difere, em certo sentido, de tudo o que foi apresentado até agora. Apesar de se considerar
incontestável a relevância dos trabalhos de Piaget e Kohlberg, que demonstraram que a moral
não pode ser ensinada tal como os conteúdos curriculares tradicionais da escola, concorda-se
com Martin L. Hoffman (ver Capítulo III) que defende a idéia que Piaget e Kohlberg
desconsideraram, em sua proposta de educação moral, a importância que a vida afetiva tem
para o desenvolvimento moral. Neste sentido, é que se propõe uma educação moral que leva
em consideração tanto questões afetivas, quanto cognitivas.
Por outro lado, é relevante registrar que não se pode esquecer que tanto Piaget quanto
Kohlberg não desconsideram a afetividade como aspecto relacionado à moralidade. Na teoria
de Piaget (1932/1994; 1954/2001; 1962; 1964/2005), cognição e afetividade apresentam-se
como aspectos indissociáveis. Apoiando esta idéia, Kohlberg (1992) defende que os
julgamentos morais não são puramente cognitivos, mas possuem componentes afetivos e
motivacionais. Porém, nem Piaget, nem Kohlberg verificaram empiricamente qual seria o
papel da afetividade em relação à moralidade e como a moralidade, a afetividade e a cognição
estariam relacionadas, deixando uma lacuna.
Dentro de uma perspectiva que leva em consideração o componente afetivo da moral,
Stephan e Finlay (1999) listaram alguns programas de intervenção cujos objetivos eram
promover a autonomia moral. Nesses programas, eles estimulavam a capacidade de roletaking e o desenvolvimento de habilidades empáticas, por meio de atividades como discussão
67
sobre dilemas morais, role-plays e debates com a participação de pessoas de diferentes grupos
étnico-raciais. A grande diferença entre esses programas e o programa de Blatt e Kohlberg
(1975) é que nas atividades com o foco na afetividade, solicitava-se explicitamente que os
participantes tentassem se colocar no lugar das outras pessoas e imaginassem o que elas
estariam pensando ou sentindo. Como Batson, Klein, Highberger e Shaw (1995)
demonstraram, esse tipo de instrução tem o potencial para estimular componentes cognitivos e
afetivos da empatia, passíveis de influenciar o comportamento e o julgamento moral das
pessoas. Tal achado pode ser de bastante valia para o campo da educação moral, tendo em
vista o potencial que esse tipo de técnica pode ter.
Defende-se, portanto, na presente tese a idéia de que a educação moral deve ser guiada
por parâmetros que não enfatizem apenas as questões cognitivas, como a proposta de
Kohlberg, mas que se fundamente em ações que englobem tanto o aspecto cognitivo como o
afetivo.
1.7. Considerações sobre o capítulo
Neste capítulo, inicialmente, foi realizado um breve percurso histórico sobre a noção
de moral, dando destaque as teorias de Piaget e Kohlberg. A este respeito, pode-se dizer que
na psicologia permaneceu, durante muito tempo, a idéia de que a moral é algo que vem de
fora e que é internalizado, destacando-se nesta perspectiva as teorias da psicanálise e do
behaviorismo. Apenas com as teorias de Piaget e Kohlberg é que se começou a pensar a moral
dentro de um enfoque sócio-construtivista: em que o desenvolvimento moral é influenciado
pelas interações sociais e pelo desenvolvimento afetivo, mais do que pelo desenvolvimento de
estruturas biológicas ou pela aprendizagem de simples regras sociais.
68
Dentre as teorias acerca do desenvolvimento moral, deu-se um relevo especial, nesse
capítulo, a teoria de Kohlberg (por ser uma das principais teorias que fundamenta esta tese),
citando pesquisadores que procuraram investigar a empiricidade de alguns de seus
pressupostos. Diante deste confronto, considera-se pertinente realizar, neste momento, uma
breve apreciação a este respeito.
A maioria das críticas elaboradas à teoria de Kohlberg faz referência à seqüência
universal e invariante dos estágios. Percebem-se essas críticas como pertinentes apenas em
parte, já que tem se encontrado resultados que, de certa forma, apóiam ambas as posições: se
por um lado, existem estudos transculturais em que não se observa o mesmo tipo de evolução
moral em todas as culturas, existem, por outro, estudos longitudinais que confirmam o
pressuposto de seqüencialidade, tanto em termos de níveis de desenvolvimento, quanto em
termos de estágio. Diante deste impasse, acredita-se que, de fato, existe uma seqüência de
estágio universal, o que, por outro lado, não nega o papel da cultura como um fator modulador
que acentua certos tipos de raciocínio em detrimento de outros, porém sem abolir uma
“essência” humana comum. Também julga-se oportuna a crítica de Simpson (1974, citado por
Kohlberg, Levine & Hewer, 1983) acerca da dificuldade encontrada por algumas culturas em
detrimento da não familiaridade com alguns dilemas. Neste caso, concorda-se com Kohlberg,
Levine e Hewer (1983) que devem ser construídos dilemas que tenham significado para os
respondentes, o que também se aplica a uma proposta de intervenção. Outra crítica que parece
pertinente é sobre a ausência de componentes afetivos na avaliação do julgamento moral,
devendo, na avaliação da autora desta tese e de sua orientadora, não serem mais
negligenciados. Particularmente na presente tese dar-se-á destaque ao componente afetivo
denominado Empatia, que será, inclusive, o tema do próximo capítulo.
Em relação à avaliação no campo da moralidade, conforme já foi comentado em um
outro momento, tem-se notado o predomínio de instrumentos que utilizam, sobretudo, dilemas
69
hipotéticos ou situações demasiadamente abstratas que se distanciam, em certo sentido, da
realidade dos respondentes. Considerando este fato, na presente tese se propôs a criação de
dois dilemas que tratam de temas veiculados pela mídia, com personagens reais e conhecidos
da população, a saber: O dilema de Sadam Hussein, em que se ressalta a questão da pena de
morte e o dilema de João Hélio, em que se problematiza a questão da redução da maioridade
penal.
Em relação aos estudos empíricos realizados no campo da moralidade, tanto no
contexto internacional como no contexto brasileiro, percebe-se o predomínio de uma
perspectiva cognitivista, fundamentada, principalmente, em Piaget e/ou Kohlberg. Em relação
aos instrumentos empregados, têm prevalecido o uso do DIT e do MJI, em estudos, sobretudo,
de corte transversal. Os resultados desses estudos, de uma forma geral, apóiam a tipologia de
Kohlberg, porém a seqüencialidade dos estágios aproxima-se mais do modelo preconizado
por Rest (1976).
Sobre a relação entre variáveis e o raciocínio moral, tem-se constatado que o
raciocínio moral: está diretamente relacionado ao número de amigos, a comportamentos prósociais, a atividades de socialização em meninas (Schonert-Reichl, 1999); está inversamente
relacionado ao uso abusivo de álcool (Lepre & Martins, 2009); e não possui correlação com o
nível intelectual, nem com o uso de redes sociais de relacionamento na internet (Ferreira,
2007).
Sobre a seção educação moral, apresentaram-se vários estudos realizados com base na
proposta de Kohlberg que defende a idéia de que a discussão de dilemas sócio-morais produz
o avanço do raciocínio moral e na proposta do mundo justo. Dentre essas duas propostas,
ressaltou-se a primeira como sendo a que fundamentaria, em parte, o estudo de intervenção
prevista nesta tese e como sendo uma prática válida para ser incluída tanto no currículo das
escolas, quanto no planejamento educacional de outras instituições que visam à promoção da
70
cidadania, como, por exemplo, as ressocializadoras. A seguir, destacou-se que a proposta de
Kohlberg era demasiadamente cognitivista e que uma educação moral deveria englobar tanto
aspectos cognitivos quando afetivos do desenvolvimento.
Tendo em vista que a proposta de intervenção prevista nesta tese envolverá aspectos
afetivos, o próximo capítulo irá tratar de como a Psicologia tem abordado teoricamente a
empatia no decorrer dos anos, ressaltando a perspectiva teórica de Martin Hoffman, e a forma
como esse construto tem sido operacionalizado.
71
CAPÍTULO II – EMPATIA
72
E quando estiveres perto, tomarei teus olhos para colocá-los no lugar dos meus,
e tu tomarás meus olhos para colocá-los no lugar dos teus,
e eu te verei com os teus olhos, e tu me verás com os meus
Jacob Levi Moreno
2.1. Breve percurso histórico sobre a noção de empatia
A experiência do “sentir com” (tradução do alemão Einfühlung) já aparecia designada
pelos gregos em seu vocábulo empatheia, indicando, conforme lembra Pigman (1995), a
possibilidade de entrar no sentimento, estar dentro, estar presente, viver com e como o outro o
seu pathos, paixão, sofrimento e doença.
Na Psicologia, o primeiro autor a utilizar o termo Empatia (Einfülhlung) foi Titchener,
em seu livro Elementary Psychology of the Thought Processes (1909). Para Titchener, a
noção de Einfülhlung se refere à capacidade de poder saber sobre a consciência de outra
pessoa e de raciocinar de maneira análoga a ela, por meio de um processo de imitação interna
(Wispé, 1986).
Daí em diante, algumas áreas da psicologia tiveram destaque no estudo da empatia,
dentre as quais destacar-se-á, nessa seção, apenas as mais pertinentes para esta tese, a saber: a
da psicologia da personalidade/psicoterapia, com as teorias de Sigmund Freud e Carl Rogers;
a da aprendizagem social, com Nancy Eisenberg e Daniel Batson; a da psicologia do
desenvolvimento sócio-cognitivo, com Jean Piaget e Lawrence Kohlberg; a da perspectiva
evolutiva (ou evolucionista), com Plutchik (1992); a da neurociência que corroboram a
existência do construto Empatia; e a da perspectiva de Martin L. Hoffman, que terá uma seção
especial (2.2), por ser o teórico da Empatia que fundamenta esta tese.
Freud fez, em seus textos, um uso significativo do vocábulo empatia (Einfühlung), no
início do século XX, embora não tenha tido tanto relevo entre os estudiosos do assunto. Como
73
demonstrou Pigman (1995) em seu artigo “Freud and the history of empathy”: desde o livro
sobre os chistes (1905), encontramos no texto freudiano as marcas de sua familiaridade com a
Einfühlung; no texto de 1913, “Sobre o início do tratamento”, Freud considera central a
experiência da Einfühlung para o trabalho terapêutico, porque possibilita a penetração no
psiquismo de alguém que é estranho ao eu daquele que se identifica, porém de forma
cautelosa – em carta datada de 4 de janeiro de 1928, Freud apresenta a Ferenczi, criticamente,
sua posição quanto à importância da empatia na clínica psicanalítica.
Carl Rogers, por sua vez, na década de 1950, estudou a empatia de forma sistemática
e profunda, incentivando, ao contrário de Freud, seu uso na clínica. Na concepção de Rogers,
ter empatia significa “perceber o marco de referência interior da outra pessoa com precisão e
com os componentes emocionais que lhe pertencem, como se fosse essa pessoa, porém sem
perder nunca a condição de ‘como se’” (Rogers, 1959, p. 210). Em 1975, Rogers, ao rever o
conceito de empatia, acrescentou que ela não deveria mais ser vista como um estado e sim,
como um processo, em que o terapeuta deve mergulhar no mundo do outro, deixando de lado
o seu próprio ponto de vista, o que significa “viver temporariamente a sua vida” (Rogers,
1975, p. 4). Por fim, é importante acrescentar que na análise de Rogers, a empatia é percebida
como um estado passível de treinamento, tanto em termos cognitivos quanto em termos
vivenciais.
Compartilhando a idéia de que a empatia é passível de aprendizagem, tem-se a
perspectiva da aprendizagem social. Neste caso, dar-se-á ênfase as teorias de Eisenberg e de
Batson, pelo destaque que esses autores têm tido nesse campo.
Nancy Eisenberg estudou a empatia em função de sua preocupação acerca do que
motiva as pessoas a cuidar do outro. A maioria das pesquisas de Eisenberg sobre empatia,
definida como “uma resposta afetiva que decorre da apreensão ou compreensão da condição
ou estado emocional do outro, que é congruente com o que a outra pessoa está sentindo ou
74
seria esperado sentir” (Eisenberg, 2002, p. 135), é orientada para identificar as causas do
altruísmo e do comportamento pró-social, sobretudo, em crianças (Eisenberg, 2000; Eisenberg
et al., 1996; Eisenberg & Miller, 1987; Eisenberg & Strayer, 1987). Esta autora e seus colegas
de trabalho também contribuíram para a análise das diferenças de sexo na empatia (Lennon &
Eisenberg, 1987). Uma outra contribuição importante da autora (Eisenberg, 2002), diz
respeito a idéia de que a empatia, assim como o altruísmo e outros comportamentos
humanitários podem ser aprendidos e modificados, e, além disso, podem favorecer a redução
da agressividade e de tendências destrutivas.
Assim como Eisenberg, Daniel Batson examinou os motivos que estão subjacentes aos
comportamentos pró-sociais das pessoas. Para Batson e seus colegas (Batson et al., 1997) a
empatia seria uma possível fonte de motivação altruísta, definida como um emoção vicária
que é congruente, mas não necessariamente idêntica à emoção do outro (Batson, 1991).
Batson, Fultz e Schoenrade (1990), ao discutir sobre as reações emocionais que surgem diante
do sofrimento de alguém, diferenciam dois tipos de sentimentos: uma empatia pelo outro que
sofre (simpatia), envolta por sentimentos de ternura, compaixão e preocupação real pelo outro
e uma empatia que traduz a necessidade de reduzir o próprio mal-estar e reflete uma
preocupação com o alívio de sua própria angústia (angústia pessoal).
Na área do desenvolvimento sócio-cognitivo, Jean Piaget pode ser considerado um dos
primeiros a se preocupar com a empatia, mesmo que de uma forma menos precisa e
sistemática quando comparado a outros autores, como Rogers. Piaget (1932/1994) se referiu,
em sua teoria, a diferentes conceitos, como role-taking, simpatia e altruísmo para discutir o
processo que se poderia chamar de empático. Em relação ao role-taking, ele o definiu como
uma habilidade que possibilita intuir situações, necessidades, interesses do outro, e mais do
que isto, compartilhar os sentimentos do outro; no que se refere à simpatia, ele a classificou
como uma tendência instintiva que, paulatinamente, na medida em que a criança desenvolve a
75
capacidade de colocar-se no lugar do outro e reconhecer as necessidades do outro, vai se
tornando um sistema de valor mais permanente, que, por sua vez, é quem permite o altruísmo,
a verdadeira cooperação e o verdadeiro respeito mútuo.
Ainda na área da psicologia do desenvolvimento sócio-cognitivo, Kohlberg (1969)
relacionou a empatia com o lado emocional do role-taking, definido como “(...) tomar a
atitude do outro, tornar-se conhecedor dos pensamentos e sentimentos, colocar a si mesmo em
seu lugar” (p. 49). Como este autor não privilegiou em sua teoria da moral o aspecto
emocional, conforme comenta Camino (2009), ele não explorou o conceito de empatia em
seus textos e deu relevo aos avanços cognitivos voltados para o desenvolvimento moral e
social.
Dentro de uma perspectiva evolucionista, Plutchik (1992) definiu a empatia como uma
habilidade, de base inata, para captar sinais emocionais nos outros, tendo em vista a
sobrevivência das espécies. Para ilustrar tal afirmativa, Plutchik (1992) cita pesquisas que
revelam que macacos da espécie vervet produzem diferentes sinais sonoros para alertar seus
pares sobre a presença de predadores nas proximidades; e, estes sinais são compreendidos até
mesmo pelos filhotes desta espécie, inclusive por aqueles que foram criados em cativeiro
desde o nascimento, o que sugere, na análise de Plutchik (1992), que os comportamentos
empáticos possuem um forte componente genético. Esta idéia de empatia, enquanto algo
subjacente ao instinto de sobrevivência, também é aplicada à espécie humana: o choro dos
bebês, por exemplo, tem um efeito fundamental para a mobilização afetiva dos adultos, e, esta
mobilização afetiva guia e mobiliza o comportamento de ajuda dos pais.
No campo motivacional/emocional têm-se Hoffman, que, na verdade, apresenta, de
acordo com Camino (2009), uma concepção eclética da empatia, na medida em que reúne
idéias do behaviorismo, do cognitivismo e da aprendizagem social; e ainda compartilha da
perspectiva evolutiva, mencionada acima, na medida em que concebe a empatia como sendo
76
um tipo de resposta afetiva, com raízes biológicas e função adaptativa, que é modificada ao
longo da ontogênese por fatores cognitivos. As idéias de Hoffman serão tratadas de forma
mais detalhada, na próxima seção.
Neste momento, considera-se pertinente sair um pouco da área da psicologia e
comentar rapidamente como a empatia vem sendo concebida na neurociência, já que esta é
uma área que tem corroborado a existência do construto Empatia, assim como do seu
funcionamento. Goleman (2007) cita um estudo realizado em 1957, em que os pesquisadores
verificaram que há uma relação direta entre certas lesões na área direita dos lobos frontais e a
incapacidade de entender a mensagem emocional do outro por meio do tom da voz, embora,
neste caso, exista a capacidade de entender as palavras. Para ilustrar, as pessoas lesionadas em
certas regiões da área direita dos lobos frontais, ao ouvirem “muito obrigado” em diferentes
sentidos – sarcástico, agradecido ou furioso –, compreenderam essas expressões de uma
mesma forma, isto é, simplesmente como uma gratidão no sentido neutro. Em um outro
estudo realizado em 1979, também citado por Goleman (2007), foi observado que pacientes
com danos em outras partes do hemisfério direito eram incapazes de expressar suas emoções
por meio do tom de voz ou gestos; neste caso, sabiam o que sentiam, mas simplesmente não
eram capazes de transmití-lo. Esses estudos serviram como base para Brothers (1989, citado
por Goleman, 2007) que indicou, a partir do exame de relatos neurológicos, que as amígdalas
corticais e suas ligações com a área de associação com o córtex visual como parte dos
circuitos-chave do cérebro é que estão por trás da empatia. Um dos estudos citados por
Brothers (1989, citado por Goleman, 2007) para sustentar sua tese, foi realizado com macacos
Rhesus. Neste estudo, os macacos foram treinados para terem medo de um determinado som,
fazendo-os ouvirem-no ao levarem um choque. Em seguida, esses macacos foram treinados a
levantar uma alavanca sempre que ouviam o som. Finalmente, pares desses macacos foram
colocados em jaulas separadas, tendo como fonte de comunicação entre si, um circuito
77
fechado de TV, que lhes permitiam ver o rosto um do outro. O que se constatou foi que
quando um dos macacos ouvia o som temido, demonstrava uma expressão de pânico, que
levava o outro macaco, ao olhar esta fisionomia, a empurrar a alavanca que impedia o choque,
um ato altruístico de empatia. Para testar a relação entre o córtex visual e as amígdalas com a
empatia, os pesquisadores inseriram delicadamente longos eletrodos pontiagudos no cérebro
dos macacos. Os resultados indicaram que quando um macaco via a fisionomia do outro, essa
informação levava ao disparo de um neurônio, primeiro, no córtex visual, e depois, nas
amígdalas corticais, que se diferenciava do disparo do neurônio ao responder a expressões
emocionais específicas – o que levaram os pesquisadores a concluir que a empatia é um dado
biológico.
Dentro de uma perspectiva crítica a abordagem biológica apresentada no parágrafo
anterior, Vignemont e Singer (2006) questionam a suposição de que se compartilha das
emoções dos outros a partir de uma automaticidade cerebral e propõem uma abordagem
contextual, sugerindo que existem vários fatores moduladores que podem influenciar na
resposta empática do cérebro. Na compreensão desses autores, a avaliação contextual
acontece antes da sugestão emocional, e é ela que conduz ou não o cérebro a uma resposta
empática, já que não empatizamos com tudo o que vemos, e quando empatizamos somos
mobilizados em função do estímulo indutor.
2.2. A perspectiva de Hoffman
Aceitando o aspecto evolutivo da empatia, mas a estudando de uma perspectiva,
sobretudo, psicológica, Hoffman (1989, p. 285) define a empatia como sendo “a capacidade
de uma pessoa para colocar-se no lugar do outro (role-taking), inferir seus sentimentos e, a
78
partir do conhecimento gerado por esse processo, dar uma resposta afetiva mais adequada
para a situação do outro do que para sua própria situação” e, de forma semelhante ao que
Kohlberg faz em relação ao desenvolvimento moral, Hoffman (1990, 2003) elenca estágios de
desenvolvimento empático, que evoluem juntamente com o desenvolvimento cognitivo,
conforme listado a seguir:
Empatia global: em idades muito precoces, quando a criança tem dificuldade de se
distinguir do outro, ela está susceptível a vivenciar sentimentos empáticos ao
testemunhar a angústia do outro, como se aquela angústia estivesse ocorrendo com ela
mesma. Para ilustrar esta fase, Hoffman cita o choro do recém nascido despertado pelo
choro de outros bebês, como um precursor rudimentar de angústia empática, em que a
criança chora como se ela mesma tivesse sofrendo. Como dado adicional, este choro é
percebido por Hoffman (2003) como uma mistura de mímica inata, que ocorre
automaticamente, e de condicionamento.
Empatia egocêntrica: com o desenvolvimento da consciência sobre a permanência dos
objetos (Piaget, 1932/1994), a criança torna-se capaz de distinguir sua experiência da
do outro, mas ainda de forma bastante rudimentar, o que a leva a confundir, diante de
uma situação adversa, quem está realmente angustiado, se ela ou o outro. Com cerca
de um ano e seis meses, a criança torna-se consciente de que não é a outra pessoa,
embora ainda considere os estados internos do outro como iguais aos seus (Hoffman,
1990). Para ilustrar, tem-se o exemplo de uma criança que pede para sua mãe confortar
outra criança que está chorando, mesmo percebendo que a mãe da outra criança está
por perto.
Angústia empática quase-egocêntrica: Mais ou menos a partir dos quatro ou cinco
anos, com o desenvolvimento da habilidade de role-taking (neste caso, ainda
rudimentar), a criança torna-se capaz de não mais confundir a sua angústia com a
79
angústia da outra criança. Porém, como ela ainda não conhece os estados internos do
outro, ela procura ajudar o outro com algo que ajuda a ela própria. Ao ver uma criança
chorando, por exemplo, a criança pode oferecer seu ursinho para tentar consolar a
outra criança.
Verdadeira angústia empática – nesse estágio, a criança é capaz de empatizar, com
mais exatidão que antes, com os sentimentos e necessidades do outro e, desta forma,
pode ajudar o outro com mais eficiência. Isto se dá em função do desenvolvimento da
capacidade de role-taking e com a aquisição de conhecimentos metalingüísticos e
meta-empáticos.
Angústia empática além da situação ou empatia pela condição de vida dos outros: na
adolescência, quando se começa a formar conceitos sociais e com o desenvolvimento
da concepção de que outras pessoas possuem histórias e identidades particulares, o
indivíduo torna-se capaz de empatizar não só com a dor ou desconforto imediato do
outro, mas também com a tristeza crônica do outro ou com a sua desagradável
condição de vida.
Note-se que a evolução de um estágio de empatia para o outro está diretamente
relacionada ao desenvolvimento de um senso cognitivo sobre a existência de outras pessoas
ou do processo de diferenciação do eu. Conforme Hoffman (1990, 1991), essa diferenciação
ocorre em uma seqüência de quatro estágios: 1) o sujeito não é capaz de se diferenciar do
outro; 2) o sujeito adquire a consciência de que o outro é fisicamente diferente de si; 3) o
sujeito tem consciência de que o outro possui sentimentos e estados internos independentes
dos seus; 4) o sujeito obtém consciência de que as outras pessoas possuem histórias e
experiências peculiares e que os seus sentimentos continuam a existir além do aqui e agora. É
nesta perspectiva que Hoffman (2003) afirma que a evolução dos estágios da empatia está
80
intimamente relacionada ao avanço do role-taking, o que não significa dizer que o surgimento
de uma resposta afetiva empática mais evoluída representa o desaparecimento de respostas
empáticas mais primitivas; e, além disso, não se pode esquecer que, para Hoffman (1991), a
maior parte das respostas afetivas empáticas requer baixos níveis de processamento cognitivo.
O avanço cognitivo também está intimamente ligado com dois conceitos centrais da
teoria de Hoffman (1990, 1991), o de angústia empática e o de angústia simpática. O primeiro
conceito, o de angústia empática, faz referência às sensações afetivas de incômodo,
desconforto ou angústia, vivenciadas no self, quando o sujeito percebe que os outros estão
passando por algum infortúnio, o que não exige maiores descentrações cognitivas, já que este
tipo de angústia está prioritariamente centrada no self. Esta angústia pode levar o indivíduo a
procurar se libertar dela. O segundo conceito, o de angústia simpática, descreve um
sentimento de compaixão ou pena pela vítima do infortúnio, que pode se transformar em uma
vontade de aliviar a angústia do outro, e, desta forma pode contribuir para comportamentos
pró-sociais. Note-se que, cognitivamente falando, a transformação da angústia empática na
angústia simpática, depende, segundo Hoffman, do desenvolvimento do sentido cognitivo do
outro e, conseqüentemente, da transferência de parte dos afetos empaticamente sentidos no
self para a imagem do outro. Especificamente em relação à angústia empática, Hoffman
(1990) afirma que apesar deste tipo de afeto parecer “egoísta”, ele também tem um papel
relevante para os comportamentos pró-sociais, pois, na medida em que uma pessoa procura
aliviar a sua própria angústia, ela, necessariamente, está sujeita a aliviar a angústia do outro e,
desta forma, a ter um comportamento pró-social.
Além dos dois sentimentos supramencionados (angústia empática e angústia
simpática), Hoffman (2003) indica outros tipos de sentimentos vicários que revelam
diferentes formas de empatia, a saber:
81
Raiva empática: é o sentimento de raiva direcionado a um agressor em defesa da
vítima de uma agressão. Esse sentimento pode ocorrer, por exemplo, em uma situação
em que se presencia uma criança sendo espancada por um adulto e se sente raiva do
agressor em detrimento da compaixão sentida pela criança.
Compaixão empática – é o sentimento de pena desencadeado em relação à pessoa que
foi agredida, isto é, em relação à vítima.
Culpa empática: é o sentimento gerado quando o observador percebe que ele não fez
nada para mudar a situação da vítima, sobretudo quando a não ajuda decorre de
motivos egoístas, como: evitar o envolvimento com a situação e evitar conseqüências
desagradáveis. Neste caso, a culpa empática pode fazer com que o indivíduo, que não
socorreu a vítima, passe a ajudar outras vítimas em situações semelhantes.
Injustiça empática: é o sentimento que emerge quando o observador vê uma pessoa
considerada como boa ser submetida a um sofrimento. O observador sentirá injustiça,
ao concluir que o sofrimento infligido a vítima não era merecido. A este respeito,
Hoffman comenta que existe uma tendência do observador sentir, primeiramente,
tristeza, raiva e talvez culpa, mas, em seguida, ao concluir que o sofrimento da vítima
não era merecido, sentir injustiça (indignação).
Além destes tipos de sentimentos empáticos, outros podem ser constituídos, conforme
lembra Hoffman (2003), a partir da combinação de dois ou mais destes sentimentos, em
função do tipo de atribuição causal feita pelo observador, assim como do seu grau de
sensibilidade empática.
Tendo em vista não tornar a tese repetitiva, outras questões da teoria de Hoffman serão
abordadas e aprofundadas no Capítulo III, que trata da relação entre moral e empatia e passarse-á, agora, para o próximo ítem, onde serão apresentadas as principais técnicas de
mensuração que têm sido utilizadas para avaliar empatia.
82
2.3. A avaliação da empatia
O interesse em estudar a empatia tem crescido nos últimos anos. Dentre os trabalhos
empíricos, nota-se que a forma de avaliar a empatia tem variado. Utiliza-se tanto
questionários, escalas e histórias ilustradas (por fotos, figuras e gravações), quanto índices
somáticos (análise das expressões faciais e dos gestos) e índices fisiológicos (verificação da
condutibilidade e temperatura da pele e da freqüência cardíaca, por exemplo).
Em relação aos instrumentos que utilizam indicadores somáticos e fisiológicos, esses
têm se mostrado muito úteis no sentido de diminuir a desejabilidade social (Eisenberg-Berg &
Mussen, 1978). Contudo, as desvantagens em utilizá-los parecem suplantar as vantagens. Em
primeiro lugar, esse tipo de técnica exige uma série de aparelhos caros e mostra-se incômoda
para os participantes da pesquisa. Ademais, o manuseio dos aparelhos exige do pesquisador
um certo grau de especialização para utilizá-lo e interpretar os resultados. Sobre os métodos
que mensuram a empatia por meio de indicadores fisiológicos, especificamente Strayer e
Eisenberg (1987) comentam que esta forma de mensuração apresenta-se como desvantajosa
por estar relacionada com a incitação emocional geral, sem que haja certeza acerca do tipo de
emoção vivenciada. No que se refere às medidas somáticas (baseadas na análise sobre a
expressividade facial), na avaliação de Strayer e Eisenberg (1987), elas podem ser bem
aproveitadas, desde que juízes sejam altamente treinados para diferenciar tipos de emoções a
partir das expressões faciais de uma pessoa.
Quanto aos instrumentos tipo lápis e papel, de acordo com Pérez-Albéniz, Paúl,
Etxeberría, Montes e Torres (2003), destacam-se os seguintes: Hogan Empathy Scale (HES,
Hogan, 1969), Questionnaire Measure of Emotional Empathy (QMEE, Mehrabian & Epstein,
1972) e Interpersonal Reactivity Index (IRI, Davis, 1980).
83
É importante esclarecer que o HES é considerada, na análise de Cliffordson (2001),
uma medida de empatia cognitiva, o QMEE, como o próprio nome da escala sugere, uma
medida de empatia emocional, e o IRI, por outro lado, é uma medida multidimensional,
formado, classicamente por 4 sub-escalas, sendo duas Afetivas – personal distress (angústia
pessoal) e emphatic concern (consideração empática) – e duas Cognitivas – role-taking
(tomada de perspectiva) e fantasy (fantasia).
É relevante comentar que o último instrumento mencionado, o IRI, foi um dos
instrumentos escolhidos para medir a empatia na presente tese1. A sua escolha justifica-se, em
primeiro lugar, pelo IRI apresentar um caráter multidimensional, que é congruente com a
compreensão teórica adotada nesta tese a respeito da empatia; e, em segundo lugar, porque ele
vem sendo utilizado com eficácia por diversos pesquisadores de todo mundo (Escrivã,
Navarro & Garcia, 2004; Pérez-Albéniz et al., 2003; Ribeiro, Koller & Camino, 2002,
Sampaio, 2007; Siu & Shek, 2005). Para se ter uma idéia da aceitação do referido instrumento
entre os pesquisadores, nos últimos cinco anos, foram encontrados 101 trabalhos empíricos,
indexados ao PsycINFO, que relataram o uso do IRI; apenas 8 que relataram o uso do QMEE
e 7, o uso do HES; em terceiro lugar, a escolha do IRI é respaldada pelo fato deste
instrumento já ter sido validado no Brasil por Ribeiro, Koller e Camino (2002) e utilizado
com eficácia por pesquisadores brasileiros (Ribeiro, 1996; Sampaio, 2007).
Apoiando a escolha do IRI, menciona-se que Strayer e Eisenberg (1987) consideram,
ao avaliar os diferentes instrumentos de mensuração da empatia, os instrumentos
multidimensionais os mais aperfeiçoados e acurados para investigar a empatia.
Outra questão que merece ser comentada é que, ao se analisar os instrumentos
utilizados para medir a empatia, nota-se o predomínio do uso de instrumentos que avaliam a
empatia em relação a personagens que sentem diferentes emoções, as quais não,
1
É importante esclarecer que na presente tese foi utilizada a versão traduzida, validada e adaptada por Ribeiro, Koller e Camino (2002).
84
necessariamente, relacionam-se a problemas no nível societal ou no intergrupal – as questões
são, na maioria das vezes, formuladas no nível interpessoal, em relação ao que se sente ou
pensa sobre pessoas. Para ilustrar, no IRI, os itens são elaborados nos seguintes termos:
“quando eu vejo alguém se ferir, eu tendo a permanecer calmo”; “quando eu estou
incomodado com alguém, geralmente eu tento me colocar em seu lugar por um momento”.
Como a proposta de intervenção da presente tese busca trabalhar questões morais atreladas
tanto as relações interpessoais como a problemas sociais, considera-se pertinente a criação de
um instrumento para medir a empatia em um nível que ultrapasse as relações interpessoais. É
neste sentido que se propõe no novo instrumento a avaliação da empatia em relação a grupos
de pessoas vítimas de problemas sociais. Para esclarecer, esses grupos são grupos minoritários
(por exemplo, negros sendo menosprezados), trabalhadores (por exemplo, pessoas que são
obrigadas a deixar o campo para trabalhar na cidade), “apenados” (por exemplo, presos
vivendo em situações desumanas), e animais (por exemplo, animais sendo maltratados) (ver
Estudo 1).
Na próxima seção, destacar-se-ão os estudos empíricos realizados acerca da empatia,
tendo como fonte principal a base de dados dos Periódicos Capes.
2.4. Estudos empíricos
Os resultados de uma pesquisa realizada, em Junho de 2010, nas principais bases de
dados de artigos científicos dos Periódicos Capes, utilizando “empatia” (empathy) como
palavra-chave, demonstraram que existe um número significativo de trabalhos acerca da
empatia (PsycINFO = 12919, BIREME = 12011 e Scielo Brasil = 67), contudo, poucos são os
estudos que se relacionam com esta tese. Seguindo o mesmo padrão de apresentação dos
85
estudos empíricos acerca do desenvolvimento moral, realizada no Capítulo I, apresentar-se-á
nesta seção apenas os artigos que, de uma forma ou de outra, se relacionam com este trabalho,
assim como serão excluídos desta seção as pesquisas que já foram citadas anteriormente e
serão incluídos estudos que se relacionem ao tema, mesmo que não estejam indexados nas
bases de dados supramencionadas.
Interessados em investigar a estrutura fatorial do construto empatia nas diferentes
culturas, Enz e Zoll (2006) realizaram uma pesquisa com 252 crianças de Portugal (n = 55),
Alemanha (n = 96) e Reino Unido (n = 101), do sexo masculino e do sexo feminino, com
idades variando entre 8 e 14 anos; e 200 crianças chinesas do sexo masculino e do sexo
feminino, com idades variando entre 7 e 13 anos. Para tanto, utilizaram um instrumento
baseado na Escala de Bryant (1982) e um instrumento desenvolvido por um pesquisador
alemão. De um modo geral, os resultados de análises fatoriais demonstraram a existência de
duas dimensões da empatia: uma cognitiva e outra afetiva; contudo, é relevante registrar que,
na amostra chinesa, a distinção entre essas duas dimensões foi mais fraca do que nos outros
países. Em relação à dimensão afetiva da empatia, os resultados demonstraram que as crianças
chinesas são mais empáticas do que as crianças dos outros países e que as crianças germânicas
são as menos empáticas; no que se refere à dimensão cognitiva da empatia, as crianças do
Reino Unido pontuaram mais alto que as crianças dos outros países nestes itens. Sobre os
resultados observados na amostra chinesa, os autores ressaltaram que a diferença encontrada
pode ter sido decorrente de valores grupais fortemente arraigados na cultura desse país.
Também com o objetivo de estudar a dimensionalidade fatorial da empatia, Siu e Shek
(2005) realizaram um estudo com estudantes secundaristas e universitários da China
utilizando uma versão traduzida e adaptada da escala Interpersonal Reactivity Index (IRI,
Davis, 1980). Os resultados revelaram que, apesar das análises confirmatórias corroborarem o
modelo de Davis (1983), análises exploratórias apontaram para a existência de um modelo
86
com três e não quatro fatores: no primeiro fator predominaram os itens da sub-escala personal
distress; no segundo os itens da sub-escala fantasy e no terceiro fator houve um agrupamento
dos itens da sub-escalas empathic concern e da perspective taking, o que sugere que pode não
ter havido distinção para os jovens chineses entre os componentes cognitivos e afetivos da
empatia, tal como eles são mensurados no IRI.
Batson, Fultz e Schoenrade (1987), igualmente com o objetivo de investigar a
estrutura fatorial do construto empatia, realizaram seis estudos em que pesquisaram se
existiam diferenças na forma das pessoas reagirem ao testemunhar o sofrimento ou angústia
de outra pessoa. Nesses estudos, os participantes avaliaram o tipo de reação afetiva e a
intensidade desta reação a partir de uma lista com 14 adjetivos (alarmed, grieved, upset,
worried, disturbed, perturbed, distressed, troubled, sympathetic, moved, compassionate,
tender, warm e softhearted). Os resultados revelaram, mediante análise fatorial, a existência
de dois fatores: distress (angústia), formado pelos sete primeiros adjetivos (alarmed, grieved,
upset, worried, disturbed, perturbed e distressed) e empathy (empatia), constituído pelos seis
últimos adjetivos (sympathetic, moved, compassionate, tender, warm e softhearted), o que
apóia a perspectiva de Hoffman (1990, 1991) de que a consideração empática e a angústia
empática (semelhante ao distress) são experiências subjetivas distintas.
Ribeiro, Koller e Camino (2001), com o objetivo de adaptar e validar o IRI de Davis
(1980) e a Escala de Empatia de Bryant (1982) para o contexto brasileiro, realizaram um
estudo com adolescentes entre 14 e 16 anos, estudantes do ensino fundamental e do ensino
médio de escolas públicas e privadas. Os escores de consistência interna de ambas as escalas
(0,74 e 0,75) foram considerados satisfatórios e as versões traduzidas para o português foram
recomendadas pelos pesquisadores.
No que se refere à relação entre a empatia e as variáveis sócio-demográficas, Lennon e
Eisenberg (1987), fundamentados em uma revisão realizada em pesquisas que consideram a
87
influência do gênero e da idade sobre o construto empatia, sugerem que não existe um
consenso entre os pesquisadores acerca de tal influência. Especificamente em relação ao
gênero, Lennon e Eisenberg (1987) mencionam que existe a influência dos métodos utilizados
para acessar a empatia: em situações nas quais os participantes tinham controle consciente
sobre suas respostas e as demandas situacionais eram elevadas, as diferenças tenderam a ser
mais acentuadas e, por outro lado, quando as demandas eram mais sutis e os participantes não
tinham controle consciente de suas respostas, nenhuma diferença de gênero foi observada. De
forma semelhante, Lennon e Eisenberg (1987) apontaram que a questão metodológica
também pode ter influenciado as diferenças entre os resultados dos estudos que tratam da
variável idade: auto-relatos sobre as emoções sentidas, quando se inferem os afetos de outras
pessoas, parecem aumentar com avanços na idade; e, índices que se baseiam em expressões
faciais parecem estar inversamente relacionados, ou até mesmo não relacionados ao aumento
da idade durante os anos escolares.
Diferenças de gênero foram identificadas nos quatro países estudados por Enz e Zoll
(2006): os resultados indicaram que as meninas se descreveram como sendo mais empáticas
do que os meninos. Sobre o efeito do nível de escolaridade, os pesquisadores constataram que
os escores das duas dimensões da empatia diminuíram à medida que as crianças avançavam
nas séries escolares. No que se refere ao efeito da idade, apenas na amostra chinesa se
constatou o efeito desta variável: o índice de empatia diminuiu à medida que a idade das
crianças avançou.
Ribeiro, Koller e Camino (2001) também verificaram diferenças de gênero em relação
ao sentimento de empatia: as meninas apresentaram escores mais altos do que os meninos na
Escala de Empatia de Bryant e na versão brasileira do IRI de Davis. Em relação à
escolaridade, os pesquisadores constataram que os estudantes do ensino fundamental
apresentaram maiores escores do que os de ensino médio na Escala de Empatia de Bryant.
88
Sampaio et al. (2008), em uma pesquisa realizada com 120 adolescentes, do sexo
masculino e do sexo feminino, de escolas públicas e particulares, utilizando a versão brasileira
da escala de Davis, adaptada por Ribeiro, Koller e Camino (2001), verificaram diferenças nos
níveis geral de empatia, consideração empática e personal distress, relacionadas ao sexo, mas
nenhuma influência desta variável sobre a tomada de perspectiva. Além disso, observaram
diferenças entre estudantes de escolas públicas e particulares no que se refere aos escores
obtidos no nível geral de empatia e de consideração empática.
Em um outro estudo, Barnett, King, Howard e Dino (1980) abordaram a questão do
gênero analisando os antecedentes da empatia. Neste estudo, constataram que a empatia nas
meninas estava significativamente associada com a empatia nas mães, e não nos pais; as mães
também revelavam maiores níveis de afeto na interação com seus filhos, ênfase nos
sentimentos das outras pessoas, e menos uso de disciplina do que os pais.
Cecconello e Koller (2000), partindo do conceito de empatia de Eisenberg e Strayer
(1987), investigaram a relação entre competência social e empatia, utilizando o Teste das
Histórias Incompletas (THI) de Mondell e Tyler (1981) para avaliar competência social e a
Escala de Empatia para Crianças e Adolescentes (EECA) de Bryant (1982) para avaliar a
empatia. Participaram do estudo 100 crianças, do sexo feminino e do sexo masculino, com
idades entre seis e nove anos em situação de pobreza. Os resultados indicaram que as meninas
eram mais competentes socialmente e mais empáticas do que os meninos. Da mesma forma,
as crianças mais empáticas tendiam a ser mais competentes socialmente do que as outras.
Utilizando a mesma escala administrada por Cecconello e Koller (2000), a EECA de
Bryant (1982), Motta, Falcone, Clark e Manhães (2006) investigaram a relação entre práticas
educativas e empatia, definida dentro de uma perspectiva evolucionista (Plutchik, 1992). Para
tanto, além de aplicarem a EECA a 77 crianças (sendo 37 de abrigos), os autores realizaram
entrevistas com base em cenas de vídeo, selecionadas para eliciar raiva, tristeza, alegria e
89
medo. De um modo geral, os resultados indicaram que as crianças do Abrigo de curta
permanência apresentaram escores inferiores aos das crianças do Abrigo de longa
permanência e do Lar, tanto em termos de empatia quanto de práticas educativas, o que
sugere, na análise dos autores, a existência de uma relação entre as práticas educativas
adotadas pelos pais ou responsáveis e o desenvolvimento da empatia em crianças.
Nunes e Hutz (2007) abordaram a empatia, ou melhor dizendo a falta de empatia,
como um traço de personalidade avaliado pela Escala Fatorial de Socialização (EFS).
Participaram do estudo realizado por Nunes e Hutz (2007), 1100 pessoas de cinco estados
brasileiros, do sexo masculino e do sexo feminino, com nível de escolarização médio ou
superior. Análises fatoriais, para a verificação da dimensionalidade da EFS, indicaram três
fatores, denominados de Amabilidade, Pró-sociabilidade e Confiança nas pessoas.
Em relação à relevância de se estudar empatia, estudos atuais têm revelado que a
habilidade de empatia pode estar relacionada com uma série de benefícios, tais como:
1) Uma maior aceitação pelos pares – Um estudo realizado por Warden e Mackinnon
(2003), com 131 crianças de 9 a 10 anos de idade, revelou, dentre outros resultados,
que crianças consideradas empáticas eram significativamente mais populares do que
os outros grupos de crianças avaliadas.
2) Um maior ajustamento social – Uma pesquisa realizada por Crick (1996), que teve
como objetivo inicial avaliar a agressão relacional em crianças em idade pré-escolar,
demonstrou que crianças não empáticas eram mais susceptíveis a terem um menor
ajustamento social.
3) Uma melhor saúde mental – Um estudo realizado por Blair (1997) demonstrou que
crianças com alto grau de tendência psicopática apresentavam menores índices de
habilidades empáticas (medida pela atribuição de emoções morais para os
90
protagonistas das histórias) do que crianças com um baixo nível de tendência
psicopática.
4) Uma maior preocupação com o outro – Uma pesquisa realizada por Hastings, ZahnWaler, Robinson, Usher e Bridges (2000), que tinha como objetivo principal
investigar o problema da preocupação com o outro por crianças com problemas de
comportamento,
revelou
que
crianças
com
problemas
de
comportamento
apresentavam uma tendência significativa a não se preocupar com mães, professores e
outras crianças, além de apresentarem um baixo grau de sensibilidade empática,
quando comparadas com outros grupos de crianças.
5) Maior qualidade nas relações maritais. Um estudo realizado por Davis (1983), com
119 estudantes universitários envolvidos em relacionamentos monogâmicos
românticos, apoiou a idéia de que a capacidade empática favorece uma maior
qualidade nas relações maritais.
Ciente dos benefícios da empatia para o ser humano, uma pesquisadora
contemporânea e estudiosa da empatia, Susan Verducci, comenta que um grupo
"extraordinariamente diversificado de pensadores educacionais americanos estão chamando
para cultivar a empatia nas escolas com o objetivo de educação moral" (2000a, p.63). Ela cita
o trabalho dos educadores Thomas Lickons, William Bennett e Maxine Greene, do teórico
Nel Noddings, e dos filósofos da moral John Deigh, Deborah Meier e Martha Nussbaum,
ressaltando que apesar desses estudiosos partirem de perspectivas diferentes, todos "entendem
a empatia como conectada a moralidade" (p. 63). É importante registrar que os autores
mencionados por Verducci (2000a) apenas exaltam teoricamente a importância da empatia na
escola, porém a seguir serão apresentadas algumas intervenções.
Day (2002) investigou os efeitos de uma oficina de teatro destinada a aumentar a
empatia de alunos, entre 11 e 15 anos, com pessoas refugiadas e com pessoas desabrigadas,
91
assim como para incentivá-los a tornarem-se agentes morais autônomos. Participaram das
oficinas três escolas, localizadas em Londres, etnicamente diversificadas. Os dados foram
obtidos por meio de observações descritivas e entrevistas semi-estruturadas com os alunos,
antes e imediatamente após a oficina e, novamente, dois meses depois. Os resultados
revelaram que as percepções dos alunos sobre os refugiados e pessoas desabrigadas mudaram
após a participação nas oficinas. Além disso, foi verificado entre os alunos bastante
entusiasmo para a promoção de ações voltadas à inclusão dos refugiados e pessoas
desabrigadas no convívio social. Contudo, depois de dois meses, o entusiasmo inicial foi
substituído por frustração, gerada em função de não saberem como tomar outras medidas.
Apoiando o programa de intervenção voltado para a promoção da empatia por intermédio do
teatro, Verducci (2000b) defende a hipótese de que a experiência de atuar favorece a empatia.
Também corroborando esta idéia Collum (1976), em um estudo empírico, utilizando a Escala
de Empatia de Hogan, revela que os atores são mais empáticos que os não atores.
Por outro lado, conforme comenta Arnold (2003), a imaginação é uma característica
necessária, mas não suficiente para promover empatia. Para este autor, deve-se incentivar os
alunos a também participar de experiências cognitivas, mediante uma dinâmica entre
pensamento e sentimento, a fim de promover a aprendizagem da empatia mais eficazmente.
Em uma perspectiva semelhante à de Arnold (2003), Upright (2002) sugere o uso de Dilemas
Morais para aumentar a Empatia em crianças. Na perspectiva de Upright, a empatia é um
processo apreendido que pode ser modelado com sucesso nas aulas a partir do uso de dilemas
morais e role-play. Na sua concepção a estratégia deve envolver: (a) a utilização de
observações formais e informais, (b) entrevistas informais, (c) a escolha das histórias
adequadas, (d) vários métodos de apresentação e (e) grandes discussões em pequenos grupos
e (f) técnicas de fechamento, tais como amostras de escrita criativa.
92
Em um estudo realizado no Canadá, por Tsai e Kaufman (2009), foi investigada uma
forma de educação empática bastante inusitada. Os pesquisadores estudaram a possibilidade
de se utilizar um vídeo game portátil que simula um animal de estimação para melhorar a
empatia da criança e as atitudes humanas. Os resultados mostraram que, após o jogo
Nintendogs, quando se confrontou os resultados do pré-teste com os do pós-teste, os
participantes de ambos os sexos tiveram um aumento significativo no grau de empatia,
verificado por meio da Bryant Empathy Index, assim como no nível de atitude humana,
verificado por intermédio da Intermediate Attitude Scale. As análises estatísticas também
apontaram para uma correlação entre o tempo de brincadeira com o jogo e a melhora no
relacionamento com animais.
No Brasil, Falcone (1999) desenvolveu um Programa de Treinamento da Empatia
(PTE), no qual foi utilizado jogos de papéis para promover a empatia em estudantes
universitários, em 11 encontros. Nesse trabalho, no grupo experimental participaram dez
estudantes (três do sexo masculino e sete do sexo feminino), selecionados randomicamente, e,
no grupo de controle, sete sujeitos (quatro do sexo masculino e três do sexo feminino). Os
sujeitos foram filmados em situações de jogos de papéis, antes e depois do treinamento, com
follow up de 30 dias. Os conteúdos verbais e não-verbais de seus comportamentos foram
avaliados por seis juízes previamente treinados e cegos para ambos os grupos. Os resultados
revelaram mudanças significativas entre os grupos na comunicação verbal e em quatro dos 12
aspectos da comunicação não-verbal.
Mais recentemente, foi publicado um trabalho de Frare et al. (2005), que tinha como
objetivo principal avaliar um programa para o ensino do comportamento empático em
crianças brasileiras, em contexto clínico. Dentro de uma perspectiva comportamental, os
autores desenvolveram atividades lúdicas para o ensino de nove comportamentos empáticos,
sob a contingência de reforços positivos. Desses comportamentos, seis foram aprendidos pela
93
criança durante as sessões. Os resultados possibilitaram, de acordo com os autores, identificar
que, quando o ensino é programado, a aprendizagem ocorre de maneira a possibilitar ao
terapeuta intervir mais precisamente sobre aqueles comportamentos que estão com mais
dificuldades de serem aprendidos, aumentando, dessa forma, a eficiência do atendimento.
2.5. Considerações sobre o capítulo
Ao se realizar um breve percurso histórico sobre a noção de empatia, percebe-se que
este construto tem sido objeto de interesse, ao longo dos anos, de diversos campos do saber.
Especificamente na psicologia, a empatia tem sido estudada, sobretudo, por pesquisadores das
áreas clínica, social, behaviorista e do desenvolvimento.
Sobre o conceito de empatia, nota-se que as definições apresentadas focalizam
aspectos
distintos.
Alguns
autores
defendem
que
a
empatia
é
um
fenômeno
predominantemente cognitivo; enquanto outros afirmam que a empatia é essencialmente
afetiva, com alguns componentes cognitivos; ainda outros vêem a empatia como um construto
multidimensional, que abrange não apenas componentes cognitivos e afetivos, mas também
comportamentais (Davis, 1980; Ribeiro, Koller & Camino, 2002). Esta última compreensão
da empatia é a que tem tido mais sucesso na atualidade entre os estudiosos.
Pode-se dizer que Hoffman adota também uma perspectiva multidimensional, na
medida em que considera em sua teoria as três dimensões da empatia: a dimensão cognitiva,
quando ele exalta, por exemplo, a importância do role-taking para o avanço do
desenvolvimento empático, a dimensão afetiva, quando discorre, por exemplo, sobre os
primeiros estágios de desenvolvimento da empatia, e a dimensão comportamental, quando
comenta, por exemplo, sobre os comportamentos pró-sociais motivados pela empatia. Além
94
do mais, Hoffman pode ser considerado o autor que melhor oferece um detalhamento dos
aspectos psicológicos envolvidos em diferentes formas de empatia (raiva empática,
compaixão empática, culpa empática, injustiça empática) e em diferentes estágios de empatia
(empatia global, empatia egocêntrica, angústia empática quase egocêntrica, verdadeira
angústia empática, angústia empática além da situação ou empatia pela condição de vida dos
outros). Por outro lado, Hoffman é o único a assumir uma posição eclética, em que reúne
idéias do behaviorismo, do cognitivismo e da aprendizagem social (Camino, 2009). Foi nesse
sentido que se elegeu Hoffman como o principal teórico da empatia desta tese. Também a sua
escolha se deu em função da relação que ele faz entre empatia e desenvolvimento moral, que
será apresentada no próximo capítulo, e de sua perspectiva sócio-cognitiva, que se assemelha
a de Piaget e Kohlberg (os autores que fundamentam a concepção de desenvolvimento moral
adotada nessa tese).
Em relação à avaliação da empatia, merece destaque, na análise de Strayer e Eisenberg
(1987), as escalas multidimensionais como sendo as mais aperfeiçoadas, já que tem
predominado nelas uma operacionalização da empatia como um construto multidimensional.
Por outro lado, ao se analisar essas escalas, nota-se o predomínio de testes que medem a
empatia apenas em relação a personagens que sentem diferentes emoções, as quais não,
necessariamente, relacionam-se a problemas sociais – as questões são, na maioria das vezes,
formuladas em relação ao que se sente ou pensa sobre pessoas. É nesse sentido que se propõe
no novo instrumento a avaliação da empatia focada em personagens classificados socialmente
em categorias que se encontram em situações referentes a diferentes problemáticas sociais.
No que se refere aos estudos empíricos, alguns foram encontrados, mas poucos têm
relação direta com esta tese. Duan e Hill (1996) consideram tímido o número de trabalhos
nessa área nas últimas décadas, o que é corroborado por Camino (2009) quando analisa o
estudo da empatia no contexto brasileiro. Os estudos realizados demonstram diferenças em
95
relação ao sentimento empático em função da cultura (Enz & Zoll, 2006); controvérsias em
relação à influência do gênero e da idade sobre a empatia (Lennon & Eisenberg, 1987); uma
tendência a se perceber a empatia como um construto multifatorial (Batson, Fultz &
Schoenrade, 1987; Ribeiro, Koller & Camino, 2001; Siu & Shek, 2005); diferentes benefícios
do desenvolvimento da habilidade empática, tais como: uma maior aceitação pelos pares
(Warden & Mackinnon, 2003), um maior ajustamento social (Crick, 1996), uma melhor saúde
mental (Blair, 1997), uma maior preocupação com o outro (Hastings et al., 2000) e uma maior
qualidade nas relações maritais (Davis, 1983).
Em termos teóricos, existem muitos contrapontos conceituais, há definições da
empatia que ressaltam, sobretudo, o componente comportamental da empatia (Falcone, 1999;
Freire et al., 2005); definições que dão ênfase, sobretudo, ao componente afetivo (Cecconello
& Koller, 2000); definições que concebem a empatia dentro de uma visão desenvolvimentista,
definindo-a a partir de M. L. Hoffman (Sampaio et al., 2008); definições que se referem a
empatia como uma habilidade social, constituída de três componentes, o cognitivo, o afetivo e
o comportamental (Motta et al., 2006); e, finalmente, definições que abordam a empatia
como um traço de personalidade (Nunes & Hutz, 2007).
Em termos empíricos, existe uma grande variedade de formas de se estudar a empatia.
Mas, nos artigos analisados (Cecconello & Koller, 2000, Motta & cols., 2006, Nunes & Hutz,
2007, Sampaio et al., 2008) prevaleceu o uso do instrumento denominado escala.
Para finalizar, é importante comentar que poucos trabalhos foram encontrados com
propostas de intervenções voltadas para o desenvolvimento da empatia, apesar dos benefícios
indiscutíveis das intervenções realizadas (Verducci, 2000b). Nessas propostas predominam o
uso da dramatização e de jogos de papéis, que para se tornarem eficazes deveriam, na análise
de Arnold (2003), incluir experiências cognitivas, mediante uma dinâmica entre pensamento e
sentimento. É exatamente sobre esta relação entre pensamento e afeto que o próximo capítulo
96
discorrerá; mais precisamente, sobre a relação entre moral e empatia, tanto do ponto de vista
teórico, quanto do ponto de vista empírico.
97
CAPÍTULO III – MORAL E EMPATIA
98
3.1. Considerações teóricas
Durante muito tempo se difundiu a idéia de que as emoções podem prejudicar o
raciocínio moral. Em um tribunal, por exemplo, os jurados são orientados a não permitir que
as emoções influenciem suas decisões. Segundo Pizarro (2000), esta concepção que percebe
um antagonismo entre julgamento moral e emoção encontra nas teorias acerca da moral pelo
menos três argumentos favoráveis. O primeiro, é que as emoções destroem o princípio da
imparcialidade do julgamento. Por exemplo, ao avaliar as ações de um indivíduo que roubou
um carro, a opinião do indivíduo tende a mudar quando ele descobre que o ladrão é seu irmão.
Neste caso, as emoções podem conduzir o avaliador no sentido de favorecer àqueles com
quem ele se importa. Um segundo problema com as emoções é que elas surgem
freqüentemente devido à presença de fatores arbitrários. Por exemplo, quando o indivíduo fica
diante de um estranho necessitado, ele pode ser motivado a não ajudá-lo simplesmente porque
ele está vestindo uma camisa que o faz lembrar de um velho inimigo. Os efeitos do humor no
comportamento de ajuda também revelam este lado arbitrário das emoções. Por exemplo, o
fato da pessoa estar de bom humor pode motivá-la a ajudar os necessitados. Finalmente, o
terceiro argumento é que as emoções são involuntárias e, portanto, irracionais. Se isto for
verdade, as emoções seriam meros reflexos automáticos da mente.
Diante dos argumentos apresentados, parece claro que, em alguns casos, as emoções
de fato levam os indivíduos a agir de uma forma que pode comprometer as suas decisões
morais. No entanto, conforme argumenta Pizarro (2000), é questionável o posicionamento de
99
alguns teóricos que afirmam que as emoções nunca podem ajudar, e sempre prejudicam os
julgamentos morais. Em primeiro lugar, porque, na análise de Pizarro, as pessoas são dotadas
de capacidade de regular suas emoções, e em muitas ocasiões são capazes de efetivamente
induzir ou suprimir as reações emocionais por meio de uma variedade de táticas, que as
permitem recrutar emoções quando necessárias e flexibilizar outras. Em segundo lugar,
conforme pontua Pizarro, as emoções não estão vazias, nem desprovidas de influência
racional. Ao contrário, as emoções refletem as preocupações pré-existentes, como crenças e
princípios morais, o que torna as emoções menos arbitrárias do que pode parecer. Finalmente,
Pizarro argumenta que as emoções, ao invés de atrapalhar o processo de raciocínio moral, na
verdade, ajudam o raciocínio moral agindo como um agente centralizador, que concentra a
atenção e o recurso cognitivo do indivíduo sobre o problema em pauta.
A defesa de Pizarro (2000) em relação à relevância das emoções sobre o julgamento
moral fica ainda mais contundente quando ele pontua os benefícios da empatia para o
julgamento moral, o que, na realidade, já vêm sendo destacado na psicologia do
desenvolvimento (Eisenberg, 1986; Hoffman, 1990), na psicologia social (Batson, 1991) e na
filosofia (Blum, 1980).
O primeiro argumento que demonstra os benefícios da empatia para o julgamento
moral refere-se ao fato de que a empatia tem a capacidade de sensibilizar o ser humano para o
sofrimento do outro. Quando se está, por exemplo, na presença de uma pessoa angustiada, o
sentimento empático fornece pistas do estado do outro, o que possibilita uma ação moral
congruente com tal percepção (Eisenberg, 1986; Hoffman, 1990)
Um outro argumento que ressalta os benefícios da empatia para o julgamento moral
está atrelado a idéia de que o despertar da empatia não apenas conduz a informação do estado
do outro, mas também leva o indivíduo a sentir com o outro, o que, por sua vez, pode
determina a ação. Porém, é bom lembrar que, na análise de Pizarro (2000), a empatia não
100
determina a ação de forma automática, pois ela também pode ser confrontada com o sistema
de crenças de um indivíduo. Por exemplo, se um indivíduo acredita que as injustiças na
sociedade são devidas as desigualdades estruturais existentes; se este indivíduo é confrontado
com uma pessoa sem-teto, sofrendo frio, mas que aparenta estar bêbado e lhe pede dinheiro; e
se ele começa a ter uma resposta empática, neste instante, ele pode questionar se sua resposta
empática é justificável. Em outras palavras, para Pizarro, na ausência de inconsistências
graves, a ação de ajuda poderia até ser automática, apesar de não deixar a jurisdição das
crenças morais; mas, em situações que causam inconsistências maiores entre as crenças
morais, a empatia experimentada funcionaria mais como uma informação útil para a decisão a
ser tomada. Por outro lado, conforme lembra Pizarro, a empatia também possui o poder de
afetar o sistema de crenças morais.
Parece, de fato, existir, conforme justificou Pizarro (2000) uma forte relação entre
empatia e moral. Apoiando esta idéia, Fabes, Carlo, Kupanoff e Laible (1999) afirmam que,
na atualidade, a maioria dos pesquisadores concorda que para desenvolver uma explicação
abrangente do desenvolvimento pró-social e moral é necessário considerar a influência das
emoções. Um bom representante desses estudiosos é o psicólogo Martin Hoffman.
Na verdade, conforme lembra Hoffman (2003), a idéia de que as emoções, mais
precisamente a empatia influencia o julgamento moral, não é nova. David Hume (1751/1957,
citado por Hoffman, 2003) sugeriu, há dois séculos, que os seres humanos têm uma tendência
a apoiar atos que promovem bem-estar no outro e a condenar atos que podem fazer mal. Neste
sentido, se uma pessoa empatiza com alguém deve, por conseguinte, apoiar ou condenar,
respectivamente, atos que ajudem ou prejudiquem este alguém. Além disso, Hume
argumentou que a empatia promove o último critério válido para um julgamento moral
correto/ menos injusto (correctness).
101
Particularmente Hoffman (1990) acredita que, durante o desenvolvimento, os afetos
empáticos tornam-se parte de muitas estruturas motivacionais e afetivas, antes mesmo que os
princípios morais sejam elaborados. E apóia, nesta direção, a idéia de Hume de que a empatia
goza de uma anterioridade em relação à moral, e, em certo sentido, a determina. Desta forma,
Hoffman difere de Piaget (1932/1994) e Kohlberg (1969, 1976, 1984).
A crítica mais contundente que Hoffman (1990) faz à teoria de Kohlberg está
relacionada ao pressuposto kohlberguiano de que a justiça é a essência da moralidade e
constitui um princípio universal. Também considera falha a teoria de Piaget porque, de forma
semelhante à Kohlberg, negligencia em suas investigações a influência de fatores afetivos e
motivacionais no julgamento moral.
Especificamente no que se refere à relação entre raciocínio moral e empatia, Hoffman
(1990) percebe o raciocínio moral como sendo fortemente influenciado pela empatia, que age
auxiliando o indivíduo a eleger qual dentre os princípios morais de justiça (necessidade,
igualdade e eqüidade) seria mais importante para ser considerado em uma determinada
situação. Em outras palavras, na visão de Hoffman (1990, 1991), o ato moral é motivado por
uma tendência a buscar o bem-estar das outras pessoas, decorrente de afetos empáticos. Neste
caso, seria a empatia que contribuiria para o julgamento moral e não o inverso.
Por outro lado, é bom lembrar que, apesar de Piaget e Kohlberg não terem enfatizado o
plano afetivo em investigações empíricas, eles não desconsideraram esta dimensão em suas
teorias: segundo Kohlberg (1971), “...todos os eventos mentais têm aspectos cognitivos e
afetivos, e o desenvolvimento de disposições mentais reflete mudanças reconhecíveis tanto
nas perspectivas cognitivas quanto nas afetivas” (pp. 181-189); e, de acordo com Piaget
(1977): “vida afetiva e vida cognitiva são inseparáveis, embora distintas. E são inseparáveis
porque todo o intercâmbio com o meio pressupõe ao mesmo tempo estruturação e
valorização... Assim é que não se poderia raciocinar, inclusive em matemática, sem vivenciar
102
certos sentimentos...” (p. 16). De forma semelhante, dizer que Hoffman ressaltou a
importância dos afetos sobre o desenvolvimento moral, não significa dizer que ele
desconsiderou o aspecto cognitivo em sua teoria. Pelo contrário, na teoria de Hoffman (1990,
2003) o desenvolvimento cognitivo é exaltado na medida em que, para Hoffman, a empatia
está inteiramente relacionada ao desenvolvimento de um senso cognitivo sobre a existência de
outras pessoas e ao processo de diferenciação do self.
Sobre este aparente antagonismo entre Kohlberg e Hoffman, Gibbs (1991) comenta
que essas duas teorias são potencialmente integráveis e complementares: “Similarmente, [é
razoável supor que] tanto a justiça (prescrições baseadas na igualdade e na reciprocidade)
quanto à empatia... contribuam para a motivação do comportamento moral.” (p. 207). Gibbs
acrescenta que tanto Kohlberg quanto Hoffman permitem tal integração: Kohlberg quando
reconhece que não se dá a devida atenção ao papel desempenhado pelos sentimentos de
empatia e compaixão; e Hoffman quando afirma que uma teoria da moralidade
completamente compreensível deve, necessariamente, abordar o processo cognitivo da
descentração. Em relação a Piaget, Gibbs (1991) afirma que esta visão é a mais completa
acerca dos papéis motivacionais desempenhados pela afetividade e pela cognição, na medida
em que para Piaget estas duas instâncias são inseparáveis e se influenciam mutuamente.
A seguir serão apresentados os estudos empíricos que relacionam empatia e
desenvolvimento moral, que, de uma forma ou de outra, confirmam ou refutam o que os
autores aqui apresentados teorizaram.
3.2. Estudos empíricos
Uma revisão da literatura realizada, em Junho de 2010, nos principais bancos de dados
disponíveis no site dos Periódicos Capes, utilizando “moral and empathy” como palavras103
chave, revelou a presença de 615 no PsycINFO, 592 no BIREME e 3 no Scielo Brasil.
Contudo, nessa seção, somente serão apresentados os artigos que, de uma forma ou de outra,
contribuem para o debate teórico e empírico de interesse para esta tese.
Preocupados em investigar como o cérebro infantil processa informações morais e
empáticas, Decety, Michalska e Akitsuki (2008) realizaram experimentos com crianças entre
sete e 12 anos. Os pesquisadores da Universidade de Chicago utilizaram uma functional
Magnetic Resonance Imaging (fMRI) para avaliar a reação de 17 crianças (nove meninas e
oito meninos) ao se deparar com fotografias de pessoas experimentando dor provocadas tanto
de forma acidental (como quando alguém derruba uma tigela pesada e machuca a mão de uma
pessoa), quanto de forma intencional (quando alguém pisa intencionalmente no pé de uma
pessoa). As crianças também viram imagens de pessoas sem dor e imagens de pessoas
ajudando alguém a aliviar a dor. Os investigadores constataram que as crianças parecem ser
naturalmente inclinadas a sentir empatia e a ter um pensamento moral ao se deparar com a dor
do outro. Os exames mostraram que as partes do cérebro ativadas quando os adultos vêem a
dor também foram acionadas em crianças. Mais precisamente, a percepção das outras pessoas
com dor foi associada com o aumento da atividade hemodinâmica nos circuitos neurais
envolvidas na transformação da experiência da dor, incluindo a ínsula, córtex
somatosensorial, córtex midcigulate anterior, área cinzenta periaquedutal e complementares.
No entanto, regiões diferenciadas foram ativadas quando as crianças viram animações em que
se prejudicava alguém intencionalmente. Ativou-se, neste caso, as regiões do cérebro
relacionadas à interação social e ao raciocínio moral medial (a junção temporo-parietal, o
paracigulate, orital córtex frontal e amígdala). Este estudo foi aprovado pela National Science
Foundation e forneceu pistas de que crianças possuem, desde cedo, noções de certo e errado e
uma capacidade de se colocar no lugar do outro, e de como seus cérebros processam tais
104
informações. Além disso, 13 das 17 crianças, após verem as imagens, confirmaram
verbalmente seu sentimento moral de injustiça revelado na ressonância.
Também interessados em investigar questões morais e empáticas na infância, NunnerWinkler e Sodian (1988) constataram, por meio do uso de histórias em que o personagem
principal deliberadamente roubava, mentia ou atacava outra criança, que os participantes mais
velhos (cerca de 8 anos) já conseguiam se colocar no papel do protagonista e inferir seus
sentimentos, no sentido de avaliá-lo como estando mal ou triste em função da quebra da regra,
enquanto que as mais novas só conseguiam fazer a inferência da felicidade da personagem por
ter conseguido o que queriam.
Igualmente contribuindo com a compreensão das questões morais e empáticas na
infância, Camino, Camino e Leyens (1996) realizaram uma pesquisa com 222 crianças, que
foram divididas em dois grupos etários (5 a 7 anos e 8 a 10 anos). Utilizando pequenas
histórias, esses pesquisadores manipularam as seguintes variáveis: intencionalidade do
personagem principal (sem intenção, intenção altruísta, intenção hostil), as ações desse
personagem (agressivas ou de roubo) e a gravidade das conseqüências da ação (mais grave ou
menos grave). Os resultados revelaram um aumento na capacidade de atribuir corretamente às
emoções dos outros em função da idade; uma relação entre a capacidade de atribuir
corretamente às emoções dos outros e o julgamento moral para os dois grupos etários; uma
progressão na empatia inferencial e no escore global de empatia em função da idade, no
sentido que, quanto mais velhas, mais as crianças se identificavam com o personagem
altruísta; e, uma relação entre empatia inferencial e julgamento moral, pois as crianças que
sentiram empatia pelo personagem altruísta deram mais respostas certas (ao avaliar quem era
o personagem mais vil) do que as que não sentiram empatia por ele.
Eisenberg, Shell, Pasternack, Lennon, Beller e Mathy (1987), por sua vez, em um
estudo longitudinal, investigaram a mudança no julgamento pró-social durante um período de
105
sete anos. Mais precisamente, eles analisaram as inter-relações entre julgamento moral,
empatia e comportamento pró-social e examinaram se existiam diferenças de gênero no
desenvolvimento do julgamento moral pró-social. Participaram do estudo dois grupos de
crianças, entrevistadas pela primeira vez entre 9-10 ou 11-12 anos. Essas crianças foram
acompanhadas durante um período de cinco a sete anos. Os resultados revelaram que: o
raciocínio hedonista diminuiu com a idade; o julgamento moral orientado para as
necessidades simples aumentou com a idade e depois se estabilizou; a maioria dos outros
tipos mais sofisticados de raciocínio aumentou de forma linear com a idade; modos de
raciocínio que refletem a empatia aumentaram com a idade para as meninas, mas não para os
meninos; a empatia foi positivamente relacionada com os julgamentos orientados para as
necessidades e com um maior nível de raciocínio pró-social e foi negativamente relacionada
ao raciocínio hedonista (dependendo da idade das crianças); a empatia foi relacionada com a
doação entre as crianças mais velhas.
Preocupados com a relação entre comportamentos altruísticos, justiça distributiva e
empatia, Batson et al. (1995) realizaram dois experimentos com estudantes universitários,
com a finalidade de investigar a possibilidade da empatia levar alguém a se comportar de
maneira não condizente com seus princípios morais ligados à justiça.
No primeiro experimento, Batson et al. (1995) utilizaram um cenário no qual a tarefa
dos respondentes deveria ser indicar como dois trabalhadores (A e C) deveriam ser
designados para duas situações: uma com conseqüências positivas e outra com conseqüências
negativas. A empatia foi manipulada por meio de instruções para que os participantes
imaginassem como o trabalhador C se sentiria, quais seriam as repercussões da decisão
distributiva sobre sua vida (condição de alta empatia), ou que tomassem suas decisões da
maneira mais objetiva possível (condição de baixa empatia). Além disso, havia uma condição
na qual os respondentes recebiam uma pequena carta deste trabalhador, falando de sua
106
situação atual, necessidades, aspirações (condição de comunicação) e outra na qual eles não
recebiam esta carta (condição de não comunicação). Os resultados indicaram que nas
condições de não comunicação e baixa empatia, o trabalhador C foi designado 50% das vezes
para situação com conseqüências positivas. Por outro lado, na condição de alta empatia o
trabalhador C foi designado para situação com conseqüências positivas 75% das vezes.
No segundo experimento, Batson et al. (1995) utilizaram um cenário no qual os
participantes foram levados a acreditar que poderiam fazer com que uma criança que tinha
uma doença grave melhorasse sua qualidade de vida, por meio de sua realocação na fila de
espera de uma associação que prestava assistência a crianças necessitadas, mesmo que isto
implicasse em prejudicar outras crianças também seriamente doentes e que estavam em uma
posição mais privilegiada. A empatia foi manipulada de maneira semelhante àquela utilizada
no primeiro estudo. De uma maneira geral, os resultados revelaram que os indivíduos na
condição de alta empatia foram mais susceptíveis a criança em pauta do que os indivíduos na
condição de baixa empatia.
Batson e Moran (1999), por sua vez, para investigar a relação entre comportamento
altruístico, justiça distributiva e empatia utilizaram o clássico dilema do prisioneiro.
Participaram deste estudo 60 mulheres universitárias que foram solicitadas a encontrar uma
solução para o dilema do prisioneiro. A empatia foi manipulada para um grupo de mulheres.
Independentemente do dilema ser enquadrado como uma troca social ou como uma transação
comercial, a cooperação foi significativamente maior entre as mulheres que foram levadas a
sentir empatia pelo outro do que entre aquelas que não foram levadas a sentir empatia. Esses
resultados levaram os pesquisadores a supor que o altruísmo não é simplesmente um tipo de
motivação moral, mas é uma forma distinta de motivação que também está relacionada com a
empatia.
107
Baseado no modelo de Batson de altruísmo, Berenguer (2010) testou o pressuposto de
que o raciocínio moral referente ao meio ambiente (número de razões morais dadas para
comportamentos pró-ambientais) pode ser melhorado por meio da manipulação do sentimento
de empatia. Testou ainda a idéia de que o argumento do raciocínio moral seria diferente,
dependendo do objeto da empatia ser um animal ou um ser humano. O raciocínio moral foi
avaliado por meio de quatro diferentes dilemas morais ecológicos, com as respostas
codificadas em três categorias. Os resultados do estudo indicaram que os participantes que
mostraram um alto nível de empatia deram argumentos morais mais elevados do que aqueles
que mostraram baixa empatia. A hipótese de que os argumentos iriam variar em função do
objeto de empatia avaliado também foi confirmada.
Também interessados com a relação entre empatia, moral e comportamento pró-social,
Eisenberg, Zhou e Koller (2001) verificaram, em uma pesquisa com estudantes brasileiros,
que a tomada de perspectiva parece ter um efeito indireto sobre os comportamentos morais,
na medida em que fortalece a motivação gerada pela empatia. Também constataram que os
participantes que pontuavam alto nas medidas de comportamento pró-social também tinham
graus elevados de tomada de perspectiva e de empatia, sendo o inverso verdadeiro para
aqueles que declaravam baixos índices de comportamento pró-social.
Relacionando empatia e comportamento moral, Prust e Gomide (2007) solicitaram a
60 famílias, sendo 30 de risco e 30 de não risco, que respondessem a um questionário de
comportamento moral. O teste não paramétrico de Maan-Whitney mostrou diferenças
estatisticamente significativas nos indicies de comportamento moral. Um maior nível de
comportamento moral entre as famílias de não risco indica que pais que fornecem modelos
morais, exercitam a empatia e fazem a reparação do dano diante de atos anti-sociais, têm
filhos com melhores índices de comportamento moral (ICM) e que não são usuários de
drogas.
108
Relacionando desenvolvimento moral, empatia e práticas parentais de socialização,
Eisenberg-Berg e Mussen (1978) realizaram uma pesquisa com adolescentes. Os participantes
foram solicitados a responder a um questionário de empatia, dois instrumentos de
desenvolvimento moral e dois questionários sobre práticas educativas, sendo um relacionado
a práticas educativas maternas e outro relacionado a práticas educativas paternas. Os
resultados indicaram que a empatia estava significativamente relacionada com o raciocínio
moral para ambos os sexos e ao comportamento de ajuda para o sexo masculino. A variável
práticas maternas de educação infantil se relacionou com a variável empatia: mães de meninos
muito empáticos eram vistas como não punitivas, não restritivas, igualitárias e incentivavam
seus filhos para discutir seus problemas.
Tratando do tema empatia, moral e técnicas de socialização, Lopez, Bonenberger e
Schneider (2001) realizaram um estudo com estudantes universitários, com o objetivo de
investigar a capacidade preditiva da técnica de socialização em relação ao desenvolvimento
moral e ao desenvolvimento empático. Mais precisamente, eles examinaram a associação
entre os estilos de disciplina parental experimentado durante a infância, os níveis de empatia e
raciocínio moral durante a idade adulta de 109 estudantes universitários. Análises de
regressão múltipla foram realizadas usando estilos de disciplina como variáveis antecedentes
e as medidas globais de desenvolvimento moral e empatia como variáveis critério. Os
resultados indicaram que o sexo, o uso de punição corporal e indução foram variáveis
preditoras significativas de diferentes níveis de empatia: as mulheres apresentaram níveis
mais elevados de empatia emocional que os homens; o uso parental de castigo físico e baixa
utilização de orientação foram associados com baixos níveis de empatia. Também se
constatou que a menor utilização de punição corporal foi a única variável preditora
significativa de raciocínio moral: os jovens adultos que apresentaram altos níveis de punição
agressiva durante a infância apresentaram baixos índices de desenvolvimento moral. Sobre
109
este estudo é relevante comentar que os autores não relacionaram empatia e desenvolvimento
moral, apenas investigaram quais as técnicas de socialização se mostraram mais benéficas
para a promoção da empatia e para um melhor raciocínio moral.
Igualmente relacionando empatia, julgamento moral e socialização, Camino et al.
(1994), em um estudo sobre valores transmitidos pelos meios de comunicação, observaram
que tanto os personagens identificados como muito simpáticos como os pouco simpáticos
transmitiam valores de moral heterônoma, porém os muito simpáticos transmitiam mais
freqüentemente esses valores, embora transmitissem, também, valores referentes ao bem-estar
e à proteção do outro. Em um outro estudo, Camino, Cavalcanti e Rique (1992), estudando
adolescentes que se situavam no nível convencional da tipologia kohlberguiana, observaram
que: quanto maior o nível de empatia para com os personagens considerados pouco atrativos,
maior o nível de adesão aos valores heterônomos transmitidos por esses personagens; e o
nível de adesão aos valores morais heterônomos era significativamente mais elevado em
relação aos personagens da telenovela do que em relação a personagens fictícios do
questionário. Assim, esse estudo mostra que a empatia dos telespectadores por personagens de
telenovelas pode diminuir sua capacidade crítica.
Relacionando empatia e justiça distributiva, Sampaio et al. (2008) investigaram se a
empatia exercia influência significativa sobre os raciocínios distributivos. Participaram do
estudo 120 adolescentes, do sexo masculino e do sexo feminino, de escolas públicas e
particulares. Como instrumento de investigação utilizaram uma situação-problema na qual os
respondentes tinham que decidir a maneira mais justa de distribuir dinheiro entre seis
personagens que haviam trabalhado junto e que diferiam no que diz respeito à naturalidade,
produtividade e necessidade e o IRI de Davis para avaliar o grau de empatia dos participantes.
De um modo geral, os resultados revelaram que as dimensões de tomada de perspectiva e de
110
personal distress, além das variáveis sexo e tipo de escola exerceram influência significativa
sobre as quantidades de dinheiro distribuídas entre os personagens.
Relacionando personalidade, empatia e desenvolvimento moral, Williams, Orpen,
Hutchinson, Walker e Zumbo (2006) realizaram uma pesquisa usando uma bateria de escalas:
o “Big Five personality traits”, que inclui os traços de extroversão, socialização, consciência
moral, estabilidade emocional e abertura a experiência (John & Srivastava, 1999); a medida
“Dark Triad” (Paulhus & Williams, 2002), que investiga três traços de personalidade
atrelados a um funcionamento moral patológico (narcisismo, “machiavellianism” e
psicopatia); o IRI de Davis (1980), com suas quatro sub-escalas: Fantasia, Tomada de
perspectiva, Angústia pessoal e Consideração empática; o “Survery of Agentic and
Communal Values” (Trapnell & Paulhus, 2004), para medir valores; a medida de julgamento
moral de Rest et al. (1999), denominada de “Defining Issues Test-2”. Participaram do estudo
307 estudantes da University of British Columbia, com uma média de idade de 20,1 anos. Os
resultados de um teste de correlação revelaram que um nível elevado de moral está associado
positivamente com a sub-escala da empatia denominada de Tomada de Perspectiva; e
inversamente com a Angústia Pessoal. Para investigar melhor o papel da Tomada de
Perspectiva no contexto do desenvolvimento moral, os pesquisadores testaram um modelo em
que a Tomada de Perspectiva funcionava como variável mediadora. Os resultados revelaram
que a psicopatia é totalmente mediada por deficiências na Tomada de Perspectiva e que a
combinação de baixa Consciência moral e baixa Tomada de Perspectiva é particularmente
associada a um baixo desenvolvimento moral.
Relacionando empatia e julgamento moral, Ribeiro (1996) investigou as respostas de
396 estudantes, entre 11 e 19 anos, ao DIT e ao IRI (versão brasileira de Ribeiro, Koller &
Camino, 2002). Os resultados de uma correlação revelaram correlações significativas e
111
positivas entre o índice pós-convencional obtido no DIT e os escores das sub-escalas
Consideração Empática e Tomada de Perspectiva do IRI.
Também relacionando empatia e julgamento moral, Batista (1996) investigou se
haveria uma possível associação entre empatia e moralidade. Participaram do estudo empírico
400 sujeitos (200 homens e 200 mulheres), com idades de 18 a 30 anos. O instrumento
utilizado foi uma historieta sobre um crime cometido por um personagem fictício, onde foi
investigado o sentimento de empatia pelos personagens, o estágio de julgamento moral dos
participantes, assim como, a disponibilidade para ajudar. Os resultados indicaram que a
empatia e a moralidade se relacionaram. A autora verificou também que a diferença de gênero
interferiu na empatia (o agressor feminino despertou mais empatia) e no julgamento moral (o
agressor masculino despertou mais punição forte).
Costa (1996), por sua vez, em um estudo em que não investigava o papel da empatia
propriamente dita sobre o desenvolvimento moral, mas o papel da afetividade de um modo
geral na resolução de conflitos morais, identificou, em uma pesquisa realizada com
adolescentes brasileiros, que, dentre 20 categorias de dilemas apresentados espontaneamente,
12 dilemas possuíam conteúdo relacionados a questões afetivas. Costa (1996) também
identificou, ao trabalhar com um grupo de discussão composto por professores adultos
brasileiros, uma presença significativa de componentes afetivos na resolução de quatro
dilemas do DIT. Estas respostas foram categorizadas em dois tipos: moral “olho por olho” e
moral do cuidado e respeito pelo outro. Contudo, diferentemente dos adolescentes, no grupo
de adultos houve prevalência de resoluções de conflitos em uma relação menos interpessoal,
pois os adultos evocavam o cuidado e respeito com todo e qualquer ser humano.
Em relação a intervenções que relacionam questões morais e empáticas, tem-se a
pesquisa realizada por Pinheiro, Haase, Del Prette, Amarante, Del Prette (2006), voltada para
o treinamento de habilidades sociais, com avaliação pré e pós-intervenção, de 32 mães e dois
112
pais para facilitar a educação dos filhos, dando destaque, dentre outros comportamentos
desejáveis, a empatia. A aprendizagem do conceito de empatia era um dentre os nove passos
de um programa de treinamento de habilidades sociais para pais. Neste caso, os pais foram
treinados para: (a) prestar atenção aos sinais que a criança emite quando está vivenciando
algum problema (mudança na fisionomia, postura, fala etc.); (b) ouvir de maneira atentiva o
que a criança tem a dizer, colocando-se no lugar da criança; (c) expressar verbalmente
compreensão e apoio; (d) reforçar positivamente as manifestações empáticas da criança; (e)
oferecer modelo de comportamento empático no ambiente doméstico no relacionamento com
o cônjuge. Os resultados indicaram, de um modo geral, a redução significativa na freqüência e
severidade de comportamentos importunos e/ou indisciplinados dos filhos, conforme
avaliação dos pais.
3.3. Considerações sobre o capítulo
Em termos teóricos, tem-se percebido uma convergência de opiniões acerca da
relevância da empatia para o desenvolvimento moral (Batson, 1991; Blum, 1980; Camino,
2009; Eisenberg, 1986; Hoffman, 1990; Pizarro, 2000), o que também vem sendo confirmado
em estudos empíricos.
De uma maneira geral, os resultados das pesquisas apresentadas neste capítulo
contrariam a idéia de que as emoções nunca podem ajudar, e sempre prejudicam os
julgamentos morais. Mais precisamente, os resultados dos estudos apresentados revelam que:
(1) existe uma relação positiva entre empatia e julgamento moral (Batista, 1996; Camino,
Camino & Leyens, 1996; Eisenberg-Berg & Mussen, 1978; Ribeiro, 1996; Williams et al.,
2006); (2) ocorre uma relação positiva entre empatia e raciocínios distributivos (Sampaio et
113
al., 2008); (3) a empatia é fundamental para o desenvolvimento moral pró-social (Batson &
Moran, 1999; Berenguer, 2010; Eisenberg, 2000; Eisenberg et al., 1987; Eisenberg et al.,
2001) e para evitar comportamentos anti-sociais ou delinqüentes (Eisenberg, 2000).
Por outro lado, a empatia, por si só, não garante que o indivíduo irá pensar ou agir de
forma moralmente correta. De acordo com os achados de Camino, Cavalcanti e Rique (1992),
a empatia pode diminuir a capacidade crítica, e, segundo os achados de Batson et al. (1995), a
compaixão gerada pela empatia pode levar ao favorecimento de uma pessoa em detrimento da
coletividade. Talvez, o caminho para um desenvolvimento moral desejável seja exatamente o
equilíbrio entre a motivação gerada pelos sentimentos empáticos e o desenvolvimento de um
raciocínio moral mais elaborado. É neste sentido que se defende na presente tese que a
intervenção mais eficaz de educação moral é aquela que considera tanto a questão do
raciocínio moral, quanto à questão de uma afetividade mais generalizada, de uma empatia
menos relacionada a amigos, familiares, grupos específicos, etc.
Note-se, ademais, que alguns trabalhos já mostraram a relação entre empatia e
moralidade, mas a transposição desses achados para programas de intervenção ainda não se
efetuou, conforme revisão bibliográfica realizada. Apenas foi encontrada uma intervenção
(Pinheiro et al., 2006) voltada para o treinamento de habilidades sociais de pais para facilitar a
educação dos filhos, dando destaque, dentre outros comportamentos desejáveis, a empatia.
Considerando essa escassez é que a presente tese tem como objetivo final verificar se existem
diferenças entre os efeitos de uma técnica de intervenção “racional-discursiva” (técnica de
Blatt & Kohlberg, 1975) e uma técnica “racional-afetiva” (ver ítem 6.3.2. do Capítulo VI), na
qual, além de serem utilizados os procedimentos elaborados por Blatt e Kohlberg (1975),
serão estimulados o desenvolvimento da empatia, para a promoção do desenvolvimento
moral.
114
Para alcançar tal objetivo, o presente trabalho de tese envolveu três estudos. O
primeiro foi um estudo empírico voltado para elaboração e adaptação de instrumentos para
medir o raciocínio moral e a empatia focada em grupos. O segundo estudo constou de uma
pesquisa que teve como objetivo principal reformular e validar a Escala de Empatia focada
em Grupos e validar o instrumento denominado Dilemas da Vida Real. E, por fim, o terceiro
estudo, refere-se a uma pesquisa quase-experimental, cujo objetivo central coincide com o
objetivo final da presente tese, citado no parágrafo anterior. Esses estudos serão apresentados
nos próximos capítulos.
115
CAPÍTULO IV – ESTUDO 1: CONSTRUÇÃO DE INSTRUMENTOS
116
O Estudo 1 objetivou elaborar e testar a adequação dos instrumentos Dilemas da Vida
Real e Escala de Empatia focada em Grupos (EEG) para avaliar respectivamente, estágios de
desenvolvimento moral e graus de sensibilidade empática.
4.1. Objetivos específicos
a) Construir o instrumento Dilemas da Vida Real e verificar se ele discrimina estágios de
desenvolvimento moral;
b) Construir a Escala de Empatia focada em Grupos e verificar sua estrutura fatorial;
c) Analisar a influência de variáveis sócio-demográficas (escolaridade, sexo e idade)
sobre os estágios de desenvolvimento moral e sobre os fatores da Escala de Empatia
focada em Grupos;
4.2. Hipóteses
Em relação ao primeiro objetivo (Construir o instrumento Dilemas da Vida Real e
verificar se ele discrimina estágios de desenvolvimento moral), espera-se que:
a1) o instrumento consiga discriminar estágios de desenvolvimento moral;
a2) os participantes elaborem respostas, sobretudo, dos estágios 1 e 2;
A hipótese a2 baseia-se em estudos empíricos que indagaram adolescentes e jovens
acerca da pena de morte e redução da maioridade penal e revelaram uma moralidade baseada,
sobretudo, na justiça expiatória (Camino, 2005; Camino, 2006; Laranjeiras, 2007; Menin,
117
2005). Sabe-se, além do mais, que os respondentes de um teste com questões abertas (como
os Dilemas da Vida Real) têm revelado um pensamento moral dominante em estágios morais
inferiores aqueles dos respondentes de um teste com questões de múltipla escolha, indicando
que é bem mais fácil reconhecer o raciocínio de um estágio como sendo o mais adequado do
que produzí-lo sob forma de resposta aberta.
No que se refere ao segundo objetivo (Construir a Escala de Empatia focada em
Grupos e explorar sua estrutura fatorial), espera-se que:
b1) a EEG apresente uma estrutura multifatorial, distinguindo, pelo menos, três fatores,
sendo um relacionado à Empatia com grupos minoritários, outro à Empatia com
“apenados” e ainda outro à Empatia com animais;
b2) a média do fator relacionado à Empatia com grupos minoritários seja a mais elevada;
b3) a média do fator relacionado à Empatia com “apenados” seja a mais baixa;
A hipótese b1 fundamenta-se na consideração de que os fatores irão se organizar em
função do grupo de pertença de cada personagem (ou seja, grupos minoritários, animais e
“apenados”), tendo em vista que a escala foi criada para levar o respondente a empatizar com
a desagradável condição de vida de indivíduos pertencentes a diferentes grupos sociais, o que,
na teoria de estágios de Hoffman (2003), corresponde ao quarto e último estágio de Empatia.
As hipóteses b2 e b3 baseiam-se na idéia de Hoffman (2003) de que as pessoas
tendem a sentir uma maior empatia em relação àquilo que lhe é familiar e socialmente
reforçado; e a sentir uma menor empatia em relação àquilo que não lhe é familiar e não é
socialmente reforçado.
No que tange ao terceiro objetivo (Analisar a influência de variáveis sóciodemográficas sobre os estágios de desenvolvimento moral e sobre os fatores da Escala de
Empatia focada em Grupo), espera-se que:
118
c1) não haja diferença entre os escores médios dos participantes do sexo feminino e
masculino em relação ao desenvolvimento moral;
c2) os escores médios dos participantes do sexo feminino sejam maiores do que os do sexo
masculino em relação a todas as dimensões da empatia;
c3) o avanço da escolaridade favoreça o desenvolvimento moral;
c4) o avanço da idade favoreça o desenvolvimento moral;
c5) o avanço da escolaridade favoreça o desenvolvimento da sensibilidade empática;
c6) o avanço da idade favoreça o desenvolvimento da sensibilidade empática;
A hipótese c1 baseia-se nos estudos de Menin (2005) e Laranjeiras (2007), que não
encontraram diferenças significativas em relação ao posicionamento das mulheres e dos
homens no que se refere, respectivamente, à pena de morte e à redução da maioridade penal; e
fundamenta-se
em
outros
estudos
realizados
utilizando
outros
instrumentos
de
desenvolvimento moral em que predominou a não diferenciação entre homens e mulheres.
Segundo um levantamento realizado por Rest (1979), de 22 estudos realizados com o
Defining Issues Test (DIT), apenas 2 revelaram diferenças de gênero: as mulheres
obtiveram escores pós-convencionais superiores aos dos homens.
A hipótese c2 se baseia nos estudos de Ittyerah e Mahindra (1990), Santilli e Hudson
(1992), Adams, Summers e Christopherson (1993), Ribeiro, Koller e Camino (2001), Enz e
Zoll (2006) e Sampaio et al. (2008) que verificaram diferenças entre homens e mulheres
quanto à sensibilidade empática: sujeitos do sexo feminino demonstraram ser mais empáticos
que os do sexo masculino. Sobre esta hipótese é importante registrar que se generalizou a
diferença para todas as dimensões da escala preconizada (Empatia com grupos minoritários,
Empatia com “apenados” e Empatia com animais), tendo em vista que não se tem base
teórica, nem empírica para se levantar hipóteses específicas para cada dimensão.
119
Ademais, não se pode deixar de considerar que as especulações em torno das
diferenças de desenvolvimento moral (Camino, Moraes & Galvão, 2006) e de empatia
(Lennon & Eisenberg, 1987) entre homens e mulheres são demasiadamente polêmicas.
Alguns estudos têm apresentado resultados diferentes do que foi postulado neste trabalho,
tanto em relação ao desenvolvimento moral (Bakken & Ellsworth, 1990; Villegas-Reimers,
1991), quanto em relação à empatia (Gnepp & Chilamkurti, 1988; Selman, 1974).
Diante das controvérsias existentes em torno das diferenças entre homens e mulheres
em relação ao desenvolvimento moral e em relação ao desenvolvimento da empatia, merece
esclarecer o porquê de se optar pela hipótese de que não haverá diferença entre os escores
médios dos participantes do sexo feminino e do sexo masculino em relação ao
desenvolvimento moral e, ademais, é relevante esclarecer o porquê de se defender a hipótese
de que os escores médios dos participantes do sexo feminino serão maiores do que os do sexo
masculino em relação à empatia. Esta opção se fundamenta tanto em estudos realizados no
Brasil (Koller, Biaggio & Viñas, 1992; Ribeiro, Koller & Camino 1996), quanto em questões
culturais: no Brasil, a questão de que “homem não pode chorar” (ou seja, homem não pode
sentir) ainda é muito forte. Neste sentido, se espera encontrar mais diferenças significativas
em relação a questões afetivas (empatia) do que em relação a questões cognitivas (julgamento
moral) na comparação entre homens e mulheres. Por outro lado, se se defende nesta tese que a
empatia favorece o desenvolvimento moral (Capítulo VI), não deveriam as mulheres também
apresentarem um desenvolvimento moral mais evoluído, já que são elas que apresentam um
grau de sensibilidade empática mais elevado? Acredita-se, na verdade, que outros fatores
devam estar relacionados à promoção do desenvolvimento moral, além da empatia, como, por
exemplo, o desenvolvimento cognitivo, promovido pelo avanço da idade e da escolaridade, a
socialização, etc.
120
As hipóteses c3 e c4 se fundamentam em estudos empíricos, como o de Rest (1994),
que têm verificado que o estágio de desenvolvimento moral eleva-se com o avanço da
escolaridade e da idade. No que se refere às hipóteses c5 e c6, os estudos de Selman (1974),
Gnepp e Chilamkurti (1988), Ittyerah e Mahindra (1990), Klemchuk, Bond e Howell (1990),
Adams, Summers e Christopherson (1993) têm demonstrado que a empatia é uma variável
que pode adequadamente ser analisada sob uma ótica desenvolvimentista, no sentido de ser
uma variável que sofre mudanças em função do avanço da idade e da escolaridade.
4.3. Método
4.3.1. Participantes
Participaram 200 estudantes da cidade de Cajazeiras-PB, sendo 100 do ensino médio e
100 do ensino superior, predominantemente do sexo feminino (66%), da religião católica
(80%), com idades variando de 15 a 36 anos (M = 21,0; DP = 4,0). Esta amostra foi nãoprobabilística, isto é, de conveniência, tendo participado as pessoas que, convidadas,
aceitaram colaborar.
4.3.2. Instrumentos
Foram utilizados neste estudo, conforme Apêndice I, além de uma lista que solicitava
aos participantes a informação de alguns dos seus dados sócio-demográficos (idade, série,
sexo, religião e freqüência da prática religiosa), dois instrumentos (Dilemas da Vida Real e
Escala de Empatia focada em Grupos) construídos, conjuntamente, pela autora desta tese e
sua orientadora. Esses instrumentos serão descritos a seguir.
a. Dilemas da Vida Real
121
Para acessar os estágios de julgamento moral, os participantes foram solicitados a
avaliar dois Dilemas Morais, que tratam, respectivamente, da questão da pena de morte e da
redução da maioridade penal. Esses dilemas foram construídos mediante temas veiculados
pela mídia, a saber: a execução de Sadam Hussein e o Caso João Hélio.
O caso Sadam Hussein
No dia 29 de Dezembro de 2006, Sadam Hussein, o ex-presidente do Iraque, foi executado. O ditador era
conhecido por não ter compaixão pelos seus inimigos, chegando, inclusive, a ordenar a morte de 2 genros.
Além disso, o ex-presidente iraquiano era acusado de ter liderado o genocídio de mais de 100 pessoas,
inclusive crianças, em uma cidade próxima de Bagdad. Este caso foi noticiado na impressa e gerou muitas
polêmicas.
Você acha que Sadam Hussein deveria ter sido executado?
( ) Sim
( ) Não
( ) Não sei
Por que?
O caso João Hélio
O que seria mais um assalto a carro no subúrbio do Rio se transformou em uma tragédia que chocou o país.
Na noite do dia 7 de fevereiro, Rosa Cristina Fernandes voltava para casa com os filhos Aline, de 14 anos, e
João Hélio, de 6 anos. Eles pararam no sinal de trânsito na Rua João Vicente, em Oswaldo Cruz, no subúrbio
do Rio, quando homens armados mandaram que eles saíssem do carro. As duas saíram rapidamente, mas
quando Rosa foi tirar o filho, que estava preso ao cinto de segurança no banco de trás, um dos assaltantes
bateu a porta e arrancou com o carro. O menino ficou preso pelo lado de fora do veículo e foi arrastado por
sete quilômetros. Entre os assaltantes havia menores de 18 anos. Quando o caso foi noticiado pela impressa,
muitas pessoas acharam que a idade dos adolescentes serem presos deveria ser a de 16 anos.
Você está de acordo em que haja uma redução na idade em que o adolescente seja punido?
( ) Sim
( ) Não
( ) Não sei
Por que?
b. Escala de Empatia focada em Grupos (EEG)
Para avaliar a Empatia focada em Grupos, foram apresentados aos participantes 18
itens, que deveriam ser avaliados em uma escala de cinco pontos, variando de 1 = afeta pouco
a 5 = afeta muito.
Analise cada questão a seguir e diga o quanto ver ou conhecer cada uma dessas situações afeta
(“mexe” com) seus sentimentos.
122
Pouco
1. Crianças passando fome.
2. “Velhos” pedindo esmola.
3. Meninos pequenos (de 5 anos de idade) usando drogas.
1
1
1
Muito
2
2
2
3
3
3
4
4
4
5
5
5
Sobre a EEG é relevante comentar que, apesar de se julgar que esta escala mede
empatia, não se pode garantir que o respondente esteja vivenciado um processo de Empatia
por tomada de perspectiva do outro, tal como Hoffman (1989) define. Pode ser que o
participante esteja simplesmente respondendo em termos de empatia por contágio emocional.
Mas, primeiramente devido ao fato de que o outro na escala pode ser “apenados” e animais,
por quem dificilmente se tem empatia por contágio, salvo, talvez, por animais de estimação;
segundo porque a operacionalização da empatia na escala faz referência a indivíduos
pertencentes a grupo de excluídos, acredita-se que a EEG é capaz de levar o indivíduo a
empatizar não só com a dor ou desconforto imediato do outro, mas também com a sua
desagradável condição de vida. Assim, julga-se que os itens da EEG correspondem ao quarto
e último estágio da teoria de estágios de Hoffman.
Outro esclarecimento importante, é que o que se está buscando medir na EEG são
graus de sensibilidade empática em relação a um único estágio de Empatia de Hoffman (o
último); diferentemente do que se pretende verificar com os Dilemas da Vida Real, que é o
estágio de amadurecimento do julgamento moral na tipologia de Kohlberg.
4.3.3. Procedimento
Os participantes responderam individualmente aos instrumentos, em ambiente coletivo
de sala de aula. Todos os procedimentos adotados nesta pesquisa seguiram as orientações
previstas na Resolução 196/96 do CNS e na Resolução 016/2000 do Conselho Federal de
123
Psicologia. A aplicação durou cerca de 25 minutos e foi realizada por pesquisadores
previamente treinados. Os questionários foram apresentados de forma randômica (para evitar
o efeito de ordem).
4.3.4. Análise dos dados
No que se refere aos Dilemas da Vida Real (Caso Sadam Hussein e Caso João Hélio),
as respostas subjetivas foram categorizadas segundo a Análise de Conteúdo Semântico,
proposta por Bardin (1977), com a participação de cinco juízes que trabalharam em conjunto,
com um consenso de, no mínimo, 80%. Além disso, foram utilizados testes do Qui-quadrado
com o objetivo de verificar a associação entre as variáveis sócio-demográficas (sexo,
escolaridade e idade) e as freqüências das respostas às categorias.
No caso da análise da EEG, os dados foram analisados com o SPSS (versão 15).
Realizou-se uma análise dos Componentes Principais (CP), com rotação Varimax,
considerando previamente como critérios o KMO igual ou superior a 0,60 e o Teste de
Esfericidade de Bartlett (qui-quadrado, χ²) significativo (p < 0,05) (Tabachnick & Fidell,
2001). Para assegurar uma melhor consistência na tomada de decisão na escolha dos fatores,
três critérios foram levados em conta: Kaiser (valor próprio igual ou superior a 1), Cattell
(distribuição gráfica dos valores próprios, visando distinguir aqueles sobressalentes) e análise
paralela (Hayton, Allen & Scarpello, 2004). Também foi realizada uma MANOVA com a
finalidade de comparar a média dos fatores em função das variáveis sócio-demográficas
(sexo, escolaridade e idade).
124
4.4. Resultados
4.4.1. Dilemas da Vida Real
Caso Sadam Hussein
Em relação à questão “Você acha que Sadam Hussein deveria ter sido executado?”,
50% dos participantes não concordaram com a execução de Sadam Hussein, 40% se
mostraram favoráveis e 10% afirmaram não saber responder. Essas respostas foram
analisadas, por meio do Qui-quadrado, em função das variáveis sócio-demográficas (sexo,
escolaridade e idade). Os resultados desta análise indicaram que não houve diferença
significativa entre os grupos avaliados.
As justificativas dadas à questão “Você acha que Sadam Hussein deveria ter sido
executado?”, por sua vez, foram categorizadas segundo dois critérios: por conteúdo e por
estágio de julgamento moral. Na primeira análise (por conteúdo), emergiram as categorias:
Lei de Talião – agrupou as respostas que afirmaram que Sadam deveria ser punido segundo o
princípio da Lei de Talião - “olho por olho, dente por dente”;
Justiça divina – congregou as respostas que atribuíram apenas a Deus o poder de sentenciar
alguém com a morte;
Outra punição – reuniu as respostas que explicitaram que Sadam Husein deveria ser punido de
outra forma, como, por exemplo, mediante a prisão perpétua;
Direito à vida – agrupou as respostas que se referiam ao Direito à vida como algo
hierarquicamente superior a todos os valores;
Proteção à sociedade – reuniu as respostas que se referiam a morte de Sadam Hussein como
um ato que beneficiou a sociedade, no sentido de protegê-la das atrocidades cometidas pelo
ditador;
Não pertinentes – agrupou as respostas tautológicas e sem sentido;
125
Na segunda análise das respostas, utilizou-se a tipologia de Kohlberg para o processo
de categorização. Para transformar a escala nominal em intervalar, algumas respostas
apresentaram o conteúdo de apenas um estágio e o valor atribuído a essa resposta
correspondeu ao do estágio. Assim se o estágio era 3, o valor foi 3. Outras respostas
apresentaram conteúdos de mais de um estágio. Neste caso, atribuiu-se o valor correspondente
a soma dos valores dos estágios, dividido pelo número de estágios considerados. Como por
exemplo, as respostas cujos conteúdos foram classificados nos estágios 4/5/1, foi-lhe atribuído
o peso 3,3, que corresponde: 4+5+1/3 = 3,3. Os estágios encontrados foram os seguintes:
Estágio 1/2 (1,5) – pertencem a este estágio as repostas que afirmaram que Sadam Hussein
deveria ser punido segundo o princípio da Lei de Talião – “olho por olho, dente por dente”.
Esta articulação com os estágios 1 e 2 de Kohlberg deve-se a primitividade do conteúdo da
resposta, que defende a idéia de uma justiça retributiva expiatória.
Estágio 4/1 (2,5) – pertencem a este estágio as respostas que atribuíram apenas a Deus o poder
de sentenciar alguém com a morte. Este tipo de justificativa ao mesmo tempo em que traz
argumentos que ressaltam a importância de se obedecer a uma Lei (a Lei de Deus),
característicos do estágio 4 de Kohlberg, revela argumentos infantis, típicos da idéia de justiça
imanente.
Estágio 3 (3,0) – pertencem a este estágio as respostas que explicitaram que Sadam Hussein
deveria ser punido de outra forma, como, por exemplo, mediante a prisão perpétua. Este tipo
de argumento parece demonstrar certa preocupação com o outro, no sentido em que os
participantes que utilizaram esta justificativa não concordaram com a morte de Sadam
Hussein;
Estágio 4/5/1 (3,3) – pertencem a este estágio as respostas que explicitaram que Sadam
Hussein deveria ser punido com a pena de morte tendo em vista o benefício da sociedade. Esta
categoria de resposta apresenta um argumento com características dos estágios 4, 5 e 1: do
estágio 4, quando apóia a manutenção da ordem social, valoriza o cumprimento dos deveres
126
com os quais se concordou e apóia a lei; do estágio 5, quando apóia o bem-estar social; e do
estágio 1, quando defende a idéia de uma justiça retributiva expiatória.
Estágio 5 (5,0) – pertencem a este estágio as respostas que se referiam ao Direito à vida como
algo hierarquicamente superior – argumento típico do estágio 5;
Note-se, no Quadro 2, que as respostas dos participantes se concentraram, sobretudo,
no estágio 1/2 de julgamento moral, que agrupa justificativas que são guiadas pelo princípio
da Lei de Talião: “olho por olho, dente por dente”.
Quadro 2. Categorias, estágios, exemplos e percentuais de respostas à questão “Você
acha que Sadam Hussein deveria ter sido executado? Por quê?”
Categorias
Estágio
Exemplos de Respostas
F
%
Lei de Talião
1/2
“Para sentir na pele o que os outros sentiram”
70
35,0
Justiça divina
4/1
“Só quem pode julgar é Deus”
32
16,0
Outra punição
3
“Deveria ser punido de outra forma (...)”
36
18,0
4/5/1
“A sociedade ficou protegida de suas maldades”
15
7,5
5
“Ninguém tem o direito de tirar a vida de outro”
30
15,0
Proteção à sociedade
Direito a vida
Não categorizadas
-------
Respostas tautológicas e sem sentido.
17
8,5
Total
--------
--------------------------------------------------------------
200
100
Quando se compararam as categorias supramencionadas em função das variáveis
sócio-demográficas (sexo, escolaridade e idade), verificou-se que houve diferença
significativa (χ² = 11,23; g.l. = 4; p < 0,05) entre os grupos apenas em função do grau de
escolaridade dos participantes (Figura 1): os alunos do ensino médio, quando comparados aos
universitários, citaram mais respostas referentes ao estágio 1/2 (Lei de Talião), enquanto que
os universitários citaram mais respostas referentes ao estágio 5 (Direito à vida).
127
50
45
44,8
40
38,3
Ensino médio
35
30
Universitários
31
Total
25
20
18,8
17,5
16,1
15
21,8
19,7
17,7
10
9,2
8,2
7,3
5
21,8
16,4
11,5
0
Estágio 1/2
Estágio 4/1
Estágio 3
Estágio 4/5/1
Estágio 5
Figura 1. Porcentagens das categorias de respostas, classificadas por nível
julgamento moral, à questão “Você acha que Sadam Hussein deveria ter sido
executado?”, em função do grau de escolaridade dos participantes
Caso João Hélio
Em relação à questão “Você está de acordo que haja uma redução na idade em que o
adolescente seja punido?”, 89% dos participantes revelaram ser favoráveis a redução da
maioridade penal e apenas 8% desfavoráveis; os demais (3%) afirmaram não saber responder.
Quando se compararam essas respostas em função das variáveis sócio-demográficas (sexo,
escolaridade e idade), constatou-se diferença significativa (χ² = 7,65; g.l. = 2; p< 0,05) apenas
em função do grau de escolaridade: o posicionamento contrário à proposta de redução da
maioridade penal prevaleceu entre os universitários.
As justificativas dadas à questão “Você está de acordo que haja uma redução na idade
em que o adolescente seja punido?”, assim como no Caso Sadam Hussein, foram
categorizadas segundo dois critérios: por conteúdo e por estágio de julgamento moral. Na
primeira análise (por conteúdo), surgiram as categorias:
Tem que pagar – reuniu as respostas que defendiam a idéia que independente da idade, errou
tem que pagar;
Punição relacionada à consciência – agrupou as respostas que afirmaram que os adolescentes
já têm consciência dos seus atos, demonstrado, por exemplo, no direito ao voto;
128
Visão negativa da Lei – congregou as respostas que explicitaram que o crime realizado por
adolescentes é motivado pelo excesso de proteção da Lei para esta população;
Visão preventiva da punição – reuniu as respostas que revelaram a idéia de que a punição tem
a capacidade de prevenir a reincidência de crimes;
Visão social do crime – agrupou as respostas que argumentaram que a questão da
criminalidade é ampla e de difícil solução, não podendo ser resolvida com a simples redução
da idade em que o adolescente é preso;
Não categorizadas – reuniu as respostas tautológicas e sem sentido;
Na segunda análise, também se realizou transformação da escala nominal em
intervalar seguindo o mesmo procedimento descrito no caso Sadam Hussein. Os estágios
encontrados, de acordo com a tipologia de Kohlberg, foram:
Estágio 1/2 (1,5) – pertencem a este estágio as repostas que defendiam a idéia que
independente da idade, errou tem que pagar. Esta articulação com os estágios 1 e 2 de
Kohlberg deve-se a primitividade do conteúdo da resposta, que ressalta a vingança e defende a
idéia de uma Justiça Retributiva Expiatória.
Estágio 3/1 (2,0) – agrupou as respostas que afirmaram que os adolescentes devem ser
punidos, pois já têm consciência dos seus atos, demonstrado, por exemplo, no direito ao voto.
Neste caso, ao mesmo tempo em que o conteúdo das respostas leva em consideração as
intenções e o comportamento social da pessoa envolvida, típico do estágio 3, defende a idéia
de uma justiça retributiva do estágio 1.
Estágio 4/1 (2,5) – congregou as respostas que explicitaram que o crime realizado por
adolescentes é motivado pelo excesso de proteção da Lei para esta população. Este tipo de
justificativa ao mesmo tempo em que considera a questão legal, típico do estágio 4 de
Kohlberg, defende a idéia de uma Justiça baseada na expiação: “Os adolescentes têm que ser
punidos, eles só agem assim porque a Lei é muito boa com eles” (Suj. 27).
Estágio 4 (4,0) – reuniu as respostas que revelaram a idéia de que a punição tem a capacidade
de prevenir a reincidência de crimes que assolam a sociedade. Esta articulação com o estágio
129
4 de Kohlberg deve-se ao tipo de argumento utilizado que apóia a manutenção da ordem social
e do bem-estar da sociedade.
Estágio 5 (5,0) – agrupou as respostas que afirmaram que a questão da criminalidade é ampla
e de difícil solução, não podendo ser resolvida com a simples redução da idade em que o
adolescente é preso. Neste caso, os argumentos apresentados pelos participantes parecem
conseguir diferenciar o aspecto legal do moral: “a simples mudança na lei não resolve, existem
outras questões que precisam ser solucionadas, como a questão da miséria que assola o país”
(Suj. 37).
Note-se, no Quadro 3, que as respostas dos participantes se concentraram, sobretudo,
no estágio 3/1 (Punição relacionada à consciência) de julgamento moral, que ao mesmo tempo
em que leva em consideração as intenções e o comportamento social da pessoa envolvida
(Estágio 3), defende a idéia de uma justiça retributiva do estágio 1.
Quadro 3. Categorias, estágios, exemplos e percentuais de respostas à questão “Você
está de acordo que haja uma redução na idade em que o adolescente seja punido? Por
quê?”
Categorias
Estágio
Exemplos de Respostas
F
%
Tem que pagar
1/2
“Errou, tem que pagar e ponto final”
20
10,0
Punição relacionada à
consciência
3/1
“Já sabe muito bem o que está fazendo, pode até votar”
76
38,0
Visão negativa da lei
4/1
“Ele confia na lei que o protege, por isso faz isso”
25
12,5
Visão preventiva da
punição
4
“Deve ser punido para não cometer outro crime”
30
15,0
Visão social do crime
5
“A questão é mais complexa, envolve questões políticas e
sociais”
19
9,5
Não categorizadas
-----
Respostas tautológicas e sem sentido.
30
15,0
Total
-----
-------------------------------------------------------------
200
100
130
Quando se compararam as categorias supramencionadas em função das variáveis
sócio-demográficas (sexo, escolaridade e idade), constatou-se diferença significativa (χ² =
13,28; g.l. = 4; p < 0,01) apenas em função da escolaridade dos participantes (Figura 2): os
alunos do ensino médio citaram mais respostas referentes ao estágio 1/2 (Tem que pagar) e
4/1 (Confia na lei que o protege) enquanto que os universitários (estudantes de licenciaturas)
citaram mais respostas referentes ao estágio 5 (A questão é mais ampla).
50
45,9
44,7
43,5
45
Ensino médio
40
35
Universitários
30
Total
25
20
15
10
5
18,8
17,6
16,5
17,6
14,7
11,8
16,5
11,8
7,1
18,8
11,2
3,5
0
Estágio 1/2
Estágio 3/1
Estágio 4/1
Estágio 4
Estágio 5
Figura 2. Porcentagens das categorias de respostas à questão “Você acha que Sadam
Hussein deveria ter sido executado?”, em função do grau de escolaridade dos
participantes
Por fim, como dado adicional, acrescenta-se que se encontrou correlação positiva
(r=0,31; p < 0,01) entre o escore total das respostas ao Dilema de Sadam Hussein (que debate
a questão da pena de morte) e o escore total das respostas ao Dilema de João Hélio (que
debate a questão da redução da maioridade penal), o que revela que faz sentido fazer uso
desses dilemas, em conjunto, para avaliar o desenvolvimento moral.
131
4.4.2. Escala de Empatia focada em Grupos
A viabilidade de realizar uma análise CP foi demonstrada por meio dos resultados
obtidos que revelaram a adequação da matriz de correlação: KMO = 0,81 e Teste de
Esfericidade de Bartlett, χ² (153) = 939,469, p < 0,001. Após a verificação desta adequação,
precedeu-se a análise CP sem fixar número de componentes a extrair ou método de rotação.
De acordo com o critério de Kaiser, puderam ser identificados cinco componentes (4,81, 1,84,
1,37, 1,31 e 1,11), que explicaram conjuntamente 58% da variância total; a distribuição
gráfica dos valores próprios (critério de Cattell) também permitiu identificar cinco
componentes. Alternativamente, realizou-se a análise paralela, assumindo os mesmos
parâmetros do banco de dados original, ou seja, 200 participantes e 18 variáveis. Os valores
próprios gerados aleatoriamente foram como seguem: 1,56, 1,45, 1,36, 1,29, 1,22 e 1,10. O
contraste destes valores próprios com aqueles observados empiricamente indicou a retenção
de seis componentes, pois em todos esses casos os valores próprios observados empiricamente
mostraram-se superiores aos simulados.
Após analisar cada critério, decidiu-se reespecificar a solução fixando a extração de
cinco componentes, adotando rotação Varimax. É importante registrar que, com o fim de
definir o ítem como pertencente ao componente, assumiu-se que ele deveria apresentar
saturação mínima de |0,40|, bem como, excluíram-se os itens que saturavam em mais de um
componente.
Na Tabela 1, apresentam-se o conteúdo de cada ítem, sua saturação (carga fatorial),
bem como os indicadores de consistência interna (Alfa de Cronbach), variância explicada por
cada fator e médias.
132
Tabela 1 – Análise dos Componentes Principais da EEG-18 (cinco fatores)
Componentes
Empatia com
grupos
minoritários
Empatia com
pessoas em
situação de
aflição
Empatia com
trabalhadores
Empatia com
“apenados”
Empatia com
animais
Meninos pequenos (de 5 anos
de idade) usando drogas
,661
-,019
,139
,316
,013
Crianças sendo levadas a
prostituição
,632
-,083
,383
,183
-,068
Negros sendo menosprezados
,619
,335
,305
,163
,066
Menores abusados
sexualmente
,618
-,015
,354
,061
,005
Velhos pedindo esmola
,576
,148
-,108
-,015
,127
Crianças passando fome
,563
,172
-,237
-,098
,292
Índios sendo menosprezados
,535
,348
,152
,259
,155
Pessoas doentes sem poder se
tratar
,078
,782
,066
,092
-,035
Pessoas que são vítimas de
catástrofes, como tremor de
terra e inundações
,258
,646
,034
,039
,285
Pessoas vítimas de injustiça
-,004
,490
,372
,021
,075
Pessoas que perdem parentes
queridos
,145
,487
,086
-,095
,333
Pessoas
trabalhando
em
serviços pesados mais de 12hs
por dia
,090
,096
,797
,022
,099
Pessoas que são obrigadas a
deixar o campo para procurar
trabalho
,125
,189
,655
,086
,221
Presos vivendo em situações
desumanas
,096
,124
,058
,812
,056
Adolescentes presos
cometerem crime
,053
-,139
,102
,736
,262
Pessoas condenadas a pena de
morte por crimes que
cometeram
,345
,230
-,032
,626
-,206
Animais sendo levados ao
matadouro
,073
,021
,058
,158
,865
Animais
morrendo
período de seca
,112
,154
,350
,068
,662
7
4,81
15,57
0,77
4,33
4
1,84
10,87
0,70
4,31
2
1,37
10,63
0,63
3,35
3
1,31
10,51
0,64
2,70
2
1,11
10,36
0,67
3,65
Itens
Número de itens
Valor próprio
% da Variância
Alfa de Cronbach
Média do fator
por
em
133
Os componentes encontrados podem ser descritos como seguem:
Componente I. Apresentou valor próprio de 4,81 e explicou 15,57%, da variância total.
Reuniu sete itens com saturações variando de 0,66 (Meninos pequenos usando drogas) a 0,54
(Índios sendo menosprezados). Considerando os itens que compunham esse componente, ele
foi denominado Empatia com grupos minoritários. Este componente apresentou consistência
interna (Alfa de Cronbach, α) de 0,77.
Componente II. Este componente obteve um valor próprio de 1,84 e explicou 10,87% da
variância total. Neste componente foram concentrados quatro itens, os quais apresentam
saturações entre 0,78 (Pessoas doentes sem poder se tratar) e 0,49 (Pessoas vítimas de
injustiça). Este componente foi denominado Empatia com pessoas em situação de aflição. O
α deste componente foi 0,70.
Componente III. Este componente apresentou valor próprio de 1,37, explicou 10,63% da
variância total e seu α foi 0,63. Apenas dois itens foram reunidos neste componente,
apresentando saturações de 0,80 (Pessoas trabalhando em serviços pesados por mais de 12hs
por dia) e 0,66 (Pessoas que são obrigadas a deixar o campo para procurar trabalho). Definiuse este componente como representando Empatia com trabalhadores.
Componente IV. O valor próprio deste componente foi de 1,31, ele explicou 10,51% da
variância total e seu α foi de 0,64. Foram concentrados três itens neste componente: Presos
vivendo em situações desumanas (0,81), Adolescentes presos por cometerem crime (0,74),
Pessoas condenadas à pena de morte por crimes que cometeram (0,63). Cabe, desta forma,
defini-lo como expressando Empatia com “apenados”.
Componente V. Este componente apresentou valor próprio de 1,11, explicou 10,36% da
variância total e seu α foi 0,67. Apenas dois itens foram reunidos, apresentando saturações de
0,87 (Animais sendo levados ao matadouro) e 0,66 (Animais morrendo em período de seca).
Pode-se definir este componente como representando Empatia com animais.
134
Em relação as médias dos fatores da EEG, constatou-se que houve diferença
significativa [Lambda de Wilks = 0,18; F(4,200) = 212,18; p<0,001] entre elas – mais
precisamente, conforme revelou o teste Post Hoc de Bonferroni, as médias dos fatores
denominados Empatia com grupos minoritários (M=4,32; DP=0,58) e Empatia com pessoas
em situação de aflição (M=4,31; DP=0,61) foram as maiores médias e não se diferenciaram
entre si, mas diferenciaram-se das médias dos demais fatores [Empatia com animais (M=3,65;
DP=0,96); Empatia com trabalhadores (M=3,35; DP=0,92); Empatia com “apenados”
(M=2,70; DP=1,0)]; estas, por sua vez, diferenciaram-se entre si.
Em síntese, observa-se uma estrutura multifatorial para a medida de Empatia focada
em grupos. No geral, os cinco componentes pareceram facilmente interpretáveis, tendo Alfas
de Cronbach entre 0,77 (Empatia com grupos minoritários) e 0,63 (Empatia com
trabalhadores), e um Alfa médio de 0,68.
Porém, como este primeiro estudo foca-se na exploração dos dados da EEG e,
ademais, tendo em vista que a organização dos itens nos fatores mostrou-se desequilibrada, no
sentido em que o número de itens por fator variou bastante. Por parcimônia, optou-se por reter
uma estrutura fatorial com os três componentes. Assim como ocorreu na análise com cinco
fatores, assumiu-se que cada ítem deveria apresentar saturação mínima de |0,40|, assim como
se excluiu os itens que saturavam em mais de um componente.
Considerando os critérios antes assinalados, os componentes encontrados podem ser
descritos como seguem (Tabela 2):
Componente I. O valor próprio deste componente foi 4,81 e explicou 26,73% da variância
total. Reuniu seis itens, com saturações variando de 0,66 [Meninos pequenos (de 5 anos de
idade) usando drogas] a 0,54 (Menores abusados sexualmente). Este componente foi
denominado Empatia com transgressores e vítimas de transgressão e apresentou consistência
interna (Alfa de Cronbach) de 0,71.
135
Componente II. O valor próprio deste componente foi 1,84 e explicou 10,19% da variância
total. Foram concentrados quatro itens neste componente, com saturações variando de 0,73
(Animais morrendo em período de seca) a 0,54 (Pessoas trabalhando em serviços pesados
mais de 12hs por dia). O componente foi definido como expressando Empatia com animais e
trabalhadores. O Alfa deste componente foi 0,66.
Componente III. Este componente apresentou valor próprio de 1,37 e explicou 7,59% da
variância total. Neste componente foram concentrados quatro itens, os quais apresentaram
saturações entre 0,61 (Pessoas que são vítimas de catástrofes, como tremor de terra e
inundações) e 0,49 (Velhos pedindo esmolas). Este componente foi denominado Empatia com
grupos minoritários. O Alfa deste componente foi 0,51.
Em relação as médias dos fatores, constatou-se que houve diferença significativa
[Lambda de Wilks = 0,33; F(2,200) = 198,25; p<0,001] entre elas – mais especificamente,
conforme revelou o teste Post Hoc de Bonferroni, a média do fator denominado Empatia com
grupos minoritários (M=4,4; DP=0,53) foi a maior e as menores médias foram a dos outros
dois farores [Empatia com transgressores e vítimas de transgressão (M=3,6; DP=0,72) e
Empatia com animais e trabalhadores (M=3,6; DP=0,77)] que, por sua vez, não se
diferenciaram entre si.
136
Tabela 2 – Análise dos Componentes Principais da EEG-18 (três fatores)
Componentes
Itens
Empatia com
transgressores e
vítimas de
transgressão
Empatia com
animais e
trabalhadores
Empatia com
grupos minoritários
Meninos pequenos (de 5 anos de idade) usando
drogas
,664
,030
,278
Pessoas condenadas a pena de morte por crimes
que cometeram
,657
-,081
,147
Crianças sendo levadas a prostituição
,636
,078
,227
Presos vivendo em situações desumanas
,632
,212
-,135
Adolescentes presos por cometerem crime
,562
,327
-,307
Menores abusados sexualmente
,537
,173
,304
Animais morrendo em período de seca
,073
,729
,163
Animais sendo levados ao matadouro
,021
,704
,064
Pessoas que são obrigadas a deixar o campo
para procurar trabalho
,244
,579
,121
Pessoas trabalhando em serviços pesados mais
de 12hs por dia
,246
,543
,032
Pessoas que perdem parentes queridos
-,115
,527
,488
Pessoas vítimas de injustiça
,031
,386
,291
Pessoas que são vítimas de catástrofes, como
tremor de terra e inundações
,059
,349
,609
Crianças passando fome
,136
,021
,553
Pessoas doentes sem poder se tratar
,034
,193
,545
Negros sendo menosprezados
,516
,230
,532
Velhos pedindo esmola
,269
-,024
,489
Índios sendo menosprezados
,478
,239
,479
6
4
4
Valor próprio
4,81
1,84
1,37
% da Variância
26,73
10,19
7,59
Alfa de Cronbach
0,71
0,66
0,51
Média do fator
3,6
3,6
4,4
Número de itens
De um modo geral, a estrutura fatorial apresentada, com a fixação de três fatores,
revela componentes razoavelmente interpretáveis, tendo Alfas de Cronbach entre 0,71
(Empatia com transgressões e vítimas de transgressão) e 0,51 (Empatia com grupos
minoritários) e um Alfa médio de 0,63.
137
Note-se, porém, que a consistência interna do modelo trifatorial foi inferior ao do
modelo pentafatorial. Tendo em vista esses resultados, não foram realizadas análises das
variáveis sócio-demográficas em função dos fatores da Escala, como foi anunciado nos
objetivos específicos desse Estudo. Decidiu-se, então, reformular a EEG e testar as variáveis
sócio-demográficas em um outro estudo (Capítulo V)
4.5. Discussão parcial
Neste primeiro Estudo, que trata da criação e exploração inicial dos instrumentos
Dilemas da Vida Real e Escala de Empatia focada em Grupos (EEG), os resultados parecem
demonstrar que esses instrumentos são adequados para discriminar, respectivamente, estágios
de desenvolvimento moral e graus de sensibilidade empática (com algumas ressalvas em
relação a este último instrumento).
Especificamente em relação ao instrumento denominado Dilemas da Vida Real, este
propiciou dados que merecem ser refletidos, tanto em termos metodológicos, quanto em
termos sociais, e é o que será feito a seguir.
O fim da pena de morte e a luta contra as propostas de redução da maioridade penal
constituem uma das bandeiras levantadas pelos defensores dos direitos humanos e pelo
Conselho Federal de Psicologia. Contudo, apesar de todo o esforço desprendido por essas
organizações, os estudantes que participaram do presente estudo revelaram uma
favorabilidade considerável à pena de morte, demonstrada pelo apoio a execução de Sadam
Hussein (40%), e um apoio maciço a mudança na lei penal brasileira, no sentido de reduzir a
idade do adolescente cumprir medida de privação de liberdade (89%). Resultado análogo a
este foi encontrado em diferentes estudos, já apresentados neste trabalho, a saber: em uma
pesquisa realizada pelo Datafolha (2006), 51% dos brasileiros disseram ser favoráveis à pena
138
de morte e 84% demonstraram apoiar a redução da maioridade penal; em um estudo realizado
por Laranjeiras (2007), 63% dos estudantes entrevistados mostraram-se favoráveis a execução
de Sadam Hussein; em um estudo realizado por Menin (2005), 74% dos participantes da
escola pública e 54% dos da escola privada mostraram-se favoráveis à redução da idade para
se punir infrações na lei. Por outro lado, não se poderia deixar de comentar que Galvão et al.
(2007), contrariamente a esses resultados, verificaram que a favorabilidade em relação à
redução da maioridade penal e pena de morte foi mínima entre aqueles que seriam
diretamente atingidos, caso houvesse uma mudança na lei (15% dos adolescentes em
ressocialização) e entre aqueles que poderiam vir a ser atingidos (26,3% dos adolescentes em
condição de rua). No caso da pena de morte, verificou-se que apenas 18,8% dos adolescentes
em ressocialização e 23,8% daqueles em condição de rua mostraram-se favoráveis à adoção
de tal penalidade.
No que se refere à análise por conteúdo das justificativas dadas às questões
relacionadas aos temas pena de morte e redução da maioridade penal, neste estudo se
observou o predomínio de respostas, no caso da pena de morte, que eram guiadas pelo
princípio da Lei de Talião: “olho por olho, dente por dente”, o que também foi encontrado nos
estudos de Laranjeiras (2007); no caso da redução da maioridade penal, se encontrou a
prevalência de respostas que fazem uso do slogan “tem consciência, deve ser punido”, o que
também foi observado no estudo de Menin (2005).
É interessante registrar também que os conteúdos das justificativas dadas às questões
relacionadas aos temas pena de morte e redução da maioridade penal são semelhantes aos que
vêm sendo utilizados por participantes de outros estudos. Em relação à pena de morte, na
pesquisa de Laranjeiras (2007) houve semelhanças entre o conteúdo das seguintes categorias
de respostas: Lei de Talião (denominada por Laranjeiras de “Matou, tem que morrer”), Outra
punição (denominada por Laranjeiras de “Penas alternativas”), Proteção à sociedade
139
(denominada por Laranjeiras de “Crime contra a humanidade”) e Direito à vida. Da mesma
forma, algumas das justificativas utilizadas pelos participantes do presente estudo, em relação
à pena de morte, coincidiram com as utilizadas pelos participantes da pesquisa realizada por
Galvão et al. (2007): Lei de Talião (denominada pelas autoras de “Punição retaliativa”),
Justiça Divina, Direito à vida, Outra punição (denominada pelas autoras de “Pagar na
cadeia”). Quanto à redução da maioridade penal, algumas das justificativas utilizadas pelos
participantes do presente estudo acerca desta temática assemelham-se as explicitadas pelos
participantes da pesquisa realizada por Menin (2005): Punição relacionada à consciência
(categoria denominada por Menin de “O adolescente sabe o que é certo e errado”), Tem que
pagar (categoria denominada por Menin de “Cometeu um crime, deve ser punido”), Visão
preventiva da punição (denominada por Menin de “Para a situação não piorar”). Em Galvão et
al. (2007) também se encontrou categorias semelhantes às encontradas no presente estudo, em
relação à redução da maioridade penal, a saber: Punição relacionada a consciência
(denominada pelas autoras de “Responsabilidade do menor’) e Visão preventiva da punição
(denominada pelas autoras de “Serve de exemplo”).
No que se refere à análise das justificativas dadas aos dilemas, em função do estágio
de julgamento moral, encontrou-se, no presente estudo, argumentos típicos dos estágios
hierarquicamente inferiores (pensamento pré-convencional) da tipologia kohlberguiana –
resultado abaixo do que vem sendo encontrado entre adolescentes e adultos com dilemas
hipotéticos. Diante deste resultado, questiona-se: por que se encontrou um nível de
moralidade tão baixo entre os participantes do presente estudo?
Na realidade, este resultado já era esperado (hipótese a2), tendo em vista que os
estudos realizados com temas relacionados à pena de morte e redução da maioridade penal
(Galvão et al., 2007, Laranjeiras, 2007; Menin, 2005), apesar de não fazerem referência a uma
análise das respostas considerando os níveis da tipologia kohlberguiana, têm revelado uma
140
moralidade baseada, sobretudo, na justiça expiatória, típica dos estágios hierarquicamente
inferiores da tipologia de Kohlberg. Além disso, segundo Rest (1975), os instrumentos que os
testandos têm que construir sua própria resposta apresentam raciocínios morais de estágios
inferiores a aqueles escolhidos pelos mesmos participantes em questionários em que os
raciocínios já estejam elaborados e eles só façam escolhê-los; neste último caso, tendem a
escolher raciocínios superiores aos que são capazes de elaborar. Em segundo, o fato dos
dilemas, respondidos pelos participantes do presente estudo, fazerem referência a cenas reais
e a temas polêmicos pode ter influenciado a adesão a estágios de julgamento moral
hierarquicamente inferiores, pois os dilemas que vêm sendo propostos na literatura tratam,
sobretudo, de dilemas hipotéticos, com temas não tão polêmicos.
De qualquer forma, pode-se dizer que os Dilemas utilizados para medir estágios de
julgamento moral, segundo a tipologia de Kohlberg, mediram aquilo que se propôs a medir,
conseguindo diferenciar os participantes quanto a seus estágios de julgamento moral,
podendo, inclusive, serem utilizados conjuntamente, já que apresentaram correlações
positivas, conforme foi mencionado na apresentação dos Resultados.
Para finalizar o debate acerca do instrumento Dilemas da Vida Real, é relevante
comentar a respeito da influência das variáveis sócio-demográficas sobre o desenvolvimento
moral. No caso da variável sexo, já se esperava a não influência desta variável sobre o
desenvolvimento moral, tendo como base os estudos de Menin (2005) e Laranjeiras (2007):
estes autores trabalharam com temáticas semelhantes a dos Dilemas apresentados neste
estudo, ou seja, redução da maioridade penal e pena de morte, e não encontraram diferenças
entre o sexo masculino e o feminino. No caso da religião esta não foi analisada tendo em vista
a distribuição amostral: 80% disseram ser católicos. No que se refere à idade, esta
surpreendentemente não revelou influência sobre os estágios de desenvolvimento moral.
Neste caso, apenas se constatou a influência da variável escolaridade: os estágios mais
141
elevados de moralidade foram alcançados, sobretudo, pelos estudantes universitários (alunos
de licenciatura em letras, matemática e história), o que é, por um lado, um dado positivo, pois
estes estudantes serão futuros professores e deverão ser, de acordo com a proposta dos PCNs,
também educadores morais; mas, por outro lado, ainda existe um número alarmante de
estudantes universitários que utilizam indiscriminadamente argumentos típicos de estágios
hierarquicamente inferiores, que revelam discursos de uma visão moral primária, pautada, por
exemplo, na Lei de Talião – neste último caso, o que esperar destes futuros educadores? A
propagação das idéias de que: “matou tem que morrer”, “bateu tem que apanhar”, “seres
humanos devem ser levados à cadeira elétrica”, “adolescentes merecem cadeia”.
No que se refere ao segundo instrumento, EEG, os dados indicaram, assim como foi
apontado na hipótese b1, que a escala criada para medir Empatia focada em Grupos conseguiu
discriminar diferentes tipos ou dimensões empáticas e diferentes graus de empatia.
Note-se que na primeira análise fatorial realizada, com a extração de 5 componentes, a
EEG apresentou uma estrutura multifatorial que distinguiu os três fatores citados na hipótese
b2 - Empatia com grupos minoritários, Empatia com “apenados” e Empatia com animais.
Ainda se observou na Análise Fatorial a configuração de mais dois componentes: Empatia
com pessoas em situação de aflição e Empatia com trabalhadores.
Quanto as médias dos fatores, elas corresponderam ao esperado na hipótese b3
(espera-se que a média do fator relacionado à Empatia com grupos minoritários seja a maior)
e b4 (espera-se que a média do fator relacionado à Empatia com “apenados” seja a menor).
A análise realizada com a fixação de três componentes apresentou uma estrutura
multifatorial que distinguiu, em parte, os três fatores citados na hipótese b2 – Empatia com
grupos minoritários, Empatia com animais (neste caso, o componente extraído na Análise
Fatorial incluiu a questão da empatia com trabalhadores e, nesse sentido, foi denominado de
Empatia com animais e trabalhadores), Empatia com “apenados” (neste caso, o componente
142
extraído da Análise Fatorial envolveu outras pessoas cometendo transgressões além dos
“apenados”, e vítimas de transgressão e foi denominado de Empatia com transgressores e
vítimas de transgressão).
De forma semelhante ao que aconteceu na análise fatorial com cinco componentes, as
médias dos fatores corresponderam ao esperado nas hipóteses b3 (espera-se que a média do
fator relacionado à Empatia com grupos minoritários seja a maior) e b4 (espera-se que a
média do fator relacionado à Empatia com “apenados” seja a menor média).
É relevante lembrar que o que motivou a realização da Análise Fatorial com a fixação
de três componentes foi, sobretudo, a organização dos itens na análise com cinco fatores que
se mostrou não desejada, no sentido em que o número de itens por fator revelou-se
inapropriada.
Agora, fazendo uma comparação entre as duas análises fatoriais realizadas, considerase que a primeira análise, com cinco fatores, apresentou uma estrutura fatorial mais clara,
revelando componentes altamente compreensíveis, do que a análise com três fatores: Empatia
com grupos de minoritários, Empatia com pessoas em situação de aflição, Empatia com
trabalhadores, Empatia com “apenados”, Empatia com animais. Por outro lado, a
distribuição do número de ítens por fator na segunda análise fatorial (com três fatores) expôs
uma estrutura mais harmoniosa que a primeira (com cinco fatores); contudo, a explicação dos
fatores tornou-se menos compreensível. Neste sentido, julga-se que o mais apropriado seja
reformular a escala e testá-la novamente.
143
CAPÍTULO V – ESTUDO 2: REFORMULAÇÃO E VALIDAÇÃO DA ESCALA DE
EMPATIA FOCADA EM GRUPOS E VALIDAÇÃO DOS DILEMAS DA VIDA REAL
144
O segundo estudo é uma pesquisa empírica que tem como objetivos principais
reformular e validar a Escala de Empatia focada em Grupos, bem como validar o instrumento
denominado Dilemas da Vida Real.
5.1. Objetivos específicos
a) reformular a Escala de Empatia focada em Grupos (EEG) e analisar suas
características psicométricas;
b) apresentar os resultados descritivos dos instrumentos criados nesta tese (EEG e
Dilemas da Vida Real), assim como de outros instrumentos já validados no Brasil
[Interpersonal Reactivity Index (IRI) e o Defining Issues Test (DIT)]
c) verificar se existem correlações entre os instrumentos criados nesta tese (EEG e
Dilemas da Vida Real) e os já validados no contexto brasileiro (IRI e DIT);
d) analisar a influência de variáveis sócio-demográficas (sexo, série, idade e religião)
sobre os estágios de desenvolvimento moral e sobre o grau de sensibilidade empática;
5.2. Hipóteses
No que se refere ao primeiro objetivo (reformular a Escala de Empatia focada em
Grupos (EEG) e analisar suas características psicométricas), espera-se que:
145
a1) a EEG apresente uma estrutura multifatorial, com quatro componentes: Empatia com
grupos minoritários, Empatia com trabalhadores, Empatia com “apenados”, Empatia
com animais;
a2) a média do componente Empatia com grupos minoritários seja a maior;
a3) a média do componente Empatia com “apenados” seja a menor;
a4) uma análise confirmatória revele indicadores psicométricos aceitáveis para o modelo
com quatro fatores (hipótese a1) em comparação com outros modelos alternativos;
As hipóteses a1, a2, a3 e a4 fundamentam-se nos resultados de análises fatoriais
exploratórias, apresentados no Estudo 1.
Em relação ao segundo objetivo (apresentar os resultados descritivos dos
instrumentos criados nesta tese (EEG e Dilemas da Vida Real), assim como de outros
instrumentos já validados no Brasil (Interpersonal Reactivity Index – IRI – e o Defining
Issues Test – DIT), espera-se que:
b1) as respostas dos estudantes se concentrem nos estágios 1 e 2, quando o
desenvolvimento moral for medido por meio dos Dilemas da Vida Real;
b2) as respostas dos adolescentes se concentrem nos estágios 3 e 4, quando o
desenvolvimento moral for medido por meio do DIT;
b3) a IRI apresente coeficientes de consistência interna semelhantes ao que se têm
encontrado em estudos realizados no Brasil;
b4) todas as sub-escalas do IRI (Consideração Empática, Tomada de Perspectiva e
Angústia Pessoal) apresentem correlações positivas entre si;
A hipótese b1 fundamenta-se, conforme já foi exposto no ítem 4.2, em estudos
empíricos (Camino, 2005; Camino, 2006; Laranjeiras, 2007; Menin, 2005) que indagaram
adolescentes acerca da pena de morte e redução da maioridade penal e revelaram uma
146
moralidade baseada, sobretudo, na justiça expiatória. Além disso, espera-se que os resultados
do Estudo 2 corroborem os resultados apresentados no Estudo 1.
A hipótese b2 baseia-se nos estudos empíricos (Snarey, 1985), que usam testes
convencionais, tais como o DIT, o MJI e o SROM, que têm demonstrado uma prevalência do
pensamento convencional (estágios 3 e 4) entre adolescentes e jovens adultos. Ademais,
conforme comentam Colby e Kohlberg (1984) e Biaggio (1976), o pensamento pósconvencional tem dominado uma minoria de adultos, geralmente com idades superior a 20
anos (que não é o caso dos participantes da presente pesquisa) e o pré-convencional tem
dominado o pensamento infantil e de adolescentes delinqüentes.
Para fundamentar as hipóteses b1 e b2, é importante ainda retomar a idéia de que
existem diferenças entre instrumentos objetivos e subjetivos no campo da moralidade (Rest,
1975): os escores de um teste com questões abertas (como os Dilemas da Vida Real) têm
revelado estágios de desenvolvimento moral menor do que os de questões de múltipla escolha
(como o DIT), indicando que é bem mais fácil reconhecer um estágio como sendo o mais
adequado do que produzí-lo.
A hipótese b3 fundamenta-se em estudos realizados no contexto brasileiro que têm
revelado coeficientes de consistência interna satisfatórios (Ribeiro, Koller & Camino, 2002;
Sampaio, 2007), porém inferiores aos coeficientes que têm sido encontrados em estudos
internacionais (Davis, 1980; Escrivã, Navarro & Garcia, 2004; Pérez-Albéniz et al., 2003; Siu
& Shek, 2005). A hipótese b4 também se fundamenta em estudos realizados no Brasil
(Ribeiro, Koller & Camino, 2002; Sampaio, 2007) que têm verificado correlações positivas
entre todas as sub-escalas do IRI, o que difere, no que se refere à correlação positiva entre a
sub-escala denominada Angústia Pessoal e as demais sub-escalas, do previsto teoricamente e
do encontrado em pesquisas transculturais (Escrivã, Navarro & Garcia, 2004; Pérez-Albéniz
147
et al., 2003; Siu & Shek, 2005), mas assemelha-se aos achados de Ribeiro, Koller e Camino
(2002) e Sampaio (2007), realizados no Brasil.
No que tange ao terceiro objetivo [verificar se existem correlações entre os
instrumentos criados nesta tese (EEG e Dilemas da Vida Real) e os já validados no contexto
brasileiro (IRI e DIT)], espera-se que:
c1) haja validade convergente entre os instrumentos criados para medir desenvolvimento
moral (Dilemas da Vida Real e DIT);
c2) haja validade convergente entre os instrumentos criados para medir graus de
sensibilidade empática (EEG e IRI);
c3) os escores dos instrumentos de desenvolvimento moral e os graus de sensibilidade
empática estejam correlacionados entre si;
A hipótese c3 se fundamenta nos trabalhos existentes que relacionam empatia e
desenvolvimento moral e têm encontrado uma correlação entre essas duas variáveis (Camino,
Camino & Leyens, 1996; Eisenberg-Berg & Mussen, 1978; Hogan & Dickstein, 1972;
Ribeiro, 1996; Sampaio, 2007).
Quanto ao quarto objetivo (analisar a influência de variáveis sócio-demográficas
sobre os estágios de desenvolvimento moral e sobre o grau de sensibilidade empática), esperase que:
d1) não haja diferença entre os escores médios dos participantes do sexo feminino e os do
masculino em relação ao desenvolvimento moral;
d2) os escores médios dos participantes do sexo feminino sejam maiores do que os dos
participantes do sexo masculino em relação a todas as dimensões da empatia;
d3) o avanço da escolaridade favoreça o desenvolvimento moral;
d4) o avanço da idade favoreça o desenvolvimento moral;
d5) o avanço da escolaridade favoreça a sensibilidade empática;
148
d6) o avanço da idade favoreça a sensibilidade empática;
Os argumentos que fundamentam as hipóteses do quarto objetivo, que tratam da
influência de variáveis sócio-demográficas sobre os estágios de desenvolvimento moral e
sobre o grau de sensibilidade empática, são os mesmos que foram apresentados em relação às
variáveis sócio-demográficas do Estudo 1.
5.3. Método
5.3.1. Participantes
Participaram 206 estudantes do ensino médio, da cidade de João Pessoa/PB, Brasil, de
uma instituição pública, sendo: 45,6% do sexo masculino e 54,4% do sexo feminino;
predominantemente da religião Católica (61,7%); com idades variando de 14 a 19 anos (M =
15,6; DP = 0,9). Esta amostra foi não-probabilística, isto é, de conveniência, tendo participado
as pessoas que, convidadas, aceitaram colaborar.
5.3.2. Instrumento
Foram aplicados no segundo estudo, conforme Apêndice II, além de uma lista que
solicitava aos participantes a informação de alguns dos seus dados sócio-demográficos (idade,
série, sexo, religião), quatro instrumentos, sendo dois criados na presente tese (Escala de
Empatia focada em Grupos e Dilemas da Vida Real) e dois já validados no Brasil
(Interpersonal Reactivity Index e Defining Issues Test):
149
Escala de Empatia focada em Grupos (EEG)
Com a finalidade de melhorar a estrutura fatorial da EEG, nesse segundo estudo,
decidiu-se reformular a escala e incluir mais 9 itens, a saber: Pessoas tendo que se levantar de
madrugada para ir trabalhar; Pessoas que têm parentes seqüestrados; Animais sendo caçados
como diversão das pessoas; Os presos passarem muito tempo esperando o julgamento;
Animais em extinção; Animais sendo maltratados; Pessoas que cometeram crimes leves
convivendo com pessoas que cometeram crimes muito graves; Pessoas que trabalham em
condições desumanas, como nas minas de carvão e nos garimpos; Pessoas que trabalham com
produtos tóxicos, sem terem a devida proteção (Apêndice II).
Dilemas da Vida Real
Este instrumento não sofreu modificações e está descrito no Estudo 1.
Defining Issues Test (DIT)
O DIT é um teste objetivo de julgamento moral elaborado por Rest (1975), composto
por seis dilemas morais hipotéticos, dos quais será utilizado, no presente estudo, apenas um,
retirado da versão brasileira de Camino e Luna (1989): o dilema do prisioneiro foragido. Este
dilema conta o caso de um senhor condenado pela justiça a dez anos de prisão, que foge da
cadeia, adota uma identidade falsa e passa a trabalhar duro e honestamente. Consegue
dinheiro suficiente para abrir seu próprio negócio, é gentil com os fregueses, paga bem aos
seus funcionários e ainda contribui com uma parte dos seus lucros para obras de caridade. Um
dia, uma vizinha, chamada Dona Cida, o reconheceu como sendo aquele fugitivo da prisão e
pensa em denunciá-lo à polícia. A pergunta que segue ao dilema é: “Dona Cida deveria
entregá-lo à polícia?”.
150
Vale mencionar, conforme Apêndice II, que, após cada uma das perguntas que seguem
o dilema supramencionado, os participantes deveriam responder sim, não ou não sei.
Ademais, deveriam indicar o grau de importância de cada uma das doze afirmações que
acompanhavam o dilema e que foram construídas por Rest (1975), tendo como base a
tipologia de estágios de Kohlberg. A este respeito, é importante esclarecer que, entre as
afirmações, pelo menos uma delas possui conteúdo, retoricamente bem construído, porém
destituído de sentido (intitulado por Rest de M); e, pelo menos, uma das afirmações
representa um estágio kohlberguiano intermediário (entre o 4 e 5), denominado de A
(antiestabilishment) (Rest & Kohlberg, 1975, citado por Rest, 1975). Finalmente, para
concluir a resolução de cada dilema, os participantes deveriam escolher, dentre as doze
afirmações, as quatro mais importantes, para ele, de forma hierárquica.
Para corrigir o instrumento, inicialmente foi identificado o estágio correspondente às 12
afirmações, seguindo as orientações contidas na Folha de Apuração do DIT (Apêndice III). A
seguir, estes itens foram pontuados conferindo peso 4 à primeira escolha, 3 à segunda, 2 à
terceira e 1 à quarta, obtendo-se um total de dez pontos distribuídos entre os estágios. Após a
obtenção desta pontuação, foram somadas todas as pontuações relativas a cada estágio,
obtendo-se desta forma, os escores brutos de cada um dos estágios. Para dizer que um
participante era predominantemente de um estágio, se considerou a maior freqüência de
respostas no estágio. É relevante citar que quando houve a mesma freqüência (7 casos), se
considerou o estágio mais baixo (Turiel, 1977).
Interpersonal Reactivity Index (IRI)
O IRI é composto, originalmente, por quatro sub-escalas (personal distress,
perspective taking, fantasy e emphatic concern) que avaliam determinados tipos de
experiências subjetivas vivenciadas pelo respondente ao testemunhar ou imaginar as
151
experiências que uma outra pessoa vivencia ou vivenciará: a de personal distress (angústia
pessoal) mensura a tendência a sentir sentimentos de angústia ou aflição, ao observar ou
inferir que outras pessoas estão vivenciando sentimentos negativos ou desagradáveis; a de
perspective taking (tomada de perspectiva) avalia a capacidade de colocar-se no lugar do
outro e ver as coisas a partir de outros pontos de vista; a de fantasy (fantasia) mede a
capacidade imaginativa de identificar-se com personagens de filmes ou livros; e a sub-escala
de emphatic concern (preocupação empática) mensura a tendência a sentir sentimentos de
compaixão, simpatia e preocupação por outras pessoas que passam por experiências
negativas, dolorosas ou de sofrimento.
Para cada ítem descrito no IRI, o respondente deverá indicar qual o seu grau de
concordância com a afirmação, por meio de uma escala de cinco pontos (1 = “Não me
descreve bem”; 5 = “Descreve-me muito bem”).
É importante registrar que os itens 2, 3, 9, 10, 11 e 13 devem ter sua pontuação
invertida, já que foram elaborados na direção oposta dos outros itens da escala.
Particularmente, nesta tese, será utilizada a versão traduzida e validada por Ribeiro,
Koller e Camino (2002) (Apêndice II), a qual consta apenas de três das quatro sub-escalas
originalmente proposta por Davis (1983). Tal escolha justifica-se pelo fato de que a escala de
fantasy, conforme comentou Sampaio (2007), tem sido cada vez menos utilizada por
pesquisadores de outros países, por se basear em aspectos culturais muito específicos, não
passíveis de generalização.
5.3.3. Procedimento
Os participantes responderam individualmente aos instrumentos, em ambiente coletivo
de sala de aula. Os questionários foram apresentados de forma randômica (para evitar o efeito
de ordem). Todos os procedimentos adotados nesta pesquisa seguiram as orientações previstas
152
na Resolução 196/96 do CNS e na Resolução 016/2000 do Conselho Federal de Psicologia.
Os participantes levaram cerca de 50 minutos para responder os instrumentos.
5.3.4. Análise dos dados
No caso da análise da EEG, os dados foram analisados seguindo os mesmos
procedimentos adotados no Estudo 1. Além desses procedimentos, visando reforçar a
adequação da EEG e sua confiabilidade, realizou-se uma análise fatorial confirmatória,
utilizando o programa AMOS 7, com uma amostra distinta da que fora usada no estudo
exploratório.
O instrumento Dilemas da Vida Real (Caso Sadam Hussein e Caso João Hélio) foi
analisado seguindo os mesmos procedimentos adotados no Estudo 1.
Em relação ao DIT, calculou-se a pontuação média bruta dos participantes segundo os
estágios de julgamento moral, assim como a distribuição dos participantes em função da
predominância de suas respostas nos estágios. A predominância do estágio moral também foi
analisada em função dos dados sócio-demográficos (sexo, idade, escolaridade).
Em relação ao IRI, para verificar a consistência interna de suas sub-escalas foi
calculado o coeficiente Alpha, proposto por Cronbach (1951); para verificar a convergência
entre as sub-escalas, foram calculados os coeficientes de correlação de Pearson; e, para
verificar a relação entre as variáveis sócio-demográficas, realizou-se uma MANOVA.
Para verificar a Validade Convergente entre os instrumentos criados nesta tese
(Dilemas da Vida Real e EEG), foram realizadas correlações de Pearson com instrumentos já
validados no Brasil (DIT e IRI).
153
5.4. Resultados
5.4.1. Escala de Empatia focada em Grupos (EEG)
A adequação da matriz de correlação [KMO = 0,84 e Teste de Esfericidade de Bartlett,
χ² (351) = 1757,033, p < 0,001] possibilitou a realização de uma análise CP. Inicialmente, esta
foi realizada sem fixar número de componentes a extrair e método de rotação. De acordo com
o critério de Kaiser, puderam ser identificados sete componentes com valores próprios
superiores a um: 6,66, 2,24, 1,99, 1,58, 1,26, 1,20, 1,19, explicando conjuntamente 59,3% da
variância total; a distribuição gráfica dos valores próprios (critério de Cattell) permitiu
identificar seis componentes. Alternativamente, realizou-se a análise paralela, assumindo os
mesmos parâmetros do banco de dados original, ou seja, 206 participantes e 27 variáveis. Os
valores próprios gerados aleatoriamente foram: 1,74, 1,62, 1,53, 1,46, 1,34, 1,28, 1,18. O
contraste destes valores próprios com os observados empiricamente indicou a retenção de sete
componentes.
Diante desses resultados e das expectativas geradas em torno da hipótese de trabalho,
decidiu-se reespecificar a solução fixando a extração de quatro componentes, adotando
rotação Varimax. É importante registrar que, com o fim de definir o ítem como pertencente ao
componente, assumiu-se que ele deveria apresentar saturação mínima de |0,40| e excluíram-se
aqueles que saturavam em mais de um componente. Com este procedimento, sete dos 27 itens
da escala foram descartados, ora por saturarem em mais de um fator (Pessoas que têm
parentes seqüestrados, Pessoas que trabalham em condições desumanas, Índios sendo
menosprezados, Adolescentes presos por cometerem crimes), ora por apresentarem saturações
inferiores a |0,40| (Crianças passando fome, Pessoas que perdem parentes queridos, Pessoas
que trabalham com produtos tóxicos, sem terem a devida proteção).
Na Tabela 3, apresenta-se o conteúdo de cada ítem, sua saturação (carga fatorial), bem
154
como os indicadores de consistência interna (Alfa de Cronbach) e variância explicada de cada
fator e médias.
Tabela 3 – Análise dos Componentes Principais da EEG-27
Componentes
Itens
22. Menores abusados sexualmente
Empatia com
grupos
minoritários
,676
Empatia com
animais
Empatia com
trabalhadores
Empatia com
“apenados”
,117
,036
,165
17. Negros sendo menosprezados
,659
,279
-,140
,104
05. Pessoas doentes sem poder se tratar
,643
,016
,129
-,122
19. Crianças sendo levadas à prostituição
,604
,255
,146
,120
06. Pessoas que têm parentes seqüestrados
,573
-,028
,405
-,017
16. Pessoas que são vítimas de catástrofes, como tremor de terra
e inundações
,564
,101
,340
-,051
13. Pessoas vítimas de injustiça
,562
-,056
,077
,200
04. Meninos pequenos (de 5 anos de idade) usando drogas
,545
,126
,231
,105
24. Pessoas que trabalham em condições desumanas, como nas
minas de carvão e nos garimpos
,422
,424
,341
,208
01. Crianças passando fome
,389
,316
,343
-,203
23. Animais morrendo em período de seca
,193
,764
,236
-,014
18. Animais sendo maltratados
,247
,721
-,018
-,018
25. Animais sendo levados ao matadouro
,113
,698
,083
-,005
15. Animais em extinção
,085
,661
,121
,107
09. Animais sendo caçados como diversão das pessoas
-,100
,591
,045
,189
20. Índios sendo menosprezados
,458
,467
,014
,257
08. Pessoas que são obrigadas a deixar o campo para procurar
trabalho nas grandes cidades
,021
,082
,687
,277
03. Pessoas tendo que se levantar de madrugada para ir trabalhar
,089
-,034
,676
,072
07. Pessoas trabalhando em serviços pesados mais de 12hs por
dia
,186
,167
,658
,255
14. Pessoas que perdem parentes queridos
,236
,087
,285
-,005
26. Adolescentes presos por cometerem crime
-,111
,051
,446
,437
02. Velhos pedindo esmola
,242
,208
,442
-,119
27. Pessoas que trabalham com produtos tóxicos, sem terem a
devida proteção
,303
,258
,332
,245
21. Pessoas condenadas a pena de morte por crimes que
cometeram
,003
,097
,095
,727
11.Os presos passarem muito tempo esperando julgamento
,056
,036
-,040
,720
12. Presos vivendo em situações desumanas
,168
-,003
,154
,642
10. Pessoas que cometeram crimes leves convivendo com
pessoas que cometeram crimes muito graves
,267
,178
,158
,518
7
6,66
24,68
0,80
4,26
5
2,24
8,29
0,77
3,74
4
1,99
7,38
0,67
3,22
4
1,58
5,85
0,68
2,79
Número de itens
Valor próprio
% da Variância Explicada
Alfa de Cronbach
Média do fator
155
Os componentes encontrados podem ser descritos como seguem:
Componente I. Este componente apresentou valor próprio de 6,66, explicando 24,7% da
variância total. Reuniu sete itens com saturações variando de 0,68 (Menores abusados
sexualmente) a 0,55 [Meninos pequenos (de cinco anos de idade) usando drogas] e apresentou
consistência interna (Alfa de Cronbach, α) de 0,80. Considerando os itens que compunham o
componente I, ele foi denominado de Empatia com grupos minoritários.
Componente II. Este componente apresentou valor próprio de 2,24, explicou 8,3% da
variância total e obteve um α de 0,77. Neste componente, concentraram-se cinco itens, que
apresentaram saturações entre 0,76 (Animais morrendo em período de seca) e 0,59 (Animais
sendo caçados como diversão das pessoas). O componente II foi denominado de Empatia com
animais.
Componente III. Este componente apresentou valor próprio de 1,99, explicou 7,4% da
variância total e seu α foi 0,67. Quatro itens foram reunidos neste componente, apresentando
saturações entre 0,69 (Pessoas que são obrigadas a deixar o campo para procurar trabalho) e
0,44 (Velhos pedindo esmolas). O componente III foi denominado de Empatia com
trabalhadores.
Componente IV. O valor próprio deste componente foi 1,58, ele explicou 5,9% da variância
total e seu α foi de 0,68. Concentram-se quatro itens neste componente, com saturações
variando de 0,73 (Pessoas condenadas à pena de morte por crimes que cometeram) a 0,52
(Pessoas que cometeram crimes leves convivendo com pessoas que cometeram crimes muito
graves). Assim, este componente foi denominado de Empatia com “apenados”.
Em relação as médias dos fatores da EEG, constatou-se que houve diferença
significativa [Lambda de Wilks = 0,25; F(3,206) = 198,90; p<0,001] entre elas – mais
precisamente, conforme revelou o teste Post Hoc de Bonferroni, todas os fatores
diferenciaram-se entre si, sendo a maior média atribuída ao fator denonimado de Empatia com
156
grupos minoritários (M=4,26; DP=0,63) e a menor média ao fator denominado de Empatia
com “apenados” (M=2,79; DP=0,92).
Com a finalidade de comparar os cinco fatores da EEG em função das variáveis sóciodemográficas (sexo, idade e escolaridade), realizou-se uma MANOVA. Os resultados
revelaram:
- efeito principal do sexo do participante em relação a dois dos quatro fatores [Lambda
de Wilks = 0,93, F(4,206) = 3,63, p < 0,05], nas quais as mulheres apresentaram
médias superiores às dos homens em relação ao fator denominado Empatia com
grupos minoritários (Mulheres: M=4,41, DP=0,58; Homens: M=4,09, DP=0,65) e ao
fator denominado Empatia com trabalhadores (Mulheres: M=3,33, DP=0,79;
Homens: M=3,10, DP=0,78);
- efeito principal da idade do participante em relação ao fator denominado Empatia
com “apenados” [Lambda de Wilks = 0,96, F(4,206) = 2,99, p < 0,05], em que os
participantes mais velhos apresentaram médias superiores (M=2,85, DP=0,93) às dos
mais novos (M=2,42, DP=0,79);
- efeito principal da série do participante em relação ao fator denominado Empatia
com grupos minoritários [Lambda de Wilks = 0,92, F(4,206) = 2,81, p < 0,05]: os
estudantes do 2º ano se mostraram mais empáticos (M=4,38; DP=0,49) que os do 1º
ano do ensino médio (M=4,17; DP=0,71);
- efeito de interação [Lambda de Wilks = 0,95, F(4,206) = 2,61, p < 0,05] da idade e
do grau de escolaridade, em que os estudantes mais velhos do segundo ano obtiveram
médias mais altas do que os estudantes mais novos do primeiro ano em relação ao
fator denominado Empatia com grupos minoritários; enquanto os mais velhos do
primeiro ano obtiveram médias semelhantes aos mais novos do primeiro e do segundo
ano.
157
Por fim, considerando a análise exploratória apresentada na Tabela 3 e visando testar a
adequação da escala, realizou-se uma análise fatorial confirmatória, hipotetizando-se uma
estrutura tetrafatorial; porém, a fim de comparar a adequabilidade da estrutura encontrada no
estudo exploratório, considerou-se tanto a fatoralização conhecida, com quatro fatores, quanto
a de modelos alternativos (unifatorial e bifatorial). Mais precisamente, foram testados os
seguintes modelos: (a) Modelo 1: unifatorial, em que todos os itens da EEG apresentam
saturação em um único fator, tendo em vista que alguns autores defendem que a Empatia é um
construto unidimensional; (b) Modelo 2: bifatorial, no qual se uniu o Fator 1 (Empatia com
grupos minoritários) com o Fator 3 (Empatia com trabalhadores); e o Fator 2 (Empatia com
animais) com o Fator 4 (Empatia com “apenados”), considerando que o Fator 1 e o Fator 3
fazem referência a grupos de pessoas que estão sofrendo de forma injustificada; e o Fator 2 e
o Fator 4 fazem referência a um sofrimento que pode parecer mais justificável; (c) Modelo 3:
uma estrutura multifatorial, composta por quatro fatores, de acordo com o que se espera
teoricamente e com o que foi descrito na hipótese b1.
Para a realização da análise fatorial confirmatória, participaram 210 estudantes do
ensino médio da cidade de Campina Grande-PB, Brasil, de uma instituição privada de ensino,
sendo: 39% do sexo masculino e 61% do sexo feminino; predominantemente da religião
Católica (61,7%); com idades variando de 13 a 17 anos. Esta amostra foi não-probabilística,
isto é, de conveniência, tendo participado as pessoas que, convidadas, aceitaram colaborar.
A tabulação e a análise dos dados foram efetuadas por meio do pacote estatístico SPSS
– versão 15.0. Porém, para a análise fatorial confirmatória, utilizou-se o programa AMOS 7.
Este tipo de análise permite testar hipóteses específicas sobre a estrutura latente do modelo,
apresentando os respectivos indicadores do “goodness”, os quais permitem avaliar a qualidade
de ajuste do modelo a que se propõe (Hair, Tatham, Anderson & Black, 2005; Tabachnick &
Fidell, 2001; Van de Vijver & Leung, 1997), como por exemplo:
158
- O χ² (qui-quadrado) testa a probabilidade do modelo teórico se ajustar aos dados;
quanto maior este valor pior o ajustamento. Este tem sido pouco empregado na
literatura, sendo mais comum considerar sua razão em relação aos graus de liberdade
(χ²/g.l.). Neste caso, valores até 3 indicam um ajustamento adequado.
- O Goodness-of-Fit Index (GFI) e o Adjusted Goodness-of-Fit Index (AGFI) são
análogos ao R² em regressão múltipla e, portanto, indicam a proporção de variânciacovariância nos dados, explicadas pelo modelo. Estes variam de 0 a 1, com valores na
casa dos 0,90, indicando um ajustamento satisfatório.
- A Root-Mean-Square Error of Approximation (RMSEA), com seu intervalo de
confiança de 90% (IC90%), é considerado um indicador de “maldade” de ajuste, isto
é, valores altos indicam um modelo não ajustado. Assume-se como ideal que o
RMSEA se situe entre 0,05 e 0,08, ou menos.
- O Comparative Fit Index (CFI) compara, de forma geral, o modelo estimado e o
modelo nulo, considerando valores mais próximos de um como indicadores de
ajustamento satisfatório (Hair, Tatham, Anderson & Black, 2005).
- O Expected Cross-Validation Index (ECVI) e o Consistent Akaike Information
Criterion (CAIC) são indicadores geralmente empregados para avaliar a adequação de
um modelo em relação a outro. Valores baixos do ECVI e CAIC expressam o modelo
com melhor ajuste.
De acordo com a Tabela 4, é possível destacar que o melhor modelo para a EEG em
adolescentes foi o Modelo 3 – multifatorial (com quatro fatores), destacando os seguintes
indicadores de qualidade de ajuste: χ2/gl (184,61/163) = 1,13, GFI = 0,96, AGFI = 0,94, CFI
= 0,99, RMSEA (90%IC) = 0,02 (0,01-0,03), CAIC = 657,96 e ECVI = 0,82.
159
Tabela 4 – Comparação dos modelos alternativos da estrutura fatorial da EEG-27
Modelos
χ²
gl
χ²/gl
GFI
AGFI
CFI
RMSEA
CAIC
ECVI
Unifatorial*
558,15
176
3,17
0,86
0,82
0,81
0,08
941,00
1,72
(0,07-0,08)
Bifatorial**
599,42
188
3,19
0,86
0,83
0,80
0,07
(1,55-1,92)
898,75
(0,06-0,08)
Tetrafatorial
184,61
163
1,13
0,96
0,94
0,99
0,02
(0,01-0,03)
1,77
(1,59-1,97)
657,96
0,82
(0,77-0,97)
Nota: * unifatorial = F1/F2/F3/F4; ** bifatorial = F1/F3 e F2/F4
Os resultados da estrutura tetrafatorial estão sumarizados na Figura 4. Ademais, todas
as saturações (Lambdas, λ) ou pesos de regressão são estatisticamente diferentes de zero (0;
t>1,96; p<0,05), sugerindo a pertinência do conjunto de itens considerados.
160
1
2
0,32
EEG22
0,49
EEG17
3
0,21
4
0,40
5
6
7
8
0,57
0,70
EEG05
EEG19
0,45
0,63
Empatia com
grupos
minoritários
0,64
0,41
EEG16
0,49
0,24
EEG13
0,60
0,36
EEG04
0,57
0,69
EEG23
0,75
9
0,57
10
0,45
11
0,44
12
0,26
EEG18
EEG25
0,76
0,67
0,76
Empatia com
animais
0,66
EEG15
0,51
0,50
EEG09
0,62
13
0,48
EEG08
0,69
14
0,19
15
0,33
16
0,23
17
0,26
18
0,37
19
0,24
EEG03
0,44
EEG07
0,57
Empatia com
trabalhadores
0,37
0,48
EEG02
0,62
EEG21
0,47
20
0,35
EEG11
0,55
EEG12
0,56
EEG10
Empatia com
“apenados”
0,42
Figura 4. Estrutura Tetrafatorial da EEG
Considerando mais um indicador de confiabilidade do instrumento, calculou-se o Alfa
de Cronbach e obteve-se os seguintes resultados: Empatia focada em Grupos (somatório de
todos os itens) – α de 0,86; Empatia com grupos minoritários (Fator 1) – α de 0,80; Empatia
com animais (Fator 2) – α de 0,77; Empatia com trabalhadores (Fator 3) – α de 0,60; e
Empatia com “apenados” (Fator 4) – α de 0,63.
161
5.4.2. Dilemas da Vida Real
Caso Sadam Hussein
No que se refere à questão “Você acha que Sadam Hussein deveria ter sido
executado?”, 53% dos participantes concordaram com a morte de Sadam Hussein, 43% se
mostraram desfavoráveis e 4% afirmaram não saber responder. Essas respostas, ao serem
analisadas em função das variáveis sócio-demográficas (sexo, escolaridade, idade e religião),
não diferiram em função dos grupos avaliados.
As justificativas dadas à questão “Você acha que Sadam Hussein deveria ter sido
executado?”, assim como aconteceu no Estudo 1, foram avaliadas segundo dois critérios: por
conteúdo e por estágio de julgamento moral. Nessas análises emergiram as mesmas categorias
elencadas no Estudo 1.
Observe no Quadro 4 que as respostas dos participantes se concentraram, sobretudo,
no estágio 1/2 de julgamento moral, que faz referência as justificativas que são guiadas pelo
princípio da Lei de Talião: “olho por olho, dente por dente”.
Quadro 4. Categorias, estágios, exemplos e percentuais de respostas à questão “Você
acha que Sadam Hussein deveria ter sido executado? Por quê?”
Categorias
Estágio
Exemplos de Respostas
F
%
Lei de Talião
1/2
“Ele deveria ser morto, justamente como ele fez com outras
vítimas”
94
45,6
Justiça divina
4/1
“Porque só quem tem o direito de tirar a vida é quem a deu”
17
8,3
Outra punição
3
“Ele deveria ser punido de outra forma, como prisão perpétua”
38
18,4
4/5/1
“Só assim a sociedade não sofrerá mais com as suas maldades”
17
8,3
“Todos tem o direito a vida. É algo incontestável”
19
9,2
Proteção à
sociedade
Direito a vida
5
Não categorizada
-----
Respostas tautológicas e sem sentido.
21
10,2
Total
----
--------------------------------------------------------------
206
100
162
Ao se avaliar as justificativas de repostas (organizadas em categorias semânticas e
estágios) à questão “Você acha que Sadam Hussein deveria ter sido executado?” em função
das variáveis sócio-demográficas, verificou-se que não houve diferença significativa entre os
grupos em função de nenhuma variável sócio-demográfica.
Caso João Hélio
Quanto ao segundo caso avaliado, Caso João Hélio, 82% dos participantes revelaram
ser favoráveis a redução da maioridade penal, 15% desfavoráveis e os demais (3%) afirmaram
não saber responder. Quando se comparou essas respostas em função das variáveis sóciodemográficas (sexo, escolaridade e idade), constatou-se diferença significativa (χ² = 15,03;
g.l. = 2; p<0,005) apenas em função do grau de escolaridade: o posicionamento contrário em
relação à proposta de redução da maioridade penal prevaleceu entre os estudantes do 2º ano
do ensino médio.
As justificativas à questão “Você está de acordo que haja uma redução na idade em
que o adolescente seja punido?”, assim como no Caso Sadam Hussein, foram avaliadas
segundo dois critérios: por conteúdo e por estágio de julgamento moral. Nessas análises
emergiram também as mesmas categorias elencadas no Estudo 1.
Note-se, no Quadro 5, que as respostas dos participantes se concentraram, sobretudo,
no estágio 3/1 de julgamento moral – esse estágio revela um pensamento que ao mesmo
tempo em que leva em consideração as intenções e o comportamento social da pessoa
envolvida, típico do estágio 3, defende a idéia de uma justiça retributiva do estágio 1.
163
Quadro 5. Categorias, estágios, exemplos e percentuais de respostas a questão “Você
está de acordo que haja uma redução na idade em que o adolescente seja punido? Por
que?”
Categorias
Exemplos de Respostas
Estágio
F
%
Tem que pagar
1/2
“Fez algo errado, tem que ser punido”
22
10,7
Punição relacionada à
consciência
3/1
“É adolescente, mas sabe o que faz muito bem. Deve ser
preso. Ele pode votar e já quer ser dono do próprio nariz”
90
43,7
Visão negativa da lei
4/1
“Ele faz isto, porque ele confia na lei. É o protegido da
lei”
45
21,8
Visão preventiva da
punição
4
“Deve ser punido para que não faça de novo outro crime”
21
10,2
Visão social do crime
5
A coisa não é tão simples assim. Não é simplesmente
punir. Tem muitas questões políticas e sociais em jogo.
8
3,9
Não categorizada
------
Respostas tautológicas e sem sentido.
20
10,7
Total
------
-----------------------------------------------------------
206
100
Quando se avaliou as categorias e estágios em função das variáveis sóciodemográficas, verificou-se que não houve diferença significativa entre os grupos em função
de nenhuma variável sócio-demográfica.
5.4.3. Defining Issues Test (DIT) – O prisioneiro foragido
No gráfico a seguir tem-se a distribuição média da pontuação bruta nos estágios de
raciocínio de julgamento moral no DIT dos participantes. A Figura 3 demonstra que a maior
pontuação média dos participantes foi no estágio 4.
6
4,92
4
2
2,77
Des. Moral
1,58
0
Estágio 3
Estágio 4
Estágio 5/6
Figura 3. Pontuação média bruta dos participantes no DIT
164
Em uma segunda análise das respostas, os participantes foram classificados em função
da predominância de suas respostas nos estágios. Conforme pode ser observado na Figura 4,
os
resultados
obtidos
com
o
DIT
apontam
para
um
desenvolvimento
moral
predominantemente do estágio 4.
70
60
50
40
30
20
10
0
60,8
24,9
14,4
Estágio 3
Estágio 3
Estágio 4
Estágio 5/6
Estágio 4
Estágio 5/6
Figura 4. Predominância do estágio de Desenvolvimento Moral, medido pelo DIT
A predominância do estágio moral também foi analisada em função dos dados sóciodemográficas (sexo, idade, escolaridade). Neste caso, não houve diferença significativa entre
os grupos.
5.4.4. Interpersonal Reactivity Index (IRI)
Para verificar a consistência interna do IRI e das sub-escalas de Consideração
Empática (CE), Tomada de Perspectiva (TP) e Angústia Pessoal (AP) foi calculado o
coeficiente Alpha. Os resultados demonstraram que o IRI apresentou um alpha de 0,75, a
subscala CE de 0,67, a sub-escala TP de 0,60 e a sub-escala de AP um alpha de 0,53.
Para verificar a convergência entre as sub-escalas, foram calculados os coeficientes de
correlação de Pearson. Conforme pode ser visto na Tabela 5, todas as sub-escalas
apresentaram correlações positivas entre si.
165
Tabela 5 – Coeficientes de correlação de Pearson entre as sub-escalas do Interpersonal
Reactivity Index (IRI)
Consideração Empática
Tomada de Perspectiva
Consideração Empática
1
Tomada de Perspectiva
0,43**
1
Angústia Pessoal
0,39**
,19**
Angústia Pessoal
1
** A correlação é significativa a um nível de 0,01 (unilateral).
No que se refere à relação entre as variáveis sócio-demográficas (sexo, idade e
escolaridade) e as três sub-escalas do IRI, os resultados de uma MANOVA revelaram o efeito
principal do sexo do participante em relação as três sub-escalas do IRI [Lambda de Wilks =
0,84, F(3,206) = 12,48, p < 0,001], isto é, as mulheres obtiveram médias maiores que os
homens em relação as sub-escalas Consideração Empática (Mulheres: M=3,85, DP=0,70;
Homens: M=3,33, DP=0,61), Tomada de Perspectiva (Mulheres: M=3,43, DP=0,67; Homens:
M=3,28, DP=0,63) e Angústia Pessoal (Mulheres: M=3,35, DP=0,59; Homens: M=3,01,
DP=0,58). Não houve efeito de interação entre as variáveis sócio-demográficas e as subescalas do IRI.
5.4.5. Validade Convergente
No que diz respeito à relação entre os instrumentos de medida de Empatia (Escala de
Empatia focada em Grupos e Interpersonal Reactivity Index), conforme pode ser observado
na Tabela 6, verificou-se correlações significativas entre as sub-escalas do IRI e os fatores da
EEG; assim como correlações significativas entre as sub-escalas do IRI (já apresentada na
Tabela 6) e correlações significativas entre os fatores da EEG.
Note-se, também, na Tabela 6, que:
(1) a sub-escala Consideração Empática apresenta correlações acima de ,30 com
dois dos quatro fatores, a saber Empatia com grupos minoritários (0,43) e
166
Empatia com o trabalhador (0,39); no caso dos fatores Empatia com animais e
Empatia com “apenados” a correlação é fraca;
(2) a sub-escala Tomada de Perspectiva só apresenta correlação acima de ,30 em
relação ao fator Empatia com grupos minoritários (0,33);
(3) a sub-escala Angústia Pessoal não apresenta correlação acima de ,30 em
relação a nenhum dos fatores da EEG;
Tabela 6 – Coeficientes de correlação de Pearson entre as sub-escalas do Interpersonal
Reactivity Index (IR) e os Fatores da Escala de Empatia focada em Grupos (EEG)
Consid.
Empática
Tomada de
Perspec.
Angústia
Pessoal
Emp c/
grup. min.
Emp c/
animais
Empatia c/
trabalh.
Consideração
Empática
1
Tomada de
Perspectiva
0,43**
1
Angústia
Pessoal
0,39**
0,19**
1
Empatia c/
grupos min.
0,43**
0,33**
0,29**
1
Empatia com
animais
0,23**
0,15*
0,17**
0,35**
1
Empatia com
trabalhadores
0,34**
0,25**
0,23**
0,38**
0,27**
1
Empatia com
apenados
0,24**
0,16*
0,16*
0,27**
0,22**
0,39**
Emp c/
apenados
1
** A correlação é significativa a um nível de 0,01 (unilateral)
* A correlação é significativa a um nível de 0,05 (unilateral)
Quanto à relação entre os instrumentos de medida de julgamento moral (Dilemas da
Vida Real e Defining Issues Test), conforme pode ser observado na Tabela 7, verificaram-se
correlações positivas entre o DIT e o Dilema de Sadam Hussein (neste caso, a correlação
revelou-se fraca: 0,16); e entre o Dilema de Sadam Hussein e o Dilema de João Hélio.
167
Tabela 7 – Coeficientes de correlação de Pearson entre o DIT e os Dilemas da Vida Real
DIT
Dilema S. Hussein
DIT
1
Dilema S. Hussein
0,16*
1
Dilema João Hélio
0,13
0,31**
Dilema João Hélio
1
** A correlação é significativa a um nível de 0,01 (unilateral)
* A correlação é significativa a um nível de 0,05 (unilateral)
No que se refere às correlações entre os instrumentos de desenvolvimento moral e os
de empatia, se encontrou correlações em relação ao DIT e as sub-escalas CE e TP. Conforme
pode ser observado na Tabela 8, também se constatou que as respostas dos participantes ao
Dilema de Sadam Hussein se correlacionaram com o fator Empatia com “apenados” da EEG;
de forma semelhante, as respostas dos participantes ao Dilema de João Hélio se
correlacionaram com o fator Empatia com “apenados”. Note-se, que os valores dessas
correlações são menores que 0,30.
Tabela 8 – Coeficientes de correlação de Pearson entre os instrumentos de
desenvolvimento moral (DIT e Dilemas da Vida Real) e os de empatia (IRI e EEG-27)
DIT
Caso S. Hussein
Caso João Hélio
Consideração Empática
0,13*
0,09
-0,02
Tomada de Perspectiva
0,13*
0,01
0,06
Angústia Pessoal
-0,01
0,04
-0,13
Empatia c/ g. minoritários
-0,03
0,01
0,01
Empatia com animais
0,05
0,05
0,08
Empatia c/ trabalhadores
0,06
0,02
-0,06
Empatia com “apenados”
0,07
0,10*
0,12*
* A correlação é significativa a um nível de 0,05 (bilateral)
168
5.5. Discussão parcial
Sobre os resultados da EEG (27 itens), a escala apresentou uma estrutura multifatorial,
com quatro componentes: Empatia com grupos minoritários, Empatia com trabalhadores,
Empatia com “apenados”, Empatia com animais, conforme esperado (hipótese a1). Estrutura
esta que se mostrou psicometricamente adequada, segundo o que foi constatado nos resultados
de uma análise fatorial confirmatória realizada com uma outra amostra de estudantes
adolescentes. Ainda é relevante comentar que, em consonância com o que foi hipotetizado em
b2, a maior média atribuída pelos participantes foi ao fator relacionado à Empatia com grupos
minoritários; e, em conformidade com o que foi hipotetizado em b3, a menor média foi
atribuída ao fator Empatia com “apenados” (ex: pessoas condenadas a pena de morte por
crime que cometeram).
No que se refere às características psicométricas da EEG, de um modo geral, pode-se
dizer que a EEG, elaborada com vistas à mensuração da Empatia relacionada a problemas
sociais (último estágio de desenvolvimento empático da teoria de Hoffman), apresentou
parâmetros psicométricos adequados na amostra de adolescentes, podendo ser considerada um
instrumento válido para identificar quatro componentes claramente discerníveis em relação
aos grupos aos quais se destina o sentimento empático: grupos minoritários, trabalhadores,
animais e “apenados”.
Sobre a retirada de sete dos 27 itens da escala (Pessoas que têm parentes seqüestrados,
Pessoas que trabalham em condições desumanas, Índios sendo menosprezados, Adolescentes
presos por cometerem crimes, Crianças passando fome, Pessoas que perdem parentes
queridos, Pessoas que trabalham com produtos tóxicos, sem terem a devida proteção),
consideram-se os itens retirados adequadamente associados aos fatores da escala, o que leva a
autora dessa tese e sua orientadora a sugerirem que em trabalhos futuros seja verificado se,
169
com amostras de outras faixas etárias, tal exclusão se comprova. Por outro lado, com a
eliminação dos sete itens supramencionados, apresenta-se, neste estudo, um instrumento mais
parcimonioso e breve (com vinte itens apenas), com as mesmas dimensões que a versão
inicial (com vinte e sete itens). A versão nova favorece o seu uso em pesquisas, sobretudo
quando se consideram múltiplas medidas ou se procura realizar um levantamento rápido da
Empatia.
Sobre a consistência interna da EEG, considerando os critérios de Nunnally (1991)
que indicam como satisfatório um índice de precisão maior ou igual a 0,70, pode-se afirmar
que a EEG apresenta alguns coeficientes de precisão abaixo do esperado, mas que, dada à
natureza polimorfa do construto, não devem ser descartados (Clark & Watson, 1995; Mueller,
1986); por outro lado, considerando os parâmetros de Cronbach (1996) e Churchil Jr. (1999),
que afirmam que valores entre 0,60 e 0,80 são considerados bons para uma pesquisa
exploratória, pode-se afirmar que os índices encontrados são satisfatórios, sobretudo quando
se considera a interpretação teórica e empírica dos itens nos fatores da EEG. Adicionalmente,
foi computado, no primeiro estudo, um alfa médio de 0,73, e no segundo um alfa médio de
0,70, que podem ser considerados índices de precisão aceitáveis (Tabachnick & Fidell, 2001).
Ainda deve-se comentar que os dois fatores que apresentaram alfas menores que 0,70
possuem um número reduzido de itens (4 itens cada), o que pode ser uma explicação a
respeito, já que o alfa de Cronbach é fortemente influenciado pelo número de itens que
compõem um componente, aumentando segundo este seja aumentado (Nunnally, 1991).
Quanto à análise fatorial confirmatória da EEG, os resultados apóiam a coerência do
modelo teórico que pressupõe uma multidimensionalidade do construto empatia, mostrandose, neste caso, como sendo mais adequado um modelo tretrafatorial; e os índices de ajuste
observados atendem ao que tem sido considerado apropriado na literatura (Byrne, 2001;
Tabachnick & Fidell, 2001; Van de Vijver & Leung, 1997).
170
De uma maneira geral, considera-se que a construção e a validação da EEG trazem
contribuições práticas significativas para a compreensão acerca da dimensionalidade do
construto da Empatia. Contudo, é bom lembrar que os dados aqui apresentados foram
colhidos a partir de uma amostra de conveniência, que talvez não represente adequadamente a
população brasileira, devendo, neste sentido, ser ampliado para amostras que incluam outros
contextos, no sentido de considerar as dimensões locais, específicas ou exclusivas (emics) da
orientação de cada cultura, bem como, e não menos importante, as dimensões universais
(etics) da cultura, com o objetivo de comparar os construtos estudados aqui para outro espaço
geo-político e social (Muenjohn & Armstrong, 2007; Triandis et al., 1993; Van de Vijver &
Leung, 1997). Além disso, considera-se pertinente conhecer a validade preditiva da EEG,
considerando grupos-controle, definidos como pessoas com tendência a ter ausência de
empatia (como por exemplo, os Psicopatas) e pessoas com empatia, ou mesmo comprovar sua
estabilidade temporal por meio de teste-reteste.
Em relação aos estágios de desenvolvimento moral dos participantes adolescentes, os
resultados, verificados mediante a aplicação dos Dilemas da Vida Real, revelaram o
predomínio dos participantes nos estágios 1 e 2, o que correspondeu ao esperado (hipótese b1)
e corroboram os resultados encontrados no Estudo 1. Já os resultados, verificados mediante a
aplicação do DIT, revelaram o predomínio do estágio 4 (60,8%), o que diverge, em certo
sentido, da hipótese b2 que, em consonância com diferentes estudos empíricos (Snarey,
1985), previa que os adolescentes teriam respostas predominantemente dos estágios 3 e 4,
quando verificadas mediante o DIT. Acredita-se que o predomínio do estágio 4 deva-se a
história do DIT escolhida para este estudo – O prisioneiro foragido –, que tem como conflito
central a questão da lei (obedecer a lei ou burlá-la em função da mudança de atitude do
prisioneiro), tema característico do estágio 4. Esta diferença de estágios de desenvolvimento
moral em função do instrumento utilizado já foi comentada na Discussão do Capítulo IV.
171
Também sobre questões atreladas ao desenvolvimento moral dos participantes,
observou-se, assim como no Estudo 1, uma favorabilidade considerável a pena morte e um
apoio maciço a mudança na lei penal brasileira, no sentido de reduzir a idade do adolescente
cumprir medida de privação de liberdade. Resultado análogo a este foi encontrado em
diferentes estudos já citados nesta tese (Datafolha, 2006; Galvão et al., 2007; Laranjeiras,
2007; Menin, 2005). No que tange aos argumentos utilizados a favor ou contra a pena de
morte e redução da maioridade penal, eles foram agrupadas nas mesmas categorias elencadas
no Estudo 1, tendo também o predomínio de respostas que foram guiadas pelo princípio da
Lei de Talião: “olho por olho, dente por dente” (no caso Sadam Hussein) e de respostas que
fizeram uso do slogan “tem consciência, deve ser punido” (no caso João Hélio).
Quanto à influência das variáveis sócio-demográficas sobre o desenvolvimento moral,
apenas se constatou a influência da variável escolaridade em relação à proposta de redução da
maioridade penal: o posicionamento contrário a tal idéia prevaleceu entre os estudantes do 2º
ano do ensino médio quando comparados aos do 1 º ano, o que é teoricamente adequado, já
que se esperava que o avanço da escolaridade favorecesse o desenvolvimento moral (hipótese
d3). Sobre o fato da idade não ter diferenciado os participantes em relação ao
desenvolvimento moral (o que contrariou a hipótese d4), acredita-se, como Rest (1976), que a
idade não é um bom indicador do desenvolvimento moral, na medida em que este
desenvolvimento depende do desenvolvimento cognitivo, que nem sempre caminha junto com
o avanço da idade.
Em relação ao IRI, tem-se que a escala apresentou coeficientes de consistência interna
satisfatórios (IRI – α de 0,75; CE – α de 0,67; TP – α de 0,60; AP – α de 0,53), quando
comparados aos encontrados em estudos brasileiros (Ribeiro, Koller & Camino, 2002;
Sampaio, 2007), porém baixos quando comparados ao trabalho original de Davis (1980) e
quando se considera o que diz a psicometria (Nunnally, 1991). É relevante acrescentar que,
172
apesar de apresentar uma consistência interna abaixo do desejado, as sub-escalas mostraramse correlacionadas entre si, com coeficiente de correlação positivo entre CE e TP (r=0,43;
p<0,001) compatíveis com o previsto por Davis e com o encontrado por Ribeiro, Koller e
Camino (2002) e por Sampaio (2007); e com coeficiente de correlação positivo entre a subescala Angústia Pessoal e as outras duas sub-escalas, o que difere do previsto teoricamente e
do encontrado em pesquisas transculturais (Escrivã, Navarro & Garcia, 2004; Pérez-Albéniz
et al., 2003; Siu & Shek, 2005), mas assemelha-se aos achados de Ribeiro, Koller e Camino
(2002) e Sampaio (2007) e é consonante com a hipótese b4. Diante desses dados, questiona-se
se as divergências nos resultados encontrados em outros países e no Brasil são decorrentes de
diferenças sócio-culturais e, em caso positivo, qual seria o significado teórico destas
diferenças para a compreensão da empatia.
Quanto a influência das variáveis sócio-demográficas sobre o grau de sensibilidade
empática, os resultados são congruentes com o que era esperado (hipóteses d2, d5 e d6) e
com o que vem sendo observado em alguns estudos empíricos acerca da influência da variável
sexo (Adams, Summers & Christopherson, 1993; Ittyerah & Mahindra, 1990; Santilli &
Hudson, 1992) e acerca da influência das variáveis idade e escolaridade (Adams, Summers &
Christopherson, 1993; Gnepp & Chilamkurti, 1988; Ittyerah & Mahindra, 1990; Klemchuk,
Bond & Howell, 1990; Selman, 1974). Mas, de qualquer forma, não se pode falar que as
hipóteses d2, d5 e d6 foram confirmadas, porque se esperava a influência dessas variáveis
sócio-demográficas não apenas em relação a uma ou outra dimensão das escalas utilizadas,
mas em relação a todas as dimensões da escala.
Quanto a relação encontrada entre desenvolvimento moral e empatia, julga-se
congruente com o que foi encontrado na literatura pertinente (Camino, Camino & Leyens,
1996; Eisenberg-Berg & Mussen, 1978; Hogan & Dickstein, 1972; Sampaio, 2007) e ao que
foi hipotetizado (c3). Contudo, é importante registrar que os valores das correlações são
173
baixos (menores que 0,30) e, neste sentido, passíveis de críticas; mas, por outro lado,
conforme comenta Hemphill (2003), correlações acima de 0,30 na psicologia parecem ser
mais uma exceção do que uma regra.
174
CAPÍTULO VI – ESTUDO 3: EDUCAÇÃO MORAL
175
6.1. Objetivo
O objetivo deste terceiro estudo coincide com o objetivo principal da presente tese,
que é verificar se existem diferenças entre os efeitos das técnicas de intervenção “racionaldiscursiva” (Blatt & Kohlberg, 1975) e “racional-afetiva”.
6.2. Hipóteses
1) o grupo submetido à técnica de intervenção “racional-afetiva” evoluirá mais do que o
grupo submetido à intervenção “racional-discursiva” nos estágios de desenvolvimento
moral;
2) o grupo submetido à técnica de intervenção “racional-afetiva” evoluirá mais do que o
grupo submetido à intervenção “racional-discursiva” no grau de sensibilidade
empática;
3) o grupo submetido à técnica de intervenção “racional-discursiva” evoluirá mais do que o
grupo de controle nos estágios de desenvolvimento moral;
4) o grupo de controle não apresentará evolução significativa nos estágios de
desenvolvimento moral;
5) o grupo de controle não apresentará evolução significativa no grau de sensibilidade
empática;
176
Para ilustrar e sintetizar as cinco hipóteses que foram elencadas tem-se a Figura 5.
Figura 5: Hipóteses acerca dos efeitos das técnicas de intervenção moral
As hipóteses 1 (o grupo submetido à técnica de intervenção “racional-afetiva” evoluirá
mais do que o grupo submetido à intervenção “racional-discursiva” nos estágios de
desenvolvimento moral) e 2 (o grupo submetido à técnica de intervenção “racional-afetiva”
evoluirá mais do que o grupo submetido à intervenção “racional-discursiva” no grau de
sensibilidade empática) baseiam-se na suposição de que a técnica de intervenção que mobiliza
os aspectos afetivos relacionados à empatia e ao role-taking tem um potencial maior para
promover avanços nos estágios de julgamento moral e no grau de empatia, do que uma
técnica que segue apenas o modelo elaborado por Blatt e Kohlberg (1975). Isto porque, julgase, como Hoffman (2003), que a empatia funciona como um estimulador da elaboração e
manifestação de princípios morais.
As hipóteses 3 (o grupo submetido à técnica de intervenção “racional-discursiva”
evoluirá mais do que o grupo de controle nos estágios de desenvolvimento moral) e 4 (o
grupo de controle não apresentará evolução significativa nos estágios de desenvolvimento
moral) fundamentam-se no que tem sido constatado em programas de educação moral no
âmbito internacional (Berkowitz, 1985; Blatt & Kohlberg, 1975; Gibbs, Arnold, Ahlborn &
177
Chessman, 1984) e nacional (Biaggio, 1985; Dias, 1992; Lins & Camino, 1993; Rique &
Camino, 1997; Rodrigues, 1976).
A hipótese 5 (o grupo de controle não apresentará evolução significativa no grau de
sensibilidade empática) baseia-se nas intervenções, voltadas para a promoção do
desenvolvimento empático, realizadas por Day (2002), Tsai e Kaufman (2009), Falcone
(1999) e Frare et al. (2005).
6.3. Método
6.3.1. Participantes
Participaram 36 estudantes, selecionados da amostra de 206 estudantes pessoenses do
Estudo 2. Estes foram distribuídos em três grupos, composto, cada um, por 12 participantes
do segundo ano do ensino médio, com idades semelhantes e número igual de sujeitos por sexo
e estágio de desenvolvimento moral (Tabela 9).
É relevante registrar que para selecionar os estudantes e distribuí-los nos grupos foram
consideradas as indicações de Arbuthnot e Faust (1981): 12 participantes por grupo, sendo o
perfil de cada grupo semelhante no que tange ao número de sujeitos por estágio de
moralidade; a inclusão de, pelo menos, três estágios morais em cada grupo; idades
semelhantes e o mesmo número de sujeitos do sexo masculino e do sexo feminino. Também
se considerou a média de desenvolvimento moral obtida em cada um dos Dilemas da Vida
Real, a média de desenvolvimento moral obtida no DIT, bem como a média geral da EEG, a
média geral do IRI e os índices obtidos em cada uma das sub-escalas do IRI e em cada
componente da EEG.
178
Tabela 9 – Lista de sujeitos selecionados, por grupo de intervenção, com os seus
G2 – “RACIONAL-AFETIVA”
ET
G3 – CONTROLE
ET
ET
DESENVOLVIMENTO
MORAL
(Estágio/escore)
SEXO
IDADE
EMPATIA
(Média)
SUJEITO
G1 – “RACIONAL-DISCURSIVA”
GRUPO
respectivos resultados do pré-teste
DIT
Sadam
J.Hélio
EEG
C1
C2
C3
C4
IRI
CE
TP
AP
193
146
206
202
M
M
F
F
16
14
15
15
3 (3,0)
3 (3,0)
3 (3,0)
3 (3,0)
1/2 (1,5)
1/2 (1,5)
1/2 (1,5)
1/2 (1,5)
3/1 (2,0)
1/2 (1,5)
3/1 (2,0)
1/2 (1,5)
3,07
3,11
3,32
3,53
4,00
4,00
4,20
4,10
3,52
3,54
3,71
3,82
3,00
2,90
3,10
3,20
1,75
2,00
2,25
3,00
3,26
3,21
3,32
3,48
3,50
3,33
3,55
3,80
3,28
3,20
3,40
3,43
3,00
3,10
3,00
3,20
190
M
15
4 (4,0)
3 (3,0)
3/1 (2,0)
3,36
4,00
3,70
3,10
2,65
3,20
3,30
3,30
3,00
181
M
15
4 (4,0)
4/5/1 (3,3)
4 (4,0)
3,50
4,10
3,77
3,20
2,90
3,28
3,35
3,28
3,20
189
F
15
4 (4,0)
1/2 (1,5)
3/1 (2,0)
3,55
4,40
3,81
3,30
2,70
3,55
3,85
3,45
3,35
204
F
15
4 (4,0)
4/1 (2,5)
4/1 (2,5)
3,80
3,30
2,90
3,61
4,00
3,43
3,40
M
15
P (5,5)
4/5/1 (3,3)
4 (4,0)
3,61
3,71
4,42
197
4,29
3,80
3,75
3,00
3,13
4,00
2,71
3,43
201
M
15
P (5,5)
3 (3,0)
4/1 (2,5)
3,92
4,57
3,60
2,75
4,75
4,13
3,86
4,00
3,71
194
F
15
P (5,5)
5 (5,0)
5 (5,0)
3,89
4,43
4,40
3,00
3,75
3,80
3,86
3,71
4,14
196
F
15
P (5,5)
3 (3,0)
4/1 (2,5)
3,72
4,57
4,80
2,25
3,25
3,87
4,43
4,00
3,43
---
--
--
50,0
30,6
31,5
42,3
51,1
46,3
36,9
34,9
41,8
44,8
41,2
40,0
177
M
16
3 (3,0)
1/2 (1,5)
3/1 (2,0)
3,28
4,10
3,50
3,00
2,50
3,40
3,45
3,25
3,50
172
M
15
3 (3,0)
1/2 (1,5)
1/2 (1,5)
3,10
4,00
3,50
2,90
2,00
3,20
3,30
3,20
3,10
183
F
14
3 (3,0)
1/2 (1,5)
3/1 (2,0)
3,31
4,15
3,73
3,10
2,25
3,30
3,50
3,40
3,00
166
F
15
3 (3,0)
1/2 (1,5)
1/2 (1,5)
3,51
4,10
3,72
3,20
3,00
3,43
3,70
3,40
3,20
155
M
15
4 (4,0)
4/5/1 (3,3)
4 (4,0)
3,33
4,00
3,60
3,00
2,70
3,17
3,20
3,30
3,00
157
M
15
4 (4,0)
3 (3,0)
4/1 (2,5)
3,53
4,20
3,80
3,20
2,90
3,30
3,45
3,28
3,20
176
F
15
4 (4,0)
4/1 (2,5)
3/1 (2,0)
3,53
4,30
3,80
3,30
2,70
3,50
3,85
3,40
3,35
174
F
15
4 (4,0)
1/2 (1,5)
3/1 (2,0)
3,80
3,30
2,90
3,60
4,00
3,40
3,40
M
15
P (5,5)
4/5/1 (3,3)
4 (4,0)
3,63
3,65
4,52
171
4,86
3,00
3,00
3,75
3,07
2,86
3,86
2,57
161
M
15
P (5,5)
3 (3,0)
4/1 (2,5)
3,12
4,43
3,80
3,00
3,25
3,26
3,71
2,57
3,50
160
F
15
P (5,5)
5 (5,0)
5 (5,0)
3,97
4,71
3,40
4,50
3,25
3,73
4,14
4,14
2,86
165
F
15
P (5,5)
3 (3,0)
4/1 (2,5)
4,19
4,86
4,40
4,25
3,25
4,00
4,29
4,57
3,29
---
--
--
50,0
30,6
31,5
42,2
52,2
44,1
39,8
34,5
40,3
43,5
41,8
38,0
136
M
16
3 (3,0)
1/2 (1,5)
3/1 (2,0)
3,13
4,00
3,50
3,00
2,00
3,28
3,50
3,30
3,05
173
M
15
3 (3,0)
1/2 (1,5)
1/2 (1,5)
3,08
4,00
3,50
2,80
2,00
3,20
3,30
3,20
3,10
200
F
14
3 (3,0)
1/2 (1,5)
3/1 (2,0)
3,28
4,00
3,50
3,10
2,50
3,30
3,50
3,40
3,00
206
F
15
3 (3,0)
1/2 (1,5)
1/2 (1,5)
3,63
4,50
3,80
3,20
3,00
3,44
3,70
3,43
3,20
145
M
15
4 (4,0)
3 (3,0)
4/1 (2,5)
3,36
4,00
3,70
3,10
2,65
3,23
3,40
3,30
3,00
119
M
15
4 (4,0)
4/5/1 (3,3)
4 (4,0)
3,50
4,10
3,77
3,20
2,90
3,28
3,35
3,30
3,20
147
F
15
4 (4,0)
1/2 (1,5)
3/1 (2,0)
3,55
4,40
3,81
3,30
2,70
3,53
3,85
3,40
3,35
143
F
15
4 (4,0)
4/1 (2,5)
3/1 (2,0)
4,42
3,80
3,30
2,90
3,53
3,80
3,40
3,40
137
M
15
P (5,5)
3 (3,0)
4/1 (2,5)
3,61
3,29
4,71
3,20
2,00
3,25
3,53
3,57
4,29
3,00
121
M
15
P (5,5)
4/5/1 (3,3)
4 (4,0)
3,83
4,71
3,60
4,00
3,00
3,60
3,14
3,57
3,57
117
F
15
P (5,5)
5 (5,0)
5 (5,0)
4,11
5,00
4,20
4,75
2,50
4,00
3,29
4,29
4,43
123
F
15
P (5,5)
3 (3,0)
4/1 (2,5)
3,63
4,00
5,00
3,25
2,25
4,60
5,00
4,14
4,57
---
--
--
50,0
30,6
31,5
42,0
51,8
45,4
39,0
31,7
42,5
43,4
43,0
40,9
Nota:
DIT = Defining Issues Test; Sadam = Dilema de Sadam Hussein; J. Hélio = Dilema de João Hélio; EEG = Escala de
Empatia focada em Grupos; C1 = Componente 1 da EEG – Empatia com grupos minoritários; C2 =
Componente 2 da EEG – Empatia com animais; C3 = Componente 3 da EEG – Empatia com
trabalhadores; C4 = Componente 4 da EEG – Empatia com “apenados”. IRI = Interpersonal Reactivity
Index; CE = Sub-escala do IRI - Consideração Empática; TP = Sub-escala do IRI - Tomada de
Perspectiva; AP = Sub-escala do IRI – Angústia Pessoal; ET= Escore Total (somatório dos (as)
escores/médias dos participantes, em cada instrumento, por grupo).
179
6.3.2. Delineamento
Utilizou-se um delineamento quase-experimental com três grupos, sendo dois
experimentais e um de controle, submetidos à pré e pós-testes. Esses grupos foram expostos,
durante um semestre letivo, com sessões semanais, a condições experimentais diferenciadas, a
saber:
Condição 1 – Técnica “racional-discursiva” (Blatt & Kohlberg, 1975)
A técnica proposta por Moshe Blatt, sob a orientação de L. Kohlberg, consiste,
basicamente, em formar grupos de discussão com indivíduos em diferentes estágios de
julgamento moral (medidos previamente por um instrumento de avaliação do julgamento
moral) e apresentar nos grupos dilemas morais hipotéticos para que os mesmos sejam
debatidos, sob a coordenação de um educador (facilitador). Blatt preconizou que a discussão
de dilemas entre indivíduos de estágios de raciocínio moral distintos provocaria conflito
cognitivo, o qual impulsionaria a passagem de um estágio para outro mais amadurecido.
De forma sistemática, a técnica de Blatt e Kohlberg (1975) consiste, de acordo com
Arbuthnot e Faust (1981), na realização das seguintes etapas:
1. Formação dos grupos – o objetivo desta primeira etapa é formar grupos com um tamanho
adequado para a discussão, ou seja, entre 8 e 12 indivíduos, com idades semelhantes e com
representantes dos três níveis consecutivos de raciocínio moral.
2. Seleção e preparação dos dilemas – a finalidade desta etapa é selecionar dilemas que
permitam conflitos, estimulem a discussão e possibilitem ao educador apresentar contra
argumentos de distintos estágios.
3. Criação do Set apropriado – o objetivo desta fase é preparar um bom clima para a discussão
dos dilemas morais. Para tanto, Arbuthnot e Faust (1981) aconselham que, antes de começar a
intervenção, se explique aos participantes o que será realizado, o papel da educação moral e o
do coordenador, e as diretrizes para participação com ênfase na liberdade de opinião.
180
4. Início da discussão – esta etapa busca facilitar o início do debate entre os indivíduos de
estágio de raciocínio moral inferior com os de estágio imediatamente superior. Para isto,
deve-se apresentar o dilema ao grupo e se assegurar de sua absoluta compreensão. Neste caso,
pode ser necessário resumir as idéias principais, fomentar as perguntas e oferecer qualquer
esclarecimento ou informação adicional caso o grupo solicite. Nesta fase, é sempre importante
ressaltar aos estudantes que não há respostas corretas para o dilema e que todas as opiniões,
ainda que divergentes, são importantes e merecem atenção e espaço na discussão; além disso,
é importante salientar que todos devem opinar sobre o dilema. Depois de dados todos os
informes e de assegurada a compreensão do dilema por todo o grupo, deve-se solicitar que os
estudantes se dirijam a pequenos grupos e expressem sua posição inicial, justificando-a. Para
que os estudantes não se percam nas discussões e mantenham o foco na tarefa, deve-se
solicitar a entrega de material por escrito sobre a discussão realizada no grupo. Conforme lista
Souza (2008), existem várias possibilidades para se obter o material discutido: um dos
pedidos possíveis é a redação da solução acordada pelo grupo para o dilema; outra
possibilidade é solicitar aos alunos que respondam as questões que seguem ao dilema
assumindo novos papéis ou sendo analisados sob outra perspectiva; ainda se pode requisitar
que elaborem uma resposta a favor ou contra a decisão do protagonista do dilema, justificando
ambas as decisões; finalmente, no caso de dilemas que não oferecem uma decisão tomada
pelo personagem principal, pode-se pedir aos alunos que elaborem essas duas possibilidades.
Uma vez que cada grupo apresentou suas conclusões, deve-se estruturar o debate inicial,
começando pelas opiniões de estágio mais baixo de maturidade moral em confronto com o
estágio imediatamente superior.
5. Guiando a discussão – a finalidade desta fase é dar a oportunidade à maior quantidade de
indivíduos possível para vivenciar o processo de desequilíbrio, fazendo-os perceber a
inadequação do seu tipo de raciocínio em detrimento de um imediatamente superior. Para
181
tanto, a discussão deve começar pelas respostas guiadas pelo raciocínio dos estágios mais
baixos do grupo, e os integrantes dos estágios mais maduros deverão ser encorajados a opinar
e a debater as diferenças de opinião; se os sujeitos de estágio +1 conseguirem criar o
desequilíbrio nos de estágio inferior, não será necessário que o facilitador ofereça sua ajuda;
caso os argumentos não sejam convincentes, o facilitador deve clarificá-los e animar a
apresentação de argumentos mais efetivos e, se preciso, criar contra argumentos dentro do
mesmo estágio. Desta forma, deve-se proceder passo a passo, fazendo os participantes
ascenderem por meio dos estágios até chegar no mais alto do grupo.
6. Finalizando a discussão – a discussão deve ser concluída uma vez que o grupo tenha passo
a passo ascendido por meio dos estágios de raciocínio moral.
É relevante mencionar que, nessa condição experimental, os dilemas morais são
apresentados tanto na forma escrita (modo convencional) como por meio de cenas de filmes e
vídeos do youtube (Apêndice VII).
Condição 2: Técnica “racional-afetiva” (com ênfase na Empatia)
Na Condição 2, além de ser utilizada a técnica de Blatt e Kohlberg (1975), explicitada
acima, empregam-se algumas técnicas do psicodrama (Apêndice VIII), com pequenas
adaptações que visam a estimulação do desenvolvimento da empatia e da tomada de
perspectiva dos participantes. Nessa condição experimental os participantes, além de
buscarem soluções racionais para os dilemas morais, interpretam os personagens das
estorietas, realizam exercícios imaginativos, por meio dos quais pensam e tentam sentir o que
eles acham que cada personagem sente e pensa, assim como, tentam lembrar de situações de
suas próprias vidas nas quais eles tenham tido sentimentos semelhantes aos que eles
imaginam que os personagens tenham vivenciado; no final desses exercícios imaginativos é
promovido um debate no qual eles podem falar sobre suas experiências durante a atividade. É
182
relevante mencionar que esses exercícios são organizados de maneira que todos os
participantes dos grupos interpretem papéis em algum momento do programa.
De forma semelhante ao que acontece na Condição experimental 1 (“racionaldiscursiva”), na Condição experimental 2 (“racional-afetiva”) os dilemas morais criados são
apresentados tanto na forma escrita (modo convencional) como por meio de cenas de filmes e
vídeos do youtube. A diferença entre a discussão de uma condição experimental e de outra
reside nas questões norteadoras que sucedem os dilemas: enquanto na Condição 1 as questões
estão voltadas exclusivamente para o raciocínio utilizado na resolução dos dilemas (Como
resolver este dilema? Por que?), na Condição 2 as questões estão direcionadas tanto para a
solução dos dilemas (Como resolver este dilema? Por que?) como para o exercício
imaginativo de se colocar no lugar do outro (como foi se colocar no lugar de...? O que você
sentiu?).
Condição 3 – Grupo de controle
O grupo de controle é formado por 12 participantes, que não participam de nenhum
dos dois programas de intervenção propostos. Este grupo de alunos serve apenas como
parâmetro de comparação e, neste sentido, é avaliado, em relação a moral e a empatia, da
mesma forma que os outros dois grupos.
Para sintetizar as propostas de intervenção, têm-se no Quadro 6 as idéias subjacentes a
cada condição experimental.
183
Quadro 6. Idéias subjacentes às condições experimentais: autores, foco, técnica, recursos
(meios), questões norteadoras e participantes
TÉCNICA “RACIONALDISCURSIVA”
AUTORES
FOCO
- Kohlberg;
- Cognição: raciocínio moral;
- Cognição: raciocínio moral
- Afeto: empatia
TÉCNICA
QUESTÕES
NORTEADORAS
- Kohlberg
- Hoffman
- Discussão de dilemas morais;
RECURSOS
(MEIOS)
TÉCNICA “RACIONALAFETIVA”
CONTROLE
--------------
--------------
- Discussão de dilemas morais;
- Role-playing e Dinâmica de
Grupo (psicodrama);
- Dilemas morais (hipotéticos e
reais) apresentados de forma
escrita e por meio de recursos
audiovisuais
(vídeos
do
youtube e cenas de filmes);
- Dilemas morais (hipotéticos e
reais) apresentados de forma
escrita e por meio de recursos
audiovisuais
(vídeos
do
youtube e cenas de filmes);
- Como resolver este dilema?
Por que?
- Como resolver este dilema?
Por que?
- Como foi se colocar no lugar
de...? O que você sentiu?
--------------
--------------
--------------
6.3.3. Instrumentos
Para investigar em que estágio de desenvolvimento do raciocínio moral os
participantes (antes e depois da intervenção) se encontravam, foram utilizados o DIT e os
Dilemas da Vida Real. E, para investigar o grau de sensibilidade empática dos participantes
(antes e depois da intervenção), foram utilizadas a Interpersonal Reactivity Index e a Escala
de Empatia focada em Grupos.
Além desses instrumentos, os participantes dos grupos experimentais se submeteram a
uma entrevista sobre o efeito da intervenção segundo suas opiniões, composta pelas seguintes
questões:
1) Depois que você entrou no projeto de intervenção, você consegue perceber alguma
mudança:
a) na sua forma de pensar questões morais? Se sim, que mudanças foram essas?
b) na sua forma de sentir? Se sim, que mudanças foram essas?
c) na sua forma de se comportar? Se sim, que mudanças foram essas?
184
É importante registrar, também, que no pós-teste os participantes responderam a
versão com 20 itens da Escala de Desejabilidade Social de Marlowe-Crowne (Gouveia,
Guerra, Sousa, Santos & Costa, 2009), tendo em vista mensurar atos que possam indicar a
necessidade de aprovação por parte dos participantes. Esta escala é originalmente formada por
33 itens, porém, neste estudo, foi utilizada a versão brasileira abreviada, composta por 20
itens unifatoriais. Para responder ao questionário o participante deveria marcar V (verdadeiro)
ou F (falso) em cada ítem, de acordo com seu comportamento. Quanto maior a pontuação
obtida, maior a tendência à desejabilidade social.
6.3.4. Procedimento
O pré-teste, o pós-teste e a coordenação das discussões morais, nos dois grupos
experimentais, ficaram sob a responsabilidade da autora desta tese, com o auxílio de um
monitor (que tinha, nos grupos de discussão, a tarefa de registrar tudo o que acontecia). As
discussões ocorreram em encontros semanais de 50 minutos, ao longo de um semestre letivo
(Apêndice V).
Após a seleção dos alunos, foi realizado um encontro com os 24 que iriam participar
dos grupos experimentais. Neste encontro, os alunos foram motivados a participar do projeto
e foi esclarecido que o objetivo das reuniões seria discutir questões morais. Neste primeiro
contato também se expôs a quantidade de encontros a serem realizados (20), o tempo de
duração das “aulas” (50 minutos) e os dias que deveriam acontecer as aulas (sextas-feiras);
assim como, discutiu-se a respeito da importância de não faltar as reuniões, da liberdade de
opinião, do respeito a opinião do outro, do papel do coordenador e do papel dos participantes.
Também, neste primeiro contato, realizou-se uma dinâmica de apresentação. Os
alunos, após serem divididos em dois grandes grupos de 12 (que corresponde as duas
condições experimentais que eles iriam ser submetidos), foram convidados a formarem pares
185
para conversar durante 5 minutos. Para facilitar o diálogo (e para servir como dado adicional
para pesquisadora), após 5 minutos de conversa informal, foi dado um roteiro de “entrevista”
para os participantes, que foram convidados a “entrevistarem” seus pares. Neste roteiro,
estavam explicitadas as seguintes questões: nome, mora com quem, como é na escola (bom ou
mau aluno), o que mais gosta de fazer (hobby) e o que mais gosta de assistir na TV. Em
seguida, com os dados colhidos, mediante conversa informal e a partir do roteiro de
entrevista, cada participante foi convidado a apresentar o (a) colega ao restante do grupo.
Ademais, neste primeiro encontro foram escolhidos os temas que iriam ser debatidos
na intervenção. A escolha dos temas se deu a partir de uma lista que continha 28 temas. É
importante esclarecer que essa lista continha temas que foram sugeridos tanto pela
coordenadora do grupo quanto pelos próprios alunos. Com a lista em mãos, os alunos foram
solicitados a ler todos os temas, e, em seguida, a escolher oito deles que gostariam de discutir,
tendo a informação de que seriam escolhidos apenas os temas mais votados. Os temas
selecionados foram: brigas, delinqüência, roubo, drogas, aborto, ecologia, violência e
adolescência. A este respeito, é relevante mencionar que: (1) os dilemas atrelados a esses
temas encontram-se no Apêndice VI; (2) os dilemas foram apresentados aos participantes,
tanto por meio de textos (Apêndice VI) como por intermédio de filmes e vídeos do Youtube
(Apêndice VII).
Lembrando que a condução dos debates deu-se de acordo com a proposta de
intervenção: na Condição 1 (Técnica “racional-discursiva”), os debates dos dilemas
centraram-se no aspecto cognitivo e seguiram a técnica de Blatt e Kohlberg (1975), já
descrita no tópico denominado “delineamento”; e na Condição 2 (Técnica “racional-afetiva”),
a discussão dos dilemas pautou-se pela proposta já apresentada no tópico denominado
“delineamento”, em que se acrescenta à técnica de Blatt e Kohlberg (1975) exercícios
imaginativos fundamentados em técnicas de psicodrama (Apêndice VIII). Para um melhor
186
detalhamento dos procedimentos adotados nas duas propostas de intervenção, deve-se
consultar o Diário de Campo da autora desta tese, que se encontra no Apêndice IX.
Em relação ao pós-teste, foram realizados os mesmos procedimentos adotados na
aplicação do pré-teste, ou seja, os participantes responderam individualmente aos
instrumentos, em ambiente coletivo de sala de aula. A aplicação durou cerca de 55 minutos e
foi realizada por pesquisadores previamente treinados. Os questionários foram apresentados
de forma randômica (para evitar o efeito de ordem).
Por fim, é importante ressaltar que todos os procedimentos adotados neste estudo
seguiram as orientações previstas na Resolução 196/96 do CNS e na Resolução 016/2000 do
Conselho Federal de Psicologia.
6.3.5. Análise dos dados
Para comparar as médias de desenvolvimento moral e as médias de desenvolvimento
empático dos participantes em função da técnica de intervenção utilizada e da variável sexo
realizou-se uma Profile Analysis (análise multivariada para medidas repetidas). Note-se que
mesmo não fazendo parte do objetivo desse capítulo analisar o desenvolvimento moral e o
desenvolvimento empático em função das variáveis sócio-demográficas, incluiu-se na Profile
Analysis a variável sexo, tendo em vista a possível influência dessa variável sobre o
desenvolvimento empático, observada nos Estudos 1 e 2 desta tese. Quanto às variáveis idade,
escolaridade e religião, não foram consideradas em função da homogeneidade delas na
amostra.
Para a comparação das médias antes e depois relativas ao desenvolvimento moral e ao
desenvolvimento empático, utilizou-se um Teste t para amostras emparelhadas. Também
foram calculadas outras estatísticas descritivas (médias, dispersão, freqüências, porcentagens).
187
Para testar a existência de correlação entre a desejabilidade social e o
desenvolvimento moral e entre a desejabilidade social e o desenvolvimento empático, foram
calculadas correlações de Pearson. Em relação à Escala de Desejabilidade Social de MarlowCrowne (20 ítens), é importante lembrar que alguns itens tiveram suas pontuações invertidas.
Para analisar as entrevistas realizadas após a intervenção foram efetuadas análises de
conteúdo semântico (Bardin, 1977), com a participação de quatro juízes, que trabalharam em
conjunto, com um consenso de, no mínimo, 75%.
6.4. Resultados
6.4.1. Desenvolvimento moral
Considerando os 36 participantes dos três grupos constituintes do estudo quaseexperimental, realizou-se uma Profile Analysis para verificar se as médias dos participantes
diferiam em relação às medidas de desenvolvimento moral e se a técnica de intervenção e o
sexo influenciavam esse desenvolvimento. Nessa análise, considerou-se um fator intra-sujeito
de medidas repetidas, formado pelos escores dos participantes aos dois instrumentos de
desenvolvimento moral (DIT e Dilemas da Vida Real), e duas variáveis independentes
(técnica de intervenção e sexo). Os resultados indicaram que os participantes diferiram em
relação as suas pontuações nas medidas de desenvolvimento moral [Lambda de Wilks=0,34,
F(2,36) = 27,68; p < 0,05] – o teste Post Hoc de Bonferroni revelou diferença significativa
(p<0,01) em relação à média do DIT (M=4,54) e as médias dos dois Dilemas da Vida Real
[Sadam Hussein (M=3,35) e João Hélio (M=3,56)], que, por sua vez, não se diferenciaram
entre si. Constatou-se ainda que a técnica de intervenção influenciou o desenvolvimento
moral [Lambda de Wilks=0,84, F(4,36)=28,32, p < 0,05] – especificamente, de acordo com o
188
teste Post Hoc de Bonferroni, verificou-se que: (1) em relação ao DIT, a média do grupo
submetido à técnica “racional-afetiva” (M=5,17; DP=0,81) se diferenciou significativamente
da média do grupo de controle (M=4,00; DP=0,83); e, a média do grupo submetido à técnica
“racional-discursiva” (M=4,46; DP=0,99) não se diferenciou da média do grupo submetido à
técnica “racional-afetiva”, nem da média do grupo de controle; (2) em relação aos Dilemas da
Vida Real, o grupo de controle obteve a menor média de desenvolvimento moral [tanto no
Caso Sadam Hussein (M=2,55; DP=1,10), quanto no Caso João Hélio (M=2,63; DP=0,96)] e
se diferenciou dos dois grupos experimentais, os quais não se diferenciaram entre si [tanto no
Caso Sadam Hussein (técnica “racional-afetiva”: M=3,88; DP=0,99; técnica “racionaldiscursiva”: M=3,63; DP= 0,84), quanto no Caso João Hélio (técnica “racional-afetiva”:
M=4,33; DP=0,96; técnica “racional-discursiva”: M=3,71; DP=1,08)]. Por fim, os resultados
indicaram que não houve efeitos significativos do sexo ou de sua interação com a técnica de
intervenção em relação ao desenvolvimento moral.
Como um dos principais interesses desta tese foi comparar a eficácia das técnicas de
intervenção em relação ao avanço do desenvolvimento moral, considera-se pertinente fazer
uma análise mais minuciosa dessa variável.
Em relação ao DIT, com o objetivo de verificar se os grupos, de forma isolada,
avançaram em relação aos resultados do pré-teste, realizou-se, para cada condição
experimental, Teste t para amostras emparelhadas. Os resultados demonstraram que, apenas
em relação ao grupo submetido à técnica “racional-afetiva”, houve uma diferença
significativa [t(11) = -3,13; p<0,01] entre a média do pré-teste (M=4,17; DP=1,07) e a do
pós-teste (M=5,17; DP=0,81).
Com o objetivo de compreender melhor como os participantes se distribuíram entre os
estágios, considerando cada técnica de intervenção, tem-se, na Tabela 10, as freqüências e as
porcentagens das respostas ao DIT em função do grupo de intervenção. Note-se que os
189
participantes do grupo submetido à técnica “racional-afetiva” deram respostas sobretudo do
Estágio P; os participantes do grupo submetido a técnica “racional-discursiva” deram
respostas sobretudo dos estágios 4 e P; e os participantes do grupo de controle deram
respostas sobretudo dos estágio 3 e 4.
Tabela 10 – Distribuição dos respondentes por estágios de desenvolvimento moral,
obtidos no DIT (pós-teste), em função do grupo de intervenção
ESTÁGIOS
GRUPOS
3
4
P
F
%
F
%
F
%
“Racional-afetiva”
1
8,3
1
8,3
10
83,3
“Racional-discursiva”
2
16,7
5
41,7
5
41,7
Controle
3
25,0
7
58,3
2
16,7
Em relação ao Dilema de Sadam Hussein, os resultados de Teste t para amostras
emparelhadas, considerando cada condição experimental, revelaram diferenças significativas
apenas em relação aos dois grupos experimentais: no grupo submetido à técnica “racionalafetiva”, a média do pós-teste (M=3,88; DP=0,97) foi significativamente [t(11) = -5,40; p <
0,001] superior a do pré-teste (M=2,55, DP=1,32), o que também aconteceu no grupo
submetido à técnica “racional-discursiva” [t(11) = -3,76; p < 0,005; Pós-teste: M=3,63,
DP=0,86, Pré-teste: M=2,55, DP=1,32]. De forma semelhante, também se constatou no Caso
João Hélio diferenças significativas [t(11) = -6,29; p < 0,001] entre a média do pré-teste
(M=2,63; DP=1,02) e a do pós-teste (M=4,33; DP=0,80) no grupo submetido à técnica
“racional-afetiva” e diferenças significativas [t(11) = -3,76; p < 0,005] entre a média do préteste (M=2,63; DP=1,02) e a do pós-teste (M=3,71; DP=0,86) no grupo submetido à técnica
de intervenção “racional-discursiva”.
190
Para uma constatação, em uma instância descritiva, da distribuição dos participantes
entre os estágios obtidos nos Dilemas da Vida Real, na Tabela 11 encontram-se as
freqüências e as porcentagens de adesão as categorias de respostas elencadas no referido
dilema, considerando os grupos de intervenção: note-se que os participantes do grupo
submetido à técnica “racional-afetiva” deram respostas sobretudo dos Estágio 3 (Outra
punição) e 5 (Direito a vida); os participantes do grupo submetido à técnica “racionaldiscursiva” deram respostas sobretudo dos estágios 3 (Outra punição) e 4/5/1 (Proteção à
sociedade); e os participantes do grupo de controle deram respostas sobretudo dos estágios
1/2 (Lei de Talião) e 3 (Outra punição).
E, na Tabela 12 encontram-se os resultados da adesão dos participantes às diferentes
categorias de respostas elencadas no Dilema de João Hélio, em função do grupo de
intervenção: note-se que os participantes do grupo submetido à técnica “racional-afetiva”
deram respostas sobretudo do estágio 5 (Visão social do crime); os participantes do grupo
submetido a técnica “racional-discursiva” deram respostas sobretudo do estágio 4 (Visão
preventiva da punição); e os participantes do grupo de controle deram respostas sobretudo do
estágio 4/1 (Visão negativa da lei).
Tabela 11 – Distribuição dos respondentes por estágios de desenvolvimento moral,
obtidos no Dilema de Sadam Hussein (pós-teste), em função do grupo de intervenção
CATEGORIAS
GRUPOS
Lei de Talião
Justiça
Outra
Proteção a
Divina
Punição
sociedade
(4/1)
(3)
(4/5/1)
(1/2)
Direito a Vida
(5)
F
%
F
%
F
%
F
%
F
%
“Racional-afetiva”
0
0,0
0
0,0
5
41,7
2
16,7
5
41,7
“Racional-discursiva”
0
0,0
0
0,0
4
33,3
5
41,7
3
25,0
Controle
5
41,7
1
8,3
3
25,0
2
16,7
1
8,3
191
Tabela 12 – Distribuição dos respondentes por estágios de desenvolvimento moral,
obtidos no Dilema de João Hélio (pós-teste), em função do grupo de intervenção
CATEGORIAS
GRUPOS
Tem que
pagar
(1/2)
Visão
Punição relac. Visão negativa
preventiva da
da lei
a consciência
punição
(3/1)
(4/1)
(4)
Visão social
do crime
(5)
“Racional-afetiva”
F
0
%
0,0
F
0
%
0,0
F
2
%
16,7
F
3
%
25,0
F
7
%
58,3
“Racional-discursiva”
0
0,0
1
8,3
3
25,0
5
41,7
3
25,0
Controle
1
8,3
3
25,0
6
50,0
1
8,3
1
8,3
6.4.2. Empatia
Para investigar se as médias dos respondentes diferiam em relação às medidas de
desenvolvimento empático e se o tipo de intervenção e o sexo afetavam esse desenvolvimento
realizou-se uma Profile Analysis, com um fator intra-sujeito de medidas repetidas (formado
pelos escores dos participantes aos dois instrumentos de desenvolvimento empático – EEG e
IRI) e com duas variáveis independentes (técnica de intervenção e sexo). Foi observado que
os participantes diferiram em termos das pontuações nas sub-escalas [Lambda de Wilks=0,05,
F(6,36) = 73,36; p<0,001].Constatou-se ainda que a técnica de intervenção influenciou o
desenvolvimento empático [Lambda de Wilks=0,24, F(12,36) = 4,41, p<0,001].
Especificamente, a partir do Post Hoc de Bonferroni, observou-se que: (1) em relação ao
componente Empatia com grupos minoritários, o grupo submetido à técnica “racionalafetiva” obteve a maior média (M=4,68; DP=0,24) e se diferenciou tanto do grupo submetido
à técnica “racional-discursiva” (M=4,32; DP=0,32), quanto do grupo de controle (M=4,29;
DP=0,36), porém esses últimos não se diferenciaram entre si; (2) no que se refere, de forma
mais específica, ao componente Empatia com animais, o grupo submetido à técnica “racionalafetiva” (M=4,23; DP=0,39) se diferenciou do grupo de controle (M=3,78; DP=0,31), mas
não se diferenciou do grupo submetido à técnica “racional-discursiva” (M=4,02; DP=0,31), o
192
qual não se diferenciou do grupo de controle; (3) no que tange ao componente Empatia com
trabalhadores, o grupo submetido à técnica “racional-afetiva” obteve a maior média
(M=4,20; DP=0,31), diferenciando-se significativamente do grupo submetido à técnica
“racional-discursiva” (M=3,70; DP=0,29), que, por sua vez, obteve média mais alta do que o
grupo de controle (M=3,23; DP=0,64); (4) em relação ao componente Empatia com
“apenados”, o grupo submetido à técnica “racional-afetiva” (M=3,77; DP=0,46) obteve uma
média mais alta do que a do grupo de controle (M=2,59; DP=0,50), mas não se diferenciou da
média do grupo submetido a técnica “racional-discursiva” (M=3,22; DP=0,50), o qual não se
diferenciou do grupo de controle; (5) em relação a sub-escala Consideração Empática, o
grupo submetido a técnica “racional-afetiva” obteve a maior média (M=4,32; DP=0,33) e se
diferenciou tanto do grupo submetido à técnica “racional-discursiva” (M=3,91; DP=0,34)
quanto do grupo de controle (M=3,58; DP=0,48), esses últimos não se diferenciaram entre si;
(6) no que se refere a sub-escala Tomada de Perspectiva, o grupo submetido a técnica
“racional-afetiva” (M=4,15; DP=0,47) se diferenciou do grupo de controle (M=3,63;
DP=0,49), mas não se diferenciou do grupo submetido à técnica “racional-discursiva”
(M=3,94; DP=0,47), o qual não se diferenciou do grupo de controle; (7) em relação a subescala Angústia pessoal não se observou diferenças entre os grupos de intervenção [“racionalafetiva” (M=3,31;DP=0,27); “racional-discursiva” (M=3,40; DP=0,32); controle (M=3,42;
DP=0,47)]. Ademais, não foram verificados efeitos significativos do sexo ou de sua interação
com a técnica de intervenção em relação ao desenvolvimento empático.
Com o objetivo de comparar as respostas dos participantes em relação à EEG no pré e
no pós-testes foram realizados Testes t para amostras emparelhadas para cada condição
experimental. Os resultados demonstraram que houve diferenças significativas entre as
médias do pré-teste e do pós-teste no grupo submetido à técnica “racional-afetiva” e no grupo
submetido à técnica “racional-discursiva”, mas não houve diferenças significativas no grupo
193
de controle. Note-se, na Tabela 13, que apenas em relação ao componente Empatia com
grupos minoritários no que se refere ao grupo submetido à técnica “racional-discursiva” não
houve diferença significativa.
Tabela 13 – Comparação de médias obtidas, pelos grupos experimentais, no pré e no
TÉCNICA “RACIONALAFETIVA”
pós-testes em relação aos componentes da EEG
COMPONENTE
TESTES
N
Média
Correlação
Estatística
P
Grupos
Pré-teste
12
4,35
0,71
t = -5,09
0,000
minoritários
Pós-teste
12
4,68
Pré-teste
12
3,67
Pós-teste
12
4,23
Pré-teste
12
3,24
Pós-teste
12
4,20
Pré-teste
12
2,87
Pós-teste
12
3,77
Pré-teste
12
4,26
Pós-teste
12
4,32
Pré-teste
12
3,85
Pós-teste
12
4,02
Pré-teste
12
3,08
Pós-teste
12
3,70
Pré-teste
12
2,93
Pós-teste
12
3,22
Animais
Trabalhador
Apenados
Grupos
TÉCNICA “RACIONALDISCURSIVA”
Minoritários
Animais
Trabalhador
Apenados
gl = 11
0,63
t = -6,08
0,000
gl = 11
0,83
t = -8,03
0,000
gl = 11
0,84
t = -11,64
0,000
gl = 11
0,93
t = -1,47
n.s.
gl = 11
0,89
t = -3,25
0,008
gl = 11
0,00
t = -4,62
0,001
gl = 11
0,98
t = -7,34
0,000
gl = 11
Também se realizou Testes t para amostras emparelhadas para cada condição
experimental, com o objetivo de comparar as respostas dos participantes ao IRI no pré e no
pós-testes. Os resultados indicaram que houve diferenças significativas entre as médias do
pré-teste e do pós-teste, tanto no grupo submetido à técnica “racional-afetiva” quanto no
194
grupo submetido à técnica “racional-discursiva”, mas não houve diferenças significativas no
grupo de controle. Note-se, na Tabela 14, que na comparação das medidas antes e depois não
houve diferença significativa apenas em relação à sub-escala Angústia Pessoal no que se
refere ao grupo submetido à técnica “racional-discursiva”.
Tabela 14 – Comparação de médias obtidas, pelos grupos experimentais, no pré e no
TÉCNICA “RACIONALDISCURSIVA”
TÉCNICA “RACIONALAFETIVA”
pós-testes em relação às sub-escalas do IRI
COMPONENTES
TESTES
N
Média
Correlação
Estatística
P
Consideração
Pré-teste
12
3,62
0,80
t = -9,87
0,000
Empática
Pós-teste
12
4,32
Tomada de
Pré-teste
12
3,48
Perspectiva
Pós-teste
12
4,15
Pré-teste
12
3,16
Pós-teste
12
3,31
Consideração
Pré-teste
12
3,74
Empática
Pós-teste
12
3,91
Tomada de
Pré-teste
12
3,43
Perspectiva
Pós-teste
12
3,94
Pré-teste
12
3,33
Pós-teste
12
3,40
Angústia Pessoal
Angústia Pessoal
gl = 11
0,92
t = -12,15
0,000
gl = 11
0,83
t = -3,20
0,008
gl = 11
0,93
t = -15,01
0,000
gl = 11
0,77
t = -5,87
0,000
gl = 11
0,89
t = -1,56
n.s.
gl = 11
6.4.3. Desejabilidade social
Para testar a existência de correlação entre a desejabilidade social e o desenvolvimento
moral e entre a desejabilidade social e o desenvolvimento empático, utilizou-se a correlação
de Pearson. Os resultados indicaram que do conjunto de instrumentos testados, apenas houve
correlação significativa (negativa) entre o construto desejabilidade social e o instrumento
denominado Dilemas da Vida Real [Caso Sadam Hussein (r=-0,45; p<0,01); Caso João (r=195
0,35; p<0,05)] e entre o construto desejabilidade social e componente Tomada de perspectiva
do outro (r=-0,40; p<0,05) do IRI. Isto significa dizer que os adolescentes que apresentaram
maior pontuação em desejabilidade social, isto é, aqueles que procuram ser mais agradáveis,
politicamente corretos ou socialmente aceitos, apresentaram menores estágios de
desenvolvimento moral (verificados por intermédio dos Dilemas da Vida Real) e menores
médias de tomada de perspectiva do outro.
É relevante acrescentar que resultados de uma ANOVA revelaram que não houve
diferença significativa entre as médias obtidas na Escala de Desejabilidade Social de MarlowCrowne, considerando a técnica de intervenção utilizada (F(2, 33) = 0,23; n.s.): controle
(M=11,00; DP=1,81), técnica “racional-discursiva” (M=11,33; DP =1,72) e técnica “racionalafetiva” (M =11,50; DP =1,97).
6.4.4. Efeito da intervenção segundo a opinião dos participantes
A seguir serão apresentados os resultados das entrevistas realizadas com os
participantes dos dois grupos experimentais acerca das suas opiniões em relação ao efeito da
intervenção em suas vidas. Esses resultados foram organizados em três eixos que versavam
respectivamente sobre o pensar, o sentir e o se comportar em relação a questões morais.
a) Pensar questões morais
Todos os participantes do grupo submetido à técnica “racional-discursiva” (TRD)
afirmaram ter percebido mudanças na sua forma de pensar questões morais, o que também
aconteceu no grupo submetido à técnica “racional-afetiva” (TRA), e, quando questionados
sobre que mudanças seriam essas, as respostas dos participantes, submetidos tanto a TRD,
quanto a TRA, se distribuíram de forma semelhante entre as diferentes categorias, com
196
exceção da última categoria, denominada “Penso como o outro”, que não apareceu em relação
a TRD (Quadro 7).
Quadro 7. Categorias, exemplos e freqüências de respostas a questão “Depois que você
entrou no projeto de intervenção, você consegue perceber alguma mudança na sua
forma de pensar questões morais?”
Categorias
Exemplos de Respostas
TRD
TRA
5
5
4
3
3
2
Eu agora tenho uma frase comigo: “E se fosse eu no lugar
dele” (TRA)
0
2
-----------------------------------------------------------
12
12
Eu penso diferente sobre vários assuntos. Tipo sobre aborto.
(TRD)
Mudei de opinião
Eu mudei muitas opiniões que eu tinha, tá ligado? Os presos...
eu tenho é pena de alguns deles, antes eu tinha é ódio de todos.
(TRA)
Agora, tudo o que escuto é um dilema para mim. (TRD)
Tudo é um dilema
Vejo um dilema em tudo. (TRA)
Debato os Dilemas
Penso
outro
Total
como
o
Agora tenho argumentos para discutir com os meus amigos.
Pareço mais um advogado. Me desenvolvi bastante aqui. (TRD)
Quando passa alguma coisa na TV, já levanta a discussão em
casa. Mas, o povo lá de casa é cego como eu era. (TRA)
Eu agora fico pensando como o outro pensa. (TRA)
b) Sentir questões morais
A questão “Depois que você entrou no projeto de intervenção, você consegue perceber
alguma mudança na sua forma de sentir questões morais? (...)” parece que, da forma que foi
elaborada, não foi muito bem compreendida pelos participantes, sobretudo por aqueles do
grupo submetido à TRD: 6 participantes do grupo submetido à TRD e 2 do grupo submetido à
TRA “fugiram da pergunta” (o que foi interpretado como sendo fruto da incompreensão da
pergunta). Note-se também que a categoria denominada “Sinto como o outro” representou
apenas as respostas dos participantes do grupo submetido à TRA (Quadro 8).
197
Quadro 8. Categorias, exemplos e freqüências de respostas à questão “Depois que você
entrou no projeto de intervenção, você consegue perceber alguma mudança na sua
forma de sentir questões morais?”
Categorias
Exemplos de Respostas
TRD
TRA
5
6
6
2
0
4
11
12
Eu estou mais sensível as coisas que vejo na TV, os problemas
dos outros, os filmes que vejo, sempre analiso o conflito do
personagem. (TRD)
Mais sensível
Fugiu da pergunta
Talvez eu esteja mais sensível. Vejo as pessoas sofrendo e isto
me toca. Até um menino pedindo esmola, mas fico no conflito se
ajudo ou não. Tudo agora é conflito. É que tem o lado bom e o
ruim de ajudar. (TRA)
Eu agora penso diferente. Vivo em conflito, como eu já disse na
outra questão. (TRD)
Eu sei que mudei. Até nas aulas estou mais quieto. To agindo
diferente. (TRA)
Agora eu tento sentir o que o outro está sentindo. (TRA)
Sinto como o outro
Total
Num tem aquela frase que sempre diz depois das dinâmicas:
“como foi se colocar no lugar de...” Aí é assim... to brigando
com minha mãe... aí vem a voz e eu paro, porque eu sinto o que
ela sente. Não sei explicar. (TRA)
--------------------------
c) Comportamentos morais
Na questão relacionada à mudança de comportamento, quatro participantes do grupo
submetido à TRD e três do grupo submetido à TRA afirmaram não ter mudado seus
comportamentos. Aqueles que disseram que mudaram, tiveram suas respostas distribuídas em
duas categorias: “Mais comportado” e “Mais altruísta” (Quadro 9).
198
Quadro 9. Categorias, exemplos e freqüências de respostas à questão “Depois que você
entrou no projeto de intervenção, você consegue perceber alguma mudança na sua
forma de se comportar?”
Categorias
Mais comportado
Mais altruísta
Total
Exemplos de Respostas
Eu estou mais comportado na escola, em casa também. (TRD)
Eu estou mais quieto. O legal daqui é que eu posso falar. (TRA)
Estou mais preocupado com os problemas dos outros e tento
fazer alguma coisa pelas pessoas mais pobres. (TRD)
Estou tentando ajudar mais as pessoas. Dei a idéia ao Pastor
para arrecadarmos alimentos. (TRA)
-----------------------------------------------------------
TRD
TRA
3
3
5
6
8
9
6.4.5. Diário de Campo
Nesta seção serão realizados alguns comentários acerca do Diário de Campo da autora
desta tese, que se encontra no Apêndice IX. Inicialmente, é importante esclarecer que as
anotações do Diário foram realizadas no mesmo dia dos encontros, tendo como ferramenta
um documento do Word de um note-book, que foi utilizado como um lugar de registro dos
principais acontecimentos, percepções e sentimentos da pesquisadora em relação a cada dia de
intervenção. Infelizmente, em função da não gravação dos encontros (por pedido de alguns
participantes), não existe o registro detalhado das falas dos alunos, o que impossibilita uma
análise desses discursos. Neste sentido, o foco desta análise se limitará as considerações
diárias da autora desta tese, que devem ser percebidas apenas como suposições e sentimentos
oriundos de uma experiência isolada, que, neste sentido, não possuem nenhuma pretensão
conclusiva. Após esses esclarecimentos, serão listados alguns comentários que deverão ser
testados em pesquisas futuras:
- De acordo com relatos do diário de campo, os alunos que disseram em seus discursos que
eram estudiosos são exatamente aqueles que revelaram um maior desenvolvimento moral no
199
pré-teste e os que disseram não gostar de estudar foram os que apresentaram um menor estágio
de desenvolvimento moral. Qual o significado disso?
- Foi constatado, que a aplicação da lei da retaliação parece ser contextual. Quando o dilema
relacionado ao tema “briga” envolveu pares (colegas), eles demonstraram ser mais agressivos.
Mas, quando o dilema envolveu um casal adulto, alguns deles mudaram de opinião dizendo
que o caminho não era aquele.
- A partir da experiência desta intervenção, considera-se pertinente que, em outras
intervenções, a ordem dos temas seja melhor planejada. Temas com dilemas morais mais
consensuais devem vir antes dos que possuem dilemas morais mais polêmicos.
- O vídeo é uma ferramenta interessante para mobilizar sentimentos humanos. Por outro lado,
eles precisam ser utilizados com muita cautela, pois eles podem até atrapalhar a promoção do
desenvolvimento moral quando não conduzidos da forma correta. O vídeo pode trazer
sentimentos como revolta, raiva e ódio, que podem conduzir as pessoas a terem pensamentos
morais bastante primitivos.
- Uma ferramenta interessante para outras intervenções é o uso de documentários. O fato de
ouvir pessoas reais em situações reais tem um peso emocional diferente dos filmes que
apresentam histórias fictícias.
- A literatura pertinente aponta que para que se crie conflito nas estruturas de raciocínio moral
é necessário que o facilitador consiga identificar, em cada momento, qual é o estágio que
aparece na discussão para poder expor o participante a um estágio superior. Mas, nem sempre
é possível conseguir esta façanha, sobretudo quando se lida com falas que traduzem o
raciocínio moral de vários estágios;
- Uma das maiores dificuldades para lidar com o grupo submetido à intervenção “racionalafetiva” foi a questão do tempo. Ter que aplicar duas técnicas em 50 minutos não foi fácil.
Mas, por outro lado, a técnica de psicodrama não suplantou o debate; pelo contrário, o tornou
até mais estimulante para alguns alunos.
- Em relação às questões atreladas a justiça retributiva, é curioso notar que os participantes do
estágio 3 demonstraram maior disponibilidade para evoluir moralmente do que os do estágio
200
4; de forma semelhante, os participantes do grupo submetido a técnica “racional-afetiva”
foram mais susceptíveis a mudança de pensamento do que o grupo submetido a técnica
“racional-discursiva”. Esses dados parecem revelar que os afetos são benéficos para promoção
de desenvolvimento moral atrelado a questões retributivas.
6.5. Discussão parcial
A principal hipótese de trabalho defendida nesta tese foi a de que uma intervenção
moral pautada em aspectos afetivos e cognitivos (“racional-afetiva”) seria mais eficaz que
uma intervenção voltada para o desenvolvimento moral dentro de uma perspectiva puramente
cognitivista (“racional-discursiva”), pois, julgava-se, assim como Hoffman (2003), que a
empatia funciona como um estimulador da elaboração e manifestação de princípios morais.
De acordo com o conjunto de análises realizadas a partir do instrumento denominado DIT esta
hipótese foi confirmada. Na análise dos resultados relativos ao DIT, alguns dados chamam a
atenção. É interessante constatar, por exemplo, que não houve diferença significativa entre as
médias antes e depois do grupo submetido à intervenção “racional-discursiva”. Este resultado
vem sendo encontrado em outros estudos (Correia, 2007; Nepomuceno, 2000; Wanderley,
1987) e tem sido atribuído ao curto espaço de tempo destinado as intervenções. Por outro
lado, como explicar a eficácia da técnica “racional-afetiva” que foi desenvolvida no mesmo
período de tempo da “racional-discursiva”? Os afetos empáticos teriam o poder de acelerar o
desenvolvimento do raciocínio moral? Considerando as ponderações de Pizarro (2000) e de
Hoffman (1990), a resposta para essa última questão seria sim. Na perspectiva desses autores
as emoções beneficiariam o desenvolvimento do raciocínio moral na medida em que atuariam
como um agente catalisador, levando o indivíduo a concentrar sua atenção no problema e no
princípio moral a ser utilizado. Também chama a atenção nos resultados, o fato de cerca de
201
83% dos participantes do grupo submetido à técnica “racional-afetiva” encontrarem-se, após a
intervenção, no estágio P. Esta evolução é considerada por Biaggio (1983) um fato
socialmente relevante, na medida em que, levar jovens a raciocinar de forma pósconvencional significa promover o raciocínio crítico, capacitar o questionamento do status
quo e, conseqüentemente, provocar mudanças sociais. Também acerca dessa evolução para o
estágio P, verificou-se, contrariamente a Kohlberg (1969), e conforme Camino (2009), a partir
de pesquisas realizadas sob sua orientação (Lins & Camino, 1993; Rique & Camino, 2007),
acerca da transição de um estágio para outro, que é possível os participantes avançarem mais
de dois estágios de desenvolvimento moral em um período relativamente curto.
Contudo, esses resultados devem ser vistos com uma certa reserva, pois resultados
referentes a avaliação feita com o instrumento Dilemas da Vida Real não revelaram uma
diferenciação entre a média do grupo submetido à técnica “racional-discursiva” e a média do
grupo submetido à técnica “racional-afetiva”. Por outro lado, os resultados descritivos,
relacionados aos Dilemas da Vida Real, conduzem a suposição de que, se a amostra fosse
maior, com esse instrumento se verificaria uma diferença significativa entre os tipos de
intervenção, e, mais do que isto, existiria uma superioridade da intervenção “racional-afetiva”
em detrimento da “racional-discursiva”.
Sobre as análises descritivas, é interessante observar que tanto no caso do dilema sobre
Sadam Hussein, quanto no caso do dilema sobre João Hélio, os participantes do grupo
submetido à técnica “racional-afetiva” tenderam a supervalorizar o Estágio 3 e o Estágio 5,
enquanto os participantes do grupo submetido a técnica “racional-discursiva” a supervalorizar
o 4, o que faz sentido, pois os afetos empáticos devem beneficiar mais um raciocínio do
estágio 3 (relacionado a afetividade) e um raciocínio do estágio 5 (que pode ressaltar o
cuidado com o outro, só que nesse caso, dentro de uma perspectiva mais coletivista), do que
um raciocínio do estágio 4 (que supervaloriza a lei), que, por sua vez, deve ser mais
202
favorecido por uma discussão racional. Também as análises descritivas demonstram um certo
relativismo do julgamento moral, o que contraria pressupostos kohlberguianos.
No que se refere ao desenvolvimento empático, de um modo geral, constatou-se que o
grupo submetido à técnica “racional-afetiva” foi mais eficaz na promoção de afetos empáticos
do que o grupo submetido à técnica “racional-discursiva” e do que o grupo de controle. A
eficácia do desenvolvimento empático favorecida por uma técnica voltada para a promoção de
afetos empáticos já foi comprovada por outros autores (Day, 2002; Falcone, 1999; Frare et al.,
2005; Tsai & Kaufman, 2009). Mas, o que dizer da eficácia do desenvolvimento empático
promovida por uma técnica pautada no desenvolvimento do raciocínio moral (“racionaldiscursiva”)? Piaget (1977) diria que afetividade e cognição são aspectos inseparáveis que se
influenciam mutuamente, e, Kohlberg (1971) afirmaria que o desenvolvimento de disposições
mentais reflete mudanças tanto nas perspectivas cognitivas quanto nas afetivas. Note-se, por
outro lado, que a eficácia da técnica “racional-discursiva” não foi comprovada em relação a
todos os componentes: na comparação entre as médias do pré-teste e do pós-teste não houve
diferença significativa em relação ao componente da EEG denominado Empatia com grupos
minoritários e em relação ao componente do IRI denominado Angústia pessoal.
Em relação a não promoção do aumento da Empatia com grupos minoritários pela
intervenção “racional-discursiva”, poder-se-ia julgar que isso ocorreu devido ao fato dos
escores médios de empatia a essa dimensão no pré-teste terem sido elevados; contudo, isso
não impediu que o grupo submetido à intervenção “racional-afetiva” obtivesse escores
significativamente diferentes entre o pré-teste e o pós-teste.
Sobre a Angústia pessoal, alguns autores (Davis, 1980; Escrivã, Navarro & Garcia,
2004; Pérez-Albéniz et al., 2003) explicariam o não aumento da média dessa sub-escala,
obtidos nesta tese, em relação ao pré-teste e pós-teste, como algo positivo, tendo em vista que
este sentimento, para eles, revelaria uma experiência egocêntrica do pesquisado. Apoiando a
203
visão desses autores, Williams et al. (2006) observaram uma correlação negativa entre os
escores dos estágios mais elevados do desenvolvimento moral, verificado por intermédio do
DIT-2, e a Angústia pessoal, verificada pelo IRI. Porém, em estudos brasileiros com o IRI,
Ribeiro, Koller e Camino (2002) e Sampaio (2007) têm encontrado correlações positivas entre
Angústia pessoal e as outras sub-escalas de Davis, o que parece indicar que no Brasil esse
sentimento tem um significado teórico diferente daquele previsto por Davis (1980) e por
Hoffman (1990, 1991), que deve ser analisado mais pormenorizadamente por meio de outras
pesquisas.
Sobre o desempenho do grupo de intervenção “racional-afetiva”, em relação ao
desenvolvimento empático, percebem-se avanços em relação a todos os componentes das
duas escalas utilizadas quando se compara as medidas antes e depois, o que inclui a Angústia
pessoal. Este é um fato que merece ser comprovado por meio de outras pesquisas.
Ainda se considera relevante comentar acerca dos resultados obtidos pelo grupo de
controle. Note-se que este grupo não demonstrou avanços significativos nem em relação ao
desenvolvimento moral, nem em relação ao desenvolvimento empático, o que revela que a
forma que a escola pesquisada tem trabalhado o desenvolvimento moral não tem tido eficácia.
Existindo, inclusive, resultados de regressões de um estágio para outro, o que contraria a idéia
kohlberguiana acerca da transição dos estágios.
Note-se que a interpretação de todos os dados empíricos feita até agora poderia ser
invalidada caso houvesse uma distorção das respostas por parte dos participantes em função
da sua desejabilidade social. A este respeito, Schwartz, Verkasalo, Antonovsky e Sagiv
(1997) alertam que esta variável deve ser verificada, sobretudo em pesquisas que usam
instrumentos que avaliam valores humanos por intermédio de auto-relato, considerando que
pessoas com grande quantidade de respostas positivas a itens socialmente aceitáveis podem
dissimular sua resposta real com relação a esses valores. Entretanto, os resultados obtidos,
204
nesta tese, referente à correlação de Pearson, realizada entre o questionário de desejabilidade
social e os valores morais, indicaram que os adolescentes que apresentaram maior pontuação
em desejabilidade social apresentaram maiores escores nos estágios baixos de
desenvolvimento moral (verificados por intermédio dos Dilemas da Vida Real) e menores
escores na tomada de perspectiva do outro.
Outro fator que motivou a investigação da influência da desejabilidade social sobre as
respostas dos respondentes aos instrumentos utilizados foi o convívio, no decorrer de um
semestre, entre a autora desta tese e os grupos experimentais. Porém, os resultados de uma
ANOVA revelaram que não houve diferença significativa entre as médias de desejabilidade
social entre os diferentes grupos, o que significa dizer que os resultados da desejabilidade
social não foram influenciados pela convivência com a pesquisadora.
Em relação à entrevista realizada com os participantes sobre suas opiniões em relação
ao efeito da intervenção em suas vidas, foi quase consensual o comentário de que a
intervenção promoveu mudanças, que se refletiram na sua forma de pensar, sentir e se
comportar em relação a temas morais.
Sobre as mudanças na forma de pensar, alguns relatos indicaram mudanças de
raciocínio acerca de determinados temas, como aborto e sistema prisional. A este respeito é
importante comentar que o objetivo da intervenção moral não foi doutrinar os alunos
impondo-lhes valores, mas ajudá-los a pensar de forma ampla e autônoma, tendo como base
critérios de juízo mais generalizáveis.
Outros relatos, acerca das mudanças na forma de pensar questões morais, indicaram
que a intervenção propiciou a alguns participantes a capacidade de debater dilemas morais
com outras pessoas, como amigos e familiares, conforme pode ser constatado na fala de um
dos alunos: “Quando passa alguma coisa na TV, já levanta a discussão em casa. Mas, o povo
lá de casa é cego como eu era”. A este respeito, observa-se que Alexander (1980), ao
205
proporcionar a um grupo de adolescentes a oportunidade de dirigir discussões morais com
estudantes mais jovens, supervisionados por um professor especializado no tema, percebeu
essa técnica como sumamente importante para o desenvolvimento de todos os participantes.
Sobre o fato de alguns adolescentes mencionarem que depois da intervenção tudo
passou a ser um dilema, foi realizado um encontro extra para propiciar-lhes um espaço para
falar sobre seus sentimentos em relação a esses conflitos. Note-se que uma intervenção moral,
pode ser, conforme lembra García-Ros, Collado e Pérez-Delgado (1991), palco de diferentes
sentimentos que precisam ser observados pelo facilitador do grupo.
Em relação à mudança na forma de sentir questões morais, alguns relatos indicaram
um aumento da sensibilidade e outros relatos (exclusivos dos alunos submetidos à técnica
“racional-afetiva”) um aumento da capacidade de role-taking. Com relação ao aumento da
sensibilidade moral, La Taille (2006) a considera como sendo necessária a ação moral e
acrescenta que a falta de sensibilidade moral poderia levar a ações imorais ou, no mínimo,
inadequadas. Com respeito ao aumento da capacidade de role-taking, acredita-se, conforme as
constatações de Serrano (2002), que as incorporações de papéis vivenciadas pelos alunos do
grupo submetido à técnica “racional-afetiva” tenham facilitado o aumento do role-taking.
No que se refere à mudança na forma de se comportar, a maioria dos participantes se
percebeu como mais altruístas. Acredita-se, assim como Díaz-Aguado e Medrano (1999), que
existe uma relação entre juízo moral e conduta altruísta: na medida em que o pensamento dos
sujeitos se aproxima do nível pós-convencional aumenta a consistência entre juízo moral e
conduta moral.
Quanto à relação entre desenvolvimento moral e desenvolvimento acadêmico,
mencionada no Diário de Campo, verificou-se que os alunos apontados pelos colegas e por
eles próprios como estudiosos foram os que apresentaram melhor desenvolvimento moral.
Esta relação pode ser, talvez, explicada pela inteligência (Camino, 1979). Entretanto, é
206
possível que outras variáveis, como escolarização, conhecimento e responsabilidade,
expliquem essa relação.
No que se refere à observação registrada no Diário de Campo de que o julgamento
moral é situacional, ou seja, sujeito a um processo de avaliação que depende dos personagens
envolvidos, tem-se o estudo de Distéfano et al. (2005) que apóia essa idéia. As autoras
constataram que estudantes entre 8 e 18 anos eram mais favoráveis, independente da idade, a
ajudar um jovem que havia cometido um crime a ser defendido em um tribunal, quando esse
era brasileiro, do que quando era estrangeiro. Existem também outros estudos, como o de
Haidt, Koller e Dias (1993) e o de Turiel (1983), que apontam para a relatividade no
julgamento moral e corroboram essa observação.
Outros registros do Diário de Campo relacionaram-se ao próprio processo de
intervenção. Em relação ao planejamento dos temas da intervenção, considera-se pertinente
que seja obedecido na discussão dos dilemas um certo grau de complexidade em relação aos
conflitos dos dilemas: sugere-se que os dilemas mais consensuais, que despertem menos
preconceito, venham antes dos dilemas mais polêmicos, que despertam mais preconceito. Para
investigar essa idéia, recomenda-se que sejam realizadas pesquisas que esclareçam que
dilemas podem favorecer e/ou dificultar o raciocínio moral do grupo e pesquisas que testem a
ordem de apresentação desses dilemas.
Quanto ao uso do vídeo, julga-se que de fato, como indicado por Serrano (2002), este
recurso é uma ferramenta interessante para a promoção do desenvolvimento moral. Contudo,
conforme problematiza Alves (2001), “não é o filme na escola que provoca mudanças, mas o
uso que se faz dele, como é encarado, demonstrado através da postura do professor frente à
escolha, análise e relacionamento com seus alunos e com a instituição escolar como um todo”
(p. 135).
207
Sobre os documentários com personagens reais terem provocado, segundo registros do
Diário de Campo, maior mobilização emocional comparados aos filmes com personagens
fictícios, acredita-se que uma explicação plausível esteja na mesma direção do debate, já
realizado nesta tese, em torno dos efeitos emocionais de um dilema da vida real e de um
dilema fictício. Mas, a preocupação de Alves (2001) descrita acima também se aplica neste
contexto – não é o documentário, por si só, que provoca mudanças, mas a forma com que ele
é utilizado. Pois, da mesma maneira que um documentário tem o poder de conduzir os
participantes a reflexões morais mais amplas, ele também pode se tornar um empecilho para o
avanço moral, dependendo do conteúdo das histórias trazidas e da forma como elas são
trabalhadas.
A dificuldade, mencionada no Diário de Campo, para reconhecer o estágio de
desenvolvimento moral do participante no momento em que ele fala, também foi verificada
por Fraenkel (1978, citado por Díaz-Aguado & Medrano, 1999) e por Napier (1978, citado
por Díaz-Aguado & Medrano, 1999).
Sobre a dificuldade, comentada no Diário de Campo, em lidar com o tempo de
aplicação da técnica “racional-afetiva”, que envolve dois tipos de intervenção em uma única
sessão (uma voltada para a discussão de dilemas morais e outra para a sensibilização
empática), sabe-se que a ampliação do horário da sessão é algo desejável, porém inviável em
função das outras necessidades da escola. Uma solução possível seria realizar a intervenção
moral durante todo o ano letivo, conforme orienta os PCNs, ao invés de realizá-la em um
semestre apenas. Isto também seria aconselhável para o uso da técnica “racional-discursiva”,
pois, os participantes dos estudos de Rique e Camino (1997), Lins e Camino (1993) e Dias
(1992) apresentaram avanços em seus julgamentos, com o uso dessa técnica, em um período
de dois semestres letivos.
208
Sobre a constatação, mencionada no Diário de Campo, de que houve resistência dos
participantes do estágio 4 para avançar para o estágio 5 e a avaliação pouco aprofundada de
que alguns participantes do estágio 3 avançaram direto para o estágio 5, deve-se ter em conta
a afirmação de Eckensberger (1984) de que existem elementos em comum entre o estágios 3
(bom garoto) e 5 (contrato democrático), e entre os estágios 1 (punição e autoridade) e 4 (lei e
ordem). Apoiando a idéia de avanço para estágios não imediatamente superiores, Dias (1999)
e Lins e Camino (1993) observaram avanços, promovidos por intervenções morais segundo a
técnica de Blatt e Kohlberg (1975), do estágio 3 para o estágio 5 no período de um ano.
209
CAPÍTULO VII – DISCUSSÃO GERAL E CONSIDERAÇÕES FINAIS
210
Inicialmente, considera-se relevante tecer alguns comentários acerca dos dois
instrumentos criados e validados. Em linhas gerais, julga-se que os referidos instrumentos
trazem contribuições significativas para a área de estudos sobre o desenvolvimento moral e
sobre a empatia.
Especialmente em relação ao instrumento denominado Dilemas da Vida Real, julga-se
que, devido aos sentimentos negativos provocados nos telespectadores pela mídia diante das
notícias sobre Sadam Hussein e sobre o responsável pela morte de João Hélio, os participantes
elaboraram estágios demasiadamente primitivos ao avaliarem as questões de justiça e da
maioridade penal referentes aos dilemas envolvendo esses personagens. Porém, mesmo
achando que o impacto da mídia sobre os participantes pode ter influenciado seus
julgamentos, considera-se que este deve ser o tipo de julgamento das pessoas frente às
violências vistas como graves no Brasil. Por outro lado, talvez, só um instrumento que
pudesse averiguar pensamentos morais mais primitivos pudesse, de fato, ajudar a
compreender melhor o raciocínio moral dos participantes, a propor discussões mais
compatíveis com suas formas de ver a justiça e a fazer uma avaliação mais realista dos
benefícios da intervenção.
Outro ponto crítico do instrumento Dilemas da Vida Real é que os casos narrados
podem perder, com o passar do tempo, toda a característica de ser um dilema da vida real,
pois, em um futuro não tão distante, quem se lembrará do menino João Hélio? Quem se
importará com Sadam Hussein?
Apesar da utilidade desse instrumento para a intervenção utilizada, julga-se que talvez
o seu uso seja limitado pelo fato de se tratar de um dilema da vida real e por isso mesmo mais
211
sujeito a influência do tempo e do contexto. Outro aspecto que limita o alcance do uso do
referido instrumento é o fato dele possuir questões subjetivas que necessitam de análises mais
demoradas, sobretudo, em pesquisas com amostras maiores.
No que se refere ao instrumento denominado Escala de Empatia focada em Grupos
(EEG), elaborado com vistas à mensuração da Empatia relacionada a problemas sociais
(último estágio de desenvolvimento empático da teoria de Hoffman), pode-se dizer que ele é
um instrumento que apresentou parâmetros psicométricos adequados nas amostras de
adolescentes, podendo ser considerado um instrumento válido para identificar quatro
componentes claramente discerníveis em relação aos grupos aos quais se destina o sentimento
empático: grupos minoritários, trabalhadores, animais e “apenados”, mas que precisa ser
testado em outras amostras, considerando, por exemplo, diferentes faixas etárias, diferentes
contextos, diferentes culturas e tipos de personalidade (como os das pessoas que apresentam
diagnóstico de psicopatias).
Ainda em relação à EEG, julga-se que a realização de outros estudos é importante para
esclarecer qual a melhor versão da escala: a que foi indicada por intermédio da análise
fatorial, com 20 ítens, ou a versão com 27 ítens. Nesta escolha é relevante que se considere
que a EEG possui dois fatores com coeficientes de precisão abaixo de 0,70, tendo cada
componente quatro ítens, o que pode ser melhorado caso haja um aumento do número de itens
(Nunnally, 1991).
Um outro ponto que parece interessante considerar é a adaptação desta escala para
crianças. Se se julga que os ítens da escala correspondem ao último estágio de
desenvolvimento de Hoffman, que exige um maior nível de abstração, pergunta-se: em que
momento as crianças estariam aptas para responder a essa escala? Independente dos ajustes
que deverão ser feitos em outros estudos, pode-se dizer que a EEG apresenta alguns méritos
que precisam ser destacados, como o de mensurar a empatia em um nível que ultrapassa as
212
relações interpessoais, diferindo da maioria dos instrumentos de empatia; e o de fornecer
subsídios para análise de questões morais atreladas a problemas sociais relevantes.
Outro mérito da EEG é que ela, por intermédio do componente Empatia com os
“apenados”, possibilitou testar, de forma mais significativa, a evolução da empatia nos
programas de intervenção, pois sem um instrumento dessa natureza corre-se o risco de fazer a
avaliação de uma empatia facilmente provocada.
Ainda um outro mérito da EEG é que ela verifica a empatia por animais, algo
negligenciado nos estudos acerca da empatia. Em relação a este último aspecto, lembra-se
aqui o que disse M. Gandhi, um dos maiores modelos de moral e compaixão: “a grandeza de
uma nação e seu progresso moral pode ser julgado pela forma que seus animais são tratados”.
Também sobre a empatia por animais merece ser citado o estudo de Paul (2000), que
verificou, a partir de uma amostra de 514 adultos, correlação significativa (porém, modesta)
entre o Questionnaire Measure of Emotional Empathy (Mehrabian & Epstein, 1972) e a
Animal Empathy Scale (criada para o estudo).
Por fim, é relevante comentar que a EEG trouxe para a discussão o fato de que,
contrariamente ao que se imaginava, a capacidade afetiva, denominada empatia, não é
estranha à dimensão racional. Conforme exemplifica La Taille (2006), é provável que as
pessoas sintam empatia por uma criança que chora porque lhe roubaram o sorvete, sentindo-se
afetadas por sua dor; mas, também é provável que as pessoas achem algo ilegítimo e
incompreensível que um adulto chore pela mesma razão.
Em relação às propostas de intervenção investigadas, de um modo geral, considera-se
que os resultados encontrados, deram muito mais do que uma contribuição empírica para o
campo que investiga a relação entre moral e afetividade, trouxeram também contribuições
teóricas, na medida em que este estudo revelou não apenas que uma técnica “racional-afetiva”
é mais eficaz que uma técnica “racional-discursiva” para promover desenvolvimento moral,
213
mas que Hoffman (1990) tinha razão quando afirmou que o raciocínio moral é favorecido
pelo desenvolvimento da empatia; e, na medida em que corroboraram a idéia de Piaget (1977)
e de Kohlberg (1971) de que a afetividade e a cognição são aspectos inseparáveis que se
influenciam mutuamente, o que foi constatado pelo fato da empatia ter favorecido o
desenvolvimento moral.
Entretanto, esta última afirmação pode ser questionada. Pode-se perguntar se o
desenvolvimento empático encontrado no grupo submetido à técnica “racional-discursiva”
não foi influenciado pelos vídeos utilizados, que classicamente não fazem parte desse tipo de
estratégia de intervenção, no sentido de ter gerado impactado na afetividade dos participantes.
Para responder a essa questão será necessária uma nova investigação. Uma outra questão que
se pode fazer é se uma intervenção voltada apenas para a promoção da empatia promoveria o
avanço da moralidade. Já foi constatado, neste estudo, que uma técnica “racional-afetiva” é
mais eficaz para a promoção do desenvolvimento moral que uma técnica “racionaldiscursiva”, mas, seria ela também mais eficaz que uma técnica “afetiva”, em que se
estimularia apenas a empatia? Esta também é uma questão para ser respondida por uma outra
pesquisa, pois de acordo com os estudos de Camino, Cavalcanti e Rique (1992) e de Batson et
al. (1995), a empatia, por si só, não garante que o indivíduo pense ou aja de forma
moralmente correta.
O tipo de estratégia de educação moral denominada “racional-afetiva” apesar de ter se
mostrado bastante eficiente, suplantando inclusive, em alguns aspectos, a clássica técnica de
Blatt e Kohlberg (1975), apresenta algumas limitações, que também dizem respeito à técnica
“racional-discursiva”, quanto à sua viabilidade em situações naturais, que merecem ser
refletidas. A primeira limitação refere-se à formação dos grupos, que, segundo Arbuthnot e
Faust (1981) e Blatt e Kohlberg (1975), devem conter um pequeno número de participantes a
fim de tornar possível à discussão de dilemas morais. Essa composição não condiz com a
214
realidade da maioria das salas de aulas brasileiras que, cada vez mais, encontram-se
superlotadas. Seria necessário, neste caso, subdividir a turma em vários grupos de
intervenção. Mas, isto seria viável nas escolas que quase não possuem tempo disponível ou
que não possuem tempo algum para atividades extra-classe? Particularmente, nesta tese, tevese muita dificuldade para encontrar uma escola que permitisse a realização do programa de
intervenção. Os diretores argumentavam que não havia nenhum horário disponível para o
trabalho ou ainda que seus alunos não podiam “perder tempo” com outras atividades que não
os ajudassem a passar no vestibular. Esses argumentos só ratificavam a idéia de que muitas
escolas só estão preocupadas com o ensino intelectual.
Outra limitação para a reprodução da intervenção em um contexto não experimental é
a de que, com o uso da técnica “racional-discursiva”, segundo Arbuthnot e Faust (1981), se
faz necessário que o grupo tenha um número igual de sujeitos por estágio de raciocínio moral
para que haja a provocação de conflitos cognitivos. Será que em uma sala de aula, em uma
situação não experimental, é possível ter este controle? E, se não houver este controle, será
que a intervenção terá sucesso? Existe, atualmente, um certo consenso em aceitar que a
eficácia da educação moral depende dos conflitos gerados nas estruturas de raciocínio
construídas, facilitados pela heterogeneidade dos participantes (Berkowitz, 1985; Blatt &
Kohlberg, 1975; Díaz-Aguado, 1982; Maqsud, 1977), o que indica que pelo menos alguma
diferença em termos de desenvolvimento moral é necessária.
Em síntese, como efetivar uma proposta de intervenção em situações naturais
considerando as restrições e exigências referentes à formação dos grupos? Apenas outros
estudos poderão responder com maior clareza a esta e outras questões.
Outro aspecto a ser refletido diz respeito ao alcance que o trabalho de intervenção teve
na vida dos participantes. As verbalizações dos estudantes e os resultados do pós-teste
indicaram que os participantes, sobretudo os que se submeteram a técnica “racional-afetiva”,
215
mudaram em termos de desenvolvimento moral e desenvolvimento empático. Mas, com o
término do trabalho, eles estão tendo acesso a programas policiais que estimulam a violência,
a comunidades que possuem suas próprias leis (como a de fazer justiça com as próprias
mãos), a um mundo que, cada vez mais, tem naturalizado a violência, a corrupção e a
desonestidade. Diante deste cenário, questiona-se: será que um trabalho ocasional tem forças
suficientes para promover um desenvolvimento moral permanente? Segundo Kohlberg se, de
fato, houve uma construção de princípios morais mais elevados, o meio não teria forças para
mudar o pensamento desses indivíduos e os efeitos desse programa permaneceriam a longo
prazo. Mas será que é mesmo assim? Neste sentido, valeria a pena, após um certo tempo,
realizar avaliações posteriores (follow up).
Note-se, ademais, que este trabalho apenas problematizou o papel da afetividade, mais
precisamente da empatia, na construção da moralidade. Sabe-se, no entanto, que existem
outros fatores, como os históricos, culturais, econômicos, políticos e ideológicos, relacionados
à construção da moralidade, que precisam ser considerados em estudos futuros; além de
outras questões afetivas que não foram exploradas como se deveria, como a raiva, a culpa, a
compaixão, a indignação, etc.
Depois de tantas ponderações em relação ao uso dos instrumentos construídos e da
intervenção proposta, a sensação que se tem é a de que, após o término desta tese, existem
mais questões do que respostas, mais dúvidas do que certezas, mais desconstruções do que
construções, o que pode de início parecer algo ruim, porém, como diz uma vinheta do Canal
Futura, incorporando uma das reflexões da epistemologia do conhecimento, “não são as
respostas que movem o mundo, são as perguntas”.
De qualquer maneira, consideram-se auspiciosos os resultados obtidos com a
estratégia de educação moral investigada nesta tese e julga-se recomendável que ela oriente
projetos de educação moral nas escolas, com o planejamento de estratégias para o exercício da
216
educação moral, uma vez que a forma que vem sendo realizado este tipo de educação, pelo
menos dentro dos espaços educacionais pesquisados, não parece estar surtindo os efeitos
desejáveis. O que se verifica é a ausência de planejamento prévio e, conforme alerta DíazAguado e Medeano (1999), a transversalidade, por estar presente em todas as matérias, fica
susceptível a não estar presente em matéria nenhuma. Compartilhando a compreensão dessas
duas autoras espanholas, defende-se que a educação moral seja tratada de forma específica,
com a reserva de um espaço para centralizar discussões morais, mediante um planejamento
prévio dentro do projeto político-pedagógico da escola, o que não anula o fato dos professores
serem os principais agentes desse processo, desde que eles estejam preparados para isto e que
haja um responsável para coordenar os debates.
Em relação à intervenção propriamente dita, acredita-se, com base nas reflexões sobre
a intervenção relatada nesta tese, que um programa de educação moral deve incluir a
discussão de dilemas hipotéticos, dilemas reais do universo acadêmico (normas da escola, a
transgressão de regras por alunos, etc.), dilemas reais do universo não acadêmico (reportagens
que passaram na TV, vivências pessoais dos alunos, etc.) e os próprios conteúdos curriculares
(escravidão, inquisição, desigualdades sociais, etc.). Também, com base no experimento
realizado nesta tese, sugere-se que se utilize a técnica “racional-afetiva” que concilia
estratégias cognitivas e afetivas de discussão de dilemas morais, em que o aluno não apenas
discute os dilemas morais, mas também é convidado a se envolver afetivamente, colocando-se
na perspectiva e na “pele” do outro.
217
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236
APÊNDICES
237
Apêndice I – Instrumentos utilizados no Estudo 1
238
Nome _______________________________ Data ___/___/____. Duração ___:___ as ___:___
QUESTIONÁRIO
O objetivo deste questionário é compreender como as pessoas pensam determinadas questões sociais. Aqui não
existem respostas “certas” e “erradas”. Nós apenas gostaríamos de saber a sua opinião acerca da resolução de
alguns dilemas e sobre algumas questões que serão levantadas.
PARTE 1- DADOS SÓCIO-DEMOGRÁFICOS
Idade __________________
Religião __________________
Série __________________
freqüência: 1 2 3 4 5 6 7
Sexo ( ) Masculino ( ) Feminino
PARTE 2- Dilemas da vida real
O caso Sadam Hussein
No dia 29 de Dezembro de 2006, Sadam Hussein, o ex-presidente do Iraque, foi executado. O ditador era
conhecido por não ter compaixão pelos seus inimigos, chegando, inclusive, a ordenar a morte de 2 genros. Além
disso, o ex-presidente iraquiano era acusado de ter liderado o genocídio de mais de 100 pessoas, inclusive
crianças, em uma cidade próxima de Bagdad.
Este caso foi noticiado na impressa e gerou muitas polêmicas. Você acha que Sadam Hussein deveria ter sido
executado? ( ) Sim
( ) Não
( ) Não sei
Por que? (se precisar, utilize o verso da folha)
__________________________________________________________________________________________
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__________________________________________________________________________________
O caso João Hélio
O que seria mais um assalto a carro no subúrbio do Rio se transformou em uma tragédia que chocou o país. Na
noite do dia 7 de fevereiro, Rosa Cristina Fernandes voltava para casa com os filhos Aline, de 14 anos, e João
Hélio, de 6 anos. Eles pararam no sinal de trânsito na Rua João Vicente, em Oswaldo Cruz, no subúrbio do Rio,
quando homens armados mandaram que eles saíssem do carro. As duas saíram rapidamente, mas quando Rosa
foi tirar o filho, que estava preso ao cinto de segurança no banco de trás, um dos assaltantes bateu a porta e
arrancou com o carro. O menino ficou preso pelo lado de fora do veículo e foi arrastado por sete quilômetros.
Entre os assaltantes havia menores de 18 anos. Quando o caso foi noticiado pela impressa, muitas pessoas
acharam que a idade dos adolescentes serem presos deveria ser a de 16 anos.
Você está de acordo em que haja uma redução na idade em que o adolescente seja punido?
( ) Sim
( ) Não
( ) Não sei
Por que? (se precisar, utilize o verso da folha)
__________________________________________________________________________________________
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239
PARTE 3 – Escala de Empatia focada em Grupos
Análise cada questão a seguir e diga o quanto “mexe” com seus sentimentos ver cada uma dessas situações.
1. Crianças passando fome.
2. “Velhos” pedindo esmola.
3. Meninos pequenos (de 5 anos de idade) usando drogas.
4. Pessoas doentes sem poder se tratar.
5. Pessoas trabalhando em serviços pesados mais de 12hs por dia.
6.Pessoas que são obrigadas a deixar o campo para procurar trabalho nas grandes
cidades.
7.Pessoas condenadas a pena de morte por crime que cometeram.
8.Presos vivendo em situações desumanas.
9.Pessoas vítimas de injustiça.
10.Pessoas que perderam parentes queridos.
11. Pessoas que são vítimas de catástrofes, como tremor de terra e inundações.
12.Negros sendo menosprezados.
13.Crianças sendo levadas a prostituição
14.Índios sendo menosprezados.
15. Menores abusados sexualmente.
16.Os animais morrendo em período de seca.
17.Os animais sendo levados ao matadouro.
18.Adolescentes presos por cometerem crime.
Pouco
1
2
1
2
1
2
1
2
1
2
3
3
3
3
3
Muito
4
5
4
5
4
5
4
5
4
5
1
2
3
4
5
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
2
2
2
2
2
2
2
2
2
2
2
2
3
3
3
3
3
3
3
3
3
3
3
3
4
4
4
4
4
4
4
4
4
4
4
4
5
5
5
5
5
5
5
5
5
5
5
5
240
Apêndice II – Instrumentos utilizados nos Estudos 2 e 3
241
Nome _______________________________ Data ___/___/____. Duração ___:___ as ___:___
QUESTIONÁRIO
O objetivo deste questionário é compreender como as pessoas pensam determinadas questões sociais. Aqui não
existem respostas “certas” e “erradas”. Nós apenas gostaríamos de saber a sua opinião acerca da resolução de
alguns dilemas e sobre algumas questões que serão propostas.
DADOS SÓCIO-DEMOGRÁFICOS
Idade __________________
Religião __________________
Série __________________
freqüência: 1 2 3 4 5 6 7
Sexo ( ) Masculino ( ) Feminino
O Prisioneiro Foragido
Um homem foi condenado à prisão por dez anos. Depois de um ano, porém, ele fugiu da cadeia, mudou-se para uma
região nova do país, e tomou o nome de Simões. Durante oito anos ele trabalhou duro, tanto que conseguiu economizar
dinheiro suficiente para ter seu próprio negócio. Ele era muito gentil com seus fregueses, pagava altos salários a seus
empregados e dava muito dos seus lucros pessoais para obras de caridade. Um certo dia, dona Cida, uma velha vizinha,
reconheceu-o como o homem que tinha fugido da prisão, e a quem a polícia estava procurando.
Dona Cida deveria entregar o Sr. Simões à Polícia?
( ) SIM ( ) NÃO
( ) NÃO SEI
Nas colunas a seguir, assinale com um “x” qual o grau de importância que tem, para você, o fator ou a consideração
proposta.
GRAU DE IMPORTÂNCIA
Máxima
Grande
Média
Pequena
1. Oito anos não são suficientes para provar que o Sr. Simões é uma boa
pessoa.
2. O não cumprimento de uma lei estimula a desobediência de outras.
3. Melhor seria uma sociedade sem leis.
4. O Sr. Simões deve cumprir o que determina a lei.
5. As ações devem ser julgadas a partir de princípios universais de justiça.
6. Não é vantagem fazer prisões isoladas quando se trata de um homem
caridoso.
7. Só uma pessoa cruel e sem coração denunciaria o Sr. Simões.
8. O correto seria que Dona Cida se comportasse com base no que dita a
lei.
9. Dona Cida deve pensar na sua amizade como Sr. Simões.
10. Um cidadão tem obrigação de entregar um criminoso foragido, não
importando as circunstâncias.
11. Decisões deste tipo devem ser tomadas considerando-se o bem comum.
12. O cumprimento de uma lei deve estar subordinado aos interesses e
necessidades sociais.
Da lista das 12 questões, escolha as 4 (quatro) mais importantes:
- A 1ª questão mais importante: _____________________________________
- A 2ª questão mais importante: _____________________________________
- A 3ª questão mais importante: _____________________________________
- A 4ª questão mais importante: _____________________________________
242
Nenhuma
Dilemas da Vida Real
O caso Sadam Hussein
No dia 29 de Dezembro de 2006, Sadam Hussein, o ex-presidente do Iraque, foi executado. O ditador era
conhecido por não ter compaixão pelos seus inimigos, chegando, inclusive, a ordenar a morte de 2 genros. Além
disso, o ex-presidente iraquiano era acusado de ter liderado o genocídio de mais de 100 pessoas, inclusive
crianças, em uma cidade próxima de Bagdad.
Este caso foi noticiado na impressa e gerou muitas polêmicas.
Você acha que Sadam Hussein deveria ter sido executado?
( ) Sim
( ) Não
( ) Não sei
Por que? (se precisar, utilize o verso da folha)
__________________________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________________________
O caso João Hélio
O que seria mais um assalto a carro no subúrbio do Rio se transformou em uma tragédia que chocou o país. Na
noite do dia 7 de fevereiro, Rosa Cristina Fernandes voltava para casa com os filhos Aline, de 14 anos, e João
Hélio, de 6 anos. Eles pararam no sinal de trânsito na Rua João Vicente, em Oswaldo Cruz, no subúrbio do Rio,
quando homens armados mandaram que eles saíssem do carro. As duas saíram rapidamente, mas quando Rosa
foi tirar o filho, que estava preso ao cinto de segurança no banco de trás, um dos assaltantes bateu a porta e
arrancou com o carro. O menino ficou preso pelo lado de fora do veículo e foi arrastado por sete quilômetros.
Entre os assaltantes havia menores de 18 anos. Quando o caso foi noticiado pela impressa, muitas pessoas
acharam que a idade dos adolescentes serem presos deveria ser a de 16 anos.
Você está de acordo em que haja uma redução na idade em que o adolescente seja punido?
( ) Sim
( ) Não
( ) Não sei
Por que? (se precisar, utilize o verso da folha)
__________________________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________________________
________________________________________________________________________________________
243
Escala de Empatia focada em Grupos – 27 itens
Analise cada questão a seguir e diga o quanto afeta (“mexe” com) seus sentimentos ver ou conhecer cada uma
dessas situações.
1.
2.
3.
4.
5.
6.
7.
8.
9.
10.
11.
12.
13.
14.
15.
16.
17.
18.
19.
20.
21.
22.
23.
24.
25.
26.
27.
Crianças passando fome.
“Velhos” pedindo esmola.
Pessoas tendo que se levantar de madrugada para ir trabalhar.
Meninos pequenos (de 5 anos de idade) usando drogas.
Pessoas doentes sem poder se tratar.
Pessoas que têm parentes seqüestrados.
Pessoas trabalhando em serviços pesados mais de 12hs por dia.
Pessoas que são obrigadas a deixar o campo para procurar trabalho nas grandes
cidades.
Animais sendo caçados como diversão das pessoas.
Pessoas condenadas a pena de morte por crime que cometeram.
Presos vivendo em situações desumanas.
Os presos passarem muito tempo esperando o julgamento.
Pessoas vítimas de injustiça.
Pessoas que perderam parentes queridos.
Animais em extinção.
Pessoas que são vítimas de catástrofes, como tremor de terra e inundações.
Negros sendo menosprezados.
Animais sendo maltratados.
Crianças sendo levadas a prostituição.
Índios sendo menosprezados.
Pessoas que cometeram crimes leves convivendo com pessoas que cometeram
crimes muito graves.
Menores abusados sexualmente.
Animais morrendo em período de seca.
Pessoas que trabalham em condições desumanas, como nas minas de carvão e
nos garimpos.
Animais sendo levados ao matadouro.
Adolescentes presos por cometerem crime.
Pessoas que trabalham com produtos tóxicos, sem terem a devida proteção.
Pouco
1
1
1
1
1
1
1
2
2
2
2
2
2
2
3
3
3
3
3
3
3
Muito
4
5
4
5
4
5
4
5
4
5
4
5
4
5
1
2
3
4
5
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
2
2
2
2
2
2
2
2
2
2
2
2
3
3
3
3
3
3
3
3
3
3
3
3
4
4
4
4
4
4
4
4
4
4
4
4
5
5
5
5
5
5
5
5
5
5
5
5
1
2
3
4
5
1
1
2
2
3
3
4
4
5
5
1
2
3
4
5
1
1
1
2
2
2
3
3
3
4
4
4
5
5
5
244
Interpersonal Reactivity Index
As seguintes afirmações questionam seus sentimentos e pensamentos em uma variedade de situações. Para cada
ítem, indique quanto seu pensamento ou sentimento é descrito pela afirmação escolhendo sua posição na escala
abaixo (“não me descreve bem”/ “descreve-me muito bem”). Quando você tiver decidido sua resposta circule o
número apropriado ao lado da afirmação. Leia cada ítem com muito cuidado antes de responder. Responda o mais
honesto possível.
Não me
descreve bem
1. Eu freqüentemente tenho sentimentos de ternura e preocupação
por pessoas menos felizes do que eu.
2. Às vezes, eu tenho dificuldade de ver as coisas como os outros
vêm.
3. Às vezes, eu não lamento muito por outras pessoas que estão tendo
problemas.
4. Em situações de dificuldades, eu me sinto ansioso e
desconfortável.
5. Eu tento considerar os argumentos de todas as pessoas em uma
discussão antes de tomar uma decisão.
6. Quando eu vejo alguém sendo enganado eu sinto vontade de
protegê-lo.
7. Às vezes, eu me sinto desconfortável quando estou no meio de
uma situação muito emotiva.
8. Às vezes eu tento entender melhor meus amigos, imaginando
como as coisas são vistas por eles.
9. Quando eu vejo alguém se ferir eu tendo a permanecer calmo.
10. As desgraças e os problemas dos outros em geral não me perturbam
muito.
11. Se eu tenho certeza de que estou correto sobre alguma coisa, eu não
perco muito tempo ouvindo os argumentos das outras pessoas.
12. Estar em uma situação em que eu me sinto muito tenso assusta-me.
13. Quando eu vejo alguém sendo injustiçado, eu às vezes não sinto
muita pena dele.
14. Geralmente eu sou muito efetivo para lidar com dificuldades.
15. Freqüentemente eu fico emocionado com coisas que eu vejo
acontecer.
16. Eu acredito que existem dois lados para cada questão e tento olhar
para ambos.
17. Eu descreveria a mim mesmo como uma pessoa de coração mole.
18. Eu tendo a perder o controle durante dificuldades.
19. Quando eu estou incomodado com alguém, geralmente eu tento me
colocar em seu lugar por um momento.
20. Quando eu vejo alguém que tem grande necessidade de ajuda em
uma dificuldade, eu fico desesperado.
21. Antes de criticar alguém, eu tento imaginar como eu me sentiria, se
eu estivesse em seu lugar.
Descreve-me
muito bem
1
2
3
4
5
1
2
3
4
5
1
2
3
4
5
1
2
3
4
5
1
2
3
4
5
1
2
3
4
5
1
2
3
4
5
1
2
3
4
5
1
2
3
4
5
1
2
3
4
5
1
2
3
4
5
1
2
3
4
5
1
2
3
4
5
1
2
3
4
5
1
2
3
4
5
1
2
3
4
5
1
2
3
4
5
1
2
3
4
5
1
2
3
4
5
1
2
3
4
5
1
2
3
4
5
245
Versão brasileira da Escala de Desejabilidade Social de Marlowe-Crowne
Abaixo são apresentadas frases ou afirmações que uma pessoa poderia usar para descrever a si mesma.
Leia cada afirmação e decida se ela descreve ou não você. Se você concordar com uma afirmação ou
achar que ela descreve você, faça uma linha em volta da letra “V” (“Verdadeiro”), na frente da frase.
Se você discordar da afirmação ou achar que ela não descreve você, faça uma linha em volta da letra
“F” (“Falso”) na frente da frase.
Responda cada afirmação com “V” ou “F”, mesmo que você não tenha certeza de sua resposta.
1. É difícil fazer meu trabalho se não sou encorajado (a).
2. Nunca antipatizei com alguém intensamente.
3. Já duvidei sobre a minha habilidade para ter sucesso na vida.
4. Sinto-me chateado (a) quando falo algo e não me compreendem.
5. Meus modos à mesa são os mesmo em casa ou em um restaurante.
6. Entraria em um cinema sem pagar, se soubesse que não seria visto.
7. Gosto de fazer fofoca.
8. Já senti vontade de me rebelar contra pessoas com autoridade.
9. Já fingi estar doente para fugir de alguma responsabilidade.
10. Já tirei vantagem de alguém.
11. Estou sempre disposto (a) a admitir quando cometo um erro.
12. Tento acertar as contas, em lugar de perdoar e esquecer.
13. Sou sempre educado (a), mesmo com pessoas desagradáveis.
14. Já insisti em ter as coisas feitas do meu modo.
15. Já senti vontade de quebrar coisas.
16. Nunca me chateei quando alguém me pediu para retribuir um favor.
17. Não me aborreço com pessoas que têm idéias diferentes das minhas.
18. Já senti inveja da boa sorte de outras pessoas.
19. Fico irritado (a) com pessoas que me pedem favores.
20. Nunca disse algo que magoasse alguém de propósito.
V
V
V
V
V
V
V
V
V
V
V
V
V
V
V
V
V
V
V
V
F
F
F
F
F
F
F
F
F
F
F
F
F
F
F
F
F
F
F
F
246
Apêndice III – Folha de Apuração do DIT
247
FOLHA DE APURAÇÃO DO DIT
Prisioneiro Foragido
Nome: ____________________________________________ Idade: _______________
Grau de escolaridade: ________________________________ Sexo: ________________
ITENS
ESTÓRIAS
PROBLEMAS
Prisioneiro
1
2
3
4
5
6
7
8
9
10
11
12
3
4
A
4
6
M
3
4
3
4
5A
5A
ITENS
ESTÓRIAS
PROBLEMAS
2
3
4
5
5A
5B
6
A
M
P
Prisioneiro
248
Apêndice IV – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
249
UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA
CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS
LETRAS E ARTES
Lilian Galvão
Fone: (83) 8826-8177
[email protected]
www.ufpb.br
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
Pesquisa: Desenvolvimento Moral e Empatia: intervenção educativa
ESTUDO 1 – Termo para participantes Adolescentes
1. Natureza da pesquisa
Esta pesquisa tem como finalidade investigar o nível de desenvolvimento moral e o nível de
empatia de adolescentes e jovens.
2. Participantes da pesquisa
Participarão deste estudo 200 estudantes, sendo 100 do ensino médio e 100 do ensino
superior, do sexo masculino e do sexo feminino, de instituições públicas de ensino da Cidade
de Cajazeiras-PB.
3. Envolvimento na pesquisa
Ao assinar este termo de consentimento livre, você estará permitindo que o/a seu/sua filho/a
responda a um questionário, de forma individual, em ambiente coletivo de sala de aula, por
um período aproximado de 30 minutos. Você tem a liberdade de não autorizar a participação
de seu/sua filho/a na pesquisa, sem qualquer prejuízo para você ou para ele/a.
Se você achar necessário poderá pedir quaisquer informações à coordenadora da pesquisa, por
meio do telefone (83) 8826-8177 ou do e-mail [email protected].
4. Sobre o questionário
Os questionários serão aplicados na escola do/a seu/sua filho/a, em local e horário designados
pelo/a coordenador/a daquela instituição. Será solicitado que seu/sua filho/a resolva dois
dilemas morais proposto pela pesquisadora e que responda a algumas questões sobre empatia.
5. Riscos e desconforto
A participação nesta pesquisa não traz qualquer tipo de risco ou complicação, talvez, apenas,
um pequeno sentimento de timidez que algumas pessoas sentem quando têm que expor sua
opinião.
Os procedimentos utilizados nesta pesquisa seguem as normas estabelecidas pelo Estatuto da
Criança e do Adolescente (LEI Nº 8.069, de 13/07/1990) e não oferecem riscos à integridade
física, psíquica ou moral, e nem à dignidade do/a seu/sua filho/a.
250
6. Confidencialidade
Todas as informações coletadas neste estudo são estritamente confidenciais, de maneira que
apenas os membros do grupo de pesquisa terão acesso aos dados dos participantes. Se você
der a sua autorização por escrito, assinando a permissão para utilização dos dados dos
questionários, os resultados da pesquisa poderão ser utilizados para fins de ensino e durante
encontros e debates científicos, assegurando-se sempre que a identidade dos participantes seja
preservada.
7. Benefícios
Ao participar desta pesquisa seu/sua filho/a não deverá ter nenhum benefício direto.
Entretanto, esperamos que esta pesquisa nos dê informações importantes sobre aspectos
relacionados ao desenvolvimento moral e afetivo durante a adolescência. No futuro, essas
informações poderão ser utilizadas no desenvolvimento de mais programas de intervenção,
que podem vir a beneficiar outras crianças e adolescentes.
8. Pagamentos
Você não terá nenhum tipo de despesa com a participação do/a seu/sua filho/a. Por outro lado,
nada lhe será pago caso você autorize a participação de seu/sua filho/a nesta pesquisa.
Autorização
Tendo em vista os itens acima apresentados, eu, de forma livre e esclarecida, autorizo a
participação de meu/minha filho/a __________________________________________ nesta
pesquisa.
_______________________________________
_______________________, ____ de _________________ de 20___.
251
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TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
Pesquisa: Desenvolvimento Moral e Empatia: intervenção educativa
ESTUDO 1 – Termo para participantes Universitários
1. Natureza da pesquisa
Esta pesquisa tem como finalidade investigar o nível de desenvolvimento moral e o nível de
empatia de adolescentes e jovens.
2. Participantes da pesquisa
Participarão deste estudo 200 estudantes, sendo 100 do ensino médio e 100 do ensino
superior, do sexo masculino e do sexo feminino, de instituições públicas de ensino da Cidade
de Cajazeiras-PB.
3. Envolvimento na pesquisa
Ao assinar este termo de consentimento livre, você estará se disponibilizando a responder a
um questionário, durante cerca de 30 minutos. Você tem a liberdade de não querer colaborar
com esta pesquisa, sem qualquer prejuízo para você.
4. Sobre o questionário
No questionário você terá que resolver dilemas morais e deverá responder algumas questões
sobre empatia.
5. Riscos e desconforto
A participação nesta pesquisa não traz qualquer tipo de risco ou complicação.
6. Confidencialidade.
Todas as informações coletadas neste estudo são estritamente confidenciais, de maneira que
apenas os membros do grupo de pesquisa terão acesso aos dados dos participantes. Se você
der a sua autorização por escrito, assinando a permissão para utilização dos dados dos
questionários, os resultados da pesquisa poderão ser utilizados para fins de ensino e durante
encontros e debates científicos, assegurando-se sempre que a identidade dos participantes seja
preservada.
7. Benefícios
Ao participar desta pesquisa seu/sua filho/a não deverá ter nenhum benefício direto.
Entretanto, esperamos que esta pesquisa nos dê informações importantes sobre aspectos
relacionados ao desenvolvimento moral e afetivo durante a adolescência. No futuro, essas
informações poderão ser utilizadas no desenvolvimento de mais programas de intervenção,
que podem vir a beneficiar outras crianças e adolescentes.
252
8. Pagamentos
Você não terá nenhum tipo de despesa com a participação do/a seu/sua filho/a. Por outro lado,
nada lhe será pago caso você autorize a participação de seu/sua filho/a nesta pesquisa.
Autorização
Tendo em vista os itens acima apresentados, eu, de forma livre e esclarecida, me disponibilizo
a participar desta pesquisa.
_________________________________________
_______________________, ____ de _________________ de 20___.
253
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TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
Pesquisa: Desenvolvimento Moral e Empatia: intervenção educativa
Estudo 2 e Estudo 3
1. Natureza da pesquisa
Esta pesquisa tem como finalidade selecionar um grupo de 36 alunos para participar de um
projeto de intervenção voltado para educação moral de adolescentes.
2. Participantes da pesquisa
Participarão deste estudo 210 estudantes do ensino médio, do sexo masculino e do sexo
feminino, de instituições públicas de ensino da Cidade de João Pessoa - PB.
3. Envolvimento na pesquisa
Ao assinar este termo de consentimento livre, você estará permitindo que o/a seu/sua filho/a
responda a um questionário, de forma individual, em ambiente coletivo de sala de aula, por
um período aproximado de 30 minutos, assim como estará permitindo que seu filho participe,
caso ele seja selecionado, de um projeto de educação moral, que terá duração de um semestre
e acontecerá em um horário que não prejudicará suas atividades na escola. Você tem a
liberdade de não autorizar a participação de seu/sua filho/a na pesquisa e/ou no projeto, sem
qualquer prejuízo para você ou para ele/a.
Se você achar necessário poderá pedir quaisquer informações à coordenadora da pesquisa, por
meio do telefone (83) 8826-8177 ou do e-mail [email protected].
4. Sobre o questionário
O questionário será aplicado na escola do/a seu/sua filho/a, em local e horário designados
pelo/a coordenador/a daquela instituição. Será solicitado que seu/sua filho/a resolva dilemas
morais e que responda a algumas questões sobre empatia.
5. Sobre o projeto de educação moral
O projeto de educação moral tem como objetivo principal desenvolver no/a seu/sua filho/a o
senso de cidadania. Para tanto, caso ele/a seja selecionado/a, seu/sua filho/a terá que participar
de encontros semanais com a coordenadora do projeto, na escola e no turno em que estuda,
em um horário diferente de suas aulas para discutir dilemas morais.
6. Riscos e desconforto
A participação nesta pesquisa não traz qualquer tipo de risco ou complicação, talvez, apenas,
um pequeno sentimento de timidez que algumas pessoas sentem quando têm que expor sua
opinião.
Os procedimentos utilizados nesta pesquisa seguem as normas estabelecidas pelo Estatuto da
Criança e do Adolescente (LEI Nº 8.069, de 13/07/1990) e não oferecem riscos à integridade
física, psíquica ou moral, e nem à dignidade do/a seu/sua filho/a.
254
7. Confidencialidade
Todas as informações coletadas neste estudo são estritamente confidenciais, de maneira que
apenas os membros do grupo de pesquisa terão acesso aos dados dos participantes. Se você
der a sua autorização por escrito, assinando a permissão para utilização dos dados dos
questionários, os resultados da pesquisa poderão ser utilizados para fins de ensino e durante
encontros e debates científicos, assegurando-se sempre que a identidade dos participantes seja
preservada.
8. Benefícios
Ao participar desta pesquisa seu/sua filho/a não deverá ter nenhum benefício direto.
Entretanto, esperamos que esta pesquisa nos dê informações importantes sobre aspectos
relacionados ao desenvolvimento moral e afetivo durante a adolescência. No futuro, essas
informações poderão ser utilizadas no desenvolvimento de mais programas de intervenção,
que podem vir a beneficiar outras crianças e adolescentes.
9. Pagamentos
Você não terá nenhum tipo de despesa com a participação do/a seu/sua filho/a. Por outro lado,
nada lhe será pago caso você autorize a participação de seu/sua filho/a nesta pesquisa.
Autorização
Tendo em vista os itens acima apresentados, eu, de forma livre e esclarecida, autorizo a
participação de meu/minha filho/a __________________________________________ nesta
pesquisa.
_______________________________________
_______________________, ____ de _________________ de 20___.
255
Apêndice V – Cronograma de Atividades: Estudo 3
256
CRONOGRAMA DE ATIVIDADES
DATAS GRUPO 1: “racional-discursiva”
Apresentação;
06/08
Escolha das temáticas;
Tema: Brigas
Recursos:
- Dilema escrito: “Provocações”
Técnica:
- Discussão de Dilema Moral;
07/08
(1)
Questão norteadora:
- Como resolver este dilema? Por que (...)?
14/08
(2)
Tema: Brigas
Recursos:
- Vídeo do Youtube: “Olho por olho, dente por
dente”
Técnica:
- Discussão de Dilema Moral;
Questão norteadora:
- Como resolver este dilema? Por que (...)?
21/08
(3)
28/08
(4)
04/09
(5)
Tema: Brigas
Recursos:
- Dilema escrito: “Maiores x Menores”
Técnica:
- Discussão de Dilema Moral;
Questão norteadora:
- Como resolver este dilema? Por que (...)?
Tema: Drogas
Recursos:
- Filme: Bicho de Sete Cabeças
Técnica:
- Discussão de Dilema Moral;
Questão norteadora:
- Como resolver este dilema? Por que (...)?
Tema: Drogas
Recursos:
- Vídeos do Youtube – “Notícias de uma guerra
GRUPO 2: “racional-afetiva”
Apresentação;
Escolha das temáticas;
Tema: Brigas
Recursos:
- Dilema escrito: “Provocações”
Técnica:
- Discussão de Dilema Moral;
- Técnica do Psicodrama: Role-playing e
Inversão de papéis (role reversal);
Questão norteadora:
- Como resolver este dilema? Por que (...)?
- Como foi se colocar no lugar de ____? O
que você sentiu?
Tema: Brigas
Recursos:
- Vídeo do Youtube: “Olho por olho, dente
por dente”
Técnica:
- Discussão de Dilema Moral;
- Técnica do Psicodrama: Role-taking;
Inversão de papéis (role reversal);
Questão norteadora:
- Como resolver este dilema? Por que (...)?
- Como foi se colocar no lugar de ____? O
que você sentiu?
Tema: Brigas
Recursos:
- Dilema escrito: “Maiores x Menores”
Técnica:
- Discussão de Dilema Moral;
- Técnica do Psicodrama: Role-taking;
Inversão de papéis (role reversal);
Questão norteadora:
- Como resolver este dilema? Por que (...)?
- Como foi se colocar no lugar de ____? O
que você sentiu?
Tema: Drogas
Recursos:
- Filme: Bicho de Sete Cabeças
Técnica:
- Discussão de Dilema Moral;
- Técnica do Psicodrama: Carta
Questão norteadora:
- Como resolver este dilema? Por que (...)?
- Como foi se colocar no lugar de ____? O que
você sentiu?
Tema: Drogas
Recursos:
- Vídeos do Youtube – “Notícias de uma
257
particular”
Técnica:
- Discussão de Dilema Moral;
Questão norteadora:
- Como resolver este dilema? Por que (...)?
11/09
(6)
18/09
(7)
25/09
(8)
02/10
(9)
09/10
(10)
Tema: Delinqüência
Recursos:
- Dilema escrito: “Traficante de drogas”
Técnica:
- Discussão de Dilema Moral;
Questão norteadora:
- Como resolver este dilema? Por que (...)?
Tema: Delinqüência
Recursos:
- Filme: Última parada: 174
Técnica:
- Discussão de Dilema Moral;
Questão norteadora:
- Como resolver este dilema? Por que (...)?
Tema: Delinqüência
Recursos:
- Vídeo do Youtube: “Campanha contra a pena
de morte”
Técnica:
- Discussão de Dilema Moral;
Questão norteadora:
- Como resolver este dilema? Por que (...)?
Tema: Delinqüência
Recursos:
- Filme: Redução não é solução (documentário)
- Vídeo do Youtube: “Maioridade penal”
Técnica:
- Discussão de Dilema Moral;
Questão norteadora:
- Como resolver este dilema? Por que (...)?
Tema: Roubo
Recursos:
guerra particular”
Técnica:
- Discussão de Dilema Moral;
- Técnica do Psicodrama: Bonecos/Máscaras
Questão norteadora:
- Como resolver este dilema? Por que (...)?
- Como foi se colocar no lugar de ____? O que
você sentiu?
Tema: Delinqüência
Recursos:
- Dilema escrito: “Traficante de drogas”
Técnica:
- Discussão de Dilema Moral;
- Técnica do Psicodrama: Câmara lenta
Questão norteadora:
- Como resolver este dilema? Por que (...)?
- Como foi se colocar no lugar de ____? O que
você sentiu?
Tema: Delinqüência
Recursos:
- Filme: Última parada: 174
Técnica:
- Discussão de Dilema Moral;
- Técnica do Psicodrama: Cena de Julgamento
Questão norteadora:
- Como resolver este dilema? Por que (...)?
- Como foi se colocar no lugar de ____? O que
você sentiu?
Tema: Delinqüência
Recursos:
- Vídeo do Youtube: “Campanha contra a
pena de morte”
Técnica:
- Discussão de Dilema Moral;
- Técnica do Psicodrama: Carta
Questão norteadora:
- Como resolver este dilema? Por que (...)?
- Como foi se colocar no lugar de ____? O que
você sentiu?
Tema: Delinqüência
Recursos:
- Filme: Redução não é solução (documentário)
- Vídeo do Youtube: “Maioridade penal”
Técnica:
- Discussão de Dilema Moral;
- Técnica do Psicodrama: Cena de Julgamento
Questão norteadora:
- Como resolver este dilema? Por que (...)?
- Como foi se colocar no lugar de ____? O que
você sentiu?
Tema: Roubo
Recursos:
258
- Dilema escrito: O supermercado
Técnica:
- Discussão de Dilema Moral;
Questão norteadora:
- Como resolver este dilema? Por que (...)?
16/10
(11)
23/10
(12)
30/10
(13)
06/11
(14)
13/11
(15)
Tema: Aborto
Recursos:
- Dilema escrito: “Aborto”
Técnica:
- Discussão de Dilema Moral;
Questão norteadora:
- Como resolver este dilema? Por que (...)?
Tema: Aborto
Recursos:
- Filme: O aborto dos outros
Técnica:
- Discussão de Dilema Moral;
Questão norteadora:
- Como resolver este dilema? Por que (...)?
Tema: Aborto
Recursos:
- Vídeo do Youtube: Aborto x vida
Técnica:
- Discussão de Dilema Moral;
Questão norteadora:
- Como resolver este dilema? Por que (...)?
Tema: Ecologia
Recursos:
- Dilema escrito: Dilema da Capivara
Técnica:
- Discussão de Dilema Moral;
Questão norteadora:
- Como resolver este dilema? Por que (...)?
Tema: Ecologia
Recursos:
-Vídeo do Youtube: Maltrato de animais
- Dilema escrito: O supermercado
Técnica:
- Discussão de Dilema Moral;
- Técnica do Psicodrama: Fantasia Dirigida
Questão norteadora:
- Como resolver este dilema? Por que (...)?
- Como foi se colocar no lugar de ____? O que
você sentiu?
Tema: Aborto
Recursos:
- Dilema escrito: “Aborto”
Técnica:
- Discussão de Dilema Moral;
- Técnica do Psicodrama: Role-taking e
Inversão de papéis (role reversal);
Questão norteadora:
- Como resolver este dilema? Por que (...)?
- Como foi se colocar no lugar de ____? O que
você sentiu?
Tema: Aborto
Recursos:
- Filme: O aborto dos outros
Técnica:
- Discussão de Dilema Moral;
- Técnica do Psicodrama: Fantasia Dirigida
Questão norteadora:
- Como resolver este dilema? Por que (...)?
- Como foi se colocar no lugar de ____? O que
você sentiu?
Tema: Aborto
Recursos:
- Vídeo do Youtube: Aborto x vida
Técnica:
- Discussão de Dilema Moral;
- Técnica do Psicodrama: Carta
Questão norteadora:
- Como resolver este dilema? Por que (...)?
- Como foi se colocar no lugar de ____? O que
você sentiu?
Tema: Ecologia
Recursos:
- Dilema escrito: Dilema da Capivara
Técnica:
- Discussão de Dilema Moral;
- Técnica do Psicodrama: Personificação;
Questão norteadora:
- Como resolver este dilema? Por que (...)?
- Como foi se colocar no lugar de ____? O que
você sentiu?
Tema: Ecologia
Recursos:
- Vídeo do Youtube: Maltrato de animais
259
Técnica:
- Discussão de Dilema Moral;
Questão norteadora:
- Como resolver este dilema? Por que (...)?
20/11
(16)
27/11
(17)
04/12
(18)
11/12
(19)
Tema: Violência
Recursos:
- Vídeo do Youtube: Violência contra o idoso
Técnica:
- Discussão de Dilema Moral;
Questão norteadora:
- Como resolver este dilema? Por que (...)?
Realização de Entrevistas – Efeito da
intervenção
Tema: Violência
Recursos:
- Vídeo do Youtube: Violência contra criança
- Vídeo do Youtube: Violência, fome, guerra,
preconceito
Técnica:
- Discussão de Dilema Moral;
Questão norteadora:
- Como resolver este dilema? Por que (...)?
Tema: Adolescência
Recursos:
- Vídeo do Youtube: Pro dia nascer feliz;
Técnica:
- Discussão de Dilema Moral;
Questão norteadora:
- Como resolver este dilema? Por que (...)?
Tema: Adolescência
Recursos:
- Criação de Dilema escrito: Meu Dilema
Técnica:
- Discussão de Dilema Moral;
Questão norteadora:
- Como resolver este dilema? Por que (...)?
Técnica:
- Discussão de Dilema Moral;
- Técnica do Psicodrama: Personificação;
Questão norteadora:
- Como resolver este dilema? Por que (...)?
- Como foi se colocar no lugar de ____? O que
você sentiu?
Tema: Violência
Recursos:
- Vídeo do Youtube: Violência contra o idoso
Técnica:
- Discussão de Dilema Moral;
- Técnica do Psicodrama: Role-playing
Questão norteadora:
- Como resolver este dilema? Por que (...)?
- Como foi se colocar no lugar de ____? O que
você sentiu?
Realização de Entrevistas – Efeito da
intervenção
Tema: Violência
Recursos:
- Vídeo do Youtube: Violência contra criança
- Vídeo do Youtube: Violência, fome, guerra,
preconceito
Técnica:
- Discussão de Dilema Moral;
- Técnica do Psicodrama: Carta;
Questão norteadora:
- Como resolver este dilema? Por que (...)?
- Como foi se colocar no lugar de ____? O que
você sentiu?
Tema: Adolescência
Recursos:
- Vídeo do Youtube: Pro dia nascer feliz
Técnica:
- Discussão de Dilema Moral;
- Técnica do Psicodrama: Role-playing
Questão norteadora:
- Como resolver este dilema? Por que (...)?
- Como foi se colocar no lugar de ____? O que
você sentiu?
Tema: Adolescência
Recursos:
- Criação de Dilema escrito: Meu Dilema
Técnica:
- Discussão de Dilema Moral;
- Técnica do Psicodrama: Role-playing
Questão norteadora:
- Como resolver este dilema? Por que (...)?
- Como foi se colocar no lugar de ____? O que
você sentiu?
260
18/12
(20)
Tema: Adolescência
Recursos:
- Debate dos Dilemas criados pelos alunos;
Técnica:
- Discussão de Dilema Moral;
Questão norteadora:
- Como resolver este dilema? Por que (...)?
Tema: Adolescência
Recursos:
- Debate dos Dilemas criados pelos alunos;
Técnica:
- Discussão de Dilema Moral;
- Técnica do Psicodrama: Role-playing
Questão norteadora:
- Como resolver este dilema? Por que (...)?
- Como foi se colocar no lugar de ____? O que
você sentiu?
261
Apêndice VI – Dilemas Selecionados: Estudo 3
262
DILEMAS SELECIONADOS
Tema: Brigas
Provocações
Nas escolas, nós sofremos muito tipos de provocações dos nossos colegas. Algumas vezes são apenas
brincadeiras bobas que não dão em nada e nós deixamos passar. Mas algumas vezes a provocação nos atinge
de tal maneira que não temos como não responder e aí as coisas podem complicar.
1) Como você reage quando é provocado? (Você é um provocador? Gosta disso?)
2) O que você pensa das pessoas que provocam (e até ameaçam)?
3) Como, ou o que, você faria para que uma pessoa parasse de provocar você?
_____________________
Fonte: Nepomuceno (2000)
Maiores x Menores
Nas escolas em todo o mundo existem alunos de idades diferentes. Uns são mais velhos e por isso já estão nas
séries mais avançadas. Outros são mais novos e enfrentam alguns problemas: além de serem mais novos na
idade, às vezes acabaram de chegar na escola e têm que fazer o que os mais velhos mandam. Às vezes os mais
velhos mandam fazer os deveres, às vezes tomam seu lanche, às vezes batem neles.
1) Você acha que a questão da idade tem a ver com os mais velhos quererem tirar tanto proveito dos
mais novos (seja na idade ou no tempo que o mais velho já está na escola)?
2) Você acha que a posição deles (serem mais velhos) dá o direito deles agirem desta forma?
3) Você acha isso justo? Por que sim ou porque não?
4) Que alternativas você daria para que não acontecessem abusos (como bater, tomar objetos, etc.)
como estes?
5) Como você acha que seria a melhor forma de reverter essa situação? (como seria a forma de começar
no ano que vem?, poderia ser da mesma forma ou se faz acordos pra que as coisas comecem
diferentes?)
_____________________
Fonte: Nepomuceno (2000)
Tema: Delinqüência
“Traficante de drogas”
O problema das drogas neste país alcançou muitos lugares. Muitas pessoas morrem todos os meses e muitas
vidas ficam arruinadas por causa das drogas. Todas essas drogas são ilegais. As drogas são trazidas e
distribuídas por um grupo do crime organizado. Esses grupos são difíceis de se eliminar. As pessoas que
trabalham para esses grupos não falam quando são apanhadas e até agora o governo não foi capaz de
encontrar evidências para colocá-las na cadeia.
263
Um traficante tinha sido apanhado na escola. Ele foi interrogado pela polícia sobre a fonte de seu
fornecimento, mas se recusou a cooperar. Algumas pessoas dizem que nós deveríamos obter informações a
qualquer custo: se eles não falam voluntariamente (por sua livre vontade) eles deveriam ser obrigados a falar
de alguma outra forma. Essas pessoas acham que se fizéssemos isso poderíamos eliminar esses criminosos e
salvar muitas vidas.
1) Você aprovaria ou daria à polícia o direito de manter pessoa na cadeia até que elas concordassem (ou
decidam) em falar ou questioná-los (perguntar a elas) a fim de descobrir informações que ajudariam
a controlar o tráfico organizado de drogas? Você aprovaria a idéia de torturá-los de alguma forma?
Por quê?
2) É moralmente justificável controlar um mal utilizando meios maus? Por que sim ou por que não?
3) Suponha que 50 traficantes sejam apanhados em uma semana. A polícia não sabe quanta informação
cada um desses traficantes possui. Eles deveriam torturar a todos, arriscando-se a torturar um
indivíduo que não tem nenhuma informação que ajudasse a quebrar o círculo de traficantes? Por que
sim ou por que não?
__________________________
Fonte: Nepomuceno (2000)
Tema: Roubo
O supermercado
Gilberto é fiscal em um supermercado próximo à sua casa, no Sarandi. Seu Jacinto, um senhor aposentado por
invalidez, 52 anos, vizinho e muito amigo de sua família, sempre faz compras neste supermercado. Um dia
Gilberto vê o seu Jacinto colocando um pacote de manteiga no bolso do casaco. Ele sabe que seu Jacinto
recebe pouco como aposentado e que, além disso, tem quatro filhos em idade escolar e uma mulher para
alimentar.
1) Se você fosse Gilberto, o que você faria?
2) Para tomar sua decisão, você acha que seria mais importante (coloque em ordem decrescente de
importância);
( ) o dever de Gilberto como fiscal
( ) a amizade entre a família e seu Jacinto
( ) a situação financeira de seu Jacinto
( ) o prejuízo do supermercado
Justifique:
__________________________
Fonte: Nepomuceno (2000)
264
Tema: Aborto
“Aborto”
Ângela é uma secretária de uma loja de confecções. Faz cursinho à noite e tem intenções de cursar uma
faculdade. Aos fins de semana costuma ir à missa, pois é muito religiosa. Um certo dia, quando volta da aula,
foi abordada por um estranho que pediu-lhe informações sobre um certo endereço. Ao responder, foi
empurrada para o carro e posteriormente violentada sexualmente. Passou-se um mês e Ângela descobriu que
estava grávida. Ficou desesperada e só, sem ter a quem recorrer. Pensou muito e não sabia o que fazer: Ter um
filho de alguém que a estuprara e nem sabia quem era, ou abortar um inocente.
1) O que ela deveria fazer neste caso?
2) A pessoa tem o direito de determinar a vida ou a morte de um ser indefeso?
3) Em que medida a experiência traumatizante pela qual a mãe passou não vai refletir no
relacionamento com o futuro filho e até em sua rejeição?
4) Como a Igreja encara o aborto nestas condições?
5) A lei prevê o direito ao aborto em estupro. Como provar isso (por processo) a tempo de realizar um
aborto sem grandes riscos para a mãe?
6) Qual o tipo de assistência que deveria ser dada a uma pessoa violentada sexualmente e grávida
decorrente disso?
_________________________
Fonte: Blatt, Colby e Speicher (1974), adaptado por Biaggio, Vargas, Monteiro, Souza e Tesche (1999)
Tema: Ecologia
"O dilema da capivara"
Um homem chamado Otávio trabalha muito durante a semana, e gosta de ir caçar no fim-de-semana para
relaxar. Numa noite, depois da refeição de carne de capivara - um animal que ele tinha caçado durante a
temporada de caça do ano passado, ele comentou sobre o quanto ele estava ansioso pela próxima estação de
caça. Um amigo que estava visitando sua casa perguntou se ele achava certo atirar em animais só por esporte
ou para comer a carne só por prazer. Esse amigo afirmou, por exemplo, que era possível manter-se em boa
saúde sem comer carne. Otávio começou a pensar sobre essas questões. Otávio tem um problema. Ele gosta de
ir caçar para relaxar e de comer carne de capivara, mas o fato dele continuar caçando vai fazer os animais
sofrerem e morrerem.
1) Otávio tem que tomar uma decisão. O que você acha que ele deveria fazer? Por quê? (Explique suas
razões em detalhes).
2) Animais morrerão por causa da caça. Qual seria a importância desse fato para se tomar uma decisão?
265
(muito importante/importante/não é importante) Otávio vai relaxar quando caçar. Qual seria a
importância desse fato para se tornar uma decisão? (muito importante/importante/não é importante).
3) Otávio vai relaxar quando caçar. Qual seria a importância desse fato para tornar uma decisão?(muito
importante/importante/não é importante).
4) Em geral, está certo tirar a vida de um animal para que uma pessoa possa relaxar? Por quê?
__________________________
Fonte: Biaggio, Vargas, Monteiro, Souza e Tesche (1999)
266
Apêndice VII – Filmes e Vídeos do Youtube selecionados: Estudo 3
267
FILMES/VÍDEOS DO YOUTUBE SELECIONADOS
Tema: Brigas
Vídeo do Youtube “Olho por olho, dente por dente”
Retrata o princípio da Lei de Talião, a partir de uma cena em que uma pessoa agride a outra e é agredida da
mesma forma.
Tema: Drogas
Bicho de Sete Cabeças
Os pais de um jovem descobrem um cigarro de maconha em seu casaco e são aconselhados a internar o filho
numa instituição psiquiátrica.
Notícias de uma guerra particular
Documentário sobre o mundo das drogas: entrevistas e imagens.
Tema: Delinqüência
Última Parada: 174
Baseado em uma história real, este filme conta a história de dois jovens. O primeiro, Alessandro, ainda
quando bebê, é retirado de sua mãe pelo chefe do tráfico local, devido à uma dívida não paga. O Segundo,
Sandro, vê sua mãe ser morta por dois ladrões e, a partir daí passa a conviver com um grupo de garotos que
dorme na igreja da Candelária. Na convivência com estes meninos, Sandro testemunha a chacina da
Candelária, onde 8 meninos de rua foram mortos pela polícia. Este triste evento aproxima Sandro e
Alessandro, que passam a ter um forte convívio, separado definitivamente pelo envolvimento de Sandro no
famoso seqüestro do ônibus 174.
Vídeo do Youtube: Campanha contra a pena de morte
Traz imagens do filme Última parada: 174, no sentido de refletir acerca da história de vida de algumas
pessoas que se envolvem em crimes.
Redução não é a solução
Trata-se de um documentário que explicita, a partir de vários depoimentos, os motivos que levam o Fórum de
Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente a ser contra a redução da maioridade penal.
Vídeo do Youtube: Maioridade penal
Trata-se de uma palestra que problematiza a questão da maioridade penal.
268
Tema: Aborto
O aborto dos Outros
O Aborto dos outros é um filme sobre a maternidade em seu ponto limite. A narrativa percorre situações de
aborto dentro de hospitais públicos que atendem mulheres vítimas de estupro, interrupções de gestações em
casos de má-formação fetal sem possibilidade de sobrevida após o nascimento e abortos clandestinos.
Vídeo do Youtue: Aborto x Vida
Problematiza a questão do aborto, mostrando os prós e os contras de sua legalização.
Tema: Ecologia
Vídeo do Youtube: Maltrato de animais
Traz imagens de animais que sofreram maus tratos.
Tema: Violência
Vídeo do Youtube: Violência contra o idoso
Problematiza o problema de violência contra o idosos, com imagens reais de agressão ao idoso.
Vídeo do Youtube: Violência contra criança
Problematiza a questão da violência contra as crianças.
Vídeo do Youtube: Violência, fome, guerra, preconceito
Mostra imagens de crianças em vários contextos de sofrimento.
Tema: Adolescência
Vídeo do Youtube: Pro dia nascer feliz
Pontua os problemas existenciais típicos da adolescência.
269
Apêndice VIII – Técnicas do Psicodrama selecionadas: Estudo 3
270
TÉCNICAS DO PSICODRAMA UTILIZADAS
Bonecos/Máscaras: trabalha-se com máscaras ou marionetes para promover um maior
distanciamento no papel desempenhado pelos participantes;
Câmara lenta: solicita-se que os participantes se movimentem como que em câmara
lenta no processo de dramatização de uma cena com o objetivo de fazer com que ações
sejam amplificadas, congeladas ou tornadas mais disponíveis para serem trabalhadas;
Carta – solicita-se que os participantes escrevam ou leiam uma carta imaginária de
uma pessoa significativa do Dilema;
Cena de Julgamento – realiza-se o debate de um conflito moral como em uma cena de
tribunal, com a presença de réu, advogado de defesa, promotor, juiz, jurados;
Espelho – o protagonista é solicitado a recuar e observar, enquanto o papel que ele
representou é repetido por um auxiliar;
Fantasia dirigida – é um método catalisado por sugestões verbais do diretor;
Inversão de papéis (role reversal) – os participantes principais de uma interação
trocam de papéis;
Personificação – os participantes desempenham papéis de objetos inanimados e
animais;
Role-taking (assumir o papel) – deve-se se colocar no lugar do outro e buscar
compreender suas expectativas, seus pensamentos e sentimentos (Hoffman);
Role-playing (desempenho de papéis) – refere-se ao ato de examinar estratégias
alternativas para lidar com um problema, mediante o desempenho de papéis;
271
Apêndice IX – Diário de Campo: Estudo 3
272
DIÁRIO DE CAMPO
06/08 – Reunião com todos os participantes da condição experimental
Após a seleção dos alunos, obtidas mediante a aplicação do pré-teste, foi realizado um
encontro com os 24 alunos que iriam participar dos grupos experimentais. Utilizamos uma
aula e meia para este encontro.
Inicialmente, me apresentei, apresentei meu monitor e falei um pouco sobre a proposta
de intervenção, no sentido de motivá-los para participar do projeto. Expus a quantidade de
encontros a serem realizados (20), o tempo de duração das “aulas” (50 minutos) e os dias que
deveriam acontecer às reuniões (sextas-feiras); discutimos a respeito da liberdade de opinião,
do respeito à opinião do outro, do papel do coordenador, do papel dos participantes e da
importância deles não faltarem a nenhuma reunião.
Também, neste primeiro contato, realizei uma dinâmica de apresentação. Os alunos,
após serem divididos em dois grandes grupos de 12 (que corresponde as duas condições
experimentais que eles iriam ser submetidos), que chamamos azul e vermelho e os
identificamos com uma fita em seus braços, foram convidados a formarem pares para
conversar durante 5 minutos. Para facilitar o diálogo (e para servir como dado adicional para
pesquisadora), após 5 minutos de conversa informal, foi dado um roteiro de “entrevista” para
os participantes, que foram convidados a o utilizarem. Neste roteiro, estavam explicitadas as
seguintes questões: nome, mora com quem, como é na escola (bom ou mau aluno), o que mais
gosta de fazer (hobby), o que mais gosta de assistir na TV. Em seguida, com os dados
colhidos, mediante conversa informal e a partir do roteiro de entrevista, cada participante foi
convidado para apresentar o (a) colega ao restante do grupo.
A seguir, serão reproduzidas textualmente as falas dos alunos na hora da apresentação,
segundo as anotações do meu monitor. É importante registrar que eu, juntamente com meu
monitor, tendo em vista resguardar a identidade dos participantes, coloquei nomes fictícios
nos alunos:
1) ) Equipe Azul (Moral)
Dupla 1: Einsten e Newton
- Einsten: “Este é Newton (Participante 193). Um cara estudioso que gosta de ler. Já
leu Heri Poter, o mundo de Sofia. Não é muito de ter amigos e detesta Tv. Só gosta de
filmes. Mora com o pai e os avós”.
- Newton: “Este é Einsten (Participante 146). Gosta de ir para a igreja e toca na banda
nos cultos. Toca guitarra. Gosta de ouvir louvores e participar de grupo jovem. Gosta
de estudar. Mora com os pais”.
Dupla 2: Pedro e João
- Pedro: João (Participante 190) não gosta muito de estudar, mas estuda um
pouquinho. Se acha burro. Ele gosta de jogar vídeo game e só.
273
- João: Pedro (Participante 197) gosta de sentar na última cadeira, não conversa com
ninguém na hora da aula. Se acha um cara tímido. Tem uma namorada. Gosta de ir
para a sua casa. Mora com a mãe.
Dupla 3: Rute e Valéria
Rute: Valéria (Participante 206) disse que tem uma inteligência normal. Tira notas
boas. Mas, não excelentes. Gosta de ficar em casa. Mas, detesta lavar louça. Gosta de
ouvir músicas internacionais e adora inglês. Mora com a mãe e os irmãos.
Valéria: Rute (Participante 202) é estudiosa. Gostamos de estudar juntas para as
provas. Tira notas parecidas com as minhas. Eu sou melhor em umas matérias e ela em
outras. Aí a gente se ajuda. Ela mora com os pais. Não sabe dizer o que gosta de fazer.
Dupla 4: Erick e David
Erick: David (Participante 181) é um cara que só gosta de ficar... sei lá, de ficar com
uma e com outra, tá ligado? É tipo galã de malhação, ta ligado? As meninas do
colégio, inclusive dessa sala suspira por ele. Já eu, sou feio pra caramba (kkkk). Mas
ainda pego umas, de vez em quando. Ele mora com a mãe e umas irmãs bem gatinhas.
David: Erick (Participante 201) passa o dia no computador. O dia inteiro mesmo. Só
sai para vim para o colégio. Ele mora com a mãe dele, que só vive aqui no colégio
para saber se ele tá estudando. É claro que não adianta nada!
Dupla 5: Mayara e Sara
Mayara: Sara (Participante 194) e eu formamos uma dupla. Dupla de bagunceiras.
Será que vocês vão agüentar a gente? (sorriu). Não gostamos de estudar não. O
assunto não entra. Ela mora com a chata da mãe dela e um monte de irmão vagabundo.
Sara: Mayara (Participante 196) já disse tudo. Somos uma dupla de bagunceiras. Ela
não gosta de estudar não, só de bagunçar. Ela mora com a mãe dela e um pai bêbado e
tarado. Ele só falta comer a pessoa com os olhos. Sara não gosta dele também não.
Queria que ele morresse.
Dupla 6: Camila e Daniela
Camila: Daniela (Participante 204) só passa se arrastando. Só quer saber de ouvir forró
e ir para show. Mora com os pais. O que mais? Sim, ela gosta de pânico da TV e de
assistir tudo.
Daniela: Camila (Participante 189) estuda mais ou menos. Mora com os pais e irmãos.
Gosta de internet. Sei mais não.
2) Equipe Vermelha (Moral + Empatia)
Dupla 1: Bob e Patrick
- Patrick: Este é Bob (Participante 161). Nem precisa apresentar, que todo mundo já
conhece. O CDF da sala. O que ele gosta de fazer? Gosta de conversar com os amigos
e ler. Só tira 10,0 (risos). Sim, ele mora com os pais e com duas irmãs.
- Bob: Este é Patrick (Participante 171). Ele é um cara que tira nota boa. Mora com a
mãe e uma irmã. Assim como eu, gosta de ficar na pracinha conversando com os
amigos. Assiste pouca TV, só gosta mesmo de assistir esporte espetacular.
Dupla 2: Charles e Luan
274
Charles: Este é Luan (Participante 157), ele tira nota baixa em Matemática, mas nas
outras matérias se sai bem. Gosta de assistir malhação e conversar com os amigos. Só
isso. Sim, ele mora com a mãe dele na casa da avó dele.
Luan: Este é Charles (Participante 155), gosta de ir para Lan House. Ele mora com sua
mãe e uma irmã. Se considera um aluno mais ou menos, tira notas mais ou menos.
Gosta de assistir malhação, jogos de futebol e pânico na TV.
Dupla 3: Mércia e Gabi
- Mércia: Para quem não conhece, esta é Gabi (Participante 160). Ela é inteligente na
escola, disse que era mais ou menos, mas todo mundo que a conhece sabe que é
conversa dela. Ela mora com os pais e um irmão de outro casamento do pai. Gosta de
ler romance e assistir filmes. Na TV, gosta de CIE (um programa que tem peritos que
descobre crimes), também gosta de ídolos (um programa que passa na Record, todo
mundo conhece!).
- Gabi: Esta é Mércia (Participante 165), ela é minha amigona, por isso escolhi ficar
com ela. Ela também é inteligente na escola. Sempre tira nota boa. Ela gosta de
esportes. E na TV sempre busca assistir programas de esporte e jogos, inclusive de
futebol.
Dupla 4: Regiane e Rutany
Regiane: Esta é Rutany (Participante 183). Ela gosta de se arrumar, como toda a
adolescente e sair com os amigos para show. A mãe dela sempre pega no pé dela por
causa disto e ela vive brigando com os pais (não me belisca, foi mal, eu pensei que
podia falar isso!). Sim... (cochichou com a amiga). Ela também não me deixa contar
nada! Ela gosta de assistir malhação e ir para a Lan House. Mora com a mãe e um
monte de irmão. Pronto!
Rutany: Esta é Regiane (Participante 166), uma figura da bagaceira mesmo (a amiga a
beliscou). Não estuda, vem para o colégio apenas zoar mesmo. Mora com a mãe e três
irmãos. Gosta de ir para show e assisti tudo na TV.
Dupla 5: Paulinho e Iran
Paulinho: Este é Iran (Participante 177). Ele gosta de jogar bola no meio da rua e ficar
de bobeira com os amigos. Não gosta de estudar. Estuda porque é o jeito. Gosta
mesmo é de namorar. Mora com a mãe e quatro irmãos.
Iran: Este é Paulinho (Participante 172), o cara mais bagunceiro da sala. Melhor, o
segundo mais bagunceiro da sala, porque o primeiro sou eu (sorriu). Ele não gosta de
estudar. Mas, ainda consegue tirar notas mais ou menos, o cara deve ser inteligente.
Gosta de jogar bola e quase não assisti TV.
Dupla 6: Wigna e Zaíra
Wigna: Esta é Zaíra (Participante 176). Ela é mais ou menos na escola. Em umas
disciplinas se sai bem, em outras não. Gosta de ir para Lan House e de ficar no Orkut,
MSN, Twister. Assisti tudo na Tv. Mora com a mãe e a avó.
Zaíra: Esta é Wigna (Participante 174). Ela é uma garota tímida, fala pouco. Gosta de
ficar só e assisti muita TV. Mora com o avô, a avó e uma tia. Ela disse que... posso
falar? (a menina balançou a cabeça) É que seus pais morreram em um acidente de
ônibus. Ela não lembra deles. Ela era pequena. Só tem fotos.
275
Além dessa dinâmica de apresentação, neste primeiro encontro foram escolhidos os
temas que iriam ser debatidos na intervenção. A escolha dos temas se deu a partir de uma lista
que continha 28 temas. É importante esclarecer, que essa lista continha temas que foram
sugestionados tanto pela coordenadora do grupo, quanto pelos próprios alunos. Com a lista
em mãos, os alunos foram solicitados a ler todos os temas, e, em seguida, a escolher 8 temas
que eles gostariam de discutir, tendo ciência que seriam escolhidos apenas os temas mais
votados. Os temas selecionados foram: brigas, drogas, delinqüência, aborto, roubo, ecologia,
violência e adolescência.
Terminada a reunião, lembrei os horários que nos encontraríamos novamente. E
ressaltei que o grupo azul (Condição 1 - Moral) seria em um horário diferente do grupo
vermelho (Condição 2 – Moral + Empatia).
Neste dia, também foi acordado que não seria utilizado o gravador nas reuniões.
Alguns alunos disseram que ficariam mais envergonhados e outros argumentaram que não
poderiam falar mal de ninguém, com ar de brincadeira.
Considerações pessoais
Neste primeiro encontro, os alunos se mostraram um pouco tímidos, o que parece
natural para um primeiro encontro. Mas, o objetivo principal foi alcançado, que foi motivá-los
para participar e conhecer um pouco de suas vidas. É interessante notar que uma simples
brincadeira de apresentação trouxe questões acerca dos arranjos e desarranjos familiares: “Ela
mora com a mãe dela e um pai bêbado e tarado. Ele só falta comer a pessoa com os olhos.
Sara não gosta dele também não. Queria que ele morresse”; “Mora com o avô, a avó e uma
tia. Ela disse que... posso falar? (a menina balançou a cabeça) É que seus pais morreram em
um acidente de ônibus. Ela não lembra deles. Ela era pequena. Só tem fotos”; “Ela mora com
a chata da mãe dela e um monte de irmão vagabundo”.
Um outro dado que merece ser refletido é que os alunos que disseram em seus
discursos que eram estudiosos são exatamente aqueles que revelaram um maior
desenvolvimento moral no pré-teste (Tabela 9) e os que disseram não gostar de estudar foram
os que apresentaram um menor estágio de desenvolvimento moral (Tabela 9). Outro dado
interessante, é que a forma de agrupamento obedeceu, de um modo geral, o estágio de
desenvolvimento moral e o gênero. As meninas ficaram com as meninas e os meninos com os
meninos e os mais desenvolvidos moralmente, segundo o pré-teste, e que disseram ser mais
estudiosos se uniram em duplas e os menos desenvolvidos moralmente, segundo o pré-teste, e
os que disseram ser menos estudiosos (e bagunceiros) também se uniram em duplas. O
desafio será mesclar essas duplas e quebrar a união por gênero nas próximas intervenções. Os
temas escolhidos também se revelaram interessantes. Agora é correr contra o tempo, para
escolher os dilemas, os filmes e vídeos do youtube que sejam congruentes com os temas.
276
07/08 – Reunião 01
Nessa reunião apresentei o cronograma de atividades, juntamente com os temas mais
votados; e disse que começaríamos o debate naquele dia e o tema seria Briga. Distribui o
dilema entre os participantes, pedi que eles o lessem em trio e, depois, respondessem as
perguntas. Dessa vez, eu mesma me encarreguei de distribuir os participantes nos grupo, um
de cada estágio de desenvolvimento moral.
Condição 1: Técnica “racional-discursiva”
Tema: Brigas
Recurso: Dilema escrito: Provocações
Técnica: Discussão de dilema moral
Os participantes, após tentarem entrar em um consenso para responder as perguntas,
foram convidados a apresentar a solução do Dilema ao grande grupo. Como existiam pessoas
de diferentes níveis de desenvolvimento moral nos grupos, houve muita discordância e, em
alguns grupos, não houve consenso, o que eles fizeram foi expor a opinião da maioria, já que
o grupo era formado por três pessoas. Notou-se nas falas da maioria dos participantes um
discurso repleto de agressividade: “O que nós decidimos foi que para que uma pessoa parasse
de provocar, deveríamos nos reunir e meter a porrada. Duvido que ele viria novamente
provocar. ___ não concordou muito com isso, mas como eu e ___ pensa assim, ela teve que
aceitar (risos)”. Ao apresentarem esse tipo de argumento, foi perguntado ao grupão quem
concordava. Poucos alunos discordaram. Os que discordaram foram convidados a exporem as
suas opiniões. Isto gerou muito debate.
Condição 2: Técnica “racional-afetiva”
Tema: Brigas
Recurso: Dilema escrito: Provocações
Técnicas: Discussão de dilema moral
Técnica do Psicodrama: Role-playing/Inversão de papéis (role reversal)
De forma semelhante ao que aconteceu no outro grupo experimental, a presença de
pessoas de diferentes níveis de desenvolvimento moral no pequeno grupo gerou muitas
discordâncias e a idéia que dei foi que votassem e assumissem um posicionamento. A
agressividade também estava presente no discurso dos participantes: “Acho divertido a
provocação... o que seria do mundo sem brigas? (risos), mas o pessoal do meu grupo não
acha...uma das meninas disse que ela soube que um tio dela, que mora no Rio, morreu em um
briga porque foi revidar a provocação”. De forma semelhante ao que fiz no outro tipo de
intervenção, pedi para que aqueles que eles expusessem os argumentos favoráveis e
desfavoráveis ao ato de revidar as provocações, o que gerou muito debate.
Nesse grupo, tive que cortar o debate e propus que o mais “afoitinho” em seu debate
favorável a retaliação interpretasse uma cena de briga. O outro personagem (o que mata) foi
interpretado por um aluno que estava discordando da retaliação. Sugeri o caso do tio da
menina, após a autorização da garota. Ela contou como foi e eles reviveram a cena. Após a
277
interpretação em que o “afoitinho” representou o tio da menina e “morreu”, foi perguntado:
como foi se colocar no lugar do tio dela? “Rapaz, não é muito bom morrer não, acho que
minha mãe iria ficar muito triste”. Também perguntei ao que mata, como foi se colocar no
lugar do matador e ele disse: se eu já não concordava com briga, agora que não concordo
mesmo, fiquei pensando se isto fosse de verdade, eu poderia ser preso, perderia toda a minha
vida, por uma bobagem... e o cara que morreu? Acho que não dormiria direito nunca mais,
lembrando da cena. Deus me livre!”
Considerações pessoais
Neste primeiro dia de intervenção já ficou muito claro para mim a importância dessa
proposta de intervenção. Os adolescentes parecem cultuar o ato de violência e a Lei de Talião.
O que será da humanidade, se isto vira uma regra? Penso que a técnica de intervenção
conseguiu mexer com alguns deles. Agora, o tempo no grupo que se submete a técnica
“racional-afetiva” me pareceu muito curto. Tive que cortar o debate, o que achei uma lástima.
Mas, por outro lado, a técnica de psicodrama parece que substituiu, com louvor, a continuação
do debate. Na verdade, eles continuaram debatendo, só que desta vez, com a ajuda de uma
situação mais concreta, além de poderem também exercitar a idéia de se colocar no lugar do
outro.
14/08 – Reunião 02
Neste encontro informei que continuaríamos debatendo acerca do tema Brigas, só que
dessa vez iríamos usar um vídeo para suscitar o debate. Perguntei o que eles acharam do
encontro passado.
Condição 1: Técnica “racional-discursiva”
Tema: Brigas
Recurso: Vídeo do Youtube: “Olho por olho, dente por dente”
Técnica: Discussão de dilema moral
Os participantes disseram que gostaram muito do encontro passado e que continuaram
no intervalo das aulas conversando sobre o assunto.
Após assistirem o vídeo do Youtube, os participantes foram convidados a debaterem
acerca do que viram. Pedi que eles se reunissem com o mesmo grupo da aula anterior para
debater. Depois pedi que a sala se dividisse em dois grandes grupos: os que concordavam com
a lei “olho por olho, dente por dente” e os que não concordavam. Percebi que alguns deles
278
mudaram de “time”: alguns que estavam bastante agressivos na aula passada, disseram que
mudaram, em certo sentido, de opinião: “Eu acho que a pessoa tem que revidar, algumas
vezes, mas nem sempre é necessário. Aí mesmo nesse filme, não precisava disso tudo, por
isso vim para esse grupo”. O debate foi posto e os grupos foram convidados para listarem seus
argumentos no papel e depois exporem ao grande grupo.
Condição 2: Técnica “racional-afetiva”
Tema: Brigas
Recurso: Vídeo do Youtube: “Olho por olho, dente por dente”
Técnicas: Discussão de dilema moral
Técnica do Psicodrama: Role-playing/Inversão de papéis (role reversal)
Os participantes afirmaram estarem gostando do encontro e um deles disse que tinha
sonhado com uma briga e que ele dizia ao que estava provocando que não era assim que se
resolviam as coisas.
Depois de assistirem o vídeo do Youtube, os mesmos procedimentos utilizados no
grupo anterior foram utilizados, ou seja, reunião com os mesmos trios e depois divisão da
turma em dois grandes grupos. De forma semelhante ao que aconteceu no outro grupo de
intervenção, alguns tinham mudado de idéia quanto a lei da retaliação, um desses afirmou: “é
que quando é na vida real, a coisa é diferente... dois boys, o pau rola. Mas, no caso do vídeo
que é um casal. Não precisava descontar desse jeito. Além disso, eles já são grande”.
Mais uma vez, interrompi o debate para fazer uma dinâmica. Pedi para eles
reproduzirem a cena vista e, em seguida, solicitei que eles trocassem de papel. Desta vez,
participaram dois alunos (um casal) que não havia participado na aula anterior. Depois das
duas cenas, eles disseram como era fazer um personagem e depois como era fazer o outro.
Mais uma vez eles relataram o desconforto que é sofrer a agressão.
Considerações pessoais
Neste encontro, a mudança de opinião de alguns alunos me chamou atenção, no
sentido de que a aplicação da lei da retaliação parece ser contextual e influenciada pela
familiaridade do evento. Quando a briga envolvia pares (debate elencado na Reunião 1), eles
demonstraram ser mais agressivos. Mas, quando a confusão envolveu um casal adulto, alguns
deles mudaram de opinião dizendo que o caminho não era aquele.
Outro ponto que me chamou atenção foi o fato de um dos alunos ter relatado que
sonhou, o que faz supor que os encontros têm mexido de fato com eles.
279
21/08 – Reunião 03
Nesta reunião pedi que eles se organizassem em duplas. Dessa vez, tentei organizá-los
de modo que sempre um de estágio mais avançado ficasse com outro de estágio menos
avançado. Pedi para eles ler os dilemas e responder as questões buscando chegar a uma única
resposta. Lembrei que dessa vez, um teria que convencer o outro, pois não havia mais o
processo de votação.
Condição 1: Técnica “racional-discursiva”
Tema: Brigas
Recurso: Dilema escrito: Maiores x Menores
Técnica: Discussão de dilema moral
A confusão foi maior do que nunca em alguns grupos, pois ninguém queria ceder e
escrever a opinião do outro. Uma dupla chegou com o papel em branco porque nenhum dos
dois cedeu. Existiam os que defendiam a questão da hierarquia. Um deles relatou o caso de
sua comunidade em que quem manda é o traficante grande e os pequenos têm que obedecer
mesmo. O debate suscitou naturalmente. Tive que intervir com mais seriedade porque estava
virando era um briga de verdade. Os levei a refletir sobre como é difícil fazer acordos e sobre
a questão da hierarquia, que pode acontecer sem precisar apelar para a violência por
intermédio do respeito (este discurso foi de uma das alunas que eu reforcei).
Condição 2: Técnica “racional-afetiva”
Tema: Brigas
Recurso: Dilema escrito: Maiores x Menores
Técnicas: Discussão de dilema moral
Técnica do Psicodrama: Role-playing/Inversão de papéis (role reversal)
Do mesmo jeito que aconteceu no grupo anterior, houve resistência por parte de alguns
alunos em ter que ceder a opinião do outro.
Pedi que outros dois voluntários representassem uma cena e depois invertessem os
papéis, problematizando a questão dos mais velhos x os mais novos. Dessa vez, perguntei se
algum deles já tinha vivenciado algo parecido, ou como autor da agressão ou como vítima.
Uma aluna disse que já foi vítima disso quando era pequena e que não quis mais ir para uma
escola por causa disso. Debatemos sobre seus sentimentos em relação a isto (ela se
emocionou). Outro aluno, disse que já fez muito pirralho sofrer, como seu irmão. E que acha
que fez aquilo por causa da influência dos amigos.
Considerações pessoais
Achei muito rica a discussão, dessa vez amarrei, de forma mais explícita, a discussão
em argumentos morais mais avançados, reforçado a opinião daqueles que demonstraram um
raciocínio mais avançado, já que esta era nossa última reunião sobre o tema Brigas.
280
Sobre a técnica de psicodrama utilizada no grupo 2, o debate conseguiu suscitar
questões pessoais e emocionar alguns com o depoimento da colega e levou um dos alunos a
refletir sobre a sua própria ação enquanto agressor.
28/08 – Reunião 04
O tema mudou para drogas e, dessa vez, com o uso de um filme muito forte chamado
“Bicho de sete cabeças”. Após assistirmos trechos do filme, abri a discussão no grupão e pedi
a opinião deles acerca do uso de drogas.
Condição 1: Técnica “racional-discursiva”
Tema: Drogas
Recurso: Filme: Bicho de sete cabeças
Técnica: Discussão de dilema moral
Como eu já esperava, existia um grupo que fazia apologia a liberação do uso de
maconha, o que gerou muita discussão. A questão principal foi: liberdade individual x
liberdade coletiva. As pessoas têm o direito de fumar sua maconha desde que não atinjam as
outras pessoas? Mas, será que isto é possível? Se uma pessoa compra maconha para fumar na
tranqüilidade em sua casa, ela não estará ajudando a manter o tráfico? Outro ponto de debate
foi à questão do vício: vicia ou não? E se vicia, a pessoa vai para um hospital psiquiátrico?
Ainda se questionou: A maconha é o caminho para as outras drogas? Houve nessa seção mais
questionamentos do que respostas.
Condição 2: Técnica “racional-afetiva”
Tema: Brigas
Recurso: Filme: Bicho de sete cabeças
Técnicas: Discussão de dilema moral
Técnica do Psicodrama: Carta
As questões suscitadas no filme foram muito semelhantes a do grupo 1. Houve
também mais questionamentos por parte dos alunos do que respostas.
No segundo momento da reunião, pedi que eles escrevessem uma carta, caso eles
tivessem no lugar do ator Rodrigo Santoro e, depois, a lesse para o grupo (quem quisesse). O
teor da carta era o mesmo da discussão: até que ponto pode chegar a liberdade de uma pessoa?
A minoria deles defendia a liberdade individual e a maioria deles diziam estar arrependidos de
terem usado drogas e lamentavam a sua situação naquele terrível manicômio. Uma das cartas
me chamou atenção, porque parecia que era do próprio aluno. Ele fugiu completamente do
contexto do filme e relatou o que parecia está vivendo: “às vezes, acho muito legal ficar
doidão, é uma fuga muito massa; mas, as vezes, faço as pessoas sofrerem com isso, como
281
minha mãe, quando eu pego as coisas. Ela tem que trancar os móveis com cadeado. Ela não
merece este sofrimento, nem eu”.
Considerações pessoais
Desconfio que alguns usam drogas. E que, de fato, mexi com um conflito pessoal. Me
senti muito desgastada emocionalmente no final desse encontro. Existe sempre uma
preocupação em reforçar os argumentos mais elevados e, quando o aluno está falando, já fico
pensando: que estágio é este? É um esforço mental demasiadamente grande. Além disso, se
aproximar desses adolescentes e saber que a droga é uma realidade e não apenas um filme em
suas vidas, me deixou um pouco angustiada, sem saber o que fazer, sem saber qual é o meu
papel ali.
04/09 – Reunião 05
Comecei a reunião perguntando como eles estavam e disse que iria mostrar outro
vídeo. Este vídeo mostra cenas muito fortes. Uma inclusive aparece os meninos pelados em
uma instituição de re-socialização. Mostra as diferentes facetas da droga e revela como o
usuário sustenta o crime, como acontece a guerra do tráfico. A discussão foi aberta para o
grupão. Mais uma vez muitos questionamentos. Dessa vez, os defensores das drogas ficaram
mais tímidos porque estavam lutando contra um documentário, que mostra vidas reais e
pessoas reais se destruindo.
Condição 1: Técnica “racional-discursiva”
Tema: Drogas
Recurso: Vídeo do Youtube: Notícias de uma guerra
Técnica: Discussão de dilema moral
Como já foi dito na introdução, emergiram muitos questionamentos e os defensores
das drogas ficaram mais calados. Uma das alunas até brincou com o silêncio dos “defensores”
e disse: “Estão calados... é porque contra fatos não existe argumentos!”
Condição 2: Técnica “racional-afetiva”
Tema: Drogas
Recurso: Vídeo do Youtube: Notícias de uma guerra
Técnicas: Discussão de dilema moral
Técnica do Psicodrama: Bonecos/Máscara
De forma semelhante ao que aconteceu no grupo anterior, o documentário silenciou
aqueles que faziam apologia as drogas.
282
Desta vez, trouxe duas opções para os alunos: fantoches e máscaras, e pedi que eles
escolhessem um tipo de estratégia para trabalhar. Eles preferiram os fantoches. Pedi que eles
escolhessem uma cena do documentário pra reproduzir com os fantoches. Eles acabaram
inventando uma. Quando eles acabaram a cena que tinha o depoimento de um usuário de
drogas, perguntei como era ser aquela pessoa ao “ator”, enquanto ele estava ainda atrás dos
panos do teatro de fantoche. Ele disse: “É triste, é um vazio danado. Sem futuro. O futuro de
drogado só é dois: cadeia ou morte”. Uma menina disse que o irmão dela usava droga e estava
no CEA porque roubou uma carteira de um policial (ele não sabia que ele era policial, tava
muito doidão). “Ele lá, é feito de mulherzinha. Ele só usava drogas e lá tem menino bandido
de verdade. Meu irmão é um coitado, acabou com a vida. Mas, ele é tão viciado que ainda me
pede para arrumar dinheiro para ele conseguir droga. Não aprende não”.
Considerações pessoais
Considero o filme um bom suscitador de conflitos morais. É uma boa estratégia,
principalmente quando ele traz fatos da realidade. Mais uma vez, a técnica de psicodrama
mostrou sua riqueza, sensibilizando as pessoas a sentirem a dor do outro e, até mesmo, a sua
própria dor, como foi o caso da menina que deu o relato do seu irmão. Nesta reunião, eu me
coloquei a disposição deles se eles quisessem conversar depois pessoalmente. Disse que eu
era psicóloga e podia ouvi-los de forma sigilosa, caso eles quisessem “desabafar”; também
falei que sabia que aquelas reuniões poderiam mexer com seus sentimentos, mas, a idéia das
reuniões não era trazer sofrimento, mas sim crescimento na forma de vê o mundo.
11/09 – Reunião 06
Nesta reunião foi apresentado um dilema escrito e os participantes foram solicitados a
se organizarem em duplas e, em seguida, a debaterem suas respostas.
Condição 1: Técnica “racional-discursiva”
Tema: Delinqüência
Recurso: Dilema escrito: Traficante de drogas
Técnica: Discussão de dilema moral
A questão principal do dilema foi o problema da tortura. Mais uma vez, alguns
defenderam a tortura, alguns com argumentos mais elaborados (“Para o bem geral da
sociedade, pode ser até aceitável”), outros com argumentos menos evoluídos (“Deve-se bater
em bandido mesmo”). Uma aluna levantou a idéia de que pode-se negociar de outras formas,
como o afrouxamento da pena. Perguntei o que eles achavam dessa solução. Sobre a terceira
questão do dilema, aqueles que afirmaram que deveriam torturar os 50, mesmo sabendo que
poderia ter inocentes, a mesma aluna levantou a questão: e se você fosse um traficante
inocente, você queria? Ele disse que sim.
283
Condição 2: Técnica “racional-afetiva”
Tema: Delinqüência
Recurso: Dilema escrito: Traficante de drogas
Técnicas: Discussão de dilema moral
Técnica do Psicodrama: Câmara lenta
De forma semelhante ao grupo anterior, houve argumentos mais elaborados e outros
menos elaborados que sempre estavam sendo problematizados por mim.
A dinâmica do psicodrama utilizada foi a da câmara lenta. Os alunos foram
convidados a contracenarem e, cada um, recebeu um papel com um símbolo que significava
inocente ou culpado. Existia um torturador e todos eram traficantes. A cena foi elaborada em
tempo real, depois foi pedido que eles repetissem a cena em câmara lenta. No final, foi
revelado quem era inocente e quem era culpado. Depois eles foram convidados a dizerem o
que sentiram se colocando no lugar dos personagens. Alguns que representavam os inocentes,
disseram que se sentiram muito injustiçados. Outros que representavam os culpados, disseram
que a tortura é muito ruim até para quem é culpado. Teve um aluno que disse que ficou sem
ar, lembrando de um filme em que a pessoa era torturada com um saco.
Considerações pessoais
Achei interessante a fala de uma aluna do grupo 1, que mesmo não tendo a empatia
sendo trabalhada em seu grupo, fez uma colocação que demonstra um bom desenvolvimento
desta: “e se você fosse inocente?” Mas, por outro lado, o rapaz que foi questionado, não
abstraiu como ela queria e disse: deveria ser torturado. Será que em um processo de
sensibilização, em que ele sentisse “na pela” a tortura, ele não mudaria de idéia?
No grupo 2, o exercício que começou com ar de brincadeira, parece que os
sensibilizou de alguma forma. Um dos alunos relatou até que ficou sem ar, durante a cena.
18/09 – Reunião 07
Hoje passei cenas do filme “Última parada: 174”, o que gerou muita polêmica, pois
existe um número significativo de aluno que são bastante severos com “bandidos”. A
discussão do filme foi realizada no grupão.
Condição 1: Técnica “racional-discursiva”
Tema: Delinqüência
Recurso: Filme: Última parada: 174
Técnica: Discussão de dilema moral
284
O filme, conforme eu imaginava, gerou muita polêmica, principalmente porque foi
baseado em um caso real, que chocou a população. Alguns disseram que foi bom vê o filme
porque conheceu o outro lado da vida do seqüestrador do ônibus, que a TV não mostrou.
Utilizei os procedimentos normais da técnica de Kohlberg, problematizando a discussão e
reforçando o discurso mais avançado.
Condição 2: Técnica “racional-afetiva”
Tema: Delinqüência
Recurso: Filme: Última parada: 174
Técnicas: Discussão de dilema moral
Técnica do Psicodrama: Cena de Julgamento
O debate também gerou muitas polêmicas, mas tenho percebido que a ênfase em um
discurso punitivo não é tão grande neste grupo quanto no outro.
Utilizamos a técnica da Cena Julgamento do Psicodrama, em que os participantes
formaram um Juri popular para julgar o caso, convidei um aluno que tem um excelente poder
de persuasão para ser o advogado (Estágio 5), um aluno que sempre defende a punição para
ser o réu (o seqüestrador) e uma aluna se candidatou para ser a promotora e outra para ser a
juíza. Foi muito interessante vê-los atuando. Todos se envolveram com a técnica. Os jurados
faziam anotações e os advogados utilizaram cenas do filme para defender seu cliente. Neste
caso, fizemos uma adaptação da história, imaginamos que o seqüestrado tivesse sobrevivido.
O veredito final foi: condenado a 10 anos de prisão, com 5 anos de serviços prestados a
comunidade, tendo que voltar a estudar e fazer aulas de música para desenvolver sua
habilidade no Rap. Quando o personagem que fez o réu foi perguntado sobre como foi se
colocar no lugar do rapaz, ele disse: “Fica mais fácil de entender ele agora. Pensar sobre o que
ele viveu é diferente de sentir, de ser ele por alguns minutos. Mas, de qualquer forma, ele tem
que pagar pelo o que fez, mas esta pena deveria ajudá-lo a construir uma nova vida. Algumas
pessoas só precisam de uma oportunidade. Outras não, são ruins mesmo e parece que não têm
jeito (risos)”
Considerações Pessoais
Uma questão que tenho percebido é que os participantes mais punitivos são os do
estágio 4, eles são muito legalistas e radicais: é assim e acabou-se. Tenho observado discursos
mais evoluídos entre os participantes do estágio 3 do que os do estágio 4, quando o tema é
“presos” e “punições”.
Outro ponto é que tenho notado um discurso mais punitivo entre os participantes do
grupo 1, do que entre os participantes do grupo 2. Será que as técnicas de psicodrama têm
conseguido sensibilizar esses alunos?
Sobre o Julgamento, achei muito legal vê-los, dessa vez, mais civilizados para entrar
em um acordo. Adorei a idéia de fazer o réu estudar e ser colocado para estudar Rap. A
discussão foi mais profunda do que eu pensava. Eles refletiram sobre o sistema carcerário e
deram uma segunda chance para o réu recomeçar a vida. Muito interessante também foi vê o
que o rapaz que interpretou o réu, defendendo o réu. Ele que é tão punitivo, fez colocações na
defesa do réu e sensibilizou os jurados. Ele foi até mais significativo na escolha pela
condenação do que o próprio advogado de defesa. E sua colocação sobre o fato de se colocar
285
no lugar do outro, me fez refletir como a dramatização é um técnica interessante para
desenvolver a empatia: “pensar sobre o que ele viveu, é diferente de sentir”
25/09 – Reunião 08
Neste encontro, apresentei um vídeo do youtube que questiona a eficácia da pena de
morte. A partir desse vídeo, levantou-se a discussão sobre o tema. Pedi que a sala se dividisse
em dois grupos, os favoráveis e os desfavoráveis e que cada um lançasse seus argumentos.
Ainda foi lançada a proposta de um terceiro grupo “favorável, em certas situações”. Esta
proposta foi lançada no grupo 1 e eu já cheguei com a sugestão no grupo 2 da formação de
três grupos.
Condição 1: Técnica “racional-discursiva”
Tema: Delinqüência
Recurso: Vídeo do Youtube: campanha contra a pena de morte
Técnica: Discussão de dilema moral
Neste grupo, 7 participantes foram contrários a pena de morte, 1 favorável em
qualquer situação e 4 favoráveis em crimes graves. Mas, após o debate, 1 participante tornouse contrário a pena máxima.
Condição 2: Técnica “racional-afetiva”
Tema: Delinqüência
Recurso: Vídeo do Youtube: campanha contra a pena de morte
Técnicas: Discussão de dilema moral
Técnica do Psicodrama: Carta
Neste grupo, inicialmente, 8 participantes foram contrários a pena de morte e 4
favoráveis em crimes graves. No final da sessão, apenas 1 mostrou-se favorável a pena de
morte em situação de crime grave.
Quanto a técnica de psicodrama, foi pedido para que os participantes se imaginassem
como um condenado. Foram sorteadas as seguintes situações para que eles se colocassem no
lugar de um condenado que cometeu crimes graves e escrevessem uma carta: 1) condenado
inocente; 2) condenado com problemas psiquiátricos; 3) condenado por matar dezenas de
pessoas (foram crimes encomendados por um ricaço não identificado); 4) condenado culpado.
Infelizmente, não deu tempo de todos os participantes lerem as cartas.
Considerações pessoais
Achei muito interessante a mudança de lado de alguns participantes após a
intervenção. Mas, o mais interessante foi a mudança de discurso de alguns deles acerca da
pena de morte. Note-se que, em termos numérico, a mudança mais significativa foi no Grupo
2.
286
02/10 – Reunião 09
Neste encontro, ainda tendo como grande tema a questão da delinqüência, teve-se
como sub-tema o problema da redução da maioridade penal. Após ser mostrado o vídeo,
abriu-se a discussão. Desta vez, eu perguntei quem era a favor e quem era contra e organizei o
grupo no sentido inverso, ou seja, aqueles que eram favoráveis deveriam, mesmo sem
concordar, elaborar argumentos para a não redução da maioridade penal em conjunto, depois
expor para o grande grupo; e, aqueles que eram desfavoráveis deveriam defender a redução.
Foi apenas uma tentativa de fazê-los pensar o outro lado.
Condição 1: Técnica “racional-discursiva”
Tema: Delinqüência
Recurso: Filme: Redução não é a solução
Técnica: Discussão de dilema moral
Os adolescentes são muito empolgados... tão empolgados que acabaram defendendo
com tanto gosto a opinião contrária a sua que até parecia que eles acreditavam naquilo. No
final, fiz uma síntese dos argumentos no quadro e os problematizei com a ajuda de todos.
Condição 2: Técnica “racional-afetiva”
Tema: Delinqüência
Recurso: Filme: Redução não é a solução
Técnicas: Discussão de dilema moral
Técnica do Psicodrama: Cena de Julgamento
Para debater a questão da redução utilizou-se a mesma estratégia utilizada no grupo 1.
Mas, após o debate, foi realizado mais um julgamento. Desta vez, o réu era um adolescente.
Em seguida, foi perguntado se ele deveria ir para uma instituição de medida socioeducativa ou
para um presídio comum. Também foi pedido para os adolescentes que eles se imaginassem
indo para um presídio por ter cometido um crime. Como seria? Uma das alunas retomou a
história do seu irmão que está no CEA em detrimento a drogas, ela disse que se já é ruim uma
instituição de medida sócio-educativa, imagina um presídio de verdade, onde tem todo o tipo
de pessoas?
Considerações pessoais
Penso que tenha tido mudança entre os participantes. Mas, já me sinto cansada dessa
rotina de ter que preparar material semanalmente. Por outro lado, o cansaço vai embora
quando os vejo crescendo e fazendo comentários dos quais eles mesmo se impressionam.
Desde a primeira vez que tive contato com a leitura de Kohlberg, me senti instigada a realizar
uma intervenção. E, só agora no doutorado estou podendo realizá-la. Eu pensava que dava
trabalho. Mas, o trabalho é infinitamente maior do que eu imaginava. Principalmente na hora
da intervenção em que se mapeiam os estágios e há um esforço mental para tentar fazê-los
entrar em conflito. Que pergunta utilizar? Antes era pior, pois eram todos contra um. Ou
287
melhor, contra eu e uns três alunos que pensavam de forma mais evoluída... quem sempre dá
mais trabalho são os mais legalistas (estágio 4), que até possuem argumentos interessantes,
mas não se permitem enxergar o outro lado.
09/10 – Reunião 10
Voltamos a utilizar um dilema escrito. Pedi para eles se organizarem em trios. Um de
cada estágio. Se bem, que eu acho que alguns já mudaram de estágio. Depois fizemos uma
discussão geral.
Condição 1: Técnica “racional-discursiva”
Tema: Roubo
Recurso: Dilema escrito: O supermercado
Técnica: Discussão de dilema moral
Neste encontro, logo de início, os argumentos do estágio 4 e 3 entraram em conflito. O
que vale mais, uma amizade ou a lei? Mas, depois de muito “bate-boca” essas idéias se
uniram em uma única idéia: “Por meio da amizade, ele conversa com seu Jacinto e diz que ele
não pode fazer aquilo e pede que ele devolva o produto. Faz uma campanha para ajudá-lo com
os seus colegas de trabalho. Caso seu patrão fosse compreensível, ele informaria ao patrão e
pediria que ele fizesse um “bico” no final de semana, como forma de se desculpar pelo
roubo”.
Condição 2: Técnica “racional-afetiva”
Tema: Roubo
Recurso: Dilema escrito: O supermercado
Técnicas: Discussão de dilema moral
Técnica do Psicodrama: Fantasia dirigida
O debate neste grupo também caminhou para uma solução apaziguadora, em que não
se deixou o ladrão impune, sendo chamado para conversar. Mas, também propuseram o ajudar
com uma quantia em dinheiro, que seria paga com o trabalho de seu Jacinto no supermercado
(algo leve, como empacotador, já que ele é aposentado).
A dinâmica foi realizada com a reprodução da cena em que se propunham vários
finais. E, o mais votado foi o explicitado no parágrafo anterior.
288
Considerações pessoais
Os alunos, no caso do dilema do roubo, parecem ter chegado em um mesmo nível de
elaboração moral. Será que não há diferença entre as técnicas? Por outro lado, quando os
temas são mais polêmicos, como pena de morte e redução da maioridade penal, o esforço de
se colocar no lugar do outro (sempre realizado pelos integrantes do Grupo 2, que já dizem um
para o outro – se coloca no lugar dele!) parece fazer a diferença na tomada de decisão. Além
disso, tenho a impressão que os alunos do grupo 2, chegaram muito mais rápido a solução
final do que os do grupo 1.
16/10 – Reunião 11
O dilema escrito foi apresentado aos estudantes e foi debatido em quartetos. Depois foi
colocado para o grupão as opiniões.
Condição 1: Técnica “racional-discursiva”
Tema: Aborto
Recurso: Dilema escrito: Aborto
Técnica: Discussão de dilema moral
O debate foi muito diversificado de opiniões. Desta vez o discurso religioso apareceu
com veemência. A questão do valor da vida também foi colocado em cheque. Muita
desinformação foi mostrada. Eles não conhecem o que a lei brasileira diz sobre o aborto e tem
informações distorcidas sobre a posição da igreja quanto a isto.
Condição 2: Técnica “racional-afetiva”
Tema: Aborto
Recurso: Dilema escrito: Aborto
Técnicas: Discussão de dilema moral
Técnica do Psicodrama: Role-taking e Inversão de papéis (role reversal)
A questão da desinformação também apareceu neste grupo, o debate religioso foi
acirrado e a questão do direito a vida também foi problematizada.
Quanto à técnica de inversão de papéis, dois participantes que diziam não ter opinião
formada sobre o assunto foram solicitados a realizar uma cena em que trocavam de papéis
(mãe- bebê). No primeiro momento, a mãe estava decidida a fazer o aborto e o bebê tinha que
convencê-la do contrário. No segundo, a mãe tinha que convencer o bebê que o aborto era o
melhor para ele. Nos dois casos, pedi aos participantes que estavam na platéia que gritassem
as falas dos personagens segundo o que eles acreditavam (como se eles fossem as vozes na
mente), como exemplo: “Bebê diz a mãe que se ela fizer isso você não terá a oportunidade de
289
amá-la”; “Mãe, diz ao bebê que se você não abortar, ela terá que conviver com um rosto
parecido com o da pessoa que a violentou”’. Foram cenas muito fortes, em que percebi que
alguns estavam emocionados.
Considerações pessoais
Acho que hoje eu não fui muito eficaz nas minhas intervenções na parte da discussão
do dilema e eu sei exatamente o motivo. É que eu não tenho uma idéia muito bem definida
sobre o tema aborto. Ele ainda é muito confuso em minha cabeça. Neste sentido, meu papel
foi mais de dizer: “e você o que acha do que fulaninha falou?”; “você concorda com ela?”; “e
se o caso fosse de um estupro?”. Ou seja, de simplesmente problematizar ao invés de reforçar
argumentos.
No que se refere ao psicodrama, acho que ele foi muito rico. Mas, por outro lado, não
acho que ele foi muito esclarecedor. Na verdade, bagunçou mais a minha cabeça do que a
organizou. Talvez os alunos tenham tido a mesma sensação.
23/10 – Reunião 12
O filme apresentado problematiza a questão da legalização do aborto e mostra a
realidade, em forma de documentário, das maternidades públicas que atendem mulheres
vítimas de estupro e que interrompem a gravidez de forma clandestina. Após a apresentação
do filme, foi aberto o debate no grupão.
Condição 1: Técnica “racional-discursiva”
Tema: Aborto
Recurso: Filme: O aborto dos outros
Técnica: Discussão de dilema moral
A questão da legalização do aborto dividiu opiniões. Na verdade, penso que a questão
não está muito bem amadurecida na cabeça de ninguém. A diferença de desenvolvimento
moral só apareceu quando alguns disseram que a gravidez iria fazer a menina perder a vida
dela, iria perder as festas (de forma bem hedonista), por isso deveria legalizar. Tentei
trabalhar este tipo de argumento, fazendo-os refletir que a falta de diversão não justifica a
legalização de um aborto.
Condição 2: Técnica “racional-afetiva”
Tema: Aborto
Recurso: Filme: O aborto dos outros
Técnicas: Discussão de dilema moral
290
Técnica do Psicodrama: Fantasia dirigida
Argumentos hedonistas também apareceram neste grupo, o que é altamente
compreensível em um grupo de adolescentes.
Sobre a técnica do psicodrama, criou-se duas cenas: uma situação em que uma
adolescente engravida porque não tomaram as devidas precauções...e, o final é dirigido em
dois sentidos: abortar e não abortar; e uma cena em que a garota é estuprada...com também
dois finais. Após o término da cena, pedi que os participantes relatassem como foi ser aqueles
personagens e o que eles sentiram.
Considerações pessoais
Acho que fui mais útil neste encontro acerca do aborto do que no anterior. Desta vez,
encontrei um ponto para ser trabalhado: o hedonismo! E, tentei descentrá-los do seu próprio
eu.
30/10 – Reunião 13
Nesta reunião foi apresentado um vídeo do youtube que problematiza a questão do
aborto; mais precisamente, a questão do valor da vida. Na verdade, uma tentativa de reflexões
voltadas para o estágio 5.
Condição 1: Técnica “racional-discursiva”
Tema: Aborto
Recurso: Vídeo do Youtube: Aborto x Vida
Técnica: Discussão de dilema moral
A discussão voltou-se para o Direito a vida. Foi um debate muito filosófico, em que se
questionou muito acerca de quando começa a vida.
Condição 2: Técnica “racional-afetiva”
Tema: Aborto
Recurso: Vídeo do Youtube: Aborto x Vida
Técnicas: Discussão de dilema moral
Técnica do Psicodrama: Carta
A discussão também gerou em torno do direito a vida e das questões filosóficas
existentes. Houve também a técnica da carta em que se pedia que os participantes
escrevessem uma carta, como se fosse o bebê e outra como a mãe do bebê.
291
Considerações pessoais
A discussão de hoje parece que não foi alcançada por todos. Foi demasiadamente
filosófica e em um nível de abstração que nem todos parecem alcançar.
06/11 – Reunião 14
Finalmente, mudou-se o tema. Desta vez, um tema mais leve: Ecologia. Foi
apresentado aos alunos o divulgado dilema da Capivara de Ângela Biaggio e colaboradores.
Eles foram convidados a se reunir em quartetos, depois a se unirem em um grande grupo.
Condição 1: Técnica “racional-discursiva”
Tema: Ecologia
Recurso: Dilema escrito: dilema da capivara
Técnica: Discussão de dilema moral
O debate, desta vez, foi mais consensual. Houve uma concordância, quase unânime de
que se caçar para comer é aceitável, mas caçar para se divertir não.
Condição 2: Técnica “racional-afetiva”
Tema: Ecologia
Recurso: Dilema escrito: dilema da capivara
Técnicas: Discussão de dilema moral
Técnica do Psicodrama: Personificação
De forma semelhante ao que aconteceu no grupo anterior. O debate foi mais
consensual e houve uma concordância em defesa dos animais.
A técnica de psicodrama foi demasiadamente descontraída. A proposta era que um
fizesse o papel da capivara e outro do caçador. Mesmo em meio a risadas, tentei fazê-los se
colocar no lugar do animal que morria. O que fez o papel da capivara, comentou que animal
também é uma vida e a sensação de está sendo perseguido para morrer não é nada bom. Ele
comparou a sensação a um filme em que se existe perseguição e a pessoa fica sem fôlego e a
um sonho em que a pessoa sonha que está sendo seguida e acorda aperreada.
Considerações pessoais
A reunião de hoje foi mais tranqüila que as demais em termos de debates. Houve um
maior consenso entre as respostas acerca do tema ecologia. Em função disso, fiquei pensando
292
se este tema não deveria ter vindo antes, já que é um tema mais “light”. Fica, então, esta
questão para ser considerada no planejamento da próxima intervenção!
13/11 – Reunião 15
A reunião agora contou com um recurso visual e que deixou as pessoas inquietas em
suas carteiras. O debate foi realizado no grande grupo.
Condição 1: Técnica “racional-discursiva”
Tema: Ecologia
Recurso: Vídeo do Youtube: Maltrato de animais
Técnica: Discussão de dilema moral
A questão levantada foi sobre o fato das pessoas (racionais) maltratarem os animais
irracionais. Problematizei a questão de alguns deles não aceitarem a morte de um animal, mas
aceitarem a pena de morte, redução da maioridade penal e aborto.
Condição 2: Técnica “racional-afetiva”
Tema: Ecologia
Recurso: Vídeo do Youtube: Maltrato de animais
Técnicas: Discussão de dilema moral
Técnica do Psicodrama: Personificação
A discussão foi conduzida na mesma direção do grupo anterior. Sobre a técnica de
psicodrama, as brincadeiras continuaram, o que é natural em um grupo de adolescentes. Pedi
para que também interpretassem a caça de um ser humano criminoso. Neste caso, o caçador
disse que não sentia pena. A justificativa dada foi que ele é racional e o animal não. Um aluno
perguntou ao caçador: “qual é a diferença do criminoso que mata e do caçador que mata o que
matou? Todos não são assassinos? Justifica matar alguém por vingança? Resolve o problema?
Que racionalidade há quando você diz que não tem pena da morte de um bandido? Você é
melhor que ele, em que? São todos assassinos, na minha opinião.”
Considerações pessoais
Como havia uma certa concordância nas respostas em relação aos animais, tentei
puxar a discussão acerca das pessoas que cometem crimes. A colocação do participante do
Grupo 2, após intervenção deixou todos em estado de reflexão, parados e calados, sobretudo
293
porque este era um aluno que não se colocava muito no debate, o que demonstra que o fato de
está calado, não significa que não haja reflexão.
No final do encontro, meu monitor realizou uma entrevista com os participantes, sobre
o efeito da intervenção segundo a opinião dos alunos. Outros dias da semana foram utilizados
para o término das entrevistas. Ao olhar as entrevistas, percebi que cometi um erro em não têlas realizado pessoalmente, já que as respostas deram-se em frases curtas e poderiam ter sido
melhor exploradas se realizadas por uma pessoa mais experiente no uso dessa técnica.
20/11 – Reunião 16
O dilema foi apresentado por intermédio de um vídeo do Youtube, que tratava da
questão da violência contra o idoso, que não teve, na verdade, grandes dilemas. Daí eu trouxe,
mais uma vez, a questão do agressor do idoso. Aí sim, a polêmica foi lançada.
Condição 1: Técnica “racional-discursiva”
Tema: Violência
Recurso: Vídeo do Youtube: Violência contra o idoso
Técnica: Discussão de dilema moral
O dilema sobre a violência contra o idoso, tornou-se um dilema não em função do
idoso agredido, mas em função do agressor do idoso.
Condição 2: Técnica “racional-afetiva”
Tema: Violência
Recurso: Vídeo do Youtube: Violência contra o idoso
Técnicas: Discussão de dilema moral
Técnica do Psicodrama: Role-playing
A discussão tomou a mesma direção do grupo 1. Mas, neste grupo, os participantes
tiveram a oportunidade de refletir acerca do agressor (o que motiva uma pessoa a cometer
tamanha violência?). E, mais do que isto, a tentar sentir o que o agressor estava sentindo
naquela hora, não justificando o que ele fez, mas fazendo-os refletir que errar é humano.
Perguntei se eles algum dia já tinham perdido o controle com um irmão mais jovem ou com
um amigo chegando a bater nele descontroladamente. Perguntei se eles já tinham gritado com
alguém e depois se arrependido. Muitos deles confessaram que sim. Após esta tentativa de
fazê-los se colocar no lugar do outro, um exercício não muito fácil, já que este outro fez algo
humanamente imperdoável; eles foram convidados a refletirem que do mesmo jeito que o
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agressor perdeu o controle, eles não podem perder o controle e querer sair batendo em todos
aqueles que agridem alguém.
Considerações pessoais
No final deste encontro, fiquei pensando acerca dos vídeos que vem sendo mostrados.
Mesmo que eles sejam utilizados de forma diferente nos Grupos, penso que ele deve
mobilizar, por si só, sentimentos empáticos. Só que no grupo 1, se mobiliza sentimentos
empáticos de forma não intencional, e, no grupo 2, de forma intencional. Por outro lado,
quando não trabalho a empatia intencionalmente no grupo 1, os participantes acabam ficando
livres para sentir empatia por quem quiser e, pelo o que eles disseram, eles sentiram uma forte
empatia pela pessoa idosa, o que ocasional um ódio mortal pelo o agressor, o que foi muito
difícil mudar apenas no nível do discurso. Considero, neste caso, uma boa estratégia o que fiz
no grupo 2, que é mobilizar um sentimento empática pelo agressor (tentar entendê-lo, mesmo
que nada justifique tamanha brutalidade). Talvez, esta seja a única forma de diminuição do
ódio gerado pelas imagens.
27/11 – Reunião 17
Esta reunião tomou uma direção semelhante a da anterior: o foco foi o agressor. Desta
vez, se trabalhou a questão da agressão contra a criança em um nível interpessoal (adultos que
batem em crianças) e em um nível mais amplo, em que se considerou o descaso político pela
miséria da população.
Condição 1: Técnica “racional-discursiva”
Tema: Violência
Recurso: Vídeo do Youtube: Violência contra criança
Vídeo do Yotube: Violência, fome, guerra, preconceito
Técnica: Discussão de dilema moral
A justiça com as próprias mãos mais uma vez foi colocada em cheque. Chego até a
compreender a revolta dos adolescentes, é que as imagens são tão fortes que a vontade de
fazer justiça com as próprias mãos flui quase que naturalmente.
Condição 2: Técnica “racional-afetiva”
Tema: Violência
Recurso: Vídeo do Youtube: Violência contra criança
Vídeo do Yotube: Violência, fome, guerra, preconceito
Técnica: Discussão de dilema moral
Técnica do Psicodrama: Carta
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Neste grupo, após o debate, foi pedido que os adolescentes escrevessem uma carta
para um político, falando acerca do que eles viram. Depois comentei que existem formas
inteligentes de se lutar contra as injustiças, e que a violência não seria uma delas. Pedi que
eles listassem algumas. Aqui estão algumas das sugestões dos alunos: se juntar em grupo e
fazer campanhas para ajudar os necessitados; se juntar e ir em instituições fazer visitas, como
os abrigos; juntar brinquedos; fazer abaixo assinados; votar certo; ir até os políticos exigir
mudanças; fazer protestos e passeatas...
Considerações pessoais
Mais uma vez percebi o perigo de certos vídeos enquanto mobilizador de revolta. No
grupo 2, esta raiva foi contornada com a reflexão de que existe outras forma de se reivindicar
direitos, que não a violência. Esta reflexão só foi construída, inspirada na carta construída
pelos adolescentes no grupo afetivo. Além do mais, uma intervenção que trabalha os
sentimentos, ajuda na canalização destes. A carta foi uma ótima forma de fazê-los colocar
para fora toda a raiva e, mais do que isto, de fazê-los pensar em soluções também.
04/12 – Reunião 18
O debate suscitou a partir de um vídeo chamado “Pro dia nascer feliz” que retrata os
problemas existenciais típicos da adolescência, como gravidez na adolescência, namoro,
iniciação sexual, etc. A discussão aconteceu nos pequenos grupos (trios) e, em seguida, o
debate aconteceu entre todos.
Condição 1: Técnica “racional-discursiva”
Tema: Adolescência
Recurso: Vídeo do Youtube: Pro dia nascer feliz
Técnica: Discussão de dilema moral
Este foi um dos temas que eu mais percebi vergonha entre os participantes. Parece que
quando o tema tem relação com as nossas próprias vidas, afeta de forma mais direta,
principalmente quando o tema é sexualidade. A virgindade foi um tema que trouxe muito
debate, e vergonha entre alguns. O discurso religioso ainda é forte entre alguns adolescentes e
a questão do tratamento diferenciado entre o gênero feminino e masculino é notória.
Condição 2: Técnica “racional-afetiva”
Tema: Adolescência
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Recurso: Vídeo do Youtube: Pro dia nascer feliz
Técnica: Discussão de dilema moral
Técnica do Psicodrama: Role-playing
Além do debate que caminhou de forma semelhante com o grupo 1, pediu-se que os
adolescentes se colocassem no lugar dos personagens que eles mesmo criaram em uma estória
que se baseava no vídeo e falava sobre a primeira vez de uma menina e de um menino. Eu
pedi que a platéia fizesse a “voz do pensamento” dos personagens em conflito (“Deus
castiga!”; “Mas, a vontade está maior que tudo”; “Você vai se sentir culpada”; “Culpada, mas
feliz!”; “E se você engravidar?”...).
Considerações pessoais
Foi muito interessante esta reunião, pois ela tomou uma dimensão em um nível muito
pessoal e revelou o peso que a cultura tem sobre o desenvolvimento moral dos adolescentes,
como a religião e a questão de gênero (o homem pode e a mulher não pode). No grupo 2, tudo
foi mais intenso, porque não foi apenas falar sobre, mas representar e compartilhar
sentimentos com os personagens da história.
11/12 – Reunião 19
Neste encontro, eu pedi que os participantes escrevessem um dilema que ele já viveu
ou está vivendo e registrassem seu desejo ou não de compartilhá-lo com todos (sem se
identificar). Além disso, pedi que eles escrevessem a solução que deram (se fariam diferente
hoje) ou que registrassem, caso o dilema seja atual, que decisão estão mais propensos a tomar.
Condição 1: Técnica “racional-discursiva”
Tema: Adolescência
Recurso: Criação de Dilema escrito: Meu dilema
Técnica: Discussão de dilema moral
Os participantes gastaram muito tempo construindo o Dilema e apenas um aceitou
compartilhá-lo com o grupão. Os dois dilemas já tinham acontecido. Um era sobre traição, em
que a pessoa decidiu trair... era um primo (a), que sempre gostou muito, era um amor mal
resolvido, que foi resolvido naquele dia. A pessoa disse que o primo (a) era muito grudento
em seus carinhos e que foi bom ter acontecido isto porque ele (a) percebeu que era algo só
fantasioso e, que, na verdade, gostava mesmo era do namorado (a). Esta traição não foi dita
para ninguém e, desta forma, a pessoa disse que não magoou o namorado (a) e que, neste
sentido, foi muito bom ter acontecido aquilo porque a pessoa percebeu o quanto amava o
namorado (a) e o quanto o amor em relação ao primo (a) era fantasioso. A pessoa disse que
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este foi um caso a parte e que é totalmente contrária a traição. E que se tivesse gostado de
ficar com o (a) primo (a) teria acabado o namoro. Não deu tempo debater o dilema.
Condição 2: Técnica “racional-afetiva”
Tema: Adolescência
Recurso: Criação de Dilema escrito: Meu dilema
Técnica: Discussão de dilema moral
Técnica do Psicodrama: Role-playing
Os participantes gastaram muito tempo construindo o Dilema. Apenas um aceitou
compartilhar o dilema. Era sobre contar a traição do pai ou não em relação a sua mãe. Ele
disse que seu pai era muito calmo e nunca imaginou que ele fizesse aquilo. Então, ele não teve
coragem de contar. Aquilo sempre fica martelando em sua cabeça. E, desta forma, continua
sendo um conflito. Decidimos representar vários finais para ajudar a pessoa que estava com
conflito e elegermos um. Não deu tempo de fazermos a dramatização, nem o debate.
Considerações pessoais
Coincidentemente os dilemas foram sobre traição, um tema não trabalhado, mas que
revela que os adolescentes já entendem exatamente o que é um dilema. Os demais
adolescentes não quiseram nem me entregar o dilema, porque disseram que eu conhecia a
letra. O fato é que eles refletiram sobre seus dilemas. O tempo foi curto para concluirmos,
mas, temos ainda mais um encontro.
18/12 – Reunião 20
Esta foi nossa última reunião. E, tinha todo um clima de despedida. Disse que
tínhamos que concluir a atividade que ficou pendente sobre o dilema da traição, e depois
faríamos uma despedida.
Condição 1: Técnica “racional-discursiva”
Tema: Adolescência
Recurso: Debate dos dilemas criados pelos alunos
Técnica: Discussão de dilema moral
O dilema criado neste grupo não despertou muita discordância, porque a forma que a
pessoa conduziu a sua justificativa convenceu alguns, pois ela se preocupou em não magoar o
namorado (a) e disse que era contrária a traição. Mas, de qualquer maneira, houve uma
polêmica em o fato de que não se pode trair nunca e se pode trair em circunstâncias extremas.
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Condição 2: Técnica “racional-afetiva”
Tema: Adolescência
Recurso: Debate dos dilemas criados pelos alunos
Técnica: Discussão de dilema moral
Técnica do Psicodrama: Role-playing
Na dinâmica em que envolvia o dilema de contar ou não para a mãe que o pai estava
traindo, dentre os finais elaborados, o final escolhido foi a do filho procurar o pai para
conversar, e, caso ele não conseguisse, a estratégia sugerida era que ele escrevesse uma carta
dizendo tudo o que estava sentindo e que queria que o pai tomasse uma decisão entre a pessoa
ou a mãe, porque ele estava com vontade de contar a mãe. Pediu que o pai refletisse sobre o
que era mais importante para ele: a família ou uma mulher qualquer. E que se ele visse
novamente a mulher com ele, ele não teria uma outra chance. Ele disse que a mãe dele é
muito honesta para ter que está vivendo aquilo. Levantei a questão de que se fosse o contrário,
ou seja, se a mãe tivesse traído o pai, ele deveria ter a mesma atitude, com a intenção de
problematizar a questão do gênero.
Considerações pessoais
Este foi o nosso o último encontro. Os debates foram tranqüilos e rápidos. Trouxe uma
torta e uns salgados como um gesto de agradecimento pela participação deles naqueles
encontros em que nenhum faltou, atendendo ao que solicitei. Disse que os encontros
deixariam saudades. Pedi que eles dissessem o que eles levariam daqueles encontros. No
grupo 1 foi dito: “É preciso debater”; “Temos que aprender a ouvir, para depois falar”; “Não
devemos falar todos de uma vez”; “Temos que tentar entrar em um acordo”. E, no grupo 2 foi
dito: “se coloque no lugar dele! O que você sentiu? (risos)”; “tentar ver as coisas em
diferentes ângulos”; “ a lei é maleável, quando se tem um bem maior, como a vida”. Achei
muito interessante essas colocações, que demonstram que a intervenção se focou em questões
diferentes. Uma mais focada no debate, a do Grupo 1; e outra na capacidade de se colocar no
lugar do outro. Outro ponto que acho que devo registrar, que pode até ter sido coincidência:
os participantes do grupo 2 vieram se despedir de mim e de meu monitor com um abraço ou
aperto de mão. Talvez seja porque neste grupo as reuniões eram mais descontraídas e eles se
sentiram mais livres para tal atitude. Ou trabalharam mais a questão da timidez e dos
sentimentos nas peças do que no grupo 1. O grupo 1 apenas deu um até logo de longe ou
vieram agradecer pelo trabalho, mas sem contato físico.
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Moral development and empathy - UFPB