DIFICULDADES DE UMA UNIDADE DE SAÚDE DA FAMÍLIA RELATIVAS À CONSTITUIÇÃO DA EQUIPE MÍNIMA Daniele de Souza Vieira1 Carla Cristina Pimentel da Mota2 Jaqueline de Oliveira Sousa3 Leiliane Teixeira Bento Fernandes4 Oriana Deyze Correia Paiva Leadebal5 Eixo temático: Vulnerabilidade social RESUMO Introdução: A Estratégia de Saúde da Família possibilita o desenvolvimento dos serviços de saúde em todo o país, expandindo a cobertura e a ampliação quantitativa das equipes em conformidade com princípios básicos do SUS. A constituição de Unidades de Saúde de Família ocorre de acordo com a demanda e a necessidade da população, sendo oferecido recurso do Ministério da Saúde aos municípios para a aquisição de insumos (medicamentos, equipamentos, entre outros), manutenção das unidades básicas de saúde, contratação e remuneração de trabalhadores da equipe mínima de saúde; os quais devem atuar de forma interdisciplinar, assumindo a responsabilidade sobre um território, com foco de intervenção à família. Nas USF deve haver a constituição da equipe mínima completa para que o recurso financeiro seja liberado, fato que tem gerado dificuldades para alguns municípios, a exemplo de João Pessoa que vivencia a inexistência de profissionais médicos em algumas unidades de saúde. Nessa perspectiva, esse estudo objetiva relatar as dificuldades de uma Unidade Integral de Saúde da Família situada em João Pessoa - PB, no tocante a falta do profissional médico na constituição da equipe mínima. Metodologia: Trata-se de um estudo descritivo do tipo relato de experiência, desenvolvido durante aulas práticas de uma disciplina da graduação em enfermagem da UFPB, em uma unidade integrada de um bairro da periferia de João Pessoa, composta por três equipes da ESF e uma equipe do Programa 1 Acadêmica de Enfermagem da Universidade Federal da Paraíba (UFPB). E-mail: [email protected] ²Acadêmica de Enfermagem da Universidade Federal da Paraíba (UFPB). E-mail: [email protected] ³Acadêmica de Enfermagem da Universidade Federal da Paraíba (UFPB). E-mail: [email protected] 4 Acadêmica de Enfermagem da Universidade Federal da Paraíba (UFPB). E-mail: [email protected] 5 Enfermeira. Graduada pela Universidade Federal da Paraíba (UFPB). E-mail: [email protected] de Agentes Comunitários de Saúde (PACS). Resultados: Evidenciou-se que as dificuldades encontradas na unidade incluíam a falta da oferta de serviços essenciais como a disponibilidade de receitas para os pacientes com doenças crônicas, insumos insuficientes, dificuldades de formação de vínculo entre os profissionais e os usuários, que por sua vez descaracterizavam a UBS como porta de entrada do sistema de saúde, além de gerar sobrecarga às enfermeiras, causando em linhas gerais um déficit na assistência prestada pelas equipes, devido à falta do médico. Conclusão: Pelo princípio da universalidade a população ganha o direito a saúde e a gratuidade, sem necessitar de qualquer forma de pagamento, pois o serviço à saúde é dever do estado. Contudo, à falta de profissionais, de materiais ou de medicamentos, observados na experiência relatada distanciam a prática da assistência implementada da materialização dos princípios do SUS, demandando ações estratégicas de enfrentamento mais efetivas. Descritores: Equipe interdisciplinar de saúde; Financiamento em saúde; Unidade Básica de saúde. INTRODUÇÃO O Sistema Único de Saúde brasileiro (SUS), criado em 1988, mas promulgado apenas em 1990 é norteado por princípios e diretrizes e estes constituem as bases para o funcionamento e organização do sistema de saúde em nosso país1. É notório que é a partir de princípios e diretrizes que o SUS se efetiva, e termos como descentralização, integralidade e participação da comunidade e tomada à legislação em seu conjunto são apresentados ao mesmo tempo como princípio e diretriz do SUS. É pelo principio da universalidade que a população ganha o direito a saúde e a gratuidade, sem necessitar de qualquer forma de pagamento, pois o serviço à saúde é dever do estado. No Brasil, o direito à saúde é social e coletivo, não um direito individual garantido mediante pagamento1. Contudo, em algumas localidades os serviços de saúde não estão sendo efetivados segundo os princípios e diretrizes do SUS, devido à falta de profissionais, de materiais ou de medicamentos nas unidades de saúde. Dessa forma, os clientes necessitam recorrer a serviços de saúde privado e a compra de medicamentos ou materiais para melhorar sua condição de saúde, já que o seu direito não está sendo legitimado no serviço público de saúde. O Ministério da Saúde criou, em 1994, o Programa Saúde da Família (PSF) que tem como principal propósito reorganizar a prática da atenção à saúde em novas bases e substituir o modelo tradicional, levando a saúde para mais perto da família e, com isso, melhorar a qualidade de vida dos brasileiros2. É pelo PSF, atualmente Estratégia Saúde da Família - ESF que o serviço de saúde tem-se desenvolvido em todo o país, expandindo a cobertura e a ampliação quantitativa das equipes, contudo cada ESF tem suas particularidades de acordo com o município e região na qual pertence. Ideologicamente, a estratégia está em conformidade com os princípios básicos do SUS e os profissionais de saúde trabalham de acordo com os princípios: integralidade e hierarquização, equipe multiprofissional, territorialização e cadastramento de clientela3, priorizando ações de prevenção, promoção e recuperação da saúde das pessoas de forma integral e contínua. A elaboração de Unidades Saúde de Família (USF) ocorre de acordo com a demanda e a necessidade da população, e dessa forma são oferecidos recursos ao município para a contratação e remuneração de trabalhadores (equipe mínima), na aquisição de insumos (medicamentos, equipamentos, entre outros), manutenção das unidades básicas de saúde e etc. Os investimentos com a saúde ocorrem de acordo com a demanda dos usuários na USF e com a constituição completa da equipe mínima. Os recursos financeiros para a saúde são resultado da arrecadação de impostos além de outras formas de obtenção que devem ser administradas para atender aos princípios do SUS e a demanda de saúde da população brasileira1. Em relação à equipe mínima presente na USF, esta é composta por médico, enfermeiro, auxiliar de enfermagem e agentes comunitários de saúde (ACS), e conta ainda com um dentista, um auxiliar de consultório dentário e um técnico em higiene dental, quando ampliada. Os profissionais da equipe devem atuar de forma interdisciplinar, assumir a responsabilidade sobre um território, e ter como foco de intervenção a família, buscando atender aos problemas de saúde da comunidade4. A equipe que compõe a ESF deve trabalhar de forma complementar para que não haja centralização do trabalho em um só membro, pois embora cada um tenha suas devidas atribuições, faz-se necessário a conscientização de que o trabalho deve ser compartilhado, humanizado, com responsabilização e vínculo com a comunidade. Sendo assim, os profissionais de saúde devem visualizar o trabalho em equipe como uma estratégia para a efetivação positiva do trabalho que por consequência elevará o grau de satisfação dos trabalhadores envolvidos5. Diante do exposto, é notório que a ESF foi elaborada para colocar os princípios e diretrizes do SUS na prática, ela se efetiva nas USF que estão distribuídas pelos municípios de todo país, construídas de acordo com a demanda e a necessidade da população, sendo compostas por uma equipe mínima que precisa estar completa para receber do Ministério da Saúde os recursos financeiros para a unidade. Nessa perspectiva, esse estudo objetiva relatar as dificuldades de uma Unidade Integral de Saúde da Família situada em João Pessoa - PB, no tocante a falta do profissional médico na constituição da equipe mínima acarretando em déficits da assistência prestada à comunidade. METODOLOGIA Trata-se de um estudo descritivo que relata a experiência vivenciada por estudantes de Enfermagem, realizado no período de estágio prático supervisionado de uma disciplina da graduação em enfermagem da Universidade Federal da Paraíba, durante o mês de maio de 2012, em uma unidade integrada de um bairro da periferia de João Pessoa - PB. A unidade integrada é composta por três equipes da ESF e uma equipe do Programa de Agentes Comunitários de Saúde (PACS) que presta assistência básica a clientes moradores da comunidade. A partir de uma situação problema e real no contexto da atenção à saúde, estabeleceu-se a revisão da literatura pertinente à temática utilizando neste manuscrito documentos online hospedados na base de dados Scielo e sites Governamentais, tendo como descritores: Unidade Básica de saúde; Equipe interdisciplinar de saúde; Financiamento em saúde. RELATANDO A EXPERIÊNCIA Evidenciamos em uma Unidade Integrada de Saúde da Família do município de João Pessoa a falta de um integrante da equipe mínima de saúde, em consequência deste desfalque muitas dificuldades relacionadas à minimização da oferta de serviços essenciais de saúde a população cadastrada nesta unidade. Há aproximadamente dois anos apenas uma unidade possui médico, enquanto que as demais ficam sem o atendimento deste profissional. De acordo com relatos fornecidos pelos próprios usuários, a unidade deixa de fornecer alguns serviços essenciais devido à falta destes profissionais, o que acarreta falta de receitas para os pacientes, insumos insuficientes para as três comunidades, a não formação de vínculo entre a comunidade e os usuários, pois os mesmos quando necessitam de atendimento não a procuram, além de sobrecarregar as enfermeiras das unidades em questão, causando um déficit na assistência de enfermagem prestada a população desta unidade de saúde. Todos esses fatores são resultados da falta de um integrante da equipe mínima, pois com uma equipe incompleta a USF não recebe o financiamento para suprir as necessidades da população, acarretando na subutilização desses materiais e na privação de uma assistência adequada aos clientes da comunidade. As enfermeiras das unidades que apresentam desfalque na equipe acabam sendo sobrecarregadas, pois como não tem competência para prescrever determinados fármacos e fornecer diagnósticos clínicos ao cliente, acabam buscando auxílio do único médico da unidade integrada que nem sempre está disposto a atendê-las, neste caso, encaminham os clientes em casos de emergências para hospitais referências do município. A desatenção com o atendimento básico se reflete na vida da população que não tem condições financeiras para pedir socorro em unidades particulares de saúde. Quem consegue angariar recursos para ser atendido com mais respeito e qualidade, faz de tudo para não utilizar a unidade, considerada pelos usuários um “elefante branco”, ou seja, apenas uma base de concreto que não oferece suporte e resolutividade. DISCUTINDO A EXPERIÊNCIA A Saúde da Família está presente em 94% dos municípios (29 mil equipes e cobertura populacional de 48% - o que corresponde a 92 milhões de pessoas)6, e a ESF é considerada uma das melhores iniciativas implantadas em saúde exatamente por seu foco na prevenção, pela forma pedagógica com a qual trabalha a saúde da família, atacando a doença antes que ela se torne crônica e dando atenção especial àqueles que precisam de tratamento contínuo. No que tange a falta de médico nas USF do município de João Pessoa, vale salientar que o município é composto por 182 USF, destas 58 não contam com um médico na equipe, sendo que 75% da população são dependentes do SUS7. A partir desses dados, pode-se concluir que essa é uma situação preocupante e que talvez se estenda a vários municípios da região Nordeste. De acordo com o Conselho Regional de Medicina (CRM), a categoria médica relata que o município paga baixos salários, por isso existem a falta desses profissionais no serviço. Por isso, as unidades de saúde perdem os médicos para clínicas privadas, unidades de saúde com menor contingente populacional acobertado e especializações em geral8. O médico é considerado a peça chave da equipe saúde da família, por ter liberdade e competência para diagnosticar e prescrever, e sua ausência na equipe compromete o funcionamento do sistema de saúde que toma progressões inimagináveis como: aumento do trabalho para os enfermeiros da unidade; os usuários engrossam as filas nas unidades de referência ou policlínicas, e em muitos casos, voltam a ser encaminhados para a USF em busca de medicação ou para o acompanhamento e não encontram. Portanto, é possível notar que a falta de um integrante da equipe, e especificamente o médico, gera inúmeros problemas relacionados à saúde como a perda de confiança no SUS pela população local. Sendo assim, a falta de um membro não efetiva a proposta da ESF, já que priva a população do atendimento integral e do fornecimento gratuito dos insumos necessários à manutenção e recuperação da saúde. CONCLUSÃO É pelo princípio da universalidade que a população ganha o direito a saúde e a gratuidade, sem necessitar de qualquer forma de pagamento, pois o serviço à saúde é dever do estado. Contudo, à falta de profissionais, de materiais ou de medicamentos, observados na experiência relatada distanciam a prática da assistência implementada da materialização dos princípios do SUS, demandando ações estratégicas de enfrentamento mais efetivas. Dessa forma, observa-se também a relevância de uma equipe mínima completa atuando na USF, tanto para atender a necessidade dos usuários da comunidade como para se efetivar uma equipe interdisciplinar onde cada um desempenha seu papel de forma integrada. REFERÊNCIAS 1. Matta GC. Princípios e Diretrizes do Sistema Único de Saúde. In: Matta GC, Pontes ALM. (orgs.). Políticas de saúde: organização e operacionalização do Sistema Único de Saúde. Rio de Janeiro: Fiocruz 2007. 2. Sousa MF, Hamann EM. Programa saúde da família no Brasil: uma agenda incompleta? Ciência & Saude Coletiva 2009; 14: 1325-35. 3. Abrahão, AL. Atenção primária à saúde e o processo de trabalho em saúde. Promocao da Saude [periódico online]; 2007; 3 (1): 1-3. Disponível em: <http// www.uff..br/promoçãodasaude/informe> Acesso em: (21 mai. 2012). 4. BRASIL. Resolução CIB Nº 041 DE 03.12.99. [on line] 1999. Disponível em: < http://www.saude.mt.gov.br/adminpublicacao/arquivo/Caderno_Gestor_Web.pdf> Acesso em: (24 mai. 2012). 5. Francischini AC, Moura SDRP, Chinellato M. A importância do trabalho em equipe no programa saúde da família. Investigação.v. 8, n. 3, p. 25-32, 2008. 6. Giovanella L, Mendonça MHM, Almeida PF, Escorel S, Senna MCM, Fausto MCR, et al. Saúde da família: limites e possibilidades para uma abordagem integral de atenção primária à saúde no Brasil. Ciência & Saúde Coletiva, 2009;14(3):783-94. 7. BRASIL. Ministério da Saúde - Departamento de Atenção Básica. [on line] 2012 Disponível em: <http://dab.saude.gov.br/historico_cobertura_sf/historico_cobertura_sf_relatorio.php> Acesso em: (23 mai. 2012). 8. Santos MFO, Oliveira HJ. Influência de variáveis laborais na qualidade de vida dos anestesiologistas da cidade de João Pessoa. Rev. Bras. Anestesiologista, 2011; 61 (3): 338-43.