Publicado na 11° Edição (Novembro e Dezembro de 2009) da Revista Linguasagem
www.letras.ufscar.br/linguasagem
BAKHTIN E A PÓS-MODERNIDADE: ABERTURA DAS NOÇÕES DE
DIALOGISMO E POLIFONIA PARA O PENSAMENTO PÓSMODERNO
Manoel Rodrigues Pereira Neto
Resenhado por: Jânio Fausto, Maria Júlia Mendes, Tatiana Cristina, Thales Aguiar e
Wilson Ribeiro1
ANÁLISE
O artigo de Manoel Rodrigues Pereira Neto, "Bakhtin e a pós-modernidade:
abertura das noções de dialogismo e polifonia para o pensamento pós-moderno" tem como
objetivo discutir de que modo as noções de dialogismo e polifonia abordadas pelos autores
do Círculo de Bakhtin anteciparam concepções que figuram no ambiente filosófico da pósmodernidade.
1
Universidade Vale Do Rio Doce (Univale). Faculdade De Artes E Comunicação (Fac)
O excesso no pensamento desses autores russos que supera até mesmo uma visão
moderna do mundo sob a óptica marxista, aponta dois emblemas do pós-modernismo: a
impossibilidade que teria o homem de superar o horizonte da linguagem e alcançar o real, e
o caráter fragmentário, descontínuo da linguagem. Isso ocorre porque a linguagem esta em
permanente proliferação e metamorfose, e é nesse movimento que mora a descontinuidade
da linguagem, a qual se manifesta no percurso da palavra de um usuário a outro, do emissor
ao seu próprio receptor.
Neste sentido, o ser falante é o transformador da palavra, que a irá conferir um novo
sentido, o qual a norma lingüística é um produto da reflexão acerca da linguagem, assim, a
palavra é colhida por ele nas enunciações vivas e concretas dos outros falantes. Por sua vez,
o receptor orienta seu comportamento verbal no sentido de adequação as normas
lingüísticas a compreensão. Compreender é responder por que o receptor introduz a palavra
no contexto potencial da resposta. Ao recebermos uma enunciação a modificamos, pois as
palavras mudam por isso um diálogo nunca pronuncia a mesma palavra.
O social é o jogo permanente e aberto de interação que ocorre entre os indivíduos
que o constitui como usuários da linguagem e que acabam por constituir a própria
linguagem. Ou seja, o individuo faz uso de outras enunciações para construir a própria
enunciação que será nova para os demais. Valendo ressaltar neste ponto, que a palavra esta
sempre carregada de um sentido ideológico ou vivencial. Além disso, é preciso frisar que a
linguagem é elemento constitutivo, o qual reflete e retrata do real, mesmo fazendo uso de
outras enunciações para construir uma nova esta sempre será singular e individual.
A Teoria do romance de Bakhtin que analisa os romances da maturidade de
Dostoiéviski, estudava, principalmente, a articulação trabalhada pelo autor russo, que nivela
todas as vozes presentes no texto com a do autor. Este modo de articular é o da
equivalência. Assim, os personagens possuem vozes próprias, sendo donos do próprio
discurso. Bakhtin tem o romance polifônico como a recriação artística da natureza
polifônica da própria vida, onde elementos como alteridade das vozes das personagens em
relação ao voz doa autor e o trabalho com as questões filosófica existências que levam o
personagem a ser absorvido pela reflexão sobre o mundo, reflexão que constituí sua
identidade.
Objetivando indicar um caminho que revele a presença do contexto no texto, o
marxista contemporâneo Frederic Jameson indica que sejam percorridas três etapas. A
primeira refere-se à compreensão do texto como solução simbólica de contradições reais. É
do Plano Individual. O texto não apenas reproduz o real, mas entra em contradição com ele.
A Interpretação é obtida sobre forma de solução simbólica do real.
Na segunda etapa o texto entendido com expressão do discurso de uma determinada
classe social. Passa do Plano Individual para o Plano Social. O discurso de cada classe
social não ignora o das demais classes e não pode apenas surgir de si mesmo. A estrutura
do texto é essencialmente dialógica. O valor e o caráter dessa ação simbólica são agora
significativamente notificados e ampliados.
A terceira etapa que consiste na Inclusão do texto no horizonte totalizador do
conceito de modo de produção. Há a incorporação dialética da 1ª e 2ª etapas (superação e
abstração). Aborda a questão da Revolução Cultural e coexistência de vários modos de
produção caracterizada pelo conflito. Para Frederic Jameson, superar o individual é
alcançar o coletivo. Para Bakhtin e Volochinov o social concreto é o interindividualismo.
Os indivíduos só podem existir em sociedade como esta só pode ser composta de
indivíduos concretos. O social concreto constitui-se nos indivíduos concretos.
Jameson afirma que o ato de anunciar é acompanhado da identidade individual, das
experiências temporais, físicas e da formação do objeto que o comporta. Bakhtin afirmou
que o produto da linguagem pode ser interpretado no contexto do materialismo histórico,
porém o que Jameson percebeu é que estas ideais não se difundiram dentro da orgânica
social, por isso não aprofundou estes pensamentos. O real na verdade é inatingível, o que se
consegue chegar é apenas as representações enunciativas e sociais que as camadas
constitutivas são formadas. “O reinado da separação, da fragmentação, da explosão dos
códigos e da multiplicidade das disciplinas não passa da realidade da aparente”.
É esse real aparente que pode ser alcançado pela linguagem. Já Steven Connor
defende em seu livro da Cultura pós-moderna, que os objetos culturais é que formam a
estrutura aparente, ou seja, há uma dualidade direcionada que remete ao objeto. A própria
linguagem é introduzida e trazida para guiar as coisas e os objetos, todo meio inserido na
textura cultural.
Uma das exemplificações do mesmo pensamento pós-moderno é trazida por dois
importantes filósofos da modernidade, Giles Deleuze e Félix Guattari. D/G metaforiza um
organismo biológico vegetal no qual é o rizoma. Este organismo se multiplica por si
mesmo, todos são iguais e parecidos. Em seguida eles apresentam seis princípios do
rizoma, afim de convencer e sistematizar a visível multiplicidade na linguagem que alcança
o horizonte do real.
O primeiro e o segundo princípio é que eles sempre estão interligados e podem ser
ligados em qualquer ponto. O terceiro é que na multiplicidade ele perde a característica de
um objeto ou de um ponto central. No quarto princípio essa multiplicidade pode ser
rompida, mas mesmo assim ela se reconstitui. A reconstrução é formada nela mesma. E por
último, o quinto e sexto princípio o rizoma não se parece na sua estrutura gerativa e
molecular com nenhum outro organismo.
D/G colocam a critica da comunicação frente à psicanálise e a lingüística. A
incompreensão da produtividade do inconsciente fez com que a psicanálise fechasse os
olhos e ouvidos para o presente e para a diferença. O que a psicanálise não queria ouvir era
em por em questão o que, para eles, é o horizonte. Por isso, D/G propõem que a psicanálise
como diversidade sem centro como rizoma.
A noção de recepção/compreensão ativa proposta por Bakhtin ilustra o movimento
dialógico da enunciação, a qual constitui o território comum do locutor e do interlocutor.
Nesta noção podemos resumir o esforço dos interlocutores em colocar a linguagem em
relação frente a um e a outro. O locutor enuncia em função da existência (real ou virtual) de
um interlocutor, requerendo deste último uma atitude responsiva, com antecipação do que o
outro vai dizer, isto é, experimentando ou projetando o lugar de seu ouvinte.
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