www.cardiol.br
SOCIEDADE BRASILEIRA DE CARDIOLOGIA
ISSN-0066-782X
Artigo em destaque
Comparação entre a Ecocardiografia 2D
e 3D na Avaliação do Remodelamento
Reverso após a TRC
Artigo Original
Hotta V T, Martinelli Filho M, Mady C e cols. - São Paulo, SP
Página 111
Volume 97, Nº 2, Agosto 2011
Vasculites e Eosinófilos em Biópsia Endomiocárdica,
como Preditores de Rejeição em Transplante Cardíaco
Artigo de Revisão
Comportamento do Ergorreflexo na Insuficiência Cardíaca
Cartas ao Editor
Riscos Cardiovasculares em Adolescentes com Diferentes
Graus de Obesidade
Estamos Preparados para Avaliar Atletas Jovens?
Páginas Eletrônicas
Sumário
Editorial
Obesidade e Resistência a Insulina: “Janela” para a
Disfunção Miocárdica
Artigo Especial
Racionalidade e Métodos do Registro ACCEPT - Registro
Brasileiro da Prática Clínica nas Síndromes Coronarianas
Agudas da Sociedade Brasileira de Cardiologia
Artigos Originais
Pressão Diastólica Final do Ventrículo Esquerdo e
Síndromes Coronarianas Agudas
Comparação entre a Ecocardiografia 2D e 3D na
Avaliação do Remodelamento Reverso após a TRC
Parâmetros Ecocardiográficos de Deposição de Gordura
Epicárdica e sua Relação com Doença Arterial Coronariana
Validade e Equivalência da Versão em Português do
Veterans Specific Activity Questionnaire
Validade das Equações Preditivas da Frequência
Cardíaca Máxima para Crianças e Adolescentes
Marcadores de Desequilíbrio em Reações de Redução e
Oxidação no Sangue de Pacientes Hipertensos em uma
Comunidade no Nordeste do Brasil
Comparação e Correlação entre Automedida, Medida
Casual e Monitorização Ambulatorial da Pressão Arterial
Dessincronia Ventricular e Aumento dos Níveis de BNP
na Estimulação Apical do Ventrículo Direito
Correlação Anatomoclínica
Caso 4 - Agranulocitose e Sepse em Mulher no Puerpério
após uso de Ceftriaxona
Relato de Caso
Truncus Arteriosus Operado aos 28 anos: Importância
do Diagnóstico Diferencial
Uso do Octreotide no Tratamento do Quilotórax e
Quiloperitôneo
Ponto de Vista – Point Of View
Pôster: uma Prática a ser Revista
Imagem
Prótese de Amplatzer para Fechamento de Forame Oval
Pérveo: Visão por Ecocardiografia Tridimensional
Atualização clínica
Avanços Recentes do Impacto da Apneia Obstrutiva do
Sono na Hipertensão Arterial Sistêmica
Resumo das Comunicações
Congresso Paranaense de Cardiologia 2011
XIII Congresso Brasileiro de Aterosclerose
Diretriz
I Diretriz Latino-Americana para o Diagnóstico e
Tratamento da Cardiopatia Chagásica
CONTENTS
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CONTENIDO
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REVISTA DA SOCIEDADE BRASILEIRA DE CARDIOLOGIA - Publicada desde 1948
Sumário - CONTENTS
Editorial - Editorial
Obesidade e Resistência a Insulina: “Janela” para a Disfunção Miocárdica
Obesity and Insulin Resistance: “Window” to Myocardial Dysfunction
Marcel Liberman
................................................................................................................................................................... página 92
Artigo Especial - Special Article
Racionalidade e Métodos do Registro ACCEPT - Registro Brasileiro da Prática Clínica nas Síndromes
Coronarianas Agudas da Sociedade Brasileira de Cardiologia
Rationality and Methods of ACCEPT Registry - Brazilian Registry of Clinical Practice in Acute Coronary Syndromes of
the Brazilian Society of Cardiology
Investigadores do Registro ACCEPT-SBC
................................................................................................................................................................... página 94
Artigos Originais - Original Articles
Coronariopatia Aguda
Pressão Diastólica Final do Ventrículo Esquerdo e Síndromes Coronarianas Agudas
Left Ventricular End Diastolic Pressure and Acute Coronary Syndromes
Rogério Teixeira, Carolina Lourenço, Rui Baptista, Elisabete Jorge, Paulo Mendes, Fátima Saraiva, Silvia Monteiro,
Francisco Gonçalves, Pedro Monteiro, Maria J. Ferreira, Mário Freitas, Luís Providência
................................................................................................................................................................. página 100
Ecocardiografia Adultos
Comparação entre a Ecocardiografia 2D e 3D na Avaliação do Remodelamento Reverso após a TRC
Comparison between 2D and 3D Echocardiography in the Evaluation of Reverse Remodeling after CRT
Viviane Tiemi Hotta, Martino Martinelli Filho, Charles Mady, Wilson Mathias Jr, Marcelo Luiz Campos Vieira
................................................................................................................................................................. página 111
Parâmetros Ecocardiográficos de Deposição de Gordura Epicárdica e sua Relação com Doença
Arterial Coronariana
Echocardiographic Parameters of Epicardial Fat Deposition and its Relation to Coronary Artery Disease
Juan Valiente Mustelier, Julio Oscar Cabrera Rego, Angela Gala González, Júlio César Gandarilla Sarmiento,
Beatriz Vega Riverón
................................................................................................................................................................. página 122
Epidemiologia
Validade e Equivalência da Versão em Português do Veterans Specific Activity Questionnaire
Validity and Equivalence of the Portuguese Version of the Veterans Specific Activity Questionnaire
Geraldo de Albuquerque Maranhão Neto, Antonio Carlos Ponce de Leon, Paulo de Tarso Veras Farinatti
................................................................................................................................................................. página 130
Arquivos Brasileiros de Cardiologia - Volume 97, Nº 2, Agosto 2011
Fisiologia
Validade das Equações Preditivas da Frequência Cardíaca Máxima para Crianças e Adolescentes
Validity of Maximum Heart Rate Prediction Equations for Children and Adolescents
Fabiana Andrade Machado e Benedito Sérgio Denadai
................................................................................................................................................................. página 136
Hipertensão Arterial Sistêmica
Marcadores de Desequilíbrio Redox em Sangue de Pacientes Hipertensos de uma Comunidade no
Nordeste do Brasil
Markers of Redox Imbalance in the Blood of Hypertensive Patients of a Community in Northeastern Brazil
Sandra Mary Lima Vasconcelos, Marília Oliveira Fonseca Goulart, Maria Alayde Mendonça da Silva, Vanusa Manfredini,
Mara da Silveira Benfato, Luiza Antas Rabelo, Gilberto Fontes
................................................................................................................................................................. página 141
Mapeamento Ambulatoria da PA (MAPA)
Comparação e Correlação entre Automedida, Medida Casual e Monitorização Ambulatorial da
Pressão Arterial
Comparison and Correlation between Self-measured Blood Pressure, Casual Blood Pressure Measurement and
Ambulatory Blood Pressure Monitoring
Weimar Kunz Sebba Barroso de Souza, Paulo César Brandão Veiga Jardim, Ludmila Brito Porto, Fabrício Alves
Araújo, Ana Luíza Lima Sousa, Cláudia Maria Salgado
................................................................................................................................................................. página 148
Marcapasso
Dessincronia Ventricular e Aumento dos Níveis de BNP na Estimulação Apical do Ventrículo Direito
Ventricular Dyssynchrony and Increased BNP Levels in Right Ventricular Apical Pacing
Cláudia Drummond Guimarães Abreu, Maria do Carmo Pereira Nunes, Márcia Melo Barbosa, Manoel Otávio Costa
Rocha, Antônio Luiz Pinho Ribeiro
................................................................................................................................................................. página 156
Transplante Cardíaco - Cirurgia
Vasculites e Eosinófilos em Biópsia Endomiocárdica, como Preditores de Rejeição em
Transplante Cardíaco
Vasculitis and Eosinophils in Emdomyocardial Biopsies as Rejection Predictors in Heart Transplantation
Reginaldo Cipullo, Marco Aurélio Finger, João Manoel Rossi Neto, Carlos Mendes Contreras, Nádia Van Geen
Poltronieri, Mabel de Moura Barros Zamorano, Lílian Mary da Silva, Paulo Chaccur, Jarbas Jakson Dinkhuysen,
Noedir Antônio Groppo Stolf
................................................................................................................................................................. página 163
Artigo de Revisão - Review Article
Comportamento do Ergorreflexo na Insuficiência Cardíaca
Ergoreflex Activity in Heart Failure
Juliana Fernanda Canhadas Belli, Fernando Bacal, Edimar Alcides Bocchi, Guilherme Veiga Guimarães
................................................................................................................................................................. página 171
Carta ao Editor - Letter to the Editor
Riscos Cardiovasculares em Adolescentes com Diferentes Graus de Obesidade
Cardiovascular Risks in Adolescents with Different Degrees of Obesity
Kerginaldo Paulo Torres, Samara Gomes Torres, Ricardo Oliveira Guerra
................................................................................................................................................................. página 179
Estamos Preparados para Avaliar Atletas Jovens?
Are We Ready to Assess Young Athletes?
Maria Cecília Solimene e Max Grinberg
................................................................................................................................................................. página 181
Arquivos Brasileiros de Cardiologia - Volume 97, Nº 2, Agosto 2011
Arquivos Brasileiros de Cardiologia - Páginas eletrônicas
Correlação Anatomoclínica – Anatomopathological Session
Caso 4 - Agranulocitose e Sepse em Mulher no Puerpério após uso de Ceftriaxona
Case 4/2011 – Agranulocytosis and Puerperal Sepsis in Women after the use of Ceftriaxone
Haliana Muzio Candido, Maria Rita Bortolotto, Tânia Mara Varejão Strabelli, Luiz Alberto Benvenuti
.............................................................................................................................................................. página e20
Relato de Caso – Case Report
Truncus Arteriosus Operado aos 28 anos: Importância do Diagnóstico Diferencial
Atypical Truncus Arteriosus Operated at 28 Years of Age: Importance of Differential Diagnosis
Lilian Maria Lopes, Jose Pedro da Silva, Luciana da Fonseca, Sonia Meiken, André Bavaresco Cristóvão Salvador,
Gustavo Spadaccia dos Santos Fernandes
.............................................................................................................................................................. página e29
Uso do Octreotide no Tratamento do Quilotórax e Quiloperitôneo
Use of Octreotide in the Treatment of Chylothorax and Chyloperitoneum
Cristiane Felix Ximenes Pessotti, Ieda Biscegli Jatene, Paulo Emanuel Uhrovcik Buononato, Patrícia Figueiredo Elias,
Anna Carolina Domingues Pinto, Maria Fernanda Jensen Kok
.............................................................................................................................................................. página e33
Ponto de Vista - Point of View
Pôster: uma Prática a ser Revista!
Poster: a Practice to be Revised!
Luís Beck-da-Silva e Luís Eduardo Rohde
.............................................................................................................................................................. página e37
Imagem - Image
Prótese de Amplatzer para Fechamento de Forame Oval Pérveo: Visão por Ecocardiografia
Tridimensional
Amplatzer Septal Occluder for Closing Foramen Ovale: View Through 3D Echocardiography
Marcelo Luiz Campos Vieira e Carlos A. Pedra
.............................................................................................................................................................. página e39
Atualização Clínica - Clinical Update
Avanços Recentes do Impacto da Apneia Obstrutiva do Sono na Hipertensão Arterial Sistêmica
Recent Advances of the Impact of Obstructive Sleep Apnea on Systemic Hypertension
Rodrigo P. Pedrosa, Eduardo M. Krieger, Geraldo Lorenzi-Filho, Luciano F. Drager
............................................................................................................................................................. página e40
Resumo das Comunicações
Congresso Paranaense de Cardiologia 2011
XIII Congresso Brasileiro de Aterosclerose
Diretriz
I Diretriz Latino-Americana para o Diagnóstico e Tratamento da Cardiopatia Chagásica
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Arquivos Brasileiros de Cardiologia - Volume 97, Nº 2, Agosto 2011
REVISTA DA SOCIEDADE BRASILEIRA DE CARDIOLOGIA - Publicada desde 1948
Diretor de Comunicação
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Cardiologia Intervencionista
Pedro A. Lemos
Epidemiologia/Estatística
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Editor-Chefe
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Cardiologia Pediátrica/Congênitas
Antonio Augusto Lopes
Hipertensão Arterial
Paulo Cesar B. V. Jardim
Editores Associados
Arritmias/Marcapasso
Mauricio Scanavacca
Cardiologia Clínica
José Augusto Barreto-Filho
Métodos Diagnósticos Não-Invasivos
Carlos E. Rochitte
Cardiologia Cirúrgica
Paulo Roberto B. Evora
Pesquisa Básica ou Experimental
Leonardo A. M. Zornoff
Ergometria, Exercício e
Reabilitação Cardíaca
Dr. Ricardo Stein
Primeiro Editor (1948-1953)
† Jairo Ramos
Conselho Editorial
Brasil
Adib D. Jatene (SP)
Alexandre A. C. Abizaid (SP)
Alfredo José Mansur (SP)
Álvaro Avezum (SP)
Amanda G. M. R. Sousa (SP)
André Labrunie (PR)
Andrei Sposito (DF)
Angelo A. V. de Paola (SP)
Antonio Augusto Barbosa Lopes (SP)
Antonio Carlos C. Carvalho (SP)
Antônio Carlos Palandri Chagas (SP)
Antonio Carlos Pereira Barretto (SP)
Antonio Cláudio L. Nóbrega (RJ)
Antonio de Padua Mansur (SP)
Ari Timerman (SP)
Armênio Costa Guimarães (BA)
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Ayrton Pires Brandão (RJ)
Barbara M. Ianni (SP)
Beatriz Matsubara (SP)
Braulio Luna Filho (SP)
Brivaldo Markman Filho (PE)
Bruce B. Duncan (RS)
Bruno Caramelli (SP)
Carisi A. Polanczyk (RS)
Carlos Alberto Pastore (SP)
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Carlos Eduardo Rochitte (SP)
Carlos Eduardo Suaide Silva (SP)
Carlos Vicente Serrano Júnior (SP)
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Charles Mady (SP)
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Décio Mion Jr (SP)
Denilson Campos de Albuquerque (RJ)
Dikran Armaganijan (SP)
Djair Brindeiro Filho (PE)
Domingo M. Braile (SP)
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Emilio Hideyuki Moriguchi (RS)
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Evandro Tinoco Mesquita (RJ)
Expedito E. Ribeiro da Silva (SP)
Fábio Sândoli de Brito Jr. (SP)
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Fernando A. P. Morcerf (RJ)
Fernando Bacal (SP)
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Iran Castro (RS)
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José Lázaro de Andrade (SP)
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Leopoldo Soares Piegas (SP)
Luís Eduardo Rohde (RS)
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Max Grinberg (SP)
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Paulo J. F. Tucci (SP)
Paulo J. Moffa (SP)
Paulo R. A. Caramori (RS)
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Sergio Almeida de Oliveira (SP)
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Sergio G. Rassi (GO)
Sérgio Salles Xavier (RJ)
Sergio Timerman (SP)
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Valmir Fontes (SP)
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Exterior
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Aldo P. Maggioni (Itália)
Cândida Fonseca (Portugal)
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Hugo Grancelli (Argentina)
James de Lemos (Estados Unidos)
João A. Lima (Estados Unidos)
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Peter Libby (Estados Unidos)
Piero Anversa (Itália)
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Cardiovascular
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Cardiovascular
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Hemodinâmica e Cardiologia
Intervencionista
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SBC/DERC - Departamento de Ergometria e
Reabilitação Cardiovascular
William Azem Chalela
SBC/DCC/GAPO - Grupo de Estudos de
Avaliação Perioperatória
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Cardiovascular Respiratória e Cardiologia
Experimental
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Coronariopatias, Emergências e Terapia
Intensiva
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Cardíaca
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Valvopatia
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Ressonância e Tomografia Cardiovascular
Paulo Roberto Schvartman
ARQUIVOS BRASILEIROS de Cardiologia
Volume 97, Nº 2, Agosto 2011
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Editorial
Obesidade e Resistência a Insulina: “Janela” para a Disfunção
Miocárdica
Obesity and Insulin Resistance: “Window” to Myocardial Dysfunction
Marcel Liberman
Instituto Israelita de Ensino e Pesquisa - Sociedade Beneficente Israelita Brasileira Hospital Albert Einstein, São Paulo, SP-Brasil
A obesidade é uma epidemia mundial1, cuja prevalência
aumenta progressivamente. As implicações cardiovasculares
e metabólicas da obesidade são múltiplas (especialmente o
diabete melito e a resistência a insulina) e podem ocorrer
mesmo em fases precoces da doença. Assim, o estudo
publicado pela Dra. Ana Paula Lima-Leopoldo e cols. 2
avaliou os efeitos da obesidade no desempenho miocárdico,
investigando especificamente a variação da concentração
de cálcio extracelular, o efeito do potencial pós-pausa e a
estimulação beta-adrenérgica com isoproterenol, utilizando
preparação de músculo papilar isolado de ratos Wistar
submetidos a dieta hipercalórica (Ob) por 15 semanas, ou a
dieta padrão (C).
De forma muito interessante, os animais Ob, apesar de
não apresentarem aumento de peso corporal final, tiveram
incremento da gordura corporal (96,1%) e maior resistência a
insulina após sobrecarga oral a glicose quando comparados aos
ratos controles. Ainda, apesar de o desempenho do músculo
papilar isolado ter sido semelhante entre os grupos em condições
basais, houve comprometimento funcional do músculo papilar
de ratos Ob quando exposto a concentrações progressivamente
maiores de cálcio extracelular (2,5 a 8 mM) e diante do efeito
do potencial pós-pausa, demonstrado especialmente pela
menor resposta da tensão máxima desenvolvida (TD) e pela
menor velocidade máxima da variação de decréscimo da tensão
desenvolvida (-dT/dt) em comparação aos C. Além disso, a
estimulação beta-adrenérgica com isoproterenol diminuiu a
velocidade máxima da variação positiva da tensão desenvolvida
(+dT/dt) em animais Ob versus C.
Apesar de outros estudos terem observado alterações
funcionais em cardiomiócitos de ratos obesos, mesmo
em condições basais3,4, os autores do presente trabalho
concluem que a obesidade pode promover disfunção dos
canais regulatórios de Ca+2, mais especificamente relacionada
ao trocador Na + / Ca +2, canais tipo –L do sarcolema,
Retículo Sarcoplasmático (RS) e alteração na sensibilidade dos
miofilamentos ao Ca+2, avaliados indiretamente pelos resultados
funcionais obtidos diante da elevação da concentração de Ca+2
extracelular e do potencial pós-pausa de músculos papilares
em preparação isolada. Além disso, a diminuição da -dT / dt
encontrada diante de altas concentrações de Ca+2 citosólico
fizeram que os autores especulassem que a ativação da SERCA2
via Ca+2-calmodulina quinase poderia estar deprimida em ratos
obesos, reduzindo, assim, a captação de cálcio pelo RS de
cardiomiócitos, o que resultaria em decréscimo de estoques
de Ca+2 e em menor liberação de Ca+2 pelos receptores
rianodina. Contudo, a expressão e a atividade dessas proteínas
não foram estudadas no presente estudo, assim como o fluxo, a
concentração e a compartimentalização intracelular do cálcio.
Ainda, os autores concluem que a redução da -dT / dt em ratos
obesos após estímulo com isoproterenol pode ter ocorrido
por diminuição de fosforilação de fosfolambam via Ca+2calmodulina quinase.
Publicação recente de Howarth e cols.5 coincidentemente
demonstrou que os tempos de contração máxima e de
relaxamento de cardiomiócitos de ratos Zucker diabéticos
eram mais prolongados (aproximadamente 30%) em
relação aos cardiomiócitos de ratos controles. Apesar de
a amplitude de fluxo de Ca+2 ser normal, o tempo para
o influxo de Ca+2 estava aumentado em cardiomiócitos
de ratos Zucker. Isso foi explicado pela diminuição
da densidade de corrente pelos canais tipo-L, que foi
atribuída à alteração na expressão de genes que sintetizam
a cadeia pesada da miosina, canais de Ca +2 tipo-L e
proteínas de regulação do transporte de Ca+2 intracelular.
Além do tratamento e da prevenção do diabetes, da
obesidade e da resistência a insulina, a investigação de
novos mecanismos moleculares que possam explicar as
alterações fisiopatológicas iniciais da disfunção miocárdica
e, especificamente, de cardiomiócitos, certamente
possibilitará o diagnóstico precoce, além de potenciais
alvos terapêuticos para a insuficiência cardíaca relacionada
à obesidade mesmo em fases subclínicas.
“Editorial sob responsabilidade do Cardiosource em Português. http://cientifico.
cardiol.br/cardiosource2/default.asp”
Palavras-chave
Obesidade, diabete melito / metabolismo, miocardio/
fisiopatologia, resistência à insulina, ratos zucker.
Correspondência: Marcel Liberman •
Av. Albert Einstein, 627- Piso 2SS, Morumbi - 05652-900 - São Paulo, SP, Brasil
E-mail: [email protected]
Artigo recebido em 08/07/11, revisado recebido em 13/07/11,
aceito em 13/07/11.
92
Liberman
Obesidade e Resistência a Insulina: “Janela” para a Disfunção Miocárdica
Editorial
Referências
1. Reynolds K, He J. Epidemiology of the metabolic syndrome. Am J Med
Sci.2005;330(6):273-9.
2.
Lima-Leopoldo AP, Leopoldo AS, Sugizaki MM, Bruno A, Nascimento
AF, Luvizotto RAM et al. Myocardial dysfunction and abnormalities in
intracellular calcium handling in obese rats. Arq Bras Cardiol 2011 May 13
[Epub ahead of print].
3. Relling DP, Esberg LB, Fang CX, Johnson WT, Murphy EJ, Carlson EC. Highfat-diet-induced juvenile obesity leads to cardiomyocyte dysfunction and
upregulation of Foxo3a transcription factor independent of lipotoxicity and
apoptosis. J Hypertens. 2006;24(3):549-61.
93
4. Carroll JF, Jones AE, Hester RL, Reinhart GA, Cockrell K, Mizelle HL.
Reduced cardiac contractile responsiveness to isoproterenol in obese
rabbits. Hypertension. 1997; 30(6):1376-81.
5. Howarth FC, Qureshi MA, Hassan Z, Al Kury LT, Isaev D, Parekh K,et
al. Changing pattern of gene expression is associated with ventricular
myocyte dysfunction and altered mechanisms of Ca2+ signaling in young
type 2 Zucker diabetic fatty rat heart. Exp Physiol.2011;96(3):325-37.
Arq Bras Cardiol 2011; 97(2) : 92-93
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Artigo Especial
Racionalidade e Métodos do Registro ACCEPT - Registro Brasileiro
da Prática Clínica nas Síndromes Coronarianas Agudas da
Sociedade Brasileira de Cardiologia
Rationality and Methods of ACCEPT Registry - Brazilian Registry of Clinical Practice in Acute Coronary
Syndromes of the Brazilian Society of Cardiology
Investigadores do Registro ACCEPT-SBC
Sociedade Brasileira de Cardiologia, Rio de Janeiro, RJ - Brasil
Resumo
Fundamento: Aferição da prática clínica brasileira em pacientes com síndrome coronariana aguda, em hospitais públicos
e privados, permitirá identificar os hiatos na incorporação de intervenções clínicas com benefício comprovado.
Objetivo: Elaborar um registro de pacientes portadores do diagnóstico de síndrome coronariana aguda para aferir dados
demográficos, morbidade, mortalidade e prática padrão no atendimento desta afecção. Ademais, avaliar a prescrição de
intervenções baseadas em evidências, como a aspirina, estatinas, betabloqueadores e reperfusão, dentre outras.
Métodos: Estudo observacional do tipo registro, prospectivo, visando documentar a prática clínica hospitalar da
síndrome coronariana aguda, efetivada em hospitais públicos e privados brasileiros. Adicionalmente, serão realizados
seguimento longitudinal até a alta hospitalar e aferição da mortalidade e ocorrência de eventos graves aos 30 dias,
6 e 12 meses.
Resultados: Os resultados serão apresentados um ano após o início da coleta (setembro de 2011) e consolidados após
a reunião da população e dos objetivos posteriormente almejados.
Conclusão: A análise desse registro multicêntrico permitirá projetar uma perspectiva horizontal do tratamento dos
pacientes acometidos da síndrome coronariana aguda no Brasil. (Arq Bras Cardiol 2011; 97(2) : 94-99)
Palavras-chave: Síndrome coronariana aguda/epidemiologia, prática clínica baseada em evidências, estudos multicêntricos.
Abstract
Background: Assessing the Brazilian clinical practice in patients with acute coronary syndrome, in public and private hospitals to identify gaps
in the incorporation of clinical interventions with proven benefit.
Objective: To develop a registry of patients diagnosed with acute coronary syndrome to assess demographics, morbidity, mortality, and standard
practice in the care of this condition. Besides, to assess the prescription of evidence-based interventions such as aspirin, statins, beta blockers
and reperfusion, among others.
Methods: Registry-type prospective observational study intended to document hospital clinical practices of acute coronary syndrome in public
and private hospitals in Brazil. In addition, longitudinal follow-up will be held until discharge and measurement of mortality and occurrence of
serious events at 30 days, 6 and 12 months.
Results: The findings will be presented one year after the start of collection (September 2011), and consolidated after a meeting with the
population to discuss the objectives sought.
Conclusion: The analysis of this multicenter registry will design a horizontal perspective for the treatment of patients suffering from cardiovascular
disease in Brazil. (Arq Bras Cardiol 2011; 97(2) : 94-99)
Keywords: Acute coronary syndrome/epidemiology; evidence-based practice; multicenter studies.
Full texts in English - http://www.arquivosonline.com.br
Correspondência: Luiz Alberto Piva e Mattos •
Av. Jandira, 550/121 - Moema - 04080-003 - São Paulo, SP - Brasil
E-mail: [email protected], [email protected]
Artigo recebido em 27/12/10; revisado e recebido em 27/12/10; aceito em 21/03/11.
94
Investigadores do Registro ACCEPT
Racionalidade e métodos do registro ACCEPT
Artigo Especial
Introdução
Dados recentes da Organização Mundial de Saúde
demonstram que as doenças cardiovasculares, particularmente
o infarto agudo do miocárdio (IAM), representam a principal
causa de incapacidade e morbimortalidade em ambos os
sexos, tanto no Brasil, quanto no mundo1-3.
no Quadro 1. Pacientes admitidos com o diagnóstico de dor
torácica a esclarecer, com suspeita de origem coronariana,
alocados neste registro, porém não confirmados, após a
elucidação diagnóstica, serão excluídos do mesmo.
C. Hospitais
Uma vez que representa um dos principais problemas
de saúde pública, a busca por intervenções que apresentem
benefício comprovado na redução da incidência dessa
doença e de suas complicações passa a ser prioridade.
Dentre as intervenções com beneficio comprovado na
redução de eventos cardiovasculares maiores, destacamse as farmacológicas, como aspirina, trombolíticos e
antiplaquetários, na admissão hospitalar, inibidores da enzima
de conversão, estatinas e betabloqueadores na alta, as quais
demonstraram redução de risco relativo variando de 6,5 até
25% em estudos prévios4-8.
Os centros foram selecionados por meio de convite
enviado pelo comitê diretivo deste registro, assim como,
de maneira voluntária, após exposição da oportunidade de
participação nesta pesquisa, exibida no portal eletrônica da
SBC, oportunidade esta ofertada durante um período de 30 dias
consecutivos. Todos os centros foram convidados a preencher
um questionário prévio a fim de verificar a viabilidade da
operacionalização da participação do centro médico. Os
centros participantes encontram-se listados no final do artigo.
Registros prévios demonstraram que o uso dessas
intervenções no cenário das síndromes coronarianas agudas
(SCA) ainda é sub-ótimo, sugerindo, na admissão, taxas de
utilização de aspirina variando entre 91 e 92%, e, na alta,
variando entre 90 e 95%, uso de estatina, na alta, variando
entre 26 e 57%, bem como uso de betabloqueadores na alta
em menos de 63 a 77% dos pacientes9-14.
A fim de detectar uma proporção de 50% (por exemplo,
taxa de utilização de estatinas na alta ou de pacientes que
recebem reperfusão), considerando-se um erro amostral
de 2%, um alfa de 5% e um poder estatístico de 90%,
será necessário incluir 2.401 pacientes. Esse tamanho de
amostra será suficiente para responder os objetivos primários
do estudo, o qual é factível dentro do primeiro ano de
recrutamento. Existe o planejamento para que o ACCEPT
seja continuado após 12 meses, arrolando um número maior
de pacientes, o que permitirá análises futuras e inferências
sobre preditores independentes de eventos clínicos maiores.
A aferição da sua ocorrência, por meio de um registro
nacional de coleta controlada e de início recente, poderá
assim documentar a prática clínica no tratamento de pacientes
portadores de uma SCA, sejam estes internados em hospitais
brasileiros públicos e/ou privados.
Métodos
O registro representa um projeto de documentação da
prática clínica atual do atendimento à SCA no Brasil com o
objetivo de identificar a incorporação de evidências na prática
clínica do tratamento desta afecção, envolvendo hospitais
públicos e privados. Adicionalmente, será realizado seguimento
longitudinal dos pacientes até sua alta hospitalar, além da
verificação da mortalidade em até 30 dias, 6 e 12 meses.
A. Delineamento
Serão compilados os pacientes com SCA atendidos
em hospitais da rede pública e privada para definir dados
relacionados às características demográficas, morbidade,
mortalidade e à prática diária, no tratamento das SCA, bem
como aferir padrões de prescrição de intervenções baseadas
em evidências (aspirina, estatinas, betabloqueadores,
inibidores da enzima conversora da angiotensina e reperfusão)
no atendimento dos mesmos.
B. Caracterização da amostra
Serão elegíveis os pacientes cujo médico da unidade de
atendimento suspeite do diagnóstico de SCA e planeje iniciar
tratamento para esta condição. Desta forma, os critérios de
inclusão e exclusão de pacientes serão determinados não pelo
protocolo, mas pelo julgamento clínico do médico assistente.
De qualquer forma, sugere-se fortemente que sejam incluídos
pacientes que apresentem o quadro clínico conforme descrito
D. Cálculo do tamanho da amostra
E. Desfechos de interesse e definições
Como desfecho primário, será verificada a proporção de
pacientes que recebem intervenções com benefício comprovado,
Quadro 1 - Critérios de inclusão e exclusão para participação no
registro ACCEPT
CRITÉRIOS DE INCLUSÃO
Síndrome Coronariana Aguda (SCA) sem supradesnivelamento do segmento ST
Sintomas isquêmicos suspeitos de SCA sem supradesnivelamento do ST
definidos como: história médica compatível com a nova manifestação ou um
padrão de piora de dor torácica característica de isquemia ocorrendo em
repouso ou com esforço mínimo (duração de 10 minutos)
E no mínimo um dos itens a seguir:
c) Alterações no eletrocardiograma (ECG) compatíveis com uma nova
isquemia [depressão ST de pelo menos 1 mm, ou elevação de ST transitória,
ou elevação de ST de 1 mm ou menos, ou inversão da onda T superior a 3
mm em pelo menos duas derivações contíguas, ou
d) Enzimas cardíacas (ex.: CKMB) ou biomarcadores (Troponina I ou T)
elevados acima do limite superior da faixa normal.
Síndrome Coronariana Aguda (SCA) com supradesnivelamento do segmento ST
Apresentando sinais ou sintomas de IAM com duração de pelo menos 20
minutos. Com alterações de ECG definidas, compatíveis com SCA com
supradesnivelamento ST persistente (> 2 mm em duas derivações precordiais
contíguas, ou > 1 mm em pelo menos duas derivações dos membros) ou
novo bloqueio do ramo esquerdo com onda Q em duas derivações contíguas.
CRITÉRIOS DE EXCLUSÃO
Pacientes transferidos de outras instituições com mais de 12 horas do início
da dor.
Arq Bras Cardiol 2011; 97(2) : 94-99
95
Investigadores do Registro ACCEPT
Racionalidade e métodos do registro ACCEPT
Artigo Especial
demonstrado pelos indicadores (como, por exemplo, aspirina
na admissão e na alta, percentual de pacientes que recebem
reperfusão, ou estatinas e betabloqueadores na alta).
Desfechos secundários: mortalidade total e eventos
cardiovasculares maiores (reinfarto, acidente vascular cerebral,
parada cardíaca fatal e não fatal e mortalidade por causa
cardiovascular) durante a internação, em até 30 dias, 6 e 12 meses.
Mortalidade cardiovascular
Mortalidade por causa cardiovascular é definida como
qualquer óbito de causa vascular e inclui os óbitos que
ocorrem após um infarto do miocárdio, parada cardíaca,
acidente vascular cerebral, procedimento de revascularização
cardíaca (ou seja, intervenção coronariana percutânea [ICP]
ou cirurgia de revascularização do miocárdio [RM]), embolia
pulmonar, ou óbitos por causa desconhecida.
Reinfarto
Definido como novo evento (além do que motivou a
entrada do paciente no estudo), inclui pelo menos dois dos
critérios a seguir:
•
•
Sintomas isquêmicos suspeitos de SCA sem
supradesnivelamento do ST definidos como: história
médica compatível com a nova manifestação ou um
padrão de piora de dor torácica característica de
isquemia (duração de pelo menos 10 minutos).
Alterações no eletrocardiograma (ECG) compatíveis com
uma nova isquemia [depressão de ST de pelo menos 1
mm, ou elevação de ST transitória, ou elevação de ST de
1 mm ou menos, ou inversão da onda T superior a 3 mm
em pelo menos duas derivações contíguas ou enzimas
cardíacas (ex.: CKMB), ou biomarcadores (Troponina I
ou T) elevados acima do limite superior da faixa normal*.
* Se, no início do evento suspeito, o biomarcador isquêmico
estava ainda elevado como resultado do evento índice, deverá
haver demonstração de um nível de marcador em queda antes
do início do evento suspeito. Além disso, o pico subsequente
do biomarcador isquêmico deverá ser 1,5 vez o valor anterior
ao início do evento suspeitado. Esses critérios não precisarão
ser atendidos se o biomarcador isquêmico não estiver elevado
antes do início do evento suspeitado.
Novas ondas Q, maiores ou iguais a 0,04 segundos, ou
patologia distinta daquela do evento que motivou a entrada
do paciente (ou seja, considerada como nova desde a inclusão
do paciente no estudo).
Parada cardíaca não fatal
Parada cardíaca não fatal é definida como a ressuscitação
bem sucedida de uma fibrilação ventricular documentada ou
presumida, taquicardia ventricular mantida, assistolia ou atividade
elétrica sem pulso requerendo ressuscitação cardiopulmonar,
terapia farmacológica ou desfibrilação cardíaca.
Acidente vascular cerebral
Acidente vascular cerebral é o início rápido de um novo
déficit neurológico persistente com duração superior a 24
96
Arq Bras Cardiol 2011; 97(2) : 94-99
horas. No caso de diagnóstico clínico de AVC, a tomografia
computadorizada (TC) ou imagem por ressonância nuclear
magnética (RNM) é altamente recomendada, mas não obrigatória,
ficando a critério da equipe assistente. Adicionalmente, os AVCs
serão classificados como “isquêmicos” ou “hemorrágicos”, com
base nos dados da imagem, ou de “causa incerta” se os dados
de imagem não estiverem disponíveis.
O fluxograma operacional deste registro está demonstrado
na Figura 1.
F. Detalhamento das visitas clínicas
Visita índice - aferição dos critérios de inclusão/
exclusão, dados demográficos, história médica/cirúrgica,
eletrocardiograma, marcadores de necrose miocárdica e o
tratamento realizado.
Visita de alta hospitalar ou dia 7 (o que ocorrer primeiro) aferição das complicações hospitalares e medicações.
Visita de seguimento dia 30 - aferição dos eventos
cardiovasculares maiores e medicações.
Visita de seguimento 6 meses - aferição dos eventos
cardiovasculares maiores e medicações.
Visita de seguimento 12 meses - aferição dos eventos
cardiovasculares maiores e medicações.
G. Análise estatística
Variáveis quantitativas serão descritas por média e desviopadrão na presença de distribuição normal ou mediana e
amplitude interquartil na presença de distribuição assimétrica.
As variáveis qualitativas serão apresentadas por frequências
absolutas (número de pacientes) e relativas (percentuais).
Considerando todos os centros, os desfechos serão
descritos por percentual global e pelo percentual prescrito
em cada centro e serão expressos por meio de proporções e
seus respectivos intervalos de confiança de 95%. Caso haja
grande variabilidade na prescrição, será gerada uma média
ponderada pela variância em cada centro.
Para os modelos de regressão, vamos relatar os Odds
Ratios probabilidade ou a relação de risco, o erro padrão
correspondente, os intervalos de confiança de 95% e os
valores-p associados. Vamos relatar os valores-p até três casas
decimais com valores-p inferiores a 0,001 relatados como p
< 0,001. Em todos os testes, usaremos o nível de significância
alfa bicaudal = 0,05. O exame de resíduos fornecerá uma
avaliação das suposições de modelo para as análises de
regressão. O teste Goodness-of-fit dos modelos será realizado
utilizando testes apropriados. As análises serão realizadas
usando Stata versão 10.0.
H. Financiamento
Este registro é de propriedade da SBC, utilizando
recursos financeiros dedicados a esta finalidade para a sua
execução. O Instituto de Ensino e Pesquisa do Hospital
do Coração de São Paulo (HCor/ASS) foi contratado
para operacionalizar a execução deste registro, sob a
coordenação da SBC. O comitê diretivo do registro está
descrito ao final deste artigo.
Investigadores do Registro ACCEPT
Racionalidade e métodos do registro ACCEPT
Artigo Especial
Logística para coleta de dados - ACCEPT
1º Passo: no pronto socorro
Visita diária ao pronto socorro
(Idealmente 2 vezes por dia)
Perguntar quais pacientes
foram diagnosticados
Não se esqueça dos pacientes que
foram transferidos para outras unidades
Perguntar ao médico de plantão ou enfermeiro responsável quais pacientes tem diagnóstico de
infarto agudo do miocárdio ou síndrome coronariana aguda.
Perguntar sobre os pacientes com este diagnóstico que estão internados e também aqueles que foram admitidos
no pronto socorro e transferidos para outra unidade (UCO ou CTI ou UTI) ou foram a óbito.
2º Passo: nas outras unidades
Verificar nas outras unidades pacientes que estavam em
acompanhamento e os que foram admitidos
Os pacientes são acompanhados de admissão até a alta hospitalar ou
até o 7º dia de internação. É importante verificar o leito ao qual ele foi
transferido.
Paciente na unidade
coronariana
3º Passo
Separar os prontuários dos pacientes para coleta
de dados
Da admissão à alta hospitalar ou ao 7º dia de internação
Completar a ficha de coleta
4º Passo
Responder as pendências
O centro coordenador poderá solicitar esclarecimentos de dados que não ficaram visíveis ou dados faltantes
ou confirmação de valores. para serem consideradas como completas, as fichas de coleta devem estar sem
nenhuma pendência.
Fig. 1 - Procedimentos operacionais para inclusão de pacientes no registro ACCEPT
I. Controle de qualidade dos dados
Todos os centros receberão treinamento do protocolo e
do sistema eletrônico presencial ou por telefone, estando a
equipe de coordenação disponível para solucionar dúvidas.
O controle de qualidade dos dados do estudo se dará por
variadas estratégias, como ficha eletronica dedicada para
coleta das variáveis clínicas, checagem central de dados,
monitoria presencial dos 05 centros com maior número de
pacientes recrutados e sorteio aleatório de 20% dos centros
para monitoria presencial.
J. Aspectos éticos
O protocolo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa
(CEP) do Hospital do Coração de São Paulo-SP (HCor/
ASS), em 22/06/2010, sob o número de registro 117/2010
e na sequência, cada centro participante também teve sua
aprovação no seu CEP local.
Todos os pacientes assinarão termo de consentimento livre
e esclarecido e o estudo clínico será conduzido de acordo com
os princípios da revisão atual da Declaração de Helsinque e
das Diretrizes de Boas Práticas Clínicas, em sua versão mais
recente, e da Resolução 196/96. Adicionalmente, obedecerá
às exigências legais locais e regulatórias do Brasil.
Política de publicação
Todas as apresentações do estudo e/ou publicações de
resultados terão como base dados objetivos, verificados
e validados previamente, visando garantir a precisão
dos resultados. Os detalhes sobre a responsabilidade e a
sequência dessas apresentações, e/ou publicações, serão
definidas com a SBC.
A publicação das principais conclusões da presente
pesquisa terá sua autoria com base nas contribuições dos
centros participantes. Todos os participantes do registro
Arq Bras Cardiol 2011; 97(2) : 94-99
97
Investigadores do Registro ACCEPT
Racionalidade e métodos do registro ACCEPT
Artigo Especial
(investigadores e membros dos comitês) fizeram uma
delegação de autoridade antecipada para apresentação e/
ou publicação dos principais resultados à SBC e ao IEPHCor. Qualquer apresentação ou publicação por qualquer
participante do ensaio deverá mencionar o estudo e ter a
aprovação da SBC.
Coleta de dados
Até o dia 15 de fevereiro de 2011, contabilizamos 51
centros participantes, sendo 38 já ativos, com um total de
850 pacientes incluídos, desde agosto de 2010 (35,4% do
total desejado). O término da inclusão está estimado para o
final do primeiro semestre de 2011.
Organização
Investigadores principais - Luiz Alberto Piva e Mattos e
Otávio Berwanger.
Comitê diretivo - Luiz Alberto Piva e Mattos, Otávio
Berwanger, Jorge Ilha Guimarães, Fábio Sândoli de Brito,
Renato A. Kalil, Ângelo V. de Paola, Hélio Penna Guimarães
e Alexandre Biasi Cavalcanti.
Coordenação no Instituto de Ensino e Pesquisa do HCor
- Hélio Penna Guimarães, Eliana Vieira Santucci, Luis Paulo
Duprat, Karina Normilio da Silva, Alessandra Akiko Kodama,
Marcos Thadeu de Tenuta Junior e Ana Denise Zazula.
Propriedade intelectual - Sociedade Brasileira de Cardiologia.
Coordenação e supervisão - Sociedade Brasileira de
Cardiologia e IEP-HCor.
Centros investigadores participantes
IMV Mãe de Deus, Porto Alegre/RS: Euler Roberto
Fernandes Manenti; Hospital Moinhos de Vento, Porto Alegre/
RS: Eduardo Costa Duarte Barbosa; Instituto de CardiologiaFundação Universitária de Cardiologia, Porto Alegre/RS: Oscar
Pereira Dutra; Irmandade Santa Casa de Misericórdia de Porto
Alegre/Hospital São Francisco, Porto Alegre/RS: Paulo Ernesto
Leães; Hospital de Clínicas de Porto Alegre, Porto Alegre/RS:
Carisi Anne Polanckzyk; Instituto de Cardiologia Uruguaiana,
Uruguaiana/RS: Sidney Campodonico Filho; Hospital São
Vicente, Passo Fundo/RS: Hugo Vargas Filho; Hospital Santa
Izabel, Blumenau/SC: Sérgio Luiz Zimmermann; Instituto de
Cardiologia São José, São José/SC: Ilnei Pereira Filho; Centro
Hospitalar UNIMED, Joinville/ SC: Rogério Carregoza Dantas;
Sociedade Hospitalar Angelina Caron, Campina Grande do
Sul/PR: Dalton Bertolim Précoma; Irmandade Santa Casa de
Misericórdia de Curitiba, Curitiba/PR: José Augusto Ribas
Fortes; Associação Bom Samaritano-Hospital e Maternidade
Santa Rita, Maringá/PR: Raul D’Aurea Mora Junior; Hospital
de Caridade São Vicente de Paulo, Guarapuava/PR: Stefan
Wolanski Negrão; Hospital São Paulo, São Paulo/SP: Antônio
Carlos de Camargo Carvalho; Hospital do Coração, São
Paulo/SP: Edson Renato Romano; Instituto Dante Pazzanese
de Cardiologia, São Paulo/SP: Elizabete Silva dos Santos;
98
Arq Bras Cardiol 2011; 97(2) : 94-99
Hospital Santa Paula, São Paulo/SP: Otavio Celso Eluf Gebara;
Hospital Bandeirantes, São Paulo/SP: Hélio Castello; Hospital
Sírio Libanês, São Paulo/SP: Roberto Kalil Filho; Hospital
Maternidade Celso Pierro-PUCCAMP, Campinas/SP: José
Francisco Kerr Saraiva; Hospital Vera Cruz, Campinas/SP: Sílvio
Giopatto; Santa Casa de Votuporanga, Votuporanga/SP: Mauro
Esteves Hernandes; Instituto de Moléstias Cardiovasculares,
São José do Rio Preto/SP: Gilmar Valdir Greque; Santa Casa
de Marília, Marília/SP: Pedro Beraldo de Andrade; Hospital
Regional de Presidente Prudente, Presidente Prudente/SP:
Margaret Assad Cavalcante; Instituto Nacional de Cardiologia
Laranjeiras, Rio de Janeiro/RJ: Marco Antonio de Mattos;
Hospital Barra D’Or, Rio de Janeiro/RJ: João Luiz Fernandes
Petriz; Instituto Estadual de Cardiologia Aloysio de Castro,
Rio de Janeiro/RJ: Roberto Bassan; Hospital Pró-Cardíaco,
Rio de Janeiro/RJ: Luiz Antônio de Almeida Campos; Hospital
Prontocor, Rio de Janeiro/RJ: Paulo Henrique Godoy; Hospital
Souza Aguiar, Rio de Janeiro/RJ: Marco Antonio da Costa
Araújo; Hospital Madre Tereza, Belo Horizonte/MG: Roberto
Luiz Marino; Hospital Lifecenter, Belo Horizonte/MG: Estevão
Lanna Figueiredo; Hospital Maternidade e Pronto-Socorro
Santa Lúcia, Poços de Caldas/MG: Frederico Toledo Campo
Dall’Orto; Fundação Hospitalar de Montes Claros, Montes
Claro/MG: Antonio José Marinho Cedrim Filho; Instituto
do Coração do Triangulo Mineiro, Uberlândia/MG: Roberto
Vieira Botelho; São Bernardo Apart Hospital, Colatina/ES: João
Miguel Malta Dantas; Hospital do Coração do Brasil, Brasília/
DF: Alberto Gomes Faaues Fonseca; Instituto de Cardiologia
do Distrito Federal, Brasília/DF: Núbia Welerson Vieira;
Hospital Santa Isabel, Salvador/BA: Gilson Soares Feitosa Filho;
Instituto Cardiopulmonar, Salvador/BA: Luiz Eduardo Fonteles
Ritt; São Lucas Médico Hospitalar, Aracaju/SE: Antonio Carlos
Sobral Sousa; Hospital de Terapia Intensiva, Teresina/PI: Paulo
Márcio Sousa Nunes; Hospital Português, Recife/PE: Sérgio
Montenegro; Procape, Recife/PE: Isly Lucena de Barros;
Hospital Dom Hélder Câmara, Cabo de Santo Agostinho/
PE: Audes Feitosa; Hospital do Coração do Cariri, Barbalha/
CE: Francisco Carleial Feijó de Sá; Hospital Universitário
da Universidade Federal do Maranhão, São Luis/MA: José
Albuquerque de Figueiredo Neto; Hospital de Clínicas Gaspar
Viana, Belém/PA: Hélder José Lima Reis; Hospital Universitário
Francisca Mendes, Manaus/AM: Mariano Brasil Terrazas.
Potencial Conflito de Interesses
Declaro não haver conflito de interesses pertinentes.
Fontes de Financiamento
O presente estudo foi financiado pela Sociedade Brasileira
de Cardiologia.
Vinculação Acadêmica
Não há vinculação deste estudo a programas de pósgraduação.
Investigadores do Registro ACCEPT
Racionalidade e métodos do registro ACCEPT
Artigo Especial
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99
Voltar ao índice da Capa
Artigo Original
Pressão Diastólica Final do Ventrículo Esquerdo e Síndromes
Coronarianas Agudas
Left Ventricular End Diastolic Pressure and Acute Coronary Syndromes
Rogério Teixeira, Carolina Lourenço, Rui Baptista, Elisabete Jorge, Paulo Mendes, Fátima Saraiva, Silvia Monteiro,
Francisco Gonçalves, Pedro Monteiro, Maria J. Ferreira, Mário Freitas, Luís Providência
Departamento de Cardiologia, Hospital Universitário e Faculdade de Medicina de Coimbra - Portugal
Resumo
Fundamento: Há falta de dados sobre o impacto prognóstico da pressão diastólica final do ventrículo esquerdo (PDFVE)
sobre as síndromes coronarianas agudas (SCA).
Objetivo: Avaliar a PDFVE e suas implicações prognósticas em pacientes com SCA.
Métodos: Estudo prospectivo, longitudinal e contínuo de 1.329 pacientes com SCA de um único centro, realizado entre
2004 e 2006. A função diastólica foi determinada através da PDFVE. A população foi dividida em dois grupos: Grupo
A - PDFVE < 26,5 mmHg (n = 449); Grupo B - PDFVE ≥ 26,5 mmHg (n = 226).
Resultados: Não houve diferenças significantes entre os grupos em relação aos fatores de risco para doença
cardiovascular, histórico médico e terapia médica durante a admissão. Nos pacientes do grupo A, a SCA sem elevação
do segmento ST foi mais frequente, bem como angiogramas coronarianos normais. A mortalidade hospitalar foi similar
entre os grupos, mas a sobrevida de um ano foi maior entre os pacientes do grupo A (96,9 vs 91,2%, log rank p = 0,002).
Em um modelo multivariado de regressão de Cox, uma PDFVE ≥ 26,5 mmHg (RR 2,45, IC95% 1,05 - 5,74) permaneceu
um preditor independente para mortalidade de um ano, quando ajustado para idade, fração de ejeção sistólica do VE,
SCA com elevação do segmento ST, pico da troponina, glicemia na admissão hospitalar e diuréticos após 24 horas. Além
disso, uma PDFVE ≥ 26,5 mmHg foi um preditor independente de uma futura rehospitalização por IC congestiva (RR
6,65 IC95% 1,74 - 25,5).
Conclusão: Em nossa população selecionada, a PDFVE apresentou uma influência prognóstica significante. (Arq Bras
Cardiol 2011; 97(2) : 100-110)
Palavras-chave: Insuficiência cardíaca, disfunção ventricular esquerda, síndrome coronariana aguda/prognóstico.
Abstract
Background: Data is lacking in the literature regarding the prognostic impact of left ventricular-end diastolic pressure (LVEDP) across acute
coronary syndromes (ACS).
Objective: To assess LVEDP and its prognostic implications in ACS patients.
Methods: Prospective, longitudinal and continuous study of 1,329 ACS patients from a single center between 2004 and 2006. Diastolic function
was determined by LVEDP. Population was divided in two groups: A - LVEDP < 26.5 mmHg (n = 449); group B - LVEDP ≥ 26.5 mmHg (n = 226).
Results: There were no significant differences between groups with respect to risk factors for cardiovascular disease, medical history and
medical therapy during admission. In group A, patients with non-ST elevation ACS were more frequent, as well as normal coronary angiograms.
In-hospital mortality was similar between groups, but one-year survival was higher in group A patients (96.9 vs 91.2%, log rank p = 0.002). On
a multivariate Cox regression model, a LVEDP ≥ 26.5 mmHg (HR 2.45, 95%CI 1.05 - 5.74) remained an independent predictor for one-year
mortality, when adjusted for age, LV systolic ejection fraction, ST elevation ACS, peak troponin, admission glycemia, and diuretics at 24 hours.
Also, a LVEDP ≥ 26.5 mmHg was an independent predictor for a future readmission due to congestive HF (HR 6.65 95%CI 1.74 - 25.5).
Conclusion: In our selected population, LVEDP had a significant prognostic influence. (Arq Bras Cardiol 2011; 97(2) : 100-110)
Keywords: Heart failure; ventricular dysfunction, left; acute coronary syndrome/prognoses.
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Correspondência: Rogério Teixeira •
Rua Maria Vitória Bobone, Condomínio Zen, lote 3, Ap 332 - Quinta da Portela - 3000-050 - Coimbra - Portugal
E-mail: [email protected]
Artigo recebido em 06/09/10; revisado recebido em 10/09/10; aceito em 18/03/11.
100
Teixeira e cols.
Função diastólica e síndromes coronarianas agudas
Artigo Original
Introdução
Após 10 a 20 segundos de oclusão arterial coronariana, o
tempo de relaxamento começa a diminuir com um aumento
simultâneo na pressão diastólica final do ventrículo esquerdo
(PDFVE). Anormalidades na motilidade da parede ocorrem
de 15 a 30 segundos após a oclusão da artéria responsável,
sendo seguidas por uma queda na fração de ejeção. Após essa
cascata, os sintomas isquêmicos e sinais elétricos de isquemia
podem se suceder. Contudo, esta apresentação é bastante
variável, e depende do fluxo colateral, perfusão colateral e
pré-condicionamento isquêmico1.
De acordo com o relatório de 1998 do grupo de
trabalho da Sociedade Europeia de Cardiologia sobre
como diagnosticar insuficiência cardíaca diastólica (ICD),
três condições obrigatórias precisam ser simultaneamente
satisfeitas: 1 - presença de sinais de insuficiência cardíaca
congestiva (ICC); 2 - presença de função sistólica do ventrículo
esquerdo (VE) normal ou apenas ligeiramente anormal;
3 - evidência de relaxamento ou enchimento anormal,
distensibilidade diastólica anormal ou rigidez diastólica do
VE2. O documento revisado de 2007 desafiou o terceiro
tópico, reconhecendo as dificuldades na avaliação da função
diastólica do VE e, baseado em dados recentes3, a medida da
função diastólica do VE não foi necessária para diagnosticar IC
diastólica, também chamada IC com fração de ejeção normal.
Entretanto, os autores comentaram que evidências adquiridas
de forma invasiva da disfunção diastólica do VE continuam a
ser consideradas como provas definitivas de IC com função
sistólica preservada4.
Ambos os documentos afirmaram que a presença de
PDFVE > 16 mmHg na presença de um ventrículo esquerdo
não dilatado é sinônimo de uma redução na distensibilidade
diastólica do VE e portanto um marcador da disfunção
diastólica do VE5.
Autores anteriores demonstraram que uma pressão de
cunha capilar pulmonar (PCCP) e um baixo índice cardíaco
eram preditores independentes de desfecho no contexto de
infarto agudo do miocárdio (IAM)6-8. A maior parte dos dados
atuais na literatura sobre pacientes com SCA e função diastólica
está relacionada à avaliação ecocardiográfica não invasiva da
função diastólica do VE. Como relatado por Oh e cols.9, um
padrão de enchimento restritivo após um IAM estava associado
com a ocorrência de IC durante a hospitalização. Outros
índices ecocardiográficos também foram considerados como
tendo valor prognóstico, tais como o tempo de desaceleração
(TD) < 140 ms10-12 e também a razão E/E’ > 15, como relatado
por Hillis e cols.13. Esse último grupo observou que em 250
pacientes com IAM a razão E/E’ tinha um papel prognóstico
em relação à mortalidade por todas as causas, com um valor
incremental sobre a idade e a fração de ejeção do ventrículo
esquerdo (FEVE). Contudo, havia alguns dados conflitantes na
literatura em relação à função diastólica como um marcador
de prognóstico, como o estudo ATTenuation by Adenosine of
Cardiac Complications (ATTACC), um estudo randomizado
controlado do valor aditivo da adenosina sobre a fibrinólise
no IAM com elevação do segmento ST (STEMI), o qual não
demonstrou uma importância prognóstica independente do
enchimento restritivo definido tanto por um TD <140 ms ou
razão E/A > 214.
Devido à falta de dados prognósticos relativos aos padrões
de enchimento do VE determinados de forma invasiva em
pacientes com SCA, especialmente em relação à PDFVE,
levantamos a hipótese que esta seria um preditor de desfecho
adverso após uma SCA. Para testar esta hipótese avaliamos
o valor prognóstico da PDFVE em uma população com SCA
de um único centro não selecionado, admitida para uma
estratégia invasiva durante a fase aguda.
Métodos
População de estudo
O presente foi um estudo contínuo, observacional e
prospectivo de 1.459 admissões consecutivas por SCA, entre
maio de 2004 e dezembro de 2006, de uma única unidade de
cuidados coronarianos. Excluímos 130 registros porque eram
readmissões. A população final consistiu de 1.329 pacientes.
Destes, selecionamos aqueles admitidos para uma estratégia
invasiva - 786 pacientes.
O IAM foi definido de acordo com a Definição Universal de
infarto de miocárdio, como um biomarcador cardíaco positivo
(nomeadamente troponina I), com sintomas de isquemia ou
variações do ECG indicativas de nova isquemia (ondas ST e
T e novo bloqueio de ramo)15.
Em relação aos dados do ECG, STEMI foi definido como
um novo aumento do segmento ST > 2 mm em derivação
precordial para homens e 1,5 mm para mulheres, e > 1 mm
em outras derivações. IAM sem elevação do segmento ST
(NSTEMI), além dos critérios laboratoriais e clínicos anteriores,
podia estar associado ou não com variações isquêmicas no ECG
(nomeadamente depressão do ST ou inversão de onda T)15.
Angina instável foi definida tanto por novo início de
angina (pelo menos classe III da Canadian Cardiovascular
Society [CSS]), angina progressiva ou angina de repouso,
com ou sem alterações isquêmicas e um ensaio negativo de
biomarcador cardíaco16.
A função sistólica do VE foi avaliada através de
ecocardiografia, de acordo com o método de Simpson. A
avaliação considerada nesse estudo foi realizada nas 24 horas
após a avaliação invasiva.
A PDFVE foi determinada no laboratório de cateterização,
usando um sistema calibrado preenchido de fluido antes da
ventriculografia esquerda. A PDFVE foi medida no ponto Z, o
qual foi identificado no traçado da pressão ventricular esquerda
como o ponto no qual a inclinação (slope) da elevação da
pressão ventricular muda, aproximadamente 50 ms após a onda
Q do ECG e geralmente coincidindo com a onda R do ECG17.
A decisão de determinar a PDFVE foi tomada pelo médico
hemodinamicista. Todos os pacientes foram encaminhados
para procedimento invasivo primariamente para diagnóstico
de doença arterial coronariana (DAC) e não exclusivamente
para avaliação invasiva da hemodinâmica do VE.
Biomarcadores cardíacos, nomeadamente Troponina I e
CKMB foram avaliados diariamente e os valores de pico durante
a hospitalização também foram utilizados em nossa análise.
A população foi dividida em dois grupos, com base na
PDFVE. O grupo A incluiu 449 pacientes com PDFVE <
Arq Bras Cardiol 2011; 97(2) : 100-110
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Teixeira e cols.
Função diastólica e síndromes coronarianas agudas
Artigo Original
26,5 mmHg. Os pacientes do Grupo B tinham PDFVE ≥
26,5 mmHg e consistia em 226 indivíduos. A PDFVE não foi
determinada em 111 pacientes.
O presente estudo seguiu os princípios contidos na
Declaração de Helsinki. O Comitê de Ética local aprovou o
protocolo de pesquisa e consentimento livre e informado foi
obtido de todos os indivíduos.
Dados basais e seguimento dos pacientes
Analisamos registros padronizados durante a hospitalização
que incluíam dados demográficos, clínicos, eletrocardiográficos,
ecocardiográficos e laboratoriais. Terapia médica, dados de
cateterização, curso intrahospitalar e medicamentos na alta
hospitalar também foram registrados.
A mediana do seguimento clínico foi de até 19 meses
após a alta hospitalar. As informações foram coletadas por
telefone, a partir de registros hospitalares ou no ambulatório.
O endpoint primário foi mortalidade por todas as causas
um ano após a alta. Outros resultados foram analisados, tais
como o resultado combinado de morte cardiovascular, infarto
não fatal, rehospitalização por angina instável e intervenção
coronariana percutânea não programada - eventos cardíacos
adversos importantes (MACE) e rehospitalização por ICC um
ano após a hospitalização por SCA.
Análise estatística
O teste de Kolmogorov-Smirnov foi usado para avaliar
se as variáveis contínuas tinham distribuição normal ou
não. Dados contínuos foram apresentados como médias
e desvios-padrão e comparados com o teste t de Student.
Variáveis categóricas foram apresentadas como frequências
e porcentagens e o teste χ2 ou Exato de Fisher foram usados
quando apropriado.
As curvas de sobrevida cumulativa foram construídas com
o método de Kaplan-Meier e os grupos foram comparados
através do teste de log rank. O período observacional iniciouse com a alta hospitalar e durou um ano.
Uma análise multivariada de regressão de Cox foi realizada
para o endpoint primário e também para a rehospitalização
por IC um ano após a SCA. Variáveis que foram significantes no
nível bivariado (p < 0,05), ou que tinham relevância clínica,
foram incluídas nos modelos.
Com exceção do teste de Kolmogorov–Smirnov, todos os
testes estatísticos eram bicaudais e um valor de p < 0,05 foi
considerado significante. As análises foram realizadas com
o pacote estatístico SPSS 15 (Statistical Package for Social
Sciences) da SPSS Inc, Chicago, IL.
Resultados
O valor da PDFVE estava disponível para 675 pacientes.
O valor médio para a população foi de 23,2 mmHg, com
um valor máximo de 52,0 mmHg, e mínimo de 2,3 mmHg.
O valor de corte de 26,5 mmHg apresentou a maior
sensibilidade (58%) e especificidade (61%) - área sob a
curva ROC de 0,60, para o endpoint primário selecionado
(mortalidade por todas as causas).
102
Arq Bras Cardiol 2011; 97(2) : 100-110
A coorte do estudo consistiu em 499 homens e
176 mulheres, com média de idade de 63,5 anos. As
características basais demográficas e clínicas e o tratamento
durante a hospitalização de ambos os grupos são mostrados
nas Tabelas 1 a 4.
Uma maior PDFVE estava associada com infarto do
miocárdio com elevação do segmento ST (STEMI), maiores
valores de pico de biomarcadores cardíacos, menor fração
de ejeção do VE (FEVE) e um VE mais dilatado. Houve uma
correlação negativa significante entre a PDFVE e a FEVE (r:
-0,324; p < 0,01).
Pa c i e n t e s c o m m e n o r P D F V E t i n h a m m e n o r
probabilidade de IC durante a hospitalização, receberam
menos prescrições de diuréticos em 24 horas (17,4 vs 28,3
%, p = 0,001), e mais frequentemente apresentavam um
angiograma coronariano normal.
Não houve outras diferenças significantes em relação
à terapia intrahospitalar e após a alta hospitalar. A
mortalidade intrahospitalar foi similar em ambos os grupos
(2,4 vs 4,9%, p = 0,095).
Desfecho
Em relação ao seguimento, dados estavam disponíveis para
618 dos pacientes que receberam alta hospitalar, com uma
taxa de perda de seguimento de 5,4%.
Uma maior PDFVE estava associada com menor taxa de
sobrevivência em um, seis e doze meses após a alta - Tabela
5. A taxa de sobrevida cumulativa era significantemente
menor nos pacientes do grupo B (96,9 vs 91,2% log rank p =
0,002) - Figura 1. Essa diferença permaneceu significante para
o subgrupo com função sistólica preservada (FEVE ≥ 40%),
mas a estratificação proposta para PDFVE como marcador de
sobrevida não foi significante para depressão da função do
VE (FEVE < 40%). O valor de p para a interação entre essas
três últimas variáveis não foi significante (0,59).
Na análise univariada, uma PDFVE ≥ 26,5 mmHg estava
significantemente associada com maior mortalidade um ano
após a alta hospitalar - Tabela 6, bem como a idade, FEVE,
STEMI, diuréticos em 24 horas, glicemia na hospitalização e
valor de pico da Troponina I. Em um modelo composto que
incluiu as sete variáveis anteriores, a PDFVE como variável
contínua não foi um preditor independente de desfecho
(HR = 1,03, IC95%: 0,98 - 1,08; p = 0,17) - Tabela 6. Não
houve interações entre a PDFVE e a FEVE em relação a esse
endpoint, bem como em um modelo de regressão de Cox que
incluiu apenas aquelas duas variáveis, ambas permaneceram
significantes (dados não mostrados).
A sobrevida cumulativa livre de ICC no ano após a
hospitalização inicial foi significantemente mais alta em
pacientes com menor PDFVE (98,1 vs 93,2%, log rank p
= 0,004) - Figura 2. A estratificação da PDFVE proposta
também teve um impacto significante para a subpopulação
com FEVE ≥ 40%, mas não para aqueles pacientes com FEVE
< 40%. O valor de p para a interação de PDFVE, FEVE e IC
no seguimento não foi significante (0,37). A PDFVE, como
variável contínua, permaneceu um preditor independente
de rehospitalização por IC em um modelo composto que
incluiu a PDFVE (como variável contínua), idade, pico da
Teixeira e cols.
Função diastólica e síndromes coronarianas agudas
Artigo Original
Tabela 1 - Características basais
Todos os pacientes
Número de pacientes
Sexo masculino (%)
Idade (média, DP)
A - PDFVE < 26,5
B - PDFVE ≥ 26,5
p
675
449
226
499/675 (73,9)
337/449(75,1)
162/226 (71,7)
0,35
63,5 ± 12,4
63,3 ± 11,8
63,8 ± 13,4
0,61
Diagnóstico na hospitalização (%)
STEMI
281/654 (43,0)
164/439 (37,3)
117/215 (54,4)
<0,01
NSTEMI
234/654 (35,8)
171/439 (39,0)
63/215 (29,3)
0,01
AI
123/654 (18,8)
94/439 (21,4)
29/215 (13,5)
0,02
16/654 (2,4)
10/439 (2,3)
6/215 (2,8)
0,69
Padrão indeterminado
Fatores de risco para doença cardiovascular (%)
Diabete
171/671 (25,3)
108/446 (24,2)
63/225 (28,0)
0,29
Dislipidemia
439/628 (65,0)
283/416 (68,0)
156/212 (73,6)
0,15
Hipertensão
440/631 (65,2)
284/418 (67,9)
156/213 (73,2)
0,17
Tabagismo atual
153/675 (22,7)
101/449 (22,5)
52/226 (23,0)
0,88
Infarto do miocárdio prévio
89/616 (13,2)
57/409 (13,9)
32/207 (15,5)
0,61
Histórico cardiovascular (%)
ICP prévia
67/661 (9,9)
44/439 (10,0)
23/222 (10,4)
0,89
IC prévia
2/310 (0,3)
1/235 (0,4)
1/75 (1,3)
0,39
AVC prévio
36/671 (5,3)
27/446 (6,1)
9/225 (4,0)
0,27
150/401 (37,4)
106/275 (38,5)
44/126 (34,9)
0,49
Medicamentos prévios (%)
Aspirina
Outros antiplaquetários
51/401 (12,7)
35/275 (12,7)
16/126 (12,7)
0,99
Betabloqueadores
86/401 (21,4)
62/275 (22,5)
24/126 (19,0)
0,43
Inibidores de ECA
148/401 (36,9)
104/275 (37,8)
44/126 (34,9)
0,58
Estatinas
133/401 (33,2)
91/275 (33,1)
42/126 (33,3)
0,96
Diuréticos
77/401 (19,2)
56/275 (20,4)
21/126 (16,7)
0,38
Nitratos
72/401 (18,0)
52/275 (18,9)
20/126 (15,9)
0,46
STEMI - infarto agudo do miocárdio com elevação do segmento ST; NSTEMI - infarto agudo do miocárdio sem elevação do segmento ST; AI - angina instável; ICP intervenção coronariana percutânea; IC - insuficiência cardíaca; ECA - enzima conversora de angiotensina; PDFVE - pressão diastólica final do ventrículo esquerdo.
Troponina I, STEMI, escore de risco TIMI, diuréticos em 24
horas e fibrilação atrial (FA) - Tabela 7.
Discussão
Nossos dados confirmaram a PDFVE como uma variável
de estratificação de risco durante a SCA. Como variável
contínua e após ajustes, a PDFVE teve um impacto prognóstico
em relação à rehospitalização por IC após uma SCA - para
cada aumento de 1 mmHg, o risco relativo aumentou 1,10
vezes (1,04 a 1,16). Contrariamente, a PDFVE não foi um
preditor independente em relação à mortalidade hospitalar,
mortalidade de um ano e complicações isquêmicas de um ano
(taxa de MACE). O ponto de corte de 16 mmHg utilizado para
identificar a disfunção diastólica do VE4, não foi um preditor
univariado de mortalidade no seguimento. Estava associado
com uma taxa mais alta de rehospitalização por IC (dados não
mostrados), mas com menor sensibilidade e especificidade.
Prognóstico
Como relatado anteriormente, uma maior PCCP - um
marcador de distensibilidade diastólica do VE no contexto
de IAM estava associada com infartos maiores18 e com pior
função sistólica do VE19.
Em nossa população, uma maior PDFVE estava mais
frequentemente relacionada com STEMI e com maiores
valores de pico de Troponina I. Isso estava de acordo com o
trabalho de Bronzear e cols.20, pois o miocárdio isquêmico
estava associado com pressões de enchimento do VE mais
altas e redução na distensibilidade do VE durante a isquemia
induzida por estímulo.
Nosso trabalho também corroborou os dados clínicos
anteriores relatados por Killip e Kimball em 1967, de que
uma pressão de enchimento do VE mais alta era sinônimo
de diagnóstico intrahospitalar de IC21.
Arq Bras Cardiol 2011; 97(2) : 100-110
103
Teixeira e cols.
Função diastólica e síndromes coronarianas agudas
Artigo Original
Tabela 2 - Dados hemodinâmicos, elétricos e laboratoriais
Todos os pacientes
A - PDFVE < 26,5
B - PDFVE ≥ 26,5
p
FC, bpm (média, DP)
76,5 ± 15,3
75,2 ± 15,3
78,8 ± 15,4
0,05
Pressão arterial sistólica, mmHg (média, DP)
135,0 ± 24,3
136,3 ± 23,2
134,8 ± 26,8
0,46
Pressão arterial diastólica, mmHg (média, DP)
73,9 ± 14,2
73,4 ± 13,7
74,3 ± 15,3
0,48
Escore de risco TIMI ≤ 2 (%)
342/675 (50,7)
236/449 (52,6)
106/226 (46,9)
0,17
Escore de risco TIMI 3 e 4 (%)
276/675 (40,9)
177/449 (39,4)
99/226 (43,8)
0,27
Escore de risco TIMI ≥ 5 (%)
57/675 (8,4)
36/449 (8,0)
21/226 (9,3)
0,57
27,7 ± 4,8
27,4 ± 4,6
28,3 ± 5,3
0,03
613/671 (91,4)
409/446 (91,7)
204/225 (90,7)
0,65
36/671 (5,4)
23/446 (5,2)
13/225 (5,8)
0,74
Dados hemodinâmicos na hospitalização
IMC (kg/m )
2
Dados elétricos na hospitalização (%)
Ritmo sinusal
FA
Depressão do segmento ST
47/671 (7,0)
33/446 (7,4)
14/225 (6,2)
0,57
96/671 (14,3)
69/446 (15,5)
27/225 (12,0)
0,23
44,5 ± 63,0
33,0 ± 58,2
53,9 ± 69,0
<0,01
Pico de CKMB massa, U/l
125,4 ± 177,7
96,9 ± 134,8
171,0 ± 233,2
<0,01
Colesterol total, mg/dl
194,7 ± 49,6
192,7 ± 48,4
199,0 ± 53,2
0,20
LDL colesterol, mg/dl
131,2 ± 37,0
130,4 ± 36,1
133,9 ± 39,7
0,34
HDL colesterol, mg/dl
43,3 ± 10,3
42,4 ± 10,0
44,5 ± 10,5
0,04
Taxa de filtração glomerular, ml/min
71,5 ± 21,5
72,4 ± 20,7
69,4 ± 23,2
0,12
Glicemia na hospitalização, mg/dl
Inversão da onda T
Dados Laboratoriais (média, DP)
Pico da Troponina I, U/l
149,4± 63,9
155,5 ± 68,4
144,7 ± 59,0
0,06
Hemoglobina na hospitalização, g/dl
14,2 ± 1,6
14,2 ± 1,7
14,0 ± 1,6
0,20
Hemoglobina mínima, g/dl
12,4 ± 1,7
12,4 ± 1,7
12,1 ± 1,7
0,06
FC - frequência cardíaca; IMC - índice de massa corporal; FA - fibrilação atrial; PDFVE - pressão diastólica final do ventrículo esquerdo.
Tabela 3 - Tratamento hospitalar
Nas primeiras 24 horas
Medicamentos na alta hospitalar
A - PDFVE < 26,5
B - PDFVE ≥ 26,5
p
A - PDFVE < 26,5
B - PDFVE ≥ 26,5
p
AAS (%)
436/449 (97,1)
219/226 (96,9)
0,88
388/438 (88,6)
197/215 (87,2)
0,45
Clopidogrel (%)
332/449 (73,9)
179/226 (79,2)
0,13
268/438 (61,2)
138/215 (64,2)
0,46
Betabloqueadores (%)
381/449 (84,9)
184/226 (81,4)
0,25
349/438 (79,7)
169/215 (78,6)
0,75
Inibidores de ECA (%)
406/449 (90,4)
206/226 (91,2)
0,76
389/438 (88,8)
187/215 (87,0)
0,49
Estatinas(%)
444/449 (98,9)
221/226 (97,8)
0,27
417/438 (95,2)
206/215 (95,8)
0,73
Inibidores da Gp IIb/IIIa (%)
241/449 (53,7)
136/226 (60,2)
0,11
HBPM
444/449 (98,9)
221/226 (97,8)
0,27
Diuréticos (%)
78/449 (17,4)
64/226 (28,3)
0,01
Nitratos (%)
165/449 (36.7)
83/226 (36,7)
0,99
AAS - ácido acetilsalicílico; HBPM - heparina de baixo peso molecular; Gp - glicoproteína; PDFVE - pressão diastólica final do ventrículo esquerdo.
Similar aos dados publicados recentemente sobre a
classificação invasiva de Forrester, a PCCP não foi um
preditor independente de desfecho intrahospitalar8, como
a PDFVE não foi em nosso estudo. Essa falta de influência
prognóstica pode ter as seguintes explicações: primeiro,
104
Arq Bras Cardiol 2011; 97(2) : 100-110
embora a presente coorte representasse um grupo de
pacientes consecutivos, nem todos os pacientes submetidos
à angiografia coronariana foram submetidos à avaliação
invasiva da função diastólica do VE. A mortalidade hospitalar
para os 111 pacientes submetidos à angiografia coronariana
Teixeira e cols.
Função diastólica e síndromes coronarianas agudas
Artigo Original
Tabela 4 - Dados do ecocardiograma e laboratório de cateterismo
A - PDFVE < 26,5
B - PDFVE ≥ 26,5
p
Átrio esquerdo, mm º
41,4 ± 6,6
41,4 ± 6,5
0,97
Diâmetro sistólico final do VE, mm º
38,9 ± 6,9
41,7 ± 7,8
<0,01
Diâmetro diastólico final do VE, mm º
56,2 ± 6,6
58,4 ± 6,6
<0,01
54,6 ± 9,05
48,8 ± 11,2
<0,01
58/447 (13,0)
64/226 (28,3)
<0,01
Dados ecocardiográficos
FEVE, % º
FEVE < 40% *
Fração de encurtamento do VE, % º
31,5 ± 5,5
29,8 ± 6,2
0,01
Motilidade anormal da parede do VE*
233/332 (70,2)
146/175 (83,4)
0,01
Insuficiência mitral *
202/359 (56,3)
115/191 (60,2)
0,73
32,4 ± 10,4
31,9 ± 11,0
0,81
Pressão arterial sistólica pulmonar, mmHg º
Dados do laboratório de cateterismo
2,0 ± 1,9
1,5 ± 1,5
0,06
Angiograma coronariano ≤ 48 horas *+
Tempo até balão (angioplastia primária), horas
79/224 (35,3)
30/70 (42,9)
0,25
Angiograma coronariano > 48 horas* +
145/224 (64,7)
40/70 (57,1)
0,25
Angiograma coronariano normal*
68/418 (16,3)
19/211 (9,0)
0,01
Doença coronariana uniarterial*
172/418 (41,1)
91/211 (43,1)
0,64
Doença coronariana biarterial*
96/418 (23,0)
52/211 (24,6)
0,64
Doença coronariana triarterial*
77/418 (18,4)
49/211 (23,2)
0,16
Totalmente revascularizado*
172/350 (49,1)
94/192 (49,0)
0,96
Parcialmente revascularizado*
89/350 (26,0)
50/192 (26,0)
0,88
Não revascularizado*
89/350 (25,4)
48/192 (25,0)
0,91
Stent*
258/418 (61,7)
133/211 (63,0)
0,75
Stents farmacológicos*
181/258 (70,2)
91/132 (68,9)
0,81
16/418 (3,8)
6/211 (2,8)
0,53
Revascularização cirúrgica*
º - média ± DP; * - %; + para SCA sem elevação do segmento ST; FEVE - fração de ejeção do ventrículo esquerdo; PDFVE - pressão diastólica final do ventrículo esquerdo.
Tabela 5 - Desfechos hospitalares e um ano após a alta hospitalar
Tempo de permanência (dias)
Mortalidade hospitalar (%)
A - PDFVE < 26,5
B - PDFVE ≥26,5
5,2 ± 2,5
5,9 ± 3,7
OR (IC95%)
p
<0,01
11/449 (2,4)
11/226 (4,9)
1,99 (0,88 – 4,51)
0,01
Diagnóstico hospitalar de IC (%)
128/446 (28,7)
84/225 (37,3)
1,48 (1,05 – 2,08)
0,02
Mortalidade geral em 30 dias (%)
1/414 (0,2)
4/204 (2,0)
8,12 (0,91 – 72,2)
0,03
Mortalidade geral em 6 meses (%)
9/414 (2,2)
14/204 (6,9)
3,16 (1,39 – 7,17)
<0,01
Mortalidade geral em 1 ano (%)
13/414 (3,1)
18/204 (8,8)
2,81 (1,41 – 5,62)
0,01
Mortalidade cumulativa em 30 dias (%)
12/449 (2,7)
15/226 (6,6)
2,48 (1,18 – 5,22)
<0,01
Mortalidade cumulativa em 6 meses (%)
20/449 (4,5)
25/226 (11,1)
2,48 (1,41 – 4,37)
<0,01
Mortalidade cumulativa em 1 ano (%)
24/449 (5,3)
29/226 (12,8)
2,40 (1,43 – 4,03)
<0,01
MACE 1 ano (%)
46/414 (11,1)
33/204 (16,2)
1,45 (0,96 – 2,19)
0,08
8/414 (1,9)
14/204 (6,9)
3,59 (1,51 – 8,33)
0,01
IC 1 ano (%)
MACE - eventos cardíacos adversos importantes; IC - insuficiência cardíaca; PDFVE - pressão diastólica final do ventrículo esquerdo.
Arq Bras Cardiol 2011; 97(2) : 100-110
105
Teixeira e cols.
Função diastólica e síndromes coronarianas agudas
Artigo Original
Sobrevida de um ano ao final do primeiro ano após a SCA
96,9%
Sobrevida cumulativa
90,9%
PDFVE < 26,5 mmHg
PDFVE ≥ 26,5 mmHg
.00 - censurado
1.00 - censurado
Log Rank p = 0,002
414
391
335
204
187
165
Tempo após alta, dias
Rehospitalização por insificiência cardíaca após a síndrome coronariana aguda
Sobrevida cumulativa livre de IC
98,1%
93,2%
PDFVE < 26,5 mmHg
PDFVE ≥ 26,5 mmHg
1.00 - censurado
2.00 - censurado
Log Rank p = 0,004
414
365
315
204
179
157
Tempo após alta, dias
Fig. 1 e 2 - Desfechos em relação à sobrevida geral e rehospitalização por IC um ano após a SCA.
e cuja função diastólica não foi avaliada, foi 9% e dessa
forma, uma exclusão dos pacientes com maior risco pode
ter acontecido. Segundo, o tratamento médico com nitratos,
diuréticos e vasodilatadores influenciaram as condições de
carga do VE e, consequentemente, a PDFVE, e por último,
a evolução da SCA com o tempo pode ter tido um impacto
na isquemia miocárdica, desenvolvimento de fibrose e
106
Arq Bras Cardiol 2011; 97(2) : 100-110
alterações na geometria do VE, o que também influenciou
as pressões de enchimento e a distensibilidade do VE22.
Como descrito anteriormente, o atordoamento precoce do
miocárdio pode, de maneira transitória, aumentar a PDFVE
com subsequente normalização das pressões de enchimento
em longo prazo23. Isso, associado com a exclusão de 111
pacientes também poderia, em nossa opinião, explicar a baixa
Teixeira e cols.
Função diastólica e síndromes coronarianas agudas
Artigo Original
Tabela 6 - Preditores univariados de mortalidade por todas as causas um ano após a SCA
Sobreviventes
Número
Falecidos
OR (IC95%)
p
587
31
Sexo feminino*
150/587 (25,6)
7/31 (22,6)
0,85 (0,36 – 2,01)
0,71
STEMI*
238/570 (41,8)
19/29 (65,5)
2,65 (1,21 – 5,80)
0,01
Diabete*
142/587 (24,2)
11/31 (35,5)
1,72 (0,81 – 3,68)
0,16
Hipertensão*
386/553 (69,8)
22/27 (81,5)
1,90 (0,71 – 5,11)
0,19
29/587 (4,9)
1/31 (3,2)
0,64 (0,08 – 4,87)
0,67
Depressão do ST ao ECG *
41/587 (7,0)
1/31 (3,2)
0,44 (0,06 – 3,34)
0,42
Angiograma coronariano normal *
85/587 (14,5)
1/31 (3,2)
0,20 (0,03 – 1,46)
0,08
Doença triarterial*
114/587 (19,4)
10/31 (32,3)
1,98 (0,91 – 4,31)
0,08
Revascularização percutânea completa*
248/502 (49,4)
11/30 (36,7)
0,59 (0,28 – 1,27)
0,18
Diuréticos 24 horas *
102/587 (17,4)
15/31 (48,4)
4,46 (2,13 – 9,31)
<0,01
Maior pico de troponina I (U/l) º
33,7 ± 51,4
92,9 ± 102,0
<0,01
Glicemia na hospitalização (mg/dl) º
144,1 ± 60,3
184,9 ± 66,0
<0,01
Idade (anos) º
62,9 ± 12,1
71,3 ± 109
<0,01
PDFVE (mmHg) *
23,0 ± 8,1
27,3 ± 11,7
<0,01
FEVE (%) º
53,2 ± 9,9
45,1 ± 11,4
<0,01
IMC (kg/m2) º
27,7 ± 4,8
27,0 ± 3,5
0,41
Taxa de filtração glomerular (ml/min) º
72,4 ± 20,4
71,6 ± 26,0
0,82
Fibrilação atrial *
º média ± DP; * %
Análise de regressão multivariada de Cox para mortalidade geral um ano após a SCA
Variáveis
RR
Valor de p
IC95%
Pico da Troponina I
1,01
<0,01
1,00 – 1,01
Idade
1,05
0,02
1,01 – 1,09
Glicemia na hospitalização
1,01
0,02
1,00 – 1,01
Diuréticos em 24 horas
2,35
0,048
1,01 – 5,48
PDFVE
1,03
0,17
0,98 – 1,08
STEMI
1,13
0,80
0,44 – 2,90
FEVE
0,99
0,45
0,96 – 1,02
Número de eventos - 27; População - 490 pacientes; Qui-quadrado - 47,3; p < 0,01. STEMI - infarto agudo do miocárdio com elevação do segmento ST; ECG eletrocardiograma; PDFVE - pressão diastólica final do VE; FEVE - fração de ejeção do VE; IMC - índice de massa corporal.
sensibilidade e especificidade do ponto de corte proposto
para a PDFVE, para o desfecho primário de nossa análise.
A importância da função diastólica como marcador
prognóstico estava de acordo com autores de estudos anteriores,
que analisaram o papel de vários marcadores ecocardiográficos,
tais como a razão E/A, o TD da onda E e a razão E/E’9-13.
A razão E/E’ é o método mais confiável de avaliação
da função diastólica como a correlação com as pressões
de enchimento do VE e ao contrário de outros índices,
está presente mesmo em pacientes com função sistólica
preservada. Quando a razão E/E’ é maior que 15, as pressões
de enchimento do VE estão elevadas e quando razão é menor
que 8, as pressões de enchimento do VE estão baixas24. Uma
razão E/E’ variando de 8 a 15 é considerada sugestiva, mas não
diagnóstica de disfunção diastólica do VE e outras investigações
não-invasivas precisam ser realizadas para confirmar o
diagnóstico de disfunção diastólica4. Outras desvantagens da
razão E/E’ são o fato de que o Doppler tecidual não consegue
separar contração ativa de movimentação passiva (tethering),
velocidades anulares podem variar dependendo da localização
da amostra e são influenciados por IAM “local” e a presença
de calcificação do anel mitral12. Analisando os dados do
trabalho de Hillis e cols.13, uma razão E/E’ maior que 15 teve
significância prognóstica, mas a média da razão E/E’ para os
250 pacientes pós-infarto selecionados foi 13,8 ± 6,8, o que
estava precisamente na zona “cinza” da avaliação da função
diastólica13. Entretanto, a razão E/E’ > 15 foi um preditor
independente de sobrevivência no seguimento. Em nossa
população, a PDFVE como variável categórica (com um ponto
de corte em 26,5 mmHg, dados não mostrados), também
permaneceu um preditor independente de sobrevivência, mas
como variável contínua, perdeu essa capacidade.
Arq Bras Cardiol 2011; 97(2) : 100-110
107
Teixeira e cols.
Função diastólica e síndromes coronarianas agudas
Artigo Original
Tabela 7 - Preditores univariados de rehospitalização por ICC um ano após a SCA
Sem eventos
Número
Eventos
OR (95% CI)
p
596
22
Sexo feminino *
151/596 (25,3)
6/22 (27,3)
1,11 (0,43 – 2,88)
0,84
STEMI*
243/578 (42,0)
14/21 (66,7)
2,76 (1,10 – 6,93)
0,03
Diabete*
146/596 (24,5)
7/22 (31,8)
1,10 (0,83 – 1,48)
0,44
Hipertensão*
392/560 (70,0)
16/20 (80,0)
1,71 (0,57 – 5,20)
0,34
Escore de risco TIMI ≤ 2*
311/596 (52,2)
3/22 (13,6)
0,15 (0,04 – 0,49)
<0,01
PDFVE ≥ 26,5 mmHg *
190/596 (31,9)
14/22 (63,6)
3,74 (1,54 – 9,07)
0,02
Fibrilação atrial *
27/596 (4,5)
3/22 (13,6)
3,33 (0,93 – 11,94)
0,05
Angiograma coronariano normal *
85/596 (14,3)
1/22 (4,5)
0,29 (0,04 – 2,16)
0,20
Revascularização percutânea incompleta *
259/511 (50,7)
14/22 (66,7)
1,95 (0,77 – 4,90)
0,15
Diuréticos 24 hours *
107/596 (18,0)
10/22 (45,5)
3,81 (1,60 – 9,04)
0.01
PDFVE (mmHg) º
22,8 ± 8,2
30,8 ± 8,6
<0.01
Pico da troponina I (U/l) º
35,0 ± 53,3
88,5 ± 104,6
<0.01
Idade (anos) º
62,9 ± 12,1
74,2 ± 7,1
<0.01
FEVE (%) º
53,2 ± 9,9
41,1 ± 10,0
<0.01
IMC (kg/m )º
27,7 ± 4,8
28,0 ± 3,0
0.77
2
º média ± DP; * %
Análise de regressão multivariada de Cox para rehospitalização por ICC um ano após a SCA
Variáveis
RR
Valor de p
IC95%
PDFVE
1,10
<0,01
1,04 – 1,16
Idade
1,10
0,01
1,02 – 1,16
Pico da troponina I
1,01
0,03
1,00 – 1,01
Diuréticos 24 horas
1,44
0,49
0,52 – 3,94
FEVE
0,98
0,31
0,95 – 1,02
Fibrilação atrial
0,94
0,95
0,12 – 7,38
STEMI
0,73
0,63
0,21 – 2,57
Escore de risco TIMI ≤ 2
0,27
0,09
0,06 – 1,27
Número de eventos - 17; População - 489; Qui-quadrado –52,1; p < 0,01. ICC - insuficiência cardíaca congestiva; FEVE - fração de ejeção do VE; IMC - índice de massa
corporal; PDFVE - pressão diastólica final do VE; STEMI - infarto agudo do miocárdio com elevação do segmento ST.
De IC diastólica à congestiva
O maior valor prognóstico da hemodinâmica invasiva
vs sinais clínicos de pressões de enchimento elevadas já
havia sido descrito por Shell e cols.25. Em nossa população,
observamos que a avaliação da função diastólica teve um
maior valor preditivo para rehospitalização por ICC do que
variáveis clínicas, tais como a classe de Killip-Kimball, e
mesmo o grau de revascularização percutânea.
A história natural da IC de etiologia isquêmica é
baseada no desenvolvimento de disfunção diastólica,
seguida por IC diastólica e finalmente pelo aparecimento
de IC sistólica 26 . A sobrecarga de pressão do VE irá
causar estiramento do miócito, aumento do estresse da
parede, piora na perfusão subendocárdica e redução
da produção de energia, o que por sua vez irá causar a
ativação neurohormonal e remodelamento ventricular.
108
Arq Bras Cardiol 2011; 97(2) : 100-110
Esses mecanismos compensatórios são deletérios e assim,
causarão, no futuro, a perda da função sistólica do VE e
de sobrevida.
Nossos dados fortemente confirmam esse paradigma, pois
a função diastólica foi um determinante de hospitalização
futura por ICC e, portanto, de remodelamento do VE,
principalmente no grupo de pacientes com função sistólica
preservada. Na população com FEVE < 40% durante a
hospitalização inicial pela SCA, a função diastólica não
foi forte o suficiente para determinar o prognóstico - a
disfunção sistólica superou a disfunção diastólica.
Esse subgrupo de pacientes com SCA e fração de ejeção
preservada e PDFVE mais alta não deveriam, portanto, ser
estereotipados como sendo de baixo risco e bloqueadores
neuro-hormonais, vasodilatadores e provavelmente
diuréticos podem ter uma importância crucial.
Teixeira e cols.
Função diastólica e síndromes coronarianas agudas
Artigo Original
Limitações do estudo
Embora a presente coorte represente um grupo de
pacientes consecutivos, nem todos os pacientes submetidos
à angiografia coronariana tiveram uma avaliação invasiva da
função diastólica do VE, já que tal avaliação foi realizada
por decisão do cardiologista invasivo. Além disso, somente
60% dos 1.329 pacientes admitidos em nossa Unidade
Coronariana foram submetidos à estratégia invasiva.
Portanto, uma exclusão dos pacientes com maior risco
pode ter ocorrido. Também lamentamos a taxa de perda
de seguimento de 5,4%.
Os índices sistólico e diastólico refletiram medidas
instantâneas e podiam variar durante o período da SCA.
Sendo assim, uma única medida pode não refletir o melhor
índice prognóstico. Além disso, não havia registros de função
diastólica antes da hospitalização inicial por SCA, nem
avaliação não-invasiva por ecocardiografia do fluxo mitral.
Conclusões
Em nossa população com SCA, a PDFVE foi um preditor
independente de futura rehospitalização por IC.
Potencial Conflito de Interesses
Declaro não haver conflito de interesses pertinentes.
Fontes de Financiamento
O presente estudo não teve fontes de financiamento
externas.
Vinculação Acadêmica
Não há vinculação deste estudo a programas de pósgraduação.
Referências
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Artigo Original
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Artigo Original
Comparação entre a Ecocardiografia 2D e 3D na Avaliação do
Remodelamento Reverso após a TRC
Comparison between 2D and 3D Echocardiography in the Evaluation of Reverse Remodeling after CRT
Viviane Tiemi Hotta1,2, Martino Martinelli Filho1, Charles Mady1, Wilson Mathias Jr1, Marcelo Luiz Campos Vieira1,3
Instituto do Coração (InCor) da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo1, Fleury Medicina e Saúde2, Hospital Israelita Albert
Einstein3, São Paulo, SP - Brasil
Resumo
Fundamento: A ecocardiografia consiste em método muito útil para seleção e avaliação de resposta à terapia de
ressincronização cardíaca (TRC). O ecocardiograma tridimensional já tem seu papel estabelecido na avaliação dos
volumes ventriculares e fração de ejeção ventricular esquerda (FEVE) com excelente correlação de resultados quando
comparado à ressonância nuclear magnética (RNM).
Objetivo: Comparar a avaliação dos volumes ventriculares (VDVE, VSVE), FEVE e massa do VE antes e após a TRC pela
ecocardiografia bi (Eco 2D) e tridimensional (Eco 3D).
Métodos: Foram avaliados 24 pacientes com insuficiência cardíaca (IC), classe funcional (CF) III ou IV (NYHA), ritmo sinusal
QRS ≥ 120 ms, em vigência de terapêutica otimizada para IC submetidos a TRC. Foram realizados eletrocardiograma
(ECG), avaliação clínica, Eco 2D e 3D antes, três e seis meses após a TRC. A comparação entre as técnicas foi realizada
utilizando-se a correlação de Pearson (r).
Resultados: No momento basal, a correlação entre os métodos foi de 0,96 para avaliação do VDVE, 0,95 para avaliação
do VSVE, 0,87 para FEVE, e 0,72 para massa do VE. Após três meses da TRC, a correlação entre os métodos para análise
do VDVE foi de 0,96, 0,95 para VSVE, 0,95 para FEVE, e 0,77 para massa do VE. Após seis meses da TRC, a correlação
entre o Eco 2D e 3D para análise do VDVE foi de 0,98, 0,91 para VSVE, 0,96 para FEVE, e 0,85 para massa do VE.
Conclusão: Neste estudo foi observada redução dos VDVE,VSVE, além de melhora da FEVE após a TRC. Houve excelente
correlação entre o Eco 2D e o 3D para avaliação dos volumes ventriculares e FEVE, e boa correlação entre os métodos
para avaliação da massa ventricular esquerda antes e após a TRC. (Arq Bras Cardiol 2011; 97(2) : 111-121)
Palavras-chave: Ecocardiografia, ecocardiografia tridimensional, volume sistólico, disfunção ventricular esquerda.
Abstract
Background: Echocardiography is a useful method for screening and assessing response to cardiac resynchronization therapy (CRT). 3D
echocardiography has already established its role in the evaluation of ventricular volumes and ejection fraction (LVEF) with excellent correlation
of results when compared with magnetic resonance imaging (MRI).
Objective: To compare the evaluation of ventricular volumes (LVDV, LVSV), LVEF, and LV mass before and after CRT by 2D echocardiography
and three-dimensional echocardiography.
Methods: We evaluated 24 patients with heart failure (HF), functional class (FC) III or IV (NYHA), sinus rhythm QRS ≥ 120 ms, during an
optimized therapy for HF undergoing CRT. We conducted electrocardiogram (ECG), clinical evaluation, 2D and 3D echocardiography before,
three and six months after CRT. The comparison between the techniques was performed using Pearson’s correlation (r).
Results: At baseline, the correlation between methods was 0.96 for evaluation of LVDV, 0.95 for evaluation of LVSV, 0.87 for LVEF and 0.72 for
LV mass. After three months of CRT, the correlation between methods for analysis of LVDV was 0.96, 0.95 for LVSV, 0.95 for LVEF, and 0.77 for
LV mass. After six months of CRT, the correlation between 2D and 3D echocardiography for analysis of LVDV was 0.98, 0.91 for LVSV, 0.96 for
LVEF, and 0.85 for LV mass.
Conclusion: This study reported a reduction of LVDV, LVSV, besides improvement in LVEF after CRT. There was an excellent correlation between
the 2D and 3D echocardiography for evaluation of ventricular volumes and LVEF, and a good correlation between methods for evaluation of left
ventricular mass before and after CRT. (Arq Bras Cardiol 2011; 97(2) : 111-121)
Keywords: Echocardiography; echocardiography, three-dimensional; stroke volume; ventricular dysfunction, left.
Full texts in English - http://www.arquivosonline.com.br
Correspondência: Viviane Tiemi Hotta •
Av. Dr. Enéas de Carvalho Aguiar, 44 - Cerqueira César - 05403-000 - São Paulo, SP - Brasil
E-mail: [email protected], [email protected]
Artigo recebido em 22/09/10; revisado recebido em 08/11/10; aceito em 28/01/11.
111
Hotta e cols.
Eco 2D e 3D na avaliação de resposta após a TRC
Artigo Original
Introdução
A ecocardiografia consiste em método muito útil para
seleção e avaliação de resposta à terapia de ressincronização
cardíaca (TRC) para pacientes com insuficiência cardíaca (IC)
grave e distúrbio da condução ventricular1-4. O ecocardiograma
tridimensional (Eco 3D) já tem seu papel estabelecido na
avaliação dos volumes ventriculares e fração de ejeção
ventricular esquerda (FEVE) com excelente correlação de
resultados quando comparado à ressonância magnética
cardíaca5,6. Em relação ao ecocardiograma bidimensional (Eco
2D), o Eco 3D apresenta maior proximidade à anatomia real
em razão da ausência de inferências geométricas.
Uma vez que o Eco 2D tem maior disponibilidade e tem
sido o método mais utilizado para o acompanhamento desses
pacientes, demonstramos nesse estudo sua correlação com
o Eco 3D na avaliação dos volumes ventriculares (volume
diastólico final do ventrículo esquerdo e volume sistólico final
do ventrículo esquerdo), fração de ejeção e massa ventricular
esquerda antes e após a TRC.
Métodos
Foi realizado estudo prospectivo e observacional, no
período de 1/1/2007 a 1/6/2009. O projeto foi aprovado
pela Comissão Científica e de Ética do InCor - HCFMUSP,
pela Comissão de Ética para a Análise de Projetos de Pesquisa
(CAPPesq), da Diretoria Clínica do Hospital das Clínicas da
Universidade de São Paulo. Este estudo apresenta os resultados
parciais de tese de doutorado, realizada no período descrito,
baseando-se em uma amostra de conveniência.
Foram estudados pacientes com diagnóstico de
miocardiopatia de etiologia não isquêmica que preenchessem
os seguintes critérios:
1. Idade entre 18 e 75 anos;
2. Tratamento medicamentoso otimizado na dose
máxima tolerada pelo paciente por pelo menos um
mês antes da inclusão no estudo;
3. Ritmo sinusal;
4. QRS ≥ 120 ms ao ECG de 12 derivações;
5. FEVE < 0,35 (medida ao ecocardiograma bidimensional
pelo método de Simpson);
6. Diâmetro diastólico final do ventrículo esquerdo
(DDVE) > 55 mm;
7. Presença de sinais e sintomas de IC classe funcional
(CF) III ou IV (NYHA).
Os pacientes com idade maior que 40 anos e fatores de
risco para doença arterial coronariana foram submetidos
à realização de cineangiocoronariografia para exclusão de
etiologia isquêmica.
Foram considerados critérios de exclusão: 1) imagem
ecocardiográfica inadequada à análise tridimensional; o bloco
do exame tridimensional foi considerado inadequado para a
análise quando dois ou mais segmentos não foram visibilizados;
2) presença de artefatos de translação cardíaca; 3) fibrilação
atrial ou de grande irregularidade do ritmo cardíaco pré-TRC;
4) pacientes impossibilitados de permanecer em pequeno
período de apneia (15 a 20 segundos) para aquisição das
imagens ecocardiográficas tridimensionais; 5) morte antes
de completar pelo menos a primeira reavaliação (aos três
meses após TRC).
Os pacientes que preencheram os critérios de inclusão
foram encaminhados ao implante de marca-passo
atriobiventricular (MPaBiv). Antes da alta hospitalar, os
pacientes foram submetidos a avaliação ecocardiográfica,
para programação do intervalo atrioventricular (IAV) ótimo,
por meio da fórmula de Ritter7,8.
Após a alta hospitalar, a programação eletrônica do
MPaBiv foi reavaliada no décimo dia após implante do
marca-passo e, após um e, também, três meses do implante,
de acordo com a rotina da Unidade Clínica de Arritmia e
Estimulação Cardíaca Artificial do InCor. O objetivo dessas
avaliações foi garantir o funcionamento adequado dos
MPaBiv, em cada paciente.
Foram realizados ECG, avaliação clínica, ecocardiograma
bidimensional (2D), e tridimensional (3D) antes, três e seis
meses após a TRC. Foram avaliados os seguintes parâmetros:
volumes do ventrículo esquerdo (diastólico - VDVE, e sistólico
), fração de ejeção ventricular esquerda (FEVE) e massa
ventricular esquerda.
Foram avaliados os blocos volumétricos de oito pacientes,
incluídos no protocolo, para análise da variação intra e
interobservador. Foram avaliadas as seguintes variáveis:
volume diastólico e sistólico do ventrículo esquerdo,
fração de ejeção ventricular esquerda, obtidos pela análise
tridimensional. Para a análise intraobservador, foram realizadas
duas análises do mesmo bloco volumétrico, por um mesmo
observador, com intervalo mínimo de um mês entre as leituras.
Análise clínica
Todos os pacientes foram submetidos a uma avaliação
clínica composta por anamnese, exame físico, realização de
eletrocardiograma de 12 derivações, e classificação da classe
funcional segundo classificação da NYHA (New York Heart
Association), além de avaliação da qualidade de vida pelo
“Minessota Living with Heart Failure Questionnaire” (MLHFQ).
A classe funcional pela classificação da NYHA estratifica o
grau de limitação imposto pela IC nas atividades cotidianas do
paciente. Essa classificação, além de possuir caráter funcional, é
também uma maneira de avaliar a qualidade de vida ante a IC2.
Já o MLHFQ é composto por 21 perguntas que avaliam como o
paciente percebe os efeitos da doença e do seu tratamento em
sua vida diária. As questões enfocam sintomas como dispneia,
fadiga, edema, assim como o estado psicológico e o impacto
da doença na rotina diária e laborativa9.
Análise ecocardiográfica
Os estudos ecocardiográficos foram realizados com
o equipamento iE33 Philips Medical Systems, Andover,
MA, EUA. Foram realizados os estudos ecocardiográficos
bidimensional, análise de fluxos cardíacos pelo estudo
Doppler e avaliação tridimensional em tempo real.
As imagens foram adquiridas nos planos paraesternal
longitudinal de câmaras esquerdas, transversal e apical 2,
3 e 4 câmaras, de acordo com padronização da Sociedade
Americana de Ecocardiografia10.
Arq Bras Cardiol 2011; 97(2) : 111-121
112
Hotta e cols.
Eco 2D e 3D na avaliação de resposta após a TRC
Artigo Original
Análise bidimensional
Foram avaliados os seguintes parâmetros nos estudos
ecocardiográficos: 1) diâmetro diastólico do ventrículo
esquerdo e diâmetro sistólico do ventrículo esquerdo em
projeção paraesternal longitudinal de câmaras esquerdas; 2)
volume diastólico final do ventrículo esquerdo (VDVE) (método
de Simpson); 3) volume sistólico final do ventrículo esquerdo
(VSVE) (método de Simpson); 4) FEVE (método de Simpson); 5)
avaliação do fluxo mitral para a análise da diástole ventricular
com o emprego do estudo Doppler pulsado.
Análise tridimensional
Os pacientes foram posicionados em decúbito lateral
esquerdo e foi utilizado transdutor matricial X3, compatível
com o equipamento iE33, Philips Medical Systems. As
imagens tridimensionais, em tempo real, foram adquiridas
em apneia expiratória (15 a 20 segundos), com a observação
do ciclo cardíaco a partir do registro eletrocardiográfico. Para
a avaliação dos volumes ventriculares e FEVE, os ajustes de
ganho e compressão foram realizados de forma a permitir a
obtenção de imagens de boa qualidade técnica e identificação
clara das bordas endocárdicas.
A obtenção do bloco volumétrico (Full Volume) foi feita a
partir da aquisição de quatro pequenos subvolumes, em ciclos
cardíacos consecutivos, que, combinados, fornecem um bloco
piramidal de maior volume (110o x 100o). Em cada aquisição,
os ajustes foram feitos de modo que a totalidade do volume
ventricular esquerdo estivesse contida no bloco avaliado.
Os VDVE, VSVE, e FEVE foram avaliados, posteriormente,
em estação de trabalho equipada com programa específico
(Q-Lab, versões 5.0. e 6.0., Philips Medical System,
Andover, MA, EUA) por um algoritmo semiautomático para
a identificação das bordas endocárdicas. Esse programa
fornece, para cada quadro adquirido, a visão dos planos
apical quatro câmaras, apical duas câmaras e transversal. Para
a reconstrução volumétrica do VE, são identificados cinco
pontos de referência. A partir desses pontos de referência,
são identificadas as bordas endocárdicas para o cálculo
automático de VDVE, VSVE e FEVE. Nos casos em que a
detecção automática apresentou qualidade subótima (falha
na identificação das bordas endocárdicas), foi realizada
edição das imagens.
Análise estatística
A análise estatística foi realizada para as variáveis
quantitativas contínuas, pelo cálculo dos valores mínimos,
máximos, médias e desvios-padrão. As variáveis qualitativas
foram apresentadas em números absolutos, e calculadas as
frequências absolutas e relativas (porcentagem).
A comparação entre os parâmetros aferidos pela
ecocardiografia bidimensional e tridimensional foi efetuada
com o emprego de testes de regressão linear e correlação de
Pearson (r). Foi realizada a análise da variação intraobservador
e interobservador das medidas dos volumes diastólico e
sistólico do ventrículo esquerdo, fração de ejeção ventricular
esquerda, por meio do cálculo do coeficiente de correlação
de concordância.
113
Arq Bras Cardiol 2011; 97(2) : 111-121
Foram utilizados o Excel (2007), para a tabulação e
organização dos resultados, e um programa computacional
para realização da análise estatística (SPSS versão 13.0,
Chicago, IL, EUA).
Resultados
Foram avaliados 63 pacientes que preencheram os critérios
de inclusão no período de 1/1/2007 a 1/6/2009. Este trabalho
apresenta parte dos resultados de tese de doutorado (1/6/2006
a 18/6/2010), e os pacientes foram selecionados no período de
coleta dos dados para a tese. Dos 63 pacientes avaliados no
período, apenas 35 foram encaminhados à TRC. Desses, oito
pacientes evoluíram a óbito antes da primeira reavaliação e
foram excluídos da análise, uma vez que o objetivo do estudo
era a avaliação do remodelamento reverso.
Dos oito óbitos que ocorreram antes da primeira reavaliação
aos três meses: um paciente necessitou de transplante cardíaco,
evoluindo a óbito após o transplante por complicações
infecciosas; um paciente apresentou parada cardiorrespiratória
(AESP - atividade elétrica sem pulso) no centro cirúrgico,
sendo reanimado com sucesso e transferido para UTI após
o procedimento, porém faleceu por choque cardiogênico;
um paciente faleceu por choque séptico, secundário a
infecção de loja de marca-passo; cinco pacientes faleceram
por insuficiência cardíaca congestiva refratária. A decisão de
encaminhar o paciente à TRC foi realizada, em conjunto, pelas
equipes do marcapasso e miocardiopatias do InCor.
Assim, durante o período do estudo, foram avaliados 35
pacientes submetidos ao implante de MPaBiv. Ocorreram oito
óbitos, antes dos três meses de reavaliação. Dos 27 pacientes
restantes, dois foram excluídos por imagem ecocardiográfica
inadequada, e uma paciente recusou a realização dos exames
de acompanhamento, após a TRC. Dessa forma, 24 pacientes
realizaram reavaliação antes, três e seis meses após a TRC (figura
1). Todos os pacientes concordaram em participar do estudo
e assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.
A média etária dos 27 pacientes analisados foi de 58,9
± 9,7 anos, sendo 10/27 (37%) dos pacientes do sexo
masculino e 17/27 (63%) do sexo feminino. A etiologia da
miocardiopatia foi idiopática, na maioria dos pacientes (24/27
pacientes; 89%), e chagásica em 3/27 pacientes (11%). A
maioria dos pacientes (21/27 pacientes; 77,8%) era portadora
de hipertensão arterial sistêmica, enquanto 6/27 pacientes
(22,2%) apresentavam antecedente de diabete melito (tab. 1).
Em relação ao tratamento medicamentoso, 26/27 pacientes
(96,3%) estavam em uso de inibidores da enzima de conversão
da angiotensina (iECAs) ou bloqueadores do receptor da
angiotensina II (BRAs); 26/27 pacientes (96,3%), em uso de
betabloqueadores e diuréticos; 25/27 pacientes (92,3%), em
uso de espironolactona; e 16/27 pacientes (59,3%), em uso de
digoxina. O tratamento foi mantido, sem alterações, durante
todo o período de seguimento (tab. 1).
Com relação à evolução clínica, após três meses da TRC,
houve melhora da CF (NYHA), p < 0,001, de pelo menos
um grau em 18/24 (75%) dos pacientes e manutenção da
CF em 6/24 (25%) dos pacientes. Aos seis meses após a
Hotta e cols.
Eco 2D e 3D na avaliação de resposta após a TRC
Artigo Original
Fig. 1 - Fluxograma.
Tabela 1 - Características clínicas da amostra total do estudo
Características
Total (n = 27) %
Idade (média ± DP)
58,9 ± 9,7 anos
Sexo
Masculino
10 (37%)
Feminino
17 (63%)
Etiologia
Idiopática
24 (89%)
Chagásica
3 (11%)
Hipertensão arterial
21 (77,8%)
Diabete melito
6 (22,2%)
Tratamento medicamentoso
iECAs ou BRAs
26 (96,3%)
Betabloqueadores
26 (96,3%)
Espironolactona
25 (92,3%)
Diuréticos
26 (96,3%)
Digoxina
16 (59,3%)
iECAs - inibidores da enzima de conversão do angiotensinogênio; BRA bloqueadores do receptor de angiotensina.
TRC, 19/24 (79%) mantiveram a melhora na CF (NYHA) e
5/24 (21%) não apresentaram alterações da CF, p < 0,001
(fig. 2A). Também foi evidenciada melhora da qualidade
de vida, avaliada pelo escore de Minnesota (MLHFQ), aos
três meses após TRC, em 21/24 (88%) dos pacientes, piora
em 1/24 (4%), e 2/24 (8%) dos pacientes não apresentaram
alterações (p < 0,001). Aos seis meses após a TRC, 20/24
(83%) dos pacientes apresentaram melhora do MLHFQ,
3/24 (13%) apresentaram piora e 1/24 (4%) paciente não
apresentou alterações, p < 0,001 (fig. 2B).
A análise dos volumes ventriculares pelo modo
bidimensional, por meio do método de Simpson (VDVE: 283
± 117 ml; VSVE: 219 ± 93 ml no momento basal), revelou
redução dos volumes ventriculares diastólico e sistólico do
ventrículo esquerdo (VDVE: 262 ± 124 ml, p = 0,018;
VSVE: 196 ± 105 ml, p = 0,007) após três meses da TRC.
Essa redução manteve-se na avaliação após seis meses da TRC
(VDVE: 256 ± 137 ml, p = 0,038; VSVE:185 ± 114 ml, p =
0,027) (tab. 2; fig. 3 e 4).
A fração de ejeção ventricular esquerda (0,23 ± 0,05),
avaliada pelo método de Simpson, também apresentou
melhora aos três meses (0,28 ± 0,07, p = 0,028) após TRC,
e a qual se manteve aos seis meses (0,28 ± 0,10, p = 0,006),
após TRC (tab. 2) (fig. 5).
A análise pelo Eco 3D evidenciou médias e desvio-padrão
dos volumes ventriculares diastólico e sistólico de 252 ± 105
ml e 194 ± 86 ml, respectivamente, no momento basal.
Após a TRC, houve redução não significativa dos volumes
ventriculares, avaliados ao Eco 3D. Aos três meses após
TRC, houve redução de 25 ml (10%) da média dos valores
de VDVE e de 26 ml (13%) da média dos valores de VSVE,
em relação ao momento basal (VDVE: 227 ± 113 ml, p =
0,187; VSVE: 168 ± 95 ml, p = 0,065). Aos seis meses após
TRC, a redução do VDVE foi de 13 ml (5%) e de 6 ml (6%)
do VSVE, em relação ao momento basal (VDVE: 239 + 129
ml, p = 0,163; VSVE: 183 + 115 ml, p = 0,347) (tab. 2;
fig. 2 e 3). Com relação à FEVE, houve melhora (21,7%), em
relação ao momento basal (FEVE: 0,23 ± 0,05), evidenciada
aos três meses, após TRC (FEVE: 0,28 ± 0,07, p = 0,008)
e que se manteve aos seis meses (FEVE: 0,28 ± 0,10; p =
0,033) (tab. 2; fig. 5).
Arq Bras Cardiol 2011; 97(2) : 111-121
114
Hotta e cols.
Eco 2D e 3D na avaliação de resposta após a TRC
Artigo Original
Fig. 2 - A) Evolução da CF (NYHA) nos períodos basal (pré-TRC), três e seis meses após implante de MPaBiv. Após TRC, houve melhora da CF na maioria dos pacientes.
No momento basal, a maioria dos pacientes encontrava-se em CF III ou IV. Aos três meses de TRC, a maioria dos pacientes encontra-se em CF I e II (NYHA). A melhora
foi mantida aos seis meses de reavaliação. B) As médias dos escores de qualidade de vida avaliadas pelo MLHFQ nos momentos basal, três e seis meses após TRC são
representadas. Observa-se melhora significativa da qualidade de vida a partir dos três meses (p < 0,001), a qual é mantida aos seis meses de reavaliação (p < 0,001).
Não houve variação da massa ventricular esquerda aos três
meses (p = 0,511 pelo Eco 3D) e seis meses (p = 0,706 ao
Eco 2D, p = 0,479 ao Eco 3D), após a TRC (tab. 2).
115
(CCC) da análise do VDVE intraobservador foi de 0,95 (95%
Intervalo de confiança: 0,80 a 0,99) e o do interobservador
foi de 0,95 (95% Intervalo de confiança: 0,77 a 0,99). O
CCC da análise do VSVE intraobservador foi de 0,97 (95%
Intervalo de confiança: 0,86 a 0,99) e o do interobservador
foi de 0,95 (95% Intervalo de confiança: 0,81 a 0,99). O CCC
da análise da FEVE intraobservador foi de 0,97 (95% Intervalo
de confiança: 0,86 a 0,99) e o do interobservador foi de 0,92
(95% Intervalo de confiança: 0,71 a 0,98).
No momento basal, a correlação entre os métodos foi de
0,96 para avaliação do VDVE, 0,95 para avaliação do VSVE,
0,87 para FEVE e 0,72 para massa do VE. Após três meses da
TRC, a correlação entre o Eco 2D e 3D para análise do VDVE
foi de 0,96, 0,95 para VSVE, 0,95 para FEVE e 0,77 para massa
do VE. Após seis meses da TRC, a correlação entre o Eco 2D
e 3D para análise do VDVE foi de 0,98, 0,91 para VSVE, 0,96
para FEVE e 0,85 para massa do VE (fig. 6 e 7).
Discussão
Com relação à avaliação da variação intra e interobservador
pelo Eco 3D, o coeficiente de correlação de concordância
Em pacientes com IC avançada, a dilatação ventricular
esquerda importante é considerada fator independente de
Arq Bras Cardiol 2011; 97(2) : 111-121
Hotta e cols.
Eco 2D e 3D na avaliação de resposta após a TRC
Artigo Original
Tabela 2 - Evolução da amostra total do estudo
Parâmetro
Escore de Minnesota
Basal (pré TRC) (n = 27)
3 meses (após TRC) (n = 21)
p
6 meses (após TRC) (n = 24)
p
60 ± 21
33 ± 21
<0,001
33 ± 24
<0,001
0 (0%)
4 (19%)
Classe funcional
I
9 (37%)
II
0 (0%)
12 (57%)
III
26 (96%)
5 (24%)
IV
1 (4%)
0 (0%)
FC (bpm)
72 ± 13
70 ± 8
NS
Intervalo PR (ms)
204 ± 36
164 ± 37
Duração do QRS (ms)
164 ± 23
153 ± 33
72 ± 12
<0,001
10 (42%)
5 (21%)
<0,001
0 (0%)
ECG
BRE
DDVE (2D) (mm)
68 ± 8
NS
<0,001
155 ± 20
<0,001
0,075
146 ± 28
0,003
NS
72 ± 13
NS
96,3% (1)
74 ± 9
DSVE (2D) (mm)
67 ± 7
64 ± 13
NS
65 ± 13
NS
VDVE (2D) (ml)
283 ± 117
262 ± 124
0,018
256 ± 137
0,038
219 ± 93
196 ± 105
0,007
185 ± 114
0,027
FEVE (2D)
VSVE (2D) (ml)
0,23 ± 0,05
0,27 ± 0,08
0,028
0,28 ± 0,10
0,006
VDVE (3D) (ml)
252 ± 105
227 ± 113
0,187
239 ± 129
0,163
VSVE (3D) (ml)
FEVE (3D)
194 ± 86
168 ± 95
0,065
183 ± 115
0,347
0,23 ± 0,05
0,28 ± 0,07
0,008
0,28 ± 0,10
0,033
Massa (2D)(g)
188 ± 51
173 ± 51
0,024
177 ± 48
0,706
Massa (3D) (g)
252 ± 66
263 ± 110
0,511
263 ± 108
0,479
ECG - eletrocardiograma; FC - frequência cardíaca; DDVE - Diâmetro diastólico final do ventrículo esquerdo; VDVE - volume do ventrículo esquerdo diastólico;
VSVE - volume do ventrículo esquerdo sistólico; FEVE - fração de ejeção do VE; DSVE - diâmetro sistólico do ventrículo esquerdo.
Fig. 3 - Avaliação dos VDVE nos momentos basal, três e seis meses após TRC pelo método de Simpson (à esquerda) e Eco 3D (à direita).
pior prognóstico11. Pacientes com miocardiopatia dilatada
idiopática e dilatação ventricular importante apresentam
diminuição da reserva de fluxo coronariano, detectada em
estudos de perfusão miocárdica com técnicas de medicina
nuclear e pela ecocardiografia sob estresse farmacológico
com dipiridamol12-14. Esses achados estão associados ao maior
Arq Bras Cardiol 2011; 97(2) : 111-121
116
Hotta e cols.
Eco 2D e 3D na avaliação de resposta após a TRC
Artigo Original
Fig. 4 - Avaliação dos VSVE nos momentos basal, três e seis meses após TRC pelo método de Simpson (à esquerda) e Eco 3D (à direita).
Fig. 5 - Avaliação da FEVE nos momentos basal, três e seis meses após TRC pelo método de Simpson (à esquerda) e pelo Eco 3D (à direita).
estresse sistólico na parede ventricular esquerda e a áreas
de consumo anormal de oxigênio sugerindo a presença de
isquemia e pior prognóstico nestes pacientes.
117
Portanto, pacientes com IC grave e dilatação ventricular
importante, evidenciada pelo aumento do DDVE e dos
volumes ventriculares, podem apresentar pior resposta à
TRC em razão de menor reserva de fluxo coronariano e
de presença de áreas com padrão anormal do consumo
de oxigênio. A avaliação do grau de dilatação ventricular
analisada pela ecocardiografia 2D e 3D no momento basal
fornece informações importantes a respeito da evolução dos
pacientes após a TRC. Assim, sabe-se da importância da
avaliação dos VSVE e VDVE antes da TRC.
alterações volumétricas após a TRC fornece informações
preditivas importantes a respeito dos desfechos clínicos
na evolução natural da doença, conforme demonstrado
inicialmente por Yu e cols. 16 e confirmado em estudo
recente de Ypenburg e cols.17. Dados a respeito da utilização
de terapias farmacológicas enfatizam a importância do
remodelamento reverso ventricular esquerdo no prognóstico
em longo prazo, tornando, dessa forma, essa variável muito útil
como marcador de melhora clínica. No estudo de Ypenburg
e cols.17, a extensão do remodelamento reverso apresentou
ainda correlação com o prognóstico em longo prazo: quanto
maior a taxa de remodelamento reverso, melhor a evolução
clínica e vice-versa.
Em estudo de António e cols. 15, pacientes em fases
mais precoces de miocardiopatia e menores alterações na
geometria ventricular apresentaram maior probabilidade
de resposta com a TRC. Adicionalmente, a avaliação das
O valor da ecocardiografia tridimensional na avaliação dos
volumes ventriculares, fração de ejeção e massa ventricular
esquerda já foi comprovado em diversos estudos, com excelente
correlação de resultados quando comparado à ressonância
Arq Bras Cardiol 2011; 97(2) : 111-121
Hotta e cols.
Eco 2D e 3D na avaliação de resposta após a TRC
Artigo Original
Fig. 6 - A comparação entre os métodos de Simpson (Eco 2D) e Eco 3D para a avaliação dos volumes ventriculares é mostrada a seguir. Houve ótima correlação entre
os dois métodos para a avaliação do VDVE e VSVE nos momentos basal, três e seis meses após a TRC.
Arq Bras Cardiol 2011; 97(2) : 111-121
118
Hotta e cols.
Eco 2D e 3D na avaliação de resposta após a TRC
Artigo Original
Fig. 7 - São representadas as correlações entre a FEVE avaliada pelo Eco 2D e Eco 3D. Houve excelente correlação (r) entre os dois métodos em todos os momentos
de avaliação (à esquerda). Houve também boa correlação entre a massa do VE avaliada nos momentos avaliados (basal, três e seis meses após TRC) (à direita).
magnética cardíaca5,6. A aquisição dos blocos volumétricos,
por meio do Eco 3D, para avaliação desses parâmetros, pode
ser realizada rapidamente, com a utilização de um transdutor
matricial, e a quantificação dos dados, por um operador treinado
e experiente, dura em média de seis a oito minutos18,19.
119
Arq Bras Cardiol 2011; 97(2) : 111-121
Desse modo, o Eco 3D constitui-se em uma ferramenta
muito útil na avaliação ecocardiográfica, aumentando a
precisão dos cálculos dos volumes, FEVE e massa ventricular
esquerda, sem aumentar de maneira significativa a duração
do exame. Porém, atualmente, o Eco 3D ainda não é
Hotta e cols.
Eco 2D e 3D na avaliação de resposta após a TRC
Artigo Original
amplamente disponível, requer equipamentos e programas
computacionais específicos para a quantificação dos dados,
além de exigir treinamento adequado para a aquisição de
blocos volumétricos de boa qualidade técnica.
métodos (Ecos 2D e 3D), torna o Eco 2D um método confiável
para a avaliação do remodelamento reverso após a TRC.
A ecocardiografia bidimensional, por sua vez, é amplamente
disponível e tem sido o método mais utilizado na avaliação
de pacientes candidatos à TRC e na avaliação da resposta
após essa terapêutica.
Houve discreto aumento do volume ventricular entre
os três e seis meses após a TRC, detectado ao Eco 3D.
Acreditamos que esse achado ainda seja decorrente das
limitações inerentes à tecnologia atual dos equipamentos de
Eco 3D. Os pacientes incluídos neste estudo apresentavam
valores muito altos de DDVE e dilatação importante dos
volumes ventriculares, o que dificultou a inclusão de todo
o ventrículo esquerdo na aquisição do bloco tridimensional.
Apesar de terem sido excluídos os blocos com impossibilidade
de avaliação de dois ou mais segmentos miocárdicos, a
dificuldade na avaliação da parede lateral ao plano coronal
e das paredes inferior e anterior, no plano sagital, podem ter
limitado o cálculo dos volumes ventriculares esquerdos ao
Eco 3D. Além disso, limitações no grau de abertura do feixe
ultrassônico e o baixo frame rate (20 a 30 volumes/segundo)
do Eco 3D, também, podem ter resultado na diferença não
significativa entre os volumes ventriculares esquerdos dos GI
e GII, antes da TRC.
Neste estudo, foi comparada a avaliação dos dados a
respeito da morfologia e função ventricular esquerda pelo Eco
2D e 3D, no momento pré-TRC, o que auxilia na seleção dos
candidatos a TRC, e três e seis meses após a TRC, a fim de se
avaliar a resposta ao tratamento.
A avaliação dos volumes ventriculares após a TRC é
importante no reconhecimento do remodelamento reverso
ventricular esquerdo, definido como redução dos volumes
diastólico e sistólico do ventrículo esquerdo e melhora
da FEVE. A identificação do remodelamento reverso pela
ecocardiografia tem importância prognóstica, uma vez
que a resposta volumétrica tem apresentado melhor valor
preditivo de sobrevida livre de eventos e mortalidade, quando
comparada com a resposta clínica avaliada pela melhora da
classe funcional (NYHA) e da qualidade vida16,20. Uma vez
comprovada a superioridade do Eco 3D, em relação ao Eco
2D, na avaliação dos volumes ventriculares, massa e FEVE, é
fundamental avaliar a concordância entre essas duas técnicas,
pois o Eco 2D é o método mais utilizado em pacientes
submetidos a TRC.
Os volumes ventriculares (VDVE e VSVE) avaliados tanto
pelo método de Simpson como pelo Eco 3D fornecem
informações adicionais à seleção dos pacientes e à taxa de
resposta à TRC. A melhora e o grau de melhora da FEVE
avaliada após a TRC apresentam boa correlação com a
melhora na evolução clinica dos pacientes submetidos à TRC.
Segundo Di Biase e cols.21, o aumento de seis pontos ou mais
na FEVE aos três meses após a TRC apresenta taxa ao redor de
66% livre de eventos em cinco anos de seguimento.
Neste estudo, houve melhora significativa da FEVE
avaliada por ambos os métodos (Simpson e Eco 3D) três
meses após a TRC e que se manteve aos seis meses da
TRC na amostra total do estudo. Houve ainda excelente
correlação entre os métodos para a aferição volumétrica
ventricular esquerda durante todas as fases do estudo, o que
demonstra a utilidade da ecocardiografia bidimensional no
acompanhamento e avaliação do remodelamento reverso
dos pacientes submetidos a TRC, enquanto o Eco 3D não é
parte da avaliação ecocardiográfica na prática clínica diária.
A avaliação da massa do VE pelo Eco 3D é superior ao
Eco 2D, quando comparada à RMC. É importante notar que
apesar da boa correlação entre os Ecos 2D e 3D para avaliação
da massa, o Eco 3D é mais acurado, justificando seu uso
quando disponível. Porém, apesar da superioridade do Eco
3D para avaliação dos volumes, massa e função ventricular
esquerda em relação ao Eco 2D (quando comparados à RMC,
que é atualmente o método padrão de referência para essas
análises), o Eco 2D é o método mais utilizado na pratica clinica
por sua disponibilidade e custo. Dessa forma, os resultados
deste estudo, ao demonstrar a excelente correlação entre os
Limitações do estudo
O Eco 3D, apesar de disponível há cerca de quatro
décadas, ainda não chegou a seu formato definitivo
e apresenta limitações físicas e em seu formato de
apresentação em diferentes programas de aquisição, leitura
e de interpretação. O desenvolvimento do Eco 3D irá sem
dúvida permitir trabalhar em futuro próximo com pacientes
que apresentem grandes dilatações ventriculares e que
apresentem acentuada variação de ritmo cardíaco (fibrilação
atrial) e ritmo respiratório.
Outra limitação refere-se à não utilização da ressonância
magnética cardíaca na avaliação dos volumes ventriculares
e FEVE para comparação com os Ecos 2D e 3D, uma vez
que esse é o método considerado padrão de referência
para essa finalidade.
Conclusão
Neste estudo, foi observada redução dos volumes diastólico
e sistólico do ventrículo esquerdo, além de melhora da FEVE
após a TRC. Houve excelente correlação entre os Ecos 2D
e 3D para avaliação dos volumes ventriculares e fração
de ejeção ventricular esquerda, e boa correlação entre os
métodos para avaliação da massa ventricular esquerda antes
e após a TRC.
Potencial conflito de interesses
Declaro não haver conflito de interesses pertinentes.
Fontes de financiamento
O presente estudo foi parcialmente financiado pela
SOCESP (Bolsa de estudos de julho 2009 a julho 2010).
Vinculação acadêmica
Este artigo é parte da tese de Doutorado de Viviane Tiemi
Hotta pela Faculdade de Medicina da USP.
Arq Bras Cardiol 2011; 97(2) : 111-121
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Hotta e cols.
Eco 2D e 3D na avaliação de resposta após a TRC
Artigo Original
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of heart failure patients treated with cardiac resynchronization therapy. Eur
Heart J. 2008;29(20):2497-505.
A vida merece uma segunda chance.
Agora você já pode
fazer muito
mais pelos
seus pacientes
com SCA.
Brilinta® demonstrou superioridade em relação
ao clopidogrel no estudo PlatO:
21% de redução do risco relativo na mortalidade cardiovascular versus clopidogrel.1
Superioridade de BRILINTA® na redução do desfecho de eficácia evidente
nos primeiros 30 dias e aumento no período de 12 meses de tratamento.1
Não apresenta diferenças significativas no sangramento maior ou fatal
versus clopidogrel.1
Oferece resultados consistentes em amplo espectro de pacientes com SCA
e suas formas de tratamento.1
Contraindicação: pacientes com sangramento patológico ativo, com antecedente de hemorragia intracraniana
e/ou com insuficiência hepática grave. Interações medicamentosas: cetoconazol, diltiazem e rifampicina.
Referências bibliográficas: 1- Wallentin L, Becker RC, Budaj A, et al; pLATO investigators. Ticagrelor versus clopidogrel in patients with acute coronary syndromes. N engl J med. 2009;361:1045-57.
A peRSISTIRem OS SINTOmAS,
O médICO deveRá SeR CONSuLTAdO.
material destinado exclusivamente à classe médica.
A bula do produto encontra-se no interior desta publicação.
20 Comprimidos
30 Comprimidos
60 Comprimidos
BRILINTA® (ticagrelor) é um membro da classe química ciclopentiltriazolopirimidinas (CpTp), que é antagonista seletivo e reversível do receptor da adenosina
difosfato (Adp), agindo sobre o receptor de Adp p2Y12 que pode prevenir a ativação e agregação plaquetária mediada por Adp. O ticagrelor é ativo por via
oral e interage reversivelmente com o receptor plaquetário de Adp p2Y12. O ticagrelor não interage com o sítio de ligação Adp, mas sua interação com o
receptor plaquetário de Adp p2Y12 previne a transdução de sinal. Indicações: BRILINTA® é indicado para a prevenção de eventos trombóticos – morte
cardiovascular (Cv), infarto do miocárdio (Im) e acidente vascular cerebral (AvC) – em pacientes com síndrome coronariana aguda (SCA), angina instável,
infarto agudo do miocárdio sem elevação do segmento ST (IAmSST) ou infarto agudo do miocárdio com elevação do segmento ST (IAmCST), incluindo
pacientes tratados clinicamente e aqueles que são tratados com intervenção coronariana percutânea (ICp) ou cirurgia de revascularização do miocárdio (Rm).
Contraindicações: BRILINTA® é contraindicado a pacientes com hipersensibilidade ao ticagrelor ou a qualquer componente da fórmula. este medicamento
é contraindicado a pacientes com sangramento patológico ativo, com antecedente de hemorragia intracraniana e/ou com insuficiência hepática grave.
Cuidados e Advertências: Advertências: risco de sangramento – Assim como com outros agentes antiplaquetários, o uso de BRILINTA® em pacientes com
reconhecido risco aumentado de sangramento deve ser balanceado em relação ao benefício em termos de prevenção de eventos trombóticos. Não existem
dados com BRILINTA® em relação ao benefício hemostático de transfusões de plaquetas; BRILINTA® circulante pode inibir as plaquetas transfundidas. uma
vez que a coadministração de BRILINTA® com desmopressina não diminuiu o tempo de sangramento padrão, é improvável que a desmopressina seja efetiva
no manuseio clínico do sangramento. Terapia antifibrinolítica (ácido aminocaproico ou ácido tranexâmico) e/ou fator vIIa recombinante podem aumentar a
hemostasia. BRILINTA® pode ser retomado após a causa de sangramento ter sido identificada e controlada. Cirurgia – Se um paciente necessita de cirurgia,
os médicos devem considerar o perfil clínico de cada paciente, bem como os benefícios e riscos da terapia antiplaquetária continuada, determinando
quando a interrupção do tratamento BRILINTA® deve ocorrer. Pacientes com insuficiência hepática moderada – é aconselhada cautela em pacientes
com insuficiência hepática moderada, pois não há estudos com BRILINTA® nesses pacientes. Pacientes com risco de eventos bradicárdicos – devido
à experiência clínica limitada nesses pacientes, recomenda-se precaução. Dispneia – dispneia, geralmente de leve a moderada e frequentemente de
resolução espontânea sem a necessidade de descontinuação do tratamento, foi relatada em pacientes tratados com BRILINTA® (aproximadamente 13,8%).
Outros – A coadministração de ticagrelor com altas doses de ácido acetilsalicílico (>300 mg) não é recomendada. Descontinuações – Os pacientes que
requerem a descontinuação de BRILINTA® estão em risco aumentado para eventos cardíacos. A descontinuação prematura do tratamento deve ser evitada.
Gravidez: Categoria B – Este medicamento não deve ser utilizado por mulheres grávidas sem orientação médica (vide bula completa do produto).
Interações medicamentosas: efeitos de outros medicamentos em BRILINTA® – Medicamentos metabolizados pela CYP3A4 – potentes inibidores da
CYp3A4: a coadministração de cetoconazol com ticagrelor aumentou a Cmax e AuC de ticagrelor igual a 2,4 vezes e 7,3 vezes, respectivamente. A Cmax e
AuC do metabólito ativo foram reduzidas em 89% e 56%, respectivamente. Outros potentes inibidores da CYp3A4 devem ter efeitos similares e não devem
ser administrados concomitantemente com BRILINTA®). – Indutores da CYp3A4: a coadministração de rifampicina com ticagrelor diminuiu a Cmax e AuC
de ticagrelor em 73% e 86%, respectivamente. A Cmax do metabólito ativo foi inalterada e a AuC diminuiu em 46%, respectivamente. Outros indutores da
CYp3A4 devem diminuir a exposição ao ticagrelor e poderiam resultar em eficácia reduzida de BRILINTA®. Efeitos de BRILINTA® em outros medicamentos
– Medicamentos metabolizados pela CYP3A4 – a coadministração de ticagrelor com sinvastatina aumentou a Cmax da sinvastatina em 81% e a AuC em
56% e elevou a Cmax em 64% e a AuC em 52% da sinvastatina ácida, com alguns aumentos individuais iguais a 2 a 3 vezes. Consideração de significância
clínica deve ser dada referente à magnitude e variação de alterações na exposição à sinvastatina em pacientes que requerem mais de 40 mg de sinvastatina.
Não houve efeito da sinvastatina nos níveis plasmáticos de ticagrelor. BRILINTA® pode ter efeito similar sobre a lovastatina, mas não é esperado ter um efeito
clinicamente significativo sobre outras estatinas. – digoxina (substrato da Gpp – glicoproteína p): a administração concomitante de ticagrelor aumentou
a Cmax da digoxina em 75% e a AuC em 28%. portanto, monitoramento laboratorial e/ou clínico adequado é recomendado quando da administração de
medicamentos dependentes da glicoproteína p (Gpp) de índice terapêutico estreito como a digoxina concomitantemente com BRILINTA® (vide bula completa
do produto). Reações adversas: as seguintes reações adversas foram identificadas nos estudos com BRILINTA® – Reação muito comum: hiperuricemia,
dispneia. Reação comum: cefaleia, tontura, vertigem, epistaxe, dor abdominal, constipação, diarreia, dispepsia, hemorragia gastrointestinal, náusea, vômito,
sangramento dérmico ou subcutâneo, rash, prurido, sangramento do trato urinário, creatinina sanguínea aumentada, hemorragia pós-procedimento (vide
bula completa do produto). Posologia: o tratamento de BRILINTA® deve ser iniciado com uma dose única de 180 mg (dois comprimidos de 90 mg) e então
continuada com a dose de 90 mg duas vezes ao dia. Os pacientes que estiverem utilizando BRILINTA® devem também tomar ácido acetilsalicílico diariamente,
a menos que especificamente contraindicado. Após uma dose inicial de ácido acetilsalicílico, BRILINTA® deve ser utilizado com uma dose de manutenção
de 75-150 mg de ácido acetilsalicílico. O tratamento é recomendado por pelo menos 12 meses, exceto se a interrupção de BRILINTA® for clinicamente
indicada. em pacientes com síndrome coronariana aguda (SCA), a interrupção prematura com qualquer terapia antiplaquetária, incluindo BRILINTA®, poderia
resultar em aumento do risco de morte cardiovascular ou infarto do miocárdio devido a doença subjacente do paciente. Superdose: atualmente, não há
antídoto para reverter os efeitos do BRILINTA® e não é esperado que BRILINTA® seja dialisável. O tratamento da superdose deve seguir a prática médica
local padrão. O efeito esperado da dose excessiva de BRILINTA® é a duração prolongada do risco de sangramento associado com a inibição plaquetária.
Se ocorrer sangramento, devem ser tomadas medidas de suporte apropriadas. O ticagrelor é bem tolerado em doses únicas de até 900 mg. A toxicidade
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Artigo Original
Parâmetros Ecocardiográficos de Deposição de Gordura Epicárdica e
sua Relação com Doença Arterial Coronariana
Echocardiographic Parameters of Epicardial Fat Deposition and its Relation to Coronary Artery Disease
Juan Valiente Mustelier1, Julio Oscar Cabrera Rego1, Angela Gala González2, Júlio César Gandarilla Sarmiento1,
Beatriz Vega Riverón2
National Cardiology and Cardiovascular Surgery Institute1; Institute of Tropical Medicine ´Pedro Kourí´2 - Havana - Cuba
Resumo
Fundamento: Gordura epicárdica tem sido associada com a presença de doença arterial coronariana (DAC) significante.
Entretanto, a associação entre infiltração lipomatosa do septo atrial e a infiltração de gordura do ventrículo direito (VD)
permanece incerta. Nenhum desses parâmetros foi totalmente estudado em pacientes hispânicos.
Objetivo: Determinar a associação entre a gordura epicárdica, infiltração lipomatosa do septo atrial e a infiltração de
gordura do VD na presença de DAC.
Métodos: Duzentos e cinquenta pacientes hispânicos (86 mulheres e 164 homens, média da idade 61,5 ± 8 vs 62 ± 10
anos respectivamente), submetidos à sua primeira angiografia coronariana invasiva (ACI) foram estudados. No dia seguinte
à ACI, parâmetros de deposição de gordura epicárdica foram avaliados através de ecocardiografia bidimensional. Variáveis
clínicas (idade, sexo, antecedentes pessoais do hábito de fumar, hipertensão e diabete melito, bem como a apresentação
clínica da DAC) e antropométricas (circunferência da cintura e índice de massa corporal [IMC]) também foram coletadas.
Resultados: A gordura epicárdica (OR 1,27 p = 0,009), bem como a infiltração de gordura no VD (OR 2,94 p = 0,027),
apresentaram uma associação significante e independente com a presença, mas não com a extensão (p = 0,516) e
apresentação clínica (p = 0,153) da DAC. A extensão da deposição da gordura epicárdica mostrou uma associação
proporcional e significante (p = 0,001) com a presença de DAC.
Conclusão: A gordura epicárdica e a infiltração de gordura do VD foram fatores significantes e independentes, associados
com a presença de DAC, a qual estava proporcionalmente aumentada de acordo com a extensão da deposição de
gordura epicárdica. (Arq Bras Cardiol 2011; 97(2) : 122-129)
Palavras-chave: Ecocardiografia, gordura subcutânea, pericárdio, doença das coronárias.
Abstract
Background: Epicardial fat has been associated to the presence of significant coronary artery disease (CAD). However, the association of
lipomatous infiltration of the atrial septum and fat infiltration of the right ventricle remains uncertain. None of these parameters has been
thoroughly studied in Hispanic patients.
Objective: To determine the association between epicardial fat, lipomatous infiltration of the atrial septum and fat infiltration of the right
ventricle with the presence of CAD.
Methods: Two hundred and fifty Hispanic patients (86 women and 164 men, mean age 61.5 ± 8 vs 62 ± 10 years respectively), undergoing
their first invasive coronary angiography (ICA) were studied. The day after the ICA, parameters of cardiac fat deposition were evaluated using
bidimensional echocardiography. Clinical (age, sex, personal antecedents of smoking habit, hypertension and diabetes mellitus, as well as clinical
presentation of CAD) and anthropometric (waist circumference and body mass index [BMI]) variables were also collected.
Results: Epicardial fat (OR 1.27 p = 0.009), as well as fat infiltration of the right ventricle (OR 2.94 p = 0.027), had a significant and
independent association with the presence, but not the extent (p = 0.516) and clinical presentation (p = 0.153) of CAD. The extent of epicardial
fat deposition showed a proportional and significant association (p = 0.001) with the presence of CAD.
Conclusion: Epicardial fat and fat infiltration of the right ventricle were both significant and independent factors associated to the presence of
CAD, which was proportionally increased according to the extent of cardiac fat deposition. (Arq Bras Cardiol 2011; 97(2) : 122-129)
Keywords: Echocardiography; subcutaneous fat; pericardium; coronary disease.
Full texts in English - http://www.arquivosonline.com.br
Correspondência: Julio Oscar Cabrera Rego •
Dstrampes No.5 - Stos Suarez - 10400 - Havana - Cuba
E-mail: [email protected]
Artigo recebido em 05/10/10; revisado recebido em 12/10/10; aceito em 23/02/11.
122
Mustelier e cols.
Deposição de gordura epicárdica e doença arterial coronariana
Artigo Original
Introdução
A medida ecocardiográfica da gordura epicárdica é
um método de quantificação não-invasivo e objetivo com
alta disponibilidade e que tem mostrado claras vantagens
como marcador de risco cardiometabólico, superior mesmo
ao da gordura subcutânea e adiposidade corporal total1.
Recentemente, alguns estudos mostraram a associação entre
a gordura epicárdica a aterosclerose subclínica2-4, a presença,
extensão e severidade de doença arterial coronariana (DAC)5-7
e a reserva de fluxo coronariano em mulheres8.
Em comparação com a gordura epicárdica, outras
manifestações de deposição de gordura cardíaca tem
recebido menor atenção na literatura. A gordura epicárdica
também é o principal determinante da infiltração lipomatosa
do septo atrial, o que ocasionalmente tem sido relatado
como hipertrofia lipomatosa em vários relatos de caso9, uma
entidade benigna (definida como espessura do septo atrial
> 20 mm) em associação com arritmias supraventriculares e
morte súbita. Em relação à esse assunto, Chaowalit e cols.10
recentemente relataram sua associação com a presença de
significante DAC. Por outro lado, a infiltração de gordura
do ventrículo direito (VD) é um fenômeno relativamente
frequente, encontrado principalmente em indivíduos mais
velhos e mulheres. A relação entre a gordura no VD e DAC
ainda não foi avaliada adequadamente11.
Não há estudos avaliando a associação entre essas
manifestações de deposição de gordura cardíaca (gordura
epicárdica, infiltração lipomatosa do septo atrial e infiltração
de gordura no VD) e sua relação com DAC, especialmente
em indivíduos hispânicos.
Métodos
População do estudo
Duzentos e cinquenta pacientes hispânicos sendo
submetidos à sua primeira angiografia coronariana invasiva
(ACI) [185 (74%) com DAC significante e 65 (26%) com artérias
coronárias normais (ACN)] foram estudados entre novembro
de 2009 e abril de 2010 em nossa instituição. No grupo de
pacientes com DAC, os diagnósticos clínicos na admissão foram
síndrome coronariana aguda (SCA) em 107 (57,8%) e angina
estável em 78 (42,2%). Pacientes foram excluídos se tivessem
uma história pregressa de SCA, doença valvar grave, doença
cardíaca congênita ou cardiomiopatia, derrame pericárdico,
hipotireoidismo e imagem ecocardiográfica transtorácica
inadequada. No dia posterior à ACI, todos os pacientes foram
submetidos à ecocardiografia transtorácica. As variáveis clínicas
(idade, sexo, antecedentes pessoais de tabagismo, hipertensão e
diabete melito, bem como apresentação clínica da DAC) foram
coletadas. A dislipidemia foi definida como níveis de colesterol
total ≥ 200 mg/dl ou triglicérides ≥150 mg/dl. Medidas
antropométricas tais como peso, altura e circunferência da
cintura (CC) foram medidas. O índice de massa corporal (IMC)
em kg/m2 foi calculado através da fórmula: peso/(altura)2.
O protocolo do estudo estava de acordo com as diretrizes
éticas da Declaração de Helsinki de 1975 e foi aprovado pelo
Comitê de Ética de nossa instituição. Todos os participantes
assinaram o Termo de Consentimento Livre e Informado.
123
Arq Bras Cardiol 2011; 97(2) : 122-129
Medida dos parâmetros ecocardiográficos de deposição
de gordura epicárdica
Os exames ecocardiográficos foram realizados em um
aparelho de ultrassom cardíaco Philips iE33 2006 (EUA)
(versão 2.0.1.420, S5-1 transdutor com arranjo de fase 1,33,6 MHz) por um ecocardiografista que desconhecia os dados
clínicos e da angiografia coronariana, com os pacientes em
decúbito lateral esquerdo.
A gordura epicárdica foi definida como o espaço
relativamente livre de eco entre a parede externa do
miocárdio (epicárdio) e a camada visceral do pericárdio, e
sua espessura foi medida no corte paraesternal de eixo longo
e curto, em imagens congeladas no modo bidimensional,
perpendicularmente à parede livre do VD, ao final da sístole,
em 3 ciclos cardíacos, usando o anel aórtico como ponto de
referencia anatômico para o corte paraesternal de eixo longo
e o nível de músculos papilares para o corte de eixo curto (Fig.
1 A, B). Como sugerido por Iacobellis e Willens12, a melhor
medida da espessura da gordura epicárdica é obtida ao final da
sístole, por que ela está comprimida durante a diástole. Foram
obtidas médias desses valores para obter-se a espessura média.
A infiltração lipomatosa do septo atrial foi definida como
espessamento ≥ 10 mm de ambos os polos do septo atrial,
geralmente poupando a fossa ovalis, dando-lhe um formato
característico de halteres e perpendicularmente medida no
corte subcostal de 4 câmaras ao final da diástole com o paciente
em inspiração máxima (Fig. 1C). A infiltração de gordura do
ventrículo direito (VD) foi definida como um espessamento ≥
5 mm da parede do VD na ausência de sobrecarga de volume/
pressão, com evidência de aumento do conteúdo adiposo
(padrão mais brilhante), no corte subcostal de 4 câmaras, ao
final da diástole, com o paciente em inspiração máxima (Fig.
1D). Com o objetivo de diminuir o componente subjetivo da
determinação da infiltração de gordura do VD, todos os exames
foram realizados com ajustes fixos no aparelho (imagem geral
harmônica, frequência de aquisição de 39 Hz, profundidade
de campo de 15 cm e ajuste de ganho de 65%).
Dados da angiografia coronariana
A análise da angiografia coronariana foi realizada por dois
cardiologistas invasivos experientes utilizando o método de
Judkin, após punção percutânea da artéria femoral ou via
artéria radial e digitalmente registrada por um sistema Hicor
(Siemens, Munique, Alemanha). As lesões coronarianas foram
avaliadas a partir de pelo menos dois cortes ortogonais. DAC
foi definida como a presença de uma ou mais estenoses ≥
50% no diâmetro de um grande vaso epicárdico. A extensão
da DAC foi quantificada de acordo com o número de vasos
com estenose ≥ 50%.
Análise estatística
A análise estatística foi realizada com o software SPSS versão
13.0 para Windows. As variáveis contínuas foram expressas
como média ± DP e as variáveis categóricas como números
absolutos e porcentagens. As comparações de variáveis contínuas
foram realizadas utilizando o teste t de Student e variáveis
categóricas foram comparadas através do teste Qui-quadrado.
Para avaliar a reprodutibilidade das medidas ecocardiográficas
Mustelier e cols.
Deposição de gordura epicárdica e doença arterial coronariana
Artigo Original
Fig. 1 - Avaliação ecocardiográfica dos parâmetros de deposição de gordura epicárdica. A) Corte paraesternal de eixo longo usando o anel aórtico como referencia
anatômica. B) Corte paraesternal de eixo curto ao nível dos músculos papilares mitrais. Gordura epicárdica (setas) A) e B). C) Corte subcostal de quatro câmaras.
Infiltração lipomatosa do septo atrial (setas). D) Corte subcostal de quatro câmaras. Infiltração de gordura no ventrículo direito (setas). AO - aorta; VE - ventrículo esquerdo;
VD - ventrículo direito; AE - átrio esquerdo; AD - átrio direito.
de gordura epicárdica, 20 pacientes foram selecionados ao
acaso para a análise por dois observadores independentes que
desconheciam os dados clínicos e angiográficos. Os coeficientes
de correlação inter e intraobservador foram calculados. As
variabilidades das medidas também foram calculadas como a
média de diferenças em medidas.
Primeiramente comparamos os parâmetros clínicos,
antropométricos e ecocardiográficos de acordo com a
presença de DAC significante. Uma comparação entre
variáveis clínicas e antropométricas com cada um dos
parâmetros ecocardiográficos de deposição de gordura
cardíaca também foi realizada. A comparação média da
espessura da gordura epicárdica em relação aos dados
antropométricos (de acordo com o sexo), apresentação
clínica e extensão da DAC também foi feita, utilizando o
teste ANOVA para avaliar diferenças entre os grupos. A
análise multivariada foi realizada usando um modelo de
regressão linear múltiplo, incluindo potenciais confundidores
(variáveis com valor de p < 0,25 na análise univariada). O
valor do ponto de corte da espessura da gordura epicárdica
para predizer DAC com correspondente especificidade
e sensibilidade foi estimado através da análise de curvas
Arq Bras Cardiol 2011; 97(2) : 122-129
124
Mustelier e cols.
Deposição de gordura epicárdica e doença arterial coronariana
Artigo Original
ROC (Receiver Operating Characteristic). Finalmente,
comparamos a extensão da deposição de gordura cardíaca
com a presença de DAC.
Resultados
Parâmetros clínicos, antropométricos e de deposição de
gordura cardíaca na população do estudo
Nosso grupo de estudo consistia de 86 (34%) mulheres
e 164 (66%) homens, com média de idade de 61,5 ± 8
e 62 ± 10 anos respectivamente. A espessura da gordura
epicárdica variou de 1 mm a 18 mm, com média (DP) de
6,1 ± 2,8 mm. Os coeficientes de correlação inter e intraobservador e a variabilidade das medidas da espessura da
gordura epicárdica foram 0,94, 0,92 e 0,5 ± 0,4 mm, 0,6 ±
0,5 mm, respectivamente, indicando boa reprodutibilidade.
Não houve diferença na espessura da gordura epicárdica
entre homens e mulheres (5,85 ± 2,8 mm vs 6,25 ± 2,8
mm, p = 0,283). A infiltração lipomatosa do septo atrial
estava presente em 141 pacientes (56,4%) e a infiltração de
gordura no VD em 71 (28,4%). As características clínicas e
antropométricas da população do estudo de acordo com o
sexo são apresentadas na Tabela 1.
Parâmetros de deposição de gordura cardíaca de acordo
com a presença e gravidade de DAC
A espessura da gordura epicárdica estava aumentada em
pacientes com DAC significante, quando comparados àqueles
com ACN. Todos os parâmetros de deposição de gordura
cardíaca mostraram uma associação significante com a presença
de DAC significativa na análise univariada. Sexo, gordura
epicárdica e infiltração de gordura do VD foram as variáveis finais
que mostraram uma associação significante e independente com
a presença de DAC na análise multivariada (Tabela 2).
A espessura da gordura epicárdica não era significantemente
maior em pacientes com DAC multiarterial do que aqueles
com DAC biarterial ou uniarterial (7,0 ± 3 mm vs 6,6 ±
2,8 mm vs 6,4 ± 2,6 mm respectivamente, p = 0,516) (Fig.
2a). Embora a gordura epicárdica fosse maior em pacientes
com SCA quando comparados àqueles com angina estável,
não houve uma associação significante entre os dois grupos
em relação a diferenças na espessura da gordura epicárdica
(6,45 ± 2,9 mm vs 5,91 ± 1,7 mm, respectivamente, p =
0,153) (Fig. 2b). Espessura da gordura epicárdica ≥ 5,2 mm
apresentou uma sensibilidade de 65,4% e especificidade
de 61,5% (área ROC 0,712, IC95% [0,640-0,784]) para a
previsão de DAC (Fig. 3).
De acordo com esses resultados, também definimos uma
nova classificação ecocardiográfica da extensão da deposição
de gordura cardíaca, determinada pela associação de gordura
epicárdica e infiltração de gordura do VD em diferentes
níveis de gravidade:
I Gordura Epicárdica < 5,2 mm.
II Gordura Epicárdica ≥ 5,2 mm.
III Gordura Epicárdica ≥ 5,2 mm e infiltração de gordura
do VD.
Tabela 1 - Variáveis clínicas e antropométricas de acordo com o
sexo na população do estudo
Feminino
n = 86 (34%)
Variáveis
Idade (anos)
Masculino
n = 164 (66%)
61,5 ± 8
62 ± 10
63 (73,2%)
127 (77,4%)
Hipertensão n (%)
68 (79%)
126 (76,8%)
Dislipidemia n (%)
55 (63,9%)
88 (53,6%)
Diabete
30 (34,8%)
38 (23,1%)
IMC (kg/m2)
27,3 ± 5,3
26,7 ± 4,1
Circunferência da cintura (cm)
90,8 ± 10,1
94,3 ± 9,7
Fumante n (%)
IMC - índice de massa corporal.
Tabela 2 - Associação de parâmetros clínicos, antropométricos e de deposição de gordura epicárdica com a presença de DAC
DAC
n = 185
Variáveis
Idade (anos)
ACN
n = 65
Odds Ratio
(IC95%)
p
Odds Ratio
(IC95%)
p
63 ± 10
58,7 ± 8
_
0,001
0,98 (0,94-1,01)
0,148
Masculino n (%)
138 (74,6%)
26 (40%)
4,40 (2,42-7,99)
0,000*
5,71 (2,89-11,27)
0,000 †
Fumante n (%)
134 (89,3%)
29 (44,3%)
3,26 (1,81-5,85)
0,000*
1,48 (0,67-3,35)
0,339
Hipertensão n (%)
156 (84,3%)
46 (70,8%)
2,22 (1,14-4,32)
0,020*
0,62 (0,28-1,41)
0,259
Dislipidemia n (%)
115 (62,1%)
31 (47,7%)
1,80 (1,02-3,18)
0,041*
0,72 (0,35-1,48)
0,367
Diabete n (%)
55 (29,7%)
14 (21,5%)
1,54 (0,78-3,01)
0,203
0,83 (0,36-1,93)
0,668
IMC (kg/m )
27,5 ± 5,7
27,1 ± 4,1
_
0,566
_
_
Circunferência da cintura (cm)
93,8 ± 10
91,2 ± 9,8
_
0,081
1,01 (0,98-1,05)
0,520
2
Gordura epicárdica (mm)
6,6 ± 2,8
4,7 ± 2,3
_
0,000*
1,27 (1,1-1,5)
0,009 †
Infiltração lipomatosa do septo atrial n (%)
116 (62,7%)
25 (38,5%)
2,69 (1,50-4,81)
0,000*
0,75 (0,37-1,53)
0,428
Infiltração de gordura no VD n (%)
62 (33,5%)
9 (13,8%)
3,14 (1,45-6,75)
0,002*
2,94 (1,14-7,07)
0,027 †
DAC - doença arterial coronariana; ACN - artérias coronárias normais; IMC - índice de massa corporal; * Associação significante na análise univariada. † Associação
significante na análise multivariada.
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Mustelier e cols.
Deposição de gordura epicárdica e doença arterial coronariana
Artigo Original
Fig. 2 - Comparação da espessura do tecido adiposo epicárdico de acordo com o número de vasos com DAC (A) e a apresentação clínica (B). Box plots mostram
mediana, valores dos percentis 25 e 75 para o tecido adiposo epicárdico. SCA - síndrome coronariana aguda.
Fig. 3 - Curva ROC (receiver operating characteristic) da espessura da gordura epicárdica para predizer DAC angiográfica.
Arq Bras Cardiol 2011; 97(2) : 122-129
126
Mustelier e cols.
Deposição de gordura epicárdica e doença arterial coronariana
Artigo Original
Fig. 4 - Curva ROC (receiver operating characteristic) da espessura da gordura epicárdica para predizer DAC angiográfica.
A presença de DAC significante estava proporcionalmente
e significantemente aumentada de acordo com a extensão
dessa associação (p = 0,001) (Fig. 4).
Relação entre os parâmetros de deposição de gordura
cardíaca com variáveis clínicas e antropométricas
Quando os pacientes foram divididos em dois grupos
de acordo com o valor de corte da gordura epicárdica,
o IMC mostrou uma associação significante com esse
parâmetro ecocardiográfico somente na análise univariada
(27,3 ± 4,6 vs 26,1 ± 4,5, p = 0,038). Idade (63,3 ± 8,4
vs 56,2 ± 10,8), CC (94,1 ± 9,6 cm vs 90,3 ± 10 cm) e
dislipidemia (65,3% vs 48%) eram maiores no grupo com
espessura de gordura epicárdica ≥ 5,2 mm em comparação
com pacientes com espessura de gordura epicárdica < 5,2
mm, com uma associação independente e significante na
análise multivariada.
Idade e sexo masculino foram as únicas variáveis que
mostraram uma associação significante e independente com a
infiltração lipomatosa do septo atrial, bem como idade e sexo
feminino em relação à infiltração de gordura do VD (Tabela 3).
Discussão
Parâmetros de deposição de gordura cardíaca na
população do estudo
Como sugerido por Iacobellis e Willens 12, a melhor
medida da espessura da gordura epicárdica é obtida no final
da sístole, por que ela está comprimida durante a diástole.
Tabela 3 - Análise de regressão logística múltipla das variáveis clínicas e antropométricas de acordo com os parâmetros de deposição de
gordura epicárdica
Gordura epicárdica
Variáveis
Infiltração lipomatosa do septo atrial
Infiltração de gordura no VD
Odds Ratio
(IC95%)
p
Odds Ratio
(IC95%)
1,07 (1,03-1,11)
0,000*
_
_
Fumante n (%)
1,27 (0,67-2,40)
0,461
Hipertensão n (%)
1,17 (0,57-2,42)
0,671
_
_
1,72 (0,72-4,12)
0,226
Dislipidemia n (%)
1,82 (1,04-3,16)
0,035*
_
_
1,20 (0,62-2,31)
0,584
Diabete n (%)
0,80 (0,41-1,54)
0,496
0,67 (0,36-1,24)
0,198
0,65 (0,33-1,26)
0,198
IMC (kg/m2)
1,03 (0,95-1,11)
0,537
_
_
0,95 (0,88-1,04)
0,272
Circunferência da cintura (cm)
1,04 (1,01-1,07)
0,006*
0,98 (0,96-1,01)
0,254
0,98 (0,95-1,02)
0,421
Idade (anos)
Masculino n (%)
p
Odds Ratio
(IC95%)
p
0,96 (0,93-0,99)
0,002*
0,97 (0,93-1,00)
0,048*
2,47 (1,45-4,21)
0,001*
1,90 (1,01-3,55)
0,045*
_
_
_
_
Feminino n (%)
IMC - índice de massa corporal. _ Essas variáveis não foram incluídas na análise multivariada devido ao valor de p ≥ 0,25 na análise univariada. * Associação significante
na análise multivariada.
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Deposição de gordura epicárdica e doença arterial coronariana
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Entretanto, todos os estudos realizados para avaliar essa
questão mediram a gordura epicárdica no final da diástole.
Assim, as variações e valores médios da espessura da gordura
epicárdica encontrados em nosso estudo, embora similares aos
valores encontrados em outros relatos5-7, são de fato diferentes
e menores, devido à diferente metodologia usada nessas
medições. Esse é o primeiro estudo realizado exclusivamente
em pacientes hispânicos. Assim, esses resultados poderiam
estar relacionados à diferenças étnicas apontadas por
algumas investigações em relação à espessura e volume da
gordura epicárdica, que parece ser menor em indivíduos de
ascendência afro-americana e hispânica13,14.
A infiltração lipomatosa do septo atrial e a infiltração
de gordura do VD parecem ser pelo menos um fenômeno
relativamente frequente em pacientes com risco cardiovascular
alto. Chaowalit e cols.10 relataram um valor médio de espessura
de septo atrial de 15 ± 4 mm em 75 pacientes submetidos
à ACI. Por outro lado, em um exame macro e microscópico
de 148 corações obtidos de autópsias, 85% continham pelo
menos alguma gordura intramiocárdica, mais evidente no
ventrículo direito11.
Parâmetros de deposição de gordura cardíaca de acordo
com a presença e gravidade de DAC
Em nosso estudo, encontramos gordura epicárdica e
infiltração de gordura do VD como fatores independentes
e significantes associados à DAC. Iacobellis e cols. 15
demonstraram que a gordura epicárdica é claramente
metabolicamente ativa e uma fonte importante de pró (fator
de necrose tumoral-α, interleucina 1, interleucina 6, fator
de crescimento nervoso) e anti (adiponectina) produção de
citocinas inflamatórias, o que pode afetar de forma significante
a função e a morfologia cardíacas15.
Em um resultado similar, aparte de estudos utilizando
metodologia estado-da-arte (ecocardiografia bidimensional
e angiografia coronariana)5-7, investigações mais recentes
tem demonstrado, através de tomografia computadorizada
cardíaca, uma associação significante entre gordura
epicárdica e DAC14,16. Entretanto, ao contrário do nosso, uma
associação significante entre gordura epicárdica e a extensão
e apresentação clínica da DAC também foi identificada5-7.
A gordura epicárdica ≥ 5,2 mm mostrou valores modestos
de sensibilidade e especificidade na previsão de DAC. Eroglu
e cols.7 identificaram os mesmo valor de corte da espessura
da gordura epicárdica medida ao final da diástole, com 85%
de sensibilidade e 81% de especificidade (área ROC 0,914,
p < 0,001, IC95% [0,86-0,96]) para previsão de DAC7. Ahn
e cols.6 mostraram valores menores quando a espessura
da gordura epicárdica era adicionada aos fatores de risco
de DAC conhecidos (área ROC 0,783, p < 0,001, IC95%
[0,742-0,824])6. Nossa hipótese é que os valores de corte
mais baixos de espessura da gordura epicárdica obtidos em
nosso estudo para a identificação de pacientes com DAC
estão possivelmente relacionados à diferenças étnicas para
essa associação. Por exemplo, Divers e cols.17 encontraram
uma diferença étnica significante (p = 0,019) em relação à
associação de adiposidade pericárdica com aterosclerose
coronariana em afro-americanos, quando comparados à
americanos de ascendência europeia17.
A gordura epicárdica é uma fonte importante de
adiponectina e a hipoadiponectinemia tem emergido como
um fator de risco independente para doença cardiovascular.
Em relação a esse assunto, Hanley e cols.18 observaram
que uma associação inversa de tecido adiposo visceral
com adiponectina era maior em afro-americanos, quando
comparados com hispânicos. Esses achados apoiam os
resultados encontrados em nosso estudo em relação à menor
sensibilidade e especificidade da gordura epicárdica em
identificar pacientes com DAC, pelo menos em comparação
com outros estudos realizados em outros grupos étnicos.
De nosso conhecimento, esse é o primeiro estudo a propor
uma definição de extensão de deposição de gordura cardíaca
e a demonstrar sua significante e proporcional relação com
DAC. Esse também é o primeiro estudo realizado para avaliar
a infiltração de gordura do VD via ecocardiografia, como
marcador de deposição de gordura cardíaca e DAC. Em
relação à infiltração lipomatosa do septo atrial, Chaowalit e
cols.10, o único estudo relatado até o momento, encontraram
uma associação limítrofe entre a espessura do septo atrial e a
presença de DAC, independente da idade, sexo e IMC (p =
0,05)10. Também identificamos uma associação significante,
mas somente na análise univariada.
Relação dos parâmetros de deposição de gordura cardíaca
com variáveis clínicas e antropométricas
Em nosso estudo, a gordura epicárdica estava associada
de forma significante e independente com idade, CC e
dislipidemia. Todos os estudos que abordaram esse assunto
encontraram os mesmos resultados5-7. Iacobellis e cols.19
demonstraram uma excelente correlação entre tecido adiposo
epicárdico e CC, bem como tecido adiposo visceral abdominal
medido através de ressonância magnética19. A infiltração
lipomatosa do septo atrial e a infiltração de gordura do VD
também foram mais prevalentes em indivíduos mais velhos9,20.
Por outro lado, a associação entre sexo e essas manifestações
de adiposidade cardíaca permanece controversa.
Conclusões
A gordura epicárdica e a infiltração de gordura do VD são
fatores independentes relacionados à presença de DAC, que
estão significantemente e proporcionalmente aumentados de
acordo com a extensão da deposição de gordura cardíaca.
Entretanto, diferenças étnicas em relação ao valor preditivo da
espessura da gordura epicárdica para identificar pacientes com
DAC em indivíduos hispânicos ainda precisam ser provadas.
Limitações
A avaliação da infiltração de gordura do VD via
ecocardiografia tem um alto componente subjetivo devido
à avaliação da refletividade dessa estrutura, que é necessário
para a definição desse parâmetro ecocardiográfico além da
presença de aumento da espessura da parede do VD.
Teria sido ideal estabelecer uma correlação entre a
infiltração de gordura do VD via ecocardiografia e outros
métodos de imagem, tais como a imagem por ressonância
magnética ou tomografia computadorizada.
Arq Bras Cardiol 2011; 97(2) : 122-129
128
Mustelier e cols.
Deposição de gordura epicárdica e doença arterial coronariana
Artigo Original
Potencial Conflito de Interesses
Declaro não haver conflito de interesses pertinentes.
Fontes de Financiamento
O presente estudo não teve fontes de financiamento
externas.
Vinculação Acadêmica
Este artigo é parte de livre-docência de Juan Valiente
Mustelier, Julio Oscar Cabrera Rego, Angela Gala González,
Júlio César Gandarilla Sarmiento, Beatriz Vega Riverón pela
National Cardiology and Cardiovascular Surgery Institute,
Institute of Tropical Medicine ´Pedro Kourí´.
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Arq Bras Cardiol 2011; 97(2) : 122-129
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Artigo Original
Validade e Equivalência da Versão em Português do Veterans
Specific Activity Questionnaire
Validity and Equivalence of the Portuguese Version of the Veterans Specific Activity Questionnaire
Geraldo de Albuquerque Maranhão Neto1,2, Antonio Carlos Ponce de Leon1, Paulo de Tarso Veras Farinatti2,3
Pós-Graduação em Saúde Coletiva, Departamento de Epidemiologia, Instituto de Medicina Social - Universidade do Estado do Rio de Janeiro1,
Rio de Janeiro, RJ; Laboratório de Atividade Física e Promoção da Saúde, Instituto de Educação Física e Desportos - Universidade do Estado do Rio
de Janeiro2, Rio de Janeiro, RJ; Programa de Pós-Graduação em Ciências da Atividade Física - Universidade Salgado de Oliveira3, Niterói, RJ - Brasil
Resumo
Fundamento: O Veterans Specific Activity Questionnaire (VSAQ) tem sido utilizado para a individualização de testes
ergométricos (TE) e para avaliar indiretamente a aptidão cardiorrespiratória (ACR) em estudos epidemiológicos. Apesar
disso, ainda não há versão em português validada.
Objetivo: Verificar a validade de critério da versão em português do VSAQ e examinar a equivalência de mensuração
dessa versão em 95 indivíduos, sendo 8 mulheres (69 ± 7 anos), com indicação para a realização de TE.
Métodos: Os indivíduos realizaram teste cardiopulmonar de exercício progressivo máximo em ciclo-ergômetro. A
correlação do escore do VSAQ com o MET Máximo Medido e Estimado foi comparada com os resultados de outros estudos.
O Nomograma VSAQ foi calculado e seus resultados comparados com os valores reais da ACR por regressão linear. Limites
de concordância e as diferenças médias (vieses) foram avaliados segundo a metodologia proposta por Bland e Altman.
Resultados: Os escores obtidos através do VSAQ correlacionaram-se de forma significativa com o MET máximo medido
(r = 0,64) e estimado (r = 0,67), resultados equivalentes àqueles obtidos com versões originais. O nomograma VSAQ
obteve resultados com R múltiplo de 0,78 (para MET medido) e 0,80 (para MET estimado). O nomograma, entretanto,
parece subestimar os valores de indivíduos com ACR acima de 6 METs.
Conclusão: A versão do VSAQ confirmou-se válida e equivalente à versão original, especialmente para avaliação de
indivíduos cardiopatas e de idade avançada. (Arq Bras Cardiol 2011; 97(2) : 130-135)
Palavras-chave: Validade dos testes, aptidão física, teste de esforço, doenças cardiovasculares.
Abstract
Background: The Veterans Specific Activity Questionnaire (VSAQ) has been used to individualize exercise testing (ET) and to indirectly assess
cardiorespiratory fitness (CRF) in epidemiological studies. Nevertheless, there is no validated Portuguese version.
Objective: To verify the criterion-related validity and the measurement equivalence of a Portuguese version of VSAQ in 95 individuals, 8 women
(aged 69 ± 7 years) referred to ET.
Methods: The subjects performed a cardiopulmonary test with incremental to maximal exercise on a cycle ergometer. The correlation between
VSAQ score and Maximum Measured and Estimated METs was compared to results from other studies. The VSAQ Nomogram was calculated and
its results were compared to CRF real values by linear regression. Limits of concordance and mean differences (biases) were assessed according
to the Bland Altman methodology.
Results: The VSAQ scores were significantly correlated to the Measured METs (r = 0.64) and Estimated METs (r = 0.67), results that were
equivalent to those obtained by the original versions. The VSAQ Nomogram presented multiple R of 0.78 (Measured MET) and 0.80 (Estimated
MET). However, the Nomogram seems to have underestimated CRF values greater than 6 METs.
Conclusion: The VSAQ version confirmed its validity and equivalence to the original version, especially when evaluating individuals with
coronary heart disease and older adults. (Arq Bras Cardiol 2011; 97(2) : 130-135)
Keywords: Validity of tests; physical fitness; exercise test; cardiovascular diseases.
Full texts in English - http://www.arquivosonline.com.br
Correspondência: Geraldo de Albuquerque Maranhão-Neto •
Av. Ayrton Senna, 270/1807 Bloco 1 - Barra da Tijuca - 22793-000 - Rio de Janeiro, RJ - Brasil
E-mail: [email protected], [email protected]
Artigo recebido em 25/08/10, revisado recebido em 26/08/10, aceito em 08/02/11.
130
Maranhão Neto e cols.
Validade da versão em português do VSAQ
Artigo Original
Introdução
Baixos níveis de aptidão cardiorrespiratória (ACR) têm
sido considerados fator de risco para morbimortalidade1,2. A
obtenção da ACR pela realização de testes ergométricos (TE)
torna esse tipo de teste de grande importância, servindo como
ferramenta diagnóstica e prognóstica3.
Apesar do valor da utilização dos TE, muitas dificuldades
podem inviabilizá-lo, tais como o tempo gasto e o custo
elevado com recursos materiais e humanos4,5. Em populações
de risco, como idosos e cardiopatas, a realização dos TEs fica
dificultada pela menor capacidade funcional e fragilidade
desses indivíduos6,7.
Com isso, alternativas têm sido criadas, especialmente por
meio de testes submáximos, questionários sobre sintomas e
modelos sem exercício para estimar a ACR. Apesar de muitas
vezes gerarem correlações modestas, muitos instrumentos
demonstram considerável valor prognóstico. Um dos principais
instrumentos encontrados é o Veterans Specific Activity
Questionnaire (VSAQ)7. Inicialmente desenvolvido para a
individualização do TE8, para o que se utiliza uma equação
preditiva juntamente com a variável idade (Nomograma VSAQ),
o questionário também tem sido utilizado para estimar a ACR
de indivíduos revascularizados9 como indicador de risco de
mortalidade em homens com indicação de TE10.
Em razão da importância do VSAQ, em 2008, Maranhão
Neto e cols.11 realizaram a adaptação transcultural da escala.
O investimento nesse sentido se justificou, pois, até aquele
momento, apesar da utilização do VSAQ em publicações
nacionais12,13, essa necessária adaptação não havia sido
feita. O processo de adaptação do VSAQ mostrou que a
versão em português desenvolvida possuía vários tipos de
equivalência com a versão original. Além disso, ela apresentou
boa reprodutibilidade11. Entretanto, ainda há a necessidade
da análise de equivalência de mensuração - uma vez
comprovado que a validade da versão em português é similar
àquela da versão original do instrumento, ratificar-se-ia sua
aplicabilidade clínica e epidemiológica, especialmente em
indivíduos cardiopatas.
Com isso, o presente estudo teve os seguintes objetivos:
a) realizar a validação de critério do VSAQ em indivíduos
com indicação para a realização de TE; b) verificar a
equivalência de mensuração dessa versão; e c) verificar a
validade de critério do nomograma VSAQ, a fim de analisar
sua aplicabilidade clínica em sujeitos cardiopatas.
Métodos
Amostragem
A amostra foi selecionada entre os idosos atendidos nos
anos de 2005 e 2006 pela consulta ambulatorial do Núcleo de
Atenção ao Idoso (NAI) da Universidade Aberta da Terceira Idade
(UnATI-Uerj). Para participação do presente estudo, os seguintes
critérios de inclusão foram estabelecidos: todos deveriam
ser cardiopatas estáveis, assintomáticos, sem anormalidades
eletrocardiográficas em repouso e acompanhados por pelo
menos seis meses pelo serviço ambulatorial. Atenderam aos
critérios 95 indivíduos (8 mulheres) com idades entre 60 e 85
131
Arq Bras Cardiol 2011; 97(2) : 130-135
anos (69 ± 7 anos). Todos os participantes assinaram Termo
de Consentimento Livre e Esclarecido pós-informado, de
acordo com as recomendações da convenção de Helsinki e
da Resolução n.196/96 do Conselho Nacional de Saúde para
pesquisas envolvendo seres humanos. O estudo foi aprovado
pelo Comitê de Ética institucional. Não houve conflito de
interesse relacionado ao estudo.
Procedimentos
Todos os participantes responderam ao VSAQ (quadro 1).
A versão em português utilizada teve como base a proposta
revisada por Myers e cols.14. A massa corporal foi obtida em uma
balança digital Filizola® ID 1500 scale (Filizola, São Paulo, Brasil)
com limite mínimo de 2,5 kg, e máximo de 150 kg, e precisão
de um grama. A estatura foi determinada com estadiômetro de
madeira com precisão de 0,1 cm. O índice de massa corporal
(IMC) foi calculado a partir do peso e estatura referidos.
Quadro 1 - Versão em português do VSAQ
Sublinhe a atividade que lhe causaria cansaço, falta de ar, desconforto
no peito ou qualquer outra razão que o faça querer parar. Mesmo que
você não faça uma determinada atividade, tente imaginar como seria se
você fizesse
METs
Atividades
1
Comer, vestir-se, trabalhar sentado
2
Tomar uma ducha, fazer compras em shoppings e lojas de roupa,
cozinhar
Descer oito degraus
3
Caminhar devagar em uma superfície plana, por um ou dois
quarteirões
Carregar compras, fazer serviços domésticos de intensidade
moderada, como varrer o chão e passar o aspirador de pó
4
Trabalho leve no quintal ou jardim, como juntar e colocar folhas
numa sacola ou saco plástico, semear, varrer ou empurrar um
cortador de grama a motor
Pintura ou carpintaria leve
5
Caminhar rápido
Dançar socialmente, lavar o carro
6
Jogar golfe (nove buracos) carregando os próprios tacos.
Carpintaria pesada, empurrar cortador de grama sem motor
7
Subir ladeira caminhando, fazer trabalho pesado no exterior da
casa, como cavar um buraco com pá, arar o solo
Carregar pesos com cerca de 25 kg
8
Mover móveis pesados
Corrida leve em superfície plana, subir escadas rapidamente,
carregar sacolas de supermercado escada acima
9
Andar de bicicleta em ritmo moderado, serrar lenha, pular corda
(devagar)
10
Natação acelerada, pedalar morro acima, andar rapidamente
morro acima, correr a cerca de 9,5 km/h
11
Subir 2 lances de escada carregando algo pesado, como lenha ou
uma criança no colo
Andar de bicicleta em ritmo acelerado continuamente.
12
Correr rápida e continuamente (plano horizontal, 5 minutos para
cada 1 km)
13
Qualquer atividade física competitiva, incluindo aquelas com
corrida acelerada (sprint) intermitente
Correr, remar, ou pedalar de forma competitiva
Maranhão Neto e cols.
Validade da versão em português do VSAQ
Artigo Original
Os indivíduos realizaram um teste de exercício cardiopulmonar
máximo em cicloergômetro de membros inferiores Cateye
EC-1600 (Cat Eye, Tokyo, Japão) em um protocolo de rampa
individualizado. Para a medida e análise dos gases expirados,
foi utilizado um analisador metabólico VO2000 (MedGraphics,
Estados Unidos). Os resultados obtidos através do VSAQ não
eram de conhecimento dos profissionais que conduziam
os testes. As cargas em Watts foram selecionadas com base
na capacidade máxima de trabalho estimada, com vistas à
obtenção do esforço máximo entre 6 e 12 minutos, de acordo
com as recomendações da American Heart Association3. Foi
realizada monitorização contínua da eletrocardiografia (ECG)
de 12 derivações (Micromed®, Brasília, Brasil), com medidas da
pressão arterial ao repouso a cada minuto de teste, realizadas com
esfigmomanômetro aneroide WelchAlln da Tycos® (Arden, EUA).
Tabela 1 - Caracterização clínica e respostas ao exercício
Peso (kg)
77,8 ± 11,6
Estatura (cm)
169,7 ± 8,2
Índice de massa corporal (kg/m2)
27,0 ± 3,3
VSAQ
4,6 ± 1,2
FC repouso (bpm)
65,2 ± 9,9
PA sistólica repouso (mmHg)
129,4 ± 20,2
PA diastólica repouso (mmHg)
73,4 ± 9,7
VO2 pico (ml/kg/min)
20,3 ± 6,8
Met máximo medido
5,8 ± 1,9
Met máximo estimado
6,0 ± 1,7
Foram estabelecidos critérios de interrupção para os testes,
de acordo com as recomendações da literatura15. O teste era
interrompido por exaustão máxima voluntária. Não foi imposto
nenhum limite quanto ao valor da frequência cardíaca (FC) a ser
atingida. Os testes que fossem interrompidos por razões clínicas
ou considerados submáximos seriam excluídos da análise.
FC máxima (bpm)
O valor do MET Máximo medido foi calculado a partir do
consumo máximo de oxigênio em teste (VO2 pico) dividido por 3,5,
e o MET máximo estimado foi determinado a partir das equações
do Colégio Americano de Medicina do Esporte, considerando a
resistência mecânica do cicloergômetro na maior carga atingida
(em Watts)16.
Tabagismo
11,6%
Hipertensão
43,2%
Diabete
7,4%
Dislipidemia (> 220 mg/dl)
18,9%
Análise estatística
Após confirmação da normalidade dos dados por análise
univariada, foi testada a correlação entre os escores obtidos
no VSAQ e as variáveis MET Máximo Medido e Estimado
através do cálculo do r de Pearson. A análise de correlação de
Pearson também foi realizada entre os valores obtidos em MET
Máximo e o resultado do nomograma VSAQ. O resultado foi
calculado a partir da seguinte equação: MET máximo = 4,7
+ 0,97 (escore VSAQ) - 0,06 (idade em anos)7.
A análise visual foi realizada com as plotagens de
identidade e de Bland Altman, para avaliação se o erro do
Nomograma VSAQ variava de acordo com os níveis de MET
máximo (heterocedasticidade). Para auxiliar nessa análise,
foram estipulados limites de concordância de 95% (LC 95%)
calculados mediante a diferença média entre reportado e
medido ± o desvio padrão das diferenças multiplicado por
1,96. Todos os cálculos foram feitos com uso do aplicativo Stata®
10.1 Standard Edition for Windows (Texas, EUA). Em todos os
casos, o nível de significância estatística foi fixado em p ≤ 0,05.
Resultados
As características da amostra, tanto em repouso quanto em
exercício, são apresentadas na tabela 1. A duração média do
TE foi de 9,6 ± 1,8 minutos, não tendo havido complicações
durante ou após os testes.
As correlações obtidas entre os escores do VSAQ e os
valores de MET máximos medido e estimado podem ser
observadas nas tabelas 2 e 3, assim como as correlações
relatadas por outros estudos.
PA sistólica máxima (mmHg)
125 ± 24,7
186,1 ± 29,3
PA diastólica máxima (mmHg)
78,8 ± 13,1
Carga máxima absoluta (Watts Max)
100,6 ± 41,4
Tempo de teste (minutos)
Histórico de infarto agudo do miocárdio
9,6 ± 1,8
41%
Medicamentos
Betabloqueador
65,3%
Antagonista de cálcio
22,1%
Diurético
21%
Vasodilatador
37,9%
Antiagregante
89,5%
VSAQ - Veterans Specific Activity Questionnaire; FC - frequência cardíaca;
PA - pressão arterial.
As correlações entre o Nomograma VSAQ e os MET medido
e estimado podem ser observadas na figura 1. As plotagens
de Bland Altman (fig. 2) apresentam, por linhas pontilhadas,
os valores de LC 95% que foram, respectivamente, -3,07 e
+1,7; entre Nomograma e MET Medido, e -2,98 e +1,01
para MET Estimado.
Discussão
Os maiores valores observados para o MET estimado em
comparação com o medido (tab. 1) corroboram os indícios
da literatura, no sentido de que, em indivíduos cardiopatas, a
ACR costuma ser superestimada quando o VO2 não é medido
diretamente14. Esses resultados são igualmente condizentes
com estudos prévios que encontraram correlações mais
elevadas entre VSAQ e MET estimado (tab. 3), sugerindo
que o questionário se adaptaria melhor à determinação
da intensidade em esteira ou ciclo ergômetro do que à
determinação do VO2pico14.
Arq Bras Cardiol 2011; 97(2) : 130-135
132
Maranhão Neto e cols.
Validade da versão em português do VSAQ
Artigo Original
Tabela 2 - Coeficientes de correlação dos escores do VSAQ com o MET máximo medido
Autores
Sexo
n
Idade
Característica da amostra
Ergômetro
r
Presente Estudo
M
F
87
08
69 ± 7
Cardiopatas
Bicicleta
0,64
Rankin e cols.17
M
F
85
12
59 ± 10
Cardiopatas
Esteira
0,57
Myers e cols.14
M
F
324
13
58 ± 12
Sadios e cardiopatas
Esteira
0,42
Pierson e cols.9
M
F
146
52
63,4 ± 9,4
Revascularizados
Esteira
0,66
Maeder e cols.18
M
F
31
10
29,5-41
Saudáveis
Bicicleta
0,46*
Myers e cols.19
M
41
68,3 ± 12
Insuficiência cardíaca
Esteira
0,37
Maeder e cols.20
M
F
33
10
30-41
Saudáveis
Esteira
0,47*
Mc Auley e cols.10
NR
321
NR
Sadios e cardiopatas
Esteira
0,56
M - masculino; F - feminino; NR - não relatado; * Correlação de Spearman.
Tabela 3 - Coeficientes de correlação dos escores do VSAQ com Met máximo estimado
Autores
Sexo
n
Idade
Característica da amostra
Ergômetro
r
Presente estudo
M
F
87
08
69 ± 7
Cardiopatas
Bicicleta
0,67
Myers e cols.7
M
F
207
05
62 ± 8
Sadios e cardiopatas
Esteira
0,79
Myers e cols.14
M
F
324
13
58 ± 12
Sadios e cardiopatas
Esteira
0,59
Maeder e cols.18
M
F
31
10
29,5-41
Saudáveis
Bicicleta
0,52*
Myers e cols.19
M
41
68,3 ± 12
Insuficiência cardíaca
Esteira
0,73
Maeder e cols.20
M
F
33
10
30-41
Saudáveis
Esteira
0,61*
Mc Auley e cols.10
NR
321
NR
Sadios e cardiopatas
Esteira
0,68
M - masculino; F - feminino; NR - não relatado; * Correlação de Spearman.
Ao comparar os resultados obtidos com a versão em
português do VSAQ (tab. 2 e 3), nota-se que são muito similares
àqueles produzidos pela versão original do instrumento,
incluindo indivíduos de características semelhantes aos do
presente estudo (cardiopatas e com idade mais avançada).
Tal evidência sugere a equivalência de mensuração da versão
em português, presentemente avaliada.
Com exceção do estudo de Myers e cols.19 realizado
em indivíduos com insuficiência cardíaca, que encontrou
uma correlação de 0,37 entre VSAQ e o VO2 pico, os valores
apresentados nas tabelas 2 e 3 mostram que correlações
mais elevadas são geralmente observadas quando o VSAQ
é aplicado em populações de idade avançada e com algum
comprometimento cardiovascular. Os resultados do presente
estudo vão ao encontro dessas evidências e sugerem,
adicionalmente, que a utilização do cicloergômetro pareceu
133
Arq Bras Cardiol 2011; 97(2) : 130-135
não afetar a associação do VSAQ com o VO2 pico. Estudos
prévios haviam até então usado o cicloergômetro apenas em
pesquisas com indivíduos saudáveis e mais jovens, obtendo
coeficientes de correlação que variavam de 0,46 a 0,5218 o
que ratifica a ideia de o VSAQ talvez não seja tão adequado
para essa população10.
O Nomograma VSAQ para a estimativa da ACR (fig. 1)
mostrou valores muito similares, tanto na estimativa do MET
medido quanto no estimado. O resultado de 0,80 é muito
semelhante ao encontrado pelo estudo original, em que o
Nomograma foi proposto, e que foi desenvolvido somente a
partir do MET estimado7 (r = 0,81, p < 0,001).
Até o presente momento, apenas dois estudos, que são
apresentados nas tabelas 2 e 3, haviam analisado a validade
do Nomograma. Myers e cols.14 relataram correlações de 0,50
e 0,63 para MET medido e estimado. Maeder e cols.20, por
Maranhão Neto e cols.
Validade da versão em português do VSAQ
Artigo Original
Fig. 1 - Plotagem de identidade entre nomograma VSAQ e MET máximo medido e estimado.
Fig. 2 - Plotagem Bland Altman entre nomograma VSAQ e MET máximo medido e estimado.
sua vez, encontraram resultados de 0,56 para MET medido,
e 0,76 para MET estimado. Uma provável explicação para a
maior semelhança entre os resultados do presente estudo e
o original talvez seja a presença de indivíduos de faixa etária
muito similar em ambos os estudos.
Os resultados apresentados pela análise gráfica de Bland
Altman (fig. 2) mostram poucos valores que se situaram fora
dos limites estabelecidos pelo LC95%, o que sugere uma boa
precisão entre o resultado obtido através do Nomograma e
os valores de MET estimado e medido. Apesar disso, notase que o Nomograma VSAQ tendeu a subestimar a ACR,
especialmente quando os indivíduos apresentaram maior
capacidade funcional (aproximadamente acima de 6 METs).
Conclusões mais aprofundadas ficam limitadas em razão do
tamanho amostral; entretanto, os achados são dignos de nota,
especialmente por essa análise gráfica não ter sido realizada
em nenhum dos estudos originais.
Estudos adicionais devem ser conduzidos com o intuito
de detectar quais níveis de capacidade funcional o VSAQ
seria mais adequado para avaliar. Maiores números amostrais
também auxiliariam no estabelecimento de pontos de
corte e na detecção de critérios de diagnóstico, tais como
sensibilidade e especificidade.
É importante destacar que os resultados apresentados no
presente estudo foram obtidos em indivíduos cardiopatas,
em sua maioria homens, e com mais de 60 anos de idade. A
versão do VSAQ apresentaria com isso, uma menor validade
externa para a avaliação de amostras compostas por indivíduos
mais jovens e por mulheres em sua maioria.
É importante destacar que o pequeno número amostral de
mulheres foi uma consequência do período estudado e dos
critérios de seleção determinados. A proporção no presente
artigo (9%) é bem similar à de outros estudos, tais como os
de Myers e cols.7 (2%), Myers e cols.14 (4%) e Rankin e cols.17
14%). Myers e cols.19 não incluíram mulheres em sua amostra,
e o estudo com a maior proporção foi o de Maeder e cols.18
(36%). Essas evidências sugerem que o VSAQ ainda é um
instrumento pouco estudado em mulheres, mesmo em sua
versão original. Ainda há, portanto, uma carência de pesquisas
sobre a diferença entre sexos na validade de critério da escala.
Arq Bras Cardiol 2011; 97(2) : 130-135
134
Maranhão Neto e cols.
Validade da versão em português do VSAQ
Artigo Original
Conclusão
Agradecimentos
Em conclusão, nossos achados confirmam a validade de
critério da versão em português do VSAQ, demonstrada
previamente por Maranhão Neto e cols.11, assim como
sua equivalência de mensuração. Os resultados obtidos na
validação do instrumento foram similares àqueles encontrados
para a versão original, especialmente em amostras similares
à do presente estudo (cardiopatas e idosos). Também foi
demonstrada a validade de critério do Nomograma, obtendose resultados semelhantes aos do artigo original, ratificando sua
aplicabilidade, especialmente em indivíduos com baixa ACR.
Pesquisa parcialmente financiada pelo Conselho Nacional
de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), sob a
forma de bolsa de produtividade em pesquisa para P. T. V.
Farinatti (processo nº 303018/2003-8) e para Antonio Ponce
de Leon (processo nº 309156/2007-6) e pela Fundação de
Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro para P. T. V.
Farinatti (E26/102.916/2008).
Sugere-se, portanto, a utilização da versão em português
do VSAQ aqui estudada, pois se trata originalmente de uma
ferramenta de importante aplicação clínica e epidemiológica.
Uma vez sendo de fácil compreensão e simples preenchimento,
pode ser utilizada por profissionais de saúde para auxiliar na
individualização do TE. Em situações em que seja impossível
realizá-lo, o VSAQ pode mesmo substituí-lo na avaliação da
ACR, tanto no acompanhamento da evolução da condição
física quanto para detectar o risco de morbimortalidade,
especialmente em indivíduos cardiopatas.
Potencial Conflito de Interesses
Declaro não haver conflito de interesses pertinentes.
Fontes de Financiamento
O presente estudo não teve fontes de financiamento
externas.
Vinculação Acadêmica
Este artigo é parte de tese de Doutorado de Geraldo de
Albuquerque Maranhão Neto pela Universidade Salgado de
Oliveira.
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Artigo Original
Validade das Equações Preditivas da Frequência Cardíaca Máxima
para Crianças e Adolescentes
Validity of Maximum Heart Rate Prediction Equations for Children and Adolescents
Fabiana Andrade Machado1 e Benedito Sérgio Denadai2
Departamento de Educação Física - Universidade Estadual de Maringá (UEM)1 - Maringá, PR; Departamento de Educação Física - Universidade
Estadual Paulista (UNESP)2 - Rio-Claro, SP - Brasil
Resumo
Fundamento: Ausência de estudos na literatura validando equações preditivas da frequência cardíaca máxima (FCmáx)
em crianças e adolescentes.
Objetivo: Analisar a validade das equações preditivas da FCmáx “220 - idade” e “208 - (0,7 x idade)” em meninos com
idades entre 10 e 16 anos.
Métodos: Um teste progressivo de esforço máximo foi realizado em 69 meninos com idades entre 10 e 16 anos,
aparentemente saudáveis e ativos. A velocidade inicial do teste foi de 9 km/h com incrementos de 1 km/h a cada três
minutos. O teste foi mantido até a exaustão voluntária, considerando-se como FCmáx a maior frequência cardíaca
atingida durante o teste. A FCmáx medida foi comparada com os valores preditos pelas equações “220 - idade” e “208
- (0,7 x idade)” através da ANOVA, medidas repetidas.
Resultados: Os valores médios da FCmáx (bpm) foram: 200,2 ± 8,0 (medida), 207,4 ± 1,5 (“220 - idade”) e 199,2 ±
1,1 (“208 - (0,7 x idade)”). A FCmáx predita pela equação “220 - idade” foi significantemente maior (p < 0,001) que a
FCmáx medida e que a FCmáx predita pela equação (“208 - (0,7 x idade)”). A correlação entre a FCmáx medida e a idade
não foi estatisticamente significativa (r = 0,096; p > 0,05).
Conclusão: A equação “220 - idade” superestimou a FCmáx medida e não se mostrou válida para essa população. A
equação “208 - (0,7 x idade)” se mostrou válida apresentando resultados bastante próximos da FCmáx medida. Estudos
futuros com amostras maiores poderão comprovar se a FCmáx não depende da idade para essa população, situação
em que o valor constante de 200 bpm seria mais apropriado para a FCmáx. (Arq Bras Cardiol 2011; 97(2) : 136-140)
Palavras-chave: Frequência cardíaca, criança, adolescente, coração/fisiologia.
Abstract
Background: There are no studies in the literature to validate equations that predict maximum heart rate (HRmax) in children and adolescents.
Objective: To analyze the validity of the HRmax predictive equations “220 - age” and “208 - (0.7 x age)” in boys aged 10 to 16 years.
Methods: A progressive maximal exertion test was carried out in 69 apparently healthy boys aged 10 to 16 years. The initial test velocity was
9 km/h, with 1-km/h increments every three minutes. The test was maintained until maximum voluntary exertion was achieved, considering
HRmax as the highest heart rate attained during the test. The measured HRmax was compared with the values predicted by the “220 - age” and
“208 - (0.7 x age)” equations, using ANOVA for repeated measures.
Results: The mean values of HRmax (bpm) were: 200.2 ± 8.0 (measured), 207.4 ± 1.5 (“220 - age”) and 199.2 ± 1.1 (“208 - (0.7 x age)”).
The HRmax predicted by the “220 - age” equation was significantly higher (p < 0.001) than the measured HRmax and the HRmax predicted by
the (“208 - (0.7 x age)”) equation. The correlation between the measured HRmax and age was not statistically significant (r = 0.096; p > 0.05).
Conclusion: The “220 - age” equation overestimated the measured HRmax and was not valid for this population. The “208 - (0.7 x age)”
equation was valid for this population, showing results that were quite similar to those of measured HRmax. Future studies with larger sample
sizes can verify whether the HRmax does not depend on age for this population, a situation in which the constant 200 bpm value would be
more appropriate for HRmax. (Arq Bras Cardiol 2011; 97(2) : 136-140)
Keywords: Heart rate; child; adolescent; heart/physiology.
Full texts in English - http://www.arquivosonline.com.br
Correspondência: Fabiana Andrade Machado •
Av. Colombo, 5790 - Bloco M06 - Depto. Educação Física - Universidade Estadual de Maringá - 87020-900 - Maringá, PR - Brasil
Email: [email protected], [email protected]
Artigo recebido em 09/10/10; revisado recebido em 03/04/11; aceito em 11/04/11.
136
Machado e Denadai
Predição da FCmáx de crianças e adolescentes
Artigo Original
Introdução
A frequência cardíaca (FC) é considerada uma variável
fisiológica de fácil mensuração, sendo rotineiramente utilizada
para avaliar a resposta cardiovascular durante o esforço e a
recuperação1,2. A frequência cardíaca máxima (FCmáx), por
sua vez, é considerada um dos critérios de verificação do
esforço máximo em testes ergométricos3,4 e é amplamente
utilizada na prescrição da intensidade de exercícios4-6.
A determinação da FCmáx pode ser feita de maneira direta,
usualmente por meio de protocolos progressivos de esforço
máximo, ou pode ser feita de maneira indireta com o auxílio
de equações preditivas, que constituem uma maneira de baixo
custo e de fácil aplicação1,7,8.
Entre as diversas equações propostas para predizer a
FCmáx, a de maior destaque por ser amplamente conhecida
é a equação “220 - idade”4,9,10, que curiosamente possui
autoria desconhecida, apesar de muitas vezes ser citada
como de autoria de Karvonen e cols.11, ainda que o trabalho
elaborado por esses autores não tenha envolvido a elaboração
dessa equação7,10,12,13. Outra equação que merece destaque
é “208 - (0,7 x idade)” proposta por Tanaka e cols.4, que foi
desenvolvida em um estudo de meta-análise coletando-se
dados na literatura de 18.712 sujeitos.
A principal característica dessas e de outras fórmulas
apresentadas para predizer a FCmáx é a de que todas
consideram que essa variável decresce com a idade14. Apesar
de esse decréscimo ser um consenso geral para homens e
mulheres, adultos saudáveis, ele pode não ser verdadeiro para
crianças e adolescentes, e ainda que o seja, esse decréscimo
deve ser mensurado para essa clientela específica, visto que a
taxa de decréscimo da maioria das equações foi determinada
para uma ampla faixa etária, englobando apenas em alguns
casos crianças e adolescentes9,15,16.
Assim, em razão da importância do conhecimento da
FCmáx para que uma criança ou adolescente não treine
em uma intensidade diferente da apropriada e planejada,
e considerando a inexistência na literatura, segundo nosso
conhecimento, de estudos validando essas duas equações
preditivas da FCmáx para essa clientela, o objetivo deste
estudo foi analisar a validade das equações preditivas da
FCmáx “220 - idade” e “208 - (0,7 x idade)” em meninos
com idades entre 10 e 16 anos.
Métodos
População
Sessenta e nove meninos com idades entre 10 e 16
anos, aparentemente saudáveis e ativos, participaram deste
estudo. Os valores médios ± desvio padrão (DP) da idade,
estatura e massa corporal foram: 12,6 ± 1,5 anos; 152,7 ±
13,1 cm; 47,3 ± 14,1 kg, respectivamente; a mediana da
idade (intervalo interquartil) foi de 12,1 anos (11,4 - 13,8).
A idade foi calculada de forma centesimal considerando
a data de nascimento e a data de realização do teste.
Nenhum dos participantes estava inserido em programas
sistemáticos de treinamento. Todos os procedimentos
adotados foram previamente aprovados pelo Comitê de
Ética em Pesquisa local. A participação foi voluntária e
137
Arq Bras Cardiol 2011; 97(2) : 136-140
isenta de qualquer bônus ou ônus aos sujeitos. Antes do
início dos testes os responsáveis tomaram conhecimento de
todos os procedimentos a que as crianças seriam submetidas
assinando o termo de consentimento livre e esclarecido
referente à participação nos testes.
Teste progressivo de esforço máximo
Previamente à realização do teste de esforço em esteira
rolante, os participantes realizaram uma visita ao laboratório
para uma sessão de adaptação ao ergômetro e também para
a verificação das medidas antropométricas (massa corporal
e estatura). O teste progressivo de esforço máximo foi
realizado em esteira rolante multiprogramável (Inbrasport
Super ATL, Porto Alegre, Brasil). Após aquecimento inicial
de três minutos a 5 km/h, o teste iniciou-se a 9 km/h, com
incrementos de 1 km/h a cada três minutos. Durante todo o
teste foi mantida uma inclinação contante referente a 1%.
A frequência cardíaca (FC) foi constantemente monitorada
por meio de frequencímetro (Polar Vantage XL). O teste foi
mantido até a exaustão voluntária, sendo os participantes
encorajados verbalmente a se manterem em exercício pelo
maior tempo possível. A FCmáx foi definida como a maior FC
atingida durante o teste4, sendo considerada atingida (válida)
apenas quando fossem observados sinais de esforço intenso
(hiperpneia, vermelhidão facial, descompasso de passadas)17.
Análise estatística
Os dados são apresentados como média ± desvio padrão
(DP) para todas as variáveis mensuradas. Os métodos foram
comparados utilizando-se ANOVA para medidas repetidas
com o teste post-hoc de Bonferroni. ANOVA one-way foi
utilizada para comparar a FCmáx medida entre as faixas
etárias. O coeficiente de correlação de Pearson foi utilizado
tanto para relacionar os valores medidos com os valores
preditos da FCmáx como para verificar a relação entre a
idade e a FCmáx medida. Análise de Bland-Altman18 foi
utilizada para calcular os limites de concordância entre a
FCmáx medida e a predita pela idade; o nível de significância
adotado foi de p < 0,05.
Resultados
Na tabela 1 são apresentados os valores medidos e
preditos da FCmáx para meninos com idades entre 10 e 16
anos. Os valores apresentados pela equação “220 - idade”
foram significativamente maiores (p < 0,001) que os valores
medidos e que os valores estimados pela equação “208 (0,7 x idade)”, conforme ANOVA para medidas repetidas
com o teste post-hoc de Bonferroni. A correlação entre
os valores da FCmáx medida e os valores preditos para as
duas equações não foi estatisticamente significante (p >
0,05) apresentando o mesmo coeficiente de correlação
para ambas as equações (r = -0,096).
A figura 1 apresenta os valores médios ± DP da FCmáx
medida para as diferentes faixas etárias. ANOVA one-way não
demonstrou diferença significativa (p > 0,05) entre as faixas
etárias. A correlação entre os valores da FCmáx medida e a
idade não foi estatisticamente significante (r = 0,096; p >
0,05). Observa-se visualmente a ausência de uma tendência
Machado e Denadai
Predição da FCmáx de crianças e adolescentes
Artigo Original
Tabela 1 - Valores da FCmáx medida e estimada para meninos entre
10 e 16 anos de idade (n = 69)
FCmáx
Média ± DP
Medida (bpm)
200,2 ± 8,0*
“208 - (0,7 x idade)” (bpm)
199,2 ± 1,1*
“220 - idade” (bpm)
207,4 ± 1,5
entre as médias dos valores preditos pela equação “220 idade” e os valores da FCmáx medida, o qual conduz a uma
superestimação da FCmáx.
Discussão
p < 0,001 em relação a 220 - idade; FCmáx - frequência cardíaca máxima.
de aumento ou diminuição da FCmáx com a idade. Isso foi
corroborado pela correlação entre essas variáveis, a qual não
foi estatisticamente diferente de zero. A variabilidade da
FCmáx para as diversas faixas etárias representada pelo DP
na figura 1 também não apresentou nenhuma tendência de
aumentar ou diminuir com a idade. Verificam-se ainda na
figura 1 os elevados valores de DP encontrados, em que o
menor e o maior DP foi de 5,1 e 9,0 bpm para as faixas etárias
entre 13-14 e 14-15 anos, respectivamente.
A figura 2 refere-se ao gráfico de dispersão dos valores
da FCmáx medida da amostra. Destaca-se novamente a alta
dispersão dos dados corroborada pelo alto DP apresentado
na tabela 1 para a FCmáx medida. Verifica-se também que os
valores preditos pela equação “220 - idade”, representados
pela linha tracejada, apresentam a tendência de superestimar
a FCmáx. Por sua vez, os valores preditos pela equação “208 (0,7 x idade)”, representados pela linha pontilhada, aparentam
se ajustar muito melhor à média da FCmáx medida.
A análise de concordância entre a FCmáx medida e a
predita pelas fórmulas apresentou como viés (diferença entre
as médias) ± desvio padrão das diferenças: 7,1 ± 8,3 bpm
(“220 - idade”) e -1,1 ± 8,2 bpm (“208 - (0,7 x idade)”).
Ressalta-se o alto viés de 7,1 bpm apresentado pela diferença
O objetivo deste estudo foi analisar a validade das equações
preditivas da FCmáx “220 - idade” e “208 - (0,7 x idade)”
em meninos com idades entre 10 e 16 anos. O principal
achado foi que a equação “220 - idade” superestimou na
média os valores da FCmáx não se mostrando válida para
essa população, e a equação “208 - (0,7 x idade)” se mostrou
válida para essa clientela pediátrica. Além disso, verificamos
que a FCmáx se mostrou independente da idade para essa
população específica, ressalvando-se que a amostra estudada
(n = 69) não permite conclusões definitivas quanto a essa
independência de relação.
De acordo com Almeida e cols.19, equações preditivas são
válidas quando aplicadas em populações com características
semelhantes às da amostra a partir da qual a equação foi
gerada. Dessa forma, apesar de sua ampla aplicação, a fórmula
“220 - idade” necessita das amostras pela qual foi gerada, visto
o desconhecimento de seu autor e da faixa etária utilizada
para a sua elaboração. Já a equação “208 - (0,7 x idade)” foi
gerada pela regressão linear de 18.712 sujeitos especialmente
entre as idades de 20 e 70 anos.
Verifica-se na tabela 1 que o valor médio da equação
“220 - idade” foi significantemente maior (p < 0,001) que
os valores medidos e que os valores estimados pela equação
“208 - (0,7 x idade)”. Dessa forma, a equação “220 - idade”
superestima, na média, os valores da FCmáx. Aplicando-se
a equação “220 - idade”, constata-se que FCmáx predita
recua linearmente de 210 bpm aos 10 anos para 204 bpm
aos 16 anos, superestimando ao longo da faixa etária de 10
215
210
FCmáx (bpm)
205
200
195
190
185
180
175
10 - 11
11 - 12
12 - 13
13 - 14
14 - 15
15 - 16
Faixa etária (anos)
Fig. 1 - Valores médios ± DP da FCmáx medida para as diferentes faixas etárias (n = 69). Não houve diferença significativa (p > 0,05) entre as faixas etárias.
Arq Bras Cardiol 2011; 97(2) : 136-140
138
Machado e Denadai
Predição da FCmáx de crianças e adolescentes
Artigo Original
230
FCmáx (bpm)
220
210
FCmáx Medida
200
220 - idade
190
208 - (0,7 x idade)
180
170
9
10
11
12
13
14
15
16
17
Idade (anos)
Fig. 2 - Gráfico de dispersão dos valores da FCmáx medida dos sujeitos (n = 69). A linha tracejada representa os valores preditos pela equação “220 - idade”. A linha
pontilhada representa os valores preditos pela equação “208 - (0,7 x idade)”.
a 16 anos o valor médio da FCmáx medida de 200,2 bpm.
Essa constatação pode ser feita visualmente pela figura 2.
Contrariamente à equação “220 - idade”, não houve diferença
significativa (p > 0,05) entre os valores preditos pela equação
“208 - (0,7 x idade)” e os valores medidos. Os valores preditos
pela equação “208 - (0,7 x idade)” recuam de 201 bpm aos
10 anos para 196,8 bpm aos 16 anos de idade, apresentando
valores acima (idade < 11,1 anos) e abaixo (idade ≥ 11,1
anos) da média de 200,2 bpm da FCmáx medida.
Verificou-se por meio da figura 1 que não houve diferença
significativa (p > 0,05) entre as diversas faixas etárias para a
FCmáx medida. Corroborou para essa ausência de diferença
o fato de a correlação entre a FCmáx medida e a idade não
ter sido estatisticamente significante. Dessa forma, por meio
deste estudo, não é possível afirmar que a FCmáx decresça
com a idade para a população aqui estudada. Apesar de essa
amostra não ser pequena (n = 69), ela ainda não permite
obter conclusões definitivas quanto à ausência de relação
entre a FCmáx e a idade.
Outro ponto interessante apresentado nos resultados foi
a alta variabilidade da FCmáx para as diversas faixas etárias,
variabilidade representada pelo DP. Esse elevado DP também
não apresentou nenhuma tendência de aumentar ou diminuir
com a idade. Tanto na figura 1 como na figura 2, é possível
verificar esse padrão de um elevado DP para a FCmáx.
Ressaltamos que não apenas a FCmáx medida apresentou um
alto DP da ordem de 8 bpm, como também a diferença entre
as médias (viés) dos valores preditos e medidos apresentou
um DP dessa mesma ordem. Esses valores estão de acordo
139
Arq Bras Cardiol 2011; 97(2) : 136-140
com a literatura que relata um desvio padrão da ordem de 10
bpm para os valores preditos da FCmáx4,10. Analisando-se o
viés e o DP da diferença entre os valores da FCmáx preditos
e medidos, verifica-se um amplo limite de concordância para
95% dos casos entre os valores medidos e os preditos pela
equação “220 - idade” (-9,5 a 23,7 bpm) e pela equação “208
- (0,7 x idade)” (-17,5 a 15,3 bpm), os quais poderão resultar
em erros de até +12% e -9%, respectivamente, considerando
a FCmáx média de 202,2 bpm. Diante disso, temos que a alta
variabilidade da FCmáx se apresenta como o principal fator
limitante para a sua predição.
Conclusão
Com base nesses resultados, conclui-se que a equação
“220 - idade” não se mostra válida e apropriada para crianças
e adolescentes, já que essa superestimou na média os valores
da FCmáx para meninos na faixa etária de 10 a 16 anos.
A equação “208 - (0,7 x idade)”, por sua vez, apresentou
resultados bastante próximos da FCmáx medida, podendo ser
considerada uma equação válida para essa clientela pediátrica.
Adicionalmente, caso a FCmáx seja realmente independente
da idade para meninos dessa faixa etária, o que apenas poderá
ser comprovado em futuros estudos com amostras maiores,
o valor constante de 200 bpm poderá se tornar o valor mais
apropriado para a FCmáx dessa população.
Potencial Conflito de Interesses
Declaro não haver conflito de interesses pertinentes.
Machado e Denadai
Predição da FCmáx de crianças e adolescentes
Artigo Original
Fontes de Financiamento
O presente estudo não teve fontes de financiamento
externas.
Vinculação Acadêmica
Não há vinculação deste estudo a programas de pósgraduação.
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Arq Bras Cardiol 2011; 97(2) : 136-140
140
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Artigo Original
Marcadores de Desequilíbrio Redox em Sangue de Pacientes
Hipertensos de uma Comunidade no Nordeste do Brasil
Markers of Redox Imbalance in the Blood of Hypertensive Patients of a Community in Northeastern Brazil
Sandra Mary Lima Vasconcelos1,2,4, Marília Oliveira Fonseca Goulart1,2, Maria Alayde Mendonça da Silva1,5,
Vanusa Manfredini6, Mara da Silveira Benfato6, Luiza Antas Rabelo1,3, Gilberto Fontes1,3
Universidade Federal de Alagoas-UFAL1, Instituto de Química e Biotecnologia-IQB2, Instituto de Ciências Biológicas e da Saúde-ICBS3,
Faculdade de Nutrição-FANUT4, Faculdade de Medicina-FAMED5; Maceió, AL-Brasil. Universidade Federal do Rio Grande do Sul-UFRGS6;
Porto Alegre, RS-Brasil.
Resumo
Fundamento: Estudos recentes descrevem a participação de espécies reativas de oxigênio e nitrogênio na
hipertensão.
Objetivo: Identificar o desbalanço redox em sangue de hipertensos.
Métodos: Superóxido dismutase (SOD), catalase (CAT), glutationa peroxidase (GPx), glutationa (GSH), vitamina C,
transferrina, ceruloplasmina, malondialdeído (MDA) e o grupo carbonila, foram quantificados no sangue de 20 hipertensos
e 21 controles. Os indivíduos tinham um Índice de Massa Corporal de ≥ 18,5 e ≤ 30 kg/m2, glicemia ≤ 100 mg/dL, colesterol
sérico ≤ 200 mg/dL, e eram mulheres não fumantes, não grávidas e não lactantes, não usuárias de alopurinol e probucol, e
hipertensos em medicação anti-hipertensiva. Todos os indivíduos foram submetidos a um período preparatório de quatro
semanas sem álcool, suplementos vitamínicos, dexametasona e paracetamol.
Resultados: Níveis reduzidos de CAT (p = 0,013), GSH ( p = 0,003) e MDA (p = 0,014), e altos níveis de GPx (p = 0,001)
e ceruloplasmina (p = 0,015) foram obtidos no grupo de hipertensos, em comparação com os controles. Foi verificada
uma correlação positiva entre a pressão sistólica e o MDA nos hipertensos e diastólica e CAT nos controles.
Conclusão: Os dados obtidos são sugestivos de que os hipertensos apresentavam desequilíbrio em reações redox, a
despeito do possível efeito atenuante de sua medicação anti-hipertensiva. (Arq Bras Cardiol 2011; 97(2) : 141-147)
Palavras-chave: hipertensão, marcadores biológicos, antioxidantes, estresse oxidativo, enzimas.
Abstract
Background: Recent studies describe the participation of reactive oxygen and nitrogen species in hypertension.
Objective: To identify the redox imbalance in the blood of hypertensive.
Methods: Superoxide dismutase (SOD), catalase (CAT), glutathione peroxidase (GPx), glutathione (GSH), vitamin C, transferrin, ceruloplasmin,
malondialdehyde (MDA) and carbonyl group were quantified in the blood of 20 hypertensives and 21 controls. The individuals had a Body Mass
Index of ≥ 18.5 and ≤ 30 kg/m2, glycemia ≤ 100 mg/dL, serum cholesterol ≤ 200 mg/dL, and were nonsmokers, non-pregnant and non-lactating
women, non-users of alopurinol and probucol, with hypertensives on antihypertensive medication. All individuals underwent a preparatory
period of 4 weeks without alcohol, vitamin supplements, dexamethasone and paracetamol.
Results: Reduced levels of CAT (p 0.013), GSH (p 0.003) and MDA (p 0.014), and high levels of GPx (p 0.001) and ceruloplasmin (p 0.015)
were obtained in the hypertensive group compared with controls. A positive correlation between systolic pressure and MDA in hypertensive
and diastolic pressure and CAT in controls was obtained.
Conclusion: The data obtained suggest that the hypertensives were in redox imbalance, despite the possibly attenuating effect of their
antihypertensive medication. (Arq Bras Cardiol 2011; 97(2) : 141-147)
Keywords: Hypertension; biological markers; antioxidants; oxidative stress; enzymes.
Full texts in English - http://www.arquivosonline.com.br
Correspondência: Sandra Mary Lima Vasconcelos •
Av. Dr. Hamilton Falcão, 379 – Cond. Chácaras da Lagoa, quadra F, lote 13 - Santa Amélia - 57063-250 – Maceió, AL, Brasil
E-mail: [email protected]
Artigo recebido Artigo recebido em 10/06/10; revisado recebido em 14/12/10; aceito em 08/02/11.
141
Vasconcelos e cols.
Desequilíbrio em reações de redução e oxidação no sangue de hipertensos
Artigo Original
Introdução
A hipertensão vem sendo objeto de muitos estudos, em razão
da alta prevalência e de grande impacto na morbimortalidade:
levantamentos populacionais realizados em várias cidades
brasileiras indicam sua prevalência em 22,3% a 43,9%1.
Dentre os fatores associados ao desenvolvimento da
hipertensão, uma questão extremamente importante,
complexa e atual é a participação de espécies reativas
de oxigênio (ERO) e de espécies reativas de nitrogênio
(ERN) em sua patogênese. Dessa forma, a hipótese
oxidativa de hipertensão se baseia no fato de que o
endotélio vascular, o órgão central para a hipertensão, é
o local onde ocorrem numerosos processos de redução e
oxidação, especialmente por meio das enzimas NAD(P)H
oxidase, xantina oxidase (XO) e da óxido nítrico sintase
endotelial (eNOS), que agem aumentando a produção de
ânion radical superóxido (O2•—), mas também por meio
de forças mecânicas que estimulam a produção de O2•—.
A produção excessiva de O2•— favorece a reação com o
óxido nítrico ( •NO) e forma o peroxinitrito (ONOO—),
um intermediário reativo particularmente perigoso, uma
vez que é capaz de formar o radical hidroxila ( •OH),
independentemente da presença de metais de transição.
Dentre outros fenômenos associados, o desvio do •NO
de sua função vasodilatadora promove o crescimento
de células endoteliais e da vasoconstrição2-13. O estresse
oxidativo pode ser determinado por meio de biomarcadores
do equilíbrio de reações de oxidação e redução, que são
quantificáveis em fluidos biológicos14.
O principal objetivo deste estudo foi quantificar alguns
antioxidantes e marcadores de dano oxidativo no sangue de
um grupo de hipertensos e controles.
Métodos
Seleção dos participantes do estudo
Os indivíduos incluídos no estudo eram residentes do
município de Flexeiras, Alagoas (AL), Brasil, um município
de pequeno porte, com área de 316 quilômetros quadrados,
com uma população de 11.881 habitantes, localizado na
região da Zona da Mata do Estado de Alagoas, no Nordeste
do Brasil, a 60 quilômetros de distância da capital do
Estado, Maceió. A principal receita de Flexeiras advém da
monocultura da cana-de-açúcar, de acordo com o IBGE
(http://www.ibge.org.br).
Indivíduos
Os participantes deste estudo foram selecionados de uma
amostra de 433 dos 803 hipertensos cadastrados pelas equipes
de saúde da família do município de Flexeiras em 2005.
Representavam 53,92% dos hipertensos com seguimento pela
saúde pública local. Os 433 hipertensos foram avaliados de
janeiro a junho de 2005, com base em dados antropométricos
(peso, altura, circunferência da cintura), dados clínicos
(níveis de pressão arterial, diagnóstico de diabete, uso de
medicamentos), dados bioquímicos (glicemia em jejum,
colesterol total e triglicerídeos, após 12 horas de jejum), e
estilo de vida (fumo, sedentarismo). Os critérios de inclusão
foram: (1) pacientes com hipertensão1; (2) 40 a 60 anos; (3)
não obesos, com Índice de Massa Corporal(IMC) ≤ 30 kg/m2
e ≥ 18,5 kg/m2; (4) com glicemia em jejum ≤ 100 mg/dL e
colesterol sérico ≤ 200 mg/dL; (5) mulheres não menopáusicas,
não grávidas, não lactantes e não usuárias de contraceptivos.
Pacientes com diagnóstico de diabete melito, glicemia em
jejum > 100 mg/dL, colesterol > 200 mg/dL, usuários de
alopurinol e probucol e fumantes foram excluídos.
Sessenta e três indivíduos não hipertensos (grupo controle),
voluntários, também moradores de Flexeiras, assinaram o
formulário de consentimento livre e esclarecido e foram
submetidos aos mesmos critérios de seleção.
Os protocolos aderiram aos princípios da Declaração de
Helsinki e os pacientes que estavam em conformidade com
os critérios de seleção foram incluídos após leitura e assinatura
dos formulários de consentimento livre e esclarecido aprovado
pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal
de Alagoas (UFAL), em processo nº 009991/2004-79, de 20
de novembro de 2005.
Dados socioeconômicos
Além das informações citadas, houve levantamento dos
indivíduos com relação à classe social, com base nos Critérios
de Classificação Econômica Brasil (CCEB) da Associação
Brasileira de Empresas de Pesquisa de Mercado (ABEP), renda
per capita e nível de escolaridade.
Preparação para a coleta sanguínea
Os indivíduos selecionados foram orientados a interromper
o uso de medicação interferente, como suplementos
vitamínicos e minerais, paracetamol, dexametasona e bebidas
alcoólicas quatro semanas antes da coleta do sangue. Durante
esse período, os indivíduos foram contatados sistematicamente
por meio de visitas domiciliares e telefonemas para garantir
que a fase preparatória estava sendo seguida.
Amostras sanguíneas e procedimentos analíticos
Após 12 horas de jejum, as amostras sanguíneas foram
coletadas e depositadas em tubos de coleta a vácuo em três
frações do sangue total: (1) de 10 mL em heparina para análise
das enzimas antioxidantes: superóxido dismutase (SOD),
glutationa peroxidase (GPx) e catalase (CAT), glutationa (GSH),
todos eles em eritrócitos e carbonila em plasma; (2) 5 mL em
EDTA para o hemograma, e (3) 5 mL, sem anticoagulante para
as leituras de ácido úrico, ceruloplasmina (CER), transferrina,
malondialdeído (MDA) e vitamina C no soro. Todo o sangue
foi centrifugado a 3.000 rpm por 5 min. Uma fração de
500 mL de soro foi armazenada em triplicata, a uma temperatura de
-20˚C, enquanto uma fração de 500 mL de soro, uma fração de
200 mL de plasma e quatro frações de 500 mL de plasma foram
armazenadas em triplicata a uma temperatura de -80˚C.
A atividade da SOD, CAT e GPx foi determinada,
respectivamente, de acordo com o kit de enzimas RANDOXRansod, método de Aebi e método de Paglia e Valentine. GSH
foi determinada de acordo com o método de Akerboom e Sies,
carbonila de acordo com o método de Levine, e MDA e vitamina C
Arq Bras Cardiol 2011; 97(2) : 141-147
142
Vasconcelos e cols.
Desequilíbrio em reações de redução e oxidação no sangue de hipertensos
Artigo Original
por HPLC-UV, conforme método de Katepe. A CER e a transferrina
foram analisadas com o kit de teste quantitativo Spinreact. Todos
os métodos utilizados foram descritos por Vasconcelos e col14.
(Tabela 2). Nesse grupo, 30% eram usuários de diuréticos, 25%
utilizavam um inibidor de Enzima Conversora de Angiotensina
(ACE) e 30% utilizavam uma associação de duas medicações.
Análise estatística
Antioxidantes e biomarcadores de dano oxidativo
A análise estatística envolveu inicialmente a aplicação do
teste de Kolmogorov-Smirnov para verificar a distribuição
Gaussiana. Para comparar os grupos, o teste t de Student, o
teste do Qui-quadrado (χ2) de Pearson e o teste de Fischer
foram utilizados ​​para as variáveis ​​com distribuição normal,
e o teste de Mann-Whitney e Spearman para as variáveis​​
com distribuição assimétrica. Em todos os testes, adotou-se
p < 0,05 como estatisticamente significativo.
Os indivíduos hipertensos apresentaram níveis diminuídos
de SOD, CAT, GSH, transferrina e MDA no sangue e níveis
elevados de GPx, ascorbato, CER e carbonila no sangue, quando
comparados aos controles. No entanto, apenas os níveis de
CAT, GSH e MDA no sangue (diminuídos) e de GPx e CER
(aumentados) apresentaram diferenças significativas (Tabela 3).
Resultados
Os testes de correlação de Pearson e Spearman revelaram
uma correlação positiva entre PAS e MDA (r = 0,44 e
p = 0,04) nos hipertensos, e entre PAD e CAT
(r = 0,54 e p = 0,01) nos controles. Dentre os biomarcadores,
uma correlação negativa foi verificada entre MDA e GPx nos
dois grupos (r = -0,63 e p = 0,003 nos hipertensos e r = -0,63
e p = 0,004 nos controles).
Características gerais da população estudada
Dos 433 hipertensos, 24 (5,5%) estavam em conformidade
com os critérios de seleção e 20 (4,6%) concluíram o protocolo.
No que tange ao grupo de controle, dos 63 voluntários
estudados, 21 (33,33%) estavam em conformidade com os
critérios de seleção e concluíram o protocolo. Portanto, o
estudo foi conduzido com 20 hipertensos e 21 controles, cujas
características demográficas, socioeconômicas, antropométricas
e bioquímicas foram relacionadas na tabela 1.
Tratamento com medicação anti-hipertensiva
Os hipertensos eram submetidos à terapia anti-hipertensiva
e eram usuários regulares de medicação anti-hipertensiva
Tabela 1 - Características gerais dos indivíduos dos controles e
hipertensos
Variáveis
Idade, y†
Indivíduos
hipertensos
(n = 20)
Controles
(n = 21)
Valor de
p
49,95 ± 6,99
45,85 ± 6,31
NS
Sexo, M/F‡
14/6
15/6
NS
IMC, kg/m2†
26 ± 2,45
26 ± 2,94
NS
Cintura, cm†
90,16 ± 8,02
93,25 ± 7,54
NS
PAS, mmHg†
139,28 ± 11,41
113,33 ± 12,30
< 0,0001*
PAD, mmHg†
95 ± 9,40
73,33 ± 8,87
< 0,0001*
86 ± 10,14
81 ± 10,55
NS
170,85 ± 13,20
151,01 ± 23,66
NS
Classe social, C/D/E
8/10/2
8/8/3
NS
Escolaridade, 0/1/2§//
9/6/5
8/5/7
NS
234,76 ± 182,34
354,73 ± 207,12
NS
Fumantes
0
0
-
Menopausa
0
0
-
Glicose basal, mg/dL
†
Colesterol total, mg/dL†
§//
Renda per capita,
US$ †¶
*Os Valores de P denotam diferenças entre hipertensos e o controle, † teste t
de Student; ‡ Teste X2 de Pearson; § teste exato de Fischer; // Critérios CCEB;
¶ 10 de novembro de 2006; NS - Não significativo.
143
Arq Bras Cardiol 2011; 97(2) : 141-147
Correlação entre níveis pressóricos e biomarcadores de
dano oxidativo
Discussão
Um estudo epidemiológico constatou uma associação positiva
entre o estresse oxidativo aumentado e a redução do status
antioxidante com fatores de risco cardiovascular na população
em geral15,16. Estudos experimentais e clínicos demonstraram
um aumento na produção de espécies reativas em pacientes
com hipertensão essencial17-36, alguns dos quais apresentados
na Tabela 4. Há uma elevada produção de O2•— na hipertensão,
que levaria à formação de ONOO— (por reação de O2•— com
•
NO), o que ocorre com uma constante de velocidade de
6,7 x 109 de mol L-1 s-1 16, enquanto a reação de dismutação de
O2•— por SOD ocorre em velocidade 3 vezes mais lenta: 1,6 x 109
mol L-1 s-1 4. Além disso, a atividade do SOD é favorecida quando
a concentração de O2•—é baixa e a de SOD é alta, o que ocorre
apenas em condições fisiológicas3. Esses aspectos explicariam, em
Tabela 2 - Tratamento com medicações anti-hipertensivas
Tratamento com
medicação
anti-hipertensiva
Diurético
Inibidor de ACE‡
Diurético + inibidor
de ACE
Diurético+
inibidor de ACE +
betabloqueador
Nenhum
medicamento
Total de pacientes
Uso de medicação e
dosagem (mg)
Pacientes
(n, %)
HCT†, 25 mg
6 (30%)
Captopril 25 mg
3 (15%)
Captopril 50 mg
2 (10%)
HCT 25 mg + Captopril 25 mg
4 (20%)
HCT 50 mg + Captopril 50 mg
2 (10%)
HCT 25 mg + Captopril 25 mg
+ Atenolol 40 mg
1 (5%)
2 (10%)
20 (100%)
† HCT Hidroclorotiazida; ‡ ACE - Enzima Conversora da Angiotensina.
Vasconcelos e cols.
Desequilíbrio em reações de redução e oxidação no sangue de hipertensos
Artigo Original
Tabela 3 - Antioxidantes e biomarcadores de estresse oxidativo na população do estudo
Grupos de
biomarcadores
População do estudo e valores obtidos
(média ± DP e mediana)
Hipertensos (H) (n = 20)
Controles (C) (n = 21)
1.498,85 ± 575,04
1.470,00
68,00 ± 32,83
67,24
20,51± 9,42
21,51
1.649 ± 407,43
1.722,00
102,08 ± 49,36
102,48
7,77 ± 9,60
2,00
5,33 ± 2,87
4,80
4,08 ± 1,33
3,80
40,53 ± 12,93
37,63
8,96 ± 5,19
7,00
3,49 ± 0,83
3,60
34,58 ± 9,55
32,00
189,60 ± 32,96
188,00
38,60 ± 8,61
37,00
194,14 ± 38,42
189,00
33,86 ± 3,97
33,00
2,80 ± 4,49
1,42
2,13 ± 1,66
1,71
8,51 ± 6,83
8,81
1,91 ± 1,42
1,67
Valor de
p
Enzimas antioxidantes
SOD (U/gHb) †
CAT (KU/gHb) †
GPx (U/gHb) ‡
NS
0,013*
0,0001*
Antioxidante de baixa massa molecular
GSH (mM) ‡
Ácido úrico (mg/dL) ‡
Ascorbato (mmol/L) †
0,003*
NS
NS
Proteínas de transporte Fe+2/+2 Cu+/+2
Transferrina (mg/dL) †
Ceruloplasmina (mg dL) ‡
NS
0,015*
Biomarcadores de dano oxidativo
Malondialdeído (mmol/L) ‡
Carbonila (nmol/gPtna) ‡
0,014*
NS
*Os Valores de P denotam diferenças entre hipertensos e o controle, † teste t de Student; ‡ teste de Mann-Whitney. NS - Não significativo.
parte, os fenômenos pró-oxidantes da hipertensão3,4,16. Além do
mais, a atividade dos sistemas antioxidantes seria reduzida, o que
também favoreceria o estresse oxidativo presente na hipertensão.
Estudos clínicos demonstraram uma atividade de enzimas
antioxidantes diminuída entre hipertensos quando comparada
aos controles17,18, mas ainda não está claro se essa é uma causa
ou uma consequência da hipertensão. O estresse oxidativo em
um processo crônico como a hipertensão poderia consumir as
reservas e prejudicar a atividade de enzimas antioxidantes.
Em vista do que discutimos anteriormente, é possível prever
níveis altos de dano oxidativo e níveis baixos de antioxidantes
em hipertensos. No entanto, no presente estudo, o grupo
de hipertensos apresentou níveis mais baixos apenas dos
antioxidantes CAT e GSH, níveis mais altos de GPx e CER, e
níveis mais baixos do marcador de dano oxidativo, MDA, em
comparação com o grupo de controle (Tabela 3). De fato, no que
concerne às enzimas antioxidantes, os estudos de hipertensos
constataram níveis baixos de SOD, CAT e GPx17-19 (Tabela 3), de
maneira semelhante a este estudo, à exceção da GPx, que se
constatou surpreendentemente alta muito embora semelhante
ao observado por Ide e cols.20.
A catalase pode ser inibida na presença de O2•—removido
inadequadamente, gerando ferroxicatalase, que não decompõe
H2O2 rapidamente10. Isso explicaria não só os níveis de CAT
baixos, mas também os níveis de GPx altos, possivelmente
indicando uma maior demanda por essa enzima, uma vez que
é capaz de reduzir ONOO— de maneira eficiente, impedindo,
assim, a oxidação de cadeias macromoleculares e a nitração de
proteínas10. Além disso, embora não tenham sido constatadas
diferenças significativas na SOD, é possível considerar que os
níveis reduzidos dessa enzima eram provavelmente devidos
à reação de O2•— e •NO, que é mais rápida do que a reação
de O2•— e SOD, além do fato de que ela age de maneira mais
eficiente em condições fisiológicas (baixa concentração de
O2•—). Retornando à CAT, pode-se considerar que, com O2
•—
“desviado” para formar ONOO—, a produção de H2O2
por meio da SOD é menor ou permanece em níveis normais,
não exigindo uma atividade adicional. Além disso, conforme
mencionado anteriormente, essa enzima pode ser inibida na
presença de O2•— acumulado e sua ação ação é delimitada no
peroxissoma das células.
Com relação à terapia farmacológica, as medicações
anti-hipertensivas que agiam como antioxidantes eram: (1)
inibidores de ACE e bloqueadores de receptores de AT1,
que agem indiretamente pela inibição do sistema reninaangiotensina-aldosterona (SRAA), uma importante fonte de
ERO no endotélio3,4,7,8,11; (2) betabloqueadores de terceira
geração, por meio do aumento da liberação de •NO e
glutationa na célula endotelial21; e (3) bloqueadores dos canais
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144
Vasconcelos e cols.
Desequilíbrio em reações de redução e oxidação no sangue de hipertensos
Artigo Original
Tabela 4 - Estudos de biomarcadores de estresse oxidativo na hipertensão
Estudos/
Referências
19
34
n
H = 30
C = 164
H = 30
C = 30
18
H = 66
C = 16
34
H = 38
C1 = 21
C2 = 17
24
H = 89
23
17
37
H1 = 70
H2 = 85
C = 40
H e C,
não se refere a n
H + ICC = 23
C = 50
Biomarcadores
estudados
Resultados obtidos
H vs. Ca e Hb
SOD e GPx
SOD e GPx diminuídosa
F2-ISO
Indiferentea
GSH, GSSG, GSH/GSSG
SOD, CAT, GPx, MDA,
8-OxoGUA
GSH
SOD, CAT, GPx, GST
Nitrato/Nitrito
Carbonila e MDA
GSH, GSSG,GSH/GSSG
SOD e MDA
F2ISO
Vitamina C e E, Ácido úrico
GST, GPx. Asc., tióis
FRAP (­Fe 3+)
SOD e CAT
MDA
GSH/GSSG e MDA aumentadosa
SOD, CAT, GPx e GSH diminuídosa
Carbonila e MDA augmentedosa
SOD diminuídoa
CAT e GPx semelhantesa
AO aumentado e MDA bdiminuído
F2ISO diminuído em H tratado (H2)a
GST, GPx, Asc., Tióis e FRAP diminuídosa
SOD e CAT aumentadosa
MDAdiminuídoa
20
H = 39
FRAP
FRAP aumentado H diuréticob
36
H = 83
C = 50
F2ISO
CRP e TNFα
F2ISO aumentadoa
CRP e TNFα aumentadosa
H - Hipertenso; C - Controle; SOD - superóxido dismutase; GPx - glutationa peroxidase; F2ISO-F2 - Isoprostano; GSH – forma reduzida da glutationa; GSSG - forma
oxidada da glutationa; MDA - malondialdeído; CAT - catalase; 8-OxoGUA - 8-oxoguanina; GST - glutationa S-transferase; AO - antioxidante; Asc - Ascorbato; FRAP –
Capacidade redutora de ferro férrico; ICC - insuficiência cardíaca congestiva; CRP - Proteína C reativa; TNFα - Fator alfa de necrose tumoral.
de cálcio, com o aumento da disponibilidade de óxido nítrico
na célula endotelial e aumento da expressão de MnSOD nas
células musculares lisas vasculares22.
No grupo de hipertensos, o uso de um inibidor de ECA
(captopril) em 60% dos pacientes (40% com 25 mg/dia e 20%
com 50 mg/dia) exige comentários adicionais. O mecanismo
antioxidante dessa medicação, embora indireto e sem uma relação
dose-resposta definida, envolve a inibição do SRAA por meio da
inibição da ação da angiotensina II (ANG II), que corresponde
a sua ação antioxidante. ANG II é um potente estímulo para a
produção de ERO na célula endotelial, aumentando a atividade de
NAD(P)H oxidase. Além disso a ANGII supra-regula a atividav de
da eNOS, a qual se acompanha de desacoplamento e redução na
produção de •NO e aumento na produção de superóxido10. Esse
efeito foi verificado em um estudo que encontrou uma associação
inversa entre o F2-isoprostano e o número e tipo de medicação
anti-hipertensiva [na qual 46% correspondia ao inibidor de ECA
tratado e 26%, a um bloqueador de receptor de angiotensina-1
(AT1)]23. Além disso, a ação antioxidante de betabloqueadores e
antagonistas de receptores de AT1 também foi relatada em um
estudo de hipertensos tratados com esses medicamentos, cujos
níveis de SOD, CAT e GPx aumentaram e os níveis de 8-oxo-2’desoxiguanosina e MDA reduziram24. Em contraste, um outro
estudo25 constatou uma capacidade antioxidante aumentada no
plasma de hipertensos em uso de diuréticos tiazídicos, mas não
constatou a mesma correlação positiva com o inibidor de ECA e
betabloqueador, a despeito de sua ação antioxidante.
A correlação positiva evidenciada entre PAS e MDA em
hipertensos é indicativa da associação entre a HAS e o estresse
oxidativo, especialmente após a relação negativa obtida entre
MDA e GPx nos dois grupos.
145
Arq Bras Cardiol 2011; 97(2) : 141-147
Como a glutationa age em conjunto com a GPx, os resultados
foram analisados ​​em conjunto, considerando que ambas são
fundamentais na defesa contra a peroxidação lipídica, provocada
por ONOO—. Cada unidade de GPx age por meio do consumo
de duas moléculas de GSH, que é o antioxidante intracelular
mais importante e está presente na célula predominantemente na
forma reduzida (GSH), em detrimento da forma oxidada (GSSG).
A razão GSH/GSSG > 1, que é vital para a célula, é mantida por
um sistema de reciclagem eficiente de GSH a partir de GSSG10.
Na hipertensão, foram encontrados baixos níveis de GSH e a
razão de GSH/GSSG <118. Neste estudo, a GSSG não foi medida.
Nossos resultados de níveis baixos de GSH são coerentes com a
literatura e seriam explicados pelo estresse oxidativo, uma vez que
a ERO oxida a GSH em GSSG, levando a uma queda na GSH, o
que é agravado pela conversão da GSH em GSSG no processo
de desintoxicação do peróxido, pela ação da GPx.
Com relação ao ácido úrico e à vitamina C, os níveis mais
elevados observados no grupo de hipertensos não foram
estatisticamente diferentes, embora se saiba que a hiperuricemia
está associada com a hipertensão28 e a atividade antioxidante
do urato envolve diferentes reações (com R•, ROO•, ONOO—,
e ONO2•)10,14 agindo de forma cíclica, uma vez que pode
ser recuperado pelo ascorbato, dentre outros. Ademais, é
considerado um antioxidante plasmático potente, uma vez que
sua concentração no plasma é dez vezes maior do que outros
antioxidantes, como as vitaminas E e C13.
Os níveis de transferrina foram semelhantes nos dois
grupos, mas os níveis de ceruloplasmina, que também é uma
ferroxidase, foram maiores no grupo de hipertensos (Tabela 3).
Essa constatação também representa um importante fator de
proteção, em vista da atividade da ceruloplasmina no transporte
Vasconcelos e cols.
Desequilíbrio em reações de redução e oxidação no sangue de hipertensos
Artigo Original
de cobre e ferro de oxidação para captura por meio da
transferrina, ou seja, ela age sobre os metais de transição mais
importantes com relação à capacidade de transferir elétrons
em sua forma livre nos sistemas biológicos. Outros mecanismos
antioxidantes incluem o sequestro de O2•— e H2O2, a inibição
da reação de Fenton, protegendo os tecidos biológicos dos
efeitos danosos da descompartimentalização do ferro, a inibição
da oxidação lipídica e o bloqueio de proteínas e os danos ao
DNA, sendo verificados por meio da inibição da formação de
carbonila e proteção da célula contra danos e a dissolução
causada pela ERO11,27. No entanto, em situações de estresse
oxidativo, a ceruloplasmina pode agir como um pró-oxidante
no meio intravascular, uma vez que ONOO— e H2O2 podem
induzir a dissociação da ligação de Cu2+ livre da proteína,
favorecendo sua liberação no meio intracelular, assim como
diminuindo sua atividade ferroxidase27. De fato, diversos
estudos constataram uma correlação entre a ceruloplasmina e
a doença cardiovascular, e alguns estudos prospectivos e casos
de controle indicaram que ela constitui em um fator de risco
cardiovascular28, o que corresponde a um biomarcador cuja
atividade pró-oxidante parece predominar em determinadas
circunstâncias, incluindo na doença cardiovascular.
Foi observada uma diminuição no fenômeno da
peroxidação lipídica (LP) entre os hipertensos, já que a
presença do MDA (o aldeído reativo mais abundante de PL)
no soro desses indivíduos era menor do que no soro dos
controles (Tabela 3). A presença de grupos carbonila em níveis
semelhantes, nesse caso, pode reforçar a premissa de que
se o grupo de hipertensos estivesse em estresse oxidativo, o
ONOO— seria a espécie reativa prevalecente, uma vez que
ele é um indutor fraco de proteínas carbonila37. Cabe ressaltar
que, na escolha do marcador do estresse oxidativo, a natureza
do estresse oxidativo em estudo desempenha uma função de
extrema importância. No entanto, a metodologia disponível e
a viabilidade da aplicação de técnicas analíticas são de igual
importância, e foram particularmente determinantes nas
escolhas deste estudo.
Diversos estudos constataram uma correlação positiva
entre níveis elevados de MDA e as doenças cardiovasculares,
como o infarto agudo do miocárdio, a insuficiência cardíaca
congestiva e a hipertensão29-31 em hipertensos sem terapia
farmacológica18 e em hipertensos idosos utilizando medicação
anti-hipertensiva 32 . Por sua vez, estudos envolvendo
hipertensos que nunca foram tratados 33 e hipertensos
tratados23,34 não constataram diferenças entre hipertensos e
controles nos níveis de F2-isoprostano, um outro marcador
de peroxidação lipídica, a despeito da ação antioxidante dos
medicamentos anti-hipertensivos. No entanto, outro estudo
encontrou uma correlação positiva entre esse marcador de
dano e marcadores de inflamação em hipertensos ainda
não submetidos à terapia farmacológica35. Os pacientes
com insuficiência cardíaca congestiva de classe II a classe IV
mostraram níveis diminuídos de MDA36. Os resultados indicam
a possível associação entre mecanismos de proteína de LP, tais
como GPx e CER, que foram encontrados em níveis elevados.
É importante ressaltar que, na população do estudo, um
viés existente era o uso de medicação. Entretanto, a terapia
farmacológica anti-hipertensiva (em especial medicações
bloqueadoras de canais de cálcio e inibidores da ECA) produz
um aumento significativo do •NO, mas os níveis de enzimas
antioxidantes permanecem baixos quando comparados a
normotensos17. Outro aspecto significativo é a possibilidade de
o CER de inibir a oxidação de proteínas, o que foi verificado
em uma cultura de células endoteliais, por meio da formação
de carbonila na presença de ceruloplasmina38.
O fenômeno do estresse oxidativo, bem como o sistema
antioxidante funcionam de forma integrada, com uma série
de eventos relacionados. Essa característica e a complexidade
desses processos necessariamente exigem uma discussão não
individualizada. Além disso, é preciso ter em mente a dualidade
do ambiente de reações de oxidação e redução: níveis elevados
de antioxidantes não são necessariamente desejáveis, e níveis
baixos de antioxidantes, indesejáveis, uma vez que os dois
podem resultar em estresse oxidativo.
Embora não seja claro se o estresse oxidativo na hipertensão
é uma causa ou um efeito, a ocorrência de estresse oxidativo
na hipertensão foi verificada neste estudo, corroborando as
constatações publicadas anteriormente.
A função do estresse oxidativo na hipertensão já está clara
e bem fundamentada. No entanto, embora vários estudos
apontem para a disfunção endotelial e para o desequilíbrio
entre as espécies reativas de oxigênio e nitrogênio e para as
defesas antioxidantes, não é possível definir se o desequilíbrio
em reações de redução e oxidação é uma causa ou uma
consequência da homeostase da pressão arterial. Este estudo
revelou estresse oxidativo na hipertensão. Não obstante, são
necessários estudos adicionais para elucidar os mecanismos que
levam a sua gênese e de outras situações clínicas caracterizadas
por disfunção endotelial envolvendo desequilíbrio em reações
de redução e oxidação. Desse modo, nosso grupo de pesquisa
está atualmente desenvolvendo estudos sobre os biomarcadores
do desequilíbrio em reações de redução e oxidação em
pacientes com síndrome metabólica, hipertensão refratária
e diabete melito que, como a hipertensão, são doenças cujo
denominador comum é a disfunção endotelial.
Conclusão
Por fim, pode-se concluir que, com relação a antioxidantes
e marcadores de dano oxidativo, os níveis de CAT e GSH
diminuídos e os níveis elevados de ceruloplasmina encontrados
em pacientes hipertensos indicam que eles se encontram em
estresse oxidativo, a despeito do possível efeito atenuante de
sua medicação anti-hipertensiva. Níveis altos de GPx e MDA
também podem advir do estresse oxidativo, uma vez que (1)
a enzima estaria sujeita a uma maior demanda na presença
de ONOO¯ em excesso, uma espécie reativa característica da
hipertensão, e (2) devido à sua ação significativa no ROO—,
haveria uma diminuição na na peroxidação lipídica, com a
consequente redução de MDA. Assim, o estresse oxidativo da
hipertensão, no que concerne a esses biomarcadores, seria
explicado por um mecanismo alternativo.
Agradecimentos
Os autores agradecem aos pacientes e voluntários que
participaram deste estudo de maneira tão prestimosa.
Potencial Conflito de Interesses
Declaro não haver conflito de interesses pertinentes.
Arq Bras Cardiol 2011; 97(2) : 141-147
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Vasconcelos e cols.
Desequilíbrio em reações de redução e oxidação no sangue de hipertensos
Artigo Original
Fontes de Financiamento
O presente estudo foi financiado pela FAPEAL, CNPq,
CAPES, CAPES/COFECUB, CNPq/PADCT, BNB e FAPEAL/
SESAU-AL, MS/DECIT-PPSUS.
Vinculação Acadêmica
Este artigo é parte de tese de Doutorado de Sandra Mary Lima
Vasconcelos pela Universidade Federal de Alagoas com análise de
biomarcadores redox em parceria com a Universidade Federal
do Rio Grande do Sul.
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Registro MS nº 1.0525.0043
1-6
ROSUCOR (rosuvastatina cálcica). Registro MS nº 1.0525.0043 USO ADULTO. Composição, Forma farmacêutica e Apresentações: Rosucor 10 mg: cada comprimido contém 10 mg de rosuvastatina; embalagem com 10 ou 30
comprimidos revestidos e sulcados.Rosucor 20 mg: cada comprimido contém 20 mg de rosuvastatina; embalagem com 30 comprimidos revestidos.Indicações: pacientes com hipercolesterolemia primária,dislipidemia combinada (mista)
e hipertrigliceridemia isolada (incluindo os tipos IIa,IIb e IV de Fredrickson; e a hipercolesterolemia familiar heterozigótica) como adjuvante à dieta,quando a resposta à dieta e aos exercícios é inadequada.Reduz o LDL-colesterol,o colesterol
total e os triglicérides elevados e aumenta o HDL-colesterol, capacitando assim a maioria dos pacientes a atingir as diretrizes relevantes de tratamento.Também diminui a ApoB, o não-HDL-C, o VLDL-C e o VLDL-TG, reduz as relações de
LDL-C/HDL-C, C-total/HDL-C, não HDL-C/HDL-C e ApoB/ApoA-I e aumenta a ApoA-I.Também é indicado a pacientes com hipercolesterolemia familiar homozigótica, tanto isoladamente quanto como adjuvante à dieta e a outros tratamentos
de redução de lipídios (por exemplo, aférese de LDL). Contraindicações: hipersensibilidade à rosuvastatina cálcica ou aos demais componentes da fórmula. Pacientes com doença hepática ativa. Na gravidez e lactação e em mulheres
com potencial para engravidar que não estejam usando métodos contracepcionais apropriados.Precauções e advertências: usar com cautela em pacientes que consomem grandes quantidades de álcool,com história de doença hepática,
com mialgia e rabdomiólise, que estejam recebendo ciclosporina, genfibrozila, ácido nicotínico, antifúngicos (do grupo azóis) e macrolídeos, em pacientes com insuficiência renal, hipotiroidismo e em idosos. Gravidez: não deve ser
administrado durante a gravidez,ou em mulheres em idade fértil,a menos que sejam utilizados métodos contraceptivos adequados.Interações medicamentosas: antagonistas da vitamina K,ciclosporina,genfibrozila e antiácidos.Reações
Adversas: geralmente é bem tolerado e as reações geralmente são leves e transitórias. As mais comuns são: cefaléia, mialgia, astenia, constipação, vertigem, náuseas e dor abdominal. Posologia: deve ser administrado 1 vez ao dia,
independentemente da hora das refeições, sempre no mesmo horário. Não pode ser mastigado. Os comprimidos de 10 mg são sulcados e podem ser divididos ao meio. A faixa de dose recomendada é de 10 a 40 mg/dia. Uma dose de 5
mg pode ser administrada para pacientes que necessitam de uma diminuição de dose. Hipercolesterolemia primária, dislipidemia combinada e hipertrigliceridemia isolada: dose usual de 10 mg/dia; nos casos graves deve-se considerar
uma dose inicial de 20 mg.Hipercolesterolemia familiar homozigótica:dose inicial de 20 mg.Crianças:a eficácia e segurança não foram estabelecidas.Idosos:doses habituais.Insuficência renal:doses habituais nos casos leves a moderados;
nos casos graves a dose é de 5 mg/dia, não devendo ser maior que 10 mg/dia. Insuficiência hepática: doses habituais para os casos leves a moderados; nos casos graves a dose é de 5 mg/dia; doses superiores a 10 mg/dia devem ser
cuidadosamente consideradas. Raça: em pacientes asiáticos iniciar com 5 mg/dia. Terapia concomitante: apresentou eficácia adicional em associação com fenofibrato e niacina; também pode ser associado com sequestrantes de ácidos
biliares. (Mai/10) - VENDA SOB PRESCRIÇÃO MÉDICA.“AO PERSISTIREM OS SINTOMAS, O MÉDICO DEVERÁ SER CONSULTADO”.
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over 52 weeks of treatment in patients with hypercholesterolaemia. Am Heart J 2002; 144: 1044-51.
Contraindicações: hipersensibilidade à rosuvastatina cálcica ou aos demais componentes da fórmula, pacientes com doença hepática ativa, gravidez e lactação. Interações medicamentosas:
antagonistas da vitamina K, ciclosporina, genfibrozila e antiácidos.
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Artigo Original
Comparação e Correlação entre Automedida, Medida Casual e
Monitorização Ambulatorial da Pressão Arterial
Comparison and Correlation between Self-measured Blood Pressure, Casual Blood Pressure Measurement
and Ambulatory Blood Pressure Monitoring
Weimar Kunz Sebba Barroso de Souza, Paulo César Brandão Veiga Jardim, Ludmila Brito Porto, Fabrício Alves
Araújo, Ana Luíza Lima Sousa, Cláudia Maria Salgado
Liga de Hipertensão Arterial, Faculdade de Medicina, Universidade Federal de Goiás, Goiânia, GO - Brasil
Resumo
Fundamento: A medida casual da pressão arterial (PA) pelos profissionais de saúde está sujeita a uma grande
variabilidade, sendo necessário buscar novos métodos que possam superar essa limitação.
Objetivo: Comparar e avaliar a correlação entre os níveis de PA obtidos por meio da automedida da pressão arterial
(AMPA) com a medida casual e com a monitorização ambulatorial da pressão arterial (MAPA).
Métodos: Avaliamos hipertensos que realizaram as três metodologias de medida da PA com intervalo menor que 30
dias; as médias das pressões foram utilizadas para comparação e correlação. Foram empregados os aparelhos: OMRON
705 CP (medida casual), OMRON HEM 714 (AMPA) e SPACELABS 9002 (MAPA).
Resultados: Foram avaliados 32 pacientes, 50,09% mulheres, idade média 59,7 (± 11,2) anos, média do IMC 26,04
(± 3,3) kg/m². Valores médios de pressão sistólica (PAS) e pressão diastólica (PAD) para a AMPA foram de 134 (± 15,71)
mmHg e 79,32 (± 12,38) mmHg. Na medida casual as médias da PAS e PAD foram, respectivamente, 140,84 (± 16,15)
mmHg e 85 (± 9,68) mmHg. Os valores médios da MAPA na vigília foram 130,47 (± 13,26) mmHg e 79,84 (± 9,82)
mmHg para PAS e PAD, respectivamente. Na análise comparativa, a AMPA apresentou valores semelhantes aos da MAPA
(p > 0,05) e diferentes da medida casual (p < 0,05). Na análise de correlação a AMPA foi superior à medida casual,
considerando a MAPA como o padrão de referência nas medidas tensionais.
Conclusão: A AMPA apresentou melhor comparação com a MAPA do que a medida casual e também se correlacionou
melhor com a aquela, especialmente para a pressão diastólica, devendo ser considerada uma alternativa com baixo
custo para o acompanhamento do paciente hipertenso. (Arq Bras Cardiol 2011; 97(2) : 148-155)
Palavras-chave: Hipertensão, pressão arterial, monitorização ambulatorial da pressão arterial, autocuidado.
Abstract
Background: Casual blood pressure (BP) measurement by healthcare professionals is subject to great variability and new methods are necessary
to overcome this limitation.
Objective: To compare and assess the correlation between the BP levels obtained by self-measured BP (SMBP), casual BP measurement and
ambulatory blood pressure monitoring (ABPM).
Methods: We assessed hypertensive individuals submitted to the three methods of BP measurement at an interval < 30 days; the BP means
were used for comparison and correlation. The following devices were used: OMRON 705 CP (casual measurement), OMRON HEM 714 (SMBP)
and SPACELABS 9002 (ABPM).
Results: A total of 32 patients were assessed, of which 50.09% were females, with a mean age of 59.7 (± 11.2), BMI mean of 26.04 (± 3.3)
kg/m². Mean systolic (SBP) and diastolic blood pressure (DBP) for SMBP were 134 (± 15.71) mmHg and 79.32 (± 12.38) mmHg. The casual
measurement means of SBP and DBP were, respectively, 140.84 (± 16.15) mmHg and 85 (± 9.68) mmHg. The mean values of ABPM during
the wakefulness period were 130.47 (± 13.26) mmHg and 79.84 (± 9.82) mmHg for SBP and DBP, respectively. At the comparative analysis,
the SMBP had similar results to those obtained at ABPM (p > 0.05) and different from the casual measurement (p < 0.05). At the analysis of
correlation, SMBP values were higher than the casual measurements, considering ABPM as the reference standard in BP measurements.
Conclusion: SMBP showed a better correlation with ABPM than the casual measurement and was also better correlated with the latter,
especially regarding the DBP and should be considered as a low-cost alternative for the follow-up of the hypertensive patient. (Arq Bras Cardiol
2011; 97(2) : 148-155)
Keywords: Hypertension; blood pressure; blood pressure monitoring, ambulatory, self-care.
Full texts in English - http://www.arquivosonline.com.br
Correspondência: Weimar Kunz Sebba Barroso de Souza •
Rua T-58, nº 315, sala 109, setor Bueno - 74223-130 - Goiânia, GO - Brasil
E-mail: [email protected], [email protected]
Artigo recebido em 03/12/10; revisado recebido em 08/12/10; aprovado em 11/04/11.
148
Souza e cols.
AMPA, medida casual e MAPA na hipertensão arterial
Artigo Original
Introdução
Métodos
A hipertensão arterial é um importante fator de risco para
doenças cardiovasculares e contribui direta e indiretamente
para a elevada morbimortalidade tanto em países desenvolvidos
quanto em países em desenvolvimento1,2. Nesse contexto, a
determinação precisa dos níveis pressóricos é fundamental
para a estratificação do risco e a definição da estratégia
terapêutica adequada, sendo importante buscar opções
para a grande variabilidade da pressão arterial na vigência de
fatores estressantes, por exemplo, durante uma consulta com
o profissional de saúde3,4.
O projeto de pesquisa número 144/07 foi avaliado e
aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa Médica Humana e
Animal do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da
Universidade Federal de Goiás (UFG). Os participantes foram
informados sobre os procedimentos do estudo e assinaram o
termo de consentimento livre e esclarecido.
A medida indireta da PA em consultório (medida casual)
é considerada o procedimento padrão para o diagnóstico
e seguimento de pacientes hipertensos com valor preditivo
para morbidade e mortalidade cardiovascular. Entretanto, se
comparada aos métodos de monitorização da PA, é inferior.
A explicação para esse fato está nas limitações da medida
casual que vão desde a influência do observador (vieses
de aferição, efeito do jaleco branco) até o ambiente onde
é realizada e do número reduzido de leituras com baixa
reprodutibilidade em longo prazo5-8.
O critérios de inclusão envolveu adultos de ambos os
sexos (maiores de 18 e menores de 70 anos), portadores
de hipertensão arterial sob tratamento medicamentoso, em
seguimento regular às consultas agendadas (o critério de adesão
foi o comparecimento a todas as consultas no ano anterior).
Os critérios de exclusão contemplaram impossibilidade ou
negação para assinar o termo de consentimento, participação
em outros protocolos de pesquisa, portadores de doenças
crônicas em estágios terminais, portadores de hipertensão
estágio III8 ou hipertensão resistente, obesidade (IMC > 30 kg/
m²), arritmia cardíaca, história de eventos cardiocirculatórios
nos últimos seis meses (infarto agudo do miocárdio, acidente
vascular cerebral, acidente isquêmico transitório), insuficiência
renal crônica, insuficiência cardíaca descompensada, diabete
descompensada, outras doenças que no julgamento do
investigador pudessem comprometer o estudo, hipertensão
secundária e terapia de reposição hormonal que não estivesse
em dose estável há pelo menos seis meses.
Dentre os métodos de monitorização, destaca-se a
monitorização ambulatorial da pressão arterial (MAPA)
como o padrão de referência, permitindo a avaliação da PA
durante as atividades habituais na vigília e durante o sono,
e, dessa maneira, possibilitando a realização de um maior
número de medidas, o conhecimento da variabilidade e do
descenso da PA durante o sono. A monitorização residencial
da pressão arterial (MRPA) é outro método reconhecido e
se caracteriza por contar com protocolos bem estabelecidos
(certo número de medidas da PA pela manhã e à noite), tendo
como vantagem a realização de um maior número de medidas
fora do ambiente do consultório e a boa aceitabilidade pelo
paciente9. Estudos indicam que as médias da pressão arterial
obtidas por MAPA e MRPA são menores do que as obtidas por
medida casual, têm maior acurácia no diagnóstico e melhor
predição de risco cardiovascular, porém são métodos caros e
pouco acessíveis aos nossos hipertensos10-12.
Discute - se ainda uma terceira metodologia de
monitorização, que é a automedida da pressão arterial
(AMPA), o objetivo deste estudo. Sobre esse método existem
poucas publicações até o momento. Sua característica é a
ausência de protocolos preestabelecidos, o próprio paciente
realiza as medidas em seu domicílio, de maneira aleatória, em
aparelhos digitais automáticos ou semiautomáticos validados.
Tem como vantagens o baixo custo, a facilidade de manuseio
e a possibilidade de evitar erros de leitura13,14. Justifica-se
assim a realização deste estudo para avaliar a PA obtida pela
AMPA, comparada à medida casual e MAPA, visto que esse
método poderá constituir num futuro próximo uma alternativa
de baixo custo e viável para a monitorização do hipertenso.
Objetivos
Comparar e correlacionar os níveis de pressão arterial
obtidos por meio de AMPA com a medida casual em
consultório e com a MAPA.
Trata-se de estudo prospectivo com amostra constituída
por pacientes em acompanhamento na Liga de Hipertensão
Arterial convidados a realizar a medida casual, MAPA e AMPA,
com intervalo menor que 30 dias entre os métodos (n = 32).
Os parâmetros antropométricos foram avaliados como
se segue:
Massa corporal - Indivíduos vestidos com roupas leves e
sem calçados, com utilização de balança eletrônica da marca
Toledo com precisão de 100 g.
Altura - Indivíduos descalços utilizando estadiômetro da
marca Filizola com precisão de um milímetro.
Índice de massa corpórea (IMC) - Mediante a fórmula
estabelecida por QUETELET (IMC = Peso em kg/Altura 2
em metro).
As metodologias empregadas na medida da pressão
arterial foram:
•
Medida casual em consultório - Realizada de acordo
com as técnicas recomendadas pelas VI DBHA, 20108.
A PA foi aferida com esfigmomanômetro automático
digital (OMRON 705 CP) com o paciente na posição
sentada, após 10 minutos de repouso, o braço apoiado
e na altura do precórdio. Foram realizadas duas
medidas no período matinal, sempre pelo mesmo
observador, com intervalo de dois minutos entre
elas,considerada a média para efeito de análise.
•
Automedida - Os pacientes receberam no início do
estudo um aparelho semiautomático HEM 714 da
marca OMRON para a automedida sistemática da
pressão arterial, sendo estabelecido que a medida
deveria ser feita no período matutino entre 8h e 10h,
ou no período vespertino entre 18h e 20h, durante,
Arq Bras Cardiol 2011; 97(2) : 148-155
149
Souza e cols.
AMPA, medida casual e MAPA na hipertensão arterial
Artigo Original
no mínimo, dois dias da semana. Medidas adicionais
puderam ser realizadas a critério dos pacientes,
mas não foram utilizadas para o cálculo da média.
O treinamento para o uso do aparelho de acordo
com as orientações da VI DBHA foi realizado pelos
autores deste protocolo. Para o cálculo da média
consideramos oito medidas consecutivas (um mês)
à consulta médica do paciente.
•
MAPA - Realizada com o Monitor Spacelabs 9002,
sendo padronizadas medidas a cada 15 minutos no
período de vigília, e a cada 20 minutos no período
de sono. Os dados foram considerados válidos
quando a monitorização aconteceu por um período
mínimo de 21h com um número mínimo de 16
medidas na vigília e oito medidas durante o sono.
O paciente foi orientado a fazer um diário e anotar,
no dia do exame, todas as atividades realizadas no
período e os horários de tomada de medicação9. Ao
retirar a MAPA, foi feita a impressão do relatório,
encaminhado para laudo médico. Esse foi arquivado
juntamente com o relatório impresso no prontuário
do paciente. Para o cálculo das médias das 24 horas,
foram consideradas todas as medidas obtidas; para o
cálculo das médias de vigília foram consideradas as
medidas realizadas no período das 7h às 23h, e para
o cálculo das médias de sono foram consideradas as
medidas obtidas das 23h às 7h.
Os dados foram armazenados e estruturados no programa
Excel Microsoft. A análise estatística foi realizada por meio
do software SPSS (Statistical Package of Social Science) para
Windows versão 15.0. O teste de Kolmogorov-Smirnov foi
utilizado para analisar se variáveis numéricas apresentavam
distribuição normal. O teste t para amostra pareadas foi
utilizado para comparar médias, variáveis numéricas, e a
correlação de Pearson, para avaliar a correlação entre a PA da
automedida com a MAPA e a medida casual de consultório.
Resultados
Foram avaliados 32 pacientes: 50,09% eram do sexo
feminino e a média de idade foi de 59,7 (± 11,2) anos. A
média do IMC foi de 26,04 (± 3,3) kg/m².
Os valores médios de pressão sistólica (PAS) e pressão
diastólica (PAD) encontrados pela automedida foram
de 134,00 (± 15,71) mmHg e 79,32 (± 12,38) mmHg,
respectivamente. Na medida casual, a média da PAS foi
140,84 (± 16,15) mmHg, e da PAD foi 85,00 (± 9,68)
mmHg. A média das medidas pela MAPA na vigília foi de
130,47(± 13,26) mmHg e 79,84 (± 9,82) mmHg para PAS
e PAD respectivamente (tab. 1 e 2).
Ao realizarmos a comparação entre as médias das pressões
encontramos diferenças significativas nas médias pressóricas
entre AMPA e medida casual, tanto para a PAS (p = 0,031)
quanto para a PAD (p = 0,003) (tab. 1). Mas na comparação da
AMPA com a MAPA na vigília não observamos diferença entre
as médias das PAS e PAD (p = 0,064 e p = 0,719) (tab. 2).
Encontramos correlação significativa entre a AMPA e a PA
casual tanto para PAS quanto para PAD (p < 0,017 e p <
0,000, respectivamente), assim como entre a AMPA e a MAPA
150
Arq Bras Cardiol 2011; 97(2) : 148-155
Tabela 1 - Comparação entre pressão arterial automedida versus
medida casual (n = 32)
Automedida
Consultório
p
PAS (mmHg)
134 ± 15,71
140,84 ± 16,15
0,031
PAD (mmHg)
79,32 ± 12,38
85 ± 9,68
0,003
Teste t de Student. Valores expressos em média ± desvio padrão. PAS pressão arterial sistólica; PAD - pressão arterial diastólica; mmHg - milímetros
de mercúrio.
Tabela 2 - Comparação entre pressão arterial automedida versus
MAPA de vigília
Automedida
MAPA vigília
p
PAS (mmHg)
134 ± 15,71
130,47 ± 13,26
0,064
PAD (mmHg)
79,32 ± 12,38
79,84 ± 9,82
0,719
Teste t de Student. Valores expressos em média ± desvio padrão. PAS - pressão
arterial sistólica; PAD - pressão arterial diastólica; mmHg - milímetros de mercúrio.
de vigília (p < 0,000 para PAS e PAD) Porém, a correlação
foi melhor entre os valores obtidos pela AMPA com os da
MAPA de vigília tanto para PAS e PAD (r = 0,755 e 0,753)
em comparação com os observados nas medidas pela AMPA
e medida casual para PAS e PAD, respectivamente (r = 0,419
e r = 0,609). Não foi observada correlação entre os valores
da PAS obtidos pela medida casual com os da MAPA durante
a vigília (p = 0,227), havendo correlação significativa apenas
com a PAD nesse caso (p < 0,000) (fig. 1, 2 e 3).
Discussão
A medida casual da pressão arterial tem sido o pilar do
diagnóstico e acompanhamento do paciente hipertenso há
mais de cem anos. Entretanto, é preciso encarar as limitações
e fragilidades dessa metodologia, levando em consideração a
grande variação que ocorre na PA ao longo do dia, as inúmeras
interferências que diversas situações provocam nos seus
valores e correlacionando esses fatos ao pequeno número de
medidas que são realizadas por esse método15,16.
Uma série de outros fatores também interfere nas medidas
isoladas nos consultórios dos profissionais de saúde, e esses
podem ser dependentes do operador, do paciente ou do
aparelho, resultando em situações que muitas vezes não
são condizentes com os reais níveis da pressão arterial do
indivíduo17,18. Nesse contexto, a hipertensão mascarada não
será diagnosticada se não utilizarmos métodos que permitam
a medida da PA fora do ambiente de consultório, e esses
pacientes que têm risco cardiovascular aumentado não
serão tratados de maneira adequada19,20. No outro extremo,
e pela mesma limitação do método, encontraremos os
portadores de hipertensão do avental branco, que receberão
medicamentos desnecessariamente21.
A MAPA é um método que permite maior precisão no
diagnóstico e seguimento dos pacientes4,14,15,17. Todavia, a
realização dessa metodologia em todos os hipertensos seria
muito onerosa e inviável do ponto de vista de saúde pública. As
limitações aqui descritas indicam a necessidade de podermos
contar com outras metodologias que permitam a medida da
Souza e cols.
AMPA, medida casual e MAPA na hipertensão arterial
PAS consultório (mmHg)
Artigo Original
R2 Linear = 0,175
PAD consultório (mmHg)
PAS automedida (mmHg)
R2 Linear = 0,371
PAD automedida (mmHg)
Fig. 1 - Correlação entre medida casual e AMPA.
Arq Bras Cardiol 2011; 97(2) : 148-155
151
Souza e cols.
AMPA, medida casual e MAPA na hipertensão arterial
PAS automedida (mmHg)
Artigo Original
R2 Linear = 0,571
PAD automedida (mmHg)
PAS MAPA dia (mmHg)
R2 Linear = 0,567
PAD MAPA dia (mmHg)
Fig. 2 - Correlação entre AMPA e MAPA (vigília).
152
Arq Bras Cardiol 2011; 97(2) : 148-155
Souza e cols.
AMPA, medida casual e MAPA na hipertensão arterial
PAS consultório (mmHg)
Artigo Original
R2 Linear = 0,571
PAD consultório (mmHg)
PAS MAPA dia (mmHg)
R2 Linear = 0,522
PAD MAPA dia (mmHg)
Fig. 3 - Correlação entre pressão casual e MAPA (vigília).
Arq Bras Cardiol 2011; 97(2) : 148-155
153
Souza e cols.
AMPA, medida casual e MAPA na hipertensão arterial
Artigo Original
pressão arterial fora do ambiente hospitalar ou ambulatorial,
de baixo custo e confiáveis, e que nos forneçam os valores da
PA sem a influência do profissional de saúde como observador.
Essas características são preenchidas pela AMPA.
A automedida da pressão arterial no modelo adotado
neste estudo apresenta poucas publicações nos periódicos
nacionais e internacionais. Frequentemente o que é
encontrado na literatura é a referência ao termo AMPA (self
measured blood pressure ou home blood pressure) como
equivalente à monitorização residencial da pressão arterial
com orientações para o uso dos aparelhos de acordo com
protocolos preestabelecidos. Na nossa amostra, os pacientes
foram orientados para realizar um mínimo de duas medidas
semanais da PA, havendo, porém, liberdade para que
outras medidas pudessem ser realizadas. Corroborando a
metodologia adotada neste estudo, recentemente a Sociedade
Europeia de Hipertensão recomendou em suas diretrizes
que, para acompanhamento em longo prazo de pacientes
hipertensos, duas medidas semanais com aparelhos validados
podem ser empregadas22.
Não foi nosso objetivo analisar desfechos cardiovasculares,
o que testamos foi a hipótese de que a medida da PA pelo
paciente, em ambiente domiciliar, com aparelhos validados
e sem protocolos preestabelecidos, teria melhor correlação e
comparação com a MAPA do que a medida casual, hipótese
que se confirmou. A questão sobre a confiabilidade e
reprodutibilidade da AMPA já foi testada anteriormente, mas
com protocolos de medidas preestabelecidas e com resultados
satisfatórios para esse tipo de análise, até mesmo na predição
de desfechos cardiovasculares22-24.
Os nossos resultados mostram que os valores de pressão
arterial na AMPA são mais baixos do que os obtidos pela
medida casual, e mais coincidentes com os encontrados na
MAPA na vigília. Além disso, a AMPA apresenta boa correlação
com as duas metodologias. Esses achados apontam para
boas perspectivas desse método no seguimento de pacientes
hipertensos, podendo atenuar diversos desvios de medidas
que surgem quando utilizamos apenas a medida casual da
pressão arterial e permitindo que um número maior de
indivíduos tenha acesso à monitorização da sua PA25.
Outra publicação demonstrou que a AMPA, além de se
comparar e correlacionar melhor com a MAPA do que a medida
casual, também é melhor preditora de risco de hipertrofia
ventricular esquerda em hipertensos22, o que reforça a sua
utilidade na rotina de acompanhamento desses pacientes.
Dessa maneira, a perspectiva da utilização desse método nos
parece bastante atrativa, merecendo ser mais estudada com
grandes possibilidades de ser incorporada como mais uma
opção para o acompanhamento do paciente hipertenso.
A superioridade das MAPA e MRPA em comparação com
a medida casual da PA já foi demonstrada15,25, havendo, até
mesmo, a recomendação em diretrizes para a utilização mais
frequente desses métodos26. Recentemente, alguns estudos
incluíram recomendações para que a medida da PA fora
do ambiente ambulatorial, realizada pelo paciente e com
aparelhos validados, seja cada vez mais utilizada, entendendo
haver também nessa metodologia vantagens no seguimento
e tratamento da hipertensão arterial9,17,22,27-29.
Essa orientação pode representar, num futuro muito
próximo, uma mudança no paradigma da medida e controle
da pressão arterial, pois o paciente passaria a ter um papel
ativo e mais importante no conhecimento e acompanhamento
dos seus níveis pressóricos, quem sabe assim interferindo
positivamente nas taxas de adesão e controle da PA.
Conclusão
Esses achados indicam a possibilidade de utilização da
AMPA como um método alternativo de monitorização da
pressão na população hipertensa, com melhor comparação
e correlação com a MAPA do que a medida casual.
Limitações do estudo
O número de pacientes avaliados neste estudo é pequeno
e outras análises com uma amostragem maior se fazem
necessárias. Apesar disso, a significância estatística tanto na
análise de comparação quanto de correlação nos faz pensar
que as conclusões deste trabalho estão na direção correta.
Potencial Conflito de Interesses
Declaro não haver conflito de interesses pertinentes.
Fontes de Financiamento
O presente estudo não teve fontes de financiamento
externas.
Vinculação Acadêmica
Este artigo é parte de tese de Doutorado de Weimar Kunz
Sebba Barroso Souza pela Universidade Federal de Goiás.
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Arq Bras Cardiol 2011; 97(2) : 148-155
155
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Artigo Original
Dessincronia Ventricular e Aumento dos Níveis de BNP na
Estimulação Apical do Ventrículo Direito
Ventricular Dyssynchrony and Increased BNP Levels in Right Ventricular Apical Pacing
Cláudia Drummond Guimarães Abreu1, Maria do Carmo Pereira Nunes1,2, Márcia Melo Barbosa2,
Manoel Otávio Costa Rocha1, Antônio Luiz Pinho Ribeiro1
Hospital das Clínicas e Faculdade de Medicina da UFMG1; Departamento de Ecocardiografia do Hospital Socor2, Belo Horizonte, MG - Brasil
Resumo
Fundamento: A estimulação apical crônica do ventrículo direito pode ocasionar dessincronia ventricular e,
secundariamente, alterações neuro-humorais e aumento da morbimortalidade cardíaca.
Objetivo: Pesquisar dessincronia ventricular e seus efeitos sobre os níveis de BNP em pacientes com marca-passo
estimulados cronicamente no ápice do ventrículo direito (VD).
Métodos: Estudo transversal com 85 pacientes com marca-passo uni ou bicameral, em classe funcional I e II da NYHA
e fração de ejeção do ventrículo esquerdo (FEVE) ≥ 35%. A avaliação de dessincronia foi realizada utilizando-se várias
técnicas ecocardiográficas, incluindo o Tissue Synchronization Imaging (TSI), com análise dos 12 segmentos. O BNP foi
dosado junto com o ecocardiograma, porém com o examinador cego.
Resultados: Quarenta e seis mulheres e 39 homens, com idade de 58 ± 12 anos, chagásicos (56%) e hipertensos
controlados (62%), foram incluídos. A fração de ejeção do VE foi 52 ± 8% e a duração média do QRS de 139 ms (120180 ms). O BNP mostrou-se alterado em 36,5% da amostra (ponto de corte de 60 pg/ml). Na análise multivariada de
regressão linear, o BNP correlacionou-se com a idade (p = 0,024), FEVE (p < 0,0001) e tempo pré-ejetivo do VE (p =
0,009), que é índice de dessincronia intraventricular.
Conclusão: Em pacientes com estimulação cardíaca convencional, estáveis clinicamente, a dessincronia intraventricular
foi um preditor independente do aumento dos níveis de BNP, após ajuste pela idade e FEVE. (Arq Bras Cardiol 2011;
97(2) : 156-162)
Palavras-chave: Marca-passo artificial, disfunção ventricular, peptídeos natriuréticos, ecocardiografia.
Abstract
Background: Long-term right ventricular apical pacing can cause ventricular dyssynchrony and, secondarily, neurohumoral alterations and
increase in cardiac morbimortality.
Objective: To analyze ventricular dyssynchrony and its effects on BNP levels in patients with pacemakers and long-term right ventricular (RV)
apex pacing.
Methods: Cross-sectional study of 85 patients with single or dual chamber pacemaker, NYHA functional class I or II and left ventricular
ejection fraction (LVEF) ≥ 35%. The dyssynchrony assessment was carried out using several echocardiographic techniques, including Tissue
Synchronization Imaging (TSI), with the analysis of the 12 segments. BNP was measured at the same time when the echocardiogram was
performed, but the examiner was blinded to the results.
Results: Forty-six women and 39 men, aged 58 ± 12 years, with Chagas’ disease (56%) and controlled hypertensive individuals (62%), were
included in the study. LVEF was 52 ± 8% and the mean QRS duration was 139 ms (120-180 ms). BNP levels were altered in 36.5% of the
sample (cutoff = 60 pg/ml). At the multivariate linear regression analysis, BNP was correlated with age (p = 0.024), LVEF (p < 0.0001) and left
ventricular (LV) pre-ejection time (p = 0.009), which is an intraventricular dyssynchrony index.
Conclusion: In clinically stable patients receiving conventional cardiac pacing, the intraventricular dyssynchrony was an independent predictor
of BNP level increase after adjusted for age and LVEF. (Arq Bras Cardiol 2011; 97(2) : 156-162)
Keywords: Pacemaker, artificial; ventricular dysfunction; natriuretic peptides; echocardiography.
Full texts in English - http://www.arquivosonline.com.br
Correspondência: Cláudia Drummond Guimarães Abreu •
Rua Padre Marinho 49/602 - Santa Efigênia - 30140-040 - Belo Horizonte, MG - Brasil
E-mail: [email protected], [email protected]
Artigo recebido em 04/09/10; revisado recebido em 10/09/10; aceito em 06/04/11.
156
Abreu e cols.
Dessincronia e BNP na estimulação apical do VD
Artigo Original
Introdução
Atualmente, os marca-passos cardíacos (MP) representam
tratamento efetivo para as bradicardias sintomáticas
causadas pela Doença do Nó Sinusal (DNS) e bloqueios
atrioventriculares (BAV). Durante muitos anos, a região apical
do ventrículo direito (VD) foi um dos sítios mais utilizados
nos implantes convencionais por sua facilidade de acesso e
estabilidade do cabo eletrodo1. Entretanto, apesar da evidente
melhora da qualidade de vida na maioria dos portadores
do implante artificial, o bloqueio de ramo esquerdo (BRE)
induzido pela estimulação apical do ventrículo direito (EAPVD)
pode ocasionar alterações hemodinâmicas, estruturais e
funcionais do coração, com consequências deletérias sobre
a evolução clínica de alguns pacientes2,3.
A estimulação cardíaca em qualquer ponto do ventrículo
altera o padrão natural de ativação e contração cardíacas,
já que a velocidade de condução do estímulo é mais lenta
através do miocárdio ventricular se comparada à efetuada
pelo sistema especializado His-Purkinje4.
Estudos já demonstraram que, em resposta ao estímulo
artificial, as fibras miocárdicas se contraem de maneira
desorganizada, provocando estiramentos heterogêneos
de segmentos miocárdicos que podem interferir no
metabolismo da célula cardíaca e causar deterioração
global do funcionamento do órgão5,6. Portanto, poderíamos
pressupor que uma sequência elétrica anormal de ativação
ventricular associada ao estiramento inapropriado das paredes
do ventrículo poderia causar dessincronismo entre a atividade
elétrica ventricular e sua contratilidade, determinando, em
longo prazo, disfunção ventricular, alterações neuro-humorais
e aumento da morbidade e mortalidade cardíacas.
Baseado nessa hipótese, o principal objetivo do estudo
consistiu em avaliar a presença de dessincronia ventricular
após a EAPVD crônica e seus efeitos sobre os níveis de
BNP, em pacientes estáveis clinicamente e sem disfunção
importante do VE.
Métodos
O estudo foi realizado no Laboratório de Marca-passo
do Serviço de Cardiologia do Hospital das Clínicas da
Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e no Centro
de Ecocardiografia do Hospital Socor, após ser aprovado
pelos Comitês de Ética da UFMG e dos hospitais envolvidos.
Todos os pacientes assinaram o termo de consentimento livre
e esclarecido.
No período de junho de 2007 a março de 2008, foram
selecionados consecutivamente durante as avaliações
telemétricas de rotina realizadas no referido Laboratório,
85 pacientes portadores de marca-passos uni ou bicamerais
com estimulação apical do VD, chagásicos e não chagásicos,
dependentes da estimulação artificial (percentual de
estimulação de VD ≥ 80%) e com padrão de ativação
ventricular tipo BRE no eletrocardiograma (ECG) de superfície.
Foram incluídos pacientes de ambos os sexos de 18 a 75
anos, em classe funcional I e II da NYHA e com fração de
ejeção do ventrículo esquerdo (FEVE) ≥ 35%. As doenças
preexistentes e medicações em uso foram identificadas.
Hipertensão arterial sistêmica (HAS) foi definida como
história clínica de hipertensão e valores de pressão arterial
sistólica (PAS) ≥ 140 mmHg ou de pressão arterial diastólica
(PAD) ≥ 90 mmHg. Foram incluídos somente hipertensos
controlados ou normotensos.
Diabete melito foi definido como história clínica de diabete
e uso regular de hipoglicemiantes orais e/ou insulina, sendo
incluídos somente diabéticos com níveis glicêmicos controlados.
A doença de Chagas foi identificada pela presença de pelo
menos dois exames sorológicos distintos positivos (ELISA,
hemaglutinação indireta ou imunofluorescência indireta) e
história epidemiológica relevante.
A função renal foi avaliada por meio da dosagem de
creatinina solicitada pelos médicos assistentes, durante o
seguimento clínico/cardiológico de rotina.
Os critérios de exclusão consideraram doença arterial
coronariana caracterizada pela presença de angina de peito
e/ou evidência de déficit segmentar da contratilidade do VE
ao ecocardiograma, fibrilação atrial (FA), doença pulmonar
(DPOC), gravidez, cirurgia cardíaca recente (menos de quatro
semanas) ou a recusa em participar do estudo.
Análise do complexo QRS e radiografia do tórax
A duração do complexo QRS consistiu na medida do
intervalo de tempo entre a emissão da espícula do marcapasso e o final do complexo QRS (ms), avaliada na derivação
D2 do eletrocardiograma de superfície (ECG).
O posicionamento do cabo-eletrodo ventricular foi
verificado por meio da radiografia de tórax nas incidências
póstero-anterior e perfil.
Estudo ecocardiográfico
O protocolo do estudo ecocardiográfico constou da
obtenção de imagens uni e bidimensionais, com Doppler
pulsátil e contínuo guiado por mapeamento de fluxo em cores,
além do Doppler tecidual, incluindo o Tissue Synchronization
Imaging (TSI), com análise dos 12 segmentos.
Os exames foram realizados por profissional experiente
em aparelho da marca Vivid 7 (GE Vingmed Ultrasound AS,
Horten, Noruega), equipado com transdutor eletrônico de
frequência variável (4 a 12 MHz) e alta resolução.
A dessincronia ventricular foi analisada mediante
diferentes técnicas ecocardiográficas, respeitando-se as
recomendações do atual Consenso da Sociedade Americana
de Ecocardiografia7. As seguintes medidas foram realizadas:
1. DifTPEVE-VD - Diferença entre os tempos pré-ejetivos
do VE e VD (atraso interventricular) obtidos por meio
do Doppler pulsátil (ponto de corte ≥ 40 ms);
2. Retardo SIVPP - Atraso de contração entre o septo
interventricular e a parede posterior ao modo M
(ponto de corte: ≥ 130 ms);
3. TPEVE - Medida do tempo pré-ejetivo do VE (aórtico)
ao Doppler pulsátil (ponto de corte: ≥ 140 ms);
4. MaxDif12seg - Máxima diferença de tempo entre
dois segmentos distintos obtidos com a técnica do TSI
(ponto de corte: > 100 ms);
Arq Bras Cardiol 2011; 97(2) : 156-162
157
Abreu e cols.
Dessincronia e BNP na estimulação apical do VD
Artigo Original
5. DP12seg - Análise do desvio padrão dos 12 segmentos
supracitados (ponto de corte > 32,6 ms);
6. Retardo SIVPL - Atraso de contração entre o septo
interventricular e a parede lateral obtida também pelo
TSI (ponto de corte: ≥ 65 ms);
Dosagem do BNP
A dosagem do BNP foi realizada a partir da coleta de
sangue venoso, de preferência em veia antecubital, com
o paciente em posição supina por 30 minutos, antes da
realização do ecocardiograma e com o examinador cego
para seus resultados. A pressão arterial e a frequência
cardíaca foram medidas antes da coleta. As amostras de
sangue total foram colocadas em tubos plásticos contendo
EDTA (1 mg/ml de sangue) e processadas imediatamente
por intermédio dos kits do Triage® BNP Test (Biosite® Inc.,
San Diego, EUA). No presente estudo, definiu-se o ponto
de corte de 60 pg/ml para os níveis de BNP, baseando-se
esse valor em trabalhos anteriores envolvendo chagásicos
com função de VE preservada8,9.
Análise estatística
As variáveis categóricas foram descritas pelas proporções,
as contínuas, pelas médias e desvios-padrão, medianas e
intervalos interquartílicos, conforme padrão de distribuição.
Utilizou-se a análise de regressão linear uni e multivariada
considerando como variável dependente o BNP. O nível
de significância estatística foi definido para valores de p
menores que 0,05.
Resultados
Foram incluídos somente pacientes clinicamente
compensados, em classe funcional I e II da NYHA. Houve
predomínio do modo de estimulação dupla câmara (74%) e o
tempo mediano do implante foi de 63 meses (1 - 137 meses), e
94% da amostra apresentavam-se em estimulação artificial por
seis meses ou mais. O bloqueio atrioventricular total (BAVT)
foi a indicação mais comum para o implante (85%) e em 48
pacientes (56%) a doença de Chagas apresentou-se como a
causa da cardiopatia de base. A duração média do QRS foi de
139 ± 14,2 ms e nenhum dos pacientes apresentou disfunção
significativa do VE (FEVE média = 51,8 ± 8%).
Com relação ao VD, as médias dos seus índices de
desempenho apresentaram-se dentro dos limites normais,
mesmo após análise do subgrupo de pacientes com FEVE ≤
40%. Sua fração de ejeção média foi de 56,4 ± 11,2%.
A mediana dos níveis de BNP foi de 38,9 pg/ml com valor
mínimo dosado de 5 pg/ml e máximo de 581 pg/ml. Em 34
pacientes (40%), esses níveis foram considerados elevados
(ponto de corte de 60 pg/ml). As principais características
clínicas, demográficas e parâmetros ecocardiográficos
avaliados estão listados na tabela 1.
A dessincronia interventricular foi observada em 49
pacientes (59,8%), considerando-se a mediana do atraso
interventricular. Dessincronia intraventricular significativa foi
158
Arq Bras Cardiol 2011; 97(2) : 156-162
Tabela 1 - Características clínicas, demográficas e parâmetros
ecocardiográficos principais dos 85 pacientes com estimulação
apical crônica do VD
n (%) ou média ± DP ou
mediana (IQL)
Variáveis
Idade (anos)
58,5 ± 12,6
Mulheres (%)
46 (54)
FC (bpm)
64 ± 3
PAS (mmHg)
125 ± 10
PAD (mmHg)
80 ± 6
Chagásicos (%)
48 (57)
Classe funcional (NYHA) (%):
I
67 (79)
II
18 (21)
Medicamentos em uso
Diuréticos de alça e tiazídicos
37 (43,5)
Inibidores ECA
35 (41,2)
Bloqueadores dos canais de cálcio
11 (12,9)
Digital
10 (11,8)
Amiodarona
8 (9,4)
Betabloqueadores
8 (9,4)
BRAS
8 (9,4)
Modo de estimulação (%)
DDD(R)
63 (74)
VVI(R)
17 (20)
VDD(R)
5 (6)
Captura ventricular (PV%)
96 ± 4
Duração (ms) do QRS:
139 ± 14,2
120-150 (%)
72 (84,7)
> 150 (%)
18 (15,3)
BNP (pg.ml-1)
38,9 (18,7;81,6)
Parâmetros ecocardiográficos
Diâmetro diastólico do VE (mm)
52,6 ± 6,9
Diâmetro sistólico do VE (mm)
37,1 ± 7,8
Fração de ejeção do VE* (%)
51,8 ± 8,5
Fração de ejeção do VD* (%)
56,4 ± 11,2
Relação E/E’
10,5 ± 3,6
PSAP (mmHg)
34,6 ± 7,1
Índice volume AE (ml/m )
2
36,3 ± 11,2
Dados expressos pela média (± desvio-padrão) ou proporção ou mediana
(intervalo interquartílico).; FC - frequência cardíaca; PAS - pressão arterial
sistólica; PAD - pressão arterial diastólica; NYHA - New York Heart Association;
ECA - enzima conversora angiotensina; BRAS - bloqueadores dos receptores
da angiotensina; DDD - modo estimulação dupla câmara; VVI - modo de
estimulação câmara única; VDD - marcapasso dupla câmara de cabo-eletrodo
único; PV% - % de batimentos estimulados no ventrículo direito; BNP - peptídeo
natriurético tipo B; VE - ventrículo esquerdo; VD - ventrículo direito; PSAP pressão sistólica artéria pulmonar; AE - átrio esquerdo. (*) Método de Simpson.
Abreu e cols.
Dessincronia e BNP na estimulação apical do VD
Artigo Original
observada em 77 pacientes (90,6%) quando o parâmetro
analisado foi a mediana do tempo pré-ejetivo do VE, assim
como quando se analisou o desvio-padrão e a diferença
máxima dos picos sistólicos medidos nos 12 segmentos
miocárdicos. Da mesma forma, a mediana do atraso de
contração entre o septo interventricular e a parede lateral foi
significativa em 31 pacientes (36,5%) (tab. 2).
Na análise univariada, a duração do QRS, o tempo
de implante, a doença de Chagas, a hipertensão arterial
Tabela 2 - Medidas ecocardiográficas de dessincronia inter e
intraventricular após estimulação apical crônica do VD
Medidas de DV
(ms)
Mediana (IQL)
Registros
Método
alterados n (%) ecocardiográfico
Interventricular
DifTPEVE-VD
44 (26;55,3)
49 (59,8)
Doppler pulsátil
Intraventricular
TPEVE
172 (153;186)
77 (90,6)
Doppler pulsátil
MaxDif12seg
112 (81;138)
49 (59,0)
TDI/TSI
DP12seg
38,5 (28,6;50,2)
52 (62,7)
TDI/TSI
Retardo SIVPL
59 (30,5;82)
31 (36,5)
TDI/TSI
Retardo SIVPP
70 (50;90)
04 (4,8)
Modo M
Na análise de regressão linear múltipla, o TPEVE
permaneceu como único preditor significativo e independente
dos níveis de BNP, mesmo após ajuste para covariáveis, como
idade e FEVE. O modelo de regressão linear obtido revelou,
portanto, que quanto mais velho for o paciente; quanto mais
grave for a disfunção do VE e mais prolongado o tempo préejetivo do ventrículo esquerdo (a partir de 140 ms), em média,
maiores serão os níveis de BNP.
Embora não tenha sido objetivo principal do estudo,
foi realizada análise entre os subgrupos de chagásicos e
não chagásicos, e também entre os diferentes modos de
estimulação, DDD e VVI. Entretanto, não se observaram
nesta série diferenças significativas entre os grupos quando
as variáveis clínicas, eletrocardiográficas e ecocardiográficas
foram avaliadas, exceto a média da FEVE, que foi menor nos
chagásicos (p = 0,035).
BNPLn
IQL - intervalo interquartílico (percentis 25º; 75º); DifTPEVE-VD - diferença
entre tempo pré-ejetivo dos ventrículos esquerdo (aórtico) e direito (pulmonar);
TPEVE - tempo pré-ejetivo do ventrículo esquerdo; MaxDif12seg - máxima
diferença entre os 12 segmentos; DP12seg - desvio padrão entre os 12
segmentos; SIVPL - atraso entre septo interventricular e parede lateral; SIVPP –
atraso entre septo interventricular e parede posterior; TDI/TSI - Tissue Doppler
Imaging/Tissue Synchronization Imaging.
e a maior parte das variáveis ecocardiográficas não
apresentaram correlação significativa com os níveis de BNP.
Entretanto, idade (r = 0,33, p = 0,002) e FEVE (r = -0,28,
p = 0,010) correlacionaram-se significativamente com esse
parâmetro. Correlação significativa também foi observada
entre a medida do tempo pré-ejetivo do VE (r = 0,27, p =
0,013) e o BNP (fig. 1). Todas as outras medidas realizadas
para avaliação de DV não mostraram correlação significativa
com os níveis do peptídeo em questão, independentemente
da técnica ecocardiográfica empregada (tab. 3). A associação
positiva entre o TPEVE e os níveis de BNP permaneceu
mesmo quando o primeiro foi analisado como uma variável
categórica, utilizando-se o ponto de corte recomendado
para o diagnóstico de DV segundo a literatura atual (≥
140 ms) (fig. 2).
Tempo pré-ejetivo do VE (ms)
Fig. 1 - Diagrama de dispersão mostrando correlação positiva entre BNP e TPEVE.
Arq Bras Cardiol 2011; 97(2) : 156-162
159
Abreu e cols.
Dessincronia e BNP na estimulação apical do VD
BNPLn
Artigo Original
Tempo pré-ejetivo do VE
Fig. 2 - Associação entre BNP e TPEVE (≥ 140 ms) em pacientes com estimulação apical crônica do VD.
Tabela 3 - Correlação entre os níveis de BNP com a idade,
eletrocardiograma e parâmetros ecocardiográficos de
dessincronia ventricular
Variáveis
r
p
Idade (anos)
0,33
0,002
QRS (ms)
0,10
0,371
Tempo implante (meses)
0,02
0,850
Captura ventricular (PV%)
0,17
0,112
Doença de Chagas
0,15
0,174
FEVE (%)*
-0,28
0,010
TPEVE
0,27
0,013
Retardo SIVPP
0,04
0,722
Dif TPEVE-VD
0,08
0,500
DP12seg
0,01
0,918
MaxDif12seg
0,06
0,617
Retardo SIVPL
0,06
0,569
PV% - % de batimentos estimulados no ventrículo direito; FEVE - fração de ejeção
do ventrículo esquerdo; TPEVE - tempo pré-ejetivo do ventrículo esquerdo;
SIVPP - septo interventricular e parede posterior; DifTPEVE-VD - diferença entre
o tempo pré-ejetivo dos ventrículos esquerdo e direito; DP12seg - desvio padrão
entre os 12 segmentos; MaxDif12seg - máxima diferença entre os 12 segmentos;
SIVPL - septo interventricular e parede lateral. (*) Método Simpson.
Discussão
O presente estudo demonstrou a elevada frequência de
DV em pacientes com MP estimulados cronicamente no
160
Arq Bras Cardiol 2011; 97(2) : 156-162
ápice do VD e estáveis clinicamente, além de uma correlação
significativa entre o tempo pré-ejetivo do VE, que é uma
medida de dessincronia intraventricular, e os níveis de BNP.
O grupo estudado caracterizou-se por idade de 58,5 ±
12,6 anos, predomínio de chagásicos e ausência de disfunção
ventricular importante (FEVE: 51,8 ± 8,5%). O uso regular
de drogas como os inibidores da ECA, betabloqueadores e
diuréticos em mais de 80% dos pacientes avaliados indica que
todos estavam em tratamento clínico otimizado, em classe
funcional I e II da NYHA.
Cerca de 40% dos pacientes apresentaram níveis elevados
de BNP, considerando-se 60 pg/ml o ponto de corte para
os valores dosados. Baseou-se esse dado em estudo prévio
que analisou chagásicos com função ventricular preservada e
observou valores médios de BNP semelhantes entre o grupo
controle e pacientes com FEVE > 40%. Níveis significativamente
maiores foram encontrados nos pacientes com FEVE ≤ 40%8.
Em concordância com outros trabalhos9,10, observou-se que
a elevação dos níveis de BNP correlacionou-se com o aumento
da idade (r = 0,33, p = 0,002) e com a piora da FEVE (r =
-0,28, p = 0,010). Entretanto, considerando-se que a maior
parte da amostra apresentava-se em classe funcional I da NYHA,
mais do que o aumento das pressões de enchimento do VE, a
DV observada no estudo também contribuiu para a elevação
dos níveis de BNP. Fato demonstrado mediante a correlação
significativa entre o tempo pré-ejetivo do VE e o BNP (r = 0,38,
p < 0,0001), independentemente da FEVE e idade.
Trabalhos anteriores já verificaram que a ativação
dessincrônica dos ventrículos pode contribuir para uma
hipertrofia assimétrica, desarranjo miofibrilar, aumento da
Abreu e cols.
Dessincronia e BNP na estimulação apical do VD
Artigo Original
concentração de catecolaminas, ativação neuro-humoral e
distúrbios de perfusão regional5. Os estudos MOST11, DAVID12
e MADIT II13, por sua vez, sinalizaram que a DV pode criar
substrato anatomofuncional capaz de comprometer a função
cardíaca em longo prazo ao constatar aumento do risco de
FA, insuficiência mitral e hospitalizações por IC em pacientes
com elevada porcentagem de batimentos estimulados no
VD, particularmente naqueles com disfunção ventricular
prévia ao implante14. Entretanto, ainda não está claro se a
DV é um fenômeno agudo que poderia deteriorar a função
do VE em longo prazo e, consequentemente, ocasionar IC
na ausência de cardiomiopatia15,16.
Nossos resultados concordam, todavia, com outros trabalhos
que verificaram que a DV secundária à EAPVD crônica pode
ocasionar prejuízos da função sistólica e diastólica do VE e
contribuir para o aumento dos níveis de BNP. Segundo Chiladakis
e cols.17, o incremento do volume sistólico final do VE e do
tempo de relaxamento isovolumétrico ocasionados pela EAPVD,
em pacientes com FEVE normal, contribuiu para esses achados.
Outros autores também verificaram correlação significativa do
BNP com a gravidade da DV detectada em pacientes com
EAPVD, assim como sintomas iniciais de IC em pacientes com
BAVT e FEVE normal, após EAPVD por 6,5 ± 5,7 anos18,19.
Atualmente, a DV ocasionada pela EAPVD pode ser
quantificada por várias técnicas ecocardiográficas. Embora
muitas medidas possam ser utilizadas, as mais simples e
rotineiras têm apresentado bom desempenho em avaliações
multicêntricas20. O tempo pré-ejetivo do VE, por exemplo,
avaliado no presente estudo, é útil em quantificar dessincronia
intraventricular com boa reprodutibilidade segundo trabalhos
prévios, como o estudo CARE-HF21. Recentemente, Sá e cols.22
observaram prolongamento dessa medida em um pequeno
grupo de pacientes, também, de maioria chagásica com FEVE
normal, ao longo de oito meses. Os autores verificaram que
apesar de as medidas do TPEVE não atingirem o valor aceito
para o diagnóstico de DV (≥ 140 ms), essa foi a única medida
de DV analisada que apresentou incrementos ao longo do
tempo de acompanhamento. Salienta-se que, no estudo em
questão, a estimulação septal predominou sobre a apical, que
parece ser mais deletéria.
Além do TPEVE, alterado em mais de 90% da amostra,
as demais medidas ecocardiográficas avaliadas no estudo
também identificaram alterações dessincrônicas inter e
intraventriculares, revelando a elevada frequência desse distúrbio
em pacientes com EAPVD crônica. Índices tais como o atraso
interventricular, a máxima diferença e o desvio padrão dos
12 segmentos apresentaram-se alterados em mais de 50% da
amostra. Entretanto, apesar da utilidade das diversas técnicas
ecocardiográficas empregadas, incluindo a Tissue Synchronization
Imaging, em quantificar a DV, não se evidenciou associação
significativa dessas medidas com os níveis séricos de BNP nesse
grupo de pacientes, ao contrário do TPEVE.
Nossos resultados corroboram as discussões atuais,
especialmente no campo da TRC, que buscam responder
se as medidas ecocardiográficas utilizadas, até o momento,
para a análise de DV, seriam aquelas que melhor definiriam
a sua presença. Dois importantes estudos prospectivos e
multicêntricos, o PROSPECT23 e o ReThinQ24, não encontraram
correlação entre as medidas de DV e os benefícios da TRC
ao selecionarem candidatos ao procedimento segundo
critérios ecocardiográficos. A importância de fatores técnicos
contribuindo para esses achados foi destacada, em especial,
por aspectos relacionados à exequibilidade e reprodutibilidade
dos métodos utilizados. É consenso, entretanto, que a técnica
do TSI não deva ser considerada improdutiva para a análise de
DV, mas avanços tecnológicos são necessários para abordagens
menos dependentes do operador20.
Limitações
Por se tratar de estudo transversal, foram avaliados pacientes
com MP em um determinado momento de seu seguimento
clínico, o que acarreta limitações nos resultados. Embora nossos
achados indiquem associação entre a elevação dos níveis de
BNP e DV secundária à EAPVD crônica, o desenho do estudo
não permite estabelecer uma relação causal entre essas variáveis.
É importante considerar, ainda, que o BNP foi avaliado
em conjunto com medidas de DV cujos trabalhos específicos
não definiram quais seriam os melhores índices ou pontos de
cortes ideais para a sua análise, sendo esse um dos motivos
da não inclusão das medidas de dessincronia propostas, até
então, nas Diretrizes atuais de ressincronização cardíaca25.
Apesar disso, é consenso na literatura atual que as medidas
de DV sejam utilizadas em conjunto com os critérios clínicos
na seleção de candidatos considerados limítrofes para a TRC26.
Limitações inerentes à técnica da Tissue Synchronization
Imaging devem ser ressaltadas7. Destacam-se, entre elas,
curvas sistólicas nem sempre contidas dentro do intervalo
ejetivo, múltiplos picos resultantes de um mesmo segmento
miocárdico e, em algumas ocasiões, em vez de um pico bem
definido, um platô, que dificultava a determinação do ponto
ideal para a medida proposta.
Conclusões
Pacientes com MP estimulados cronicamente no ápice
do VD apresentam elevada frequência de DV, e no presente
estudo a dessincronia intraventricular foi identificada por meio
da medida do tempo pré-ejetivo do VE, em cerca de 90% dos
pacientes. Além disso, essa medida mostrou ser um preditor
independente do aumento dos níveis de BNP, indicando
que a DV foi capaz de produzir alterações neuro-humorais
precocemente em pacientes sem disfunção importante do
VE. Novos estudos são necessários para se definir se a DV
identificada ao ecocardiograma ou o aumento dos níveis de
BNP, em pacientes com MP estimulados cronicamente no
ápice do VD, são capazes de predizer evolução desfavorável.
Potencial Conflito de Interesses
Declaro não haver conflito de interesses pertinentes.
Fontes de Financiamento
O presente estudo não teve fontes de financiamento
externas.
Vinculação Acadêmica
Este artigo é parte da dissertação de Mestrado de Claudia
Drummond Guimarães Abreu pela Universidade Federal de
Minas Gerais.
Arq Bras Cardiol 2011; 97(2) : 156-162
161
Abreu e cols.
Dessincronia e BNP na estimulação apical do VD
Artigo Original
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Arq Bras Cardiol 2011; 97(2) : 156-162
ÃO
Ç
VA
O
IN
2 comprimidos / dia
Doença
Coronariana
Insuficiência
Cardíaca
Mais sangue para uma
maior eficácia anti-isquêmica
1,2,6
Reduz a isquemia cardíaca
Reduz mortalidade cardiovascular
Reduz risco de IAM
Reduz hospitalização
1-5
1,2
1
1,2
Contra-indicação: insuficiência hepática grave
Interação Medicamentosa:
Não utilizar com cetoconazol, eritromicina, nelfinavir e ritonavir.
1) Fox K et al. Eur Heart J 2009;30:2337-2345 2) Swedberg K et al. The Lancet DOI:10.1016/S0140-6736(10)61198-1 3) Klein WW et al. Coron Art Dis 2002;13:427-436 4) Tardif JC et al. Eur Heart J
2009;30:540-548 5) Amosova EN et al. American Congress of Cardiology 2010 6) Jondeau G, et al. Eur Heart J 2008;Abstract P738
Registrado no MS sob os nos : 1.1278.0071.003-0 (5mg 28 cps) / 1.1278.0071.005-7 (5mg 56 cps) / 1.1278.0071.009-1 (7,5 mg 28 cps) / 1.1278.0071.011-1 (7,5mg 56 cps)
Composição: Cloridrato de Ivabradina 5 e 7,5 mg. Indicação: Tratamento da Doença Coronariana. Contra-indicações: Freqüência cardíaca em repouso < 60 bpm; Insuficiência Hepática Grave; gravidez e/ou amamentação. Dosagem e administração: 5mg: 1 comprimido 12/12h . Após 1 mês, passar para 7,5mg: 1 comprimido 12/12h. Propriedades farmacodinâmicas: Adaptação da freqüência cardíaca (FC). A Ivabradina inibe de forma seletiva e específica a corrente iônica If dos canais f localizados no nó sinusal. Os efeitos cardíacos são a exclusiva adaptação da FC, no repouso e no exercício, sem alteração da condução intra-atrial, átrio-ventricular ou intra-ventricular, nem da contratilidade miocárdica ou da
pressão arterial. Gravidez e lactação: Não está indicado o uso da ivabradina durante a gravidez ou durante a lactação. Apresentação: Caixas com 28 comprimidos de 5 e 7,5 mg e
caixas com 56 comprimidos de 5 e 7,5 mg. Venda sob prescrição médica. LABORATÓRIOS SERVIER DO BRASIL LTDA:
Estrada dos Bandeirantes, 4211 - Jacarepaguá - Rio de Janeiro - RJ. Tel: (21) 2142-1414 - Fax: (21) 2142-1415. CEP: 22.775113. Escritório: Av. Paulista, 1439 - Conj. 144 - São Paulo - SP - 01311-200 - Tel: (11) 3141-9441 - Fax: (11) 3141-2841.
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Artigo Original
Vasculites e Eosinófilos em Biópsia Endomiocárdica, como
Preditores de Rejeição em Transplante Cardíaco
Vasculitis and Eosinophils in Emdomyocardial Biopsies as Rejection Predictors in Heart Transplantation
Reginaldo Cipullo2, Marco Aurélio Finger2, João Manoel Rossi Neto2, Carlos Mendes Contreras2, Nádia Van Geen
Poltronieri2, Mabel de Moura Barros Zamorano2, Lílian Mary da Silva2, Paulo Chaccur2, Jarbas Jakson Dinkhuysen2,
Noedir Antônio Groppo Stolf1
Instituto do Coração - Universidade São Paulo1; Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia2, São Paulo, SP - Brasil
Resumo
Fundamento: O significado clínico de vasculites, lesões isquêmicas, efeito Quilty e da presença de eosinófilos em
biópsias endomiocárdicas de receptores de transplante cardíaco com rejeições leves não foi ainda estabelecido.
Objetivo: Verificar se esses achados histológicos encontrados nas biópsias endomiocárdicas (eosinófilos, vasculites,
efeito Quilty e lesões isquêmicas) são capazes de predizer rejeição aguda do enxerto.
Métodos: Foram reavaliadas 1.012 biópsias endomiocárdicas consecutivas; dessas, 939 foram classificadas como OR
ou 1R pela Nomenclatura da Sociedade Internacional de Transplante de Coração e Pulmão de 2005, e divididas em
dois grupos: (1) Biópsias preditoras: aquelas que precederam rejeição aguda; e (2) Biópsias não preditoras: aquelas
que não precederam rejeição aguda. Comparamos a ocorrência dos seguintes achados histológicos: vasculites, lesões
isquêmicas, efeito Quilty e eosinófilos por análise uni e multivariada entre os grupos.
Resultados: Após análise estatística verificou-se a presença de vasculite intensa e de eosinófilos como maiores preditores
para rejeição aguda futura, apresentando respectivamente as seguintes razões de chance: 10,60 (IC95%: 3,62 - 31,06.
p < 0,001) e 6,26 (IC95%: 3,16 - 12,43. p < 0,001).
Conclusão: Vasculites intensas e eosinófilos em biópsias do miocárdio são os principais fatores preditores de rejeição
aguda pós-transplante cardíaco. (Arq Bras Cardiol 2011; 97(2) : 163-170)
Palavras-chave: Vasculite, eosinófilos, miocárdio, biópsia, rejeição de enxerto, transplante de coração.
Abstract
Background: The clinical significance of vasculitides, ischemic lesions, Quilty effect and the presence of eosinophils in endomyocardial biopsies
of heart transplantation recipients with mild rejection has yet to be established.
Objective: To verify whether these histological findings observed in endomyocardial biopsies (eosinophils, vasculitides, Quilty effect and
ischemic lesions) are capable of predicting acute graft rejection.
Methods: A total of 1,012 consecutive endomyocardial biopsies were reevaluated; of these, 939 were classified as OR or 1R according to the
Nomenclature of the International Society of Heart and Lung Transplantation of 2005 and divided in two groups: (1) Predictive biopsies: those
that preceded acute rejection; and (2) Nonpredictive biopsies: those that did not precede acute rejection. We compared the occurrence of the
following histological findings: vasculitides, ischemic lesions, Quilty effect and eosinophils between the groups by uni- and multivariate analyses.
Results: The statistical analysis showed that the presence of severe vasculitides and eosinophils were the best predictors for future acute
rejection, with the following odds ratios: 10.60 (95%CI: 3.62 - 31.06. p < 0.001) and 6.26 (95%CI: 3.16 - 12.43, p < 0.001).
Conclusion: Severe vasculitides and eosinophils in myocardial biopsies are the main predictive factors of acute graft rejection post-heart
transplantation. (Arq Bras Cardiol 2011; 97(2) : 163-170)
Keywords: Vasculitis; eosinophils; myocardial; biopsy; graft rejection; heart transplantation.
Full texts in English - http://www.arquivosonline.com.br
Correspondência: Reginaldo Cipullo •
Rua Doutor Roberto Feijó, 513 - Vila Prudente - 03138-001, São Paulo, SP - Brasil
E-mail: [email protected], [email protected]
Artigo recebido em 01/04/10; revisado recebido em 03/12/10; aceito em 14/02/11.
163
Cipullo e cols.
Vasculites e eosinófilos em biópsia endomiocárdica
Artigo Original
Introdução
A biópsia endomiocárdica é usada como ferramenta para o
diagnóstico de rejeição em receptores de transplante cardíaco
há 35 anos1. Apesar do progresso obtido nesse período no
conhecimento da fisiopatologia da rejeição do enxerto,
atualmente não existe procedimento capaz de substituí-la com
vantagens na avaliação do processo inflamatório do enxerto2,
sendo ainda hoje considerada como padrão de referência para
o diagnóstico da rejeição aguda3-9.
Parte do sucesso da biópsia endomiocárdica se deve
à padronização da nomenclatura da rejeição do enxerto
cardíaco, realizada em 199010, e um sistema de classificação
simples e facilmente compressível foi rapidamente adotado
pelos centros transplantadores permitindo o progresso do
conhecimento médico no diagnóstico e tratamento das
rejeições do enxerto11.
Em 2005, essa classificação foi revista e simplificada de
acordo com o comportamento clínico das rejeições, estando
em uso nos dias de hoje com bons resultados11. Entretanto,
existem algumas lesões histológicas observadas nas biópsias
endomiocárdicas que possuem significado clínico incerto. Entre
elas podemos citar: a presença de eosinófilos em rejeições leves,
efeito Quilty, vasculites em vasos intramiocárdicos e lesões
isquêmicas em fibras musculares miocárdicas.
Com a intenção de avaliarmos os resultados obtidos com
microscopia óptica na profilaxia das rejeições, este estudo
tem como objetivo determinar se a presença de efeito Quilty,
eosinófilos, vasculites em vasos intramiocárdicos e lesões
isquêmicas em fibras musculares miocárdicas de biópsias com
rejeição leve ou sem rejeição são capazes de predizer rejeição
do enxerto no decorrer da evolução clínica desses receptores
de transplante cardíaco.
Métodos
Antes do início da pesquisa obtivemos aprovação do comitê
de ética médica do instituto Dante Pazzanese, sob o Protocolo
nº 3.343, datado de 31 de março de 2005.
Trata-se de um estudo de coorte combinado, retrospectivo
de 2002 a 2006 e prospectivo de 2006 a 2009, no qual
reavaliamos por microscopia óptica todas as biópsias
endomiocárdicas de 109 pacientes consecutivos submetidos
a transplante cardíaco entre 10 de janeiro de 2002 e 10 de
janeiro de 2009, e que realizaram ao menos duas biópsias
endomiocárdicas durante sua evolução clínica.
A amostra populacional analisada foi composta de 109
pacientes consecutivos submetidos a transplante cardíaco
em nossa instituição, entre 10 de janeiro de 2002 e 10
de janeiro de 2009, que realizaram duas ou mais biópsias
endomiocárdicas após a referida cirurgia; 80% dos pacientes
pertenciam ao sexo masculino; quanto à cor da pele, 73%
dos pacientes denominavam-se brancos. O paciente mais
jovem apresentava 11 anos, e o mais velho, 69 anos, sendo
a média de idade desse grupo de 46 ± 13 anos na data do
transplante. Quanto à doença cardíaca prévia ao transplante,
35% dos pacientes apresentavam cardiomiopatia dilatada
idiopática; 33%, cardiomiopatia secundária à coronariopatia;
e 22%, cardiomiopatia secundária à doença de Chagas; 7%,
cardiomiopatia secundária a valvopatias; e 3%, devido a
outras etiologias.
Após o transplante, todos os pacientes receberam
imunossupressão com ciclosporina na dose de 4 mg/kg/dia,
micofenolato mofetil na dose de 1,5 g ao dia, e metilpredinisona
na dose de 10 mg/kg/dia por cinco dias, e posteriormente
prednisona, inicialmente na dose de 0,4 mg/kg. Alterações
na terapêutica imunossupressora foram realizadas quando
necessário, porem 88% dos pacientes mantiveram-se com
ciclosporina, micofenolato mofetil e prednisona.
Todos os pacientes foram submetidos a biópsias do
miocárdio, de acordo com o seguinte protocolo: no
primeiro mês após a cirurgia esses exames foram realizados
semanalmente; nos segundo e terceiro meses, quinzenalmente;
quarto, quinto e sexto meses, mensalmente; e a partir dessa
data, a cada ano após a cirurgia.
As biópsias foram realizadas em centro cirúrgico com
biótomo de Stanford-Caves e sob fluoroscopia. Todos os
fragmentos colhidos foram fixados com Formol a 10% logo
após o término do procedimento e embebidos em parafina
formando blocos, que posteriormente foram divididos em
três planos: superficial, intermediário e profundo. De cada
bloco obtivemos 30 fatias de três micrômetros de espessura,
que após montadas em lâmina de vidro foram coradas com
Hematoxilina-Eosina para os três planos, e tricrômico de
Masson apenas para o nível intermediário.
Todas as lâminas foram reavaliadas com microscópio óptico
da marca Weiss®. Procuramos em cada biópsia identificar
os seguintes achados histopatológicos: efeito Quilty, lesões
isquêmicas e presença de eosinófilos no infiltrado inflamatório
miocárdico, bastando a presença dessas lesões em apenas
uma das quatro lâminas reexaminadas para esse exame ser
considerado como positivo para a lesão encontrada.
Para mensurar a frequência das vasculites, analisamos as
lâminas coradas com Hematoxilina-Eosina de cada biópsia.
Elegemos a coluna de fatias de fragmentos miocárdicos de
cada lâmina com as lesões mais representativas, realizamos
a contagem dos vasos acometidos pelo processo inflamatório
encontrados em cada plano e, posteriormente, o somatório
dessas lesões vasculares em todas as lâminas analisadas. Esse
valor foi divido pelo número de planos analisados, obtendo
a média aritmética das vasculites por lâminas analisadas. A
seguir, dividimos esse resultado pelo número de fragmentos
miocárdicos colhidos na biópsia; obtivemos, assim, o número
médio de vasos acometidos por processo inflamatório, por
fragmentos analisados.
Definimos vasculites como processo inflamatório,
acometendo um ou mais vasos, com extensão limitada
a estruturas adjacentes, podendo ser acompanhadas de
hemorragia ou lesão isquêmica na área de distribuição dos
vasos por causa do dano vascular12 e classificamos essas lesões
de acordo com as características apresentadas pelo infiltrado
inflamatório encontrado na parede dos vasos afetados da
seguinte forma (Figuras 1, 2, 3 e 4):
1. Vasculites leves - Infiltrado inflamatório focal, afetando
parcialmente o perímetro formado pelas paredes do
vaso, sem sinais de necrose vascular ou formação de
trombos na luz do vaso.
Arq Bras Cardiol 2011; 97(2) : 163-170
164
Cipullo e cols.
Vasculites e eosinófilos em biópsia endomiocárdica
Artigo Original
Fig. 1 - Microfotografia mostrando pequena artéria com infiltrado linfocitário
em suas paredes.
Fig. 3 - Microfotografia mostrando pequena artéria intra - miocárdica acometida
por infiltrado inflamatório e paredes do vaso delaminadas
banco de dados com a evolução clínica de cada receptor
de transplante cardíaco da data de seu transplante até seu
falecimento ou 15 de maio de 2009, data do encerramento
do acompanhamento clínico desta pesquisa.
Consideramos como desfecho da pesquisa: Rejeição
aguda moderada (2R), diagnosticada por meio de biópsia
endomiocárdica, caracterizada como dois ou mais focos com
infiltrado inflamatório mononuclear associado à lesão de fibra
miocárdica, ou grave (3R), descrita como infiltrado inflamatório
difuso, polimórfico, com múltiplas áreas de lesão de agressão
celular, podendo ser encontrado edema, hemorragia e
vasculites segundo a nomenclatura da Sociedade Internacional
de Transplante de Coração e Pulmão11, ou evento clínico que
induziu aumento agudo e imediato da imunossupressão que
usualmente, mas nem sempre, foi acompanhado de resultado
anormal da biópsia endomiocárdica13.
Todos os pacientes que durante o período estudado
apresentaram diminuição da fração de ejeção do ventrículo
esquerdo, insuficiência cardíaca ou mortes por qualquer outra
causa não relacionada com rejeição aguda foram excluídos
desta pesquisa.
Fig. 2 - Microfotografia mostrando infiltrado inflamatório acometendo todo
o perímetro da parede de pequena artéria intramiocárdica caracterizando
vasculite moderada.
2. Vasculites moderadas - Infiltrado inflamatório afetando
todo o perímetro formado pelas paredes do vaso, sem
sinais de necrose vascular ou formação de trombos
na luz do vaso.
3. Vasculites intensas - Infiltrado inflamatório presente na
parede do vaso associado à necrose de sua parede ou
formação de trombos no interior do vaso.
Os pacientes foram acompanhados em visitas ambulatoriais
mensais, no primeiro ano, e bimestrais, a partir do início
do segundo ano. Com informações obtidas nas consultas
ambulatoriais e internações hospitalares, construiu-se um
165
Arq Bras Cardiol 2011; 97(2) : 163-170
Entre 10 de janeiro de 2002 e 28 de fevereiro de 2009,
foram realizadas no Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia
1.012 biópsias endomiocárdicas; 64% foram obtidas nos
primeiros seis meses após o transplante cardíaco; 11,3%, entre
o sétimo e o décimo segundo meses da cirurgia; e 24,7%, após
o primeiro ano do transplante cardíaco. Do total de biópsias, 31
(3,06%) biópsias foram excluídas: 9 por apresentarem sinais de
reativação da doença de Chagas, e 22 por apresentarem menos
que quatro fragmentos válidos para a análise. Das 981 biópsias
restantes, foram excluídas 28 (2,77%) por apresentarem sinais
histológicos de rejeição aguda moderada (2R) ou grave (3R).
Após excluírmos as biópsias com rejeição aguda e com
recidiva da doença de Chagas dividimos as biópsia restantes
em dois grupos: o grupo preditor composto por biópsias que
antecederam um episódio de rejeição aguda e o grupo não
preditor por biópsias que não precederam esta complicação.
Cipullo e cols.
Vasculites e eosinófilos em biópsia endomiocárdica
Artigo Original
Fig. 4 - Diagrama esquemático mostrando a classificação das vasculites quanto a sua intensidade.
Desta forma, tornaram-se então elegíveis para o estudo
953 biópsias endomiocárdicas, que foram divididas em
dois grupos, a saber: Grupo Preditor, formado por 52
biópsias que precederam um episódio de rejeição aguda,
sendo 28 biópsias que antecederam episódios de rejeições
agudas demonstradas por microscopia óptica em pacientes
assintomáticos, somadas a 24 biópsias que precederam
pulsoterapia com imunossupressores em razão de evidências
clínicas e ecocardiográficas de rejeição aguda. Grupo Não
Preditor, formado por 901 biópsias endomiocárdicas que não
antecederam episódios de rejeição aguda.
Resultados
Todos os dados colhidos nesta pesquisa foram armazenados
em planilha do software Excel 2003 para Windows®, e
utilizou-se o programa SPSS® versão 10.0 para a realização
dos cálculos estatísticos.
De todas as variáveis estudadas, apenas a frequência de
vasculites por fragmento não se correlacionou com rejeição
Para a análise univariada, foram utilizados os testes: QuiQuadrado, Mann-Whitney, ANOVA ou teste exato de Fisher
para as variáveis categóricas e o teste t de Student para as
variáveis normais. Foram consideradas elegíveis para análise
multivariada variáveis com valor de p ≤ 0,10.
Na análise multivariada utilizou-se o método de regressão
proporcional de Cox, para determinar o risco oferecido por
cada parâmetro estudado de ocorrência de rejeição aguda.
Para estimativa da sobrevida e da sobrevida livre de rejeição
(com ou sem comprometimento hemodinâmico), utilizou-se o
método de Kaplan-Meier e as diferenças entre os grupos foram
verificadas pelo cálculo do log Rank Test. Foram considerados
como resultados significativos da análise multivariada aqueles
que apresentavam valores de p ≤ 0,05.
A pesquisa em questão não recebeu financiamento de
fontes de fomentos.
Análise univariada
Na análise univariada, foram comparados a intensidade
e a frequência de vasculites, efeito Quilty, eosinófilos no
infiltrado inflamatório e lesões isquêmicas entre as biópsias
que antecederam episódios de rejeição aguda (grupo
preditor), e biópsias que não precederam essa complicação
clínica (grupo não preditor). A tabela 1 resume os resultados
da análise univariada para o desfecho clínico rejeição aguda.
Analise multivariada
Tabela 1 - Análise univariada para o desfecho clínico rejeição aguda
Achados
histopatológicos
Grupo não
preditor
Grupo
preditor
Vasculites ausentes
463 (51,4%)
11 (21,2%)
Vasculites discretas
239 (26,5%)
24 (46,2%)
Vasculites moderadas
163 (18,1%)
12 (23,1%)
Vasculites intensas
36 (4,0%)
5 (9,6%)
< 0,001 entre
os grupos
estudados
Lesões isquêmicas
190 (21,1%)
14 (26,9%)
0,319
Efeito Quilty
371 (41,2%)
29 (55,8%)
0,038
Eosinófilos
47 (5,2%)
11 (21,2%)
< 0,001
Frequência média
de vasculites por
fragmento (IC95%)
0,15
(0,13-0,16)
0,28
(0,20-0,36)
< 0,001
Significância
Arq Bras Cardiol 2011; 97(2) : 163-170
166
Cipullo e cols.
Vasculites e eosinófilos em biópsia endomiocárdica
Artigo Original
aguda apresentando razão de chance de 1,174 (IC95%:
0,357 - 3,861. p = 0,792). Retirada essa variável da equação,
obtivemos a vasculite intensa e a presença de eosinófilos
como maiores preditores de rejeição futura, apresentando
respectivamente as seguintes razões de chance: 10,60 (IC95%:
3,62 - 31,06. p < 0, 001) e 6,26 (IC95%%: 3,16 - 12,43.
p < 0,001). O gráfico 1 sumariza os resultados da análise
multivariada para o desfecho clínico rejeição aguda.
O grupo de pacientes que não apresentavam vasculites em
suas biópsias apresentou sobrevida livre de rejeição aguda de
96,3 ± 0,13% no primeiro ano após o transplante cardíaco.
Entretanto, notamos nos pacientes com vasculites leves ou
moderadas uma redução semelhante de sobrevida livre de
rejeição aguda no mesmo período de 86,2 ± 0,32% e 86,4
± 0,45%, respectivamente. Os pacientes com vasculites
intensas apresentaram menor sobrevida livre de rejeição
no final do primeiro ano pós-transplante, com apenas 65,9
± 16,8%, sem experimentarem essa complicação. Como
podemos observar no gráfico 2, as diferenças entre os grupos
aumentam no decorrer do tempo e, aos cinco anos de
seguimento, os pacientes sem vasculites apresentam 91,7 ±
0,3% de sobrevida livres de rejeição aguda. Já nos pacientes
com vasculites intensas, apenas 49,4 ± 19% não apresentaram
essa complicação após o transplante cardíaco.
Pacientes que não apresentam eosinófilos no infiltrado
intersticial tem sobrevida livre de rejeição aguda no primeiro
ano após o transplante cardíaco de 98,5% ± 0,05%. Entretanto,
no grupo em que notamos a presença dessa célula no infiltrado
inflamatório intersticial miocárdico, a sobrevida livre de rejeição
nesse período foi muito reduzida a apenas 61,6% ± 10,2%. O
gráfico 3 demonstra a sobrevida livre de rejeição dos pacientes
com e sem eosinófilos no infiltrado inflamatório.
Discussão
A utilização da nomenclatura padronizada para o
diagnóstico 10,11 de rejeição cardíaca foi de extrema
importância para o crescimento do conhecimento médico na
área de transplante cardíaco. Entretanto, com o uso rotineiro
dessa classificação surgiram algumas lacunas na interpretação
dos achados histológicos das biópsias endomiocárdicas e sua
relação com a fisiopatologia da rejeição e seu significado
clínico. Entre os hiatos do conhecimento no transplante
cardíaco têm-se os significados clínicos das vasculites,
lesões isquêmicas, efeito Quilty e eosinófilos em biópsias do
miocárdio que apresentam rejeição leve.
A identificação de achados nas biópsias que possam
predizer o aparecimento de rejeição e má evolução se
reveste de enorme importância clínica, podendo ser utilizada
como uma ferramenta importante capaz de indicar em quais
pacientes devemos incrementar a terapia imunossupressora
a fim de evitar agressão imunológica do enxerto.
Pequenos estudos realizados entre as décadas de 1980
e 1990 consideraram as vasculites um sinal nefasto14-17 na
interpretação das biópsias endomiocárdicas, sendo essas
associadas a rejeição grave e morte. Porém, esse sinal
histológico não foi valorizado nas nomenclaturas padronizadas
de rejeição de 199010 ou de 200511, necessitando até hoje de
estudos capazes de elucidar seu real valor clínico.
Os achados desta pesquisa corroboram a importância das
vasculites como fatores preditores independentes de rejeição
aguda, rejeição aguda associada a grave comprometimento
hemodinâmico e morte por rejeição aguda. De maneira
inédita foram classificadas as vasculites morfologicamente
de acordo com a intensidade do fenômeno inflamatório e a
integridade de suas paredes e seu endotélio.
Dentre as alterações histológicas estudadas, as vasculites
e a presença de eosinófilos foram capazes de prever
rejeição aguda. Os pacientes portadores de vasculites leves
e moderadas apresentaram chance de rejeição aguda cerca
de quatro vezes maior que os pacientes sem inflamação
encontrada na parede dos vasos; já os pacientes com
vasculites intensas (acompanhadas de necrose da parede
6,26
p < 0,001
EOSINÓFILOS
3,16
12,43
10,60
p < 0,001
VASCULITES GRAVES
3,62
31,06
4,22
VASCULITES MODERADAS
p = 0,001
1,84
9,69
4,20
VASCULITES LEVES
p < 0,001
2,04
Gráfico 1 - Resultados da analise multivariada para rejeição aguda.
167
Arq Bras Cardiol 2011; 97(2) : 163-170
8,66
Cipullo e cols.
Vasculites e eosinófilos em biópsia endomiocárdica
Artigo Original
1,0
AUSÊNCIA DE VASCULITES
VASCULITES LEVES
Sobrevida livre de rejeição aguda
0,8
VASCULITES MODERADAS
0,6
VASCULITES GRAVES
0,4
0,2
Log rank test < 0,001
0,0
0
360
720
1.080
Tempo em dias
1.440
1.800
Gráfico 2 - Sobrevida livre de rejeição em pacientes com vasculites em biópsia endomiocárdica.
do vaso ou formação de trombos intravasculares) possuem
probabilidade aumentada de 10 vezes de rejeição aguda.
A presença de vasculites diminui significativamente a
sobrevida livre dessa complicação, especialmente no grupo
de pacientes que apresentaram vasculites intensas, onde
50% dos pacientes apresentaram rejeição até o segundo ano
de transplante, contra apenas 5% dos pacientes do grupo
sem vasculites que experimentaram esse desfecho clínico
no mesmo período.
Tomando como base os estudos das vasculites sistêmicas
que podem ser causadas por ação da imunidade celular,
pela deposição de imunocomplexos ou anticorpos18, seria
razoável inferir que as vasculites, no contexto do transplante
cardíaco, podem ocorrer tanto na rejeição celular quanto na
rejeição mediada por anticorpos; entretanto, hoje existem
mais evidências clínicas e experimentais que associam a
presença de vasculites à rejeição mediada por anticorpos19-21.
A associação entre vasculites e o aumento da expressão de
HLA-DR, deposição de anticorpos IgG ou IgM no leito vascular,
associados à fixação de frações C3d e C4d do complemento e
acúmulo de fibrina nas paredes capilares ou no interstício, foi
recém-demonstrada em receptores de transplante cardíaco e
correlaciona-se com aumento da mortalidade cardiovascular20.
Os mecanismos propostos para explicar as lesões vasculares
são a fixação do complemento aos anticorpos depositados
no leito vascular, sua ativação levando a lesão endotelial,
trombose vascular e recrutamento de neutrófilos para o local
de inflamação vascular22, originando dessa forma isquemia
tecidual, que pode ser considerada como o denominador mais
decisivo de prognóstico nas vasculites, podendo levar desde a
disfunção cardíaca decorrente de alterações metabólicas por
isquemia passageira até a infarto do miocárdio ocasionando
lesões definitivas no coração23.
A presença de eosinófilos compondo o infiltrado
inflamatório intersticial é associada frequentemente a rejeições
intensas acompanhadas de hemorragia, vasculites intensas,
necrose de fibras musculares, levando a disfunção do enxerto
cardíaco e muitas vezes a morte do receptor; entretanto, no
final da década de 1980, surge uma série de quatro casos em
que a presença de eosinófilos em rejeições leves ou moderadas
foi sucedida de graves repercussões hemodinâmicas24. Não
surgiram novas pesquisa desde então, capazes de elucidar-se
o significado dos eosinófilos nas rejeições leves.
Em nossa população, a presença de infiltração eosinofílica
nas biópsias cardíacas analisadas foi pouco comum, ocorrendo
em apena 6,1% dos exames reavaliados; entretanto, esse
achado mostrou-se de grande significado clínico, pois nos
pacientes que apresentavam eosinófilos fazendo parte do
infiltrado inflamatório intersticiais, a chance de rejeição
aumentou cerca de seis vezes em comparação ao grupo
Arq Bras Cardiol 2011; 97(2) : 163-170
168
Cipullo e cols.
Vasculites e eosinófilos em biópsia endomiocárdica
Artigo Original
Sobrevida livre de rejeição aguda
1,0
Ausência de eosinófilos
0,8
Eosinófilos presentes
0,6
0,4
0,2
0,0
0
360
720
1.080
Tempo em dias
1.440
1.800
Gráfico 3 - Sobrevida livre de rejeição aguda em pacientes com eosinófilos no infiltrado intersticial.
de paciente que possuíam infiltrado inflamatório intersticial
exclusivamente linfocitário.
Sabe-se que os eosinófilos agem como células efetoras de
rejeição quando a via do linfócito T citotóxico encontra-se
bloqueada ou inoperante25. Desencadeadas pelos linfócitos
T auxiliadores do tipo 2 a via de rejeição dos eosinófilos é
dependente de interleucinas 4, 5 e 926 acarretando, em última
instância, em aumento da permeabilidade vascular e destruição
tecidual mediada por uma série de proteínas liberadas dos
grânulos citoplasmáticos dos eosinófilos, tais como: proteína
básica principal, proteína catiônica eosinofílica, neurotoxina
eosinofílica e peroxidase eosinofilica27.
Este é o primeiro estudo em humanos que correlaciona a
infiltração eosinofílica em biópsias sem inflamação intersticial
ou com rejeição leve, à rejeição aguda.
Uma limitação potencial do estudo é o seu caráter
retrospectivo.
Conclusões
Após avaliação dos resultados obtidos na comparação
dos achados histológicos encontrados nos grupos de biópsias
preditoras e não preditoras, conclui-se que:
1. A presença de vasculites nas biópsias sem infiltrado
inflamatório ou rejeição leve está associada a
169
Arq Bras Cardiol 2011; 97(2) : 163-170
aumento do risco de o paciente desenvolver rejeição
aguda. Adicionalmente encontramos relação entre a
intensidade da inflamação dos vasos afetados com
a evolução do pacientes (a presença de vasculite
intensa na biópsia endomiocárdicas foi o fator
preditor independente que mais se correlacionou
com rejeição aguda).
2. O achado de eosinófilos compondo o infiltrado
inflamatório de pacientes com rejeições leves
correlacionou-se com aumento da chance de o
paciente desenvolver rejeição aguda.
Potencial Conflito de Interesses
Declaro não haver conflito de interesses pertinentes.
Fontes de Financiamento
O presente estudo não teve fontes de financiamento
externas.
Vinculação Acadêmica
Este artigo é parte de tese de Doutorado de Reginaldo
Cipullo pela Universidade de São Paulo.
Cipullo e cols.
Vasculites e eosinófilos em biópsia endomiocárdica
Artigo Original
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Arq Bras Cardiol 2011; 97(2) : 163-170
170
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Artigo de Revisão
Comportamento do Ergorreflexo na Insuficiência Cardíaca
Ergoreflex Activity in Heart Failure
Juliana Fernanda Canhadas Belli, Fernando Bacal, Edimar Alcides Bocchi, Guilherme Veiga Guimarães
Instituto do Coração do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo - InCor HC FMUSP, São Paulo, SP - Brasil
Resumo
Introdução
Grande número de evidências tem sugerido a existência
de uma rede de reflexos que se tornam hiperativos
secundariamente a alterações músculo-esqueléticas que
ocorrem na síndrome da insuficiência cardíaca (IC). Estes,
aliados aos reflexos cardiovasculares simpato-inibitórios,
suprimidos na síndrome, podem contribuir para a intolerância
ao exercício físico. A hiperativação dos sinais originados
dos receptores localizados nos músculos esqueléticos
(mecanoceptores - metaborreceptores) é uma hipótese
proposta recentemente para explicar a origem dos sintomas
de fadiga e dispneia e os efeitos benéficos do treinamento
físico na síndrome da IC. Na IC, outras alterações nos sistemas
de controle reflexo, que não são mutuamente exclusivos,
contribuem para dispneia. Estimulação inapropriada dos
barorreceptores arteriais com consequente falta de inibição
da descarga do metaborreflexo muscular e quimiorreflexo
carotídeo e aumento da vasoconstrição renal com liberação
de angiotensina II pode também ser considerada. Apesar
das alterações funcionais dos reflexos terem sido usadas de
maneira independente para ilustrar a excitação simpática
observada na IC, a interação entre esses reflexos em condições
normais e patológicas, especialmente sua contribuição para
o estado simpato-excitatório encontrado na IC, não tem
sido amplamente estudados. Assim, o problema se ambos
os receptores musculares (mecano e metaborreceptores)
estão envolvidos na gênese da exacerbação do ergorreflexo
observado na IC ainda fica a ser resolvido. Dessa forma, essa
revisão tem por objetivo integrar os conhecimentos a respeito
do mecano e metaborreflexo (ergorreflexo) na síndrome da
insuficiência cardíaca bem como esclarecer a influência da
terapêutica medicamentosa da IC no ergorreflexo.
Grande número de evidências tem sugerido a existência
de uma rede de reflexos que se tornam hiperativos
secundariamente a alterações músculo-esqueléticas que
ocorrem na síndrome da insuficiência cardíaca (IC)1. Estes
reflexos hiperativos, aliados aos reflexos cardiovasculares
simpato-inibitórios, suprimidos na síndrome, podem
contribuir para a intolerância ao exercício físico2,3.
Palavras-chave
171
Durante a atividade física, pacientes com IC apresentam
maior ventilação, para determinada carga de trabalho quando
comparados a indivíduos normais4. Esse fato gera baixa
eficiência ventilatória e relaciona-se com alta ventilação
relativa à produção de dióxido de carbono (CO2), que é forte
preditor de mau prognóstico, além de ser um fator limitante
ao exercício5-7. A hiperventilação pode ocorrer por diversas
causas, dentre elas a hiperatividade dos reflexos advindos
de quimiorreceptores, uma das diversas anormalidades no
controle reflexo cardiovascular relacionado ao tônus simpático
aumentado na IC4,8. A hiperativação dos sinais originados
dos receptores localizados nos músculos esqueléticos
(mecanoceptores - metaborreceptores) sustenta uma hipótese
proposta recentemente para explicar a origem dos sintomas
de fadiga e dispneia e os efeitos benéficos do treinamento
físico na síndrome da IC8.
Os reflexos cardiovasculares traduzem a atividade simpática
aumentada nos indivíduos com IC. Apesar das alterações
desses reflexos serem constantemente usadas para ilustrar a
excitação simpática observada na IC, a interação entre esses
reflexos em condições normais e patológicas, especialmente
sua contribuição para o estado simpato-excitatório encontrado
na IC, não tem sido amplamente estudados9. Dessa forma,
essa revisão tem por objetivo integrar os conhecimentos
a respeito do mecano e metaborreflexo (ergorreflexo) na
síndrome da insuficiência cardíaca bem como esclarecer a
influência da terapêutica medicamentosa da insuficiência
cardíaca no ergorreflexo.
Reflexos cardiovasculares
Hiperventilação, insuficiência cardíaca, fadiga muscular,
exercício.
Controle cardiovascular e ventilatório durante o exercício:
conceitos gerais
Correspondência: Juliana Fernanda Canhadas Belli •
Av. Dr. Enéas de Carvalho Aguiar, 44 / Bloco I, 1º Andar - Laboratório de
Insuficiência Cardíaca e Transplante - 05403-900, São Paulo, SP - Brasil
E-mail: [email protected]
Artigo recebido em 19/12/09; revisado recebido em 02/05/10; aceito em
13/07/10.
O sistema nervoso autônomo permite ao organismo
ajustar sua circulação e ventilação para manter o aporte de
oxigênio para os tecidos, assim, o equilíbrio autonômico é
mantido pela complexa interação entre o barorreflexo arterial,
quimiorreflexo central e periférico, ergorreflexo e reflexo de
estiramento pulmonar10. Durante o exercício, a hemodinâmica
central e as respostas ventilatórias estão sob controle do
Belli e cols.
Ergorreflexo na insuficiência cardíaca
Artigo de Revisão
sistema nervoso autonômico, que depende da interação entre
os receptores do córtex motor cerebral e aferências periféricas
(baroceptores, mecano e metaboceptores)11. Esse sistema
regula o débito cardíaco, condutância vascular e ventilação
na tentativa de ofertar o fluxo sanguíneo oxigenado adequado
para eliminar subprodutos metabólicos musculares.
No início do exercício, o córtex motor estabelece um
nível basal da atividade eferente simpática e parassimpática,
que é, por sua vez, modulado pelos sinais originados dos
baroceptores arteriais e dos receptores articulares, tendíneos
e musculares. Os baroceptores trabalham controlando a
vasodilatação muscular e a frequência cardíaca através
de ativação simpática, mantendo assim a pressão arterial,
contrabalanceando qualquer desbalanço entre resistência
vascular e débito cardíaco. Por outro lado, receptores
musculares ativam aferências nervosas que, por sua vez,
induzem ajustes cardiovasculares simpático-mediados em
resposta às condições mecânicas e metabólicas do músculo
em trabalho 8,11. Há evidências de que o desequilíbrio
autonômico contribua para a patogênese e progressão da
insuficiência cardíaca. Inicialmente, o desequilíbrio leva ao
aumento da pressão arterial, ventilação, resistência vascular
renal e resistência vascular periférica, e consequente aumento
da frequência cardíaca, podendo ser esse desequilíbrio o
responsável pela progressão da doença11. Uma síntese das
alterações autonômicas encontradas na IC, bem como suas
interações pode ser observada na Figura 1.
Duas classes de mecanismos neurais foram postuladas como
sendo a origem no aumento da taxa de ventilação, frequência
cardíaca, descarga nervosa simpática e contratilidade cardíaca
durante o exercício. A primeira é o sistema de comando central
que envolve a ativação direta dos sistemas de locomoção,
autonômico e circuitos ventilatórios através dos processos
nervosos ocorridos no início do exercício12,13. A segunda
classe de mecanismos é a rede de reflexos que pode ativar
circuitos autonômicos e ventilatórios medulares através de
sinais advindos da periferia, como os aferentes musculares dos
tipos III e IV, que são ativados durante o exercício14. Evidências
mostram funções para ambos os mecanismos neurais nas
respostas cardiovasculares e respiratórias ao exercício 15.
Essas aferências musculares tipos III e IV são definidas como
ergorreceptores, pois são estimuladas pelo trabalho muscular.
Foram classificadas em mecanorreceptores, que são sensíveis
ao movimento; e metaborreceptores que captam estímulos
químicos relacionados ao trabalho muscular. A ativação dessas
aferências pode afetar a frequência cardiaca, pressão arterial,
débito cardiaco, volume sistólico, ventilação e atividade
nervosa simpática captadas através da microneurografia1,16.
Controle mecanorreflexo e metaborreflexo
O controle neural circulatório e respiratório dos eventos
mecânicos e metabólicos que ocorrem nos músculos
envolvidos no exercício físico são conhecidos como reflexo
pressor do exercício. Durante a atividade física, a estimulação
mecânica muscular associada à contração pode estimular
terminações nervosas eferentes e determinar um reflexo
cardiovascular, o mecanorreflexo. Os mecanoceptores
estimulam principalmente fibras aferentes mielinizadas tipo
III que respondem, principalmente a estímulos mecânicos. As
fibras aferentes do tipo III disparam no início da contração
Fig. 1 - Mecanismos de controle autonômico na insuficiência cardíaca. A sensibilidade dos barorreceptores arteriais e dos receptores cardiopulmonares está diminuída,
enquanto a sensibilidade dos quimiorreceptores está aumentada, bem como é observado o aumento da atividade de ergorreceptores musculares (que desencadeia o
ergorreflexo). A resposta a esse balanço alterado inclui aumento generalizado na atividade simpática que resulta em aumento da pressão arterial, ventilação, resistência
vascular renal e resistência vascular periférica, enquanto há diminuição na atividade parassimpática, que provoca aumento da frequência cardíaca.
Arq Bras Cardiol 2011; 97(2) : 171-178
172
Belli e cols.
Ergorreflexo na insuficiência cardíaca
Artigo de Revisão
(têm ativação precoce em relação aos metaborreceptores) e
sua taxa de disparo tende a se adaptar caso a tensão muscular
seja mantida constante.
cardiorrespiratório resultando, assim em sintomas como a
dispneia, fadiga e a hiperpneia, comumente referidos pelos
portadores de IC23.
Com a progressão do esforço metabólitos como ácido
lático, adenosina, fosfato, cininas e cátions são produzidos no
músculo esquelético, além da produção o aporte sanguíneo
para o músculo esquelético pode não ser suficiente
prejudicando a cinética de remoção dos subprodutos do
metabolismo como ácido lático, íons hidrogênio, adenosina,
potássio, íons fosfato, ácido aracdônico, entre outros. Essas
substâncias se acumulam com o aumento do estresse e,
quando a oferta de oxigênio não pode alcançar as demandas
metabólicas do músculo em contração, os metaborreceptores
musculares são ativados. Isso, por sua vez, leva à regulação
reflexa do sistema cardiovascular, comumente chamado de
metaborreflexo. Fibras aferentes não mielinizadas do tipo
IV são sensíveis a metabólitos, especialmente à acidose, e
também sensíveis a prostaglandinas e bradicininas17. Uma
vez ativadas, estimulam diretamente o drive simpático, que
leva a aumento da ventilação pulmonar e vasoconstrição
nos músculos que não estão em exercício, efeito que,
combinado, leva mais sangue oxigenado aos músculos
esqueléticos em atividade. A estimulação das fibras
aferentes tipo III e IV parece ser essencial para a resposta
hemodinâmica normal ao exercício em indivíduos saudáveis.
A maioria das fibras aferentes dos grupos III e IV entra na
medula espinhal via corno dorsal; impulsos dessas fibras
provavelmente apresentam diversos níveis de integração, o
reflexo parece não necessitar do tronco cerebral apesar de
haver um nível de integração supraespinhal.
Essa hipótese propõe outro ciclo de deterioração similar aos
de ativação neuroendócrina. A redução na função ventricular
acarreta em efeitos metabólicos que deterioram, em última
instância, o músculo esquelético e geram anormalidades no
metabolismo e função muscular. Em resposta ao acúmulo
precoce de metabólitos no músculo em exercício, ocorre
ativação exacerbada do ergorreflexo, e isso é percebido pelo
indivíduo tanto como fadiga muscular, quanto como dispneia;
além disso, há, reflexamente, aumento do tônus simpático,
taquicardia, vasoconstrição de leitos vasculares à distância
dos músculos que não estão em exercício além da resposta
ventilatória excessiva ao exercício (Figura 2)1. Essas mudanças
inicialmente são benéficas para manter a pressão arterial
adequada e a perfusão em áreas mais nobres. Entretanto,
a longo prazo, essa situação se torna danosa e causa
vasoconstrição permanente, resposta vascular e endotelial,
inflamação e necrose, que altera a função de outros órgãos,
incluindo rins, pulmões e músculo cardíaco18.
Durante o exercício, há contração muscular seguida
de acúmulo de metabólitos, dessa forma, mecano e
metaborreflexo, sobrepõem-se. A medula espinhal é,
provavelmente, a área controladora da resposta cardiovascular
durante a ativação do mecano e metaborreflexo17,18. Dessa
forma, mesmo em termos de diferenciação anatômica
e quanto aos gatilhos fisiológicos, existe um grau de
sobreposição entre “mecano” e “metaborreceptores” e
observações mais recentes desafiam a descrição clássica
desses receptores como estruturas distintas19,20. Dessa forma,
utilizamos o termo “ergorreceptores”, que contempla ambos
os tipos de aferências, e ergorreflexo, o reflexo desencadeado
por ambos os tipos de receptores16,21-23.
A hipótese muscular
A insuficiência cardíaca causa limitações às atividades
habituais no que diz respeito às mudanças ocorridas no
sistema de transporte do oxigênio desde o centro (o coração,
pulmão e controle neural) até a periferia (circulação, status
neuro-hormonal, reflexos, sistema nervoso autonômico
e metabolismo muscular). Uma questão chave têm sido
se esse desbalanço é mecanicamente importante ou é
meramente o resultado da somação de fatores associados
à má função cardíaca e consequente inatividade física. Nos
últimos vinte anos se desenvolveu a hipótese muscular, que
atribui às anormalidades no músculo periférico a origem dos
sintomas e anormalidades nos reflexos vistos na insuficiência
cardíaca. O músculo esquelético, ao se tornar anormal na
insuficiência cardíaca, sinalizaria padrões alterados do controle
173
Arq Bras Cardiol 2011; 97(2) : 171-178
As anormalidades dos músculos esqueléticos encontradas
nos portadores de IC, descritas anteriormente, são
principalmente o predomínio do metabolismo oxidativo
sob o glicolítico e mudanças ultraestruturais na composição
muscular (tipo de fibra, número de mitocôndrias e função
endotelial). Dessa forma, ocorre acidose precoce, depleção
dos compostos de alta energia desenvolvidos durante o
exercício, que por sua vez desencadeariam outros mecanismos
compensatórios que iriam, em indivíduos normais, manter
o desempenho muscular esquelético. Esses mecanismos
provocariam estimulação de vários aferentes, incluindo
ergorreceptores musculares, que comunicam com o tronco
cerebral sobre o nível de trabalho muscular, desencadeando,
assim, o ergorreflexo16,21-23.
Fatores desencadeantes do ergorreflexo
O ergorreflexo tem sido estudado desde a década de
90, quando a hipótese muscular propôs que a intolerância
ao exercício estaria relacionada com as alterações dos
músculos periféricos24. Desde então, o instrumento para
avaliá-lo tem sido a oclusão circulatória regional (OCR)
após contração muscular25,26.
De maneira geral, a técnica inclui duas sessões de exercício
desenvolvidas de forma randomizada: (1) o exercício controle
usando movimentos repetitivos, seja de membros superiores
ou inferiores, (ergômetro de braço ou perna, handgrip),
em intensidade submáxima. (2) um manguito de pressão é
posicionado em um dos membros em exercício; o mesmo
protocolo de exercícios do controle deve ser feito, entretanto,
aproximadamente dez segundos antes do final do esforço,
o manguito de pressão do membro em exercício começa a
ser insuflado e então se faz 3 minutos de oclusão circulatória
regional, através de uma pressão de pelo menos 30 mmHg
acima da pressão sistólica obtida na última mensuração da
pressão arterial. Após o manguito insuflado, solicita-se que
o sujeito relaxe, o exercício então cessa e a contribuição
dos ergorreceptores é avaliada pelo aprisionamento dos
Belli e cols.
Ergorreflexo na insuficiência cardíaca
Artigo de Revisão
Vasoconstrição
Fig. 2 - Na hipótese muscular, a redução inicial da função ventricular e consequente inatividade ativam o estado catabólico e reduzem os fatores anabólicos, o que leva
à perda de massa muscular e à disfunção musculoesquelética. Isso, por sua vez, sensibiliza os ergorreceptores musculares, que levam à intolerânica ao exercício e à
excitação simpática. Em consequência, os efeitos combinados do estado catabólico e da inatividade pioram ainda mais a estrutura e função do músculo esquelético e
podem, eventualmente, levar à progressão da doença (Adaptado de Piepoli, M. e cols., Circulation 1996;93:940-9521).
metabólitos produzidos durante o exercício. Durante a
avaliação da atividade do ergorreflexo, os sujeitos devem
respirar ar através de uma peça bucal, com clip nasal e, os
gases expirados e a ventilação devem ser coletados, assim
como valores de pressão arterial e frequência cardíaca. Esse
protocolo têm mostrado fixar o estado metabólico do músculo
e prolongar a ativação dos ergorreceptores1,23,27.
Duas abordagens podem ser utilizadas para se estudar
o ergorreflexo: durante o esforço, pela redução do fluxo
sanguíneo ao músculo ou ao final do esforço reduzindo o fluxo
sanguíneo e causando isquemia pós-exercício, o que aprisiona
os metabólitos produzidos previamente durante a contração
muscular. A última abordagem, de se causar isquemia pósexercício, isola o comando central e o mecanorreflexo do
metaborreflexo. A avaliação do ergorreflexo contempla tanto
mecano quanto metaborreceptores muscular e como explicado
anteriormente, suas funções se sobrepõem no exercício.
Entretanto, no início do exercício, alguns autores consideram
a avaliação apenas dos mecanorreceptores, testando assim
o mecanorreflexo. A técnica consiste em três minutos de
exercício passivo seguido de 3 minutos de exercício ativo,
separados por um período de repouso de 3 minutos. Em geral,
o movimento é descrito em ergômetro de membros inferiores
tanto na movimentação passiva quanto na ativa.
Para quantificar a resposta ventilatória atribuída ao trabalho
muscular é mensurada a razão entre o aumento da ventilação
(VE) pela unidade de aumento de VO2 (dVE/dVO2) tanto
nos movimentos passivos quanto ativos. A contribuição do
mecanorreflexo ao exercício é quantificada como a diferença
na elevação da razão dVE/dVO2 entre o exercício passivo
e o ativo28,29. Entretanto, a literatura acerca da avaliação
de mecanoceptores de maneira isolada, como descrito,
é escassa e, além disso, Scott e cols.28,29 não encontraram
resposta significativa dos mecanoceptores traduzida pelo
aumento na ventilação seja em pacientes com IC ou em
controles normais. Isso pode ser atribuído ao fato da ativação
isolada ser pouco usual uma vez que a maioria das atividades
cotidianas é de natureza submáxima, havendo acúmulo de
metabólitos no músculo esquelético, ativando, assim, não
só mecanoceptores, como também metaboceptores. Dessa
forma, a avaliação do ergorreflexo, que contempla tanto
mecano quanto metaboceptores é mais frequente na literatura
e mais reprodutível1,18,20,23.
A maioria dos autores preconiza o uso de exercícios
submáximos para o teste de ergorreflexo (entre 50 e 70%
do VO2 pico). Em estudo realizado pelo nosso grupo em
pacientes portadores de IC beta-bloqueados, foi demonstrado
na OCR em um dos membros inferiores após o teste de
Arq Bras Cardiol 2011; 97(2) : 171-178
174
Belli e cols.
Ergorreflexo na insuficiência cardíaca
Artigo de Revisão
caminhada de seis minutos em esteira, que representa
atividades cotidianas, não ocorreu ativação dos mecanismos
de ergorreflexo, sugerindo que esses mecanismos estariam
ativados apenas aos esforços mais intensos e/ou máximos29,30.
Ainda não consta na literatura a avaliação do ergorreflexo
durante ou após a atividade de caminhada, no entanto,
essa seria a atividade física mais comumente realizada pelos
pacientes com insuficiência cardíaca. Essa atividade pode
ser reproduzida pelo teste de caminhada dos seis minutos,
pois há correspondência com a demanda metabólica das
atividades diárias31,32.
Em relação ao membro a ser testado, se a oclusão
circulatória regional será feita no membro superior ou inferior,
há estudos utilizando tanto um quanto outro, entretanto
estudos prévios utilizaram protocolos de exercícios localizados
de braço, e observaram uma variação da ventilação após
OCR1,22,33,34. No entanto, esta técnica envolve um grupo
pequeno de músculos e talvez o metabolismo anaeróbio
seja predominante nesse tipo de exercício, superestimando
os resultados. Outros estudos utilizaram protocolos com
dorsiflexão de tornozelo e em cicloergômetro, encontrando
resultados similares35. Ainda permanece controverso na
literatura o método mais adequado para testar fidedignamente
esse reflexo. Em estudo que comparou o ergorreflexo em
diferentes grupos musculares no mesmo paciente com
insuficiência cardíaca, observou-se que os resultados que se
atribuem à maior ou menor atividade do ergorreflexo são
dependentes do grupo muscular, tipo de fibra e metabolismo
oxidativo ou glicolítico envolvidos no exercício36.
Ergorreflexo na insuficiência cardíaca
A fadiga muscular mesmo diante de exercícios físicos
moderados é um problema comum associado a sujeitos que
sofrem de insuficiência cardíaca (IC). Durante o exercício na
IC, o débito cardíaco é diminuído e o controle da pressão
arterial se dá mais por respostas vasculares periféricas
resultantes do aumento da atividade nervosa simpática e
aumento da secreção de hormônios vasoativos. Além disso, o
fluxo sanguíneo para o músculo esquelético ativo é reduzido, o
que pode levar a isquemia relativa37. Alguns estudos mostram
que parte do aumento do tônus simpático que ocorre durante
exercício moderado em portadores de IC resulta da ativação
do ergorreflexo38,39. Durante o exercício físico, a habilidade da
vasculatura periférica dilatar relaciona-se com o maior nível de
débito cardíaco e nesse processo a pressão arterial é mantida.
Entretanto, se a capacidade do fluxo sanguíneo periférico
for maior do que o DC, como foi sugerido recentemente40,
a influência de outro controle deve estar interposta entre o
coração e os vasos dos músculos-esqueléticos para manter
a pressão arterial, garantindo assim que o fluxo sanguíneo
cerebral e cardíaco esteja preservado. A relação entre o
sistema nervoso simpático e a vasoconstrição ajuda nessa
função regulatória. (Figura 3) A principal consequência
hemodinâmica da ativação do ergorreflexo é o aumento
da pressão arterial. Essa resposta é atingida primariamente
pelo aumento da resistência vascular sistêmica devido à
vasoconstrição periférica resultante do aumento da atividade
simpática, enquanto o efeito na frequência cardíaca é variável.
175
Arq Bras Cardiol 2011; 97(2) : 171-178
A estimulação neuromuscular de metaborreceptores por
meio de mudanças físico-químicas locais provoca hiperpneia
reflexa. Em animais, a perfusão isolada de membro inferior
com sangue em acidose, hipercapnia ou hipóxia bem
como, perfusão com sangue venoso colhido previamente
de membro inferior em exercício produz aumento na
ventilação41. Similarmente ao que tem sido relatado para o
metaborreflexo, o mecanorreflexo tem demonstrado ter a
capacidade de produzir reflexos cardiovasculares. A distorção
mecânica de campos receptores de terminações nervosas em
músculos contráteis pode ativar os mecanoceptores que
tonicamente ativados, parecem ser os principais responsáveis
pela elevação reflexa da pressão arterial induzida pelo
exercício (mecanorreflexo)18,42.
Em estudo experimental, a ativação do metaborreflexo
muscular causou aumento significativo na frequência cardíaca
sem alterações no volume sistólico, resultando em grande
aumento do débito cardíaco e pressão arterial média. Após
redução da fração de ejeção de ventrículo esquerdo induzida
nesses animais, ocorreram aumentos muito menores no débito
cardíaco com a ativação do metaborreflexo muscular e,
apesar de a frequência cardíaca aumentar, o volume sistólico
diminuiu. Além disso, quando a FC manteve-se constante, não
foi observado aumento do débito cardíaco com a ativação do
metaborreflexo muscular, embora a pressão venosa central
tenha aumentado substancialmente. Após bloqueio betaadrenérgico, o débito cardíaco (DC) e o volume sistólico
diminuíram com a ativação do metaborreflexo muscular,
dessa forma, os autores concluíram que na IC, a habilidade
do metaborreflexo muscular em aumentar a função ventricular
pelos aumentos na contratilidade e na pressão de enchimento,
está evidentemente diminuída43.
Scott e cols.29 observaram em pacientes com insuficiência
cardíaca moderada e grave, durante exercício de perna em
cicloergômetro, ativação do ergorreflexo mostrado pela resposta
ventilatória aumentada ao exercício, quando comparados a
indivíduos normais e sugerem que essa hiperativação pode ser
a origem da dispneia e fadiga frente ao exercício.
Piepoli e cols. 23 avaliaram 107 pacientes com IC e,
comparados aos controles normais, observaram maior atividade
do ergorreflexo na ventilação além de diminuição de massa
muscular sendo que o ergorreflexo foi particularmente hiperativo
nos pacientes caquéticos e sugeriram uma forte correlação entre
depleção de massa muscular e hiperativação do ergorreflexo23.
Influência da terapêutica medicamentosa no ergorreflexo
Na IC, outras alterações nos sistemas de controle
reflexo, que não são mutuamente exclusivas, contribuem
para dispneia. Uma baixa estimulação inapropriada dos
barorreceptores arteriais com consequente falta de inibição
da descarga do metaborreflexo muscular e quimiorreflexo
carotídeo e aumento da vasoconstrição renal com liberação
de angiotensina II pode também ser considerada23.
Os beta-bloqueadores, usados pela maioria dos pacientes
com IC (83%), são uma terapêutica bem reconhecida e efetiva
na sobrevida desses pacientes, mas têm efeitos controversos
na tolerância ao exercício. Não há informação sobre seu efeito
no ergorreflexo. Considerando que o ergorreflexo é mediado
Belli e cols.
Ergorreflexo na insuficiência cardíaca
Artigo de Revisão
Fig. 3 - Controle neural cardiovascular durante o exercício. Sinais neurais originados no cérebro (comando central), na aorta e nas artérias carótidas (quimio e barorreflexo)
e nos músculos esqueléticos (ergorreflexo) são conhecidos por modular a atividade simpática e parassimpática durante o exercício. As alterações no tônus autonômico
induzem mudanças na frequência cardíaca e na contratilidade, além de alterações no diâmetro dos vasos e liberação de adrenalina pela medula da glândula adrenal.
Como resultado, mudanças na frequência cardíaca, débito cardíaco e resistência vascular sistêmica medeiam alterações na pressão arterial média apropriada para
determinada intensidade de exercício. ACh - acetilcolina; NA - Noradrenalina.
pelo sistema nervoso simpático e os beta-bloqueadores são
bloqueadores adrenérgicos, podemos sugerir que estes podem
afetar sua hiperativação pela redução do tônus simpático.
Além disso, nos estudos da ativação do ergorreflexo em IC,
foram incluídos, em média, apenas 30% de pacientes em
uso de beta bloqueador1,8,22,28. Assim, não existem estudos
que tenham avaliado o efeito da terapêutica com betabloqueadores em pacientes com IC e novas pesquisas são
necessárias para esclarecer essa interrelação.
Perspectivas
Conforme exposto, muitos estudos mostraram que o
mecanorreflexo medeia a desregulação hemodinâmica
observada na insuficiência cardíaca. Dessa forma, o
problema se ambos os receptores musculares (mecano
e metaborreceptores) estão envolvidos na gênese da
exacerbação do ergorreflexo observado na IC ainda fica a
ser resolvido. De uma perspectiva clínica, seria útil verificar
se o bloqueio químico dos receptores que medeiam o
metaborreflexo podem limitar a hiperatividade simpática
observada nos pacientes com IC.
De acordo com a hipótese muscular seria mais apropriado
e efetivo tratar a causa, as anormalidades músculoesqueléticas, em vez de tratar as consequências da ativação
do ergorreflexo como vasoconstrição periférica e ativação
simpática. Ensaios randomizados e controlados têm mostrado
que o treinamento físico aumenta o consumo de oxigênio e
melhora o equilíbrio neuro-hormonal na IC44. Em particular,
aumenta a densidade mitocondrial e atividade de enzimas
oxidativas, aumenta a densidade capilar e desloca em
direção ao metabolismo aeróbio associado com a redução
na ativação do metaborreflexo na IC. De certa forma, a
hipótese muscular se assemelha a outros ciclos viciosos
na insuficiência cardíaca, nas quais muitas das respostas
fisiológicas parecem ser adaptativas a princípio e, ao longo
do tempo, são adaptações deletérias.
Ao compreendermos as bases fisiológicas dos sintomas dos
pacientes com insuficiência cardíaca e ao desenvolvermos
estratégias para melhorar esses sintomas, devemos começar
a solucionar os complexos processos fisiológicos que
determinam a incapacidade ao exercício. Aparentemente,
os músculos periféricos, o endotélio, pulmões e os reflexos
Arq Bras Cardiol 2011; 97(2) : 171-178
176
Belli e cols.
Ergorreflexo na insuficiência cardíaca
Artigo de Revisão
de controle ventilatório representam um papel central nos
fatores limitantes ao exercício.
Em tempos de intervenções agressivas na cardiologia clínica
e de foco nas bases moleculares na doença cardiovascular,
deve-se ter em mente que mecanismos regulatórios
complexos e coordenados governam as funções integradas
do sistema cardiovascular por intermédio do sistema nervoso
autonômico 18. Quando essa coordenação é perdida, a
intolerância ao exercício talvez seja o precursor de muitos
problemas que certamente surgirão. Dessa forma, hábitos
saudáveis de vida, que devem incluir exercício físico regular,
contribuem para quebrar esse ciclo vicioso e promover
prevenção primária e secundária com sucesso.
Potencial Conflito de Interesses
Declaro não haver conflito de interesses pertinentes.
Fontes de Financiamento
O presente estudo foi parcialmente financiado pela FAPESP.
Vinculação Acadêmica
Este artigo é parte de tese de Doutorado de Juliana
Fernanda Canhadas Belli pela Faculdade de Medicina da
Universidade de São Paulo.
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35.Grieve DAA, Clark AL, Mc Cann GP, Hillis WS. The ergoreflex in patients with
chronic heart failure. Int J Cardiol. 1999; 68 (2): 157-64.
36.Carrington CA, Fisher JP, Davies MK, White MJ. Muscle afferents inputs to
cardiovascular control during isometric exercise vary with muscle group in
patients with chronic heart failure. Clin Sci. 2004; 107 (2): 197-204.
41.Ramsay AG. Effects of metabolism and anesthesia on pulmonary ventilation.
J Appl Physiol. 1959; 14 (1): 102-4.
42.Gallagher KM, Fadel PJ, Smith SA, Norton KH, Querry RG, Olivencia-Yurvati
A, et al. Increases in intramuscular pressure raise arterial blood pressure during
dynamic exercise. J Appl Physiol. 2001; 91 (5): 2351-8.
43.Sala-Mercado JA, Hammond RL, Kim JK, McDonald PJ, Stephenson LW,
O’Leary DS. Heart failure attenuates muscle metaboreflex control of
ventricular contractility during dynamic exercise. Am J Physiol Heart Circ
Physiol. 2007; 292 (5): H2159-66.
44.Coats AJ, Adamopoulos S, Radaelli A, McCance A, Meyer TE, Bernardi L,
et al. Controlled trial of physical training in chronic heart failure. Exercise
performance, hemodynamics, ventilation, and autonomic function.
Circulation. 1992; 85 (6): 2119-31.
Arq Bras Cardiol 2011; 97(2) : 171-178
178
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Carta ao Editor
Riscos Cardiovasculares em Adolescentes com Diferentes Graus de
Obesidade
Cardiovascular Risks in Adolescents with Different Degrees of Obesity
Kerginaldo Paulo Torres1, Samara Gomes Torres2, Ricardo Oliveira Guerra1
Universidade Federal do Rio Grande do Norte1, Universidade Potiguar2, Natal, RN, Brasil
O trabalho “Riscos cardiovasculares em adolescentes com
diferentes graus de obesidade”, desenvolvido por Lavrador
e cols.1, mostrou associações entre o grau de obesidade e
as variáveis HDL-Colesterol, Pressão Arterial, Triglicerídeos,
não distinguindo se a associação com a pressão arterial se
verificou tanto com a pressão sistólica quanto com diastólica,
fato que julgamos merecer distinção, pois diversos trabalhos
apresentados na literatura2-5 têm mostrado que, embora as
pressões sistólica e diastólica se apresentem aumentadas,
a associação com o excesso de peso tem sido observada
apenas ou mais intensamente com a pressão sistólica. Temos
interesse no tema por estarmos conduzindo, em Natal (RN),
projeto que estuda “Sobrepeso/obesidade e sua associação
com demais fatores de risco cardiovascular em Natal – RN”,
procurando identificar a prevalência dos diferentes fatores
de risco cardiovascular e a associação com sobrepeso e
obesidade. Nosso estudo, na regressão logística múltipla
para associação entre sobrepeso/obesidade com outros
fatores de risco cardiovascular, encontrou associação de
sobrepeso/obesidade com renda familiar, pressão arterial
sistólica, história familiar de hipertensão, história familiar
de obesidade, níveis elevados de triglicérides e de HOMA
IR, não apresentando associação com a pressão diastólica.
Também foi encontrado por nós que a idade e o colesterol
HDL aumentados se mostraram como fatores de proteção
quanto ao sobrepeso / obesidade.
Palavras-chave
Obesidade, adolescente, fatores de risco, síndrome
metabólica, índice de massa corporal.
Correspondência: Kerginaldo Paulo Torres •
Rua Antônio Henriques de Melo, 2002 – Capim Macio – 59078-580 – Natal, RN – Brasil
E-mail: [email protected], [email protected]
Artigo recebido em 21/03/11; revisado recebido em 21/03/11; aprovado em 08/04/11.
Referências
179
1. Lavrador MSF, Abbes PT, Escrivão MA, Tadder JA. Riscos cardiovasculares
em adolescentes com diferentes graus de obesidade. Arq Bras Cardiol.
2011;96(3):205-11.
Fatores adicionais de risco cardiovascular associados ao excesso de peso
em crianças e adolescentes: o estudo do coração de Belo Horizonte. Arq
Bras Cardiol. 2006;86(6):408-18.
2. Torres MD, Tormo MA, Campillo C, Carmona MI, Torres M, Reymundo M,
et al. Factores etiológicos y de riesgo cardiovascular en niños extremeños
con obesidad. Su relación con la resistencia a la insulina y la concentración
plasmática de adipocitocinas. Rev Esp Cardiol. 2008;61(9):923-9.
4. Garcia FD, Terra AF, Queiroz AM, Correia CA, Ramos SR, Ferreira QT, et al.
Avaliação de fatores de risco associados com elevação da pressão arterial
em crianças. J Pediatr (Rio J). 2004;80(1):29-34.
3. Ribeiro RQ, Lotufo PA, Lamounier JA, Oliveira RG, Soares JF, Botter DA.
5. Muntner P, He J, Cutler JA, Wildman RP, Whelton PK. Trends in blood
pressure among children and adolescents. JAMA. 2004;291(17):2107-13.
Torres e cols.
Riscos Cardiovasculares em Adolescentes
Carta ao Editor
Carta-resposta
O objetivo do estudo “Riscos cardiovasculares em
adolescentes com diferentes graus de obesidade” foi verificar
a presença de alterações metabólicas e de pressão arterial
e sua associação com o grau de obesidade. Esse conjunto
de situações clínicas define a síndrome metabólica, que
está relacionada ao maior risco para o desenvolvimento das
doenças cardiovasculares1. Apesar da ampla variabilidade
encontrada para a prevalência de síndrome metabólica
em crianças e adolescentes, devido aos diferentes critérios
diagnósticos utilizados, observa-se que ela vem aumentando
concomitantemente ao crescimento da obesidade nessas
faixas etárias2,3.
No nosso estudo, foram utilizados critérios diagnósticos
para hipertensão arterial bem estabelecidos na literatura4,5, e
as análises bivariadas mostraram diferenças significantes entre
as médias da pressão arterial sistólica e também da diastólica,
quando comparados os grupos de adolescentes com maior e
menor grau de obesidade.
As associações com o histórico familiar de obesidade e
hipertensão e com a renda familiar não eram objetivos desse
artigo, mas estão publicadas em outros artigos do grupo, com
a mesma população de adolescentes pós-púberes de escolas
públicas, incluindo adolescentes com sobrepeso e obesidade6-8.
Atenciosamente,
Dra. Maria Silvia Ferrari Lavrador
Referências
1. Lavrador MSF, Abbes PT, Escrivão MA, Tadder JA. Riscos cardiovasculares
em adolescentes com diferentes graus de obesidade. Arq Bras Cardiol.
2011;96(3):205-11.
2. Csábi G, Török K, Jeges S, Molnár D. Presence of metabolic cardiovascular
syndrome in obese children. Eur J Pediatr. 2000;159(1-2):91-4.
3. Lee S, Bacha F, Gungor N, Arslanian S. Comparison of different definitions
of pediatric metabolic syndrome: relation to abdominal adiposity,
insulin resistance, adiponectin, and inflammatory biomarkers. J Pediatr.
2008;152(2):177-84.
4. Cavali MdeL, Escrivão MA, Brasileiro RS, Taddei JA. Metabolic syndrome:
comparison of diagnosis criteria. J Pediatr (Rio J). 2010;86(4):325-30.
5. National High Blood Pressure Education Program Working Group on High
Blood Pressure in Children and Adolescents. The fourth report on the
diagnosis, evaluation, and treatment of high blood pressure in children and
adolescents. Pediatrics. 2004;114 (2 Suppl 4):555-76.
6. Vieira MLC, Sproesser A J. Sociedade Brasileira de Cardiologia. V Diretrizes
brasileiras de hipertensão arterial. Arq Bras Cardiol.2005;89(3):e24-e79.
7. Silveira D, Taddei JA, Escrivão MA, Oliveira FL, Ancona-Lopez F. Risk factors
for overweight among Brazilian adolescents of low-income families: a casecontrol study. Public Health Nutr 2006;9(4):421-8.
8. Cobayashi F, Oliveira FL, Escrivão MA, Daniela S, Taddei JA. Obesidade e
fatores de riscos cardiovasculares em adolescentes de escolas públicas. Arq
Bras Cardiol 2010;95(2):200-5.
Arq Bras Cardiol 2011; 97(2) : 179-180
180
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Carta ao Editor
Estamos Preparados para Avaliar Atletas Jovens?
Are We Ready to Assess Young Athletes?
Maria Cecília Solimene e Max Grinberg
Instituto do Coração do Hospital das Clinicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, SP - Brasil
Caro Editor,
Peidro e cols.1 publicaram interessante ponto de vista
sobre a necessidade de um consenso para a triagem préparticipação do atleta jovem. Os autores relataram as diferenças
nas abordagens americana e italiana quanto à avaliação
dos jovens que pretendem praticar esportes competitivos;
a Sociedade Americana de Cardiologia não indica o exame
eletrocardiográfico (ECG) de 12 derivações, pela alta taxa de
resultados falso-positivos, mas a morte súbita de atletas italianos
foi reduzida em 89%, pela inclusão do ECG de 12 derivações1.
Os autores admitem que no Brasil o número de médicos
com proficiência na interpretação do ECG do atleta é menor
do que o desejável. Gostaríamos de entender a causa dessa
afirmação: haveria entre nós poucos médicos interessados
na Cardiologia Esportiva, ou os médicos que a praticam não
estão devidamente habilitados?
Palavras-chave
Atletas, triagem, medicina esportiva, capacitação,
eletrocardiografia/utilização, Brasil.
Em nosso meio, Matos e cols.2 descreveram
detalhadamente as alterações do ECG provocadas pelo
treinamento físico, que devem ser diferenciadas de reais
anormalidades, incluindo a necessidade da interpretação
cuidadosa de critérios isolados de voltagem de QRS para
hipertrofia ventricular esquerda.
O ecocardiograma e o teste ergométrico não são
recomendados para a avaliação de rotina na triagem dos
atletas; entretanto, Peidro e cols.1 enfatizam que as equipes
nacionais italianas utilizam o ecocardiograma como primeiro
passo na triagem dos atletas competitivos, postura com a qual
concordamos, haja vista a crescente ocorrência de mortes
súbitas nos campos esportivos. Não estaria indicado também o
teste ergométrico pelo possível desencadeamento de arritmias
ventriculares graves sob esforço, ou até mesmo de isquemia,
embora a doença arterial coronariana seja pouco prevalente
nessa faixa etária?
A Medicina Esportiva no Brasil tem evoluído, no sentido
de formar profissionais capacitados a avaliar adequadamente
o jovem que se dispõe a seguir a carreira esportiva; no
entanto, concordamos com os autores que estamos na hora
de padronizar as condutas e redigir nosso próprio consenso.
Correspondência: Maria Cecília Solimene •
Unidade Clínica de Valvopatias - Instituto do Coração – HC-FMUSP - Av. Dr. Enéas de Carvalho Aguiar, 44 - Bloco II - 05403-000 - São Paulo, SP - Brasil
E-mail: [email protected]
Artigo recebido em 29/03/11; revisado recebido em 29/03/11; aceito em 26/04/11.
Referências
1. Peidro R, Froelicher V, Stein R. Triagem pré-participação do atleta jovem: é
essa a hora para um consenso? Arq Bras Cardiol. 2011;96(3):e50-e52.
2. Matos LDNJ, Pastore CA, Samesima N, Franco FGM. Alterações do
eletrocardiograma de repouso com o treinamento físico. In: Negrão CE,
Barretto ACP, ed. Cardiologia do exercício: do atleta ao cardiopata. 3ªed.
São Paulo: Editora Manole; 2010. p. 177-200.
Carta-resposta
Em seguida, perguntam se em nossa opinião haveria entre
nós poucos médicos interessados na Cardiologia Esportiva
ou se os médicos que a praticam não estariam devidamente
habilitados para interpretação do eletrocardiograma do atleta?
Prezado Editor dos Arquivos Brasileiros de Cardiologia,
Agradecemos a carta encaminhada ao Editor do ABC
referente ao nosso Ponto de Vista intitulado “Triagem préparticipação do atleta jovem: é essa hora para um consenso?1”
Nela, os autores relatam não compreender com exatidão
o que desejamos dizer ao escrever que “em países como
Brasil o número de médicos com proficiência na interpretação
do eletrocardiograma do atleta é menor do que o desejável”.
181
Na verdade, não se trata nem de uma coisa, nem de outra.
Nossa consideração diz respeito ao fato de, generalizando, não
haver entre os cardiologistas proficiência na interpretação desse
exame nesse grupo em particular (atletas). Acreditamos que os
Cardiologistas do Exercício e do Esporte brasileiros saibam, sim,
ao deparar com as nuanças do eletrocardiograma do atleta,
interpretá-las com proficiência. No entanto, esses são poucos
Solimene e Grinberg
Estamos preparados para avaliar atletas jovens?
Carta ao Editor
em nosso meio, se comparados ao número de cardiologistas que
não são habituados a lidar com atletas em todas as suas facetas.
Um segundo questionamento dos autores diz respeito a
indicação do teste ergométrico pelo possível desencadeamento
de arritmias ventriculares graves sob esforço. Como
ergometristas praticantes e amantes do método, é nossa
opinião que esse exame propedêutico não deva fazer
parte da avaliação pré-participação de todo atleta jovem,
podendo sim ser indicado em casos específicos, assim como
o ecocardiograma ou outros exames de maior complexidade.
Aproveitamos o ensejo para reforçar a ideia de que a
educação científica atualizada (embasada nas melhores
evidências disponíveis), aliada à prática individual
(experiência), forma o binômio ótimo para o atendimento de nossos clientes. Nesse particular, a triagem préparticipação do atleta jovem ainda apresenta zonas cinzentas,
as quais nós, cardiologistas do Exercício e do Esporte latinoamericanos, podemos sim ajudar a preencher1.
Atenciosamente,
Roberto Peidro,
Victor Froelicher
e Ricardo Stein
Referências
1. Peidro R, Froelicher V, Stein R. Triagem pré-participação do atleta jovem: é
essa a hora para um consenso? Arq Bras Cardiol. 2011;96(3):e50-e52.
Arq Bras Cardiol 2011; 97(2) : 181-182
182
Veja na Próxima Edição
Vol. 97, Nº3, Setembro 2011
Artigos Originais
Cirurgia Cardíaca – Adultos
Trimetazidina na Injúria de Isquemia e Reperfusão em Cirurgia de Revascularização do Miocárdio
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Cavalcanti Assunção, Francisco Bottino, Káttia Gerúndio de Carvalho, Alberto Valência
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Disfunção Miocárdica e Alterações no Trânsito de Cálcio Intracelular em Ratos Obesos
Ana Paula Lima-Leopoldo, André S. Leopoldo, Mário M. Sugizaki, Alessandro Bruno, André F. Nascimento, Renata A. M.
Luvizotto, Silvio A. Oliveira Junior, Edson Castardeli, Carlos R. Padovani, Antonio C. Cicogna
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Impacto da Disfunção Renal na Evolução Intra-hospitalar após Cirurgia de Revascularização Miocárdica
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Ibañez, Patrícia Viana da Silva, Jorge A. Farran, Vivian Lerner Amato, Pedro Silvio Farsky
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Impacto da Hipertensão Arterial no Remodelamento Ventricular, em Pacientes com Estenose Aórtica
João Carlos Hueb, João T. R. Vicentini, Meliza Goi Roscani, Daniéliso Fusco, Ricaro Mattos, Silméia Garcia Zanatti, Katashi
Okoshi, Beatriz B. Matsubara
183
16 a 19 setembro
Porto Alegre
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Artigo Original - Arquivos Brasileiros de Cardiologia