PODER JUDICIÁRIO
SÃO PAULO
SEGUNDO TRIBUNAL DE ALÇADA CIVIL
Décima Câmara
AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 615.009-0/1 – MOGI-GUAÇU
Agravante: Olga Ribeiro Rodrigues
Agravado: José Luis da Silva
FRAUDE À EXECUÇÃO. CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL,
ARTIGO 593, INCISO II. A Agravante não acenou com a
existência de outros bens, evidenciando que a alienação do
imóvel no curso da Ação de Execução, único passível de
garantir a eficácia do processo e o recebimento do crédito, foi
realizada em fraude por colocá-la em situação de insolvência.
O fato de ter sido levada a efeito com “autorização judicial”
não representa obstáculo ao decreto de ineficácia perante o
credor nesta ação. O que importa, e isso não foi negado, é
que o eventus damni restou caracterizado.
Voto nº 3.986
Visto.
OLGA RIBEIRO RODRIGUES interpôs Recurso de
Agravo de Instrumento contra despacho proferido pelo JUÍZO DE DIREITO
DA 2ª VARA CÍVEL DA COMARCA DE MOGI-GUAÇU, que declarou a
ineficácia da alienação de bens por fraude à Ação de Execução que lhe
move JOSÉ LUIS DA SILVA, partes qualificadas nos autos.
Negada a liminar e cumprido o disposto no artigo 526 do
Código de Processo Civil, o Agravado deixou transcorrer in albis o prazo
para resposta.
É o relatório.
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Em 4/9/91 JOSÉ LUIS DA SILVA (Agravado) foi
contratado por OLGA RIBEIRO RODRIGUES (Agravante) para:
“... patrocinar a causa do(s) contratante(s), e que consiste
em defendê-la nos autos do proc. 309/91 ‘Sep. de Corpos’; proc. 554/91
‘Busca e Apreensão’ e proc. 690/91 ‘Separação Judicial Litigiosa’, todos
movidos contra Atílio Ap. Gandolfo Rodrigues, perante a 1ª Vara Cível
de Mogi Guaçu/SP., e ainda propor contra o mesmo, em nome dos
filhos uma AÇÃO DE ALIMENTOS ...” (folha 10).
Ajustaram o valor de Cr$546.000,oo para a remuneração
dos serviços de advocacia e que deveria ser pago em 90 dias após a
assinatura do contrato (Cláusula 3ª).
Todos os processos terminaram em 19/2/92 por acordo
homologado na audiência de conciliação e julgamento da Ação de
Alimentos (Proc. nº 906/91 – folha 22), onde ficou estabelecido:
“... O imóvel de propriedade do casal será desocupado pelo
separando até o dia 30 de março vindouro e desde já colocado à venda.
O produto obtido será partilhado pelo casal, ou melhor, pelos
separandos ...” (grifou-se).
Em 27/5/92 JOSÉ LUIS DA SILVA (Agravado)
ingressou com Ação de Execução contra OLGA RIBEIRO RODRIGUES
(Agravante) para recebimento dos honorários de Advogado contratado.
A citação ocorreu em 9/6/92
(folha 11 vº).
Em 22/6/92 OLGA RIBEIRO RODRIGUES (Agravante)
ofereceu Embargos à Execução. O traslado é incompleto mas consta que
alguns bens móveis que foram penhorados resultaram adjudicados para
JOSÉ LUIS DA SILVA
(folhas 12 e 16).
Em 15/3/93 o “imóvel de propriedade do casal” foi alienado
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para Clayton Dal’ava
(folha 27).
Com certeza o produto da venda deve ter
sido partilhado.
Em 19/8/99 JOSÉ LUIS DA SILVA (Agravado)
peticionou requerendo, entre outras coisas, fosse declarada:
“... a ineficácia da alienação realizada por OLGA RIBEIRO
RODRIGUES, no tocante à sua meação (50%), relativamente ao imóvel
matriculado sob nº 18.351, no cartório de Registro de Imóveis desta
comarca ...” (folha 21).
Após a manifestação de OLGA RIBEIRO RODRIGUES
(Agravante) e a réplica de JOSÉ LUIS DA SILVA (Agravado) sobreveio
a decisão agravada:
“... a executada era proprietária de parte ideal – 50% - do
imóvel acima referido, o qual também assegurava a eficácia da presente
execução.
Desse modo, havendo citação da executada antes da venda
do imóvel, tal alienação é ineficaz ...” (folha 31).
Diz a Agravante OLGA RIBEIRO RODRIGUES que “...
jamais poderia ser tal alienação considerada fraudulenta, uma vez que o
agravado tinha pleno conhecimento da autorização judicial para alienar o ...
imóvel, e nada fez para impedir ou penhorar a meação da agravante antes da
venda ...”
(folha 4).
A fraude à execução difere daquela perpetrada contra
credores. Embora ambas constituam condutas reprovadas pela lei, a
fraude à execução se afigura muito mais grave, pois, afora evidenciar a
intenção de violar o direito do credor, atenta contra a atuação
jurisdicional.
Por essa razão não se exige ação própria para anulação ou
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desconstituição da alienação fraudulenta. É, por força da lei, ineficaz
perante o credor, que apenas precisa demonstrar o eventus damni, ou
seja, que o devedor tornou-se insolvente em decorrência da alienação.
A insolvência é verificada pela não existência de outros
bens passíveis de constrição ou da insuficiência dos que já foram
penhorados. A Agravante não acenou com a existência de outros bens,
evidenciando que a alienação do imóvel no curso da Ação de Execução,
único sujeito de garantir a eficácia do processo e o recebimento do
crédito, foi realizada em fraude por colocá-la em situação de insolvência.
Remanesceu,
então,
como
único
bem
passível
de
constrição aquele alienado pela Agravante no curso de demanda. O r.
Juízo analisou as circunstâncias envolvendo a venda do imóvel e concluiu
pela caracterização da hipótese do artigo 593, inciso II, do Código de
Processo Civil.
O fato de ter sido realizada com “autorização judicial” não
representa obstáculo ao decreto de ineficácia perante o credor nesta
ação. O que interessa para o processo, e isso não foi sequer infirmado
pela Agravante, é que o eventus damni restou caracterizado.
A Agravante, ao que se afigura, adotou o ato de
autorização judicial como substancial em prejuízo da homologação do
acordo entabulado entre ela e seu ex-marido, sobre os direitos
patrimoniais disponíveis.
Na execução por quantia certa a garantia é fornecida pela
penhora. Eventual excesso representa questão incidente e, após a
avaliação e até antes da arrematação ou da adjudicação, poderão
eventuais interessados requerer a substituição do bem penhorado por
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dinheiro, conforme artigo 668 do Código de Processo Civil.
A Lei nº 8.009, de 29/3/90, estabeleceu, com ressalvas,
que o imóvel residencial do casal ou da entidade familiar para moradia
permanente é impenhorável. O benefício legal não pode ser invocado
pela Agravante porque, quando o imóvel foi alienado nele não residia o
casal, que já se encontrava separado, nem a entidade familiar que se
formou com a permanência dos filhos sob a guarda da mãe. É o que
constou do acordo homologado: “... a separanda comparecerá na residência
que está o separando para retirar os bens ...” (folha 22).
“Se o executado não nomeia bens à penhora e aqueles
localizados não têm valor suficiente para garantir a satisfação integral
do crédito exeqüendo e, a par disso, ainda aliena bens imóveis que
integravam seu patrimônio, resta caracterizada a hipótese prevista no
artigo 593, II, do Código de Processo Civil, impondo a adoção das
providências judiciais pertinentes 1”.
“Os atos de má-fé, em geral, prescindem de prova direta,
bastando a sua demonstração por indícios e circunstâncias, e, no
presente caso, presume-se a existência de fraude até que se realize
prova em contrário 2”.
“Considera-se como bem de família, aquele imóvel que é
utilizado
pela
entidade
familiar
para
moradia
permanente;
indubitavelmente, aquele que não é utilizado para esse fim, pode ter sua
constrição judicial determinada 3”.
Com o não acolhimento das razões da Agravante não há
que se falar em má-fé do Agravado nem em indenização pelos “...
prejuízos que sofreu e continuará a sofrer ...”
(folha 5).
Dano, derivado do latim
damnun, de forma genérica quer dizer todo o mal ou ofensa sofrido por
1 - 2º TACivSP - AI 519.312 - 7ª Câm. - Rel. Juiz ANTONIO MARCATO - J. 3.2.98.
2 - JTA (Lex) 173/302.
3 - 2º TACivSP - Ap. c/ Rev. 386.848 - 3ª Câm. - Rel. Juiz TEIXEIRA DE ANDRADE - J. 24.5.94.
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alguém. No sentido jurídico é apreciado em razão do efeito que produz.
É o prejuízo causado.
Acena-se, sem propósito de influir no mérito da ação
principal, sobre a possibilidade de acerto entre as partes, tendo em
consideração o valor atualizado dos bens adjudicados e o restante do
débito, com igual parâmetro de atualização, com parte do produto da
venda, ou de origem outra, para o fim da lide, evitando-se transtornos e
até eventual prejuízo a terceiro, que deverá ter seu direito resguardado.
Em face ao exposto, nega-se provimento ao recurso com
observação.
IRINEU PEDROTTI
Relator
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