fls. 412 PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DA BAHIA Comarca de Salvador 1ª Vara da Infância e Juventude Justiça Gratuita Rua Agnelo de Brito, n° 72, Garibaldi - CEP 40210-245, Fone: 3203-9300, Salvador-BA E-mail: [email protected] [email protected] SENTENÇA 0562425-03.2014.8.05.0001 Ação Civil Pública - Entidades de atendimento ''''''Ministério Público do Estado da Bahia. e outro ''Estado da Bahia e outro Vistos., O Ministério Público e a Defensoria Pública ajuizaram a presente Ação Civil Pública em face do Estado da Bahia e da Fundação da Criança e do Adolescente (FUNDAC) aduzindo em síntese que os adolescentes apreendidos na Delegacia do Adolescente Infrator, lá permanecem em condições sub humanas, sem tomar banho, sem escovar os dentes, em celas de contenção sujas, ambientes fétidos, passando privações como sede, fome e frio. Afirmam os autores que os adolescentes encontram-se em acomodações inadequadas, sem colchões e sem a higiene adequada, causando sofrimento aos mesmos. Nos relatórios apresentados, informam que o serviço de limpeza por muitas vezes são realizados pelos próprios servidores da Delegacia, pois os funcionários da empresa terceirizada deixam de realizar o referido serviço por conta da falta de pagamento da empresa que os contratou. Ressalta que a situação que se encontram os adolescentes encaminhados para o referido local, é degradante e desumana, comprometendo a saúde e a integridade física dos mesmos. Requereram que fosse declarada liminarmente a interdição da Delegacia Especializada do Adolescente, desta Capital, vedando-se o recebimento dos adolescentes, remanejando-se os que ali já estivessem apreendidos para local apropriado, que fosse determinado à Autoridade Policial que sendo impossível a apresentação imediata ao representante do Ministério Público, procedesse o encaminhamento do adolescente apreendido em flagrante de prática de ato infracional à entidade de atendimento, que fizesse a apresentação ao representante do Ministério Público e que fosse determinado ao Estado da Bahia para que procedesse a devida dotação orçamentária para o atendimento do quanto requerido. A peça inicial se fez acompanhar dos documentos de fls. 50/127. A Fundação da Criança e do Adolescente – FUNDAC, apresentou contestação às fls. 342/359, arguindo a ilegitimidade passiva da Fundac e a ilegitimidade passiva do Estado da Bahia. O Estado da Bahia apresentou contestação às fls.376/395, arguindo preliminarmente a incompetência absoluta e a inépcia do pedido. A Defensoria Pública reiterou o pedido inicial, às fls. 402/404, requerendo o deferimento da ação em todos os seus termos, afastando a pretensão da parte ré. Bem como também o fez o Ministério Público às fls. 405/411. Este é o relatório. Decido. No que se refere a preliminar que suscita a ilegitimidade passiva da Fundac e do Estado da Bahia, a mesma não merece prosperar, posto que sendo a Fundação órgão criado pelo Estado da Bahia e como a própria denominação assegura, deve tratar dos interesses e do bem estar da criança e do adolescente, esta se encontra, tal qual o Estado da Este documento foi assinado digitalmente por WALTER RIBEIRO COSTA JUNIOR. Se impresso, para conferência acesse o site http://esaj.tjba.jus.br/esaj, informe o processo 0562425-03.2014.8.05.0001 e o código 1ACED69. Processo nº: Classe Assunto: Autor: Réu: fls. 413 PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DA BAHIA Comarca de Salvador 1ª Vara da Infância e Juventude Justiça Gratuita Rua Agnelo de Brito, n° 72, Garibaldi - CEP 40210-245, Fone: 3203-9300, Salvador-BA E-mail: [email protected] [email protected] Art. 148. A Justiça da Infância e da Juventude é competente para: IV- conhecer de ações civis fundadas em interesses individuais, difusos ou coletivos afetos à criança e ao adolescente, observado o disposto no art. 209. Por sua vez, o artigo 209 do mesmo diploma legal, dispõe que as ações previstas no capítulo que trata, serão propostas no foro local onde ocorreu ou deve ocorrer a ação ou omissão, cujo juízo terá competência absoluta para processar a causa. Dessa forma, trata-se, no caso, de competência absoluta fixada por lei, razão pela qual fica rechaçada esta preliminar. Em relação a alegação de que o pedido é indeterminado, não há o que se falar, uma vez que encontra-se na exordial, os fatos narrados, evidenciando com clareza o que deve ser feito para garantir o cumprimento dos preceitos legais, e efetivar as garantias legais ao adolescentes apreendidos. Sustentou o acionado a violação do princípio da separação dos poderes, uma vez que a procedência da ação representaria interferência nos serviços públicos do Estado e estaria impondo restrições a gestão do serviço público. Não se trata de decidir como gerenciar, trata-se de decidir que seja cumprida a lei, nesse caso, atendendo as garantias legais dos adolescentes. Deve atuar o Poder Judiciário de modo que sejam as lesões reparadas, suprimidas. Não cabe ao judiciário avaliação dos tramites administrativos do Estado, tal avaliação cabe a uma boa administração, se é necessário a realização de uma licitação para o cumprimento do que determina o Estatuto da Criança e do Adolescente, no caso, ou seja, a lei, que a licitação seja feita. Logo, afasto a preliminar suscitada. Ultrapassadas as preliminares, passo ao exame do mérito. Ao Poder Público cabe atender as garantias fundamentais , de modo que preserve e assegure a dignidade da pessoa humana. A questão versa sobre direitos indisponíveis, sendo eles direitos à saúde e a integridade física dos adolescentes. In casu, tratando-se de saúde e integridade física dos adolescentes, não paira qualquer dúvida de que se fazia urgente a sua preservação. Eventual demora na prestação jurisdicional findaria por causar danos irreversíveis, restando evidenciados os pressupostos necessários para a concessão da tutela pleiteada. O Acionado arguiu que não há omissão por parte do ente público, e que é apenas evidente que não existem recursos para a consecução de resultados ideais no serviço público em todos os setores e em todos os locais ao mesmo tempo. Ora, ocorre que tal discurso vem contribuindo apenas para a malversação generalizada dos recursos públicos pelos respectivos gestores – o que, na prática, implica o não cumprimento do dever de prestar pelo Estado a nenhum de seus cidadãos: quer sob a forma preventiva, quer sob a forma Este documento foi assinado digitalmente por WALTER RIBEIRO COSTA JUNIOR. Se impresso, para conferência acesse o site http://esaj.tjba.jus.br/esaj, informe o processo 0562425-03.2014.8.05.0001 e o código 1ACED69. Bahia legitimada para figurar no polo passivo da demanda, estando clara, a formação de litisconsórcio, motivos pelos quais, rejeito a preliminar suscitada. No que toca à competência do Juízo, temos que o artigo 148 do Estatuto estabelece a competência da Vara da Infância e Juventude, sendo competência ratione materiae e, portanto, de natureza absoluta. fls. 414 PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DA BAHIA Comarca de Salvador 1ª Vara da Infância e Juventude Justiça Gratuita curativa/restauradora. Desse modo, resta ao Judiciário de forma coercitiva, tendo em vista a inafastabilidade da jurisdição, recordar ao Administrador sua obrigação institucional de utilizar o dinheiro público com os seus administrados no cumprimento do interesse popular, o qual deve se sobrepor ao de qualquer individuo que se encontre no exercício da gestão da coisa pública. Ademais, nem se venha a dizer que, diante da imensa carga tributária suportada pelos cidadãos brasileiros e dos sucessivos recordes de arrecadação que o país vem alcançando, o Judiciário ao assim proceder estaria contribuindo com a falência estatal, pois tal alegação além de desproporcional carece de suporte fático. Frisa-se que Carta Federal é expressa ao assegurar o direito à vida e o direito à saúde como Garantias Fundamentais, sendo direito de todos e dever do Estado e que tais normas prescindem de outras para a sua aplicação, consoante o art. 5°, § 1º da CF/88, ao dispor que “as normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata”. No caso em concreto, é preciso destacar a prioridade que a lei assegura à criança e ao adolescente, quanto à primazia de receber proteção e socorro em quaisquer circunstâncias, bem como à precedência de atendimento nos serviços públicos ou de relevância pública, orientações que solidificam o princípio da prioridade absoluta consagrado no âmbito da Infância e Juventude. Não restando dúvida que o direito a saúde e a integridade física dos adolescentes restam violados pela omissão do Poder Público na medida em que não se encontram assegurados os direitos e serviços necessários à manutenção dos adolescentes, inclusive, de suas vidas. Observa-se, ainda, que o objetivo último da Constituição da República, de assegurar ao cidadão o direito à saúde, deve ser atendido de forma ampla – sobretudo quando se tratar de criança e adolescente em razão dos Princípios da Proteção Integral e da Prioridade Absoluta vigente no ordenamento jurídico pátrio. Nessa seara é que se encontra o caso concreto trazido a análise, pois os adolescentes expostos que se encontram a situação sub humana que a condição atual da delegacia impõe, necessitam de meios e serviços que de fato atendam e contribuam com a preservação de suas vidas, da dignidade humana e saúde. Diante do exposto e tudo mais que dos autos consta, julgo procedente o pedido contido na inicial para, determinar ao Estado da Bahia, interdição da Delegacia Especializada do Adolescente da Capital do Estado da Bahia, vedando-se o recebimento de adolescentes, mesmo que a título de provisório e precário; remanejando-se os que ali estiverem apreendidos para local apropriado, qual seja prioritariamente no Pronto Atendimento da FUNDAC e/ou sendo impossível, encaminhe-se para as suas unidades de internação (CASE), observando-se sua peculiar situação de inimputável, sob pena de multa de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) por cada dia de atraso. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Salvador(BA), 16 de setembro de 2015. Juiz Walter Ribeiro Costa Júnior Titular Este documento foi assinado digitalmente por WALTER RIBEIRO COSTA JUNIOR. Se impresso, para conferência acesse o site http://esaj.tjba.jus.br/esaj, informe o processo 0562425-03.2014.8.05.0001 e o código 1ACED69. Rua Agnelo de Brito, n° 72, Garibaldi - CEP 40210-245, Fone: 3203-9300, Salvador-BA E-mail: [email protected] [email protected]