TRIBUNAL DE JUSTIÇA PODER JUDICIÁRIO São Paulo Registro: 2011.0000142592 ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos do Apelação nº 916947792.2005.8.26.0000, da Comarca de São José do Rio Pardo, em que são apelantes JUSTIÇA PÚBLICA, ROQUE LUIS LOCATELLI e ITAGIBA BALDASSIM sendo apelados ROQUE LUIS LOCATELLI, ITAGIBA BALDASSIM e JUSTIÇA PÚBLICA. ACORDAM, em 4ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "Deram provimento, nos termos do acórdão e, de ofício, decretaram a extinção da punibilidade, pela ocorrência da prescrição da pretensão punitiva. V. U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão. O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores SALLES ABREU (Presidente) e EUVALDO CHAIB. São Paulo, 9 de agosto de 2011. EDUARDO BRAGA RELATOR ASSINATURA ELETRÔNICA TRIBUNAL DE JUSTIÇA PODER JUDICIÁRIO São Paulo *_ VOTO N. 17.038 APELAÇÃO CRIMINAL COM REVISÃO N. 9169477-92.2005.8.26.0000 (Outro n.: 993.05.051015-8) / SÃO JOSÉ DO RIO PARDO 2a Vara Judicial Processo n. 299/2000 Juiz de Primeira Instância: André Antônio da Silveira Alcântara APELANTES: ROQUE LUIS LOCATELLI, ITAGIBA BALDASSIM e MINISTÉRIO PÚBLICO APELADOS: OS MESMOS LOTEAMENTO OU DESMEMBRAMENTO DO SOLO PARA FINS URBANOS SEM AUTORIZAÇÃO DO ÓRGÃO PÚBLICO COMPETENTE, BEM COMO INTENÇÃO DE VENDER, PROMETER A VENDA E RESERVAR LOTES. LOTEAMENTO NÃO REGISTRADO NO C.R.I. COMPETENTE ARTIGOS 50 E 51 DA LEI N. 6.766/79. (A) NÃO OCORRÊNCIA DA PRESCRIÇÃO ENTRE A DATA DOS FATOS (1996 E MARÇO DE 2001) E A DATA DE RECEBIMENTO DA DENÚNCIA. ARGUIÇÃO PRELIMINAR DOS ACUSADOS AFASTADA. (B) MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. SENTENÇA CONDENATÓRIA MANTIDA, AUMENTADAS, NO ENTANTO, AS PENAS DOS ACUSADOS, PROVENDO-SE NESSA PARTE, O RECURSO MINISTERIAL. (C) OCORRÊNCIA DA PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA ESTATAL, MODALIDADE SUPERVENIENTE, TENDO EM CONTA AS PENAS EM CONCRETO, CONTADO O PRAZO PRESCRICIONAL ENTRE A DATA DE PUBLICAÇÃO DA SENTENÇA E ESTA DATA. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE DOS AGENTES, DE OFÍCIO, COM FULCRO NO ARTIGO 107, IV, DO CÓDIGO PENAL. APELAÇÃO Nº 9169477-92.2005.8.26.0000 SÃO JOSÉ DO RIO PARDO VOTO Nº 17.038 - 2/9 TRIBUNAL DE JUSTIÇA PODER JUDICIÁRIO São Paulo Vistos. Ao relatório da r. sentença que julgou parcialmente procedente a ação penal, cujo relatório se adota, acrescenta-se que o acusado ITAGIBA BALDASSIM foi condenado pela prática do crime previsto no artigo 50, inciso I, parágrafo único, inciso I, da Lei n. 6.766/79 e o réu ROQUE LUIZ LOCATELLI pela prática do crime consubstanciado no artigo 51 da Lei n. 6.766/79, à pena de 1 ano de reclusão, regime aberto, e pecuniária de 10 vezes o maior salário mínimo vigente no país. Nos termos do artigo 44 do CP, o MM. Juiz substituiu a pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, consistente na prestação de serviços à comunidade. Inconformado, a JUSTIÇA PÚBLICA apelou do julgado, buscando o aumento da pena imposta aos acusados, sustentando que as circunstâncias do artigo 59 do CP lhes são desfavoráveis, especialmente no que diz respeito ao grau de reprovabilidade da conduta, motivos, circunstâncias e consequências do crime (fls. 467/472). Vieram as contrarrazões (fls. 480/487 e 489/493). O acusado ROQUE LUIS LOCATELLI alega que ocorreu a prescrição da pretensão punitiva estatal na modalidade retroativa, devendo ser declarada extinta sua punibilidade (fls. 494/498). ITAGIBA BALDASSIM também aduz a ocorrência da prescrição da pretensão punitiva estatal na modalidade intercorrente, pois decorrido o lapso temporal de 4 anos entre a data da consumação do crime (1996) e o recebimento da denúncia (18 de março de 2002). No mérito, postula a absolvição ao fundamento de que a área objeto APELAÇÃO Nº 9169477-92.2005.8.26.0000 SÃO JOSÉ DO RIO PARDO VOTO Nº 17.038 - 3/9 TRIBUNAL DE JUSTIÇA PODER JUDICIÁRIO São Paulo trata-se de um condomínio e não loteamento em local de preservação ambiental (fls. 500/511). Os recursos foram processados e respondidos (fls. 513/527). Nesta instância, a douta Procuradoria de Justiça opinou pelo afastamento da preliminar de extinção da punibilidade dos agentes e provimento do recurso ministerial (fls. 533/546). É O RELATÓRIO. Inicialmente, esclarece-se que o presente feito foi distribuído originalmente, em 3.11.2005, ao Desembargador HÉLIO DE FREITAS, que integrava esta E. Câmara, atualmente aposentado (fls. 547) e em 25.6.2010 a seu sucessor o Desembargador HÉLIO DE FREITAS (fls. 548). Entretanto, os autos só vieram conclusos a este Relator em gabinete em 12.5.2011 (fls. 175). Frise-se ainda que este Desembargador, ora relator do presente feito, foi removido para esta E. Quarta Câmara em 11.11.2010, conforme publicação no D.J. Eletrônico na mesma data. Quanto ao mais, segundo a denúncia, entre o ano de 1996 e março de 2001, nos lugares conhecidos como “Fazenda Pocinha” e “Fazenda Barro Amarelo ou Jacutinga e Pocinha”, no município de São José do Rio Pardo, os acusados, agindo com unidade de propósitos, efetuaram loteamento ou desmembramento do solo para fins urbanos sem autorização do órgão público competente e em desacordo com as disposições da Lei n. 6.766/79, além do que, por meio de vendas, promessas de venda e reservas de lotes, manifestaram a intenção de vender lotes em loteamento ou APELAÇÃO Nº 9169477-92.2005.8.26.0000 SÃO JOSÉ DO RIO PARDO VOTO Nº 17.038 - 4/9 TRIBUNAL DE JUSTIÇA PODER JUDICIÁRIO São Paulo desmembramento não registrado no RI competente. Pois bem. Não há falar em ocorrência da prescrição da pretensão punitiva estatal na modalidade retroativa, uma vez que não fora ultrapassado o lapso prescricional de 4 anos entre a data da última venda efetuada e o recebimento da denúncia. Neste ponto, a propósito, adota-se como fundamento da decisão, nos termos do artigo 252 do Regimento Interno deste E. Tribunal de Justiça, o teor do parecer exarado pela douta Procuradoria de Justiça a fls. 533/546, no sentido de que o que caracteriza a consumação dos crimes narrados é a data das vendas realizadas, pois o loteamento já existia quando as vendas foram viabilizadas, e obvio, da última venda realizada, março de 2001. Recebimento da denúncia: 18.3.2002. Pena em concreto: 1 ano de reclusão. Prazo prescricional: 4 anos. Não ocorrência da prescrição entre a data dos fatos e a de recebimento da denúncia. Portanto, afasta-se a preliminar suscitada pelas Defesas dos réus. No pertinente ao mérito, irretocável o julgado tanto que apenas um dos apelantes busca se defender alegando que o local não se tratava de área de preservação permanente, mas sim de um condomínio. De fato, a materialidade delitiva comprovou-se pelo laudo de vistoria de fls. 26/27, documento de fls. 119/162 e laudo pericial de fls. 188/193, além dos instrumentos firmados de compra e venda dos APELAÇÃO Nº 9169477-92.2005.8.26.0000 SÃO JOSÉ DO RIO PARDO VOTO Nº 17.038 - 5/9 TRIBUNAL DE JUSTIÇA PODER JUDICIÁRIO São Paulo lotes (fls. 210/238). Como bem anotou o julgador, tais documentos revelam a negociação de glebas de terras em partes ideais para fins de urbanização em desrespeito à área de preservação permanente e sem o registro dos órgãos públicos responsáveis pela fiscalização nesta área específica. Realmente, a prova da falta do registro do loteamento junto ao Cartório de Registro de Imóveis fora comprovada pelo ofício de fls. 46. Em relação à autoria, o apelante Itagiba confessou a venda de lotes de sua propriedade com o desmembramento área e para fins de urbanização, sem autorização pelo órgão competente (fls. 313). Sua confissão fora corroborada pelos depoimentos das testemunhas ouvidas a fls. 338/343, 365, 373/374 e 381/382, adquirentes dos lotes ilegais (Walter Bergamasso, José Roberto Emidgio, Paulo Luvezutti, Miguel Esteves, Valdir maneghetti, Marco Antônio Catalano, Richard Celso Amato, Maria Aparecida Faccioli Valdez e Miguel Benedito Escudeito). As provas dos autos ainda revelam que o acusado Roque Luis Locatelli concorreu para a prática delitiva ao elaborar, na condição de engenheiro e com conhecimento das proibições legais, o memorial descritivo de cada lote, de acordo com os documentos juntados aos autos e depoimentos das testemunhas ouvidas. Praticou, com isso, o crime previsto no artigo 51 da Lei de Parcelamento do Solo Urbano, a despeito de afirmar não ter ciência da venda dos lotes sem observância das formalidades legais pelo corréu. APELAÇÃO Nº 9169477-92.2005.8.26.0000 SÃO JOSÉ DO RIO PARDO VOTO Nº 17.038 - 6/9 TRIBUNAL DE JUSTIÇA PODER JUDICIÁRIO São Paulo A propósito, neste ponto, bem destacou a r. sentença proferida: “Se estes documentos eram ou não suficientes a principiar a regularização do empreendimento, pouco importa, diante da inocultável circunstância de que foi fator importante na implementação do loteamento irregular, já que utilizados na apresentação aos pretensos compradores, pelo que podiam, inclusive, escolher suas áreas” Diante de todo o exposto a condenação dos réus era mesmo de rigor. No que toca a dosimetria da pena, tem razão o Ministério Público. Com efeito, a pena-base dos acusados deve ser majorada para o dobro do mínimo legal, ou seja, 2 anos de reclusão e pagamento de 20 vezes o maior salário mínimo vigente no país, tendo em vista que o crime cometido visava o lucro ilícito em detrimento de terceiros e da coletividade, envolveu grande área, causou graves danos ao meio ambiente e prejudicou, como expendido, dezenas de consumidores. Assim, pesam contra ambos o elevado grau de censurabilidade de suas condutas, bem como a motivação abjeta do crime e as graves consequências do crime. Na segunda etapa de fixação, registra-se que o acusado Itagiba confessou o crime, de modo que apenas em seu favor deve ser reconhecida a atenuante da confissão para reduzir-lhe a pena em 1/6, o que resulta na pena definitiva, a falta de outras circunstâncias modificadoras, de 1 ano e 8 meses de reclusão, além do pagamento de 16 vezes o maior salário mínimo vigente no país. APELAÇÃO Nº 9169477-92.2005.8.26.0000 SÃO JOSÉ DO RIO PARDO VOTO Nº 17.038 - 7/9 TRIBUNAL DE JUSTIÇA PODER JUDICIÁRIO São Paulo Quanto ao réu Roque, tendo em vista que ele não confessara o crime, mantém-se sua pena tal como fixada na primeira etapa, qual seja, 2 anos de reclusão, além do pagamento de 20 vezes o maior salário mínimo vigente no País. Por fim, com base na pena concreta fixada para ambos os agentes, forçoso reconhecer, de ofício, a extinção da punibilidade dos apelantes pela prescrição na modalidade superveniente. Com efeito, como as sanções fixadas aos agentes não excederam a 2 anos, o prazo prescricional a ser observado, nos termos do artigo 109, inciso V, do CP, é de 4 anos, lapso este decorrido desde a data da publicação da sentença (25 de abril de 2005 fls. 465) e a presente data. Nestas circunstâncias, dá-se provimento apenas ao apelo ministerial, para aumentar as penas do réu: a) Itagiba Baldassim para 1 ano e 8 meses de reclusão, além do pagamento de 16 vezes o maior salário mínimo vigente; b) Roque Luis Locatelli para 2 anos de reclusão, mais o pagamento de 20 vezes o maior salário mínimo vigente. Porém, de ofício, declara-se extinta a punibilidade dos réus pela ocorrência da prescrição, com fulcro no artigo 107, inciso IV, do CP. POSTO ISTO, afastada a preliminar e para os fins supra: I NEGA-SE PROVIMENTO AOS APELOS DOS ACUSADOS; APELAÇÃO Nº 9169477-92.2005.8.26.0000 SÃO JOSÉ DO RIO PARDO VOTO Nº 17.038 - 8/9 TRIBUNAL DE JUSTIÇA PODER JUDICIÁRIO São Paulo II - DÁ-SE PROVIMENTO AO APELO MINISTERIAL e DE OFÍCIO, DECLARA-SE EXTINTA A PUNIBILIDADE DOS RÉUS, PELA OCORRÊNCIA DA PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA ESTATAL. EDUARDO BRAGA Relator APELAÇÃO Nº 9169477-92.2005.8.26.0000 SÃO JOSÉ DO RIO PARDO VOTO Nº 17.038 - 9/9