Ação Moradia
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Depoimento de Maria Santana de Lima
E- Santana, bom dia, gostaria que você me falasse o seu nome completo a sua data de
nascimento e o local onde você nasceu.
Santana- Maria Santana de Lima, minha data de nascimento dia vinte e quatro de dezembro
de setenta e dois, nasci na Bahia cidade chamada Mundo Novo.
E- Mundo Novo?
Santana- Huhum.
E- Santana eu queria que você contasse um pouco da sua história, de onde você nasceu como
era a sua vida na lá cidade onde você nasceu, com seus pais, seus irmãos, seus avós.
Santana- A minha história com meus pais foi uma história muito linda, né, gostaria de tá até
hoje, brincava muito com meus irmãos, ajudava muito a minha mãe em casa, no trabalho
também, eu gostava sempre de ir pro café com ela né, colher café, em todo lugar que ela ia eu
ia junto com ela colher café, trabalhava a semana inteira com ela ai, quando chegava o final
do mês dividia o dinheiro junto com ela. E a história dos meus avós, que era da parte da
minha mãe eu conheci né, agora a de meu pai eu não cheguei a conhecer não, já tinham
falecido já né, () e a minha avó da parte da minha mãe, nois morou um tempão junto com ela
que foi da vez que minha mãe foi embora para São Paulo, pra trabalhar, ai nois foi criado
mais com ela, com nossos avós e era muito bom, agente andava de cavalo, saia pra pescar de
noite na beirada do rio com nossos tio, era muito lindo ((risos)), ai, crescemo mudemo pra
cidade, ai da cidade nóis, ai era mais difícil né, ai cresci mais e na idade de 11 anos eu
comecei a trabalhar de doméstica, ai eu sai pra São Paulo pra trabalhar também, passei quatro
meses, ai eu chorava todos os dias, dia e noite, de saudade de minha família, aí depois a
minha patroa pegou me mandou embora de volta né, aí ela foi e tirou autorização na
rodoviária por que eu era de menor ainda, eu peguei e voltei para os meus pais de novo, eles
tava tudo morrendo de saudade atrás de mim, já ia até me buscar () para eu voltar para casa, aí
foi fiquei uns tempos, arrumei meu marido, casei e vim embora pra aqui para Uberlândia, aí
de Uberlândia tô aqui até hoje né, aí a minha menina mais velha, quando eu tive ela eu tinha
vinte e dois anos, quando eu tive ela, hoje ela tá com catorze anos, casou também já tá gravida
esperando um bebezinho, os meus dois filhos tá aqui, eles tá na Ação Moradia tem, tem 11
anos que nois tá aqui, que eu tô aqui né, aí eu conheci, fiquei sabendo da Ação Moradia nois
morava aqui no Zaire ((bairro)) foi através de amiga né, ela falou pra mim que lá era muito
bom que tinha curso que tinha lugar das crianças ficar, trabalhar de voluntário pra ganhar uma
cesta, aí eu peguei e fui, na época era lá no bairro Dom Almir num predinho, da Luiza, na rua
da escola, de frente lá da casa de uma colega minha, eu fui, fiquei e estou até hoje aqui na
Ação Moradia, trabalhei de voluntária na limpeza por cinco anos, aí depois de lá da, dessa
escola, lá de junto do predinho, aí veio pra aqui e daqui eu fiquei e estou até hoje, trabalhei na
limpeza mais um tempão aqui, meus meninos, a Vanessa tinha a idade de uns cinco anos
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quando ela entrou aqui, quando eu comecei a trabalhar, a Vanilse tinha uns quatro meses e a
Vanuza, uns quatro aninhos também a Vanilse tinha, e a Vanuza já era bebezinho ainda de
colo, tinha uns dois meses para três meses quando ela veio ficar ai, aí cresceu e tá até hoje né.
E- Você viu a construção do Centro de Formação?
Santana- Vi tudinho, vixe isso aqui eu lembro até quando era, isso aqui era um plantio de
milho que era a coisa mais linda do mundo os milho, essa parte, () isso aqui tudo né, o milho
passava o povo pulava para roubar milho ((risos)), ai acabou a ((tossiu)) acabou a colheita do
milho aí começou a construção, e eu me lembro até hoje, como se fosse agora, começou a
construir tijolinho por tijolinho, aí está ai essa coisa mais linda que é aqui a ONG.
E- E você ajudou lá na prensa de tijolos?
Santana- Não porque na época nois trabalhava na limpeza, e só era homem né.
E- Entendi.
Santana- Aí eu comecei a trabalhar depois que fechou a fábrica que era só os homens e botou
as mulheres, tem cincos anos, vai fazer cinco anos que eu tô lá na fábrica, mas antes de eu ir
pra lá em passei pela, comecei a trabalhar na horta, depois passei pro criança feliz, trabalhei
com reciclagem, () aí voltei para a limpeza de novo, fiquei mais uns seis anos ainda na
limpeza, depois eu passei lá para a fábrica de tijolos, -- eh, vou ver se eu dou conta --, e eu
vou dá se Deus quiser, dei e estou dando até hoje, e vou dá até:: ser mandada embora, porque
na minha lei a vontade, eu nunca tive vontade de sair, nem vou te, porque eu amo o pessoal
daqui, vocês, principalmente o Oswaldo e a Eliana, que são pessoas demais, boas demais,
NOOssa são excelentes patrão que nois tem, e eu acredito em Deus que eu vou chegar lá, ( )
eu vou chegar a construir pelo menos um muro feito na minha casa desse tijolinho daqui da
Ação Moradia.
E- Sua casa não é de tijolo ecológico?
Santana- Não é de bloco, de tijolo daqueles outros comuns, só é dois comodozinhos e um
banheiro, o resto eu vou construir, vou ver se eu compro os tijolos daqui mesmo que nois faz
para poder construir lá, mas se Deus quiser eu vou chegar lá.
E- E o seu marido não vem não ajudar?
Santana- Não, na época tinha homem para ajudar, ( ) as mulheres para ajudar os maridos a
fazer, foi quando começou a construir lá o Campo Alegre, a Meire até trabalhou participando,
só que depois os homens não estavam mais dando conta de fazer, ai fechou a fábrica dos
homens e abriu só para mulheres, e é muita mulher trabalhadeira que tem ali dentro
guerreiras, demais, tá só crescendo e eu quero ver crescer mais ainda, se Deus quiser, ai meus
filhos ficam tudo assim “nossa mãe só a senhora mesmo para dar conta de um serviço
daquele, sai mãe a senhora já está cansada”, eu falo não meu filho é um cansativo feliz que eu
faço aquilo que eu gosto, ali dentro daquela fábrica é tudo de bom para mim, porque eu gosto
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de fazer o serviço de lá, eu tenho que fazer a coisa com amor, eu gostava da limpeza, gostava
não, gosto até hoje, mas de trabalhar ali na fábrica eu gosto mais ainda porque eu faço
dedicada, fico lá doidinha que chega logo de manhã para eu vir para cá, quando chega o final
de semana eu fico doida que chega logo a segunda-feira para eu vir pra cá, ((risos)) as vezes
chego até a sonhar fazendo tijolo, já sonhei muitas vezes carregando caminhão de tijolo,
fazendo, tanto que eu gosto dali né, aí o povo falam, “he Santana você não vai é sair de lá
mais não, você vai aposentar ali dentro”((tossiu)), e eu falo assim, se Deus quiser, e eu vou
chegar lá, é muito bom trabalhar.
E- Tem muita gente ali na fábrica de tijolos que está construindo a própria casa?
Santana- É tem muita gente que tá construindo
E- Você conhece alguém?
Santana- Não, devem tá comprando as coisinhas aos pouquinhos, os tijolinhos, eu mesma
daqui mesmo eu já comprei muita coisa daqui com, trabalhando aqui né, comprando, só que
eu nunca comprei desse tijolinho pra fazer lá em casa porque o terreno não é legalizado ainda,
não era, só que agora já é né, agora se Deus quiser eu vou começar a comprar, pelo menos
para fazer o muro da frente e eu mesma que vou construir, não vou pagar a ninguém para
fazer, eu mesma que eu já dou conta, nois fez o curso de pedreiro, só com a régua é só fazer
certinho, o que o pedreiro ensinou agente, lá ((na fábrica)) aquela roda lá tudo aqueles
negocio tudo lá que fechou aquelas paredinhas tudo foi nois, só aquele barracão do fundo que
foi o pedreiro né, mas os da frente tudo foi nois mulheres que fez, aí o Oswaldo quer que
mura vai ser nois também, em vez de pagar para gente de fora, paga pra nois mesmas que
trabalham lá dentro, e eu quero que vai só crescendo, cada vez mais.
E- Como você vê o futuro da Ação Moradia?
Santana- Eu vejo um futuro muito brilhante, muito bom, toda hora e todo dia chega gente
querendo entrar lá na fábrica, daqui uns dias não vai ter lugar mais nem de mulher passar lá
dentro, do tanto de mulher que está entrando lá dentro, ontem mesmo entrou uma, ontem veio
outra também fazer inscrição para entrar.
E- E por que você acha que elas querem entrar lá na fábrica?
Santana- Dinheiro, tá rolando dinheiro né, mas só que a maioria que vai né, muitas não dá
conta de trabalhar, quando chega assim no final do almoço, elas dizem “ahhh, eu num, fulano
num quer que eu venha ...” bota uma desculpinha, é porque não guenta o batidão.. .porque
nem todas tem a coragem que agente tem de tá lá dentro, porque se lá fosse tão ruim assim eu
não tava lá, vai fazer cinco anos que nois tá lá dentro eu, a Patrícia e a Rosilda, somos as mais
velhas dali, mais tem novata assim que trabalha quando dá onze horas fala que vai beber água
e não volta mais, nem para devolver as coisas, vem no outro dia, é porque não dá conta, ai as
novatas que entrou a Naiara -- filha da Maria lá da cozinha -- a Naiara, a Roseli e a Andréia,
() a::, Naiara falava assim “nossa Santana eu estou com uma vontade de ir embora”, eu falei
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assim para ela Naiara seja mulher forte, eu tenho fé em Deus que você vai vencer, completa
pelo menos uns três dias de serviço, com três dias que você trabalha as suas dores já vão
acabar, ela falou “verdade Santana eu não vou desistir eu vou completar os três dias”, e desses
três dias ela está até hoje, já recebeu o primeiro salarinho dela que foi agora em abril e está até
hoje, agente tem que ter, ter fé em Deus que agente consegue fazer as coisas, porque lá é
cansativo mas para quem não quer né? Eu não acho mais cansativo nada, já acostumei tanto, é
um cansativo bom né?
E- É a fábrica vai só crescendo,
Santana- É se Deus quiser vai crescer mais.
E- Vendendo mais tijolos ...
Santana- Vendendo mais, nois tá com uma entrega muito grande agora pra Limpebrás esse
mês agora, era pra vir agora em Abril né, mas teve que fazer a sala de música dos policiais e
dos meninos da Elga, aí os tijolos não tá completo porque é trinta mil, foi sessenta mil né, ai
dividiu um pouco prum pessoal lá de Araguari que tinha comprado quinze mil tijolos ai veio
buscando aos poucos né, agora nois tá construindo ((produzindo)) já pra Limpebrás, aí veio
um homem essa semana comprar pra fazer um predinho de dois andar né, ele levou uns dez
tijolos de amostra para poder ver se consegue fazer, ele falou assim que uns quinze mil vai dá
para fazer o predinho, ai eu fui e falei pra ele “se Deus quiser vai dá e vocês voltam mais pra
comprar, aqui nois faz o carreto, nois mesmo faz os tijolos, nois mesmo faz o carreto, se for
para fazer entrega fora nois vai também carregar e descarregar, nois já fomos muitas vezes
descarregar caminhão, agora que parou porque todos os carretos que sai para fora agente ia
junto para descarregar lá no local, eles pagava cinquenta reais para agente ir para descarregar
e as vezes nem todos quer pagar porque tem pena né, eles mesmo fala “não, agente vai com as
famílias mesmo e descarrega”, mas nois já foi muito lá pro Jardim Sucupira, lá pro ..., lá perto
do, do clube da Coca-Cola nois já foi, já foi até pro Prata ((cidade)), teve uma vez que nois
quase ficou todo mundo preso ((risos)) a polícia quase ((risos))) que apreendeu a carga do
caminhão do Valdir, as meninas ficou estressada com ele, quase deixou uma colega à pé, ela
falou “ NÃO vou ficar se você me deixar aqui eu quebro esse carro tudo mas eu vou com
você”, de noite, ai só via menina sai pro mato, e a polícia foi atrás “não, tá faltando uma loira
assim que eu vi ela correndo” ((risos)), com medo de ir presa né, é bom demais, só que mais
nunca agente foi, por que as pessoas que vem comprar tijolo a maioria não quer pagar ai de
graça também nois não vai para descarregar, mas é muito divertido demais lá na fábrica.
E- Não dá para trabalhar de graça né Santana?
Santana- Dá não, descarregar caminhão não é fácil não sô, tanto que agente soa, cansa, nois já
fomos até lá no, pra lá do Bom Jesus ((bairro)) fazer um carreto dum caminhão uma vez, -- no
sábado -- e não tem dia para nois falar que num vai não, até no domingo se for possível agente
vai, agente já carregou no sábado aqui, já encheu aqui, descarregou lá no, perto do Bom Jesus,
entregou também aqui pro lado de Perdizes ((cidade vizinha)), Araguari ((cidade vizinha)),
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para uma mulher, duas vezes foi para Araguari né, e da outra vez foi lá em Perdizes, no mês
passado mesmo saiu dois caminhão pra lá pra Perdizes, de tijolo, e agora vai ser da Limpebrás
e desse homem dos quinze mil para fazer o predinho, e quase todo dia tem gente procurando
“cadê, quando é que vai ter ((tijolo))?”, ai nois fazendo tijolo né?, ai já tem que fazer, correr
atrás de terra de novo, porque nois já tá quase tendo dificulidade de terra, tendo terra boa
mesmo “vixe”, todos os dias agora nois tá cumprindo a meta de ..., ontem foi mil e trezentos
tijolo e nois começou ontem já era quase dez horas da manhã, porque teve que tirar dois mil e
seiscentos e trinta tijolo de uma pedra, ai enquanto agente vai descarregando, tirando a,
trocando as pedras, tirando os tijolo pra por pra fora, ai eu vou coando a terra com uma
colega, as outras vai pondo pra fora, umas vão carregando terra para mim, aí agente consegue
fazer todo dia, ontem nois ficou até:: seis e meia da noite pra nois poder cumprir a meta, aí a
semana inteira, e se for possível, -- eu falei para o Oswaldo --, se for possível para nois ganhar
dinheiro mesmo fazendo tijolo, nois fica até de noite, até uma meia noite, se fosse pra dormir,
nois dormia fazendo ((tossiu)) ((risos)), a maioria eu não sei, umas topam ficar e outras não
topam, porque falam “eu tenho filho pequeno eu tenho que chegar cedo” e falo meus filhos tá
comigo, não tem nenhum filho mamando, e eu fico mesmo se for possível ficar porque eu já
fiquei, porque agente ganha hora extra não vai ficar trabalhando de graça, nois ganha as horas,
quando chega no final do mês que agente, chega o salário dagente, agente fica tão feliz, alegre
de sair com o dinheirinho no bolso, porque a coisa mais ruim do mundo é cê tá parado e
chegar no final do mês e não ter nadinha assim na mão, e agente tá aqui tá trabalhando tá
ciente que tem um dinheirinho para receber, e tem muitos que tão aí desempregado não acha
serviço agente indica -- vai lá na Ação Moradia que lá é assim, assim, assado -- o povo fala
“ah amanhã eu vou lá” e nunca vem, porque?, não quer trabalhar né?, porque se quisesse tava
aí, ai eu falo “lá tem trabalho na horta, tem na limpeza, tem na fábrica, tem pra olhar criança,
tem na cozinha”, agente fala fala, “ah eu vou lá” mas agente nunca vê eles aqui, aí fica só
“ah::, fulano tá tão ruim, tô desempregada, tem tanto tempo, só eu em casa, meu esposo está
desempregado, ” mas não tem coragem de vir pra trabalhar, agente sabe que até na limpeza,
eu sei que não tem salário na limpeza mas tem uma cesta boa, tem um cartão numa base de
cinquenta reais ((tossiu)), que já é uma ajuda boa, mas o povo não quer nada com nada, -você lembra quando era lá na fábrica que era só aquele, era só uma cesta e um vale de
cinquenta real, de cem ((reais)) -- e eu sou desde aquela época e olhe que nois pegava uma
cestinha que não era muito boa né, () às vezes a mulherada reclamava, saia, voltava de novo,
eu mesmo nunca sai, se eu sair, quando eu sair assim eu vou sair de vez, eu falo assim, de vez
assim, aí depois a pessoa vai reclama e volta de novo, fica naquele jogo de empurra, “eu
arrumei serviço fora” -- ali tá pondo currículo -- eu nunca boto currículo noutro lugar por que
eu sei que eu não gosto de ir, porque agente tem que pensar nos filhos da gente, porque do
jeito que, hoje em dia, do jeito que as coisas tá difícil, é perigoso até você deixar seu filho
sozinho, e aqui tem onde você trazer, você tá trabalhando mas está sabendo que seu filho está
ali, toda hora você está olhando, está sabendo o que ele está fazendo, ele tá aprendendo coisas
boas aqui dentro, tem aula de música com os policial, tem aula de computação, não tem
bagunça aqui dentro, quer dizer, tem umas baguncinhas de criança mesmo, que é da vida, em
todo lugar tem, mas só de saber que os filhos não tá na rua aprontando coisa ruim, já é um
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alívio para a cabeça da gente, e eu falo pra meus filhos direto, meus filhos nunca saia de lá
enquanto você não completar a sua idade, o meu tá com treze anos -- fez agora dia vinte e
quatro de abril -- invocou que quer jogar bola e a Elga quer que ele volte para a música, ele
falou que vai ficar só na quarta ((quarta-feira)), eu falei não, você tem que ficar na segunda e
na quarta, você decide o que você quer fazer, ou a bola ou a música, porque os dois é
importante mais eu acho que a música é melhor do que a bola, mas ele é louco por jogar bola,
quando é segunda-feira ele já vai direto pra escola, e aí vem para cá porque a aula com o
policial é duas horas e lá é pouco tempo de bola, mas eu já não quero que ele jogue de bola,
quero que ele venha pra aqui pra a música, ontem ele perdeu a oportunidade de ir para o
passei por causa que ele não é da música, que ele tava e saiu, mas eu vou fazer, eu falei para
ele ontem de noite, “cê vai voltar de novo para a música.. eu não quero que você fique lá na
escola jogando bola”, porque eu estou aqui e não tou vendo o que ele tá aprontando lá, e aqui
eu tou vendo, porque de lá da fábrica dá para agente vê, as mães dá pra ver o que os filhos tão
aprontando aqui dentro, por que aqui dentro ninguém aprende nada ruim, aprende::, -- as
pessoas as vezes falam, “ah depois que meu filho chegou na Ação Moradia, meu filho tá
ficando mais mais custoso do que era “--, eu falo, gente como é que ali aprende, não tem jeito
de ensinar nada ruim para ninguém, se a criança as vezes está custoso já vem de casa, eu
nunca falei que meus filhos tão custosos depois que chegou aqui, que eu sei que eles já são
custosos antes de entrar aqui, não é verdade? ((tossiu)) Agora tem mãe que fala que os filhos
tá custosos depois que tá aqui, aprendendo a xingar, falar palavrão, aqui dentro, teve uma
((mãe)) uma vez que falou que o filho dela nu::nca foi de falar coisa feia, eu falei assim, mas
não é aqui dentro que ensina não, por que as meninas não ensina nada pra ninguém desse jeito
não, que eu trabalho lá há não sei quanto tempo e nunca vi, se seu filho já é custoso, ele já
vem de casa, aprendeu dentro de casa ou na rua, porque lá não tem jeito de ninguém aprender
coisa ruim não, porque os meus, se eles falar que já aprendeu alguma coisa ruim ali dentro,
eles tá mentindo, porque eu nunca vi, as pessoas aprende as coisas e já vem de fora, não é
aqui dentro que aprende, não é verdade?
E- Santana e que planos que você tem para a sua vida para seus filhos?
Santana- Ah:: , os planos que eu tenho para meus filho é que eles estudem muito, para ser
alguém na vida, pra não sofrer no futuro, pra arrumar um emprego melhor pra eles, e eles
mesmo decidem o quê que eles querem ser quando::, crescer, eles já estão crescendo, o sonho
do outro mais velho ((filho)) é ser goleiro, quer ser jogador de futebol, já a Vanuza ela quer
ser obreira de igreja, ela vai comigo todos os dias na Universal ((igreja)), três vezes no dia, na
semana, na terça-feira, sexta-feira e domingo, ela fala, mãe meu sonho quando eu crescer mãe
é ser obreira, porque ela vê as obreiras fazer aquelas orações e ela faz, -- as vezes eu falo,
Vanusa eu estou com uma dor de cabeça e ela fala, mãe fecha os olhos tem fé em Deus que eu
vou orar para a senhora agora --, se você vê ela orar você até emociona, ela ora tão bonitinho
e ela vai para a igreja e, ( ) fica junto com as obrerinhas da igreja, inclusive tem até a mãe de
uma obreira aqui da igreja, que ela tem uns 18 anos para 19 ((anos)) e ela fica junto na
escolinha então ela aprendeu, e ela diz que o sonho dela quando ela crescer é ser obreira de
igreja, e eu falei minha filha se você quer ser quem sou eu para falar nada, que Deus lhe
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abençoa que você vai e fique firme para você ser o que você quer ser, ser obreira de igreja,
pelo menos uma coisa boa, ela está aprendendo e vai aprender muito, e meu sonho é ver meus
filhos crescerem, com o poder de Deus, ver minha netinha que está vindo ai, crescer, e ter um
futuro brilhante também pela frente, deles todos, meu sonho é dela conseguir uma casinha
para ela, que ela vai conseguir se Deus quiser,
E- De tijolo, de tijolinho,
Santana- De tijolinho daqui, se possível até eu ajudo a comprar pra fazer lá em casa, falei para
ela, ((risos))
E- E você vai ajudar?
Santana- Huhhu, Vai eu e as amigas lá da fábrica, falei para a Rosilda, -- olha Rosilda quando
eu comprar, os tijolos daqui para fazer o muro, se prepara que você vai ser minha ajudante,
por que a Rosilda ela entende de tudo, até para, fazer os rejuntes daqui, eu sei rejuntar mas eu
fiz pouquinha coisa ali, mas ela, a Carminha e a Patrícia já são práticas, se for preciso colocar
ela fazer uma casa para levantar todinha elas fazem, não é dificuldade nenhuma fazer as
casinhas desse tijolinho, aquilo ali agente, o pedreiro está fazendo e agente está vendo, e vai
tudo ficar na cabeça da gente, como é que faz, de onde começa até quando termina, difícil é os
cantinhos para fazer, mas, . passou dali tudo já é fácil de fazer, e é gostoso,
E- Você ainda vai ser pedreira,
Santana- Vou se Deus quiser, ainda vou ter que, vou aprender, a fazer lá em casa primeiro, ai
depois que eu comprar os tijolos que eu levantar os tijolos lá de casa, olhar assim para ver se
não tem nada torto fora do lugar, uma hora eu chego lá ((risos)), para fazer, eu iria fazer o
curso, mas só que eu não posso porque eu trabalho no sábado, eu participei de dois ((cursos))
aqui, agora lá na UFU ((Universidade Federal de Uberlândia)) eu não como eu ir, porque eu
trabalho dia de sábado lá no Alvorada ((bairro)), se eu for eu não posso perder o emprego de
lá do sábado, tem muitos anos também,
E- Em que você trabalha no sábado?
Santana- Faxina,
E- Tem quanto tempo que você trabalha lá?
Santana- Eu trabalho lá, o mesmo tanto de tempo que eu tenho aqui, eu tenho lá com ela, com
uma mulher, eu gosto demais dela, ela pra mim é uma mãe que eu não tenho perto de mim,
tudo que eu preciso dela ela me ajuda, ((tossiu)), as vezes quando eu demoro para ir, ela
chora, achando que eu larguei ela, ((tossiu)), -- esse dias eu cheguei lá e ela disse, é Aninha
((Santana)), eu já estava arrumando outra pessoa achei que você não vinha mais e começou a
correr água dos olhos dela, eu olhei para ela e falei, coitadinha dona Neuza, eu nunca vou
abandonar a senhora, só se a senhora me botar para fora, e ela falou, minha neta veio até aqui
e perguntou quanto eu pagava, me deu até vontade de chorar junto com ela, e eu falei não
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dona Neuza, nunca mais, nunca na vida que eu vou largar a senhora na mão, --, . é porque eu
trabalho aqui e quando agente sai já é tarde, depois de cinco e meia e até que eu vou lá no
Alvorada já é de noite, mas mesmo assim, eu sempre arrumo um jeitinho de ir lá, volto lá em
casa e vou lá no Alvorada avisar ela, sábado mesmo é dia de eu ir para lá, mas no dia que eu
não vou lá, ela fica doidinha ((risos)), eu gosto demais dela, e ela gosta de mim também, e as
filhas dela são muito cruéis com ela, ela caiu no mês passado quebrou as duas costelas, uma
daqui e de cá, não foi uma neta pelo menos para lavar um garfo para ela, ela falou assim, é::,
Aninha, ela procurou uma pessoa, um parente dela mesmo para ir lá na loja Marisa para pagar
uma conta dela e ninguém foi, eu não fui, não sabia que ia, do jeito que eu estava, com roupa
(), de trabalho mesmo, peguei o ônibus, fui lá na Marisa paguei a conta dela e vim, quando eu
cheguei tinha uma nora dela lá -- de onde a Aninha vem dona Neusa?, foi lá na loja pagar uma
conta para mim, não achei ninguém de vocês que fosse, ela foi, ela disse, eh:: dona Neusa a
Aninha para a senhora realmente é melhor que as filhas suas -- ela tem uma filha que mora no
Jardim Botânico ((bairro)) inclusive eu até já trabalhei para ela, pergunta se ela veio pelo
menos para lavar, () uma colher para a velha, e quando ela ganhou os dois meninos dela a
velha largava a casa sozinha para ir dormir com ela lá, e nem aqui ela veio, eu falo para ela, os
filhos de hoje não reconhece nada que a mãe faz, são muitos reconhece, mas tem muitos que
não estão nem ai para a mãe,
E- É verdade Santana,
Santana- E ela é muito boazinha coitadinha, se precisar dela ela te ajuda em qualquer coisa
que for possível
E- Santana me diz o que você achou de participar dessa entrevista?
Santana- Foi bom, gostoso, divertido, . é bom que agente aprende mais, quando agente for
fazer outra entrevista com outros, com outras pessoas assim de fora, que não seja aqui de
dentro a pessoa já está mais, já sabe falar mais, porque direto tem entrevista lá na fábrica,
ninguém quer fazer, porque todo mundo tem vergonha, eu digo, gente pra que ter vergonha,
vergonha é roubar, hoje em dia as pessoas não estão tendo vergonha nem disso, o Oswaldo
falou para mim no dia que eu fui, foi, passei mal na segunda-feira e fui lá na UAI ((Unidade
de Atendimento Intensivo)) tomar uma injeção, o Oswaldo ((disse)) ah:: não Santana achei
que você () ficou com vergonha de dar entrevista, logo você, eu sei que você não tem
vergonha de () de dar entrevista, eu falei que eu tinha ido na UAI tomar injeção porque meu
estomago estava doendo demais, mas mesmo assim quando eu cheguei eu fiquei lá, eu vim
subindo por último com eles para almoçar para dar essa entrevista, vai passar no último
sábado de maio, de manhã na Globo ((rede de TV)), eu fiz, eu, a Patrícia e a Andréia, mas lá
nem todo mundo gosta de falar quando vai fazer, só diz eu vou fazer, quando chega na hora H
todo mudo corre com medo, e eu não deste a horta, você já tinha, você não estava aqui ainda
não quando eu dei entrevista na horta, na época daquelas HoraAção ((moeda solidária))
lembra?
E- Eu lembro,
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Santana- Como era que comprava, com a moeda solidária, eu fui entrevistei, o pessoal era de
fora, não eram esses que estavam aqui ontem não, fui entrevistei, passou na televisão, agente
viu, nois temos o DVD em casa, é muito bom, eu guardo tudo que vai passar para lembrar,
para quando eu chegar a ir embora para a Bahia eu levar as lembranças daqui, falei para as
meninas ((tossiu)) que mesmo quando eu for embora () cada tijolinho eu quero levar um
modelo diferente daqui, ter lembranças boas, tirar fotos eu trabalhando para levar para mostrar
para minha família, que minha família está toda lá na Bahia, minha família aqui é só eu, meu
marido e os filhos, vai fazer catorze anos que nois estamos aqui, nunca eu fui lá na Bahia,
meus meninos nenhum conhece os avós deles, eles fica doido -- mãe que dia que nois vamos
lá ver meus avós, daqui uns dias meus filhos --, e agora a coisa ficou mais difícil porque todos
eles pagam passagem, e a passagem para lá não está () barata, está uns duzentos e pouco, só
para mim ir com eles todos e o marido vai ser uns mil e pouco, só para ir, e voltar, ((tossiu))
mas se Deus quiser eu vou lá levar pelo menos para passear, porque eu não tenho vontade de
ir embora para lá não, para ficar, já acostumei aqui em Minas, é muito bom o pessoal daqui,
as coisas aqui são mais difíceis, porque lá é muita dificuldade, o dia de serviço lá, quando
acha é vinte Reais, todo mundo que mora aqui já foi embora e já voltou -- essa menina que
mora aqui, que esta aqui fazendo o curso eh::, a Jaciele, foi embora com a família e já voltou
já, ela falou que o dia de serviço está tão difícil, quando a pessoa acha é vinte reais o dia, lá é
difícil pra tudo Carla, lá você não acha doação de uma roupa, não acha doação de cesta básica
quenem aqui, e aqui o povo tem de tudo e as vezes ainda reclama, as vezes ganha aquele tanto
de roupa e você vai nessas beiradas de rua que você passa e está tudo jogada fora, e lá na
Bahia para você ganhar uma roupa lá minha filha, você tem que comprar, trabalhar muito para
poder comprar, lá os homens lá trabalham e tem uma calça que está rasgada, iixxe, remenda
de lá até em cima e dá para trabalhar ainda para tirar para comprar mais outras, mas aqui não,
a calça rasgou ninguém mais quer vestir né? Lá não tudo é difícil as coisas, aí eu tenho
vontade de ir lá passear, ((tossiu)) para eles conhecerem a família deles, os avós deles, mas
para morar, falo sério, eu gosto mais, demais daqui de Minas, já me sinto mineira né? Porque
tem coisas que eu ((risos)), farinha mesmo eu não costumo mais comer farinha aqui que nem
eu comia lá na Bahia, lá Bahia eu comia () farinha só com feijão e tudo misturado com arroz,
e aqui as vezes eu vou almoçar que boto a farinha, eu já encho a barriga logo, já, “nossa
porque eu pus farinha no meio”((risos)), já acostumei demais aqui com Minas Gerais ((risos)).
E- Já é mineira né Santana?
Santana- Já me sinto mineira, com muito orgulho.
E- Você não tem nem um pouco de saudade de lá?
Santana- Saudade eu tenho, mas para morar,, para ir para ficar de vez, eu, já não tenho muita
vontade que nem era, antes de conhecer aqui né? porque eu já morei em Monte Carmelo
também, morei lá cinco anos, só que lá em Monte Carmelo também é difícil né? Lá só é bom
na época do café, depois que a colheita do café acaba, tem só serviço de cerâmica, e na época
eu não trabalhava porque meus meninos eram pequenos, a Vanessa, que ela nasceu lá em
Monte Carmelo, e ela era pequenininha e meu marido não sabia mexer com cerâmica, aí nois
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Ação Moradia
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Uberlândia/MG. CEP. 38407-291
Fone/ Fax (034) 3226-6558
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moramos na fazenda de um senhor que mora ali no::, no Custódio Pereira ((bairro)) e ele
trouxe nois, aí nois viemos para cá para Uberlândia e estamos até hoje, graças a Deus, mas
daqui uns dias, se Deus quiser, eu vou juntar um dinheiro para nois irmos lá na Bahia, porque
a Vanusa vai agora e ela quer que agente vai com ela para voltar no caminhão que vai levar as
coisas dela, mas só até na terra dela, porque ela mora em Ilhéus, e para onde eu moro é mais
longe, fica quase perto de Salvador, se fosse para onde a minha família mora aí eu iria, mas
para ir só até na terra dela,, vou deixar meus filhos sem estudar para lá ir lá, não, um dia nois
vamos se Deus quiser, passear e eles conhecerem os avós deles, é isso,
E- Deus dá jeito para tudo.
Santana- Dá, se Deus quiser.
E- Santana eu queria agradecer,
Santana- Obrigada
E- De você ter compartilhado sua história com agente, foi muito bom, nois gostamos muito tá
e:: ( ).
Santana- E obrigada também de você ter conseguido essa oportunidade
E- Agente que agradece
Santana- Precisando já sabe onde me encontra
E- Tá bom ((risos))
Santana- Porque vergonha de dar entrevista, não é comigo não.
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Depoimento de Maria Santana de Lima E- Santana