ENSINO RELIGIOSO E CIDADANIA – DA ESCOLA PARA A SOCIEDADE Mirian Matulio de Souza Rosângela da Silva Gomes* Resumo: O presente texto baseia-se em experiências pedagógicas realizadas dentro de um planejamento interdisciplinar. Busca identificar e sinalizar algumas considerações sobre o campo das representações simbólicas, mitos e lendas que assumem formas culturais, contribuindo para a diversidade cultural na perspectiva da educação. Neste sentido, tomamos o Festival do Boi bumbá em Parintins – Amazonas, como manifestação da cultura popular que, embora tendo contato com a modernidade, seus habitantes conservam muito da mitológica indígena e cabocla que veicula entre o real e o imaginário da região. Palavras-chave: Diversidade cultural, tradições, representações simbólicas. Através de algumas observações, buscamos apresentar elementos da natureza simbólica, mítica e social que envolve a vida em sociedade de modo a dar um sentido mais amplo às informações e, o mais importante, significar à vida dos alunos. Em 2008, em um planejamento interdisciplinar trabalhamos com as professoras de História, Literatura e Ciências abordando temas sobre a construção da cidadania e a vida em Sociedade. A idéia foi aproximar os conteúdos das disciplinas de modo a levar os alunos a refletirem sobre as transformações sociais vivenciadas ao longo da história. As atividades proporcionaram o diálogo e a interação entre alunos das diferentes turmas do Ensino Fundamental, diante do conjunto de informações e referências das áreas de conhecimentos. Os temas nos permitiram buscar as razões e as intenções das práticas sociais e das representações construídas sobre a realidade dos diferentes contextos culturais. Nessa perspectiva, como professora de Ensino Religioso propus-me a falar sobre o pluralismo cultural e representações simbólicas, presente no cotidiano das diversas sociedades. Contribuindo assim para o diálogo franco, no qual cada um exercita a coragem de dizer o que pensa, ao mesmo tempo em que ouve, com respeito, o pensamento dos * Professoras de Ensino Fundamental da Escola Municipal Sabá Raposo, Secretaria Municipalde Educação de Manaus – SEMED – Manaus – AM. [email protected] / [email protected] 1 outros, como o caminho mais democrático na prática do respeito à diversidade presente no espaço escolar e na sociedade de modo geral. Juntando saberes Neste sentido, tivemos ampla margem para discutir com os alunos o resgate consciente dos verdadeiros valores da pessoa em sua totalidade. Trabalhamos os principais fatores da educação cidadã, por meio de seminários, gincanas, peças teatrais e danças regionais, tornando as aulas mais dinâmicas. Elaboramos uma espécie de janela do tempo, onde discutimos fatos registrados na história e dialogamos sobre a vida em sociedade, fazendo ponte com o universo simbólico presente na história da humanidade. Enfatizamos, sobretudo, o pluralismo cultural na sociedade brasileira e sua releitura a partir das relações potencializadas pela cultura de massa, entre movimentos globalizantes e as legitimidades locais. Tivemos, assim, oportunidade para refletir os aspectos das representações simbólicas, tradições culturais e religiosidade, ressaltando que algumas são reconhecidas e transmitidas, ao passo que outras ficam à margem e constituem apenas aprendizagens informais que, quase sempre, permanecem ocultas. Fechando um pouco mais o foco, tomamos a Festa do Boi Bumbá, no Estado do Amazonas - Festival Folclórico de Parintins - AM, que é uma variante da brincadeira do boi, um Auto Popular existente em várias regiões do Brasil. Abrindo novas trilhas Para desenvolver as atividades com os alunos, buscamos apresentar elementos da natureza simbólica, mítica e social que envolve o boi e seus congêneres na história da humanidade, desde os registros pré-históricos até os dias atuais. Dessa forma, buscamos entender a significação desses elementos em diversas culturas que, em sua dinâmica, é geradora de comportamentos enriquecidos pela força das tradições e sentimentos do povo. De certo modo, levamos os alunos a perceberem a dimensão simbólica alcançada por esse animal nas diversas culturas. Fato possível de observação através das pinturas rupestres desses animais em cavernas na pré-história, na cultura do antigo Egito a adoração ao Boi Ápis; o touro Mnévis que representava um símbolo do sagrado, venerado como a manifestação terrena do deus Rá; Hátor grande divindade cósmica representada na forma de uma mulher com cabeça de vaca, onde seu centro de culto era a cidade de Dendera, mas havia templos dessa divindade por toda parte do Egito; Astérion o Minotauro figura mitológica da antiga Grécia 2 que habitava um labirinto; o Bezerro de ouro pelo qual o povo hebreu manifestou adoração no deserto; a vaca que até hoje é um animal sagrado na Índia. Destacamos ainda que o boi faz parte de temas ligados às religiões, mitologias e manifestações culturais, no qual o festival do Boi-Bumbá em Parintins/Amazonas atualmente destaca-se como uma das manifestações da cultura popular que representa o Brasil e atinge grandes centros de cultura de outros países. Apresentamos em termos históricos, o folguedo do boi que, ao se disseminar por vários Estados do Brasil, assumiu nomes e formas diversas, adaptando-se aos contextos próprios de cada região. No Amazonas, o festival do Boi-Bumbá é uma variante do Auto Popular da brincadeira do bumba-meu-boi do Nordeste do País, que chegou à região por meio da migração nordestina durante o período da produção da borracha. A festa foi ressignificada em seus aspectos mais exóticos: um grande espetáculo realçado pela intensa magia das lendas, dos mitos, dos rituais indígenas, das crendices dos ribeirinhos e de antigas tradições. Percebeu-se que, depois das aulas expositivas e a inserção das atividades lúdicas, os alunos demonstraram maior sensibilidade com relação ao pluralismo cultural e religioso, existente em sua volta. Nas atividades desenvolvidas pelos alunos, oportunizou a exposição dos conflitos e diferentes formas de discriminações de ordem física, cognitiva, religiosa, étnica, cultural que são identificados no cotidiano social. A multiplicidade de culturas existentes fez com que as características simbólicas e religiosas representadas pelos alunos fossem bastante diversificadas, contribuindo, assim, positivamente para melhorar a percepção diante de determinados grupos sociais. Constatamos, também, que a utilização das atividades lúdicas na sala de aula favoreceu o enriquecimento do cooperativismo, estimulando-os a trabalharem em equipe, conciliando com isso a ação, a criatividade e a participação dos alunos no decorrer do trabalho. Celebrando os resultados Podemos considerar que as atividades possibilitaram uma tentativa de desconstruir preconceitos no imaginário social e nas atitudes cotidianas. Em todo esse conjunto de ações, foi surpreendente o envolvimento dos alunos, sua participação, os trabalhos produzidos como cartazes, debates, gincana cultural, entre outras atividades, o que melhorou o rendimento escolar e a convivência no espaço escolar. 3 Os alunos expressavam satisfação em dialogar sobre diversidade cultural, solidariedade, liberdade e construção de uma sociedade justa que respeite as diferenças e os direitos dos indivíduos. Vale ressaltar, que a temática sobre diversidade cultural, mitos e símbolos possibilitou uma releitura de alguns aspectos históricos em diversas civilizações, que incluem modos diferentes de ver o mundo, de significar a vida e de formar comunidades, uma vez que envolve concepções muito amplas, de vários pontos de vista. A culminância do reconhecimento do trabalho desenvolvido na escola foi surpreendente, envolveu a participação dos alunos em eventos extra classe, convites para exposição dos trabalhos em workshop e até em programas televisionados como a Ação Global/2008. Conclusões Fazendo uma retrospectiva das atividades, faz-se necessário considerar que o planejamento interdisciplinar contribuiu muito para os resultados alcançados. Concluímos assim, ressaltando que é um trabalho que requer múltiplos saberes gerando uma teia de atividades construída a muitas mãos, sob diferentes olhares que ao mesmo tempo, direcionam-se para as disciplinas especificas, tendo sempre em vista a busca conjunta da superação dos contínuos desafios da educação. Referências A BÍBLIA SACRADA. Tradução na linguagem de hoje. 4. ed. São Paulo: Sociedade Bíblica do Brasil, 1988. ASSYAG, Simão. Boi-bumbá: festas, andanças, luz e pajelanças. Rio de Janeiro: Funarte, 1995. CASCUDO, L. da C. Dicionário do Folclore Brasileiro. Rio de Janeiro: Ediouro, 1999. CARVALHO, Maria Michol Pinho de. Matracas que desafiam o tempo: é o Bumba-meu-boi do Maranhão. São Luiz: [s.n.], 1995 RELIGIÃO E SOCIEDADE. In: Revista de Estudo Amazônico. São Paulo: Hucitec, Ano II, n.2, maio de 1977. Edição Especial: Manaus, Editora Valer, 2002. 4