UNIJUÍ - UNIVERSIDADE REGIONAL DO NOROESTE DO ESTADO DO RIO
GRANDE DO SUL
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO NAS CIÊNCIAS
SANDRA MARIA WIRZBICKI
ABORDAGENS E REFLEXÕES SOBRE A SIGNIFICAÇÃO
CONCEITUAL DE ENERGIA EM ESPAÇOS INTERATIVOS DE
FORMAÇÃO DE PROFESSORES
IJUÍ (RS)
2010
1
SANDRA MARIA WIRZBICKI
ABORDAGENS E REFLEXÕES SOBRE A SIGNIFICAÇÃO
CONCEITUAL DE ENERGIA EM ESPAÇOS INTERATIVOS DE
FORMAÇÃO DE PROFESSORES
Dissertação apresentada ao Curso de Mestrado
em Educação nas Ciências da Universidade
Regional do Noroeste do Estado do Rio
Grande do Sul, UNIJUÍ, como requisito
parcial para a obtenção do título de Mestre em
Educação nas Ciências.
Orientadora: Profª Dra. Lenir Basso Zanon
IJUÍ (RS)
2010
2
3
4
A minha mãe, que, apesar de todas as
dificuldades, não perdeu o sorriso e o brilho no
olhar, sempre incentivando e acreditando nesta
conquista.
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AGRADECIMENTOS
AGRADECIMENTOS
A professora orientadora desta pesquisa Lenir Zanon, por apostar e acreditar em mim, pela
disponibilidade, apoio, orientação, mas, acima de tudo, pela amizade e cumplicidade;
Aos (às) professores (as) Maria Cristina Pansera de Araújo, Otavio Maldaner, pelas valiosas
contribuições por ocasião da qualificação;
Aos professores e bolsistas do GIPEC-UNIJUÍ, cujas contribuições foram importantes para a
elaboração desta pesquisa, pelo carinho e amizade, indispensáveis em minha vida;
À professora e grande amiga Clarinês Hames (Clara) pelo constante incentivo, pelas trocas de ideia e
pelo carinho;
À professora Maria Cristina Pansera de Araújo (Cris) pelos conhecimentos partilhados, apoio e
incentivo;
Aos colegas de Curso, com os quais tive o privilégio de conviver, pela amizade, pelas trocas de
experiências, que contribuíram nesta caminhada, mas também pelos momentos de lazer e descontração. Em
especial aos colegas e amigos: Sandra, Silvia, Marla, Vanessa, Fábio, Francini, Daiane e Vanessa;
Aos professores e funcionários do Programa de Pós-Graduação do Curso de Mestrado em Educação
nas Ciências, pela disponibilidade e pelos conhecimentos compartilhados;
A minha família, pelo incentivo, amor, carinho e compreensão;
A todos os meus amigos, em especial a Claci, Jaque, Carmen, Elizandra, Tere, Chica, Mari, Micheli
e Adri que sempre acreditaram e me estimularam a continuar nessa caminhada;
A meu amor por me fazer acreditar na realização dos sonhos e ser feliz;
À CAPES, pelo apoio financeiro;
Aos sujeitos de pesquisa pela valiosa contribuição nas interações.
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RESUMO
Este trabalho parte da constatação de que o ensino de Ciências da Natureza e suas
Tecnologias (CNT) denota influências de visões dicotômicas entre conhecimentos produzidos
em contextos diversificados, em especial, o da Ciência e o do cotidiano, do que decorrem
desafios aos educadores: abordagens dos conteúdos do ensino de CNT desconsideram, muitas
vezes, a dinamicidade das inter-relações de saberes envolvidos nos processos de construção
dos conhecimentos escolares. Esta pesquisa analisa interações de licenciandos, professores da
educação básica e da universidade, em um espaço de formação para o ensino de CNT,
mediante o planejamento e desenvolvimento de “módulos interativos” em busca de
compreender formas de (re)contexualização pedagógica, especificamente, do conceito
‘energia’. São analisadas, também, abordagens do referido conceito em livros didáticos de
Biologia e Química do Ensino Médio (EM), utilizados durante os ‘módulos interativos’ como
subsídio para interações e reflexões acerca de formas como o conceito é abordado nos
mesmos. A análise das interações entre os sujeitos de pesquisa durante processos de
(re)significação conceitual denotou contribuições de reflexões possibilitadas, na formação
docente inicial, sobre como mediar explicações em aulas do EM. Com base no referencial
histórico-cultural, a análise aponta abordagens e mediações que enriquecem o ensino e a
formação docente, mediante processos dinâmicos de (re)contextualização e (re)significação
conceitual, potencializadores dos processos de conhecimentos. A busca de melhorias na
formação de professores de CNT implica promover formas de reflexão crítica e interativa
sobre mudanças no ensino de objetos complexos, cuja compreensão abrange uma
multiplicidade de relações entre significados conceituais, como é o caso dos significados de
‘energia’.
Palavras-chave: formação de professores; ensino de ciências; significação conceitual;
energia, (re)contextualização de conhecimentos.
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ABSTRACT
The present work starts from the evidence that the teaching of Sciences of Nature and their
Technologies (SNT) indicates influences from dichotomic views between the knowledge
produced in diverse contexts, specially the scientific one, and the quotidian life; and, from
such situation, some challenges to the educators emerge: the approaches of the contents in the
teaching of SNT, many times, don’t take into account the dynamicity of the inter-relationships
between the knowledge involved in the process of construction of the school education. This
research analyses interactions between undergraduates, school teachers and university
professors in a space of education for the teaching of SNT, by means of planning and
development of “interactive modules” trying to understand ways of pedagogical
(re)contextualization, specifically, the concept of “energy”. It is also analyzed approaches of
that concept found in Biology and Chemistry high-school workbooks, used during the
“interactive modules” as a source for interactions and reflections about the ways the concept
is approached in those books. The analysis of the interactions between the subjects of the
research during the processes of conceptual (re)signification indicated contributions from the
reflections for the teacher’s education on how to mediate the explanations in high-school
classes. Based on the historical-cultural reference, the analysis points out to approaches and
mediations which enhance the teaching and the teacher’s education by means of dynamic
processes of (re)contextualization and conceptual (re)signification – empowering elements of
the processes of knowledge. The search for improvements in the education of the SNT
teachers implicates in promoting ways for critical and interactive reflection about changes in
the teaching of complex objects whose comprehension includes a multiplicity of relationships
between conceptual meanings, which is the case in the concept of “energy”.
Key words: Teachers’ education, teaching of Sciences, conceptual signification, energy,
(re)contextualization of knowledge
8
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
ADP - Difosfato de Adenosina
ATP - Trifosfato de Adenosina
CNT - Ciências da Natureza e suas Tecnologias
EF - Ensino Fundamental
EM - Ensino Médio
ES - Ensino Superior
FAD – Flavina Adenina Dinoclueotídeo
GIPEC-UNIJUÍ - Grupo Interdepartamental de Pesquisa sobre Educação em Ciências
IBECC - Instituto Brasileiro de Educação, Ciência e Cultura
L - Licenciando
LB - Licenciando de Biologia
LQ - Licenciando de Química
LD - Livro didático
LDCIE - Livro didático de Ciências
LDBIO - Livro didático de Biologia
LDQUI - Livro didático de Química
LDBQ - Livro didático de Bioquímica
LDB - Lei de Diretrizes e Bases da Educação
LDBEN - Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
M - Mestrando
MST - Movimento Sem Terra
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NAD - Nicotinamida Adenina Dinoclueotídeo (forma oxidada)
NADH - Nicotinamida Adenina Dinoclueotídeo (forma reduzida)
OCNEM - Orientações Curriculares Nacionais para o Ensino Médio
PCNEM - Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Médio
PCNLEM - Programa do Catálogo Nacional do Livro Didático do EM
PEIES - Programa Especial de Ingresso no Ensino Superior
PEF - Pedagogia do Ensino Fundamental
PEMB - Professor do Ensino Médio de Biologia
PEMQ - Professor do Ensino Médio de Química
PU - Professor Universitário
PPGEC - Programa de Pós-Graduação em Educação nas Ciências.
SE - Situação de Estudo
SMEd - Secretaria Municipal de Educação
TCLE - Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
UNIJUÍ - Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul
10
LISTA DE FIGURAS
Figura1. Macro-Micro. (Site 1) ................................................................................................ 70
Figura 2. Enzima Quimotripsina. (Site 2)................................................................................. 71
Figura 3. Representação de ‘sítio catalítico’ da Quimotripsina (LDBQ2, p.311) .................... 72
Figura 4. Equação Geral da Reação Catalítica (LDBQ1, p.121) .............................................. 75
Figura 5. Energia de Dissociação de Ligação Média. LDBQ3 ................................................ 76
Figura 6. Gráfico da Reação. (Site 2) ....................................................................................... 77
Figura 7. Representação do Morro Energético. (Site 2) ........................................................... 80
Figura 8. Esquema e Gráfico da Energia de Ativação. (LDBIO1, p.96) .................................. 82
Figura 9. Modelo Explicando a Ação Enzimática. (LDBIO3, p.541) ...................................... 84
Figura 10. Modelo Chave-Fechadura para Ação Enzimática. (LDBIO4, p.75) ....................... 84
Figura 11. Catálise Enzimática. (LDQUI1, p.469) ................................................................... 85
Figura 12. Representação Artística da Ação enzimática. (LDBIO2, p.48) .............................. 86
Figura 13. Modelo Chave-Fechadura 1. (LDQUI2, p.424) ...................................................... 87
Figura 14. Modelo Chave-Fechadura 2. (LDQUI3, p. 552) ..................................................... 87
Figura 15. Processos Celulares de Transformação de Energia (LDBIO1, p.160) .................... 97
Figura 16. Fotossíntese e Quimiossíntese (LDBIO1, p.162)................................................... 98
Figura 17. Reações Químicas, Acoplamento de Reações e ATP. (LDBIO1, 176) .................. 99
Figura 18. Fotossíntese (LDBIO2, p. 88) ............................................................................... 101
Figura 19. Respiração Aeróbia (LDBIO2, p. 88) ................................................................... 101
11
Figura 20. Reações Acopladas (LDBIO1, p.163)................................................................... 103
Figura 21. Respiração Mitocondrial. (LDBIO4, p. 215, 2004) .............................................. 106
Figura 22. Processos Celulares de Energia (LDBIO1, p.161,) ............................................... 109
Figura 23. Alimentos e Ciclo de Krebs (LDBIO1, p. 203) .................................................... 110
Figura 24. Representação de NAD+ e NADH. (LDBIO4, p.208) .......................................... 111
Figura 25. Representação do ATP/ADP/AMP. (LDBIO4, p. 211) ........................................ 111
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SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ...................................................................................................................... 13
1 ABRANGÊNCIA E ORGANIZAÇÃO METODOLÓGICA DA PESQUISA .............. 17
2 CONCEPÇÕES DE CIÊNCIA E CONTEXTUALIZAÇÃO DOS CONTEÚDOS DO
ENSINO DE CIÊNCIAS NATURAIS .................................................................................. 23
2.1 Sobre Concepções de Ciência e de Conhecimento Científico ........................................ 25
2.2 Sobre a História do Ensino de Ciências da Natureza no Brasil ...................................... 28
2.3 A Perspectiva da Contextualização no Ensino de Ciências da Natureza ........................ 34
3 O CONCEITO ENERGIA NO ENSINO DE CIÊNCIAS DA NATUREZA E SUAS
TECNOLOGIAS .................................................................................................................... 40
3.1 Visão Histórica do Ensino do Conceito Energia no Âmbito Empírico da Pesquisa....... 40
3.2 Uma Discussão sobre o Conceito ‘Energia’ ................................................................... 50
3.3 A Significação Conceitual em Contexto Escolar ............................................................ 61
4 UM OLHAR SOBRE ABORDAGENS DO CONCEITO ENERGIA............................ 68
4.1 Compreensões sobre Reação Enzimática e Energia de Ativação ................................... 69
4.2 Compreensões sobre ATP e Interconversões Energéticas nos Processos Vitais ............ 94
ALGUMAS CONSIDERAÇÕES ........................................................................................ 118
CORPUS – CONJUNTO DE DOCUMENTOS UTILIZADOS E ANALISADOS NA
PESQUISA ............................................................................................................................ 121
REFERÊNCIAS ................................................................................................................... 122
ANEXOS ............................................................................................................................... 127
APÊNDICES ......................................................................................................................... 135
13
INTRODUÇÃO
Nos últimos anos, têm sido frequentes as alusões, no contexto educacional e, até
mesmo por parte da mídia em geral, ao ‘fracasso escolar’ dos estudantes da educação básica,
o que tem suscitado preocupações e discussões relativas à necessidade de avançar na
compreensão de como desenvolver práticas educativas capazes de produzir aprendizados
escolares mais significativos e socialmente relevantes. Articuladamente ao desenvolvimento
de novas políticas públicas, percebe-se que o cenário da área de educação está permeado por
preocupações relativas à qualidade do ensino e da formação dos professores que nele atuam.
Tais preocupações são cada vez mais evidenciadas, também, na literatura e em
discussões entre educadores e especialistas da área, acenando para perspectivas de mudança
nas concepções e práticas curriculares, nos diversos níveis da escolarização, tendo sido
crescente a atenção, particularmente, na área de Ciências da Natureza e suas Tecnologias
(CNT), a focos de estudo e discussão que dizem respeito aos aspectos conceituais do ensino e
aos tipos de aprendizagem por ele propiciada.
Muito se tem discutido, na última década, sobre movimentos que acenam para
reformas curriculares como as apregoadas nos Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino
Médio (PCNEM, BRASIL, 1999). Nas diversas áreas do conhecimento, as atenções têm sido
direcionadas para a construção de uma escola que eduque para a vida mediante
conhecimentos e práticas associadas ao desenvolvimento de capacidades, competências,
valores, atitudes, de uma ‘concidadania responsável’, expressão referida por Marques (1988).
Contudo, há muito que se avançar nas práticas de sala de aula, o que coloca a
necessidade de mudanças, sobretudo, nas concepções pedagógicas e epistemológicas das
quais elas decorrem, amplamente necessárias de serem objetos de reflexão na perspectiva de
virem a ser crítica e interativamente reconstruídas, sobretudo, em espaços de formação de
professores. Uma das ideias que têm sido amplamente destacadas é que os contextos de
14
mudança de concepções/práticas educativas não podem ser alijados a meras soluções técnicas
propostas por especialistas. Não se trata de tarefas simples de serem concebidas e
empreendidas em âmbito escolar.
Frente ao quadro problemático acima apontado, este trabalho busca contribuir na
produção de uma compreensão fundamentada sobre o ensino, particularmente, do complexo
conteúdo/conceito ‘energia’, amplamente abordado na área de CNT. Isto, mediante um olhar
instruído por preocupações educacionais atuais, levando em conta o desafio de adequar o
ensino e a escola ao novo cenário da educação contemporânea, conforme determina a Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN, BRASIL, 1996), referendada pelas
políticas públicas dela decorrentes, incluindo os PCNEM (BRASIL, 1999).
A complexidade acima reportada ao ensino do conteúdo/conceito ‘energia’ pode ser
remetida à visão expressa por Morin (2007), no sentido da visão de uma busca por novas
formas de conhecimento, por um “conhecimento pertinente”, fundado em compreensões não
segmentadas, não cerceadas aos limites de visões simplistas e fragmentadas, que levam em
conta a visão de complexos sistemas de relações sistematicamente implicados, entendendo
que:
O conhecimento pertinente deve enfrentar a complexidade. Complexus significa o
que foi tecido junto; de fato, há complexidade quando elementos diferentes são
inseparáveis e constitutivos do todo [...], e há um tecido interdependente, interativo e
inter-retroativo entre o objeto de conhecimento e seu contexto, as partes e o todo, o
todo e as partes, as partes entre si. [...] é a união entre a unidade e a multiplicidade.
(idem, p. 38)
Nesse sentido, a pretensão de contribuir para a melhoria do ensino do
conteúdo/conceito ‘energia’, ao longo do desenvolvimento da presente pesquisa, partindo da
visão problemática mencionada, leva em conta preocupações relativas aos processos de
(re)contextualização e (re)significação de conteúdos/conceitos no ensino e na formação para o
ensino, na área de CNT.
A pesquisa está focada na análise de abordagens e discussões relativas ao ensino do
referido conteúdo/conceito em espaços específicos de formação para o ensino de CNT,
contando com o uso de livros didáticos (LD) como subsídio aos estudos e reflexões, em busca
de avanços nas compreensões de processos de (re)contextualização e (re)significação
conceitual que acompanham abordagens e discussões propiciadas.
Assim, contribuições possíveis do trabalho referem-se a entendimentos sobre
implicações de determinadas abordagens do conceito ‘energia’, a partir da visão da produção
15
do conhecimento escolar como um processo dinâmico de inter-relação de conhecimentos
científicos e cotidianos sempre diversificados (LOPES, 1999). Nessa perspectiva, foram
registradas falas de sujeitos participantes de ‘módulos triádicos’ de interação, com
participação simultaneamente, de licenciandos, professores da universidade e do EM
(ZANON, 2003). Para isso, a organização da investigação girou em torno da busca de
respostas às seguintes questões básicas: abordagens e discussões referentes ao ensino do
conteúdo/conceito ‘energia’ possibilitadas pelos ‘módulos interativos’ contribuem na
formação para o ensino de CNT, especificamente, quanto a processos de significação
conceitual? Se sim, como?
Os ‘módulos interativos’ foram planejados e desenvolvidos em aulas de componentes
curriculares (CC) dos cursos de licenciatura em Biologia e Química da UNIJUÍ (Universidade
Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul). A partir dos registros em agenda de
campo e em áudio, seguidos de transcrição, foi possível construir materiais empíricos
(transcrições). Sucessivas leituras atentas das mesmas permitiram identificar recortes de falas
dos sujeitos participantes, nos processos de construção e análise dos resultados de pesquisa.
Tal análise, fundamentada, principalmente, no referencial histórico-cultural, situa-se
como um olhar à multiplicidade de relações intersubjetivas, com atenção direcionada aos
modos de mediação de sujeitos que interagem sob condições socioculturais diversificadas, em
processos de formação docente que acenam para a construção de conhecimentos escolares
significativos e socialmente relevantes, tal como propõem as Orientações Curriculares
Nacionais do Ensino Médio (OCNEM, BRASIL, 2006).
O trabalho está organizado em quatro capítulos. O primeiro descreve a organização
metodológica da pesquisa, incluindo os procedimentos adotados durante os registros e os
processos de construção dos resultados de pesquisa.
O capítulo 2 situa a temática da pesquisa com uma fundamentação teórica relativa a
concepções de Ciência, uma retomada de aspectos históricos do desenvolvimento do ensino
de CNT no Brasil, e, por último discute aspectos da (re)contextualização didática dos
conceitos científicos no contexto escolar.
O capítulo 3 trata, especificamente, do conceito ‘energia’ na área de CNT. Parte de
uma retrospectiva histórica do ensino do referido conceito na área e no âmbito empírico desta
pesquisa. A seguir, explicita algumas compreensões conceituais de ‘energia’, na perspectiva
de contribuir nas discussões sobre uma (re)contextualização didática mais adequada do
referido conteúdo/conceito no EM. Após, aborda aspectos da significação conceitual de
‘energia’ embasada no referencial histórico-cultural, enfocando a constituição da consciência
16
dos sujeitos e o desenvolvimento da mente humana, contando com processos de apropriação
de linguagens e de produção de significados conceituais típicos ao ensino escolar.
Ao longo do capítulo 4 são explicitados e analisados os resultados obtidos, em busca
de respostas às questões de pesquisa. Recortes de falas dos sujeitos de pesquisa, registradas
nos ‘módulos interativos’ acompanhados, relativas a abordagens do conteúdo/conceito
‘energia’ são apresentados e discutidos, com foco no ensino sobre ‘respiração, enzimas e
reação enzimática’. São tratados dois focos de compreensão, um relativo à ‘energia de
ativação’ e outro relativo à energia na forma de trifosfato de adenosina (ATP) e
interconversões energéticas associadas aos processos vitais.
Reafirma-se a potencialidade do ensino do conteúdo/conceito ‘energia’ mediante
abordagens
de
caráter
conceitual
e
contextual
dinamicamente
inter-relacionadas,
contemplando relações entre conhecimentos científicos e cotidianos, na construção de um
conhecimento escolar que promova o desenvolvimento das plenas capacidades humanas.
Tudo isso, em defesa de abordagens conceituais adequadas à promoção de tal
desenvolvimento, seja no ensino ou na formação para o ensino de CNT.
17
1 ABRANGÊNCIA E ORGANIZAÇÃO METODOLÓGICA DA PESQUISA
Nesta pesquisa, sem negligenciar a visão da complexidade dos processos de mudança
a serem desenvolvidos na formação para o ensino de CNT, a grande preocupação ocorre em
torno do desenvolvimento de novos espaços de formação docente, na perspectiva de analisálos em sua potencialidade para contribuir na reforma educativa em andamento no país, em
especial, na compreensão e significação do conceito ‘energia’.
Atualmente, a pesquisa é um dos maiores enfoques no contexto educacional, visto sua
importância em espaços de ensino e formação. De acordo com Lüdke: “a pesquisa aparece na
literatura internacional recente e em algumas propostas de inovação curricular como uma
prática fundamental no desenvolvimento profissional do professor, bem como, no
desenvolvimento curricular” (2001, p.31).
A presente investigação enfoca uma pesquisa de natureza qualitativa, organizada como
um processo que envolve:
o contato direto do pesquisador com o ambiente e a situação que está sendo
investigada mediante trabalho de campo. De frente à questão em estudo, o
pesquisador presenciará situações em que ela se manifeste, diante de um contato
direto com o contexto empírico, na condição de ‘observador’ e, por outro lado, de
‘participante’ das mesmas interações investigadas (LÜDKE e ANDRÉ, 1986, p.18).
Com apoio em Minayo et al (1994), entende-se que, em contextos de ‘observação
participante’, os pesquisadores mantêm contatos diretos com a situação real observada,
procedendo aos registros para a obtenção de informações sobre a realidade dos atores sociais,
em seus próprios contextos de vivência cotidiana, neste caso, em aulas de licenciatura
acompanhadas.
A organização metodológica da pesquisa considera o pressuposto expresso nos dizeres
da mesma autora, de que:
18
o observador, enquanto parte do contexto de observação, estabelece uma relação
face a face com os observados. No processo, ele, ao mesmo tempo, pode modificar e
ser modificado pelo contexto. A importância dessa técnica reside no fato de
podermos captar uma variedade de situações ou fenômenos que não são obtidos por
meio de perguntas, uma vez que, observados diretamente na própria realidade,
transmitem o que há de mais imponderável e evasivo na vida real. A inserção do
pesquisador no campo está relacionada com diferentes situações da observação
participante por ele desejada. Num pólo, temos sua participação plena, caracterizada
por um envolvimento por inteiro em todas as dimensões da vivência estudada.
(idem, p.59/60)
Com base em entendimentos como esses, o presente estudo envolveu os seguintes
procedimentos de pesquisa: análise de LD de EM; análise das interações de professores de
EM, da universidade e licenciandos, registradas nos ‘módulos interativos’ (ZANON, 2003) e
realização de entrevista semi-estruturada com uma professora de Biologia do Ensino Superior
(ES).
Cabe esclarecer que o presente projeto decorre de pesquisas anteriores (Zanon, 2001,
2003; Hames, 2003; Wirzbicki; 2007) desenvolvidas no âmbito do Grupo Interdepartamental
de Pesquisa sobre Educação em Ciências (Gipec-Unijuí) do qual fiz parte como bolsista de
iniciação científica, durante o período em que era estudante da Licenciatura e posteriormente
como voluntária. Tais pesquisas apontaram para a potencialidade da interação triádica
(Schnetzler e Zanon, 2001) de licenciandos, professores da educação básica e professores da
universidade na promoção de mudanças expressas, ao mesmo tempo, nas concepções e
práticas de sujeitos em formação. Em síntese, este projeto insere-se num projeto de pesquisa
mais amplo, coordenado pela orientadora, institucionalmente alocado no Programa de PósGraduação em Educação nas Ciências (PPGEC).
Em atenção aos princípios da ética na pesquisa, o projeto desenvolvido foi aprovado
pelo Comitê de Ética na Pesquisa da Unijuí, conforme consta no Anexo I (Parecer
Consubstanciado nº 055/2008).
A análise de abordagens do conceito ‘energia’, em LD de Biologia e de Química do
EM, abrangeu livros indicados pelo Programa do Catálogo Nacional do Livro para o Ensino
Médio (PCNLEM). Analisou-se ainda um LD de Ciências do Ensino Fundamental (EF), LD
do ES nos CC Bioquímica I e II. A escolha do “corpus” - conjunto de documentos utilizados e
analisados na pesquisa - deve-se ao fato de terem sido utilizados como subsídio na
organização dos ‘módulos interativos’, em especial nos capítulos que abordem os conteúdos:
Enzimas e Metabolismo Energético. A análise procurou verificar em recortes de escritas e
figuras as abordagens e explicações envolvendo as formas de ‘energia’, como são
apresentadas e se são adequadas para a significação do conceito.
19
Para estabelecer distinções entre os LD de Biologia, Ciências, Química e Bioquímica
analisados, utilizaram-se as seguintes siglas: LDBIO (Livro Didático de Biologia do EM),
LDCIE (Livro Didático de Ciências do EF), LDQUI (Livro Didático de Química do EM) e
LDBQ (Livro Didático de Bioquímica do ES).
Os livros de Biologia analisados foram identificados como LDBIO1, LDBIO2,
LDBIO3 e assim sucessivamente. O LDBIO1 é um livro de Biologia para a 1ª série do EM; o
LDBIO2 é utilizado nas três séries do EM; o LDBIO3 é um volume único utilizado nas três
séries do EM; o LDBIO4 refere-se ao volume 1, para a 1ª série do EM; o LDBIO5 é um
volume único, indicado para todas as séries do EM.
O LDCIE1 é um livro de CNT utilizado nas séries finais do EF.
Os livros de Química analisados foram identificados como LDQUI1, LDQUI2 e
LDQUI3, em que LDQUI1 é indicado para a 3ª série do EM; LDQUI2 é volume único para as
três séries do EM; LDQUI3 é outro para as três séries do EM.
Os livros de Bioquímica do ES utilizados como subsídio durante alguns ‘módulos
interativos’ foram identificados como LDBQ1, LDBOQ2 e LDBQ3, em que o LDBQ1 é de
Bioquímica Básica utilizado nos CC de Bioquímica; o LDBQ2 é, também, utilizado no CC
Bioquímica I e II da universidade, possui um CD-ROM como subsídio alternativo, que
contém imagens e animações de representações de processos atômico-moleculares, o que
possivelmente auxilia nas compreensões dos estudantes. LDBQ3 é um livro de Química
utilizado no âmbito do ES.
Outros recursos didáticos utilizados nos trabalhos de pesquisa dos licenciandos,
anteriores ao planejamento e desenvolvimento dos ‘módulos interativos’, foram também
apresentados e discutidos, durante os mesmos. As figuras do capítulo IV retiradas de sites
disponíveis na internet serão designadas de Site1, Site2 e assim sucessivamente.
Em seguida, o procedimento metodológico abrangeu o planejamento, implementação e
análise de ‘módulos interativos’, com três grupos de sujeitos de pesquisa – professores da
universidade, professores do EM e licenciandos – em aulas de CC da licenciatura de Biologia
e/ou Química (ZANON, 2003). Os módulos criam a possibilidade concreta de interação dos
três grupos de sujeitos, cada um contribuindo com vivências e saberes em processos de
discussão e reelaboração curricular em CNT. Neste contexto interativo, tem sido possível
problematizar, compartilhar e ressignificar conhecimentos acerca de objetos sistematicamente
influenciados pela cultura, pelo outro, marcados por intencionalidades e condições
mais/menos simétricas de interação social.
20
O acompanhamento das interações é realizado mediante registros das falas dos sujeitos
em áudio ou vídeo, e mediante anotações em agenda de campo. Os registros das interações
dos três sujeitos de pesquisa, realizados em espaços de sala de aula na licenciatura, com
posterior transcrição das falas, constituíram ricos materiais de análise.
A análise centrou-se nas interações dos sujeitos participantes e suas mediações,
voltadas ao desenvolvimento de processos de reflexão, em especial, sobre o conceito
‘energia’, no ensino e na formação de CNT. Por exemplo, a perspectiva de uma
contextualização que não desconsidere a essencialidade dos processos de significação de
‘energia’.
Para a realização dos ‘módulos interativos’, foram mantidos contatos com o
Departamento de Biologia e Química (DBQ) da UNIJUÍ, a fim de apresentar a proposta de
desenvolvimento desses módulos em CC dos cursos de licenciatura em Ciências Biológicas e
Química, com a participação de sujeitos de pesquisa, conforme acima explicitado.
A proposta de realização do estudo foi recebida como uma possibilidade concreta de
promover conhecimentos pedagógicos relativos ao ensino do conceito ‘energia’ em CC da
graduação, pertinentes à formação docente e que são abordados no EM, com todas as
potencialidades, problemas e implicações. Realizou-se, então, uma primeira etapa do trabalho
de coleta de dados em ‘módulos interativos’.
O contexto da pesquisa abrangeu, especificamente, aulas de CC de Bioquímica I e II e
dos referidos cursos de licenciatura, nos quais vêm sendo realizadas atividades visando a
contextualizar e significar conceitos da área de CNT. Também, contempla características
interdisciplinares, na perspectiva de compreender mudanças de concepções e práticas
pedagógicas, no âmbito de processos de construção de conhecimentos científicos escolares.
Cabe destacar que nos CC contemplados na presente pesquisa, os estudos bioquímicos
abrangiam compreensões das atividades metabólicas vitais, com a utilização do mapa
metabólico, ao que se pode referir como um recurso didático que exige graus elevados de
abstração, necessários para compreender as rotas metabólicas ali representadas.
No Apêndice I, encontra-se um quadro com os dados referentes (os CC contemplados
com a pesquisa, as temáticas abordadas e os sujeitos participantes) aos 10 ‘módulos
interativos’ planejados e desenvolvidos pela pesquisa no período de 2006 a 2009. Cabe
ressaltar que nesta dissertação, dos ‘módulos interativos’ desenvolvidos, foram analisados
somente os módulos 2, 8 e 9. Os referidos módulos trataram de assuntos vivenciais como:
“respiração”; “respiração: bioenergética celular”, “enzimas e catálise enzimática”; estudados
ao longo do semestre pelo CC em que o ‘módulo interativo’ foi desenvolvido.
21
Em conformidade com as características dos ‘módulos interativos’, para o
desenvolvimento e análise das interações na formação docente, professores do EM (Biologia e
Química) foram convidados a participar de aulas do curso de licenciatura, na universidade,
criando uma possibilidade concreta de interação dos três grupos de sujeitos, cada um com
suas vivências e saberes, sempre passíveis de discussão e reelaboração (ZANON, 2003). Com
vistas a possibilitar interações ricas e fecundas, elaborou-se, para cada ‘módulo interativo’,
um subsídio básico, para que os professores convidados pudessem contribuir nas discussões a
partir dos conteúdos abordados na graduação, bem como, foram sugeridas leituras prévias
sobre o assunto, incluindo figuras obtidas a partir de LDBIO e LDQUI utilizados no EM.
Da mesma forma, os licenciandos realizaram, anteriormente aos módulos, pesquisas
coletivas sobre os assuntos vivenciais desenvolvidos nos ‘módulos interativos’, usando fontes
diversificadas, incluindo análise de LD do EM, bem como elaboração de questões prévias
para serem levantadas e debatidas durante os módulos.
Para que as interações fossem mais participativas, foram apresentados durante todos os
‘módulos interativos’ slides que incluíam abordagens e ilustrações encontradas em LDBIO e
LDQUI do EM e em outras fontes sobre os assuntos em discussão. A exemplo disso, os slides
continham ilustrações de esquemas representativos de transformações em nível atômicomolecular, mediante as quais é produzida a ‘energia’ metabólica que possibilita a manutenção
do processo vital, envolvendo, em especial, compreensões relativas às vias metabólicas
mitocondriais.
Em relação aos princípios éticos da pesquisa, observando o que prevê a Legislação que
disciplina pesquisas envolvendo seres humanos, os sujeitos de pesquisa foram esclarecidos
sobre os objetivos, a justificativa, as metas e a possibilidade de desistirem de participar a
qualquer momento da pesquisa, sem que houvesse constrangimento ou algum tipo de
prejuízo. Aos sujeitos participantes dos ‘módulos interativos’ foi informado do anonimato
garantido pela pesquisa, expresso no Termo de Consentimento Livre Esclarecido (TCLE)
(APÊNDICE II), que foi assinado pelos que concordaram em participar.
Nesse contexto, foram procedidos os registros das falas gravadas em áudio e agenda
de campo, seguidos de transcrição, os quais constituíram ricos materiais empíricos, que, por
meio de sucessivas leituras, permitiram proceder recortes das falas, resultando na construção e
análise de dados da pesquisa. Nos trechos de fala apresentados e discutidos no próximo
capítulo, os sujeitos são referidos conforme segue: PU como professor da Universidade;
PEMQ como professor de Química do EM; PEMB como professor de Biologia do EM; LQ
como licenciando de Química; LB como licenciando de Biologia, L como licenciando quando
22
não é possível identificar se é licenciando de Biologia ou Química e M como mestrando. Os
sujeitos, dentro de um mesmo grupo, são identificados por números distintos.
Os turnos de fala dos sujeitos foram enumerados na ordem em que aconteceram as
falas, iniciando em 1 (um) em cada ‘módulo interativo’ desenvolvido, também enumerando a
sequência dos módulos. Por exemplo, (M2 - 8), corresponde ao registro do ‘módulo
interativo’ 2, no turno de fala 8. Recortes das transcrições são apresentados e analisados no
capítulo 4 do trabalho, com a finalidade de sustentar as argumentações, justificar e ampliar os
diálogos com diversos autores que embasam teoricamente esta pesquisa.
Outro procedimento metodológico constitui-se numa entrevista semi-estruturada com
uma professora universitária da área de Biologia, com experiência docente no EM e superior.
A entrevista foi realizada com base em um conjunto de questões prévias (APÊNDICE III),
tendo sido registrada em áudio e posteriormente transcrita, permitindo a construção de
resultados de pesquisa. Nos episódios da entrevista, a identificação foi feita com a
denominação de PU3.
A seguir serão discutidos aspectos relativos às concepções de Ciência e de
conhecimento científico, uma breve retrospectiva histórica do ensino de Ciências no Brasil,
articuladamente a reflexões sobre a (re)contextualização de conceitos científicos no ensino de
CNT.
23
2 CONCEPÇÕES DE CIÊNCIA E CONTEXTUALIZAÇÃO DOS CONTEÚDOS DO
ENSINO DE CIÊNCIAS NATURAIS
As reflexões iniciais sobre os processos de significação do conceito ‘energia’ no
ensino de CNT abrangem, neste capítulo, um olhar para aspectos históricos do
desenvolvimento dessa área de ensino, situando as origens da problemática em estudo neste
trabalho, em busca de melhor situá-la e compreendê-la, relacionando-a, posteriormente, com a
idéia da contextualização dos conteúdos do ensino de CNT.
Para isso, este capítulo traz algumas reflexões de cunho epistemológico sobre os
conhecimentos histórica e socialmente produzidos, que compreendem os conhecimentos
científicos, cotidianos e escolares, sempre diversificados, a partir de questões como: quais as
marcas da visão positivista/empiricista de Ciência no ensino de CNT? Quais as visões de
Ciência subjacentes aos discursos e práticas docentes? Qual a compreensão sobre dificuldades
e obstáculos que acompanham os processos de (re)contextualização pedagógica dos
conhecimentos científicos e cotidianos, nos processos de produção dos conhecimentos
escolares, especificamente, no que se refere à significação de conceitos complexos, como o de
‘energia’, que se constitui num sistema, numa trama de relações com outros conceitos?
Não é raro perceber-se que sujeitos envolvidos no ensino de CNT (professores,
estudantes) detêm a concepção de que o conhecimento científico é um conhecimento provado,
verdadeiro, inquestionável, visão que é explorada até mesmo pela mídia em propagandas
quando a imagem de um determinado produto é vendida como a melhor, por seus efeitos
terem sido “cientificamente comprovados”. Por outro lado, percebe-se a visão de que os
conhecimentos “errados” dos estudantes devem ser eliminados e substituídos pelos
conhecimentos científicos, “verdadeiros”. Nessa concepção, ensinar constitui-se num ato de
impor um conjunto de verdades absolutas e dogmáticas e aprender é realizar um esforço de
24
repetição e “memorização” de verdades (GARCIA, 1998). Nos dizeres de Marques (1993), o
ensino consiste em
transmitir fielmente verdades aprendidas como imutáveis; e a aprendizagem é
assimilação passiva das verdades ensinadas. Ensinar é repetir, aprender é memorizar.
É decisivo o papel do professor, insubstituível em sua qualidade de portador
individual dos conhecimentos depositados na tradição cultural. Os alunos são todos
iguais, desde sua ignorância radical dos conhecimentos de que necessitam para se
adaptarem ao cumprimento de suas futuras obrigações. (p. 15-28 e 105).
Nessa concepção de ensino o professor é portador individual do conhecimento
científico, visto como pronto e acabado. Os alunos, por sua vez, são sujeitos passivos da ação
do professor, o que denota uma visão distorcida do papel da escola na sociedade conforme
proposto pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN, BRASIL, 1996).
Essas considerações são um indicativo de que as concepções de Ciência e do papel do
professor de CNT carecem de discussões fundamentadas, em todos os níveis e âmbitos da
educação, em suas implicações no ensino da área, na perspectiva de uma contraposição ao
ensino usualmente limitado à transmissão repetitiva de conteúdos sem uma relevância social
intencionalmente explicitada.
A preparação de professores é tema de discussões constantes e intensas
controvérsias tanto, no Brasil como em âmbito internacional envolvendo problemas
filosóficos, ideológicos, pedagógicos entre muitos outros. Hoje quando o papel dos
docentes na preparação das crianças e jovens para viver no mundo em que mudanças
afetam diretamente suas relações com a escola, novos elementos são agregados ao
debate. No Brasil diante da situação deficitária de todos os níveis do ensino é
comum atribuir aos docentes e seus formadores a responsabilidade pelas falhas e
fracassos dos sistemas escolares. Aceitar decisões simplistas que ignorem a
complexidade do processo educacional leva ao fracasso das políticas
governamentais e das iniciativas institucionais (KRASILCHIK, 2000, p. 22).
Em contraposição às visões simplistas do processo educacional, que reduzem muitas
das dificuldades no âmbito do ensino de CNT à responsabilidade dos professores é que se
constitui o presente trabalho. O mesmo propõe discutir a complexidade do processo de ensino
do conceito ‘energia’, apontando algumas melhorias possíveis de serem implementadas na
área de CNT. Este capítulo está organizado em três subcapítulos. O primeiro resgata algumas
concepções de Ciência e conhecimento científico, ao longo da história da Ciência. O segundo
traz uma breve retrospectiva histórica do ensino de CNT, no contexto brasileiro. O terceiro
discute a perspectiva contextual no ensino de CNT.
25
2.1 Sobre Concepções de Ciência e de Conhecimento Científico
Muitas foram as ideias e concepções de Ciência desenvolvidas ao longo de seu próprio
percurso histórico, articuladamente ao desenvolvimento da própria humanidade. Algumas
estão presentes até hoje em contextos educativos, outras já foram superadas ou encontram-se
em fase de reformulação.
Desde os primórdios da organização da Ciência, os interesses científicos da
humanidade giravam em torno da relação homem/natureza, o primeiro considerado como um
ser “fora” da realidade em que está inserido, que domina e usa os bens naturais disponíveis
em seu próprio benefício. Proposições de Bacon e Galileu remetiam para as bases de uma
concepção de Ciência criticada na atualidade. A visão de que a Ciência é objetiva e de que o
conhecimento científico é provado tornou-se presente durante a (e como consequência da)
Revolução Científica que ocorreu principalmente durante o século XVII, levada a cabo por
grandes cientistas pioneiros como Galileu e Newton (CHALMERS, 1993).
A respeito dessa filosofia, pode-se dizer que um dos criadores do método científico
moderno e da Ciência experimental, Francis Bacon, utilizou, no início do século XVII, o
método de pesquisa baseado na indução. Segundo a lógica do indutivismo, o conhecimento
científico é provado e as teorias científicas derivam da obtenção de dados da experiência
adquiridos por observação e experimento. Chalmers propõe que: “Existem duas suposições
importantes envolvidas na posição indutivista ingênua em relação à observação. Uma é que a
Ciência começa com a observação. A outra é que a observação produz uma base segura da
qual o conhecimento pode ser derivado” (1993, p.46).
Críticas à posição indutivista fundamentam-se na ideia de que dois observadores
podem estar olhando para um mesmo objeto, mas cada um com um olhar, uma análise, uma
interpretação e uma conclusão diferenciada sobre o que lhe é apresentado. Fundamentam-se,
também, na ideia de que as proposições elaboradas a partir das observações pelos sentidos são
tão sujeitas a falhas quanto às teorias que elas pressupõem. “A dependência que a observação
tem da teoria, com certeza derruba a afirmação indutivista de que a Ciência começa com a
observação” (CHALMERS, 1993, p.25), visto que a Ciência progride por tentativas e erros.
Para Marques (1993, p. 42), “na moderna Ciência da Natureza o conhecimento não se
funda na interpretação intelectual dos fenômenos, mas na determinação de transformá-los
para dominá-los. (...) Os fenômenos são tecnicamente constituídos.” Chalmers (1993) afirma
que o positivismo lógico foi uma forma extrema de empirismo, segundo o qual as teorias não
apenas devem ser justificadas, na medida em que podem ser verificadas mediante um apelo
26
aos fatos adquiridos através da observação, mas também, são consideradas como tendo
significado apenas até onde elas possam ser assim derivadas. Sobre a intervenção e
dominação do homem sobre o mundo, Marques propõe que: “a consciência conhece pela
representação com que se relaciona com objetos que, para melhor domínio, reduz e fragmenta
em especialidades compartimentadas e isoladas de todo seu contexto natural e cultural” (1992,
p.553).
Na concepção empiricista/indutivista de Ciência, as principais formas de legitimação
dos conhecimentos científicos fundamentam-se na natureza, segundo a qual as ‘verdades’
estariam postas na natureza, a priore da observação, cabendo aos cientistas descobri-las,
desvelá-las. Porém, a partir da visão crítica à Modernidade, frente a situações novas como a
produção de inúmeras substâncias artificiais, produtos científicos e tantos modelos teóricos
simbolicamente criados, como refere Lopes,
é abalada a crença de que as ciências são inerentes à natureza e, anteriores à própria
ação social dos seres humanos; a própria noção de objetividade modifica-se. (...) Ser
objetivo nas ciências não significa estar fundamentado no objeto. (...) É preciso ser
capaz de elaborar métodos de construção da objetividade, e não supor essa
objetividade como anterior ao próprio processo de pesquisa (2007, p.190-191).
Cada vez mais, novas vertentes da filosofia da Ciência têm feito críticas em relação ao
fundamento seguro da observação e do experimento. Por outro lado, vêm contribuindo e
problematizando a visão de uma possibilidade segura de observação, da qual possam derivar
teorias científicas de modo confiável, em defesa da visão de que as teorias científicas não são
‘descobertas’, mas, sim, produções humanas decorrentes de interesses e de conhecimentos já
existentes.
Recentemente, ampliam-se as críticas à visão das teorias científicas como verdades
absolutas, com influências consideráveis nas concepções de Ciência como processo social,
humano e sistematicamente reflexivo. Nessa perspectiva, referenda-se a visão de que:
Como poderíamos afirmar que a experimentação científica encerra múltiplos fatores
não apenas tecnológicos, mas histórico-culturais, ético-morais, políticos, religiosos
... que condicionam e, em muitos casos na atualidade, (re)orientam e (re)centram a
atividade de pesquisa, como construção e produção social do conhecimento
científico, como empreendimento humano que toma opções e tomadas de posição
não neutrais, mas carregadas de valores. A comunidade científica tem, também, um
papel primordial que importa não esquecer. A experiência enquadra-se num
processo não de saber-fazer, mas de reflexão sistemático, de criatividade e mesmo
de invenção (PRAIA E CACHAPUZ, 2002, p.258).
27
Segundo Marques, os fenômenos “não são dados, mas resultados; não se descrevem,
mas se produzem” (MARQUES, 1993, p. 42). A Ciência é um conhecimento em expansão e
uma teoria só pode ser adequadamente avaliada em seu contexto histórico: a avaliação da
teoria está intimamente ligada às circunstâncias nas quais ela surge. Como refere Chalmers
(1993), não se pode manter uma distinção acentuada entre a observação e a teoria porque a
observação ou, antes, as afirmações resultantes da observação são permeadas pela teoria.
Outrossim, vale refletir sobre a visão de que,
com Bachelard, (...) a própria questão da verdade se modificou. Com base em sua
epistemologia, deixa de ser possível fazer referência à verdade, instância em que se
alcança em definitivo. Existem verdades, múltiplas, históricas, pertencentes à esfera
da veracidade, da capacidade de gerar credibilidade, confiança. As verdades só
adquirem sentido ao fim de uma polêmica. (LOPES, 2007, p.33).
Segundo considerações lógicas e filosóficas, teorias científicas não podem ser
provadas ou desaprovadas. Uma reação à percepção de que teorias científicas não podem ser
conclusivamente provadas ou desaprovadas e de que as reconstruções dos filósofos guardam
pouca semelhança com o que realmente ocorre na Ciência é desistir de uma vez da ideia de
que a Ciência é uma atividade racional, que opera com algum método (CHALMERS, 1993).
De acordo com o mesmo autor: “é essencial compreender a Ciência como um corpo de
conhecimento historicamente em expansão e que uma teoria só pode ser adequadamente
avaliada se for prestada devida atenção ao seu contexto histórico e às circunstâncias nas quais
surge” (idem, p.61).
Nessa perspectiva, a Ciência é tida como processo social, histórico e cultural. Lopes
(2007), com base em Stengers (1990), expressa a visão de que as Ciências se constituem e se
organizam como empreendimento cultural, ou seja, social e humano. Nesse sentido, o
trabalho científico precisa despertar interesse e ser capaz de criar diferença entre seus pares.
Dessa forma, os cientistas inventam o que talvez seja a singularidade das ciências
modernas: uma prática original de trabalhar junto. Os cientistas precisam criar
vínculos, estabelecer relações, formar grupos de interesses comuns, traduzindo
fielmente as relações sociais que determinam aqueles a quem é interessante
interessar e aqueles a que podem ajudar a fazer a diferença. Desse modo é que as
ciências se organizam como um empreendimento cultural e, portanto, social e
humano. (LOPES, 2007, p. 193-194).
A concepção de Ciência baseada na visão de um processo de produção históricosociocultural é levantada por Chalmers (1993) ao assinalar que tanto a observação quanto o
experimento orientam-se por 'teorias' pré-existentes, de que não há 'descobertas', mas, sim,
28
'produção de conhecimentos' através do aprofundamento e ampliação das formas anteriores de
conhecimento.
Tudo isso corrobora a defesa da visão de Ciência como uma construção humana, que
envolve aspectos sociais e culturais que lhe são inerentes. O uso da razão instrumental na
dominação do homem sobre o mundo e a natureza colocou a própria razão em crise. Essa
crise atingiu muitas instituições sociais, dentre elas a prática educacional, carente de rupturas
e (re)construções. Nessa perspectiva, Boufleur (1997) sugere que se abandonem as
concepções de Ciência baseadas no mundo que “se descobre” para um mundo que “se
produz”, “o que resulta em mudanças efetivamente radicais para as interações humanas que se
orientam para processos de aprendizagem nos âmbitos da cultura e da sociedade, como é o
caso das interações pedagógicas” (p.312).
Contudo, essa linha de discussão e reflexão permite a percepção e compreensão de
que, desde o princípio, o ensino das Ciências foi marcado por uma visão dogmática por parte
daqueles que o ministravam, visão ainda recorrente em diversos âmbitos e níveis
educacionais. A concepção de Ciência como verdade absoluta, pronta e acabada, um dogma,
semelhante a uma religião, fortalecida na ideia de verdade, na perspectiva de valorizá-la como
um conhecimento produzido por uma comunidade científica, resultante da produção humana,
constante e bastante específica, sujeita a sistemáticos processos de validação e refutação
(CHALMERS, 1993).
Frente a essas considerações, o subcapítulo que segue apresenta um breve retrospecto
histórico do ensino de CNT no Brasil, discutindo a promoção de um ensino que considere a
visão de que os conhecimentos científicos mediados em contexto escolar são impregnados de
aspectos históricos, sociais e culturais específicos a cada Ciência.
2.2 Sobre a História do Ensino de Ciências da Natureza no Brasil
No Brasil, o ensino de Ciências, nas últimas décadas, sofreu influências de vários
autores com grande referência em pesquisas na área de Ciências: Krasilchik (1987)
Fracalanza (1986), Lopes (1993), Maldaner (2003), Delizoicov (2004), Nardi (2005), entre
outros. A partir de autores como estes, ocorreu a constituição de grupos de pesquisa sobre o
ensino, contrapondo-se a limitações de uma visão de Ciência cerceada a transmissões técnicas
e simplistas. Sobre a instauração e a ampliação do ensino de CNT brasileiro, seus avanços e
limitações, referendando Lopes, trazemos a reflexão de que:
29
A ciência precisa ser vista no ensino dentro de sua lógica própria, sendo transmitida
aos alunos enquanto parte de uma cultura crítica, polêmica. Limitar a ciência a seu
caráter de aplicação técnico, ou suprimir essa relação igualmente impedem o
conhecimento da totalidade do processo de construção científica (p. 87, 1990).
Para compreender a atual conjuntura do ensino de CNT, é importante considerar que
esta área nem sempre esteve presente nas grades curriculares das escolas brasileiras. No que
se refere, especificamente, à presença de estudos e aprendizagens relativas ao conceito
‘energia’ do ponto de vista da área de CNT, cabe refletir que nem sempre isso aconteceu nas
escolas do nosso país. Segundo estudos publicados por Lopes (2007, p.81-82), a área de
Ciências começou a ocupar e integrar o espaço do currículo das escolas secundárias a partir de
1837, tendo como característica marcante o “fazer”, e não o “pensar”, a memorização, o
acúmulo de informações, o caráter “descritivista e empiricista” no ensino de “fatos e
princípios de utilidade prática”, mesmo que distantes da realidade do estudante.
Pesquisas mencionadas pela autora informam que as orientações do Colégio Pedro II,
já em 1899:
objetivavam o ensino dos fenômenos mais correntes e fundamentais das ciências. No
programa de 1911, a recomendação era restringir o ensino de ciências a noções
sucintas, de forma a estabelecer o ensino intuitivo, sem abordagem de teorias ou
doutrinas. Já se apontava para a perspectiva de enfatizar observações e experiências,
mesmo que de caráter ilustrativo (LOPES, 2007, p. 95).
O ensino de Ciências, nesse período histórico, reforçava classificações e conexões
entre fatos, com influências de concepções empiristas que marcavam o currículo formal
vigente. As primeiras abordagens da área eram pautadas em noções sucintas, ao mesmo tempo
em que se apresentavam programas extensos para a carga horária. Sobre o ensino
desenvolvido no colégio Pedro II, a mesma autora considera que “o ensino do país não pode
ser reduzido ao que se ensinava no Colégio Pedro II, como limitar o ensino de Ciências à
existência da disciplina com esse nome na grade curricular” (LOPES, 2007, p. 80).
Como apontado e discutido por autores diversos, citados no início deste subcapítulo,
que tratam da história da educação do Brasil, em 1932, com o Manifesto dos Pioneiros da
Educação Nova, passaram a ser propostas mudanças no ensino escolar, contrapondo-se aos
métodos tradicionais, a favor de uma metodologia ativa. Pretendia-se incluir o que se tinha de
mais moderno em descobertas nas Ciências, com a finalidade de formação de uma elite de
profissionais capazes de contribuir para o desenvolvimento industrial científico e tecnológico.
Para tanto, a orientação era de que as aulas em laboratório superariam o caráter expositivo, e
30
viriam então a propiciar atividades motivadoras que possibilitassem a compreensão dos
conceitos.
Anos mais tarde, por volta de 1950, o Brasil vivia uma fase de industrialização. O
currículo brasileiro “copiava” os currículos europeus, pois seus livros e programas eram
importados da Europa. O ensino nesta época centrava-se no uso exclusivo do livro texto, e o
professor tinha como principal função a transmissão de informações que os estudantes
deveriam memorizar e repetir. Segundo Krasilchik: “Para atender às necessidades de
mudanças, movimentos começaram a se organizar, nessa época, em várias instâncias. Em
nível internacional formava-se a chamada primeira geração de projetos curriculares, nos
Estados Unidos” (1987, p.8). A partir da primeira geração de projetos no ensino de Ciências
foram propostos os projetos voltados à temática ambiental. Esta é uma das explicações para o
fato de se colocar, ainda hoje, a Educação Ambiental junto ao ensino de Ciências.
Esse período marcante e crucial na história do ensino de Ciências, que influi até hoje
nas tendências curriculares de CNT no EM como no EF, foi dando lugar, ao longo dessas
últimas décadas, a outras modificações em função de fatores políticos, econômicos e sociais
que resultaram, por sua vez, em transformações das políticas educacionais, cumulativas em
função das quais ocorreram mudanças no ensino de Ciências. O Quadro1 situa as tendências
mundiais de ensino no período de 1950 a 2000.
Quadro 1: Evolução da Situação Mundial, segundo Tendências no Ensino (1950-2000)
Tendências
Ensino
Objetivo
Ensino
Concepção
Ciência
Instituições
Promotoras
Reforma
no Situação Mundial
1950
Guerra Fria
do • Formar Elite
• Programas Rígidos
Situação Mundial
1970
Guerra Tecnológica
• Formar Cidadãotrabalhador
•
Propostas
Curriculares
Estaduais
• Evolução Histórica
de • Atividade Neutra
•
Pensamento
Lógico-crítico
•Projetos
•
Centros
de
Ciências,
de Curriculares
•
Associações Universidades
Profissionais
• Aulas Práticas
•
Projetos
e
Discussões
Modalidades
Didáticas
Recomendadas
Fonte: Krasilchik, 2000, p. 86.
Situação Mundial
1990 - 2000
Globalização
•
Formar
CidadãoTrabalhador-Estudante
•
Parâmetros
Curriculares Federais
•
Atividade
com
Implicações Sociais
•
Universidades
Associações
Profissionais
e
• Jogos: Exercícios no
Computador
31
O quadro evolutivo dos objetivos do ensino de Ciências, proposto pela referida autora,
situa uma preocupação constante com a atualização dos programas em relação ao progresso
da própria Ciência. Segundo ela, no Brasil, o movimento de reforma do ensino de Ciências
antecedeu ao dos americanos. Sob a liderança do professor universitário Isaias Raw um grupo
de professores que almejavam mudanças na qualidade do ensino de Ciências organizou, em
São Paulo, o Instituto Brasileiro de Educação, Ciência e Cultura (IBECC). Isso, pela
preocupação frente ao baixo nível do ensino escolar, na área, e a busca de sua melhoria de
qualidade, a ser estendida até o ES. Nas palavras de Isaias Raw (apud, CHASSOT, 2002,
p.26):
Até os anos 50, no Brasil, o MEC tinha um programa oficial e todos os livros
escolares eram iguais. Era proibido inovar. Foi quando começamos um esforço
muito semelhante ao que foi desenvolvido, dois anos mais tarde, pela National
Science Fundation. Conseguimos inovar o ensino de Ciências. Somando Ibecc
(depois Funbec) e Cescem (depois fundação Carlos Chagas) preparamos novos
livros e guias de laboratório, criamos novos equipamentos de baixo custo e
retreinamos os professores para usá-los.
Segundo o autor, o trabalho deste grupo centrou-se na preparação de material de
laboratório e na atualização dos conteúdos de currículo de Ciências. Não tardou para que as
reformas se deparassem com barreiras como o número de aulas, que era determinado pelo
ministério da educação e a falta de profissionais qualificados, demandando cursos de
aperfeiçoamento para uma formação mais adequada.
De acordo com Krasilchik (1987), a disciplina de Ciências passou a ser obrigatória no
país só a partir da Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) nº. 4.024/61, a qual
ampliou bastante a participação das ciências no currículo escolar, que passaram a
figurar desde o 1º ano do curso ginasial. No curso colegial, houve também
substancial aumento da carga horária de Física, Química e Biologia. Essas
disciplinas passavam a ter a função de desenvolver o espírito crítico com o exercício
do método científico. O cidadão seria preparado para pensar lógica e criticamente e
assim capaz de tomar decisões com base em informações e dados. (idem, 1987,
p.15)
A partir da década de 1950-60, focos de mudança nas perspectivas do Ensino de
Ciências passaram a ser objeto da atenção de pesquisadores e educadores da área, refletindose, de alguma forma, nas orientações curriculares do mundo todo.
A importância dada à formação do cidadão está associada a um processo de
democratização que, em nosso país, foi interrompido durante os vinte anos
posteriores ao golpe de 1964. Paulatinamente ocorreu uma mudança nos objetivos
32
da educação e no ensino de Ciências que havia passado do cientista para o cidadão e
depois para o trabalhador. Embora os documentos legais pouco tivessem modificado
a sua letra, não mais se aspirava a um conhecimento científico atualizado,
considerado supérfluo na escola profissionalizante. As disciplinas científicas tiveram
sua carga horária reduzida, o currículo foi acrescido de uma série de disciplinas
pretensamente técnicas que, na verdade, fragmentaram, esfacelaram as demais
disciplinas, impedindo que o conhecimento fosse apresentado aos estudantes com
coerência e sentido. Em consequência, os defeitos atribuídos às disciplinas
científicas - fragmentárias, livrescas, memorísticas, enciclopédicas - acentuaram-se.
(KRASILCHIK, 1987, p.56)
Em tempo de ‘guerra-fria’, países mais desenvolvidos (Estados Unidos, Reino Unido e
Austrália), tradicionais centros culturais de influência no mundo, alavancavam as primeiras
mudanças no Ensino de Ciências e nos programas das disciplinas científicas. Era a primeira
reforma do Ensino de Ciências Naturais, cujas origens se situam, portanto, num movimento
de âmbito mundial que se contrapunha ao modelo de ensino marcado pela transmissãorecepção de conteúdos padronizados, de forma diretiva, pronta e repetitiva. Esse período foi o
marco histórico do fim de um longo tempo de estabilidade nos currículos da área.
bem como o início de um movimento de reforma que se originou como resposta a
críticas feitas a partir do exterior da instituição escolar. Tais críticas tinham por base
a constatação da existência de um considerável defasamento entre os notórios
progressos da sociedade industrial e a mediocridade dos programas de ensino em
uso para o ensino das Ciências (SANTOS, 1991, p. 26 e 27).
As propostas de mudança do ensino de Ciências não valorizavam relações entre o que
estava sendo estudado em sala de aula e situações reais vivenciadas no cotidiano fora da
escola ou em aulas experimentais. O contexto era marcado por metodologias e conteúdos
baseados no modelo de ensino referido por Freire (1987) como “bancário”. A tendência da
“transmissão-recepção”, de caráter “conteudista”, perdurava sem avanços.
Por conta dos projetos internacionais, nas décadas de 1970 e 1980, o ensino de
Ciências vinha pautado num caráter objetivista da Ciência, baseado na valorização das
técnicas de observação e experimentação, sem a influência dos interesses e concepções dos
sujeitos, marcas da visão empirista.
Mais tarde, abordagens educacionais passavam a caminhar em direção à superação das
tendências propedêuticas vigentes. Na década de 1990, é promulgada mais uma Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN) de Nº. 9.394/96 com inúmeros avanços.
Mas em muitas escolas contemporâneas ainda permanece um ensino fortemente alicerçado na
preparação para vestibulares e seleções, com pouca significação conceitual para os estudantes,
33
bem como sem a valorização das vivências desses sujeitos e a necessária contextualização.
Para Marques:
Reconstruir a educação que responda às exigências dos tempos atuais não significa o
abandono do passado, o esquecimento da tradição, mas uma releitura dela à luz do
presente que temos e do futuro que queremos, uma hermenêutica que parta do
pressuposto de que nenhuma tradição se esgota em si mesma, bem como nenhuma é
dona original de seu próprio sentido.(...) Reconstruir não significa ignorar o passado
que, na cultura e em cada homem, continua presente e ativo, vivo e operante, mas
impõe que nele penetrem e atuem novas formas que o transformem e o introduzam
na novidade de outro momento histórico e outros lugares sociais (1992, p. 549).
Dessa forma, podemos perceber, a partir de estudos históricos, que o ensino de
Ciências no país é recente, e que passou e continua passando por diversas alterações.
Entretanto, ainda hoje apresenta resultados insuficientes, tendo em vista várias dificuldades no
âmbito escolar, sobre as quais é importante empreender discussões e reflexões que apontem
para melhorias. Visto que o ensino de CNT,
Infelizmente, mantém-se um ensino precário com professores que enfrentam nas
escolas problemas de sobrecarga, de falta de recursos e de determinações que
deveriam seguir sobre as quais não foram ouvidos. As modificações promovidas por
diferentes elementos ao longo dos diversos patamares de decisões que atuam nos
componentes curriculares – temáticas e conteúdo, modalidades didáticas e recursos e
processos de avaliação – confluem para um cenário que raramente é o planejado
pelos emissores do currículo teórico. (KRASILCHIK, 2000, p. 88)
A constatação de uma crise no ensino de Ciências não pode ser destacada daquela que
atinge todo o processo educacional, mas exige soluções próprias e um tratamento adequado.
Nesse sentido, cabe refletir sobre o que observa Krasilchik:
No Brasil, no plano das intenções, aparentemente não ocorre conflito, pois pesquisas
na área de educação indicam que cientistas e educadores concordam sobre os
grandes objetivos do ensino das Ciências – pensar lógica e criticamente. Embora não
haja discordâncias evidentes sobre o papel das disciplinas científicas na educação
dos jovens, os resultados estão longe das aspirações compartilhadas por todos que
influenciam as decisões curriculares. Tal situação suscita questões para as quais não
há resposta fácil: Por que, na sala de aula, o ensino continua como sempre, e
incoerente com as metas aceitas por consenso? Se o problema não reside na
diferença de concepções, qual a explicação para a discrepância entre o que se
acredita e o que acontece? (1987, 60).
Com o resgate de aspectos do desenvolvimento histórico do ensino de CNT no Brasil e
das problemáticas a ele inerentes, busca-se melhor situar e compreender a necessidade de uma
reconstrução curricular do mesmo, a partir das novas políticas públicas do país, atualmente
em desenvolvimento nas escolas, após a LDBEN (BRASIL, 1996), em contraposição à
34
preocupação restrita em dar conta de uma lista pré-determinada de conteúdos, em cada
disciplina escolar. Procura-se promover conhecimentos escolares não mais marcados por
limitações típicas do ensino tradicional, baseadas em repetições e memorizações de conteúdos
prontos e dogmáticos, que confirmam a maneira descontextualizada e fragmentada de
organização do conhecimento no currículo escolar. Também, romper com a relação
dicotômica entre os aprendizados escolares e os desenvolvidos nas vivências em situações
reais, em decorrência de uma visão de ciência neutra, pronta, acabada, cerceada aos limites da
racionalidade técnica (SCHÖN, 1987).
No item que segue, discute-se a respeito da perspectiva da contextualização dos
conteúdos do ensino escolar, amplamente sugerida nos parâmetros, diretrizes e orientações
curriculares nacionais, que se contrapõem ao ensino desconexo ainda presente em âmbito
escolar, de modo que os estudantes sejam capazes de relacionar o pensar científico, para uma
compreensão crítica da realidade e para a solução de problemas práticos, em situações
cotidianas.
2.3 A Perspectiva da Contextualização no Ensino de Ciências da Natureza
Discutir a perspectiva da contextualização dos conteúdos do ensino de CNT, neste
trabalho, pressupõe a visão de que a Ciência é uma atividade humana que permite a produção
e validação de conhecimentos no âmbito de comunidades específicas de pesquisadores,
mediante um caminho nunca linear. Podemos chamar de Ciência um conjunto de processos
histórico-culturais de produção e validação de novos conhecimentos sobre realidades que
mudam, ou podem mudar, nos diversos tempos ou lugares sociais. Os cientistas são histórica
e culturalmente influenciados pelos pensamentos típicos de diferentes períodos e contextos.
Mesmo as teorias que hoje são refutadas, de alguma forma, contribuíram para a Ciência se
consolidar e dispor de todos os conhecimentos dos dias atuais.
Contudo, como já referido, o ensino de CNT denota influências tradicionalmente
disseminadas,
em
contextos
educativos
diversificados,
marcadas
por
concepções
empiristas/indutivistas de Ciência, o que coloca a necessidade e importância de estudos e
discussões, em processos de formação de professores sobre implicações de concepções de
Ciência no ensino de CNT. Assumir que é papel da escola e, dentro dela, do professor de
CNT, disponibilizar aos cidadãos o acesso aos conhecimentos produzidos nas Ciências
implica desenvolver e compreender modos adequados de transformação dos conhecimentos
científicos em conhecimentos escolares, os quais, por natureza, mantêm relações com
35
conhecimentos cotidianos. Neste trabalho a atenção volta-se à compreensão de processos de
significação do conceito ‘energia’, frente às críticas ao ensino tradicional, referidas
anteriormente, assumindo a visão de uma formação escolar ‘para todos’, na qual uma das
perspectivas atualmente consideradas é a da contextualização dos conteúdos do ensino
escolar.
A universalização do direito à Educação Básica até o final do EM é reveladora da
mudança radical do perfil da reforma educativa que passou a marcar o desenvolvimento
curricular, no país, buscando superar o modelo caracteristicamente elitista de organização do
ensino, no seio das políticas públicas anteriores à LDBEN (BRASIL, 1996). No entanto,
apesar das novas políticas, muitos professores de CNT ainda se mantêm alijados do acesso
aos avanços dos conhecimentos, sejam os relativos às novas perspectivas curriculares, sejam
os relativos aos próprios conhecimentos dos conteúdos do ensino que ministram.
Convivemos, ainda hoje, com a tendência de manutenção do status quo, sendo constantes os
desafios e as dificuldades enfrentadas por parte de grupos organizados que buscam propiciar,
na prática, a reforma curricular do sistema educacional.
Preocupações de educadores e pesquisadores da área de ensino CNT, em especial a
partir da década de 1980, diante das limitações percebidas no contexto educacional marcado
pela pouca significação dos conteúdos, inexistência de vinculação a situações reais, pouco
interesse e aprendizado por parte dos estudantes, ensino de transmissão e repetição com
caráter conteudista, altos índices de repetência e evasão escolar, entre outras dificuldades,
trilharam um caminho propulsor para a construção e estabelecimento de leis, parâmetros e
diretrizes que orientam o desenvolvimento de um ensino que supere as dificuldades presentes
até então.
Nessa
perspectiva,
as
reflexões
de
educadores,
pesquisadores,
instituições
governamentais e cidadãos interessados em mudar os rumos da educação neste país
permitiram a construção de documentos que fundamentam as ações educativas atuais. De
acordo com Nardi (2007):
A institucionalização da ciência em nível escolar se dá através do estabelecimento
de vários mecanismos: legislações e normas, posteriormente assumidas em caráter
oficial pelos governos através da determinação de parâmetros, diretrizes
curriculares, currículos mínimos; a criação de cursos de formação de professores
específicos para o ensino da ciência em suas diversas ramificações ou modalidades;
e a criação de outras instâncias paralelas-geralmente chamadas de não-formais,
como centros de ciências e revistas de divulgação (p.359).
36
Sugestões expressas nas orientações curriculares oficiais publicadas em documentos
como a Constituição Federal (1988), a LDBEN (BRASIL, 1996), as Diretrizes Curriculares
Nacionais para o Ensino Médio (DCNEM) (BRASIL, 1998), os Parâmetros Curriculares
Nacionais para o Ensino Médio (PCNEM) (BRASIL, 1999) e por fim as OCNEM (BRASIL,
2006), constituem uma documentação consolidada por uma caminhada histórica na educação,
de fundamental importância na perspectiva de auxiliar na melhoria da qualidade educativa dos
espaços de ensino e formação brasileiros, com uma preocupação voltada para a valorização
dos docentes da educação básica.
Todos esses documentos resultam de quase duas décadas de intenso repensar e
questionar sobre as maneiras de como a educação nacional estava sendo trabalhada nos vários
níveis e áreas. Os parâmetros, diretrizes e organizações curriculares foram publicados após a
instituição em nível nacional da LDBEN (BRASIL, 1996), com a responsabilidade de
difundir os princípios da reforma curricular e orientar o professor na busca de novas
abordagens e metodologias.
Reflexões desenvolvidas durante a elaboração de leis, diretrizes e orientações
curriculares partiram da consideração de que um avanço necessário estava se tornando
presente na área de CNT. Nessa perspectiva, as mudanças passaram a ser compreendidas
como um processo complexo e interligado, que contempla vários saberes, que não se
restringem a uma única disciplina.
Mesmo que a LDBEN não coloque referências aos eixos da contextualização e
interdisciplinaridade, ela explicita a preocupação com um ensino que garanta “o pleno
desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação
para o trabalho” (BRASIL, 1996). Acredita-se que o desenvolvimento de um ensino com
características conceituais e contextuais seja capaz de contemplar exigências de formação
expressas pela LDBEN.
Pode-se dizer que a reforma curricular em andamento no país objetiva ampliar os
processos de aprendizagem significativa ao longo do desenvolvimento dos conteúdos,
relacionando-os com a realidade dos estudantes, na perspectiva da contextualização dos
conhecimentos escolares, no ensino. Acredita-se que somente se voltarmos atenções a esta
perspectiva é que será possível uma reorganização curricular do EM que contemple a
formação dos estudantes com significações no contexto da ampla globalização que marca o
meio social e escolar, de modo que no contexto escolar possa acontecer a formação de
sujeitos ativos, críticos e participativos, capazes de construir respostas adequadas a problemas
atuais e novas situações reais (BRASIL, 1996).
37
Atualmente vivemos a era da informação e dos avanços tecnológicos de comunicação,
nos quais temas de CNT são amplamente apresentados nos variados meios de comunicação,
instigando os professores a apresentarem esses assuntos aos estudantes, possibilitando que os
mesmos associem suas realidades com os conceitos científicos básicos. Um ensino pautado na
memorização
e
reprodução
mecânica
de
conteúdos
acabados
contribui
para
a
descaracterização de uma Ciência que se preocupa com os diversos aspectos da vida e com a
formação de uma visão do homem e de seu papel no mundo em transformação (BRASIL,
2006).
Nesse sentido, torna-se necessário repensar e superar as práticas tradicionais de ensino
dos conteúdos científicos escolares, que ainda subsistem, em que pese às amplas
possibilidades de mudança propostas pelas OCNEM (BRASIL, 2006). As possibilidades de
ruptura com o modelo tradicional de ensino estão colocadas há vários anos como alternativa
de os professores repensarem sua prática pedagógica, na perspectiva de promover um
processo de ensino-aprendizagem mais significativo, que contemple expectativas de
desenvolvimento mental, cognitivo dos estudantes.
No cenário da reforma curricular vigente no país, para ensinar CNT, é fundamental
enfrentar e saber lidar com constantes desafios. Um deles é propiciar ao estudante a
participação em debates contemporâneos, que exijam conhecimentos conceituais para
tomadas de decisões com responsabilidade social. Outro desafio é a formação do indivíduo
com um sólido conhecimento na área científica e com raciocínio crítico e (re)construtivo.
Cotidianamente, a população, embora sujeita a uma variedade de propagandas e campanhas, e
mesmo diante de uma gama de informações e posicionamentos, sente-se pouco confiante para
opinar sobre temas polêmicos e que podem interferir diretamente em suas condições de vida
(BRASIL, 2006).
Nessa perspectiva, o ensino de CNT tem a pretensão de instrumentalizar o estudante,
mediante conhecimentos associados a atitudes, valores e ações, para que ele possa se
posicionar crítica e responsavelmente, diante de questões que se apresentam no seu dia-a-dia.
Trata-se, portanto, de capacitá-lo para interpretar fatos e fenômenos à luz dos conhecimentos
escolares, mais especificamente, da área de CNT, para que seja sujeito ativo, com visão crítica
e argumentativa, usando conhecimentos enriquecidos pelos estudos escolares. Defende-se
uma (re)contextualização e significação dos conhecimentos científicos em aulas de CNT, não
como conhecimentos ‘colocados a prova’ mas sim como conhecimentos cuja apropriação
pelos estudantes, em âmbito escolar, é importante.
38
Nesse cenário problemático, com as discussões apresentadas neste capítulo, defendese a atenção à necessária reflexão epistemológica sobre a especificidade dos conhecimentos
científicos e cotidianos que, produzidos pela humanidade, são prementes de co-participarem
no ensino de CNT, nos espaços educacionais diversificados, proporcionando e estimulando
uma visão mais ampliada e crítica da realidade, à luz das Ciências. Refletir sobre a
especificidade dos conhecimentos escolares e sobre o que se pretende com a produção e
recriação dos mesmos é algo bastante complexo, sendo importante promover reflexões sobre
tal complexidade, em espaços de formação para o ensino de CNT. Tal formação carece de
novas ações e interações, em busca de novas compreensões sobre as mudanças curriculares
em andamento no país, sendo essencial a conscientização e participação ativa dos agentes
envolvidos nos processos de mudança.
Nesse sentido, ao pensar num currículo para formação de professores do ensino de
ciências, logo temos que pensar na necessidade de mapear os conteúdos dessa
disciplina, de tal maneira a formar um currículo com disciplinas relevantes e que
propicie a integração entre os conteúdos e áreas específicas da ciência que está
dentro da disciplina de ciências. É importante pensarmos num currículo
interdisciplinar de formação de professores para esse ensino, levando o educando a
construir um conhecimento global, não permitindo uma organização curricular
fragmentada e compartimentalizada. Assim, acreditamos que devemos dar uma
melhor atenção nos modelos de currículo para a formação desses professores, e
também, analisar qual seria um modelo de currículo que contemple a formação de
um professor que seja apto a trabalhar interdisciplinarmente com os conteúdos das
diversas ciências no ensino fundamental (FRACALANZA, 2006, p. 211).
Assim, está-se ciente da necessidade de maior consideração, em contextos de ensino e
de formação para o ensino em CNT, da dinamicidade e complexidade dos conhecimentos e
das relações imbricadas na construção de uma organização curricular com características
contextuais atualmente propostas, frente ao pressuposto de que:
O conhecimento escolar seria estruturado de maneira a viabilizar o domínio do
conhecimento científico sistematizado na educação formal, reconhecendo sua
relação com o cotidiano e as possibilidades de uso dos conhecimentos apreendidos
em situações diferenciadas da vida. Essa proposta depende, para a concretização, de
que o professor se torne mediador entre o conhecimento sistematizado e o aluno,
para que este consiga transpor para o cotidiano os conteúdos apropriados em sala de
aula. (OCNEM, BRASIL, 2006, p. 18).
Nesse cenário problemático, situa-se e justifica-se a importância da linha de
investigação deste trabalho, que, sem deixar de dar atenção a formas de (re)contextualização
didática das abordagens tipicamente escolares, busca avanços na compreensão, sobretudo, dos
39
processos de significação conceitual, especificamente, de ‘energia’, temática que é enfocada
no capítulo que segue.
40
3 O CONCEITO ENERGIA NO ENSINO DE CIÊNCIAS DA NATUREZA E SUAS
TECNOLOGIAS
Este capítulo apresenta abordagens do conceito ‘energia’ na área de CNT. Está
organizado em três subcapítulos. O primeiro traz uma breve retrospectiva histórica do ensino
do referido conceito, na região de abrangência da UNIJUÍ, a qual se constitui no contexto
empírico desta pesquisa. O segundo explicita algumas compreensões conceituais de ‘energia’
e, com base nelas, discute aspectos do ensino do conceito, na perspectiva de contribuir para
uma recontextualização didática mais adequada do mesmo, em atividades e abordagens usuais
ao EM. O terceiro traz uma abordagem sobre a significação conceitual de ‘energia’ embasada
no referencial histórico-cultural, valorizando a visão de que a constituição da consciência dos
sujeitos e a potencialização do desenvolvimento da mente humana se dão mediante
aprendizagens configuradas por processos de apropriação de linguagens e significados
conceituais típicos ao ensino escolar.
3.1 Visão Histórica do Ensino do Conceito Energia no Âmbito Empírico da Pesquisa
Com o propósito de contribuir para situar e contextualizar a problemática em estudo,
este capítulo apresenta e discute, inicialmente, alguns aspectos históricos do ensino do
conceito ‘energia’ na área de CNT, no âmbito empírico da pesquisa. Isto, considerando-se que
o próprio interesse de investigar aspectos do ensino do referido conceito decorreu da
participação como bolsista de iniciação científica, no Gipec-Unijuí, com amplas discussões
relativas a tal ensino. Conforme Maldaner (2007), o Gipec-Unijuí “institui-se num grupo
produtivo de inovação curricular na forma contextualizada” (p. 251).
No âmbito do referido grupo de pesquisa vem sendo desenvolvida e investigada uma
organização curricular na modalidade de sucessivas Situações de Estudo (SE). Nelas, o ensino
41
assume características interdisciplinares na medida em que um contexto da vivência dos
estudantes, conceitualmente rico para diversos campos das Ciências, com duração delimitada,
é abordado em aula, permitindo uma abordagem com característica interdisciplinar,
intercomplementar e transdisciplinar. Isso, através de interações diversificadas que incluem
linguagens e significados conceituais específicos a cada um dos campos disciplinares da área
de CNT (Biologia, Química e Física), na problematização e tematização das situações
vivenciais em estudo (MALDANER e ZANON, 2004).
Ao longo dos processos de planejamento e implementação de diversas SE vivenciados,
percebeu-se a ampla e importante presença do conceito ‘energia’, com discussões em torno de
significações diferenciadas em aulas de cada campo disciplinar de CNT. Bianchi, Froner e
Araújo (2007) manifestam-se como consta abaixo, sobre as SE:
Em todas elas, a energia, cotidianamente evidenciada nas suas diferentes formas
(elétrica, luminosa, química, potencial, cinética, nuclear, mecânica,...) e relações, foi
abordada, e, impôs a necessidade de organizar esse tema de maneira sistemática na
educação Básica, a fim de constituir uma consciência crítica quanto ao
desenvolvimento (SE) almejado (p. 3).
Concomitante ao desenvolvimento das SE observou-se a necessidade de estudos e
proposições sobre as inter-relações requeridas à compreensão do conceito ‘energia’, no
âmbito da área CNT. Professores que atuam no ensino da área denotam concepções
fragmentadas, desarticuladas e até mesmo distorcidas de ‘energia’, relativamente aos
conhecimentos das Ciências. Nos processos de formação docente vivenciados articuladamente
ao desenvolvimento das SE, percebe-se a tendência de uma contraposição às abordagens e
conhecimentos fragmentados e lineares alicerçados no ensino tradicional. Contudo, tal
contraposição não pode ser vista como algo simples; são necessários estudos e pesquisas que
permitam avanços nas compreensões sobre as práticas e concepções subjacentes aos novos
contextos curriculares em desenvolvimento.
Assim, a escolha da significação do conceito ‘energia’ no ensino de CNT como objeto
de estudo considerou a potencialidade de contribuir no avanço dos entendimentos sobre as
abordagens do conceito no EM. Parte-se do pressuposto de que as SE, de modo geral, têm
potencialidade para promover compreensões e inter-relações diversificadas que incluem
dimensões contextuais e conceituais de conhecimentos, sendo importante compreender
relações entre os conhecimentos científicos e cotidianos. Assume-se que estas duas formas de
conhecimento, cada uma produzida em um contexto sociocultural específico, coparticipam
dos processos de construção dos conhecimentos escolares.
42
A relevância da presente pesquisa justifica-se também pela amplitude das relações do
conceito ‘energia’ com outros conceitos da área de CNT, sendo inúmeras as possibilidades de
produção de sentidos aos significados conceituais relativos a abordagens de diferentes
contextos e temas em estudos, por exemplo, de processos metabólicos vitais como a
respiração, entre outros.
Preocupações e estudos sobre o ensino do conceito ‘energia’ não são recentes. Elas
têm uma história em âmbito próximo e distante ao Gipec-Unijuí. Professores universitários
atualmente vinculados ao mesmo têm uma vasta caminhada, durante mais de três décadas, que
pode ser visualizada em algumas produções e ações como: publicação de materiais didáticos
em coautoria com professores da Educação Básica. Como refere Hames (2003), os processos
de formação de professores de CNT historicamente desenvolvidos no âmbito da UNIJUÍ
propiciaram relevantes momentos de interação dos professores universitários:
com os professores das redes de ensino na perspectiva da constituição dos sujeitos,
articuladamente com processos de desenvolvimento curricular, bem como nas
interações entre formadores em âmbito interinstitucional, que contribuíram tanto
para implementar amplas mudanças nas concepções e práticas de ensinoaprendizagem quanto nas reformulações do Curso de Ciências na UNIJUÍ (p. 23).
As preocupações relativas a carências na formação de professores de CNT, com
repercussão nas práticas escolares, também podem ser reportadas à problemática que diz
respeito à organização curricular das licenciaturas. As mesmas detinham-se em suas
especificidades, não sendo adequadas à formação de professores de Ciências, negligenciando
um modelo de Ciência integrada. O currículo adotado para a formação de professores de curta
duração, posteriormente modificado para as licenciaturas científicas tornando-se plenas em
uma área de CNT, não proporcionou uma boa formação nem para o EF tampouco para o EM
(WORTMANN, 2003).
Na interação com os professores das escolas, através de diferentes fases dos Projetos
de Extensão, percebia-se que as aulas nas escolas aconteciam de forma tradicional,
sempre na tentativa de transmitir conteúdos ou informações desvinculados da
realidade do aluno. Ventilou-se a possibilidade de que a formação dos professores
de Ciências pudesse ser inadequada (HAMES, 2003, p.26).
Nesse cenário, o ensino de CNT era usualmente desvinculado de abordagens de temas
ou assuntos da realidade dos estudantes e, por isso, de cunho apenas “livresco” e formalístico,
vazio de significados conceituais. Diante disso, interações com os professores das redes de
ensino, mediante atividades de extensão, potencializaram uma conscientização de que era
43
necessário instrumentalizar o professor “para um ensino mais prático e eficiente, evitando que
o estudante assumisse uma atitude de mero receptor de informações e possibilitando ao
mesmo tempo uma postura de redescoberta e realização frente às indagações da realidade
científica” (MALDANER, 1981 apud HAMES, 2003, p. 26-27).
Com base na mesma autora, no início da década de 80, constituiu-se um grupo de
estudos, interdepartamental e interdisciplinar, do qual faziam parte professores de Química,
Física, Biologia, Matemática e Pedagogia. O grupo objetivava desencadear discussões,
reflexões e estudos sobre a formação de professores em Ciências e Matemática, para melhorar
o ensino escolar e a reestruturação curricular do Curso de Ciências (HAMES, 2003).
Em nosso meio, por exemplo, na década de 80, diante dessa preocupação,
professores de Ciências vivenciaram um processo de mudança cujo desafio foi o de
inserir, nas práticas de ensino de Ciências, temas amplos de estudo trazidos da
vivência social, que pudessem articular os aprendizados na escola. Importantes
avanços foram então conseguidos, sobretudo os que permitiram dinamizar os
processos de construção do conhecimento escolar, de modo a lhes conferir um maior
grau de inter-relação, significação e relevância, além de estabelecer uma cultura de
trabalho coletivo entre os profissionais da educação (MALDANER e ZANON,
2004, p. 45- 46).
Atividades importantes no âmbito de tais grupos referem-se ao desenvolvimento de
cursos de extensão, os quais possibilitaram um profundo envolvimento dos professores
universitários com os das escolas. “As atividades, inicialmente, consistiam em elaborar
‘espécies’ de apostilas contendo roteiros de atividades práticas que abordassem,
especialmente, temas amplos, como alimentação, saúde, energia e meio ambiente”
(HAMES, 2003, p.28).
Contudo, a perspectiva de desenvolver um ensino significativo
dinamicamente inter-relacionado ao longo das séries não foi possível, incorrendo na
necessidade de níveis mais elevados de abstração, significação e compreensão dos “temas
amplos”, nos espaços de ensino e formação em CNT.
Assim, o tema ‘energia’, há trinta anos, já era concebido como um eixo articulador do
currículo da área no EF e EM, ocupando uma posição de destaque na organização dos
programas de ensino ao longo de diferentes séries da escolarização.
Inicialmente as mudanças nos currículos escolares eram propostas mediante cursos de
extensão, que nem sempre davam conta dos objetivos pretendidos, o que levou a reflexões e
questionamentos por parte dos formadores da universidade que tinham a intenção de mudança
expressa nos próprios títulos das produções: “Propostas Alternativas para o Ensino de
Ciências” (HAMES, 2003).
44
Optou-se, então, pela criação de núcleos de estudos nos quais se davam os encontros
com os professores para discutir, vivenciar, replanejar e avaliar as atividades, na
tentativa de elaborar uma proposta de trabalho que fosse ao encontro das
expectativas e necessidades dos alunos. Dessa forma, o professor passava a ser um
sujeito ativo e não mero repetidor de atividades pensadas e planejadas por outros
(idem, 2003, p.33).
No conjunto de ações desenvolvidas na área de CNT, tanto na formação inicial quanto
continuada, pode-se considerar a preocupação dispensada aos processos formativos que
permitiram avanços significativos, no que se refere às metodologias de ensino e aos encontros
de professores para a criação de núcleos de estudos, que mais tarde constituíram grupos de
produção de materiais didáticos (HAMES, 2003).
A respeito dos materiais didáticos alternativos produzidos no âmbito desses grupos, é
importante ressaltar que:
se configuravam como uma nova proposta curricular em debate e construção desde o
início da década de 80, foram elaborados em conjunto com os professores das redes
de ensino, conforme tendências pedagógicas assumidas nesse período e que podem
ser caracterizadas pela valorização das situações vivenciadas pelos alunos e dos
processos de construção dos conhecimentos, com o desenvolvimento da capacidade
de reflexão e do raciocínio crítico, de ações cooperativas, da ciência como processo
e não como um conjunto de verdades (UNIJUÍ, 1987 apud HAMES, 2003, p.41).
Segundo a mesma autora, foi possível que professores/autores das diversas disciplinas
da área participassem da produção dos materiais didáticos pelo fato de haver um grupo em
constante interação, criando possibilidades de evoluções nas práticas pedagógicas. Nessa
perspectiva, o ensino-aprendizagem em CNT não se restringia somente à área, mas buscava
abranger “questões sociais”.
na nova proposta curricular, buscava-se construir/elaborar/evoluir os conceitos
centrais de conservação-transformação; organização-diversidade; reproduçãodesenvolvimento; continuidade-descontinuidade. Para isso os seguintes temas
amplos no Ensino de Ciências foram considerados de maior relevância: o alimento,
na 4ª série; a questão ambiental, na 5ª e 6ª séries; saúde e higiene, na 7ª série;
matéria e energia, na 8ª série (MALDANER e ARAÚJO, 1992, p. 23).
No âmbito do grupo de sujeitos envolvidos em tais processos é perceptível a
consideração de inúmeras dificuldades que os acompanharam, os quais não podem ser vistos
como um “caminho” linear. Ora os avanços são mais salientes, ora menos, ora parecem
denotar retrocessos na caminhada, sendo sistemática a visão da complexidade das mudanças
em desenvolvimento. À medida que alguns resultados iam sendo atingidos, outras linhas de
mudança passavam a ser buscadas. Não tardou a consciência de que os importantes processos
45
históricos de mudança não rompiam com a forma tradicional de organização dos conteúdos na
área.
Uma avaliação mais rigorosa dessa experiência desenvolvida com base nos temas
amplos mostra que a almejada ruptura com a forma linear e fragmentada de
organização do currículo e da formação escolar não aconteceu. Ainda que de modo
não totalmente estanque, cada tema ficou concentrado em determinado espaço
curricular: alimentação na quarta série, energia na oitava, saúde na sétima.
(MALDANER e ZANON, 2004, p. 47)
Com base nisso, a partir do ano 2000, os processos de reconstrução curricular, na
região de abrangência da UNIJUÍ, na área, passaram a ser organizados em torno das SE. Com
o desenvolvimento das mesmas, houve, inclusive, a decisão de que os LD que veiculavam as
antigas “Propostas Alternativas de Ensino” não seriam mais publicados. As escolas passaram
a ser desafiadas a produzirem suas SE, com acompanhamento do Gipec-Unijuí,
implementando, assim, a nova organização curricular, na perspectiva de romper com a
linearidade e a diretividade que marcava o ensino dos mesmos conteúdos nas mesmas séries
escolares.
Durante os anos de 2003 a 2005, tendo vivenciado ações coletivas no âmbito da SMEd
(Secretaria Municipal de Educação) de Ijuí, envolvendo estudos e planejamentos de SE, foi
possível perceber a tendência, por parte dos professores e das escolas, de manter as práticas
fragmentadas, tendo sido visíveis as permanentes necessidades de aprofundamento e
ampliação das compreensões dos próprios conteúdos do ensino escolar. Isso juntamente com
as constantes dificuldades para o desenvolvimento de um currículo e de um ensino
dinamicamente articulado, na área.
Com esta breve retrospectiva histórica, pode-se dizer que preocupações em romper
com a fragmentação do conhecimento escolar - priorizando relações entre conceitos de modo
a atingir a significação dos mesmos - fizeram e fazem parte dos objetivos do grupo de
professores de CNT da UNIJUÍ. Na última década, tal grupo passou a ser organizado como
um grupo interdepartamental de pesquisa, o Gipec-Unijuí. Além de possibilitar o
desenvolvimento de uma nova modalidade de organização curricular (SE), vem
proporcionando interações mais próximas com professores em formação, seja inicial ou
continuada, ainda unido na busca de propor, discutir e implementar ações que potencializem
um ensino significativo, em CNT.
No que se refere, especificamente, ao ensino de conteúdo/conceito ‘energia’, pode-se
dizer que - apesar de o mesmo ter sido enfatizado desde os primeiros movimentos de melhoria
46
na organização curricular, no ensino e na formação de professores de CNT - permaneceram
por vários anos concepções simplistas, por parte dos professores e estudantes, haja vista as
abordagens tanto inadequadas (relativamente às explicações científicas) quanto restritas a um
único campo disciplinar.
A partir de falas registradas em entrevista com uma professora universitária (PU)
vinculada ao Gipec-Unijuí, foi possível ampliar informações sobre aspectos da história do
ensino do conteúdo/conceito ‘energia’, bem como sobre a complexidade do mesmo. Foram
expressos depoimentos relativos ao ensino e ao entendimento conceitual, antes e depois do
desenvolvimento da organização curricular na modalidade de SE, com ênfase no campo
disciplinar de Biologia.
A compreensão de ‘energia’ de forma dinamicamente inter-relacionada, contando com
entendimentos específicos a cada uma das disciplinas da área de CNT, constitui-se em tarefa
complexa e que, no mais das vezes, não faz parte do ensino e da formação de professores, na
área. Segundo o depoimento da professora universitária de Biologia, uma das primeiras
discussões sobre o conceito ‘energia’, no âmbito da área, na UNIJUÍ, veio à tona por volta de
1996, quando da organização de módulos formativos do Pedagogia do Ensino Fundamental
(PEF), junto a um grupo de acadêmicos do Curso de Pedagogia do Movimento Sem Terra
(MST). Sobre a complexidade do conceito ‘energia’ PU3 se manifestou conforme segue:
PU3: O desenvolvimento dos módulos até ir chegando a SE [...] permitiu um
diálogo entre as Ciências e dentro da própria Ciência, por exemplo, entre as
disciplinas Biologia, Química e Física, Geociências, Astronomia e tal, o que
permite dentro da própria Biologia outros tipos de diálogo. Porque se a energia, lá
na Ecologia, flui, pode ser que na Fisiologia ou na Bioquímica não flua, seja mais
transformada. Mas de fato a gente pouco lida com isso. O principal capítulo que
fala exatamente da palavra energia, nos livros didáticos, é o capítulo que trata da
Ecologia. A energia na parte do ciclo celular, da divisão celular, do ciclo de Krebs
e da cadeia respiratória, nem sempre a palavra energia aparece, apesar de
aparecer ATP. Nem lá na própria replicação e transcrição lá no DNA, também não
aparece quase a palavra energia, então veja quantos lugares que teria [...] energia
na Biologia que são pouco tratados.
O depoimento de PU3 remete para a consideração de que são inúmeros os
problemas relativos ao ensino sobre ‘energia’, desde a precariedade das abordagens ao longo
dos estudos dentro de um campo disciplinar, como o de Biologia, até problemas que podem
ser reportados às próprias concepções conceituais, a exemplo da visão de uma energia que
“flua” ou que “seja transformada” ou da forma fragmentada de abordagem dos conteúdos.
PU3: Porque são temas que todo mundo debate e poucas são as respostas que se
tem sobre essa questão da energia. [...] O grande problema da Biologia em relação
47
à Química e a Física no meu ponto de vista é como o conceito de energia fica
entendido. Porque o grande lance, [...] é o problema desse conceito em relação às
outras duas áreas. Eu só consegui perceber [...] que, na minha formação, a gente
não dava muita conta de que essa energia física, química e biológica era a mesma.
Parecia que tu tinha uma energia para cada área. Em 1996, 97, quando é a data do
PEF, aí a gente resolveu fazer um ensino por módulos, que originou o que nós
temos ((hoje)) como a Situação de Estudo, mas com um módulo. [...] apareceu o
conceito energia. Como esse módulo tinha um professor de Física, um professor de
Biologia e um professor de Química trabalhando juntos aconteceu que eu comecei a
falar, por exemplo, que, pra mim, a energia na Biologia ela flui, na Física ela é
transportada e na Química transformada. Então, a idéia que se tem na Biologia, é
que a energia tá passando dentro de um cano, de um canudo, que ela flui. [...] Essa
não é só minha concepção, é o que tá escrito no livro de Biologia, porque a energia
flui de um nível trófico para outro.
No depoimento acima é possível perceber as limitações relativas a compreensões de
‘energia’, decorrentes de uma formação sem interlocuções dentro da área de CNT, baseadas
principalmente no uso dos LD, cujas abordagens são restritas a cada campo disciplinar e,
ainda, apresentam inúmeras inadequações conceituais, denotando concepções simplistas e
fragmentadas acerca de um mesmo conceito. O que se pode dizer é que grande parte dos
professores possivelmente ainda não se deram por conta da amplitude e da complexidade das
relações envolvidas na compreensão escolar do conceito ‘energia’. O depoimento que segue
também se refere às dificuldades em romper com visões simplistas e fragmentadas sobre o
conceito.
PU3: Eu estava desde 82 na Unijuí, quatorze anos dialogando com colegas da
Física e Química, mas a ficha foi cair, para essa mudança de compreensão
conceitual, perante o PEF, que foi com o MST. Antes disso ninguém discutiu [...]
que a energia da Física, a energia da Química e da Biologia eram [...]. Primeiro foi
preciso estabelecer, perceber que a energia é um conceito e tem gente que não sabe
o que é. Essa é a primeira questão. A energia, não se sabe. Nem o texto do ((cita um
autor)) [...] nos dá uma definição de certeza do que é energia. O máximo que se
sabe é o que ela não é. E o que ela é não se sabe ao certo. A segunda coisa
importante é tu saber que a energia da Química, da Física e da Biologia e da
Geociências, e de tudo, de todas as áreas, é a mesma. [...] Um diálogo específico,
[...] nessa montagem dos módulos, trouxe a energia como um aspecto fundamental
de análise. Daí, pela primeira vez na vida, [...] foi intermediado [...] no diálogo. Os
alunos [...] olharam assim: “mas o que vocês estão dizendo? Não, a energia flui?
Não, a energia se transforma e é transportada; o que é transformado e
transportado? O que é esse negócio?” E daí a gente começou a esclarecer pra nós
professores e pros alunos, daí, nesse diálogo, que a gente, que eu comecei a
enxergar outra ((energia)), porque ela é transformada, transportada e conservada,
que são três características fundamentais. A transformação da energia é
fundamental. Mas isso eu já era professora há dezesseis anos.
PU3 ressaltava que, sendo uma professora de Biologia que atuou historicamente nos
diferentes níveis de ensino, manteve por longos anos a mesma concepção limitada decorrente
de sua formação. Dar-se conta da compreensão da complexidade do conceito ‘energia’, não
48
será possível sem diálogos entre pares que atuam nas diferentes disciplinas da área de CNT.
Tal dificuldade é reforçada nos LD, até mesmo os mais atuais, que avançam muito na
apresentação de abordagens com ilustrações e textos que denotam elevados graus de
dificuldades, carecendo de significação conceitual.
Tais interações dialógicas são vistas como um ponto determinante para avançar nas
concepções de ‘energia’, por isso é necessário que os sujeitos da área possam contar com
processos articulados de formação, poder discutir coletivamente seus trabalhos, a partir de
objetivos comuns no desenvolvimento das suas práticas escolares, de modo que professores e
estudantes possam avançar nos conhecimentos, em detrimento de entendimentos simplistas.
Especialmente na Biologia, parece ser necessário e importante superar visões como a de que a
‘energia’ “flui”. Sendo um conceito fundamental, é importante que os próprios LD de CNT,
bem como os espaços de formação de professores, propiciem abordagens relativas ao conceito
e suscitem discussões que se contraponham a tais limitações.
PU3: Não tem como avançar [...] porque parte-se [...] do pressuposto que os
professores usam os livros didáticos como base. Nos livros didáticos a energia da
Física, da Química e da Biologia é diferente. Tanto do Ensino Médio quanto do
superior ainda continua naquele caminho antigo. Acho que não ocorreram
mudanças, a não ser alguns poucos casos [...]. Porque ainda encontro em textos de
Biologia mesmo o último livro ((referindo-se a autor de LDBIO muito utilizado no
EM)) que é super cheio de coisas, faz toda a fotossíntese, [...] fótons e
transformação, mas a energia tá fluindo. [...] ((Ou seja, permanece a idéia de que))
na Biologia ela fui, na Química e na Física ela é transformada e conservada, mas é
pouca expressão a mais que tem. Então isso impede uma compreensão maior, mais
significativa.
Perante as dificuldades de estabelecer compreensões e abordagens de ‘energia’,
alternativas como a organização coletiva dos professores da área podem ser formas de
contrapor-se à simplicidade com que o conceito é abordado nos LD. Criticar somente os LD
não basta. É necessário refletir sobre eles, estudar e discutir suas abordagens em espaços de
formação inicial e continuada. A entrevistada, mesmo que afirme: “não tem como avançar”, é
talvez uma das poucas professoras de Biologia que não permaneceu acomodada ou alheia às
concepções repassadas pelos LD, relativas à ‘energia’. No episódio a seguir, manifesta-se
sobre atividades iniciais de melhoria na abordagem conceitual de ‘energia’ em contexto
escolar e sobre a formação docente inicial, na área.
PU3: Então nós estamos propondo que nas disciplinas a idéia de energia, ((seja))
nessa perspectiva de [...] em Biologia, Química e Física ser a mesma. [...] E essa
articulação, [...] tu tem que garantir [...] na escola. Aí tu tens que garantir na
49
formação inicial que esse conceito seja compreendido como um conceito unificador.
Porque se tu não pensar ele na formação inicial, ninguém vai pensar depois.
Nesse sentido, cabe aos professores de CNT, sempre que surgir alguma situação
vivencial ou escolar relacionada à ‘energia’, discutir e propor novas possibilidades de
abordagem, com vistas a relacionar e significar o conceito de forma adequada. Na entrevista
semi-estruturada com enfoque em ‘energia’, uma das questões referia-se a: “como você vê
possíveis relações entre o significado conceitual de ‘energia’ a ser ensinado na escola e
situações da vivência cotidiana? De que forma poderiam ser contempladas relações com
contextos cotidianos? (Questão 9, APÊNDICE III). A entrevistada respondeu sugerindo com
veemência o desenvolvimento das SE:
PU3: A Situação de Estudo, [...] ela permite [...] diálogos. [...] Permite um diálogo
entre as ciências e dentro da própria ciência. Por exemplo, entre as disciplinas
Biologia, Química e Física e as áreas Geociências e outras como Astronomia e tal,
que permite [...] essa articulação.
Os depoimentos de PU3 também justificam o olhar direcionado ao ensino do conceito
‘energia’, abordado nas diferentes disciplinas da área de CNT, nas diferentes séries e níveis da
educação, estando sistematicamente presente nos estudos sobre o meio físico, natural ou
artificial. Compreender a natureza das diferentes modalidades de ‘energia’ e suas
interconversões, em atenção a implicações das mesmas no ambiente é, certamente, um desafio
que se coloca na área de CNT e, também, no âmbito deste trabalho, que focaliza abordagens
relativas à compreensão da ‘energia’ e suas transformações na biosfera.
Contudo, a compreensão do conceito ‘energia’, abstrato e complexo por natureza,
quando tratado de forma abrangente e dispersa, torna-se difícil, de modo que, muitas vezes,
aparece atrelado a entendimentos simplistas, quando não deturpados relativamente ao
significado científico, por parte dos educadores e estudantes. Muitas vezes, mesmo após anos
de escolarização ou até mesmo de ensino, no caso de professores de CNT, as compreensões
de ‘energia’ mantêm-se limitadas aos conhecimentos cotidianos. Definições de caráter
formalístico e linear, sem estabelecer nexos de relações não permitem uma compreensão
conceitual significativa.
No âmbito do ensino escolar, abordagens sobre ‘energia’ limitam-se, no mais das
vezes, ao campo restrito de cada disciplina, sem contemplar inter-relações intencionalmente
mediadas entre linguagens e significados conceituais intermediados em aulas de Biologia,
Química ou Física. O que se percebe é que os aprendizados se mantêm cerceados a cada
50
campo disciplinar e, além disso, o ensino do referido conceito, no âmbito de cada uma das
disciplinas de CNT, denota problemas relativos a visões simplistas e/ou deturpadas, haja vista
as abordagens nos próprios LD e, por decorrência, nos processos de ensino e de formação de
professores da área.
Seja em contexto escolar ou universitário, compreensões e explicações do conceito
‘energia’ carecem de avanços que levem em conta novos conhecimentos, bem como a
versatilidade e complexidade inerente ao conceito. Também, é importante levar em conta a
perspectiva da superação das dicotomias entre entendimentos de nível micro e macroscópico,
em suas repercussões nos aprendizados escolares.
No item que segue a partir da breve retrospectiva histórica com uma problematização
sobre o ensino de ‘energia’ no currículo escolar, são apresentados e discutidos aspectos
relativos ao entendimento conceitual de ‘energia’, em sentido mais amplo, em busca de
avanços nas abordagens e compreensões em aulas de CNT.
3.2 Uma Discussão sobre o Conceito ‘Energia’
Ao longo da história da Ciência, a noção de ‘energia’ levou centenas de anos para se
desenvolver e se estabelecer (JACQUES, 2008). No que tange à própria evolução histórica do
universo, pode-se dizer que ‘energia’ é algo que sempre esteve presente em todos os
fenômenos naturais, os quais possibilitaram a organização do ambiente e a evolução da vida.
A ‘energia’ sempre esteve presente, também, de uma forma ou outra, no pensamento dos
estudiosos, contudo, de acordo com Auth (2000):
Somente foi reconhecido pela comunidade científica, na sua formulação atual, a
partir de meados do século XIX. Energia uma grandeza não palpável e nem
modelável e, portanto, não “coisificável” (...). As diversas manifestações
relacionadas com a energia que ocorrem na natureza indicam que o conceito energia
não está associado somente a “algo coisificável”, mas também a formas, como a
eletricidade e o calor, a interações (à distância) e a posições. (p.69)
Mesmo após esse percurso histórico de desenvolvimento, com as implicações de sua
inserção nos currículos da educação básica e superior, o ensino do conceito carece ser mais
bem compreendido, no que se refere ao seu próprio significado conceitual, bem como à
dialeticidade das relações envolvidas na construção do conhecimento escolar, mediante
formas de articulação entre conhecimentos científicos e cotidianos. Isso, considerando-se os
diversos níveis da escolarização, desde os 5º e 6º anos do EF, quando são desenvolvidos os
51
primeiros conhecimentos escolares relativos às relações entre fatores bióticos e abióticos que
mantêm as condições e a dinâmica dos processos biogeoquímicos no Planeta, com seus
permanentes ciclos e fluxos de transformação, envolvendo a matéria/energia.
Trata-se de uma noção cuja compreensão, como já referido neste trabalho, abrange
uma complexidade de entendimentos, nem sempre reconhecida como inerente ao ensino de
CNT, com decorrências que podem ser remetidas a especificidades de sentidos e significados
conceituais produzidos, validados e usados no âmbito de cada uma das comunidades
científicas da área.
Para assegurar a coerência com os princípios e leis aceitos no âmbito da Ciência, o
conhecimento escolar sobre ‘energia’ necessita priorizar entendimentos configurados a partir
da visão, primeiramente, de que existe uma diversidade de formas de ‘energia’ (trabalho,
energia elétrica, luminosa, gravitacional, eólica, hidroelétrica, magnética, térmica, mecânica, e
outras). Entendimentos, também, a partir da visão de que as diferentes formas de ‘energia’
podem transformar-se, interconvertendo-se umas nas outras. Ainda, a visão de que, ao mesmo
tempo em que elas se transformam, há conservação da ‘energia total’ do sistema
(considerando-o como um sistema isolado). Ou seja, a ‘energia’ sempre se conserva. Nesse
sentido, como referem Anacleto e Ferreira (2008):
o calor e o trabalho são, respectivamente, manifestações de movimento caótico e
organizado das partículas na vizinhança, pelo que uma alteração na vizinhança
resultante da sua permuta com o sistema poderá ter como conseqüência uma
alteração dos valores do calor e do trabalho, mantendo-se contudo invariante a sua
soma (p. 1882).
Assim, uma diversidade de entendimentos relativos a conceito ‘energia’ complexifica
a compreensão conceitual do mesmo, em sentido mais amplo.
Existem várias formas de energia, associada aos diferentes tipos de trabalho: o
trabalho mecânico, [...] o trabalho elétrico, o fluxo de calor etc. A idéia básica da
primeira lei é que todas estas formas de energia são interconvertíveis e que se
conservam. Essas idéias foram se estabelecendo com o decorrer do tempo, a partir
do século XVIII, quando se percebeu a impossibilidade da construção de máquinas
que pudessem trabalhar sem consumir energia (moto continuum). Elas foram sendo
expressas, de forma variada, por vários pesquisadores de diferentes áreas (Física,
Engenharia, Química, Fisiologia, Filosofia), alguns de maneira mais particularizada,
outros de forma mais geral, porém essas idéias nem sempre foram bem
compreendidas (CHAGAS, 1999, p. 39).
Considerações como a acima reiteram a visão de que a compreensão do conceito
‘energia’ abrange inter-relações que extrapolam os limites de cada Ciência. Por outro lado,
52
mesmo na Ciência o entendimento do que é a ‘energia’ não pode ser visto como uma
concepção simples nem consensual, sendo importante considerar as amplitudes dos
significados, a exemplo da explicação expressa por Angotti (1991) de que a energia é:
um “sutil camaleão” do conhecimento científico. Transforma-se espacial e
temporalmente, na dinâmica mutável dos objetos, fenômenos e sistemas, conservase na totalização das distintas formas e degrada-se porque uma de suas formas – o
calor – é menos elástico e reversível do que outras (p.115 apud AUTH, 2000, p. 70).
Não cabe, aqui, discutir detalhadamente tal concepção, mas, sim, reiterar a afirmativa
de que, no ensino de CNT, é importante considerar os graus de dificuldades inerentes ao
entendimento do referido conceito, evitando explicações escolares simplistas e/ou deturpadas,
que não levam em conta conhecimentos importantes sobre o ambiente, no que se refere à
natureza da matéria e da ‘energia’. Tais conhecimentos incluem noções importantes relativas
às partículas e às interações inter-partículas envolvidas na compreensão de abordagens sobre
fenômenos tomados como objeto de estudo, na área. Como refere Chagas (1999):
O estudo das variações de energia associadas às reações químicas é um dos aspectos
mais importantes da Química, tanto do ponto de vista fundamental, como das
aplicações. Do ponto de vista fundamental, pode-se mencionar que todo processo
físico, químico ou biológico ocorre envolvendo uma troca de energia com o
ambiente. Um dos conceitos básicos da Termoquímica é o de energia de ligação, ou
seja, a variação de energia que ocorre quando se quebra ou se forma uma ligação
química, o qual, juntamente com conceito de distância interatômica, é utilizado para
caracterizar a ligação química [...]. Do ponto de vista das aplicações, todo processo
químico industrial necessita trocar energia com o ambiente, e o balanço energético,
que é o cômputo de todas as trocas energéticas realizadas pelo sistema, é
indispensável para o seu bom funcionamento. Acresce-se ainda que um dos grandes
problemas do mundo de hoje é a chamada questão energética, ou seja, a produção,
distribuição e consumo de energia para uso industrial, doméstico, agrícola nos
transportes etc., energia essa em sua maioria proveniente da queima de combustíveis
fósseis (petróleo, carvão etc.) (p. 59).
A importância de melhor compreender as abordagens do conceito ‘energia’ nos
estudos escolares, na perspectiva de propiciar aprendizados significativos é remetida à
abrangência do mesmo, tanto no que se refere ao contexto científico, quanto escolar, o qual,
por sua natureza, abrange relações com conhecimentos cotidianos.
Essa visão da amplitude e da complexidade inerente à compreensão conceitual de
‘energia’ remete para discussões e reflexões relativas a entendimentos conceituais sobre
formas de abordagem no contexto escolar, sobre como os conhecimentos científicos são
recontextualizados nos próprios processos de produção dos LD. Como o conceito ‘energia’ é
compreendido no âmbito científico e como é pedagogicamente transformado em
53
conhecimento escolar? Essa linha de indagação considera e remete para reflexões sobre a
visão de que tanto os conhecimentos cotidianos quanto os científicos têm significados e
sentidos específicos, com características próprias, os quais, de forma dinamicamente interrelacionada, coparticipam na produção dos conhecimentos escolares.
Diferentemente do conhecimento científico, o conhecimento escolar envolve interrelações com conhecimentos cotidianos, nunca no sentido da conversão de um no outro, mas
sim, de uma relação dialética entre eles. Ambos se complementam e são interdependentes, nos
processos dinâmicos de constituição do conhecimento próprio ao contexto escolar. Tais
processos abrangem relações de tensão e de conflito decorrentes das inerentes características
epistemológicas dos contextos culturais de produção de conhecimento na Ciência e no
cotidiano. Vigotski (2001) usa o termo ‘espontâneo’ para referir-se aos conhecimentos
produzidos pelas pessoas nas interações circunstanciais, diferentemente dos processos de
ensino e aprendizagem sistemáticos e intencionais típicos do contexto escolar. Com base em
suas pesquisas com crianças o autor refere que:
Poderíamos dizer que os conceitos científicos, que se formam no processo de
aprendizagem, distinguem-se dos espontâneos por outro tipo de relação com a
experiência da criança, outra relação sua com o objeto desses ou daqueles conceitos,
e por outras vias que eles percorrem do momento da sua germinação ao momento da
formação definitiva. [...] a força e a fraqueza dos conceitos espontâneos e científicos
no aluno escolar são inteiramente diversas; naquilo em que os conceitos científicos
são fortes os espontâneos são fracos, e vice-versa, a força dos conceitos espontâneos
acaba sendo a fraqueza dos científicos (idem, p. 263).
No que se refere à produção de sentidos e significados conceituais, em contexto
escolar, uma das tendências curriculares que ganhou força a partir dos PCNEM (BRASIL,
1999) é a que se refere à contextualização dos conteúdos do ensino. Por um lado, tal
valorização da contextualização no ensino pode ser vista como um caminho sem volta. Por
outro lado, ela não pode ser vista como algo simples de ser desenvolvido nas práticas
curriculares, sendo necessário levar em conta a complexidade inerente aos processos
descontinuistas e plurais (LOPES, 1999) de produção de conhecimentos, mediante relações
dialéticas entre conhecimentos científicos e cotidianos variados, os quais se requerem,
mutuamente, em relação de reciprocidade, sem nunca negligenciar a diversidade de suas
naturezas. Isso, considerando-se que:
As entidades tidas como reais dentro do discurso do dia-a-dia diferem das entidades
da comunidade científica. O raciocínio de senso comum, embora possa apresentar
certa complexidade, tende a ser tácito ou a não ter regras explícitas. O raciocínio
científico, por outro lado, é caracterizado pela formulação explícita de teorias, que
54
podem ser comunicadas e inspecionadas (...). Envolve vários cientistas
comunicando-se uns com os outros (DRIVER et al, 1999, p.35).
Nesse sentido, referendando uma publicação produzida no âmbito desta pesquisa, em
que participei como coautora (HAMES et.al, 2007), cabe reiterar o entendimento de que os
processos de produção do conhecimento escolar supõem processos de diálogo entre
conhecimentos científicos e cotidianos.
Tal linha de discussão e reflexão remete para a consideração, também, de que no
ensino é inerente o risco de incorrer em obstáculos epistemológicos e pedagógicos à
compreensão escolar de ‘energia’. Partimos do pressuposto de que as formas escolares de
compreensão e explicação de situações reais não são feitas com, mas sim, contra as formas de
conhecimento produzidas na vivência cotidiana, contra os processos circunstanciais de
produção de conhecimentos, usualmente presos ao real, e que acompanham nossas primeiras
bagagens culturais (LOPES, 1999).
Isso remete a entendimentos sobre a inerente abstração que acompanha os processos
de conhecimento de CNT, a exemplo do conceito ‘energia’.
Em algumas situações o conceito de energia, por ter um caráter mais abstrato, mas
ao mesmo tempo ser identificado em várias formas, como luz e calor, passa a ser
concebido como algo superior, não compreensível. Já, em outras, passa a ser
considerado de forma simplista ignorando-se seu grau de abstração. As duas visões
fazem parte da cultura primeira das pessoas, com forte apego ao imediatismo das
evidências. Sabem que a energia é útil, identificam-na nos fenômenos elétricos, nos
solares e mesmo nos processos vitais (relacionados com as necessidades para
sobrevivência dos seres vivos). No entanto, não percebem outras possibilidades,
além das diretamente observadas (AUTH, 2000, p.70).
Nesse sentido, o conceito ‘energia’ é apontado, neste trabalho, como uma referência
importante sob o ponto de vista do ensino nas disciplinas da área de CNT, o que implica
inúmeras compreensões, (re)contextualizações e (re)significações. A ‘energia’ da Biologia, da
Química e da Física é diferente? Quais entendimentos conceituais são mediados em cada
disciplina? Formas diversas de ensino potencializam aprendizados do conceito de maneira
significativa?
Por vezes o ensino é limitado a abordagens simplistas, precariamente relacionadas
com situações reais, por exemplo, com entendimentos sobre a manutenção da vida e das
condições ambientais em sentido mais amplo. No que se refere às limitações das significações
conceituais que acompanham o ensino e a compreensão de ‘energia’ (por parte de estudantes
e professores), reafirma-se a importância e a necessidade de direcionar a atenção para
55
reflexões sobre a prática no ensino de CNT, bem como sobre a formação para o ensino na
área.
Esse cenário problemático situa o direcionamento da atenção, neste trabalho, para a
análise de interações entre professores em formação inicial ou continuada, focalizando o
ensino de conteúdos de CNT relacionados com a compreensão de ‘energia’. Como tal
conceito é significado no âmbito de cada disciplina e na área de CNT como um todo? Como
referem Strada et al:
As noções de energia são diferenciadas entre si, mas podem ser agrupadas de acordo
com a área do livro didático, ou seja, a Biologia diz que “energia flui”; na Física, “é
capacidade de realizar trabalho”; e na Química, “é agente de transformações e de
movimento”. (...) Falta uma conceituação que possa ser utilizada por todos os
componentes CNT, que permita aproximações entre eles e não essa concepção
desconexa, sem relação. Percebem-se em um mesmo tema, num primeiro momento,
explicações e/ou teorizações diferenciadas conforme a área de conhecimento, que
precisam ser recolocadas, ampliadas, significadas e compreendidas. (2007, p. 5-6)
Em processos de ensino e formação de professores de CNT, o LD, muitas vezes,
constitui-se em um dos poucos recursos pedagógicos usados em salas de aula. Por isso é
fundamental empreender esforços no sentido de uma compreensão mais ampla das
repercussões, no ensino, de formas diferenciadas de tratamento dos conteúdos por parte dos
LD. O que se percebe é que, na área, abordagens convencionais refletem a visão de uma
sequência linear e fragmentada de conteúdos, o que tende a dificultar o desenvolvimento de
conceitos escolares, que contemple inter-relações de conhecimentos diversificados.
Possivelmente, assumem tais características por decorrerem de visões positivistas, “em que as
ciências exatas e naturais reafirmam as crenças em si mesmas e se fecham em suas exclusivas
competências, segundo uma lógica desvinculada dos fins humanos” (MARQUES, 1988, p.6687).
Nem
mesmo
dentro
da área,
as
abordagens
de conteúdos
e conceitos
transdisciplinares, como é o caso de ‘energia’, contemplam inter-relações de conhecimentos.
Essa tendência de manter a fragmentação dos conceitos/conteúdos no ensino de CNT situa e
justifica a importância de estudos e ações numa direção que se contraponha a ela,
desenvolvendo interações que contribuem na articulação dos diversos conhecimentos que
integram o ensino de CNT.
Para tal, é possível eleger determinadas categorias que possibilitam estruturar
conhecimentos centrais das CN, com características voltadas para evidenciar o que é
essencial, o que é universal, o que é mais geral nas várias leis e teorias destas
ciências. Estas características podem ser exploradas no processo de ensino-
56
aprendizagem utilizando-se, por exemplo, conceitos unificadores como os propostos
por Angotti. (AUTH, 2000, p.65).
Auth refere-se à tese de Angotti (1991), defendida pelo autor com base na
sistematização de quatro conceitos unificadores, dentre os quais o conceito ‘energia’. Os
outros três são: ‘transformações’, ‘regularidades’, ‘escalas’. O autor considera que o conceito
‘energia’ é mais geral que os demais. “Por estar presente em várias esferas do conhecimento,
como na área de Ciências Naturais, com possibilidade de associar conhecimentos até então
tidos como separados, energia pode ser considerada conceito unificador” (AUTH, 2000, p.
69). Tais conceitos refletem relações que, de modo geral, precisam tornar-se mais visíveis e
presentes no ensino de CNT. O conceito ‘energia’, além de estabelecer relações com vários
conhecimentos da área, abre possibilidades de relacioná-lo com outras áreas, a exemplo da
história de seu desenvolvimento na sociedade, dos aspectos geográficos, econômicos,
políticos, relacionados com os processos de produção e uso de diferentes formas de ‘energia’
na sociedade.
O conceito unificador ‘energia’, por permitir grandes generalizações e ao mesmo
tempo aproximações em torno das conservações e transformações naturais e tecnológicas,
potencializa a conexão entre conhecimentos diversificados no ensino de CNT, em especial, no
EM.
Os conceitos unificadores são importantes quando se quer, no ensino, envolver os
objetos reais do cotidiano dos estudantes, evidenciar transformações e regularidades,
por exemplo, e, a partir delas, construir os conhecimentos escolares, atingindo níveis
mais avançados de abstração. Além disso, são considerados importantes para
reestruturar atividades de ensino de Física, Química e Biologia, com abrangência
suficiente para superar a usual forma fragmentada, de ensino. (AUTH, 2000, p.75)
Superar abordagens de cunho formalístico e fragmentado do conceito ‘energia’ no
ensino de CNT não é tarefa simples, como vem sendo afirmado neste trabalho. Isso requer
mudanças tanto nos conhecimentos dos professores em formação (inicial e continuada) quanto
nas suas concepções pedagógicas e epistemológicas.
Ao observar abordagens de ‘energia’ na área de CNT, por parte dos LD ou de
professores das diferentes disciplinas, percebem-se explicações que não contemplam
entendimentos relativos ao princípio da ‘conservação de energia’ com explicações sobre a
‘energia’ total e as transformações envolvidas nos sistemas em estudo. Por exemplo, nos
estudos sobre processos ‘endotérmicos’ e ‘exotérmicos’, estudantes e professores denotam
dificuldades recorrentes relacionadas à visão da ‘energia cinética’, ‘potencial’ e das suas
57
interconversões, mediante entendimentos sobre a natureza das partículas e das interações. Até
mesmo dificuldades relativas à compreensão de processos que envolvem variação de calor e
temperatura são recorrentes em estudos sobre sistemas com realização de trabalhos.
A interpretação atômico-molecular de processos endotérmicos e exotérmicos exige
clareza quanto aos aspectos macroscópicos dos experimentos. Há muitas
dificuldades com as definições de sistema e de vizinhança e com o fato de ser ou não
possível a troca de calor entre eles – e, em caso afirmativo, dúvidas quanto às
consequências do restabelecimento do equilíbrio térmico (BARROS, 2009, p. 1).
São várias as compreensões conceituais envolvidas nos estudos sobre sistemas
(naturais ou tecnológicos) cujo funcionamento envolve transformações de ‘energia’. Tais
dificuldades podem ser reportadas a conhecimentos sobre a natureza de entidades
coparticipantes do funcionamento dos sistemas, bem como sobre as interações entre as
mesmas. Entidades simbólicas ou reais? São inúmeras as linhas de reflexão e discussão sobre
conhecimentos e concepções que integram processos de formação de professores de CNT.
Uma discussão importante de ser aqui trazida é a que diz respeito a carências ou
inadequações de abordagens relativas à noção de ‘energia interna’ de um sistema, no ensino
de CNT. Isso implica compreensões em nível microscópico sobre as partículas e as
transformações envolvidas nos processos de interconversão matéria/energia. A ‘energia’
interna de um sistema corresponde à soma de todas as formas de ‘energia’ que o integram,
podendo ser expressa como a soma da ‘energia’ cinética e da energia potencial do sistema.
Considerando o nível microscópico, nota-se que os estudantes nem sempre têm uma
boa compreensão do significado da energia interna de um sistema nem de suas
constituintes – a energia cinética e a energia potencial das partículas que o formam.
Ainda nesse nível, existem dúvidas quanto à associação de ruptura e formação de
ligações (ou de interações intermoleculares) com absorção e liberação de energia,
como também quanto à identificação desses fenômenos com alterações na energia
potencial das partículas envolvidas (BARROS, 2009, p. 1).
Mediar explicações sobre a ‘energia interna’ é essencial para uma compreensão
adequada sobre a conservação e as transformações matéria/energia, no âmbito de qualquer
sistema em estudo. Cabe destacar o entendimento de que:
os componentes significativos da energia interna são aqueles que podem alterar-se
no decurso de uma reação química – quais sejam: (I) as energias associadas à
translação, rotação e vibração das partículas (ou de outras unidades estruturais
capazes desses movimentos); e (II) a energia eletrônica, que é a energia associada às
várias interações, intramoleculares e intermoleculares, que existem entre núcleos e
elétrons. (...) A soma dos componentes agrupados em (I) corresponde à energia
58
cinética das partículas constituintes do sistema, e a soma dos componentes
agrupados em (II), à sua energia potencial. (BARROS, 2009, p. 2)
Carências de relações nas compreensões conceituais das interconversões de formas de
‘energia’, no ensino e na formação do professor de EM, repercutem em dificuldades de
compreensão do significado de ‘energia interna’ ao qual são inerentes as relações conceituais
que permitam “entender as ligações entre os átomos, a quebra de ligações, rompimento de
ligações” com variação de ‘energia’, a partir de mudanças na “interação química... as
anteriores e as novas interações”. Em vista da complexidade das transformações envolvidas,
em vez de restringir à expressão ‘energia interna’, cabe considerar formas de energia
envolvidas, como potencial e cinética, definidas por Barros (2009) como:
Energia cinética é a energia associada ao movimento. Quanto maior ela for, tanto
maior a velocidade de translação e/ou a velocidade de rotação e/ou a frequência de
vibração das partículas. (...) A percepção da energia potencial é mais difícil do que a
da cinética. (...) a energia potencial de um sistema está associada às interações entre
núcleos e elétrons e relaciona-se à posição das partículas. Ela só se mostra evidente
quando se transforma em trabalho ou em outras formas de energia (p. 2).
Tais entendimentos remetem a concepções de que conceitos científicos não existem de
forma isolada, mas que fazem parte de sistemas complexos, os quais para serem
compreendidos de forma significativa necessitam do estabelecimento de relações entre eles, a
exemplo do calor ou trabalho, relativos à energia interna de um sistema. Com base em Beatie
apud Barros (2009):
energia interna de um sistema pode ser aumentada pela execução de trabalho sobre
ele (...) A energia interna de um sistema pode também ser aumentada pela absorção
de calor. Transferência de energia na forma de calor e execução de trabalho são
modos equivalentes de se alterar a energia interna de um sistema. Calor e trabalho só
aparecem durante a transferência de energia. Portanto, um sistema não possui calor
ou trabalho – ele possui uma energia interna (p.2).
Outra simplificação conceitual no âmbito do ensino e da formação na área de CNT,
em especial, do conceito ‘energia’ diz respeito a expressões que veiculam visões simplistas
como ‘absorção’, ‘armazenamento’ e ‘liberação’ de ‘energia’, atreladas a entendimentos
arcaicos, como a da ‘hipótese calórica’, usualmente carentes de discussões em salas de aula.
Como refere Barros (2009)
59
Na verdade, na ruptura de qualquer ligação química ou de interação intermolecular,
o sistema absorve energia e há aumento de sua energia potencial nas rupturas no
mundo macroscópico. (...) Na formação de qualquer ligação química ou de interação
intermolecular, o sistema libera energia e há diminuição de sua energia potencial (p.
2-3).
Ao alertar sobre a simplicidade com que as abordagens conceituais de ‘energia’ são
apresentadas aos estudantes, no âmbito de diferentes disciplinas, em nível universitário ou
escolar, as quais na maioria das vezes não consideram a complexidade conceitual e a
capacidade de abstração por parte dos aprendizes, é importante chamar atenção para tal
complexidade. Também, para a necessidade de retomadas, em diferentes séries e, sempre que
possível, relacionar compreensões conceituais de ‘energia’ com conhecimentos cotidianos
relativos a problemas ou fenômenos vivenciais. Isso, de forma a possibilitar aos estudantes,
compreensões conceituais significativas em aulas de CNT, particularmente, no que se refere
ao conceito em estudo neste trabalho.
Compreender conceitualmente, mediante conhecimentos escolares, por exemplo, o
funcionamento de um automóvel por meio do consumo de álcool ou gasolina no motor,
implica entendimentos sobre transformações matéria/energia envolvidas nas reações de
combustão. Explicações com uso de expressões simplistas como a de que os combustíveis
“liberam” ‘energia’ numa reação de combustão incorrem em obstáculos epistemológicos à
compreensão escolar, em aulas de CNT, sobre a natureza, a origem e as transformações
matéria/energia envolvidas numa reação química. O que dizer sobre os entendimentos usuais
que acompanham abordagens e explicações relativas à realização de trabalhos em sistemas
como um carro andando? Quais compreensões são usuais, em nível microscópico, sobre as
entidades e as transformações envolvidas?
Neste trabalho, a análise é direcionada para abordagens sobre relações energéticas
associadas ao funcionamento do nosso organismo, com atenção aos processos vitais,
particularmente, à compreensão teórico-conceitual sobre a respiração. Compreender, em
contexto escolar, o assunto vivencial ‘respiração’ implica conhecimentos relativos ao
metabolismo celular que inclui compreensões sobre reações enzimáticas mitocondriais
integrantes do mesmo. Abordagens em LD e em aulas de CNT, seja em nível escolar ou
universitário, no mais das vezes, são acompanhadas de expressões que obstacularizam
compreensões coerentes com os conhecimentos das ciências. Conforme Schnetzler et al:
60
os estudos escolares sobre a respiração – usualmente centrados em abordagens
anatômicas e fisiológicas – enfatizam a respiração pulmonar, em detrimento de
abordagens que explorem, também explicações sobre os processos e transformações
no nível das substâncias das partículas, das interações e das relações energéticas
envolvidas. Por isso, as idéias prevalentes dos estudantes sobre a respiração
restringem-se ao contexto biológico-pulmonar de explicação, sendo incipientes as
explicações moleculares (2000, p.188-189).
Ainda que sejam abordados aspectos relativos às interações em nível atômicomolecular, expressões como ‘energia química’, ‘energia absorvida’, ‘energia liberada’,
‘energia armazenada’, ‘energia contida’ ou outras similares acarretam obstáculos à
compreensão do ponto de vista das ciências. Como referem Oliveira e Santos, 1998, “o
conceito de energia química, assim empobrecido, antes de facilitar, dificulta a aprendizagem
porque retém o pensamento no patamar de uma simplicidade apenas aparente”. Considera-se
importante prestar atenção, no ensino de CNT, a obstáculos epistemológicos que, segundo
Bachelard (1996), acompanham os processos de ensino, a exemplo da tendência em incorrer
no realismo e do verbalismo, no sentido de que os estudantes correm o risco de tomar por
reais entidades criadas nas Ciências, que se constituem em objetos teóricos, do âmbito do
imaginário, do simbólico (como moléculas, átomos, estruturas supramoleculares). Com base
em autores, Lopes expressa o entendimento de que:
o obstáculo epistemológico tende a se manifestar mais decisivamente para mascarar
o processo de ruptura entre o conhecimento comum e o conhecimento científico,
quando o pensamento procura prender o conhecimento no real aparente. Os
obstáculos epistemológicos tendem a constituir-se, então, como anti-rupturas
(PARENTE, 1990: 62), pontos de resistência do pensamento ao próprio pensamento
(LECOURT, 1980: 26), instinto de conservação do pensamento, uma preferência
pelas respostas e não pelas questões (CANGUILHEM, 1994: 177). A razão
acomodada ao que já conhece, procurando manter a continuidade do conhecimento
opõe-se à retificação dos erros ao introduzir um número excessivo de analogias,
metáforas e imagens no próprio ato de conhecer, com o fim de tornar familiar todo
conhecimento abstrato, constituindo, assim os obstáculos epistemológicos (LOPES,
1996, p. 263).
Muito do que acabamos de referir traduz-se em dificuldades e fatores amplamente
percebidos em práticas escolares. Romper com visões simplificadas e distorcidas acerca de
‘energia’ demanda uma aprofundada formação científica, que não é atingida unicamente na
formação inicial. É necessário permanecer em constante aprendizado, refletindo sobre a
própria ação escolar. A formação contínua promove a constituição do sujeito professor, em
plenitude. Isso, fundamentando-se em práticas que desenvolvam o pensar, que sejam
desafiadoras, e que promovam a significação conceitual.
61
A partir do desafio de desenvolver interações em processos de formação de
professores de CNT que contribuam para a articulação de abordagens do conceito ‘energia’
com enfoque contextual, conceitual e intercomplementar, tal como proposto pelas OCNEM
(BRASIL, 2006), cabe melhor explicitar e fundamentar visões sobre a significação conceitual
e suas relações com a constituição do ser humano. Com enfoque no referencial históricocultural, tal problemática é tratada a seguir.
3.3 A Significação Conceitual em Contexto Escolar
No âmbito desta pesquisa, compreender processos de ensino e aprendizagem em CNT
implica valorizá-los como focos significativos da constituição e do desenvolvimento dos
sujeitos neles envolvidos. Um grande passo na compreensão de como é constituída a
singularidade humana, postulado por Vigotski, refere-se às interações do sujeito no mundo, a
partir da mediação simbólica de instrumentos e signos. Tal mediação simbólica permite o
estabelecimento das relações do homem no meio. Por ser um sujeito interacionista, como tal
se constitui. Góes (2000, p.12) observa que, “tendo em vista a crença no papel fundante das
relações sociais, Vigotski concebe o estudo do homem enquanto ser que se constitui imerso
na cultura – nas experiências coletivas e práticas sociais”.
Parte-se do pressuposto de que a constituição do ser humano se dá nas interações com
o outro, nos meios em que ele vive e atua. Cada sujeito, sendo historicamente constituído, é
portador das marcas culturais tipicamente humanas (filogênese), ainda que cada sujeito seja
impregnado de especificidades culturais próprias ao seu contexto social de desenvolvimento.
Essa visão remete à ideia de que cada sujeito conta com interações, por um lado, próprias à
espécie humana e, por outro, com interações inerentes ao seu contexto individual de
desenvolvimento e constituição (ontogênese). Isso, não como simples ‘troca de saberes’, nem
como uma internalização determinada unicamente pelos fatores externos ao indivíduo, mas,
sim, como processos sociointeracionistas dialéticos, tal como refere Rego (2000).
Nesses processos, com apoio no referencial histórico-cultural, a linguagem, para além
da função intercomunicativa (HABERMAS, 1989), tem um papel constitutivo do pensamento
e da mente humana. Para Vigotski (2001), o ponto de partida no processo de aprendizagem é
a palavra, que, desde o início, é uma generalização ou um conceito. A palavra é tratada como
signo e é central na abordagem vigotskiana. Assim, o seu interesse volta-se para os conceitos
que permitem entender a vivência das pessoas e a gênese de novas funções mentais
(GHELEN et al, 2008).
62
Isso situa e justifica o papel da sociedade e, nela, da escola e em especial dos
professores, na promoção do desenvolvimento humano, sem nunca conceber os estudantes
como ‘tabulas rasas’ a serem preenchidas, mas como sujeitos com vivências, experiências,
com potencialidades diversas para pensar e expressar conhecimentos acerca de conceitos
complexos como é o caso de ‘energia’, tal como tratado no subcapítulo anterior.
Cabe aos professores mediar o acesso a novas formas de linguagem e pensamento,
possibilitando processos adequados de (re)contextualização de conhecimentos científicos, na
produção dos conhecimentos escolares, de forma que, ao tratar dos objetos de conhecimento,
possibilitem a produção de sentidos aos conceitos, como é o caso de ‘energia’, de forma
controlada. Isso na medida em que os estudantes estabelecem relações dinâmicas entre
conhecimentos escolares e cotidianos, apropriando-se de novas formas, mais significativas de
explicação, associadas aos conhecimentos científicos.
Considerando as distintas linguagens e formas de pensamento que coparticipam na
construção do conhecimento escolar, é importante prestar atenção aos signos e significados
mediados em salas de aula. Os signos são instrumentos para os quais é necessário que sejam
produzidos sentidos, em contextos diversificados, de forma dinamicamente inter-relacionada,
mediante controles dos mesmos, por parte do professor, em busca de coerência com os
significados aceitos nos contextos culturais da Ciência e da escola.
Porque se signos e sentidos são sempre produzidos por sujeitos em relação, os
muitos modos de ação e interpretação desenvolvidos (no tornar próprio, no atribuir
pertença, no tornar pertinente, no adequar, no transformar...) são parte de uma
prática historicamente construída, de uma trama complexa de significações nas quais
eles participam sem serem, contudo, capazes de controlar a produção, de reterem ou
de se apropriarem dos múltiplos, possíveis e contraditórios sentidos (que vão sendo)
produzidos... (SMOLKA, 2000, p.38).
A multiplicidade dos processos de interação social típicos do contexto escolar só é
possível graças a sistemas de mediação altamente complexos, que envolvem conhecimentos
produzidos dentro e fora da escola. Processos de desenvolvimento humano iniciam desde a
infância, a partir da vivência de situações de interação, em que a criança opera com os
conceitos cotidianos, como refere Vigotski (2001), sendo que, “no pensamento infantil, não se
separa os conceitos adquiridos na escola dos conceitos adquiridos em casa” (idem, p. 348).
Nessa fase, ela estabelece relações usando instrumentos e signos de forma ainda presa
ao concreto, ou seja, sem uma abstração que lhe permita o pensar conceitualmente, sendo que
“a criança passa a tomar consciência de suas vivências por intermédio da significação dos
conhecimentos sistematizados, a exemplo dos científicos” (GHELEN et al, 2008, p.5 ). Opera
63
mediante pensamentos ‘por complexo’ e pseudoconceitos, sendo importante que os adultos
que convivem com ela (pais, professores ou outros adultos mais experientes) lhe
proporcionem estímulos e mediações variadas, que potencializem o desenvolvimento do
pensamento infantil, para que, na adolescência, possa atingir formas superiores de
pensamento, com crescentes níveis de abstração e generalização (VIGOTSKI, 2001).
A participação de relações concretas nos processos de aprendizagem possibilita o
desenvolvimento do pensamento verbal, o qual se constitui numa forma histórico-social de
comportamento, ou seja, não inata nem natural, atingida progressivamente pela criança. No
entanto, “pode-se considerar que a criança atinge tarde o grau de socialização de seu
pensamento, que é necessário para a elaboração de conceitos plenamente desenvolvidos.”
(VIGOTSKI, 2001, p.159). Se os processos de formação de conceitos resultam das interações
com outros, então, interferir intencionalmente na aprendizagem é de grande importância para
os sujeitos envolvidos nas aprendizagens.
Isto pode ajudar a compreender as razões do ‘fracasso’ do desempenho escolar de
estudantes: professores que desconhecem ou que são desatentos à perspectiva históricocultural enganam-se ao pensar que o estudante está entendendo suas intervenções, na maioria
das vezes desconexas, que não priorizam o estabelecimento de relações com conhecimentos
produzidos nos contextos cotidianos em que os sujeitos estão inseridos. Por exemplo, no caso
do complexo conceito ‘energia’, ainda que os estudantes usem signos típicos ao contexto
escolar, como as expressões ‘endotérmica’, ‘exotérmica’, ‘energia de ativação’, isso não
significa que os mesmos, necessariamente, tenham produzido sentidos e significados
escolares, de forma adequada. Conforme Vigotski (2001):
Não menos que a investigação teórica, a experiência pedagógica nos ensina que o
ensino direto de conceitos sempre se mostra impossível e pedagogicamente estéril.
O professor que envereda por esse caminho costuma não conseguir senão uma
assimilação vazia de palavras, um verbalismo puro e simples que estimula e imita a
existência dos respectivos conceitos na criança, mas, na prática, esconde o vazio.
Em tais casos, a criança não assimila o conceito, mas a palavra, capta mais de
memória que de pensamento e sente-se impotente diante de qualquer tentativa de
emprego consciente do conhecimento assimilado. No fundo, esse método de ensino
de conceitos é a falha principal do rejeitado método puramente escolástico de
ensino, que substitui a apreensão do conhecimento vivo pela apreensão de esquemas
verbais mortos e vazios. (p. 247)
Nesse sentido, cabe aos professores utilizar e fazer com que os estudantes utilizem
palavras (signos, linguagens, simbologias, representações) adequadas à expressão do
pensamento típico à forma escolar de conhecimento, que se diferencia dos conhecimentos
cotidianos. Para isso, é imprescindível o controle dos processos de produção de sentidos aos
64
significados conceituais, por meio de mediações específicas, por parte do professor. Nesse
sentido, é importante levar em conta o entendimento de que não há transformação, em aulas
de CNT, dos sistemas de conceitos típicos ao cotidiano em escolar, mas, sim, uma influência
recíproca entre ambos, que permite a evolução do conhecimento ao longo de vivências
educativas diferenciadas.
A partir do nascimento, a criança desenvolve capacidades superiores, próprias do ser
humano, nas interações com outros, em seu meio sociocultural. Contudo, é importante
considerar, com apoio em Vigotski (2001), a visão de que é na adolescência, sobretudo com a
escolarização, que é possibilitado o pleno desenvolvimento das capacidades superiores do ser
humano, constituindo-se a escola numa condição essencial a tal desenvolvimento.
Para isto, é essencial o acesso do adolescente a outras formas de linguagem e
pensamento, mediante o acesso a signos e significados próprios aos conhecimentos escolares,
que incluem relações entre sentidos atribuídos aos conceitos, em contextos socioculturais
diversificados, incluindo relações com os significados típicos a cada Ciência que se ensina e
se aprende nas salas de aula. Reitera-se, aqui, o entendimento de que, em cada contexto de
ensino e aprendizagem, são produzidos sentidos específicos aos conceitos (com os quais
operam os interlocutores), referentes aos significados mais universalmente estabilizados e
aceitos (concebidos como sentido historicamente estabilizado no âmbito de uma Ciência).
Nessa perspectiva entende-se que a tomada de consciência “se realiza através da formação de
um sistema de conceitos, baseado em determinadas relações recíprocas de generalidade, e que
tal tomada de consciência dos conceitos os torna arbitrários” (VIGOTSKI, 2001, p.295).
O sentido está sempre amarrado ao contexto no qual o conceito é produzido, ou seja,
às possíveis relações estabelecidas no contexto. O professor, ao proporcionar processos de
produção de sentidos por parte do estudante, torna possível que ele consiga desenvolver o
conceito, evoluindo no significado. Segundo Vigotski (2001), quando o sujeito começa a usar
a nova palavra (signo) recém está iniciando o processo de sua evolução conceitual, sendo
necessárias sistemáticas retomadas para, ao verbalizar suas formas de pensamento, poder
atingir, progressivamente, novos estágios de significação.
Em sala de aula e em processos de formação acompanhados, percebe-se a importância
de compreender as formas como os estudantes podem alcançar níveis de significação
conceituais mais elevados, tendo sido recorrente a percepção da influência de graus de
assimetria das interações nos processos de significação conceitual. Sujeitos que interagem
orientados para uma linha de entendimento do objeto de conhecimento, abordado sob pontos
de vista diversos, têm mais possibilidades de avançar nas compreensões conceituais, na
65
medida em que participam ativamente nos processos de verbalização e reconstrução de
saberes.
É nesse sentido que a atenção é direcionada, neste trabalho, para interações em
espaços de formação docente, em cursos de licenciatura da área de CNT, nos quais nem
sempre são inseridas abordagens, compreensões e reflexões relativas aos processos de
produção dos conhecimentos escolares, a exemplo de entendimentos relativos a como o
conceito ‘energia’ é significado em níveis progressivamente mais elevados ao longo da
escolarização. De alguma maneira, cada estudante contou, ao ingressar na escola, em
diferentes níveis/séries, com processos de conhecimento produzidos em suas vivências
cotidianas relativos ao conceito ‘energia’. A produção de novos sentidos e significados
conceituais é propiciada em salas de aula, seja no nível fundamental, médio ou superior.
Quem sabe, para além da área de CNT, em aulas de geografia, importantes processos de
significação conceitual de ‘energia’ possam ter sido vivenciados. No entanto, nem sempre há
visibilidade dos possíveis ou prováveis processos de significação conceitual, nem mesmo
dentro de uma mesma série, ou de um mesmo campo científico, dentro de uma mesma
turma/escola.
O referencial histórico-cultural ajuda-nos a entender a participação fundamental do
‘outro’ e o papel da linguagem para desencadear os processos de significação dos conceitos
na aprendizagem escolar, a qual supõe, por natureza, graus mais elevados de abstração e
generalização, o que a diferencia das aprendizagens típicas das vivências cotidianas. E,
também, entender que os processos de aprendizagem antecedem e fazem avançar os processos
de desenvolvimento humano, incluindo a inteligência. É a aprendizagem que potencializa o
desenvolvimento da inteligência em suas múltiplas dimensões e, por outro lado, o
desenvolvimento da mesma proporciona mais aprendizagens.
Dessa forma, é importante inserir estudos e discussões, na formação de professores,
sobre a especificidade dos processos escolares de significação conceitual, de modo que o
ensino seja orientado para o desenvolvimento de aprendizados significativos à formação
escolar que possam adiantar e promover os processos de desenvolvimento humano. Isso
implica prestar atenção aos tipos de aprendizado propiciados pelo ensino e pelos cursos de
formação de professores de CNT. Implica compreender como conhecimentos produzidos na
realidade vivida pelos estudantes fora da escola evoluem para novos níveis de abstração e
generalização, com acesso a outras formas de conhecimento, produzidos nas ciências e
recontextualizados no âmbito especificamente escolar. Para efeito de clareza, Vigotski (2001)
66
nomina os movimentos mentais entre conceitos cotidianos e científicos de ascendentes e
descendentes e propõe que:
Poderíamos conceber esquematicamente o caminho do desenvolvimento dos
conceitos espontâneos e científicos da criança sob a forma de duas linhas de sentidos
opostos, uma das quais se projetando de cima para baixo, atingindo um determinado
nível no ponto em que a outra se aproxima ao fazer o movimento de baixo para
cima. [...] poderíamos dizer convencionalmente que o conceito espontâneo da
criança se desenvolve de baixo para cima, das propriedades mais elementares e
inferiores às superiores, ao passo que os conceitos científicos se desenvolvem de
cima para baixo, das propriedades mais complexas e superiores para as mais
elementares e inferiores. (p. 347-348)
Cabe à escola cumprir com a sua função social imprescindível, a de mediar o acesso
do cidadão a novas formas de explicação, relativamente às formas cotidianas, mediante o uso
dos signos e instrumentos adequados ao conhecimento tipicamente escolar, impossíveis de
serem construídos diretamente pelos estudantes. É mediante as intervenções do professor,
associadas a recursos e procedimentos didáticos, que os estudantes elaboram representações
do mundo à luz das Ciências, capazes de contribuir para compreensões em novos níveis, pela
(re)contextualização dos conhecimentos científicos na escola (BRASIL, 2006).
A problemática discutida neste capítulo situa a importância de compreender, de forma
situada, a significação conceitual de ‘energia’, em suas implicações socioambientais, diante
do objetivo central do ensino na área de CNT, qual seja, o de compreender o meio em que se
vive e atua numa perspectiva socialmente responsável, mediante conhecimentos escolares
dinamicamente articulados com contextos da vida cotidiana. Tal visão problemática demanda
que práticas no ensino de tal conceito sejam amplamente compreendidas e criticamente
refletidas, em espaços como os de aulas da licenciatura. Neles, em muitos Componentes
Curriculares (CC), os conceitos necessários à compreensão dos objetos em estudo, muitas
vezes, são tratados de maneira descontextualizada, fragmentada e linear, sem uma percepção
sobre a complexidade das inter-relações envolvidas. “Não basta ensinar as partes e querer
juntá-las, depois, para formar um todo. Se elas não estiverem “amarradas”, inter-relacionadas,
representando o todo, desde o começo do ensino, o todo permanecerá fragmentado” (AUTH,
2000, p.73).
Preocupações como essas orientam o desenvolvimento do presente trabalho, em busca
de compreender contextos de ensino e de formação para o ensino em CNT que, de alguma
forma, levem em conta a dinamicidade e complexidade dos conhecimentos e das relações
imbricadas na compreensão conceitual significativa de ‘energia’, relacionada com aspectos
contextuais do conceito. É nesse âmbito de preocupação e reflexão que se apóia a presente
67
pesquisa, cujo capítulo a seguir apresenta discussões de aspectos relativos às abordagens e aos
processos de significação e (re)contextualização do conceito ‘energia’ em LD e em aulas de
CNT, articuladamente a reflexões sobre práticas de professores no ensino e na formação em
CNT.
68
4 UM OLHAR SOBRE ABORDAGENS DO CONCEITO ENERGIA
Atualmente, com o Programa do Catálogo Nacional do Livro Didático do EM
(PCNLEM), os LD tornaram-se um recurso disponível para todos os estudantes da Educação
Básica brasileira. Por sua vez, mesmo depois de políticas públicas que avaliam, selecionam e
distribuem volumes para as escolas, os mesmos ainda apresentam deficiências e limitações,
além de abordagens distorcidas com implicações ao processo de ensino e de aprendizagem em
salas de aula. Como refere a pesquisa de Jacques (2008), nos LD de CNT:
muitas pesquisas acadêmicas, como Pretto (1985), Mortimer (1988), Axt &
Brückmann (1989), Fracalanza (1993), Amaral & Megid Neto (1997), Pimentel
(1998), entre outras, apontaram nos últimos anos inúmeros problemas, como erros
conceituais, preconceitos sociais, culturais e raciais, deficiências gráficas,
diagramação cansativa e concepções errôneas sobre Ciência nos principais livros
utilizados no Brasil, tanto no Ensino Fundamental quanto no Médio. (p.16-17)
O olhar desta pesquisa voltou-se às abordagens do conceito ‘energia’ em LDBIO e
LDQUI, principalmente, no que se refere a preocupações e possíveis decorrências dessas
abordagens conceituais de ‘energia’ no EM, em CNT, particularmente, quanto à adequação
dos tratamentos didáticos para a significação conceitual, no ensino. A análise do tratamento
ao termo ‘energia’ e suas relações diz respeito a abordagens relativas a estudos sobre
respiração, enzimas, metabolismo energético celular, articuladamente aos ‘módulos
interativos’ acompanhados.
Os resultados de pesquisa apresentados e analisados neste capítulo referem-se a dois
focos de tratamento do referido conceito, quais sejam: (i) reação enzimática e energia de
ativação em transformações químicas, (ii) interconversões energéticas e variações de energia
e compreensão da participação do ATP (Trifosfato de Adenosina) nos processos vitais.
69
Os resultados foram construídos mediante procedimentos metodológicos já descritos.
A seguir são apresentadas e discutidas figuras de LD e episódios dos ‘módulos interativos’,
que se contrapõem a entendimentos simplistas do conceito ‘energia’.
4.1 Compreensões sobre Reação Enzimática e Energia de Ativação
O olhar, durante o processo de construção dos resultados de pesquisa, voltou-se
especificamente para as abordagens sobre as enzimas, visto que as mesmas abrangiam
relações com o conceito ‘energia’. Como refere o LDBIO1, os processos vitais envolvem
atividades metabólicas que incluem transformações químicas impossíveis de serem efetivadas
nas condições energéticas típicas ao meio biológico celular, não fosse a presença das enzimas.
Nos LDBIO, os estudos sobre as enzimas incluem a noção de que é a ‘catálise
enzimática’ que possibilita a ‘energia de ativação’ necessária para cada reação química que
acontece nos seres vivos. Por exemplo, no capítulo 5 do LDBIO1, intitulado ‘A Base
Específica da Vida II’, no subcapítulo ‘Aminoácidos e Proteínas’, os estudos tratam dos
ácidos nucléicos, de ligações peptídicas, estrutura e funções das proteínas, classes de
proteínas, dando enfoque ao estudo das enzimas.
Sobre a relação entre a ‘atividade enzimática’ e a ‘energia de ativação’, consta no
LDBIO1 que:
As reações biológicas são pouco espontâneas e muito lentas. [...] Uma das
maneiras de fornecer aos reagentes a energia necessária para que a reação ocorra
é aumentar a temperatura: as moléculas movimentam-se mais rapidamente,
aumentando a probabilidade de se chocarem com energia suficiente para provocar
uma reação química.
No entanto, para os seres vivos é importante que as reações ocorram em velocidade
adequada, porém sem aumento significativo da temperatura, para que não haja
desnaturação protéica. Nos seres vivos, as enzimas aumentam a velocidade das
reações sem elevar a temperatura. Isso acontece porque elas diminuem a energia de
ativação necessária para ocorrer a reação. ( 95-96) (grifo nosso)
Compreensões relativas à explicação acima, por parte dos estudantes do EM, não
podem ser vistas de forma simplista. Requerem o uso de uma rede de relações entre conceitos
ensinados nas diferentes disciplinas da área de CNT. Não é de se estranhar que muitos
estudantes não atinjam uma significação conceitual adequada de ‘energia de ativação’ nem
das relações entre este conceito, o de enzima e o de ‘catálise enzimática’, quando o ensino não
contemplar explicações e aprendizados adequados à compreensão.
70
No ‘módulo interativo 9’, articuladamente aos estudos no CC de Bioquímica I,
discutiu-se sobre a complexidade da compreensão conceitual de explicações como a que
consta no excerto acima. Abordagens no referido módulo giravam em torno da compreensão
do mecanismo da reação química catalisada por uma enzima, no caso, a ‘quimotripsina’. A
ênfase no mecanismo de ação desta enzima deve-se à disponibilização de um software que
acompanha o LDBQ2, usado no CC. PU2 iniciou sua abordagem retomando uma aula
anterior, em que PU1 havia usado o slide que segue (Figura 1), novamente apresentado e
discutido no CC.
Macro Micro Macro Micro ...
Diversas enzimas...
Catalisadores Biológicos
- uma classe de proteínas.
Figura1. Macro-Micro. (Site 1)
PU2 expõe o slide (figura 1) e dá inicio às interlocuções:
PU2: Então eu vou dar uma pequena pincelada, de novo, na questão das enzimas e
vou entrar na questão do mecanismo de ação da quimotripsina. Então, o que a
professora PU já falava durante as aulas, dessa viagem que a gente faz do macro ao
micro, do micro ao macro? Então, de você viajar lá pro teu corpo humano,
imaginar uma célula, depois imaginar o cromossomo, o DNA que está lá. Então,
tem várias representações que permitem você viajar até o “íntimo”, digamos assim,
das estruturas maiores, até as menores. Então aqui tem um exemplo da célula que
está dividida em várias outras estruturas, e dentre essas, nas células também tem
enzimas, que acabam funcionando como catalisadores biológicos que as colegas
falaram ali. (M9, 21)
71
No âmbito da presente pesquisa, é importante valorizar essa linha de reflexão
suscitada no módulo 9, quanto ao “viajar” imaginariamente dos níveis macroscópicos para os
microscópicos de compreensão e vice versa, em detrimento de uma visão dicotômica entre os
mesmos. Ambos se intercomplementam e se inter-relacionam. Possivelmente a falta de
relações entre tais níveis de explicação seja causadora das dificuldades de avanços conceituais
no ensino deste conteúdo ou de outros de CNT.
Explicações por parte de PU2 sobre o mecanismo de reação da ‘enzima quimotripsina’
enfatizaram a ação catalítica na ruptura de ligações C-N das moléculas do substrato, como
representado pela Figura 2.
• Quimotripsina: está entre as enzimas Serino-Proteases ...
• Estas enzimas são proteínas que hidrolisam ligações
peptídicas distantes dos extremos C e N-terminal da
molécula proteica (transformando-os em oligopeptídeos).
• A reação das proteases pode ser representada pelo
esquema a seguir:
Enzima
Figura 2. Enzima Quimotripsina. (Site 2)
Ainda que envolva grande quantidade de ‘energia’, tal ruptura de ligação covalente é
realizada em temperatura corporal próxima a 37ºC. Nesse sentido, a linha de explicação dizia
respeito à noção de que as ‘enzimas’ são reconhecidas como ‘catalisadores biológicos’ na
medida em que elas atuam em nível atômico-molecular, reduzindo a ‘energia de ‘ativação’
das respectivas reações.
A significação conceitual da ‘atividade enzimática’ como meio que possibilita rupturas
de ligação covalente, tais como C-N, C-C, requer compreensões sobre interações químicas
envolvidas na ‘catálise enzimática’, o que implica uma compreensão relativa a um sistema de
relações conceituais referentes a aspectos da estrutura química e das interações entre a enzima
72
e o substrato. Noções como a de ‘complexo enzima-substrato’, de ‘mecanismo de reação
enzimática’, de ‘sítio catalítico’ são essenciais à significação conceitual da ‘atividade
enzimática’. Isso, considerando que ela gira em torno do entendimento de que em cada
enzima há um microambiente (sítio catalítico) que expõe determinados grupos químicos
(radicais de aminoácidos) que conferem graus específicos de carga iônica, polaridade de
ligação covalente, interação hidrofóbica.
Sem levar em conta tais noções não é possível uma compreensão conceitual adequada,
cuja centralidade está na visão de interações químicas específicas que possibilitam a
transformação do substrato em produto, nas condições biológicas, por meio de uma redução
da ‘energia de ativação’.
Cabe reiterar a visão da complexidade e da amplitude do conceito ‘energia’, nem
sempre assim consideradas no ensino de CNT, em diversos níveis. A compreensão e
ressignificação do conceito passa pelo estabelecimento de necessárias conexões entre
compreensões relativas a conhecimentos produzidos em contextos diversificados, desde os
científicos até os cotidianos, os de nível teórico e abstrato até os vivenciais, a exemplo da
respiração. São complexas as compreensões e as relações entre conhecimentos relativos às
formas de ‘energia’ envolvidas em transformações abordadas em nível atômico-molecular.
Outro slide apresentado e discutido nos módulos acompanhados é o que segue.
QUIMOTRIPSINA
Figura 3. Representação de ‘sítio catalítico’ da Quimotripsina (LDBQ2, p.311)
73
No episódio que segue percebe-se a intencionalidade, por parte de PU2, de mediar tal
linha de compreensão, durante o ‘módulo interativo 9’. Explicações com base na Figura 3
diziam respeito a noções sobre a estrutura da enzima mencionada e o seu ‘sítio catalítico.’
PU2: Aqui tem umas representações do livro LDBQ2 que mostram a estrutura da
quimotripsina. Aqui vocês vêem que tem o sítio ativo da quimotripsina, que eles
chamam de tríade catalítica, que são os resíduos dos aminoácidos que vão atuar na
transformação da proteína. Então aqui ((imagem a direita da Figura 3)) já tem
outra estrutura um pouco diferente. (M8 - 43)
Dessa forma, recursos didáticos apresentados durante o ‘módulo interativo 9’
remetiam a reflexões e questionamentos relativos às formas de representação da enzima na
Figura 3, desde a visão da estrutura molecular como um todo, até a noção de que
determinados grupamentos químicos (radicais de aminoácidos) compõem o ‘sítio ativo’ da
enzima e atuam na catálise da reação.
PU2: [...]. E aqui ((3ª imagem da Figura 3)) [...] mostra bem essa tríade catalítica,
aqui, e que acaba mesmo fazendo ligações de hidrogênio e covalentes com o
substrato, que se encaixa aqui.
PU1: Aqui nós poderíamos começar na figura ((mais acima)) imaginando que é a
estrutura tridimensional inteira da enzima, como se fosse uma partícula cheia de
átomos, ligações e lá está cheio de aminoácidos, a outra já vem mostrando a
visibilidade da cadeia polipeptídica, e ali dentro a gente vê mais ou menos o que
seria o sítio ativo ((figura a direita)), e essa de baixo é por extenso PU2, aquela
parte azul claro mostrando, você até podia ler PU2, aqui está meio longe, tem uma
histidina 57, uma serina 195.
PU2: O número representa a posição da cadeia da proteína. Então 57 é o
quinquagésimo sétimo aminoácido. [...]
PU: Vocês imaginem a extremidade terminal né, então aqui alguns radicais
lembram?
L ((alguns)): Aham.
PU1: Então o fio, a cadeia polipeptídica ela vai expor aqui naquele espaço no
centro ativo, alguns radicais e alguns aminoácidos, um é o 102, outro é o 57, 195,
16, mas como o dezesseis está perto do cento e noventa e cinco, lembram? É o
enovelamento da cadeia polipeptídica, Então isso vocês têm que imaginar. (M9, 4552)
PU2 ao indicar a Figura 3 ressalta que esta representação não se refere a um simples
encaixe mecânico entre a enzima e o substrato. Remete à visão de uma complementaridade
estrutural entre a enzima e o substrato, que depende das interações intramoleculares, pois é
através de interações químicas adequadas que acontece o encaixe do substrato específico ao
sítio ativo de cada enzima.
74
A linha de pensamento denota a intencionalidade de mediar a compreensão de que as
rupturas de ligação exigem que as energias de ligação sejam extrapoladas. Isso requer graus
elevados de abstração, o que na maioria das vezes não é considerado no ensino. Por vezes, tal
nível não é possível por parte dos estudantes. Essa linha de discussão será tratada com mais
detalhe no item que segue, mas é importante considerar, já aqui, a visão de que os conceitos
são abstrações e que os processos de significação conceitual, por sua natureza, implicam em
aprendizados de nível teórico-conceitual, como é o caso das explicações e compreensões
sobre a ‘atividade enzimática’, assunto central nos estudos sobre os seres vivos e sobre como
acontecem as transformações que mantêm o funcionamento do processo vital. Sobre o
pensamento conceitual abstrações e significações, é importante destacar que:
O pensamento conceitual envolve uma enorme expansão das formas resultantes da
atividade cognitiva. Uma pessoa capaz de pensamento abstrato reflete o mundo
externo mais profunda e completamente e chega a conclusões e inferências a
respeito do fenômeno percebido, tomando por base não só a sua experiência pessoal,
mas também os esquemas de pensamento lógico que objetivamente se formam em
um estágio avançado de desenvolvimento da atividade cognitiva. (LURIA, 1990,
p.135 apud DUARTE, 2003, p.622).
Na compreensão da atuação das enzimas, PU2 fazia menção a compreensões relativas
às ligações químicas envolvidas nas reações enzimáticas com rupturas de ligação, em
detrimento da visão de um encaixe mecânico entre a enzima e o substrato. Para isso, foram
usadas representações em slides, a exemplo da figura que segue:
75
Equação Geral da Reação Catalítica
Nas serinas-proteases, o mecanismo baseia-se
na ação de uma TRÍADE CATALÍTICA:
- serina + histidina + aspartato
- O que significa (quimicamente) essa tríade catalítica??
Figura 4. Equação Geral da Reação Catalítica (LDBQ1, p.121)
Os sujeitos chamavam a atenção para a importância de mediar e usar conceitos,
evitando significações e compreensões simplistas.
PU2: [...] Aqui tá uma visão bem simplificada.
PU1: Na verdade [...] ali no meio tem uma ligação peptídica. Ali é que houve a
ruptura da ligação.
PU2: Então nas Serino-Proteases, que são as enzimas, o mecanismo baseia-se na
ação da tríade catalítica [...]. O que significa essa tríade catalítica? [...] Aqui vocês
vêm que as Serino-Proteases, todas elas têm a atuação da serina, aspartato e
histidina. Então, aqui tem ó ((aponta para a terceira figura do slide anterior)) a
serina, a histidina, o aspartato, ó... (M9,53-55)
Ao mediar explicações de aspectos importantes relativos à ‘catálise enzimática’, PU2
remetia para a visão da importância da atuação das enzimas no metabolismo, permitindo a
manutenção da vida. As explicações requeriam compreensões relativas à ‘energia’ envolvida
nos processos vitais, como mostra a tabela de energias de dissociação da figura 5:
76
Condição de Moléculas em Colisão:
- Inércia? Ou Reatividade Química?
Figura 5. Energia de Dissociação de Ligação Média. LDBQ3
As explicações eram mediadas por PU2:
PU2: Então [...] os resíduos de aminoácido vão tá lá, agindo [...] e transformando,
na ruptura da ligação carbono e nitrogênio. [...] Como explicar a ruptura de uma
ligação C-N [...] em que não tem nenhuma condição para que aconteça, se for
pensar quimicamente ... com temperatura de aproximadamente 37°. [...] O nosso
corpo precisaria de bastante energia para isso. Então, lembrar que sempre há uma
energia de ativação nessa ligação carbono e nitrogênio. E vocês têm como outro
exemplo [...], a reação de combustão, que precisa muita energia para que comece a
transformação. E aqui vocês têm o valor aproximado de uma ligação de carbono e
nitrogênio ((energia de ligação)). O valor foi pego daqui. Então comparado à
ligação C-C, que é 348 KJ/mol, e do C-N que é essa que a quimotripsina rompe, é
305 KJ/mol. É muita energia né? Se for pensar [...], e lembrando que isso ainda
precisa de condições: a condição das moléculas colidirem nas condições adequadas
para que acontecesse, quebrasse essa inércia que a molécula tem, de permanecer do
jeito que está, pra então ela ter a reatividade, que acaba rompendo mesmo aquela
ligação. Então a enzima como ela faz? Ela é chamada de catalisador, catalisador
biológico [...]. Então, a função da enzima é diminuir a energia de ativação de modo
seletivo. Assim, aumenta a velocidade das reações [...] sem afetar o equilíbrio das
reações. Então aqui [aponta para a Figura 6) tem um exemplo de uma reação. (M957).
Para ampliar as compreensões acerca da ‘energia de ativação’, foi apresentado outro
slide (Figura 6):
77
(Proteínas)
(Peptídeos)
Enzima = Catalisador
Figura 6. Gráfico da Reação. (Site 2)
No episódio a seguir, PU2 reitera a importância de considerar a ‘energia de ativação’
nas rupturas de ligação, mediante a compreensão conceitual de que a enzima reduz a ‘energia’
necessária para romper as ligações em nível atômico molecular.
O caminho da reação, sem a enzima, então, uma energia muito grande, e com a
enzima, que ela diminui bastante essa energia de ativação necessária para romper
aquela ligação C-N. O estado de transição seria essa parte ((aponta para o topo do
gráfico – slide anterior)) que ela acaba rompendo a ligação. É a forma ativada de
uma molécula em que a mesma é capaz de sofrer uma reação, composto instável e
de alta energia. A energia de ativação que seria essa energia ((mostra a variação de
temperatura no gráfico-Figura 6)) [...] para que rompa, para que consiga romper
essa ligação C-N. É a quantidade de energia em calorias ou KJ como eu havia
falado antes, necessárias para se elevar 1mol de uma substância a um estado de
transição. Então é uma energia [...] para vencer a inércia química dos reagentes.
Tem uma barreira que separa os reagentes dos produtos, que seria além dessa
energia de ativação depois ela tem uma energia favorável para que essa reação
aconteça ((mostrando a energia representada nos reagentes e a energia representada
nos produtos, no gráfico)). Mas primeiro é preciso quebrar essa inércia da molécula
da proteína. (M9, 57)
Diante dessas explicações, cabe refletir: em aulas de Biologia no EM, a ‘energia’
envolvida na compreensão da atividade enzimática é mediada de forma problematizadora e é
adequadamente significada? O conceito de ‘energia de ativação’ é possível de ser significado
a partir das abordagens convencionais em âmbito escolar? Se sim, em que nível de
78
compreensão? Barros (2009, p.1) alerta que, nos estudos que envolvem a ‘energia’, “é comum
os estudantes apresentarem dificuldades recorrentes”, desde aquelas relacionadas às variações
de temperatura (em processos endotérmicos e exotérmicos) ou outras no âmbito da
termoquímica.
No ‘módulo interativo 8’, PU1 chamava atenção para a especificidade de cada
disciplina na área de CNT e para a necessária articulação entre as mesmas, de modo que uma
pudesse vir a auxiliar a outra, em busca de uma compreensão mediante relações entre
conceitos, na compreensão de assuntos complexos como ‘energia’, ‘catálise enzimática’,
‘energia de ligação’. Em interlocuções anteriores, PEMQ1 e LQ1 haviam manifestado uma
ideia que remetia para uma mudança nas escolas de modo que o professor de Química
pudesse estar presente em algumas aulas de Biologia, ou vice-versa.
PU1: Agora gente, aqui [...] PEMB1, [...] eu tenho outra tese sobre energia de
ligação. Então, a profe de Biologia, e vocês também, que depois vão dar aulas de
Biologia, provavelmente não vão estar a fim de estar falando nas aulas de Biologia
nos valores das energias de ligação envolvidas nas reações químicas. Isso que o
PEMQ1 estava falando agora há pouco. Nós de Química pensamos assim, nós
temos um reagente, um produto, e nós vamos ver quais as energias de ligação que
nós tínhamos, envolvidas lá, antes, nos reagentes e nos produtos. E podemos
compreender dessa forma. Mas lá na aula de Biologia provavelmente isso é um
complicador. Por isso eu estou dizendo ((reforçando)) aquilo que o PEMQ1 e a LQ1
estavam falando antes, que era a possibilidade de termos um professor de Biologia
e de Química na sala de aula. Que bom se pudéssemos contar com o professor de
Biologia que de aula de Biologia e o de Química que de aula de Química, mas que
um pudesse, daqui um pouco, potencializar a compreensão da aula, um do outro.
Pra isso ((acontecer)) também tem que mudar alguma coisa: o PEMQ1 vai ter de
dar alguma coisa um pouquinho diferente do que ele iria dar na aula dele, se não
estivesse a PEMB1, ou vice-versa. E parece muito mais o contrário. Nós de Química
teríamos que ter mais acessibilidade de dialogar, porque a gente nem sabe o que
está acontecendo nas aulas de Biologia ((do EM)). [...] (M8, 314)
No episódio acima, PU1 fazia uma mediação que agregava reflexões, no módulo,
sobre a importância de um trabalho interdisciplinar, mas sem diminuir a importância de cada
conhecimento e abordagem disciplinar. O desenvolvimento e análise dessas interações nos
módulos partem do pressuposto de que um dos eixos focalizados como princípio básico da
reforma da educação básica em andamento no país, referendado pelas OCNEM (BRASIL,
2006) - a interdisciplinaridade - necessita ser dinamicamente inserida como princípio
educativo na formação docente inicial e continuada.
É fundamental que as escolas, ao manterem a organização disciplinar, pensem em
organizações curriculares que possibilitem o diálogo entre os professores das
disciplinas da área de Ciências da Natureza, na construção de propostas pedagógicas
que busquem a contextualização interdisciplinar dos conhecimentos dessa área. O
que se precisa é instituir os necessários espaços interativos de planejamento e
79
acompanhamento coletivo da ação pedagógica, de acordo com um ensino com
característica contextual e interdisciplinar (...), como foi proposto nos PCNEM e
PCN+ (BRASIL, 2006, p. 105).
No ‘módulo interativo 9’, as atenções também podem ser remetidas a outro princípio
defendido nas OCNEM (BRASIL 2006), no que se refere à perspectiva da contextualização
de conceitos complexos, a exemplo da ‘energia’. Esta linha de discussão remete para a visão
de que a contextualização pode potencializar processos de aprendizado e de conhecimento em
níveis de significação elevados por parte de estudantes ou dos próprios professores.
PU1: Eu tava conversando com o PU2 sobre essa idéia esses dias, e eu comentava,
assim, um exemplo bem fácil de entender. Se você tem um gás que tá vazando lá em
casa, ou uma gasolina vazando lá no posto de gasolina. Essas moléculas do gás, da
gasolina, estão em contato com o ar, elas colidem com o ar, porém não há uma
reação de combustão, não há queima. Porque não há queima?
L2: Porque não há energia de ativação...
PU1: Qual é o risco de um incêndio? Se tiver ali a energia, então, teria que ter
cuidado. Lá em São Paulo, aquele povo morando em cima de um antigo posto de
gasolina, se não tivesse ido lá, com um fogão a gás para fazer comida em cima de
um posto de gasolina, não teria problema. Eu sei que deu uma explosão, então
assim as moléculas podem colidir em si, mas nessa colisão gente, nem sempre há
saída dos reagentes que colidem da condição de inércia. Inércia é não reatividade
química. Colide mas volta como tava antes. Então a energia de ativação é a energia
mínima necessária para que com a colisão, ó ((mostra com duas canetas de quadro
branco)), ela colide, mas nessa colisão há uma interconversão energética
interessante aqui né, e essa energia cinética e potencial, ela permite atingir o estado
de transição. Então a pergunta é assim como que lá ((na célula)) em temperatura
corporal essas reações conseguem acontecer? É como se fosse com o mesmo valor
de energia de uma queima. É muito semelhante com o rompimento de uma ligação
C-C. Então a enzima é que interfere ali, vamos tentar compreender como elas
atuam pra reduzir essa energia de ativação. (M9, 58-60)
PU1 buscou, através de exemplos de situação vivencial, a importância da presença ou
não da ‘energia de ativação’ para a realização da combustão. Através do exemplo procurou
explicitar aos estudantes a necessidade de ampliar os entendimentos quanto a aspectos
microscópicos de uma reação.
Para ampliar as reflexões dos professores em formação, inicial ou continuada, sobre
representações e entendimentos referentes à ‘energia de ativação’, durante o ‘módulo
interativo 9’, foram apresentadas e discutidas figuras disponíveis em LD e na internet,
utilizadas como recursos didáticos no ensino de enzimas, a exemplo da Figura 7.
80
Ilustrações como essas ajudam a compreender conceitualmente a reatividade?
Figura 7. Representação do Morro Energético. (Site 2)
A partir das abordagens anteriores, que enfatizavam a essencialidade das interações
químicas entre o substrato e o ‘sítio catalítico’ da enzima, PU1 e PU2 questionavam a
pertinência da representação à direita.
PU2: Aqui tem uma outra representação que foi pego da internet, mas que é de um
site de ensino. Então a energia de ativação pode ser comparada com a energia
necessária para se elevar uma pedra até o alto de uma montanha, de onde ela pode
rolar livremente, ou não, dependendo se tiver energia suficiente.
PU1: Ela colide, a energia não é suficiente, ela volta como reagente.
PU2: Então do lado da representação do cara empurrando lá, a pedra, tem um
esquema.[...] que mostra os reagentes que precisam de energia de ativação. Nesse
caso ((aponta para a curva mais elevada)) é quando não tem o catalisador. E é uma
((curva)) menor quando tem ((catalisador)). Se fosse menor, aqui ó, ((aponta para a
linha pontilhada na representação à direita)), ele cruzaria por aqui. Então, situações
como essas ajudam a compreender conceitualmente a reatividade do substrato
((com ou sem a enzima))?
PU1: Aquela pedra subindo?
PU2: Eu não sei, né!
81
PU1: [...] A pergunta dele: “será que ajuda?” [...] A representação ajuda a
compreender conceitualmente a reatividade química? (M9, 61-68)
É importante que professores em formação vivenciem reflexões como as possibilitadas
pelo ‘módulo interativo 9’, no caso, a partir de um confronto entre duas formas de
representação da noção teórica de que as enzimas atuam, nas reações que catalisam, mediante
redução da ‘energia de ativação’ das mesmas. Acredita-se que limitar tais compreensões a
representações de um ‘morro energético’ obstaculiza a compreensão conceitual, por acomodar
o pensamento, ao invés de direcionar os processos de conhecimento para uma significação
conceitual coerente com as explicações escolares, na área de CNT.
Essa linha de reflexão reitera a visão já expressa (no subcapítulo 3.3) de que os
processos de aprendizagem antecedem e fazem avançar os processos de desenvolvimento
humano (VIGOTSKI, 2001). Isso, entendendo que:
O desenvolvimento do indivíduo humano está intimamente relacionado ao contexto
sócio-cultural em que se insere e se processa de forma dinâmica (e dialética) através
de rupturas e desequilíbrios provocadores de contínuas reorganizações por parte do
indivíduo (REGO, 2000, p.104).
No ‘módulo interativo 9’, abordagens traziam à tona representações que constam em
LDBIO nos quais a noção de que as enzimas reduzem a ‘energia de ativação’ das reações era
cerceada à visão de um ‘morro energético’ a ser ‘subido’. Discutiu-se se tal representação
auxiliaria, ou não, em compreensões conceituais escolares coerentes com os conhecimentos
científicos sobre a ‘energia de ativação’ envolvida nas atividades enzimáticas.
82
Figura 8. Esquema e Gráfico da Energia de Ativação. (LDBIO1, p.96)
Como já discutido neste trabalho, é importante que, no ensino de CNT, os
aprendizados dos conteúdos/conceitos extrapolem os conhecimentos restritos, que acomodam
a razão, lançando mão às formas de pensamento presas ao concreto. Por exemplo, como se
discutia nos ‘módulos interativos’, é importante ter uma visão crítica sobre o ensino, seja nas
abordagens em LD ou em aulas, em que as explicações limitam-se à introdução de analogias e
metáforas que, ao invés de propiciar avanços nas compreensões conceituais, permanecem nas
formas familiares de conhecimento, típicas ao conhecimento cotidiano, constituindo
obstáculos à construção dos conhecimentos escolares. Essa linha de reflexão traz à tona
considerações sobre os obstáculos epistemológicos bachelardianos:
Não podemos, contudo, considerar que Bachelard defende a impossibilidade de
utilização de metáforas e imagens. Sua posição é de que a razão não se pode
acomodar a elas, devendo estar pronta a desconstruí-las sempre que o processo de
construção do conhecimento científico assim o exigir (BACHELARD, 1970: 63).
Há mesmo em sua obra (BACHELARD, s.d: 84-85) uma discussão a respeito das
boas e das más imagens, úteis para descrever um mundo que não se vê, devem ser
empregadas em instância de redução: redução a ser feita pela matematização.
Temos que entender as imagens como uma instituição de meios matemáticos de
compreensão racional das leis e não como uma afirmação dogmática da realidade
(LOPES, 1996, p. 263).
83
Em módulo anterior, PEMQ1 alertava para o risco de os estudantes interpretarem de
forma inadequada a noção de redução da ‘energia de ativação’, como é o caso da analogia
expressa na Figura 8, que procura representar tal noção por meio da imagem de homens
tentando
empurrar
pedras
"morro
acima", suscitando
interpretações
bastante
diferentes daquelas que seriam esperadas pelo professor.
PEMQ1: Outra coisa é essa questão da energia de ativação, como tinha, numa figura,
ali.
PU1: Aquela do morro.
PEMQ1: Empurrando, um morro acima, e um morro abaixo. Gente! Teve um dia
que um aluno me perguntou: “professor, mas como é que é carregada para cima,
então, essa molécula? Como que é carregada para cima?” [...]
Vários: Hãn?!((espanto))
PU1: Entenderam? Olhem aqui, ó ((aponta para o morro no slide)). Ele ((aluno do
EM)) estava entendendo que a molécula é isso aqui, de repente.
PEMQ1: É. Está fazendo uma analogia, como se fosse acontecer isso. O cara
pensou “como é que vai carregar? Para que lado que vai lá dentro da célula?
Como é que funciona isso? Como que é esse morro, lá?” [...]
PEMB1: Se fosse os meus já iam dizer que gasta energia. (M8, 124-133)
O depoimento de PMQ1 fazia com que os sujeitos participantes do ‘módulo interativo
8’ refletissem sobre uma vivência em suas aulas no EM. Frente à referida figura, a analogia
fez com que os estudantes do EM pensassem que haveria algo semelhante ao tal ‘morro’ lá
dentro da célula. Fez com que eles pensassem na força necessária às moléculas, para que elas
‘subissem os morros’ dentro das células.
Também neste módulo, discutia-se sobre a inadequação de figuras que não favorecem
a compreensão de que, é mediante interações químicas entre a molécula da enzima (sítio
catalítico) e a molécula do substrato, que há redução da ‘energia de ativação’ da reação, na
‘catálise enzimática’. Ao invés de uma efetiva compreensão conceitual da variação da
‘energia’ durante a reação, esta era rechaçada por idéias que nada tinham a ver com o
conceito, o que denota visões distorcidas e simplistas sobre o mesmo. São discussões
importantes à formação para o ensino de CNT, por alertarem para a necessidade de não
negligenciar a complexidade e o grau de dificuldade de compreensão de conceitos complexos,
que requerem um sistema de relações conceituais, como é o caso da redução da ‘energia de
ativação’ na catálise de reações enzimáticas.
84
Outras reflexões sobre visões simplistas que negligenciam o pensamento conceitual
relativo às ‘interações químicas’ foram suscitadas por discussões nos ‘módulos interativos 8 e
9’. A partir das representações abaixo, coletadas em LDBIO e LDQUI do EM, nas quais o uso
de analogias reforça a idéia de uma interação enzima-substrato limitada a um simples encaixe
mecânico. Ao invés das interações químicas, as figuras privilegiam a noção de uma
complementaridade restrita ao formato da enzima e do substrato, como representam as
imagens das Figuras 9 e 10:
Representações da interação E-S
em Livros Didáticos (sacarase)
Tais representações são suficientes
para a compreensão bioquímica??
Figura 9. Modelo Explicando a Ação Enzimática. (LDBIO3, p.541)
Figura 10. Modelo Chave-Fechadura para Ação Enzimática. (LDBIO4, p.75)
PU1 e PU2 interagiam a respeito dos LD em que tais representações são encontradas,
ao passo que questionavam sobre a inadequação das mesmas, impossibilitando compreensões
significativas :
PU2: [...] Os livros didáticos trazem várias representações. [...]
PU1: Do ensino médio né?
PU2: [...] de Biologia, esse aqui é do LDBIO3, esse aqui também é de Biologia, do
LDBIO4, que são interações enzima-substrato. Será que tais representações são
85
suficientes para a compreensão bioquímica? Agora que vocês têm um pouquinho
mais de condições, e perceberam todas as etapas, as interações que acontecem:
será que elas são suficientes, em nível de ensino médio? [...] (M9, 123-126)
Noutra Figura (11), a interação enzima substrato, novamente é representada apenas
por um encaixe físico:
Figura 11. Catálise Enzimática. (LDQUI1, p.469)
Os PU esclareciam aos sujeitos presentes no ‘módulo interativo’ a fonte das
representações:
PU2: Essa é de um livro de Química e também mostra um encaixe físico entre [...]
PU1: Aquela parte azul que seria a enzima e aí vem o substrato, e aí vai rompendo
lá, a ligação [...]. (M9, 127-128)
Outra representação da ação enzimática de LDBIO do EM foi apresentada aos sujeitos
presentes no módulo 9:
86
-Estudantes tomam tais imagens como
representações da realidade?
-O que fazer?
Figura 12. Representação Artística da Ação enzimática. (LDBIO2, p.48)
Interlocuções remetiam a questionamentos sobre a carência de compreensão
conceitual a partir de imagens simplistas:
PU2: Aqui também outro livro de Biologia [...]. Será que os estudantes tomam tais
imagens como representações da realidade? Será que eles acham que lá, é assim
coloridinho, bonitinho, estático, plano.
PEMB1: Sim.
L(alguns): É [...]
PEMB1: Pergunta pra quantos daqui que não tem essa idéia. Porque os meus
alunos têm.
PU2: O que fazer [...] (M9, 129- 134)
As discussões e reflexões eram direcionadas para necessárias abordagens e
explicações, por parte do professor, em aulas de CNT, que pudessem ser contrapostas a visões
simplistas e/ou distorcidas, como as veiculadas pelas figuras apresentadas. Da mesma forma,
87
discutiu-se sobre representações que incorrem no risco de um maior grau de inadequação, por
veicularem a noção de um mero encaixe “chave-fechadura” representado nas Figuras 13 e 14.
- como os estudantes compreendem as interações em
nível atômico-molecular envolvidas nas reações
enzimáticas (pelo modelo chave-fechadura)?
- analogias/imagens ajudam ou atrapalham?
-reduzem a complexidade conceitual?
- é isso que se quer em aulas de Biologia e Química?
- O que você faria?
Figura 13. Modelo Chave-Fechadura 1. (LDQUI2, p.424)
Figura 14. Modelo Chave-Fechadura 2. (LDQUI3, p. 552)
Diante das imagens (Figuras 13 e 14) que reduzem a complexidade da atividade
enzimática a um simples encaixe físico, PU2 levantou questões que faziam pensar nos
cuidados que se deve ter ao usar tais imagens, no ensino de CNT.
PU2: Aqui tem outras representações, do LDQUI2 e LDQUI3.
PU1: Isso é livro de Química do EM. [...]
PU2: Como os estudantes compreendem as interações em nível atômico-molecular
envolvidas nas reações enzimáticas, pelo modelo chave-fechadura? Se
compreendem? As analogias ou imagens ajudam ou atrapalham? Reduzem a
complexidade conceitual? Será que é isso que se quer no ensino de Biologia ou
Química? O que fazer? São questões que preocupam. (M9, 135-138)
PEMB1 instigava os licenciandos a refletir e se pronunciar sobre as figuras
apresentadas, com o uso das quais não acredita ser possível uma compreensão ou significação
conceitual que permitam constituir aprendizados relevantes aos estudantes.
88
PEMB1: [...] Nós temos que pensar que para [...] explicar alguma coisa,
aquele modelo da chave-fechadura, por exemplo, é um modelo, eu não tenho
como explicar. São modelos de ensino aprendizagem. Agora, eles ajudam ou
eles atrapalham? Aquele ((aponta para a chave- fechadura)) do LDQUI2.
Isso aqui [...]. Um cadeado e uma chave ((risos)), vocês acham que o aluno
vai olhar pra isso aqui ((apontando para a figura da esquerda)) e vai pensar
em uma reação química entre uma enzima e um substrato? E esse aqui
((figura da direita))?
L3: Se disser que aquilo é um molde, ou um exemplo de uma enzima com
substrato, não, é lógico que não. [...]
L9: Ta, mas então como explicar sem os modelos?
L7: Aquilo ali só atrapalha. [...] Tá, mas então porque colocam esses
exemplos, só pra atrapalhar?[...]
L4: Esse ((referindo-se a figura 10)) que tu colocou dá pra entender um
pouco melhor, significa que os hidrogênios vão se ligar, vão se aproximar da
enzima, [ ...]
PU2: É mais fácil, mas não é também por que.
L4: Não to dizendo que é 100% mais fácil. Mas tem a noção que ta a
Química envolvida junto com a Biologia, vamos supor, os dois vão se unir.
(M9, 240-250)
Foi possível perceber que sujeitos presentes no ‘módulo interativo’, após as
abordagens com o uso de uma animação, que permitiu desenvolver a noção de que a cada
atividade enzimática está associado um determinado ‘mecanismo de reação’, mostravam-se
contrários e reprovavam o uso de analogias simplistas, como a da “chave-fechadura”,
apresentada em LDBIO e LDQUI, por não contemplarem um entendimento coerente com o
sistema de relações conceituais que possibilita a compreensão da formação e da ação do
‘complexo enzima-substrato’. Ou seja, foram importantes as mediações e as significações
conceituais possibilitadas, permitindo discussões relativas a representações inadequadas sobre
a ‘energia de ativação’, sem enfatizar as ‘interações químicas’ envolvidas na ‘catálise
enzimática’.
No episódio que segue PEMQ2 fazia menção à importância do professor ser um
sujeito reflexivo de sua prática pedagógica. No mais das vezes, os próprios docentes não
analisam os subsídios levados e utilizados em sala de aula. Apresentam os conteúdos aos
estudantes como verdades prontas e acabadas, sem refletir e sem proporcionar que estes
reflitam acerca dos mesmos.
PEMQ2: [...] Nós teríamos que aprender, aprender. Nós professores temos que
entender muito antes ((do ensino)) as teorias. Nós deveríamos refletir mais. Nós já
queremos dar a resposta pro aluno. Então a gente deveria refletir mais. Que bom
que ela ((a licencianda que falava sobre limitações de Ciências no Ensino
Fundamental)) deu essa colocação de que ela não aprendeu, não aprendeu e não
89
aprendeu. Mas então, por quê? Chega o momento de a gente parar, refletir e
pensar. O que esse modelo tá dizendo? O que vem por trás disso? Será que vai
ajudar ou só tá atrapalhando? Bom, se não dá esse, vamos partir pro próximo, mas
desde que isso sirva para uma reflexão. E o que tá por trás disso? Eu, pra mim, na
Química, toda base é da energia. Eu, pra mim, no meu entendimento, um modelo
pode até prejudicar, mas têm modelos que podem auxiliar na nossa imaginação [...].
Pra algumas pessoas aquilo serve. Para outras vai servir outro modelo. Mas
precisa sim de alguém, de um colega ou um professor, para mostrar outros
caminhos, e dizer assim “não, vamos por aqui, por ali, isso realmente não vai dar”.
Só que é difícil. E ninguém vai nós dizer a resposta, entenderam? Então, é uma
coisa que vai acontecendo. É um processo. É complexo. É difícil. Mas têm que
imaginar que isso é uma máquina complexa. É um sistema complexo. Então, essas
interações entre pessoas, entre conhecimentos, como se deu o processo? O que está
por detrás?[...] (M9, 252)
PEMQ2 ressaltava a importância das reflexões, das ajudas e das interações dos
professores em formação com outras pessoas, com outras experiências, que possam contribuir
com mediações, com trocas de idéias, entre sujeitos que fazem parte ou não do contexto
escolar. São inúmeras as dificuldades percebidas no ensino de CNT, frente às quais, é
importante interagir tanto com colegas próximos quanto com outros educadores ou
especialistas que possam co-participar na reconstrução dos conhecimentos e das práticas em
salas de aula. Como refere Morin (2002), “não é suficiente ter aprendido coisas para ser capaz
de ensiná-las com um espírito científico”. Com base no mesmo autor, é importante o
convencimento de que:
é preciso ir mais longe: uma mudança nas práticas de ensino e uma consideração das
variedades das práticas de ensino e de aprendizagem, o que é um trabalho de
fôlego. Além das urgências aparentes, é importante pelo menos fazer com que os
professores experimentem, eles próprios, outras maneiras de aprender além daquelas
que foram convenientes para eles mesmos durante sua adolescência e que, muitas
vezes, reproduzem, acreditando, com boas interações, que são as únicas que podem
funcionar. (MORIN, 2002, p. 532)
Cabe considerar que muitas vezes a carga horária excessiva dos docentes, a falta de
diálogo entre os colegas da área de CNT, a falta de atualização e de aprofundamento teóricoconceitual no âmbito da sua disciplina, da área e da educação como um todo, são obstáculos
que distanciam os docentes das práticas de ensino mais adequadas ao desenvolvimento de
aprendizados significativos.
Frente a este quadro, PEMQ2 alertava para reflexões que
direcionavam a atenção para o que seria possível fazer. O que fazer diante de um ensino
fortemente ancorado no uso restrito dos LD? Como potencializar o acesso aos conhecimentos
que são objetos dos estudos? Quais aprendizados são possíveis de serem propiciados aos
estudantes? Quais atitudes terão que ser tomadas no âmbito dos diferentes níveis do ensino?
90
No episódio a seguir, PU1 sugere formas de avançar nas práticas escolares, fazendo menção a
contribuições da SE.
PU1: Então assim gente, [...] fazendo aulas práticas, atividades, metodologias
variadas usando recursos, figuras, animações, sei lá. Então a gente poderá, quem
sabe, tornar a aula um pouco mais relacionada com a vivência. Enfim, por alguma
razão, o aluno não tá interessado em estudar aquilo. Pode ser que sim. Agora, outra
coisa. E esse é o ponto. E que bom que vocês têm a Situação de Estudo, com muita
diversidade de atividades, mil e uma coisas pra poder estar mediando e ajudar [...]
aquela compreensão lá na escola. A segunda coisa, que tava todo mundo falando
aqui, é que isso é complexo, isso é difícil. E aí nós temos o entendimento, [...] temos
discutido isso várias vezes aqui na Bioquímica. E eu corroboro com isso,
firmemente, de que não tem como, não tem artimanha. Isso nada vai diminuir a
dificuldade, a complexidade da compreensão conceitual, assim como PU2 tava
explicando antes. Então o que nós vamos fazer? (M9, 288)
PU1 também referia que muito do trabalho realizado em aula está ao alcance dos
professores, cabendo a estes, adequar suas práticas. No ensino, muitos obstáculos decorrem de
materiais didáticos utilizados por professores que não refletem sobre a adequação ou não de
figuras, textos e atividades constantes em LD.
Resultados de pesquisa construídos corroboram a visão de que os ‘módulos
interativos’ não se constituem em espaços formativos em que sejam dadas ‘receitas’ de como
seria a melhor maneira de ensinar Química ou Biologia. Têm a pretensão sim de discutir,
refletir a complexidade de ser professor, de constituir-se professor. Discutir limitações de
recursos didáticos, de conhecimentos, de aspectos diversos da formação inicial e continuada.
Também, as limitações do próprio currículo escolar, sendo importante que o mesmo seja
integrado, na prática, de abordagens pertinentes mediante metodologias e recursos
instrucionais que podem contribuir para a organização de um ensino que mobilize o interesse
dos estudantes.
Nas falas que seguem PEMQ1 deixava claro que o EM não propicia uma compreensão
conceitual pertinente de ‘energia de ativação’ por não direcionar o pensamento para a noção
de variações de ‘energia’ associadas a rupturas e formação de ligações químicas, mediante
interações entre as moléculas.
PEMQ1: [...] Nos livros de Química é muito superficial. [...] Aí os caras pegam 50
questões de vestibular e as 50 questões pedem a mesma coisa. Então, o cara decora
isso. Ele “sabe tudo” [...] de energia de ativação. Só que na realidade não tem a
compreensão química do processo. Ou seja, que você tem substâncias reagentes que
precisam romper ligação, que precisam fornecer energia para quebrar ligação e
que vão se formar novas substâncias/produtos, com novas ligações químicas, de
uma forma diferente. [...] Quimicamente falando, ou seja, em termos do nível
estrutural de molécula, nenhum livro didático traz. Então a única aplicação que
91
existe é dentro da Biologia, lá, mas quimicamente falando no EM isso deixa a
desejar.
PEMB1: Se a gente for pensar, por exemplo, na Biologia [...]
PEMQ1: E é extremamente importante entender isso! Na verdade o importante
seria entender as ligações entre os átomos, a quebra de ligações, rompimento de
ligações, com fornecimento de energia [...].
PU1: Interação química.
PEMQ1: É. As anteriores e as novas interações. Porque vai formar esse produto?
Porque forma o produto? Afinal de contas porque a reação acontece? Porque ela é
mais rápida? O que faz ela ser mais rápida, se não é ‘subir e descer’? Porque essa
é que é a idéia que traz na analogia, na figura. (M8, 134-138)
Retomando as concepções de PEMQ1, PU1 reforçava que as compreensões sobre
‘energia de ligação’, não devem restringir-se à disciplina de Química. A Biologia carece de tal
compreensão e poderá avançar muito no ensino quando considerar ‘energia’ como um
‘conceito unificador’.
PU1: Eu acho que a energia de ligação é um assunto importante. [...] Na aula de
Química tem isso. E na aula de Biologia, nós podemos falar em combustão, mas daí
começa dar os nós. Mas será que podemos falar que isso é combustão? Não é nada!
Em temperatura corporal: é com as enzimas. Mas a equação geral é a mesma:
glicose mais oxigênio se transformando em gás carbônico mais água. Em termos
energéticos [...] as entalpias, as energias de ligação, os princípios da Química estão
[...] contemplados aqui. Mas é outra condição ambiental, que é a condição celular. E,
por isso, as enzimas é que é o foco central. Ah, se não tivessem as enzimas! Como é
que nós iríamos imaginar as rupturas de ligação e tudo mais? [...]
LQ3: Eu acho que um pouco na Química é assim, se tu não entender ali porque tem
uma ligação, ou sei lá o porquê daquela interação da química, da energia. Porque
que sem ((essa compreensão)) eu acho tu não vê a Química. Tu sabes Química, mas
tu não sabe o porquê da Química.
PEMQ1: Aquela velha história, tu sabe coisas [...] (M8, 316-344)
PU1 trazia uma linha de reflexão que acenava para a visão das inerentes relações
conceituais interdisciplinares na compreensão do conceito. Professores e licenciandos
mostravam-se favoráveis à necessidade de compreensões mais aprofundadas em Química.
Ressaltavam carências de significação conceitual e de relações nas compreensões conceituais
relativas às interconversões de formas de energia, no ensino e na formação do professor de
EM, em detrimento de aprendizados fragmentados de ‘coisas de Química’. Alertavam para a
importância de um aprendizado teórico-conceitual que permitisse “entender as ligações entre
os átomos, a quebra de ligações, rompimento de ligações” com variação de ‘energia’, a partir
de mudanças na “interação química... as anteriores e as novas interações”. Em vista da
complexidade das transformações envolvidas, ao invés de restringir ao termo ‘energia
92
química’, caberia considerar formas diversas de ‘energia’ envolvidas, como potencial,
cinética, eletrostática. Cabe pensar:
Por que não falar em energias envolvidas nos processos químicos? (...) o conceito de
energia química. (...) a princípio tido como esclarecedor, na verdade se torna
obscuro quando isolado de um contexto explicativo mais amplo, o qual não é
necessário e sim essencial para sua fundamentação. (OLIVEIRA e SANTOS, 1998,
p.21)
Em torno da complexidade da significação conceitual, as discussões enfatizavam a
importância de abordagens capazes de inter-relacionar explicações teórico-conceituais entre si
e com contextos vivenciais, evitando incorrer no risco de recair em obstáculos à apropriação
do conhecimento escolar. Aprendizados deturpados e limitados não propiciam processos de
significação conceitual em nível atômico-molecular, como é o caso de estudantes que usam
palavras sem ter construído um significado adequado. Para Vigotski, a aparição de palavras
novas no contexto de constituição dos indivíduos, marca o princípio do desenvolvimento do
significado. Este é produzido nas interações sociais, mediadas por signos ou instrumentos,
através da figura do outro. O sujeito, na perspectiva de Vigotski (2001, p. 133) “só pode ser
compreendido na sua relação com o signo e, mais especificamente, com a linguagem”. O
homem é produzido nas relações sociais, situado histórica e culturalmente, definido pela
emergência do signo e pela consciência constituída na e pela linguagem.
Tudo isso permite reafirmar a importância de propiciar aprendizados escolares que
potencializem os processos de desenvolvimento humano, de desenvolvimento da inteligência,
da mente humana. É importante saber lidar com dificuldades de compreensão conceitual
significativa, por parte dos próprios professores, que repercutem no ensino de conceitos
complexos como o de ‘energia’. Num episódio do ‘módulo interativo 8’, PEMB1 fazia
menção a tais dificuldades no ensino escolar, suscitando importantes reflexões aos futuros
professores:
PEMB1: [...] e discutir isso! Dar uma aula sobre energia, com toda a complexidade
que isso exige que isso envolve, para pessoas que não têm noção do que é uma
mitocôndria. Esse é o mundo real, da escola que você encontrará, depois. Essa é a
sala de aula, onde a gente vai trabalhar. Acho que as primeiras vezes que eu dei
aula foi uma tragédia. Talvez hoje ainda seja, mas menor. Por que ela é menor
hoje? Porque eu acabo estudando mais Química hoje, como o PEMQ1 também diz:
“não PEMB1, é uma interação química; é isso ...”. Mas ainda falta muito o
entendimento da Química para mim talvez poder mediar adequadamente essa
construção. Talvez um pouco por isso que eu digo que é o conteúdo mais difícil do
Ensino Médio. [...]
93
PEMQ1: Olha eu passei algumas noites em claro, pegando livros. Eu tive que
apelar. Fazer o que? Pegar livros didáticos do Ensino Médio. E aí quando eu
consegui entender os livros didáticos do Ensino Médio principalmente na parte das
reações orgânicas e na parte da Bioquímica. Aí eu voltei a pegar os livros que eu
usava na faculdade, enfim, os materiais. Eu acho que dentro dessa parte da
Bioquímica os professores de Química, têm muita dificuldade para entender o
processo biológico. É muito difícil. (M8, 159, 165)
As reflexões sobre dificuldades na promoção de um ensino que propicie processos
significativos de compreensão conceitual referiam-se a transformações entre matéria e
‘energia’ e que compreender significativamente os fenômenos químicos requer estudo
constante, além de ‘trocas’ entre professores de CNT. É preciso primeiro conhecer, para
depois mediar o ensino.
Como mostram as falas apresentadas a seguir, outros momentos interativos, nos
módulos, ainda propiciavam discussões que se referiam à complexidade da prática escolar.
Acenando para o rompimento das formas tradicionais de organização do currículo escolar,
denotavam possibilidades de (re)contextualização dos conceitos científicos em contexto
escolar de forma que os conteúdos do ensino tenham mais significado para os estudantes e
para o próprio professor.
LQ2: [...] Outra coisa [...] é sobre romper com a fragmentação, com o conteúdo
disciplinar. Mas escrever é fácil, gente, agora, o difícil é pensar em contextualizar
um conteúdo como esse.
PEMQ1: É bem complicado. [...] Mas uma das coisas que eu acredito, enquanto
professor, é que a principal dificuldade ((além de outras)) é a questão de ter tempo
para ler, ter fontes que são seguras e boas. [...]
PU1: E ter gente que te ajude.
LQ2: Gente que ajude!
PU1: Um grupo!
PEMQ1: É! Você formar um grupo! Mas um grupo que realmente discuta contigo,
entre colegas das diversas áreas, ou, pelo menos, um colega da Química, um da
Biologia e um da Física. E você ter a vontade disso! (M8,187-196 )
As manifestações, no episódio, traziam à tona uma discussão anteriormente analisada,
quanto à importância de interações como as vivenciadas pelos sujeitos nos módulos.
Professores e licenciandos expressavam-se sobre a importância e a necessidade de estudar
sempre. Constituir-se professor não é algo mecânico, que acontece com a conquista do
diploma. É um processo lento, processual e gradual, no qual reflexões criticamente
94
fundamentadas sobre as práticas pedagógicas exercem papel fundamental (WIRZBICKI e
ZANON, 2009).
A consolidação da escola “ideal” estaria fundamentada sobre um espaço-tempo para
estudos e planejamentos conjuntos, para leituras e constante formação/atualização docente.
Isso remete para a importância de promover encontros que aproximem a escola e a
universidade, ou seja, aproximando sujeitos que atuam na realidade escolar com os sujeitos
em formação que atuarão na educação futuramente. A conquista de um espaço
interdisciplinar, que envolva as diferentes disciplinas da área de CNT, era vislumbrada a partir
do depoimento de professores que já conquistaram tal espaço no contexto escolar, apontando
para um ensino mais significativo conceitualmente no que se refere ao estudo de ‘energia’. “E
você ter a vontade disso!”, tal como dizia PEMQ1.
As interações nos módulos analisados possibilitaram discussões e reflexões sobre
abordagens do conceito ‘energia’ no EM, denotando contribuições à formação docente,
quanto a uma visibilidade sobre insuficiências nas significações conceituais no ensino de
CNT, seja em aulas do EM ou na licenciatura.
A análise de abordagens no ensino do conceito ‘energia’ prossegue no sub-capítulo a
seguir, que trata de outro assunto dos LDBIO do EM e em aulas de CNT, qual seja: a
participação do ATP na manutenção dos processos vitais.
4.2 Compreensões sobre ATP e Interconversões Energéticas nos Processos Vitais
No âmbito desta pesquisa, o olhar na análise das interlocuções nos ‘módulos
interativos’, envolvendo o uso de LD, esteve voltado para abordagens e compreensões
conceituais relacionadas à respiração. Trata-se de um assunto vivencial, haja vista a sensação
de “falta de ar” possivelmente experienciada por parte de cada pessoa, em situações
específicas, por vezes em riscos de afogamento ou outras vivências. Contudo, em contexto
escolar, trata-se de um conteúdo do ensino de CNT bastante complexo, cujos estudos
requerem compreensões com graus elevados de abstração, como as relativas à atuação de
enzimas no metabolismo celular.
No EM percebe-se uma ampliação crescente de abordagens e explicações sobre a
respiração celular. É preocupante a constatação de que, por exemplo, em LDBIO, elas
abrangem crescentes tratamentos de conteúdos bioquímicos, cuja compreensão envolve graus
elevados de abstração. As abordagens sobre o metabolismo energético celular (constantes nos
LDBIO direcionados para a 1ª série do EM) incluem estudos e entendimentos sobre as vias
95
metabólicas e suas relações com processos de produção e consumo de ATP na manutenção
dos processos vitais.
Esta problemática carece de ser objeto de atenção em contextos de planejamento e
execução das práticas curriculares em CNT, no EM. No âmbito dos ‘módulos interativos’
acompanhados, discussões diziam respeito a tal problemática, tendo sido expressos
depoimentos, posicionamentos e argumentos que se contrapunham a visões simplistas de que
a ‘energia’ é ‘liberada’ ou ‘absorvida’, reduzindo possibilidades de significação conceitual
por parte dos estudantes, na área de CNT.
Resultados apresentados neste capítulo dizem respeito a essa linha de preocupação,
frente à crença de que tais estudos requerem, por um lado, entendimentos relativos a cada uma
das vias metabólicas e reações enzimáticas específicas que integram o metabolismo celular (a
exemplo da Glicólise, do Ciclo do Ácido Cítrico ou Ciclo de Krebs, da Cadeia de Transporte
de Elétrons ou Cadeia Respiratória) e, por outro lado, entendimentos relativos às complexas
redes de relações entre as mesmas.
No desenvolvimento dos ‘módulos interativos’, discussões entre os sujeitos faziam
referência à necessidade de o professor mediar conceitos complexos e abstratos como os
envolvidos nos estudos sobre a constituição química e as transformações que acontecem nos
seres vivos, que mantém a vida. As explicações referem-se a processos de transformação de
‘energia’ que acontecem em nível atômico-molecular, sendo que a compreensão exige graus
elevados de abstração por parte dos estudantes, o que no EM, nem sempre é possível, pois
nem todos os estudantes atingem níveis abstratos de pensamento. No ‘módulo interativo 8’
PEMB1 questionava a complexidade do ensino e das compreensões de conteúdos/conceitos
relativos aos processos celulares.
PEMB1: [...]. Um dos conteúdos que eu trabalho e que eu mais gosto de trabalhar,
gosto muito de trabalhar biologia celular. Gosto! Para mim ela é muito
desafiadora. Porque ela é muito difícil de trabalhar. Porque no Ensino Médio ela é
muito abstrata.
PU1: É. Aqui também é.
PEMB1: Como você tem que imaginar essas rotas metabólicas, essas reações
químicas acontecendo e aqui daqui a pouco tem gente que daqui a meio ano estará
em sala de aula. E vocês ainda têm dificuldade para fazer isso. Então vocês
imaginam um aluno do Ensino Médio que tem ali os seus 15 anos. É muito difícil. E
isso que é o desafio da coisa. O que você faz para tentar minimamente produzir
significados para esses conceitos, nesse nível de ensino? Em que níveis você
consegue chegar com eles? Ou pode chegar? (M8, 40-42)
96
A preocupação expressa por PEMB1, na maioria das situações escolares, passa
despercebida nos contextos da sala de aula. As capacidades de assimilação por parte dos
estudantes, em geral, não são consideradas. Para muitos professores ensinar os conceitos é
algo mecânico, estes sequer refletem sobre os níveis de abstração necessários à compreensão
dos adolescentes. Nessa mesma linha de compreensão, Vigotski (2001) refere que:
estudos especiais mostram que só depois dos doze anos, ou com o início da
puberdade e ao término da primeira idade escolar, começam a desenvolver-se na
criança os processos que levam a formação dos conceitos e ao pensamento abstrato.
Pode-se considerar que a criança atinge tarde o grau de socialização de seu
pensamento, que é necessário para a elaboração de conceitos plenamente
desenvolvidos. (p.159)
A complexidade e os graus de dificuldade dos estudos sobre ‘respiração celular’
residem na necessidade de uso, por parte dos estudantes, de conceitos básicos de Química e de
Biologia, abstratos por sua natureza, bem como da capacidade de entendê-los de forma
dinamicamente inter-relacionada, a exemplo das significações conceituais de processos
‘endotérmicos’ e ‘exotérmicos’, ligações químicas, reação enzimática, coenzima, mitocôndria,
ATP, entre inúmeros outros que poderiam ser citados.
Tal preocupação relativa ao grau de dificuldade de compreensão conceitual pode ser
remetida à análise de excertos e/ou figuras presentes em LDBIO, a exemplo, do Cap. 8 do
LDBIO1, intitulado “Metabolismo Energético – Noções Gerais”. Há uma menção ao
“conjunto das atividades metabólicas da célula relacionadas com a transformação de energia,
o qual é denominado metabolismo energético.” (p. 159; grifo do LDBIO). Logo após, consta
o excerto abaixo, que pode ser analisado quanto a concepções relativas ao conceito ‘energia’ e
suas interconversões.
A fonte de energia mais importante para os seres vivos é a luz solar. Essa energia é
captada pelos seres clorofilados e transformada em energia química, que fica
armazenada em moléculas orgânicas, como a glicose.
A energia armazenada nas ligações químicas das moléculas orgânicas pode ser
liberada e empregada na execução das diferentes funções celulares. Para isso as
moléculas precisam ser quebradas, e o principal processo metabólico que executa
essa função é a respiração aeróbia, durante a qual há participação do oxigênio.
(LDBIO1, 2006, p. 159) (grifos nossos).
São inúmeros os LDBIO que, como mostra o excerto acima, usam expressões como
“liberada”, “armazenada”, ao se referirem à ‘energia’. Tal simplificação e deturpação
conceitual contrapõe-se à complexidade associada ao uso de analogias e metáforas, que,
97
segundo a literatura, incorrem no risco de criar obstáculos epistemológicos à apropriação do
conhecimento científico mediado no contexto escolar.
Em que pese a complexidade da compreensão conceitual de ‘energia’ e de suas
dinâmicas de transformações nos processos biológicos, foi possível perceber que o LDBIO1
apresenta os conteúdos e conceitos de forma direta, mediante definições e ilustrações, como
se fosse algo de fácil entendimento por parte dos estudantes do EM. A figura que segue
exemplifica tal simplificação.
Figura 15. Processos Celulares de Transformação de Energia (LDBIO1, p.160)
Expressões como “processos de liberação de energia”, relativamente à “transformação
de energia nos seres vivos”, como no esquema acima, remetem à visão de que a energia é
“liberada”, no sentido de ser “para fora” do ser vivo, ou seja, para o meio externo. Não há
uma problematização e significação conceitual relativa ao entendimento de reações químicas
que acontecem em níveis submicroscópicos. Assim, os entendimentos ficam reduzidos a
expressões simplistas como “incorporação” e “liberação” de ‘energia’.
O mesmo livro, ao tratar de “reações químicas”, apresenta, de forma também direta, os
conceitos de reação “endergônica” e “exergônica”, apresentando os esquemas abaixo:
98
Figura 16. Fotossíntese e Quimiossíntese (LDBIO1, p.162)
Na figura/excerto percebe-se que LDBIO1 classifica e exemplifica os fenômenos
químicos da quimiossíntese e da fotossíntese como processos ‘endergônicos’, de forma
simplista, como um conteúdo de caráter apenas formal. Apesar do item “Atenção” colocar que
as representações não contemplam as ‘reações químicas’, referindo-se a estas como um
“processo mais complexo”, cabe refletir: por que trabalhar com explicações fragmentadas que
não possibilitam uma compreensão sobre o todo? Quais compreensões os estudantes
desenvolvem diante de explicações simplistas como estas? Eles conseguem estabelecer
relações com conhecimentos de níveis submicroscópicos?
Outras ilustrações como as apresentadas abaixo também denotam uma simplificação
de explicações complexas relativas a contextos vivenciais, sem permitir uma compreensão
adequada, relativamente às Ciências, sobre os processos metabólicos envolvidos no
funcionamento e manutenção da vida, considerando-se o contexto celular. Durante o ‘módulo
interativo 9’ foi apresentado e discutido o slide contendo a gravura e o excerto da Figura 17:
99
Figura 17. Reações Químicas, Acoplamento de Reações e ATP. (LDBIO1, 176)
Pode-se dizer que em abordagens como as da Figura 17, conceitos como o de reação
‘exergônica’ e ‘endergônica’ são tratados de forma simplista, sem considerar a complexidade
dos processos de transformação e conservação de ‘energia’ envolvidos. No ‘módulo interativo
2’ PU1 manifestava-se sobre dificuldades de compreensão do metabolismo celular no ES e
que devem ser mais presentes no âmbito do EM.
PU1: Nesta turma de licenciatura estamos desde março estudando o metabolismo
celular, a glicólise, [...] eu desafiei a turma que eles analisassem livros didáticos do
Ensino Médio, como é que [...] esse assunto comparece lá para ser ensinado. A
gente aqui percebe como esse assunto é complexo, quando aqui mesmo a gente vai
compreender teoricamente como esses mecanismos são propostos, a gente tem essa
visão que compreender o metabolismo celular é algo complexo.(M2, 7)
No âmbito deste trabalho, considera-se importante que os processos de formação de
professores propiciem reflexões sobre essa complexidade do conceito ‘energia’, considerada
acima por PU1 e pela pesquisa dos licenciandos. Nem sempre há consciência de limitações
100
associadas à simplicidade e objetividade de abordagens em LD, independente do nível de
ensino.
No capítulo 6 de LDBIO1, intitulado “Metabolismo energético das células”, a
introdução a esta abordagem é realizada a partir das definições que seguem:
Nas reações químicas, moléculas reagentes interagem entre si e se transformam em
outras moléculas denominadas produtos.
Existem reações químicas que, para ocorrer, precisam receber energia. Elas são
chamadas endotérmicas. Nesses casos, os reagentes têm menos energia do que os
produtos. A fotossíntese e a quimiossíntese são processos endotérmicos.
Outras reações, no entanto, liberam energia. Elas são exotérmicas. Nessas reações,
os reagentes possuem mais energia do que os produtos, e parte da energia dos
reagentes são liberados na forma de calor. A respiração e a fermentação são
processos exotérmicos. (LDBIO1, p. 88) (grifos do LDBIO).
A maneira simplista como LDBIO1 aborda reações químicas ‘endotérmicas’ e
‘exotérmicas’, relacionando a conceitos fundamentais a serem compreendidos no EM, a
exemplo da ‘fotossíntese’, ‘quimiossíntese’, ‘respiração’ e ‘fermentação’, possivelmente não
possibilitam compreensões e inter-relações por parte dos estudantes. A interpretação
necessária para o entendimento conceitual desses processos complexos é assim referida pela
literatura:
A interpretação atômico-molecular de processos endotérmicos e exotérmicos exige
clareza quanto aos aspectos macroscópicos dos experimentos. Há muitas
dificuldades com as definições de sistema e de vizinhança e com o fato de ser ou não
possível a troca de calor entre eles – e, em caso afirmativo, dúvidas quanto às
consequências do restabelecimento do equilíbrio térmico. Nos níveis microscópicos
ainda existem as dúvidas quanto à associação de ruptura e formação de ligações (ou
de interações intermoleculares) com absorção e liberação de energia, como também
quanto à identificação desses fenômenos com alterações na energia potencial das
partículas envolvidas. (BARROS, 2009, p.1).
Logo após as abordagens com limitações aos entendimentos dos estudantes, em
LDBIO2 constam imagens representativas dos processos de fotossíntese, que não podem ser
compreendidos tão simplesmente como “incorporação” ou “liberação” de ‘energia’.
101
Figura 18. Fotossíntese (LDBIO2, p. 88)
Figura 19. Respiração Aeróbia (LDBIO2, p. 88)
Questionamentos eram levantados durante o módulo 9, sobre as compreensões dos
estudantes do EM a respeito do importante e complexo conceito ‘energia’, na área de CNT, a
partir de imagens inadequadas como as das Figuras 17 e 18, a do morro energético e outras
analogias presentes em LDBIO e LDQUI.
PU2: Que energias são essas que estamos falando? São diferentes para Física,
Química e Biologia? O que vocês entendem por energia?
L2 ((cochicho)): Pra mim é a mesma coisa.
PU2: Então aqui tem outra representação de um livro didático de uma reação
exotérmica e de outra endotérmica fala em energia. Todas tem energia. O que é
energia? O que vocês entendem por energia? Tem uns autores que falam em
interconversões de energia.
PU1: O livro ((referindo-se ao LDCIE1)).
102
PU2: Então essa, a M1 me passou esse slide e eu achei bem interessante mesmo.
“As substâncias interagem entre si e se modificam por meio de absorção,
dissipação e trocas de energia. Nesse processo, enquanto ligações químicas são
rompidas e novas ligações são formadas, há sempre o envolvimento de energia. Nas
transformações de substâncias, a energia potencial de ligação química é
transformada em energia cinética molecular, aumentando a temperatura do corpo.”
((LDCIE1, p.71)). Então são ligações, as ligações é que fornecem essa energia, que
então a gente percebe esse calor.
PU1: Ou até mesmo mantendo o organismo.
PU2: Ou mantendo o organismo pelas interconversões dessa energia potencial que
a molécula tem, então porque a energia é a mesma, tudo tem energia.
PU1: O total de energia.
PU2 - A energia total é a mesma. O que acontece são interconversões, da energia
potencial das moléculas ((que)) são transformadas em cinética, ((não é toda, há
novas energias potenciais, porque há novas moléculas)) que podem ser dissipadas
que tu nem percebe, ou tu pode perceber o calor. (M9, 71-79)
PU2, ao questionar os sujeitos presentes no ‘módulo interativo’, sobre entendimentos e
concepções diferenciadas de ‘energia’ no âmbito de cada campo disciplinar de CNT, chama
atenção para o LDCie1, utilizado nas séries finais do EF e como subsídio nos ‘módulos
interativos’. Por ser um LDCIE do EF, nível do ensino em que são iniciados os processos de
formação conceitual relacionados à ‘energia’, respiração, entre outros, tal discussão justificase, por perceber-se um avanço na forma conceitual de tratamento didático, tendo sido
observada a presença, ao longo do mesmo, de abordagens adequadas e coerentes com a forma
científica com que os termos são entendidos e tratados. Apesar da palavra “libera” ainda estar
presente em LDCIE1, a partir de análise do mesmo percebeu-se grande avanço em relação à
abordagem das transformações entre matéria/energia, como a citada no episódio acima.
Tal análise contrapõe-se a visões limitadas e fragmentadas, da área, presentes na
maioria dos LDBIO que abordam ‘energia’, a partir de ideias relativas a concepções como
“libera energia”, usualmente utilizadas em situações cotidianas. Nossa preocupação é de que,
em aulas de CNT, esta expressão tende a criar obstáculos à construção da compreensão
cientificamente aceita sobre as transformações envolvendo matéria e ‘energia’. Em vista da
complexidade das transformações envolvidas, ao invés de restringir ao termo ‘energia
química’, caberia considerar formas diversas de energia envolvidas, como potencial, cinética,
eletrostática.
Frente a expressões simplistas e equivocadas presentes em vários LDBIO e LDQUI do
EM, resultando em compreensões incoerentes com formas científicas adequadas de
explicação, cabe considerar que não podemos mais voltar a definições arcaicas dos conceitos,
uma vez que estudos sobre a natureza do calor sempre estiveram em foco para os químicos e
103
físicos, dos séculos XVIII e XIX, Lavoisier apoiava a chamada ‘hipótese calórica’, segundo a
qual o calor se devia à transmissão de um fluido calórico dos corpos mais quentes para os
mais frios. Nesse sentido, essa forma ultrapassada e descontextualizada de abordar conceitos
pode incorrer em assimilações em que os estudantes possam imaginar uma situação em que
exista uma ‘energia’ retida em um material, a qual depende de alguma reação para ser
liberada.
LD amplamente utilizados no EM também abordam de forma simplista os processos
complexos de reações referidas como ‘exotérmicas’ e ‘endotérmicas’, possivelmente sem
estabelecer relações ou diferenciações entre as noções de reação ‘exergônica’ e ‘endergônica’,
incorrendo, dessa forma em obstáculos epistemológicos às compreensões científicas, como
tratado no Capítulo 2. Tais obstáculos podem ser remetidos a figuras como a 20, referente às
“reações acopladas” quanto às interconversões de energia.
Figura 20. Reações Acopladas (LDBIO1, p.163)
Tal forma de abordagem, sem contemplar explicações acerca das transformações que
acontecem em níveis submicroscópicos, incorrem em obstáculos ao desenvolvimento de
conhecimentos escolares coerentes com as formas científicas de explicação. Isso acomoda o
104
pensamento, impedindo os entendimentos conceituais por parte dos estudantes. A figura
compromete a compreensão, devido a equívocos reportados à visão de ‘liberação’ e de
‘incorporação’ de ‘energia’ como mero movimento de caminhõezinhos num ir e vir com ou
sem a ‘carga’.
Acredita-se que mediações de saberes por parte de sujeitos com formação e atuação
profissional em diferentes níveis educativos permitem um enriquecimento das ideias e
argumentações, concebido como fator propulsor de mudanças no ensino de CNT, em
contraposição à primazia das visões simplistas como a de que o professor seria o detentor dos
conhecimentos ‘verdadeiros’, bem como a concepção extremista de que o ‘aluno constrói o
seu conhecimento’, o que negligencia a essencialidade do papel mediador do professor.
Corroboram tal visão as ideias de que:
o que afeta diretamente o desenvolvimento dos conteúdos científicos em sala de aula
é a maneira como o docente é formado ou até mesmo a visão que possui sobre o que
é Ciência e a atividade científica. ... os professores parecem possuir uma concepção
arraigada de que ensinar conteúdos científicos é transmitir conhecimentos prontos.
Assim, segundo o autor, torna-se difícil esperar que um professor formado com uma
concepção de Ciência como algo estático desenvolva práticas que privilegiem outra
visão da atividade científica, se ele próprio não vivenciou tal processo. (LONGHINI,
2008, p. 243)
Assim, dificuldades por parte dos professores da área de CNT em compreender e
ensinar o conceito ‘energia’ podem ser reportadas aos processos formativos baseados no
currículo tradicional, em que cada disciplina trata os conteúdos sem interlocuções dos pares,
não promovendo um ensino inter-relacional dentro da própria área. Limitações a
compreensões conceituais no ensino e na formação para o ensino, apesar de vários avanços
significativos, permanecem atreladas a abordagens inadequadas em LD. Não desconsiderando
a importância do LD no contexto escolar, sugere-se que haja um olhar mais crítico sobre as
formas como conteúdos/conceitos são abordados, na perspectiva de preservar a coerência com
as Ciências e, por outro lado, de valorizar as inter-relações necessárias a uma verdadeira
compreensão conceitual, enquanto sistemas de relações a serem considerados no ensino de
conteúdos/conceitos complexos, como é o caso de ‘energia’. Nesse sentido, cabe refletir que:
é preocupante evidenciar as dificuldades dos professores em conteúdos de Ciências,
muitas vezes de nível elementar. Na carência de conhecimentos de conteúdos
científicos, a interação acaba quase sempre sendo com o próprio livro didático
disponível nas escolas, o que limita o aprofundamento de tais conteúdos. Além
disso, a prática de consulta a livros didáticos pode reforçar alguns erros conceituais,
devido à qualidade ainda sofrível de muitas destas obras. [...] Caso contrário,
105
corremos o risco de continuarmos formando o professor pleno em metodologias,
mas vazio em conteúdos. (LONGHINI, 2008, p.251)
Apesar das políticas públicas, com a publicação de leis e documentos que orientam a
educação nacional, é necessário reforçar movimentos de mudança mediante os quais todos os
sujeitos que atuem no ensino tenham capacidade de desenvolver compreensões acerca dos
conhecimentos científicos e que estes sejam ensinados de forma que venha a auxiliar na
resolução de problemas típicos ao contexto cotidiano. Frente a esta concepção, cabe refletir
sobre o necessário cuidado para não incorrer na implementação de um currículo pouco
rigoroso.
O risco grave é de que se percam de vista os objetivos maiores do ensino de
Ciências, que deve incluir a aquisição do conhecimento científico por uma
população que compreenda e valorize a Ciência como empreendimento social. Os
alunos não serão adequadamente formados se não correlacionarem as disciplinas
escolares com a atividade científica e tecnológica e os problemas sociais
contemporâneos. (KRASILCHIK, 1987, p. 66)
Essa linha de entendimento remete a discussões sobre a necessidade de compreender
limitações de abordagens conceituais de ‘energia’ em LD utilizados em aulas de CNT,
conforme reflexões vivenciadas durante o desenvolvimento dos ‘módulos interativos’.
Percebia-se uma maior conscientização no sentido de o professor não vir a tomar o LD como
único orientador na apresentação dos conteúdos. Melhorias no ensino de CNT necessitam
contemplar os LD, mas não apenas os mesmos, sendo importante ter uma visão crítica sobre
os mesmos, bem como, usar uma multiplicidade de fontes de informação, bem como outros
recursos didáticos, possibilitando o desenvolvimento de um ensino em CNT dinâmico e
enriquecedor, coerentemente com as OCNEM (BRASIL, 2006).
Durante os ‘módulos interativos 2 e 8’, foram levantadas discussões sobre carências de
relações nas compreensões conceituais das interconversões de formas de ‘energia’, presente
nos LD e nas práticas de sala de aula, tanto no ensino quanto na formação de professores de
EM, ao qual são inerentes as relações conceituais interdisciplinares na compreensão do
referido conceito. Mediações alertavam para a importância de um aprendizado teóricoconceitual que permitisse “entender as ligações entre os átomos, a quebra de ligações,
rompimento de ligações” com variação de energia, a partir de mudanças na “interação
química ... as anteriores e as novas interações”.
No ‘módulo interativo 8’ foram apresentados e discutidos slides que ilustravam
esquemas representativos de transformações em nível atômico-molecular, mediante as quais é
106
produzida a energia metabólica que possibilita a manutenção do processo vital, envolvendo
em especial compreensões relativas às vias metabólicas mitocondriais.
Figura 21. Respiração Mitocondrial. (LDBIO4, p. 215, 2004)
PEMB manifestava-se sobre as dificuldades de ensinar ‘respiração’, pela
complexidade da compreensão conceitual dos processos metabólicos nela envolvidos.
PEMB1: [...] o conteúdo mais difícil para todo o EM, em Biologia,
indiscutivelmente, é mitocôndria. É compreender o processo de produção de
energia. E entender a fotossíntese. De tudo o que eu dou, nada pode ser mais
complicado. Talvez, porque eu acho também difícil. E porque eu vou esbarrar na
Química. Então, eu estudo muita química para mim conseguir ensinar.
PU1: Provavelmente os professores de Biologia que são seus colegas também...
PEMB1: É. Agora, para o aluno entender o que acontece quando ele come, ele já
tem dificuldade para entender, por exemplo, que ele come, lá, uma barrinha de
chocolate, e que, com isso, tem uma série de transformações que acontecem, até
você produzir e ter a glicose. Daí, ele tem que entender que essa glicose atravessa a
parede intestinal, que ela vai para o sangue, vai para a célula, e que, lá na célula...
PU1: Tem a mitocôndria
PEMB1: [...] Até ela ((glicose)) chegar à mitocôndria. Entender essas reações
químicas ((para o slide)) é complicadíssimo.
PU1: E isto está lá no EM.
PEMB1: Está nos livros! E isso é difícil! (M8, 100-107)
107
As dificuldades dos professores de Biologia em compreender, em dar “conta” dos
conteúdos que incluem muitos entendimentos da Química no EM, eram recorrentes desde os
primeiros ‘módulos interativos’ organizados no âmbito dessa pesquisa. Bem como a
importância da interdisciplinaridade para avançar no ensino da área e o constante estudo,
aperfeiçoamento dos docentes.
Os conteúdos que envolvem a ‘energia celular’ exigem, por parte do professor de
Biologia, estudos químicos que, isolados de um contexto, por si só não bastam. Para avançar
na significação, é de grande relevância a ajuda dos professores das demais disciplinas da área.
Por exemplo, o professor de Química poderá contribuir com explicações relativas às
partículas e interações em nível atômico-molecular. No que se refere aos LD, considerando-se
que os mesmos se limitam a uma determinada disciplina, cabe refletir que:
A abordagem dos conceitos diferencia-se apenas pela complexidade da explicação,
isto é, fica mais na dependência do tipo de livro que, por exemplo, se este for
volume único, os conceitos são pouco explicitados. Nestes termos, alguns livros se
resumem a meras definições e assim, em poucas linhas ou frases são introduzidos
muitos conceitos na forma de definição. [...] Ao nosso ver, a forma e organização
dos conteúdos celulares apresentados pelos autores não evidencia preocupação com
a inter-relação funcional e mesmo estrututal entre os diversos componentes celulares
e, portanto, o estudo destes se dá de forma linear e estanque. (CERRI et al, 2000, p.
128)
Considera-se importante valorizar modos de mediação de sujeitos como o estabelecido
por PEMB, que, na condição de professora de Biologia, expressa dificuldades vivenciadas
cotidianamente na abordagem de conteúdos que requerem necessárias compreensões
químicas.
PEMB4 – Eu digo assim por mim e por várias colegas de Biologia do EM é esse o
nosso trabalho?
PEMB3 – É, depende ainda muito da nossa capacidade, EM eu sempre tive essa
clareza, que é ruim entender sempre na corrida, a gente não tem essa clareza de
passar pra eles.
PEMB5 - Por isso que a gente quer criar esse encontro de formação
.
PEMB3 – E como é bom estar aqui.
PU1 - Fala PEMB4, quer falar?
PEMB4 – Não, eu tô contando pra eles, uma questão que tem [num livro didático]
do terceiro ano agora, e que esse ano me apertou. (...) Eu sei que tinha questões e
no próprio original tinha (...) corrigidas (...). Chegou na outra [parte], é pura
Química, fazer o que fulaninha vamos na professora de química, daí fomos lá no
professor de Química.
108
PU1 – Que bom isso mesmo.
PEMB4 – E daí as pessoas dizem, eu acho assim, quando a gente não sabe, tem
muita coisa que a gente não sabe. E todas vão sair da faculdade e vão ter que
estudar muito, tem muita coisa que a gente não sabe.
PU1 – Com certeza. O que é que não sabem?
PEMB4 – Isso vale pro resto da vida da gente, todo ano tu vai acrescentando coisas
novas, e muitas coisas (...).
PEMB3 – E quanto é importante o colega da gente de Química, [ter] essa
compreensão de que (...) é bom pra eles isso ajuda explicar para vocês [alunos]
(...).
PEMB4 – E a professora de Química é boa, pegou olhou, (...) observou e fez a
questão. (...) Explicou pra menina, e eu junto (...). Daí voltamos pra sala de aula e
eu expliquei e a menina me ajudou, então ficou clara a questão. Essa questão, pra
mais gente de química não foi uma questão que fluiu tão rapidamente a resposta.
(...) Eu sou formada em Biologia (...) [num encontro] todas nós de Biologia lá, eu
disse gente, são todas professoras há algum tempo como eu, e daí isso não dá, isso é
pura Química. Mas colega é uma questão do vestibular de biologia, essa questão
não precisa dar, (...) e foi aí que encerrou nossa discussão, (...) a questão que era
puramente Química. Eu estou sendo bem verdadeira
PU1 – Não PEMB4 a nossa pergunta é verdadeira (...).
PU1 – Viu PEMB4, nós não temos respostas, (...) por isso que nós estamos
discutindo também, nós temos preocupações, algumas idéias (...). (M2, 200-214)
O episódio aponta que há professores preocupados com o seu saber, que refletem
sobre sua prática, que buscam trocas entre colegas, assim como há aqueles que ainda
continuam dando subsídios a um ensino estanque e linear, em que cada disciplina seja
responsável por determinados conteúdos, corroborando a manutenção do currículo tradicional,
distante das orientações estabelecidas nas OCNEM (BRASIL, 2006).
Por um lado, a atenção se voltava para a complexidade do conteúdo respiração celular
e, por outro, para a necessidade da interdisciplinaridade na construção mais significativa de
conceitos envolvidos. PEMB4 coloca-se na condição de sujeito que, sendo professor de
Biologia, vivencia cotidianamente com dificuldades a abordagem de conteúdos, quanto às
necessárias compreensões químicas, sendo esse outro foco de reflexão importante na
formação.
No ‘módulo interativo 2’ foram apresentados, para discussão entre os sujeitos, com a
participação de professores do EM, slides contendo figuras de LDBIO de EM que
representavam transformações químicas envolvidas na compreensão da respiração. É um
assunto da vivência das pessoas, bastante complexo e amplamente abordado nos LD
analisados, com constantes relações com o conceito ‘energia’. Num recorte de LDBIO1
consta a figura a seguir.
109
Figura 22. Processos Celulares de Energia (LDBIO1, p.161,)
Sobre a possível contextualização e complexidade inerente à respiração, um sujeito
interativo assim se expressava:
PU - Eu queria relembrar que respiração celular é um conteúdo que é estudado
bastante, mais nas aulas de Biologia e muito pouco na Química. Para nós,
respiração é um assunto da vivência: a gente respira, e não vive sem respirar. Mas
sobre esse assunto vivencial, como é a compreensão escolar, nas aulas de Biologia
e Química? (M2, 170)
Se, por um lado, respiração é um assunto intrinsecamente presente na vida de cada um,
enquanto situação real, por outro lado, a (re)contextualização das explicações científicas,
ainda que possa ser possibilitada de forma a tornar o assunto mais atraente, não reduzirá a
dificuldade do processo de ensinar e aprender. Em outras palavras, a contextualização dos
conteúdos de CNT no ensino escolar não significa que se torna fácil mediar o acesso às
linguagens de modo a internalizar os significados conceituais coerentes com as explicações
científicas.
As reflexões sobre dificuldades na promoção de um ensino que propicie processos
significativos de compreensão conceitual referiam-se a transformações entre matéria e
‘energia’; compreender significativamente os fenômenos químicos requer estudo constante,
além de ‘trocas’ entre professores de CNT.
Nas imagens presentes em LDBIO para o EM, observa-se grande quantidade de
explicações, com ausência ou baixo comparecimento das fórmulas químicas dos processos
abordados, apesar de as mesmas não garantirem nada sem a significação.
110
Figura 23. Alimentos e Ciclo de Krebs (LDBIO1, p. 203)
PU1: Só pra dar um exemplo, vocês sabem que a gente pode ingerir alimentos ricos
em glicose, carboidratos que vão propiciar a vinda da glicose pelo sangue até as
células. Se a gente para com a atividade física, a gente tem tendência de engordar
mesmo, a partir desses carboidratos, não é verdade? Se a gente fica sentada, não
faz atividade física, a gente vai engordar mais. Então, essas enzimas estão lá,
dependendo da condição do meio. Algumas são reguladoras do metabolismo, elas
têm além do sítio de reação ali em cima que é onde o substrato se encaixa, elas têm
outro centro, chamado alostérico. Daí vamos supor que tem lá uma presença de
ATP alto na célula e que essas substâncias metabólicas estão interagindo com o
centro alostérico, inibindo aquela enzima. Em outro momento, pode ser que ela
interaja com outra substância lá presente. Pode ser que está interagindo, ativando.
[...]
PU2: Outra coisa importante de lembrar que na Química a gente imagina a
molécula isolada, [...] como se fosse possível imaginar isso [...]. Na verdade ela
esta sempre em interação, então é muito mais dinâmico que simplesmente imaginar
uma molécula. (M9, 314-318)
A Figura 23 não mostrou que, até Piruvato, a glicólise produz ATP. Seria importante
considerar as reações que produzem um saldo energético de ATPs. A “queima” de gordura na
respiração produz mais energia do que a de outras substâncias. Por exemplo: um grama de
gordura na respiração produz duas vezes mais ATP do que um grama de carboidrato ou de
proteína.
Diante da simplificação da Figura 23 e das interlocuções do episódio acima cabe
refletir: como se dão as compreensões, significações conceituais, frente a estas limitações dos
LD? Compreende-se que figuras, com fórmulas ausentes, são impossíveis para os estudantes
constituirem um sentido. Mesmo que o estudante consiga reproduzir a explicação como está
no LD, é difícil dimensionar o sentido, significado conceitual ao que está explicando aí. Por
isso defende-se a necessidade constante de interações entre as áreas de CNT, na perspectiva
de um ensino e formação mais relevante, na área.
O aumento significativo de figuras nos últimos anos em LDBIO do EM, a exemplo
das Figuras 24 e 25 sem uma explicitação adequada acerca das reações químicas que
111
acontecem nos níveis microscópicos, com elevado envolvimento de ‘energia’, foram alvo de
discussões durante os módulos.
Figura 24. Representação de NAD+ e NADH. (LDBIO4, p.208)
Figura 25. Representação do ATP/ADP/AMP. (LDBIO4, p. 211)
Acerca das Figuras 24 e 25, PU1 no ‘módulo interativo8’, estabelecia a seguinte linha
de reflexão com os sujeitos participantes do espaço formativo:
112
PU1: Eu queria falar de uma coisa importante [...] tem uma constatação que eu
faço, de que a cada poucos anos que passam, os livros de Biologia estão ampliando
tanto ((fala com entonação)) essa parte que entra na parte molecular.
PEMB1: Isso eu queria falar.
PU1: Então veja bem, uma estrutura como essa ((referindo-se a Figura 23)). Tu
falava antes do NAD, da carga positiva do NAD [...]. A gente não tem dúvida
nenhuma aqui nas aulas de Bioquímica, que a gente compreender enquanto
professores, esse metabolismo assim como nós estudamos aqui, e que é difícil
mesmo assim pra gente aqui, eu e eles, essa compreensão, não significa que da
mesma forma vai ser trabalhado lá ((Ensino Médio)), tudo bem. Por outro lado
PEMB1 ((os LDBIO)) estão cada vez ampliando mais, você concorda comigo?
PEMB1: Sim, isso que iria falar antes.
PU1: Entende PEMQ1 tu que é da Química. Então a hora que a gente vê, ainda
mais sefor no primeiro ano como muitas vezes é. A presença [...] ninguém ta
inventando colocar a estrutura do NAD como eu estou mostrando ela lá na parede,
mostrando o ATP e essa energia de ligação, etc e tal...(M8, 213-217)
Em relação ao saldo energético de ATP produzido nas diferentes reações químicas que
constituem as rotas metabólicas vitais, durante alguns ‘módulos interativos’, aconteceram
importantes discussões que diziam respeito à importância da readequação do plano de ensino
de Química e Biologia, nos 1º e 3º anos do EM. Com base nas reflexões propiciadas pelas
interações, defende-se que a Energética Celular em Biologia seja estudada no 3º ano do EM,
em conjunto com os conteúdos de Química1.
PU1: Deixa eu perguntar: vocês lembram quem é que fez Citologia, na Biologia, no
1º ano do Ensino Médio? Levanta a mão. A maior parte fez no 3º? Ou nem
lembram? [...]
LQ3: Meu. Aquilo lá é impossível de entender assim. E te jogam, pelo menos no meu
Ensino Médio teve logo no início do ano letivo.
M2: Atropelou.
LQ3: Então foi aquela coisa assim que a agente nem sabia o que estava vendo, era
célula, mas não [...]. Agora, hoje eu lembro algumas coisas, e eu associo agora, na
Bioquímica, com aquilo que eu aprendi lá.
PEMB1: Agora, este ano, o fato de ter dado Bioquímica e ter dado a parte da
Citologia que envolve toda aquela parte das interações químicas, no 1º ano, para
mim, [...] foi um desafio gigantesco. Porque quando eu pego eles no 3º ano, como
eu dou Biologia no 1º, no 2º e no 3º ano, eu vou preparando eles. Quando eu
trabalho a Ecologia, que é o primeiro conteúdo que se trabalhava. Eu dizia: “bom,
são seres vivos, e com exceção dos vírus, são formados por células. Células são ...”.
1
As possibilidades dessa organização, com o estabelecimento de inter-relações entre conhecimentos químicos e
biológicos, ficou bastante limitada quando muitas escolas adotaram o Programa de Ingresso no Ensino Superior
(PEIES) desenvolvido pela Universidade Federal de SantaMaria – RS (UFSM). Este programa organiza o
currículo ao qual as escolas que mantêm convênio com o mesmo devem-se adaptar. Através do PEIES a
preparação para o ingresso no ES se dá ao longo do EM, com a realização de provas anuais durante todas as
séries do EM, não havendo a necessidade de prestar vestibular.
113
Tu começa trabalhando isso. Tu vai fazendo essa construção. Quando eles
chegavam lá no 3º ano, quando eu ia falar em mitose e meiose, era notícia. Porque
eles já sabiam. Porque quando eu vou falar em reprodução de vegetais no 1º ano,
eu já tinha que falar da meiose e tinha que falar da redução. Aí [...] era muito
tranqüilo, só que agora não. Aí tem algumas coisas que tu também não vai mais,
fica meio automático. (M8, 66-73)
As dificuldades de compreensão e significação conceitual ficam bastante distantes
quando não é possível estabelecer inter-relações entre as disciplinas de CNT. Os graus de
abstração e de dificuldade requeridos para compreensões de processos em níveis
submicroscópicos podem ser atingidos se acontecerem conexões entre os “tempos” em que os
conceitos de Biologia e Química são abordados no EM. Como refere PEMQ1:
PEMQ1: Então isso é uma questão assim que a gente fala em tempos diferentes. Daí
o problema de você seguir um currículo que ele já vem pronto ((referindo-se ao
PEIES)), um programa de conteúdos. Agora, se a gente tivesse o tempo e a
possibilidade também muitas vezes, de você sentar junto e começar dar o conteúdo
de uma forma diferente, eu acho que os alunos têm capacidade de compreensão. A
gente os subestima muitas vezes, eles teriam condições [...] (M8, 77)
Sem a compreensão de um ensino em CNT articulado com as especificidades das
disciplinas, bem como sem considerar os processos de desenvolvimento mental dos
estudantes, necessários às compreensões de conceitos complexos, o ensino de CNT
permanecerá distante dos interesses dos estudantes e não atenderá as OCNEM (BRASIL,
2006), que têm a contextualização e a interdisciplinaridade como dois eixos articuladores do
ensino.
PEMB1: Para as escolas que seguem o currículo do PEIES [...] a Biologia ela era
trabalhada no primeiro ano, trabalhando com a Ecologia e a Botânica. E até o
segundo ano nós trabalhávamos os seres vivos, trabalhava toda Zoologia, toda
Fisiologia Humana. Por que a Histologia e a Embriologia nós dávamos ainda no
segundo. E a parte de micro nós trabalhávamos no terceiro ano. A gente vinha de
trás para frente, quer dizer, do macro para o micro e não como está sendo proposto
hoje. Daí, no terceiro ano nos dávamos a Biologia Celular e depois a Genética e
Evolução. E era um tempo maravilhoso ((tom de exclamação)) para mim em sala de
aula. Por que eu trabalho na minha escola com um professor de Química, que dá
aula numa escola pública aqui de Ijuí [...] e numa escola ((particular)) comigo.
Como nós vamos e voltamos juntos todos os dias, então a gente planeja a nossa
interdisciplinaridade nesse trajeto, afinal de contas são quase três horas por dia
que nós viajamos juntos. Então quando eu ia dar Biologia, quando eu dava a parte
da composição química da célula, eu não precisava me preocupar em dar, por
exemplo, o que é uma ligação peptídica. Eu até dizia para os meus alunos:
‘proteínas são formadas por um polímero de aminoácidos, que esses aminoácidos se
ligam por ligações peptídicas’. Agora, o que é uma ligação peptídica? O professor
ensinava na aula de Química. Eu até dizia o que é um aminoácido, que tinha um
grupo amínico, que tinha isso, aquilo e deu. Sem entrar em detalhes. Quem dava o
detalhe era a aula de Química. Agora, o conteúdo do PEIES mudou. O professor de
114
Química continua dando esse conteúdo lá no terceiro ano. Só que eu tenho que dar
a Citologia, na Biologia, agora, no primeiro ano.
PU1: Daí complicou!
PEMB1: Quando, antes, eu disse que isso é difícil, se isso é difícil para vocês que
são adultos, que conseguem abstrair com certa facilidade, vocês imaginem para
uma criança de primeiro ano do EM, que tenha, lá, os seus 14, 15 anos. (...)
Depoimentos como esses foram frequentes nos ‘módulos interativos’. Professores
faziam menção aos níveis de abstração necessários para a compreensão do ‘metabolismo
energético celular’, atingido por uma porcentagem muito pequena de estudantes. Quando tal
conteúdo for desenvolvido no 1º ano do EM, eles irão conseguir entrar no nível de abstração
no final do 3º ano, assim como muitos estudantes não os atingem. Diante dessa problemática,
cabe refletir: Quais interesses podem estar orientando o EM, impedindo que os professores
tenham autonomia de organizar seus planos de ensino em função de programas como o
PEIES?
Pode-se inferir acerca dos graus de dificuldades em que se encontram os conceitos
científicos relacionados à ‘energia’. A abstração requerida para a compreensão de conceitos
complexos como esse não pode ser compreendida nos espaços de ensino e formação em CNT
como algo simples.
Considera-se relevante inserir abordagens de ‘energia’ no âmbito do EF, de modo que
os estudantes possam gradualmente constituir compreensões e significações sobre o conceito,
evitando concepções estanques e fragmentadas na área de CNT. Sobre a complexidade
inerente aos processos de respiração celular, os sujeitos assim manifestavam suas
compreensões:
PEMB1: Que saiu da oitava série. Essa semana eu estava dando aula e eu dei
respiração celular. E daí, de repente, vem a história do...
PU1: Dos NADH, ATP, AMP, ...
PEMB1: Todos os anos o mais do NAD que aparece, aí...
PU1: Nós vamos ver semestre que vem.
PEMB1: Vocês vão ver semestre que vem meus alunos tem que ver agora, e eu vou
ter que me ver com o bendito do mais. Essa vez foi interessante porque eles
começaram, eles contaram os Hidrogênios, “professora forma isso?”, a idéia deles
era assim: deixa eu ver ((apontava para o slide)) não, não era a estrutura do NAD
que eles tinham ((comentou pelo fato de ter sido mostrado no slide a estrutura do
NAD+ e NADH)), eles tinham a glicose que forma o piruvato e depois vai formar o
AcetilCoA, etc. Aí pela conta deles faltavam dois H e daí tinha quatro H+, rebole
para mim explicar que o hidrogênio aqueles quatro H +, aqueles elétrons lá. Como
115
eu explico isso pro primeiro ano? [...] Por que doa elétron, que pega próton e que
vira não sei o que. Isso é extremamente difícil no primeiro ano.
PU1: Eu diria: impossível.
PEMB1: E sabe o que os alunos pediram para a coordenadora da escola?
((enquanto PEMB1 falava discussões em voz mais baixa se faziam pelos
lincenciandos)). Que eu achei maravilhoso! Eles vem no sábado de manhã, com a
condição que estejamos na sala de aula, eu e o professor de Química! Só comigo
eles não querem. Nem só com o professor de Química.
PU1: Uma aula extra?
PEMB1: Uma aula extra eles estão pedindo, por que eles querem aprender. Eles
pediram no sábado, a manhã inteira, mas comigo e com o professor de Química,
para ver se a gente consegue avançar neste entendimento. Então, é difícil! (M9,
181-195)
No âmbito desta pesquisa considera-se relevante ampliar as compreensões, sobretudo
em contextos de formação de professores de CNT, sobre a complexidade inerente ao ensino
do conceito ‘energia’, de modo a refletir de forma fundamentada sobre caminhos que se
contraponham a enfoques simplistas e inadequados às compreensões relativamente às
Ciências. Na perspectiva de acenar para melhorias na readequação curricular da área, PU1
reitera que:
PU1: [...] Então vejam bem, o que eu queria dizer pra dar algum encaminhamento.
[...] Então a primeira coisa [...] é que o ensino fundamental avance mais, na
compreensão mesmo com as idéias centrais da Química e não só fazer, talvez,
aquela coisa mais genérica. E no Ensino Médio [...] a pergunta que eu faria seria a
seguinte: se o professor de Biologia, [...] tem lá o modelo chave-fechadura, tem o
morro, se além disso no terceiro ano, nós temos que pensar que tem que ser no
terceiro ano. Lamentavelmente nos temos que passar por cima do PEIES, não tem
como. [...]Teria que ser no terceiro ano. Todo mundo concorda? No primeiro ano é
difícil, vindo da oitava série, eu não imagino que a Citologia pudesse entrar lá. Eu
não acredito na possibilidade do aluno compreender. É a minha leitura. Agora no
terceiro ano, eu imagino uma professora dando aula de Biologia,[...] falando que
modelos, animações, ilustrações, tudo pode ajudar, desde que a gente nunca pense
que isso daí vai substituir a necessidade de abstrair, de sair do nível de pensar
numa coisa real. [...] (M9, 296)
Como já apontado no subcapítulo anterior, os ‘módulos interativos’ não pretendem
determinar metodologias para o ensino de CNT, mas, sim, contribuir para que professores e
licenciandos desenvolvam a atitude de um constante refletir, dialogar e estudar suas
concepções e práticas escolares vivenciadas. Isso mediante diálogos que envolvam
conhecimentos específicos, as diversas disciplinas da área, numa perspectiva inter-relacional,
como referido no Capítulo 3.
116
Defende-se também a valorização dos conhecimentos dos estudantes, produzidos no
contexto cotidiano para a sala de aula, permitindo inter-relações com os conhecimentos
científicos, nos processos de constituição de conhecimentos escolares significativos e
relevantes.
Os processos de formação de conceitos partem dos ‘outros’ e interferir
intencionalmente nos processos de ensino e de aprendizagem é de grande importância para os
sujeitos envolvidos. O papel do professor mediador, com suas intervenções pedagógicas
carregadas de intencionalidades, é essencial ao desenvolvimento dos sujeitos em contexto
escolar. É importante que ele considere noções próprias aos estudantes, valorizando os
conhecimentos no desenvolvimento de situações pedagógicas potencialmente favoráveis ao
desenvolvimento dos processos de conhecimento como sistemas de relação inerentes aos
esquemas conceituais em questão.
Aos professores cabe utilizar muitas palavras que tenham algum significado no
contexto de cada aula, com base em alguma das Ciências sobre a qual se está falando. Cabe ao
professor controlar os processos de produção dos sentidos aos significados. O sentido (com o
qual operam, próprio dos interlocutores) refere-se ao significado (concebido como sentido
mais estabilizado). Ele sempre está amarrado ao contexto conceitual. Ao proporcionar
sentidos para o aluno, é possível que este consiga desenvolver, evoluir no significado.
Percebe-se a necessidade de um nível de significação mais elevado. A assimetria conceitual
entre sujeitos que interagem orientados para um objeto de conhecimento, abordado sob
perspectivas diversas, conforme a visão que se adote sobre a participação do outro e o papel
da linguagem no processo de conhecimento, é fundamental para desencadear a significação
dos conceitos e a aprendizagem destes. Isso remete para a visão da complexidade dos
processos de mediação por parte do professor e de internalização por parte dos estudantes.
Smolka afirma que:
O fenômeno da ‘internalização’ (...) geralmente refere-se a uma esfera da atividade
particular do indivíduo, ou do movimento de aprendizagem em relação à realidade
física e cultural: relacionados a um conteúdo específico transmitido pelos outros;
concernentes à atividade prática partilhada; ou ainda dizendo respeito ao processo de
(re)construção interna e transformação das ações e operações (2000, p.28).
A partir da análise dos resultados apresentados neste capítulo, cabe destacar que
preocupações como as expressas e discutidas nos módulos podem ser relacionadas com o
postulado de Vigotski de que a internalização de conceitos, abstratos por natureza, é inerente
aos processos de constituição social do indivíduo. Por exemplo, as interações em aulas de
117
CNT podem se constituir em processos dialéticos de transformação por parte do indivíduo,
como referido no capítulo 3 desta dissertação. Isso reitera a visão da função essencial do
professor, no sentido de mediar processos de abstração e generalização requeridos pela
aprendizagem tipicamente escolar.
118
ALGUMAS CONSIDERAÇÕES
Resultados de pesquisa construídos e analisados neste trabalho indicam que
abordagens e discussões referentes ao ensino do conteúdo/conceito ‘energia’ possibilitadas
pelos ‘módulos interativos’ permitem importantes reflexões sobre formas inadequadas de
explicação do referido conteúdo/conceito no ensino de CNT. Inadequadas, no sentido de
incorrer em aprendizados superficiais, limitados ou até mesmo distorcidos relativamente às
Ciências. Os ‘módulos interativos’, ao possibilitarem tais reflexões, enriquecem os saberes
docentes, contribuindo, dessa forma, com a formação de professores para o ensino de CNT,
seja inicial ou continuada. Isso, especificamente, no que se refere aos processos de
significação conceitual, a partir de uma visibilidade de inadequações e/ou insuficiências das
abordagens, seja em aulas do EM ou da licenciatura.
Contribuições potenciais do trabalho referem-se, também, à compreensão de Ciência e
de conhecimento científico, do desenvolvimento histórico do ensino de Ciências no Brasil,
enfocando a perspectiva da contextualização. O olhar voltado às abordagens e compreensões
do conceito ‘energia’ no âmbito da pesquisa e na área científica reitera a potencialidade de
abordagens concernentes à significação conceitual do mesmo.
A partir de análises de abordagens do conceito em LD, articuladamente a análises dos
módulos, foi possível perceber que os sujeitos envolvidos na pesquisa, ao estabelecerem
interlocuções com outros sujeitos, foram tomando consciência de simplificações nas
abordagens sobre ‘energia’ nos LD e no contexto do ensino escolar. Foi possível, durante o
desenvolvimento dos ‘módulos interativos’, criar condições para que os sujeitos de pesquisa
reflitam acerca de abordagens do referido conceito no ensino de CNT.
A análise das discussões e reflexões dos sujeitos interativos acena para contribuições
ao ensino e à formação de professores de CNT, na medida em que permitem dirigir olhares
críticos para saberes, concepções, posturas e atitudes subjacentes ao ensino. Pode-se perceber
119
indícios de contraposição aos moldes de formação viciosamente pautados na tendência de
manter o status quo e, nesse sentido, contribuições da pesquisa relacionam-se ao desafio de
desenvolver uma formação docente atenta à complexidade dos processos de recontextualização didática dos conteúdos das Ciências na escola, na perspectiva da
(re)construção social de concepções/práticas.
Interações em espaços de formação de sujeitos que interagem sob condições nãosimétricas de interação social denotam propensão a influenciar, mais decisivamente, nos
processos re-construtivos da formação. Isso contribui para que professores em exercício e
futuros professores não venham a simplesmente conduzir suas aulas da maneira vivenciada
enquanto estudantes, e sim participar na produção das condições requeridas para a reforma
educativa, em seus próprios processos de construção.
Ou seja, resultados de pesquisa apresentados e analisados apontam para a necessidade
de compreender limitações de abordagens conceituais de ‘energia’ em LD utilizados durante o
desenvolvimento dos ‘módulos interativos’. Percebia-se uma maior conscientização sobre
limitações de determinadas abordagens, bem como, no sentido de o professor não vir a tomar
o LD como único orientador na apresentação dos conteúdos/conceitos. Melhorias no ensino
de CNT necessitam contemplar os LD, mas não apenas os mesmos, sendo importante usar
uma multiplicidade de fontes de informação, bem como outros recursos didáticos,
possibilitando o desenvolvimento de um ensino em CNT dinâmico e enriquecedor,
coerentemente com as OCNEM (BRASIL, 2006)
Cabe destacar que tais contribuições da pesquisa dizem respeito à especificidade dos
espaços de formação acompanhados, contando com a importante co-participação de
professores da Educação Básica. Compreender a amplitude e complexidade do ensino de
‘energia’ implica levar em consideração que a formação docente carece de abordagens,
discussões e reflexões acerca de objetos complexos de ensino cuja compreensão requer o
estabelecimento de relações de conceitos entre si, o que se acredita ter sido contemplado nos
espaços desenvolvidos e acompanhados.
Nessa perspectiva, cabe aos cursos de formação de professores, inicial ou continuado,
abrir espaços para discussões sobre fatores que limitam as práticas docentes, cerceadas ao
seguimento de um LD ou a concepções ultrapassadas, sem estabelecimento de relações dentro
e fora da área do conhecimento. Nesse sentido, referendam-se os ‘módulos interativos’
analisados, como potencializadores de melhorias na formação docente em CNT. Isso, na
medida em que os módulos abrem espaço para discussão de idéias, concepções e abordagens
conceituais, através de interações entre sujeitos.
120
Com as interações, ampliam-se as visões sobre a necessidade de ‘domínio’, por parte
dos professores, dos conteúdos a serem ensinados, o que contribui para reduzir dificuldades e
limitações na forma de ensinar conceitos/conteúdos complexos, a exemplo de ‘energia’.
Também, contribui na própria análise do que é possível ensinar ou não, no âmbito da área, no
EM, evitando-se incorrer em graus de abstração e de complexidade que dificilmente seriam
alcançados pelos estudantes, a exemplo da Energética Celular em Biologia, que é estudada na
1ª série do EM, nas escolas que seguem o currículo do PEIES. Defende-se que este conteúdo
seja estudado no 3º ano do EM, em conjunto com os conteúdos de Química.
Em resposta aos desafios que acompanham os processos de mudança das práticas
docentes na área de CNT, o trabalho aponta para possibilidades de promoção de um ensino
fundamentado numa (re)contextulização pedagógica e numa (re)significação conceitual
adequadas, relativamente às Ciências, o que implica saber lidar com dificuldades expressas
pelos estudantes, em seus processos de compreensão significativa de conceitos complexos,
que exigem graus de abstração, a exemplo do de ‘energia’. “Educar para a cidadania, sem
restringir a escola ao papel de preparação do indivíduo maleável e manipulável, é a grande
tarefa com que se defrontam hoje os professores de Ciências.” (KRASILCHIK, 2000, p.22).
Nesse sentido, novos estudos e pesquisas a serem feitos poderão considerar a crescente
importância de abordagens sobre o conceito ‘energia’ relativas, também, às implicações
sócio-ambientais que têm sido recorrentemente discutidas em âmbitos e contextos
diversificados, com repercussões na área de ensino de CNT.
Enfim, conclui-se este trabalho consciente de que não se trata de um fechamento
definitivo das abordagens e discussões. Cabe referendar a visão do professor de CNT como
um sujeito em permanente processo de formação, sistematicamente aberto para novos
conhecimentos e reflexões, valorizando conhecimentos diversificados, incluindo os dos
colegas que atuam em outras disciplinas, bem como os dos pesquisadores e dos estudantes;
um sujeito capaz de propiciar situações potencialmente facilitadoras da reconstrução de
significados de conceitos, bem como de esquemas conceituais, promovendo, assim,
aprendizados associados ao desenvolvimento humano/social, de forma mais rica e plena.
121
CORPUS – CONJUNTO DE DOCUMENTOS UTILIZADOS E ANALISADOS NA
PESQUISA
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127
ANEXOS
128
ANEXO I - PARECER CONSUBSTANCIADO DO COMITÊ DE ÉTICA
129
130
131
132
133
134
135
APÊNDICES
136
APÊNDICE I - MÓDULOS REALIZADOS NO PRESENTE PERÍODO
Módulos Assuntos
discutidos
vivenciais Período/
Ano
Módulo Colesterol ‘bom e ruim’, 2º sem.
presença
de
ferro
no 2006
1
organismo, respiração
1º sem.
Módulo
Respiração
2007
2
Módulo Produtos de higiene e limpeza 1º sem.
2007
3
Módulo Funcionamento da visão, 1º sem.
colóides, nanotecnologia e 2007
4
contração muscular
2º sem.
Módulo Os perigos da acidificação
dos oceanos
2007
5
Módulo Agentes
detergentes
6
surfactantes, 1º sem.
2008
1ºsem.
Módulo Escalas
2008
7
bioenergética 2º sem.
Módulo Respiração:
celular, enzimas e outros
2008
8
Módulo Enzimas
Enzimática
9
e
Catálise 1º sem.
2009
Módulo Enzimas
Enzimática.
10
e
Catálise 1º sem.
2009
Professores do
Ensino Médio
(PEM)
participantes*
Química Biológica 6
PEM
(3
II;
PEMQ e 3
Química
PEMB)
Bioquímica II
4
PEM
(3
Biologia
PEMB
e
1
PEMQ)
Seminário II
2 PEMQ
Química
Seminário V
3
PEM
(2
Química
PEMB
e
1
PEMQ)
Biologia;
4
PEM
(2
Química
PEMB
e
1
PEMQ, PMM)
Seminário II;
2
PEM
(1
Química
PEMB
e
1
PEMQ)
Seminário V,
2PEM (1PEMQ
Química
e 1PEMB)
Bioquímica II
2PEM (1PEMQ
Ciências Biológicas e 1PEMB)
e Química
Componente
curricular/
Curso
Bioquímica I
2PEM (1PEMQ
Ciências Biológicas e 1PEMB)
e Química
Seminário V
2PEM (1PEMQ
Química
e 1PEMB)
Dados relativos à execução dos Módulos no Projeto de Pesquisa "Interações Triádicas de
Licenciandos, Professores da Educação Básica e da Universidade em Espaços de Formação
para o Ensino em Ciências Naturais”, no qual meu projeto de pesquisa está inserido como
subprojeto.
137
APÊNDICE II
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
MÓDULO 8
Prezado (a) Senhor (a)
Estamos desenvolvendo duas pesquisas cujos títulos são: “Contribuições de
Abordagens Contextuais e Interdisciplinares do Conceito Energia em Ações de Formação
Docente Inicial em Biologia” e “Abordagens Representativas dos Modelos de Estruturas
Moleculares e Supramoleculares na Formação para o Ensino de Ciências: Inter-Relações em
Processos de (Re)Construção do Conhecimento Escolar”. Este trabalho é fruto de estudos do
curso em pós-graduação Mestrado em Educação nas Ciências na Universidade Regional do
Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul – UNIJUÍ e tem como objetivos produzir e
investigar interações, simultaneamente, de licenciandos com professores da educação básica e
da universidade, focalizando práticas de formação para o ensino de Ciências
Naturais/Biologia, em especial, quanto à contextualização e interdisciplinaridade no
desenvolvimento do conceito energia, bem como identificar e analisar abordagens em aulas
de Biologia e/ou Química da universidade, incluindo o uso de gravuras/imagens concernentes
a modelos representativos de estruturas moleculares e supramoleculares, com atenção,
também, aos livros didáticos de Química e Biologia do ensino médio.
A metodologia utilizada para a realização da pesquisa trata-se de uma pesquisa
qualitativa que abrange a análise de livros didáticos e o planejamento e desenvolvimento de
Módulos de interações triádicas (entre professores do ensino médio, da universidade e
licenciandos), com o registros (gravação) de falas dos sujeitos interativos em aulas da
Licenciatura. Também, serão planejados questionários e/ou entevistas com alguns sujeitos da
pesquisa a partir da análise de livros didáticos e dos Módulos transcritos e analisados. Fica
assegurado que os sujeitos envolvidos não incorrerão em nenhum risco advindo de sua
participação e poderão obter benefícios através do acesso aos resultados da pesquisa, no que
tange a avanços do conhecimento sobre os espaços alternativos de formação investigados.
Nós pesquisadoras garantimos que seu anonimato está assegurado e suas informações
serão tratadas com sigilo absoluto, podendo você ter acesso a elas e realizar qualquer
modificação no seu conteúdo, se julgar necessário. Você tem liberdade para recusar-se a
participar da pesquisa, ou desistir dela a qualquer momento sem que haja constrangimento,
podendo solicitar que suas informações sejam desconsideradas no estudo. Mesmo
138
participando do estudo poderá recusar-se a responder as perguntas ou a quaisquer outros
procedimentos que ocasionem constrangimento de qualquer natureza.
Está garantido que você não terá nenhum tipo de despesa financeira durante o
desenvolvimento da pesquisa, como também, nenhum constrangimento moral dela decorrente.
Nós, Sandra Maria Wirzbicki e Fábio André Sangiogo, bem como nossa orientadora
Lenir Basso Zanon assumimos toda e qualquer responsabilidade no decorrer da investigação e
garantimos que suas informações somente serão utilizadas para esta pesquisa, podendo os
resultados virem a ser publicados.
Se houver dúvidas quanto a sua participação poderá pedir esclarecimento a qualquer
um de nós, nos endereços e telefones abaixo:
Sandra Maria Wirzbicki, Rua Simão Hickembick, 813, Bairro Elizabeth, Ijuí, RS CEP
98700-000.E-mail: [email protected]. Fone: (55)9135-5403.
Fábio André Sangiogo, Rua Peri da Rosa, 66 Bairro São Geraldo, Ijuí, RS. E-mail:
[email protected]. Fone: (55)-9907-7064
Lenir Basso Zanon, Rua Dom Antônio Reis, nº 58, Bairro Elizabeth, Ijuí, RS CEP
98700-000. E-mail [email protected]. Seus telefones (55)3332-4466 (residencial) e
(55)9978-0081 (celular).
Ou a membros do Comitê de Ética em Pesquisa:
Comitê de Ética em Pesquisa da UNIJUÍ - Rua José Hickembick, 66 – Sala 3 - Prédio
da Reitoria - Caixa Postal 560 - Bairro São Geraldo, Ijuí/RS CEP 98700-000. Fone/fax (55)
3332-0301.
Eu,_______________________________________RG________________,
ciente das informações recebidas concordo em participar das pesquisas, autorizando-os
a utilizar as informações por mim concedidas e/ou os resultados alcançados.
O presente documento foi assinado em duas vias de igual teor, ficando uma com o
voluntário da pesquisa e outra com o pesquisador responsável.
_______________________
Local e Data
_______________________
Nome do entrevistado
_______________________
Nome do pesquisador
__________________________
Assinatura do entrevistado
__________________________
Assinatura do pesquisador 1
139
APÊNDICE III
ENTREVISTA SEMI-ESTRUTURADA SOBRE ENERGIA
1)
Você pode me dizer agora ou em outro momento, as publicações realizadas ao
longo do tempo, de alguma forma relacionadas ao conceito ‘energia’ no ensino e na
aprendizagem?
2)
Você fez graduação na grande área das Ciências Naturais ou História Natural,
enfim, na grande área de Biologia. Procure lembrar e expressar seu entendimento sobre o
conceito ‘energia’ ao concluir o curso de graduação?
a-
Explique melhor essa idéia que você está expressando, dê um exemplo, cite
alguma situação de aprendizagem (disciplina, conteúdo) ou alguma situação real, algum fato,
em que esse entendimento estaria envolvido)
b-
Ainda sobre o que estamos falando, faça um esforço por lembrar e expressar o
entendimento por exemplo sobre a relação entre a energia dos alimentos energéticos (doces,
amidos, gorduras,...) e, por um lado a necessidade do sol (fotossíntese) e por outro lado a
relação com a energia que mantém o organismo quando esses alimentos energéticos são
consumidos.
3)
Procure lembrar e expressar agora seu entendimento sobre o conceito ‘energia’
em outras fases da sua vida profissional (ensino médio profª de Biologia, formação
continuada de professores, na licenciatura) e nos estudos (mestrado e doutorado). O
entendimento há pouco expresso continuou o mesmo? Houve alguma mudança?
4)
Hoje qual o seu entendimento sobre o conceito ‘energia’?
5)
A partir de seus contatos com professores de escola, alunos da graduação e
mestrado, segundo sua percepção, quais as compreensões/concepções mais usuais do conceito
‘energia’? (Considere as áreas Biologia,Química e Física )
140
6)
O que você teria a dizer sobre como tem percebido a concepção do conceito de
‘energia’ no proposição e desenvolvimento de Situações de Estudo (EFA, Alimentos
Produção e Consumo, ou ao longo das edições das demais SEs.
7)
O que você diz sobre a forma como o conceito energia vem sendo abordado no
ensino Médio? O que deveria mudar na universidade?
8)
E em livros didáticos de Biologia do Ensino Médio?
9)
Como você vê possíveis relações entre a o significado conceitual de energia a
ser ensinado na escola e situações da vivência cotidiana? De que forma poderiam ser
contempladas relações com contextos cotidianos?
10)
Como vê a perspectiva da interdisciplinaridade no ensino e na aprendizagem
do conceito energia? (No ensino superior e médio)
11)
De que forma a compreensão do conceito energia diferencia-se nos âmbitos da
licenciatura e do Ensino Médio?
12)
Quais dificuldades estariam presentes ensino e na aprendizagem do conceito
energia?
13)
Quais experiências bem sucedidas são de seu conhecimento, no que tange ao
ensino e a aprendizagem do conceito energia?
14)
Quais sugestões ou proposições apresentaria para de alguma melhorar o ensino
e a aprendizagem do conceito energia?
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Sandra Maria Wirzbicki - Biblioteca Digital da UNIJUÍ