EDITORIAL
A
final, o que constitui o fascínio do novo, onde fazemos o exercício da
esperança? Ano Novo, velhas esperas? Feita a contabilidade do que
faltamos em cumprir (porque sempre ficamos devendo à nossa pretensiosa lista de ano novo), já nos lançamos a novas promessas para o ano
que se inicia; e porque não? Passar das queixas à narrativa do futuro já é
algo a ser comemorado. O problema é se ficarmos na espera que um novo
tempo traga um novo saber, mágico, que nos poupe o ato necessário para
que o novo apareça. Ato que é corte, com seu conseqüente preço de trabalho e luto.
Neste início de 2005, a APPOA renova sua mesa diretiva e sua presidência. Renovação necessária para que a aposta ética que fundou a instituição se reafirme e se re-invente, a partir das experiências que a vida associativa
foi produzindo nestes 15 anos de trabalho em comum. Ampliar aos membros
da APPOA a “experiência mesa”, que constitui o desafio de dirigir a instituição, reflexão conjunta e ato analílico, exercício de castração e redução de
onipotência em vez de reconhecimento imaginário de suficiência, é o que
concerne à instituição analítica em seu trabalho formativo.
Anunciamos também o eixo temático que norteará os eventos de ensino neste ano, proposta da comissão de ensino, acolhida e trabalhada pela
mesa diretiva: Narrativas em Psicanálise, que se inicia pela JORNADA DE
ABERTURA, nomeada “Reinventar-se em Análise”.
A seção temática deste número reúne textos que dão conta de alguns
dos efeitos de transmissão da psicanálise que a fundação da APPOA, há 15
anos, vem possibilitando através do trabalho de seus membros que residem
fora de Porto Alegre. Tempo e distância não impedem o exercício da ética
fundada no desejo.
C. da APPOA, Porto Alegre, n. 132, jan. 2005
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NOTÍCIAS
NOTÍCIAS
FESTA 15 ANOS DA APPOA
APPOA NO FÓRUM SOCIAL MUNDIAL
No dia 17 de dezembro, realizou-se na sede da APPOA o coquetel
comemorativo aos 15 anos de nossa associação. Num clima descontraído,
além de brindarmos acompanhados do excelente show da banda Choro Bandido, assistimos emocionados as imagens do multimídia que retratavam esta
trajetória.
Certamente, foi um momento muito especial, pois, resgatava-se a história de uma instituição que, através do empenho de seus associados, sustenta ao longo destes anos um espaço digno e singular de trabalhar a psicanálise. Trabalho que se materializa através de suas publicações e atividades
de ensino/transmissão e pela sensibilidade para apostar no diálogo com
outros campos do saber. Princípios que, por um lado, marcam a cidade de
Porto Alegre a medida que estamos cientes da importância de estarmos
atentos às questões que lhe dizem respeito, por outro, transcendem fronteiras, através das permanentes trocas estabelecidas com outras instituições
do país e internacionais.
As imagens do multimídia, somadas aos movimentos da festa, mostrava-nos, que embora tivéssemos diversos motivos para brindar, um em especial parecia-nos fundamental, a saber: o compromisso da APPOA com a
constante aposta no fomento e na manutenção dos laços de trabalho. A
presidente da associação, Maria Ângela Brasil, acompanhada de alguns
colegas que, ao longo destes anos também ocuparam este lugar – Robson
de Freitas Pereira, Ana Costa e Alfredo Jerusalinsky –, tiveram a sensibilidade de lembrar que nossa instituição surgiu pela reunião de psicanalistas de
diversas instituições, que acreditavam na importância de não sucumbirmos
aos riscos de demandar UMA referência de mestria. Abria-se, assim, a
perspetiva de constituir um espaço de trabalho que pudesse respeitar e suportar o singular tempo de formalização da produção de seus membros.
Portanto, estes 15 anos nos ensinaram a importância de estarmos
atentos e criativos mediante a imperiosa necessidade de regularmos “nossos coeficientes de visibilidade”, aceitando o constante desafio de engendrar
mecanismos de circulação da palavra.
Nos dias 27 e 28 de janeiro a APPOA estará participando do Fórum
Social Mundial através de duas oficinas organizadas em torno dos temas “a
masculinidade e suas representações” e “rupturas na adolescência: atualidades do mal-estar nos conflitos inter-geracionais”.
Na oficina sobre masculinidade serão propostas ao debate questões
relativas às diferentes configurações sociais encontradas nas famílias atuais, as diferentes formas de circulação social da sexualidade e dos corpos,
e a diferença entre os sexos. Cabe questionar, a partir da psicanálise, o
estatuto atual do imaginário, do simbólico e do real à luz da diferença. Buscando cercar a indagação sobre o lugar da masculinidade hoje, será lançada
a questão sobre qual o lugar da diferença na cultura atual. Os palestrantes
desta mesa serão: Edson L. André de Sousa, Inajara Amaral, Lucia Mees,
Marieta Rodrigues e Otavio Nunes.
A oficina sobre adolescência abordará a adolescência enquanto produtora de conflitos: na família, na escola, na sociedade. As expressões da
adolescência não passam desapercebidas pelo mal-estar geral produzido,
mas também por sustentar, em sua imagem, os ideais de autonomia e rebeldia de nossa cultura. Os sintomas e angústias na adolescência seriam conseqüências de infâncias mal-assistidas que não puderam contar com as
referências necessárias para chegarem a um bom termo? Ou seriam, antes,
expressões do mal-estar cultural a que os jovens dão corpo? Estas serão
algumas das questões abordadas por Ana Costa, Ana Laura Giongo, Ângela
Becker, Maria Cristina Poli e Miriam Debieux Rosa.
Ressaltamos que as datas, horários e locais das oficinas ainda não
foram confirmados. Os interessados devem informar-se na APPOA ou com a
organização do Fórum em data mais próxima ao evento.
C. da APPOA, Porto Alegre, n. 132, jan. 2005
C. da APPOA, Porto Alegre, n. 132, jan. 2005
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NOTÍCIAS
SEÇÃO TEMÁTICA
TRANSMISSÃO E FORMAÇÃO
REUNIÃO DO CARTEL PREPARATÓRIO
A discussão sobre o que é a formação analítica e como se dá a transmissão da psicanálise vendo sendo o eixo de trabalho do Cartel do Interior.
Sustentados pela idéia de que esta temática também diz respeito ao laço
associativo, pareceu-nos interessante propor à APPOA uma Jornada interna
sobre a questão da formação e da transmissão em psicanálise, idéia que foi
bem recebida pelos colegas da Mesa Diretiva e que vimos gestando com um
trabalho interno no Cartel nesse ano de 2004. Chegou a hora de alargar este
trabalho, compartilhá-lo com outros colegas, constituindo-se, para além deste
pequeno grupo, um cartel preparatório à Jornada Interna da Associação, que
será realizada em 14 de maio de 2005.
Para agilizar os trabalhos, o cartel preparatório se reunirá duas vezes
ao mês, alternandamente, na quinta antes da reunião da mesa diretiva fechada e numa sexta feira. As reuniões de janeiro de 2005 serão dia 06 às 19h30min
e dia 29 às 18h na APPOA. Na reunião do dia 06, além do levantamento
bibliográfico e das outras combinações acerca da jornada, estaremos discutindo o texto de Urânia Tourinho Peres “Sobre o Passe”, publicado nesta
edição do Correio.
Desejamos que o cartel preparatório possa convocar os colegas interessados a vir refletir e discutir a questão da formação e da transmissão, e
que seu efeito repercuta em trabalhos a serem compartilhados por ocasião
da Jornada.
Coordenação do Cartel
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C. da APPOA, Porto Alegre, n. 132, jan. 2005
O
Cartel do Interior tem se constituído como um fórum de interlocução
e produção para os colegas que, por residirem ou trabalharem fora
de Porto Alegre, não acompanham o dia a dia da Associação. No
último ano temos estudado, refletido e discutido a questão da formação analítica e da transmissão da psicanálise. Esta discussão tem se sustentado
basicamente por três vias: de um lado, pela leitura de textos que tratam do
tema; de outro, pela discussão e compartilhamento das vicissitudes da formação analítica em cidades fora dos grandes centros, as quais, muitas vezes, não possuem instituições psicanalíticas; e de um terceiro ainda, a partir
da vinda de colegas da APPOA que trouxeram suas contribuições sobre
estas questões, fazendo valer ali uma alteridade extremamente importante
para nós.
Manter aberta e ativa a discussão sobre o que é a formação psicanalítica e como se dá a transmissão da psicanálise, parece-nos crucial. Obviamente, esta não é uma preocupação exclusiva do Cartel do Interior, mas de
toda a Associação. Sustentados por esta idéia, pareceu-nos interessante
propor à APPOA uma Jornada Interna sobre a questão da formação e da
transmissão em psicanálise, idéia que foi bem recebida pelos colegas da
Mesa Diretiva e que temos elaborado no trabalho interno do Cartel nesse ano
de 2004. Assim, estamos constituindo um cartel preparatório à Jornada Interna da Associação, que será realizada em 14 de maio de 2005.
Nesse momento, em que recebemos em casa folhetos propagandeando
“formação” em psicanálise através de cursos oferecidos com inúmeros atrativos (promessas de acesso a uma profissão de muito prestígio e ganhos
financeiros, preços barateados na inscrição para quem arrebanhar outros
interessados, titulação de psicanalista ao fazer um cursinho de 2 ou 3 anos,
sem nenhuma menção à análise pessoal), o lugar de “psicanalista” passa a
ser garantido a priori, sem que o sujeito pague nenhum preço – a não ser, é
claro, o preço do curso! Tudo o que se propagandeia ali é o oposto da formação analítica e fere a ética da psicanálise. Por isto, mergulharmos na discussão sobre os pilares em que se sustenta o fazer do psicanalista e desde
onde ele se autoriza, mais do que nunca, é questão urgente. Assim, este
número do Correio traz alguns artigos com o objetivo de relançar o debate
sobre essa temática na Associação.
Clara Maria von Hohendorff
Ieda Prates da Silva
C. da APPOA, Porto Alegre, n. 132, jan. 2005
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SEÇÃO TEMÁTICA
SILVA, I. P. DA. O lugar da supervisão...
O LUGAR DA SUPERVISÃO NA FORMAÇÃO DO ANALISTA
Ieda Prates da Silva
“Da análise, há uma coisa que deve prevalecer, é que
há um saber que se retira do próprio sujeito... É do
tropeço, da ação fracassada, do sonho, do trabalho do
analisante que esse saber resulta. Esse saber que não
é suposto, ele é saber, saber caduco, migalhas de
saber, sobremigalhas de saber. É isso o inconsciente.”
Jacques Lacan
O Saber do Psicanalista
P
roponho aqui algumas reflexões iniciais sobre a questão da supervisão, tema ainda pouco explorado teoricamente e que começa a ser
debatido, no Cartel do Interior, em nossas discussões acerca da formação analítica e da transmissão da psicanálise. Parece-me que a questão
da análise, do lugar da instituição, do estudo e da produção teórica assumem um relevo maior, pelo menos nas produções escritas sobre o tema, do
que a questão da supervisão. Por isto, talvez, ao me lançar a pensar sobre
este aspecto da formação, a primeira sensação que tive é a de que me
faltavam elementos para produzir um texto: não tinha lido muito a respeito,
nem refletido ou discutido o suficiente para escrever. No entanto, algo me
instigava a fazê-lo, desde a minha experiência, desde meu percurso na psicanálise. Então, é por esta falta que me interrogo, e deixo que a pergunta
sobre o lugar da supervisão na formação do analista reverbere em mim, esperando que, ao compartilhar estas primeiras questões, o trabalho teórico
possa avançar.
A palavra supervisão, de acordo com o dicionário Aurélio, significa
“ação ou efeito de supervisar ou supervisionar; dirigir, orientar ou inspecionar
em plano superior”1. Não parece apropriada à prática, consagrada no meio
analítico, de um espaço privilegiado e particular de discussão clínica entre
dois colegas, sustentada por uma relação de transferência de trabalho, em
que o lugar de sujeito suposto saber, atribuído a alguém fora da cena analítica, possibilita um espaço terceiro entre analisante-analista. Supervisão, termo comumente utilizado no meio pedagógico com esse caráter de inspecionar, supervisar, dirigir e orientar a prática de um outro, ocupando o supervisor
um lugar de mestria numa posição de saber ou de poder (ou numa superposição de ambas), parece assim carregada de sentido superegóico. Esvaziar
a palavra deste sentido comum permite apontar para outras significações:
por exemplo, super-visão, no sentido de uma visão ampla, distanciada, “a
boa distância” que faz borda entre um dentro e um fora inseparáveis por um
lado, e inconciliáveis por outro. Se trata de garantir a função do terceiro.
A denominação utilizada em francês é controle (contrôle), palavra que
possui uma polissemia na língua francesa e um uso na psicanálise distintos
do que esta palavra significa entre nós brasileiros. Controle, em português,
diz respeito ao “ato ou poder de controlar; domínio, governo. Fiscalização
exercida sobre as atividades de pessoas, órgãos, departamentos, ou produtos, para que tais atividades ou produtos não desviem das normas preestabelecidas. ...Autodomínio físico e psíquico. Comedimento, moderação.”2 Portanto, controle, na nossa língua está, mais ainda do que a palavra supervisão,
imaginariamente tomada do lado normativo ou de domínio de um saber.
Didier-Weil3 toma a metáfora do controlador do trem, que aparece no
sonho de um analisante, para falar deste lugar que põe em causa o sujeito ali
onde ele vem falar de seu trabalho na clínica: ou seja, de seu trabalho em
transferência. Esse sonho do analisante que se cala frente ao controlador do
trem, na medida em que este o olha, e tal olhar o paralisa por se encontrar
sem a passagem, só adquire efeito significante na análise, no momento em
que, o analista, frente ao “controlador” com quem discutia o caso, põe em
causa seu próprio lugar de analista na transferência com este analisante.
2
1
Ferreira, Aurélio B. de H. Novo Dicionário da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro: Ed. Nova
Fronteira, 1975, p. 1339.
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C. da APPOA, Porto Alegre, n. 132, jan. 2005
Ibid, p. 377.
Didier-Weil, A. Inconsciente Freudiano e Transmissão da Psicanálise. Rio de Janeiro:
Jorge Zahar Ed., 1994.
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C. da APPOA, Porto Alegre, n. 132, jan. 2005
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SEÇÃO TEMÁTICA
Este mesmo autor alerta que há uma diferença “...se o desejo do
controlador é o de sustentar a instituição psicanalítica, ou se seu desejo é o
de criar analistas, então todos os jogos de engano são possíveis aí.”4 Referese a que se o desejo de produzir analista é o que comanda, o supervisionando poderá esforçar-se em corresponder ao objeto de desejo desse analista
supervisor. Serve aqui o alerta freudiano de abster-se do furor curandis, neste
caso, “furor supervisionandis”, para que o que se produza ali não seja da
ordem da impostura.
Urania Peres 5 corrobora esta visão do controle ou supervisão como
espaço de retomada do lugar terceiro em momentos de impasse no processo de uma análise: “Se o analisante tenta estabelecer uma relação dual e o
analista se angustia diante dessa possibilidade, cabe ao controle presentificar
a posição terceira. ...” (p.171) Retomando C. Hoffmann, esta autora lembra
que a posição do supervisor é equiparada ao lugar do auditor no chiste: “...O
chiste coloca o jogo de palavra e o não-senso ao abrigo da crítica da razão;
ele necessita de uma outra pessoa a quem se dirigir. ... O chiste é um
processo que acontece entre três pessoas: a primeira que fala, o ‘eu’, a
segunda sobre quem se fala, e a terceira que escuta. Assim, o chiste abala
a certeza do sentido e o domínio do julgamento do eu e confia ao Outro a
decisão de finalizar o trabalho do chiste.” (p. 172).
O chiste põe em evidência a estrutura mesma do inconsciente. Esta
parece ser a função da supervisão: manter aberta a escuta às formações do
inconsciente. Portanto não se trata da transmissão de um “bom modo de
fazer”, ou de um saber sobre a clínica. Também não se trata de uma identificação ao estilo de um outro analista, sustentado em transferência num lugar
de sujeito suposto-saber. Aliás, estilo não é algo que se possa copiar ou
imitar. Diz respeito à singularidade de cada um na sua posição frente à castração do Outro.
Sirvo-me novamente das palavras de Urania para destacar aquilo que
me parece essencial na supervisão analítica:
4
5
Ibid, p.178.
Peres, U. T. Mosaico de letras: Ensaios de psicanálise. São Paulo: Escuta, 1999.
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SILVA, I. P. DA. O lugar da supervisão...
“Não fazer economia de sua singularidade e deixar que surja um estilo
é também estar atento para a lei do desejo. Ocupar o lugar de psicanalista é
seguramente uma tarefa difícil, tendo em vista que estamos permanentemente confrontados com a questão do ser. Em nossa prática, ocupamos
uma posição de saber, um saber que nos é suposto, mas que, em verdade,
toca a nossa ignorância. É difícil pensar na existência de um psicanalista,
se não há desejo de saber; por isso mesmo operamos essa passagem de
um saber suposto para um saber possível de ser encontrado. Mais do que
aquele que não sabe, o psicanalista é aquele que procura o saber e, nessa
procura, ele necessita testemunhar, falar, fazer vínculo social a partir de um
trajeto solitário. Ele fala a um outro de um terceiro lugar, lá onde o saber se
situa. Para Lacan, essa procura de saber encontra na dimensão do equívoco
o lugar por excelência da sua permanência, pois é exatamente a possibilidade de libertação do sentido o que nos coloca sempre diante de um maisalém.”6
Portanto, a prática da supervisão não se configura como a busca de
uma compreensão total, de um entendimento, mas da confrontação com um
resto intransponível: o real da castração. A supervisão não elimina o lugar
solitário da posição do analista, nem tampouco a radicalidade da responsabilidade para com sua clínica. Mas produz um alargamento transferencial
que possibilita deslocamentos na escuta, operando efeitos de formação analítica. De certa maneira, na supervisão, falamos da clínica e, ao falar da
clínica, é nossa análise que fala ali. Não me parece que seja na posição de
analisante que falamos no espaço da supervisão, nem de analista, e sim
numa posição de deixar falar o analisante através de nós, através de nossa
transferência: dupla transferência, com o analisante e com o supervisor. Ou
seja, falamos desde um ponto de ignorância em relação ao saber inconsciente. É aí que o processo de análise e a prática de supervisão confluem,
produzindo efeitos de formação analítica.
Quero destacar ainda que o efeito de formação analítica a que me
refiro se dá tanto no lugar de supervisionando, quanto no lugar de supervisor.
6
Ibid, p.173.
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SEÇÃO TEMÁTICA
PERES, U. T. Sobre o passe.
SOBRE O PASSE
Para finalizar, retomo uma frase de Urania, que não encerra a questão, mas ao contrário, abre-a para novas produções:
“Fundamentalmente, para mim, a prática do controle, ou do falar entre
analistas, marca de forma precisa a sustentação da psicanálise.”7
Urania Tourinho Peres
Q
7
uando Lacan instituiu o passe em 1967, o fez com a intenção de
que essa poderia ser uma experiência que trouxesse um novo caminho para as crises institucionais que aconteciam em torno à didática, assim como pudesse inovar no campo da teoria. Dessa maneira,
houve da parte de Lacan uma grande expectativa tanto para a resolução de
impasses institucionais, como também, teóricos.
A constituição do procedimento do passe está diretamente ligada ao
desenvolvimento teórico dado por Lacan ao pensamento freudiano, e visava
acompanhar a sua idéia de que tanto instituição como teoria psicanalítica
necessitam de uma permanente inovação. No âmbito da teoria, a sua grande
invenção foi o conceito de objeto a e, no que se refere à formação do analista
e sua inserção institucional, o passe.
De Lacan já havia surgido a afirmativa de que o analista só se autoriza
por ele mesmo, a partir da qual o que se explicitava estava absolutamente de
acordo com Freud: colocar a análise pessoal no cerne da formação do analista.
A construção teórica de Freud realizou-se, sobretudo, tomando a experiência clínica como ponto de partida. Eram os pacientes que de alguma
maneira iam ditando os caminhos através dos quais a teoria deveria prosseguir. Freud lia no dizer do paciente o saber que ia dando corpo à teoria
psicanalítica. E, como ele mesmo recomendou, escutar cada caso como
novo, ou seja, permitir surpreender-se com o dizer do paciente, como algo
novo ainda não sabido. Surpreender-se movido por uma curiosidade de quem
se coloca frente ao inédito.
Lacan parte da teoria construída por Freud, procurando de alguma
maneira assimilá-la ao que então circulava como o pensamento de uma época. É nessa direção que ele sofre influências do estruturalismo, surrealismo,
do hegelianismo francês, de Heidegger e de muitos outros. Marca de uma
maneira explícita a influência de Clérambault como um mestre especial e, no
Ibid, p.173.
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SEÇÃO TEMÁTICA
final da vida, divide-se entre a poesia e a matemática como norteadores para
o desenvolvimento da psicanálise. Lacan, também como Freud, privilegia a
procura do novo saber em detrimento de um saber já constituído.
A transmissão da experiência clínica, em Lacan, foi realizada de uma
maneira distinta da de Freud. Ele não publicou historiais clínicos, limitou-se
a comentários dos casos clínicos de Freud e de fragmentos de análises de
outros analistas. Contudo, a força clínica de Lacan é inquestionável, é o que
nos testemunha a leitura do livro Quartier Lacan, organizado por Alain DidierWeill, Emil Weiss e Florence Gravas.1 Esse livro contém entrevistas com exanalisantes de Lacan e grandes discípulos, existindo uma quase unanimidade em falar da especial escuta e leitura do inconsciente realizada pelo psicanalista. São testemunhos da maior importância. Sem nenhuma dúvida, a
leitura desse livro, entre outros, nos mostra o Lacan clínico.
O passe é uma experiência centrada no depoimento, espera-se que
algo possa ser transmitido do momento singular em que cada um autorizouse analista, assim como do que foi ter vivido a experiência de uma análise. É
o testemunho dos efeitos de uma análise e do surgimento da função desejo
de analista. Assim sendo, o passe pode ser considerado como um lugar de
excelência para a transmissão da psicanálise e análise da clínica.
Lacan criou um dispositivo para fazer-se cargo dessa experiência:
passantes, passadores e um júri. Ele esperava que o relato dos passantes,
transmitido pelos passadores a um júri, pudesse produzir, por parte desse
último, uma inovação teórica. Contudo, não foi bem assim que aconteceu. À
medida que o depoimento do júri prendia-se, antes de tudo, a comprovar a
teoria existente, “o dispositivo de reconhecimento de desejo funcionou como
o de um desejo de reconhecimento”, como bem se expressa Esther Joly . É
nesta direção que podemos tomar a declaração de Lacan:
J’ai voulu avoir des témoignages, naturellement je n’en ai eu aucun,
des témoignages de comment ça se produisait.
PERES, U. T. Sobre o passe.
Bien entendu c’est un échec complet, cette passe. 2
A expectativa de Lacan centrava-se, pois, na possibilidade de transmissão de uma análise e, considerando a absoluta singularidade desse acontecer algo de novo, teria necessariamente que surgir a partir de cada depoimento. Não apenas a leitura do analista sobre o dizer do paciente, mas uma
aposta na possibilidade de transmissão do que foi ter passado pela experiência do inconsciente. Aqui reside a grande riqueza do passe, ou seja, o
enriquecimento da teoria analítica vem, não apenas da leitura que o analista
faz do desenrolar da análise de um analisante, mas da própria observação
que esse (o analisante) realiza de seu percurso analítico. Aqui quem fala é o
analisante. Porém, não apenas o seu relato, mas, sobretudo, a possibilidade
de transmissão da experiência. Creio que é ainda nessa direção que podemos tomar a afirmativa de Lacan de que, no momento em que proferia seus
seminários, colocava-se na posição de analisante.
Venho de uma recente experiência de passe que muito me fez pensar.
De início, retiro inteiramente a idéia de fracasso desse dispositivo, não apenas pela sua permanência em muitas escolas de psicanálise, assim como,
pela riqueza que me transmitiu, e que não teria ainda como dizê-la inteiramente nesse momento e espaço.
Posso apenas confirmar algumas das hipóteses que há algum tempo
me acompanham, de que o passe como Lacan o instituiu, ao final de análise
de um jovem analista, é bem distinto da experiência, quando vivida por um
analista com um largo período de experiência. Esse é o meu caso, considerando que tive meu primeiro paciente em análise no início da década de
oitenta. Assim sendo, ao relato da experiência da análise, o esforço de recordação do final de análise, já com um longo espaço de tempo desde o seu
acontecer, vem somar-se à experiência de analista e ao próprio processo de
análise que, no meu entender, acompanha o analista junto ao seu analisante.
Sobre essa segunda parte, quero esclarecer que, apesar do fim de análise
2
Didier-Weill, Alain – Weiss, Emil – Gravas, Florence – Quartier Lacan , Témoignages sur
Jacques Lacan. Denoel, L’Espace Analytique. 2001 Paris.
Lacan, Jacques Lettres de l’école n.23, pp 180-181.
“Eu quis ter testemunhos, naturalmente não obtive nenhum desses testemunhos de como
isso acontecia. É claro que é um fracasso total, este passe” (tradução da autora)
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PERES, U. T. Sobre o passe.
vivido por ocasião da própria análise, o analista, ao longo de sua vida de
analista nunca deixa de analisar-se. Esse percurso analítico que se efetua
nos diversos vínculos transferenciais com os pacientes, instituição e teoria
também conduz a um ponto de chegada, que propicia um momento de transmissão especial. Cheguei a denominar esse momento de “fim de analista”
em analogia a “fim de análise”, mas deixei de fazê-lo pelos equívocos que
permitiu.
Voltando ao passe. Sempre me chamou a atenção o fato de Lacan ter
retirado o passe dos “velhos analistas” da escola, nominando-os ele próprio,
assim como também dele se eximiu. Acredito que, para um júri que não
sofreu a experiência, torna-se difícil inovar, assim como suportar o indizível
que constitui o cerne dessa experiência.
O desenvolvimento que Alain Didier-Weill realiza no seu livro Os “Três
Tempos da Lei”, particularmente no capítulo “A questão do mandamento
siderante”, sobre o significante Verblüffung, empregado por Freud na interpretação do chiste e dos sonhos, pode ser bastante esclarecedora do que
se evidencia de uma maneira muito forte nessa passagem pelo passe. Fazendo um paralelo com o chiste, diria que o relato de uma análise pode
perfeitamente ocupar o lugar do ininteligível do chiste, do enigmático, incompreensível, produtor de sideração, Verblüffung. Freud, na tentativa de compreensão do chiste e do sonho, usa duas palavras, que foram traduzidas por
Marie Bonaparte, para o francês, por: sideração e luz. Quando a linguagem
produz uma passagem do sentido para o não sentido, fazendo então surgir o
ininteligível, Freud situa aí a sideração, Verblüffung. No chiste, o indivíduo ou
permanece neste ponto de gozo ou faz uma passagem, uma de-sideração,
para aceder “a luz do sentido”. Didier-Weill chama a atenção para o fato de
que de-sideração é a origem etimológica da palavra desejo, de-siderare. Essa
passagem da sideração à de-sideração pode ou não se efetuar, ou seja, o
sujeito do inconsciente pode, ou não, dizer sim a essa passagem, permiti-la
ou não.
A sideração está ligada ao espanto. No que se refere ao chiste, o
espanto surge do fato de que algo escapa ao entendimento, não se reduz ao
saber já constituído e “armazenado” pela memória, ou seja, um enigma apa-
rece. Necessariamente, somos levados a um segundo momento no qual,
dando-se conta de que nenhum saber pode preencher o furo que interrompe
a fala, um luto do que já se sabe se faz necessário para que possa advir o
que ainda não se sabe, ou seja, uma nova fala. A interrupção siderante tanto
pode ter um efeito paralisante como um efeito libertador, produtor de uma
nova fala. Não se deixar permanecer no adormecimento do bom senso.
“Assim, com a questão da Verblüffung, Freud descobre a função de
um significante que tem o poder de introduzir no discurso uma ruptura que se
oferece ao sujeito como um apelo injuntivo para que mude de discurso, para
que passe, usando esta contribuição fundamental de Lacan, do discurso
universitário – ao qual estamos todos habituados – ao discurso analítico”. 3
Por que tenho clareza que esse modelo teórico do chiste aplica-se ao
passe e o torna uma experiência analítica extremamente importante: ao tentar relatar a própria análise e seus efeitos, o passante tem duas possibilidades, ou deixar-se siderar, espantar-se com o non-sense de sua fala, ou cair
no recurso movido pela censura de transformá-la em um discurso de saber
acumulado, apelando para o já sabido da teoria, escapando, portanto, do
enigmático e incomunicável como uma verdadeira manifestação do inconsciente. Quando isso ocorre considero que há fracasso nesse primeiro momento do passe, na fala do passante. Se há resistência à censura, se essa é
evitada, naturalmente o que vai ocorrendo é a des-sideração onde o apelo é
feito ao desejo inconsciente. Existe por parte do passante um intenso trabalho de luto, de confrontação com o real, com o indizível a ser dito, bastante
distinto do final de análise e do próprio percurso analítico. Por outro lado, a
escuta do passador, ponto de maior importância no processo, tem, igualmente, que se sustentar na capacidade de suportar o espanto, como no
chiste ocupar o lugar da explosão do riso como manifestação do inconsciente. Há, então, possibilidade de transmissão. Caso contrário, o que irá ocorrer
é uma exigência superegóica de tudo transmitir pelo já sabido. Se o passa-
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3
Didier- Weill Os três Tempos da Lei , O mandamento siderante, a injunção do supereu e a
invocação musical. Jorge Zahar Editor 1997, Rio de janeiro. P.119/120.
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SEÇÃO TEMÁTICA
dor transmite, o júri pode fazer uma nova leitura do que até ele chegou, e a
nominação surge como reconhecimento dessa transmissão.
A experiência do passe é o lugar em que se vive o luto de um saber,
um enfrentamento com o real da castração. Distinto do final de análise, pois
não há destituição de um suposto saber, à medida que é um processo em
que o analista é confrontado consigo próprio e, assim sendo, volta sobre si
mesmo esse processo de destituição. É exatamente nesse ponto em que
ele pode verdadeiramente se abrir para a criação. Um liquidar de transferências, que agora se produz com a teoria, mas também, com a instituição
psicanalítica, permitindo-lhe, então, desfrutar desses vínculos com dessideração, ou seja, pela emergência do desejo inconsciente.
Por que Lacan disse que o passe fracassou? O aprisionamento da
censura não permitiu que um novo saber, que Lacan esperava que se rivalizasse com o seu, tivesse surgido. Assim, Lacan demonstrava ter ultrapassado o momento de sideração com suas próprias descobertas e aguardava a
luz de um novo saber.
Sei que o meu espaço para esse texto se esgota, mas quero ainda
levantar uma questão: a riqueza da experiência do passe inter-institucional,
como lugar onde podemos ficar livres das posições imaginárias que se cristalizam nas instituições a que pertencemos. Tive a oportunidade de passar
por essa experiência, na Escuela Freudiana de Buenos Aires, e agradeço a
eles terem me dado essa oportunidade, que considero importante na minha
vida de psicanalista.
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C. da APPOA, Porto Alegre, n. 132, jan. 2005
OLIVEIRA, L. F. L. DE. Imagem e semelhança...
IMAGEM E SEMELHANÇA
NA FORMAÇÃO EM PSICANÁLISE
Luis Fernando Lofrano de Oliveira
P
ara situar algumas questões na discussão concernente à formação
com base na qual os psicanalistas partem para o exercício de uma
prática no social, propomos tomar, de início, a própria psicanálise
como uma instituição. Segundo essa proposta, a psicanálise constitui-se
como uma instituição devido ao lugar que lhe é atribuído em nossa cultura.
Frente à expectativa social relativa a suas expressões nos meios culturais, a
psicanálise dispõe, enquanto instituição, certos lugares de reação individual.
A partir desses lugares e com base em uma formação apropriada, os psicanalistas vêm, por vezes, a encontrar pontos de apoio para o exercício de sua
prática. Interessa-nos pensar de que maneira a imagem e a semelhança
podem intermediar a definição desses lugares e a apropriação dessa formação.
Entendemos instituição como um contexto de ordem social resultante da diferenciação de certos lugares de manifestação individual. Trata-se,
aqui, dos lugares possíveis para a inserção de cada indivíduo no social. No
caso da psicanálise, o lugar que ela pode designar à manifestação de cada
psicanalista define-se na diferença para com o lugar dos demais.
Deixemos de lado, por ora, a difícil formulação das razões pelas quais
o lugar que a psicanálise designa para os seus no social requereria a
intermediação das instituições psicanalíticas. Essa formulação fica difícil se
quisermos pensar que uma instituição vem fazer função sobre outra: as psicanalíticas sobre a da psicanálise, por um lado, e, por outro, esta sobre
aquelas.
Em todo caso, queremos destacar a idéia que os contextos institucionais dão lugar a manifestações de caráter individual. Nesses contextos, a
manifestação de cada um resulta de seu posicionamento como indivíduo.
Para a manutenção da dimensão institucional, esse posicionamento não
comporta a divisão que caracteriza a subjetividade dos interessados. Estamos
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SEÇÃO TEMÁTICA
OLIVEIRA, L. F. L. DE. Imagem e semelhança...
chamando de indivíduo, aqui, aquele que se apresenta no social sem divisão.
Destacamos, assim, que a participação institucional requer uma suspensão
da condição subjetiva. Mediante tal suspensão, cada um participa em contextos sociais a título de indivíduo.
Tomando a psicanálise como uma instituição, e desconsiderando, por
ora, questões relativas às instituições psicanalíticas – relativas à incidência
de uma instituição sobre outra –, estamos propondo considerar como formação em psicanálise o conjunto dos fatores que propiciam a suspensão da
subjetividade de alguém. Essa suspensão nos parece uma condição para
que esse alguém chegue a ponto de tomar assento no trem da história da
psicanálise.
E como se sustenta essa suspensão? Pensamos que as possibilidades de um posicionamento individual definem-se com base em referências
que, como o indivíduo, não comportam divisão. Seguimos a hipótese de que
a suspensão da condição subjetiva, e da divisão que a caracteriza, se apóia
em referenciais que encontram suporte na imagem e na semelhança. Nesse
sentido, seria próprio dos contextos institucionais dar vigência a referências
que ganhem valor de imagem e que encontrem apoio em função do semelhante.
Evocamos imagem e semelhança pelo seu caráter unitário; pelo fato
de não comportarem divisão. As noções de imagem e de semelhante trazem
consigo a da unidade que as constitui como tais. É neste sentido que as
tomamos em nossas considerações.
No que concerne à noção de imagem, estamos nos referindo às idéias com base nas quais chegamos a constituir algumas certezas. A posição
individual a partir da qual se constituem essas certezas vem corresponder ao
caráter unitário das imagens sobre as quais ela se apóia. Ao nosso ver, a
teorização em psicanálise compõe um conjunto dessas imagens. Os contextos institucionais seriam, nesse sentido, ideais para o desenvolvimento
dessa teorização.
Semelhante, aqui, quer designar o parceiro de instituição. Ou seja,
aquele em cujas reações cada interessado numa instituição trata de encontrar suporte para a afirmação própria. O semelhante encontra-se, assim, em
posição individual face aos demais. A idéia é essa: o semelhante não está
dividido. Ao entrar em divisão, ele deixa, aos nossos olhos, o estatuto de
semelhante. Ele falará, então, em nome próprio, mesmo a partir do seu interesse pela instituição. De certa maneira, ele encontra na instituição o apoio
que lhe permite deixar sua condição individual e se lançar numa prática pela
qual ele próprio virá a responder. O contexto institucional consiste, assim,
com suas bases de imagem e semelhança, no fundamento para a apropriação de uma formação.
Imagem e semelhança podem consistir como suporte para a iniciativa
de alguém no campo da psicanálise, sobretudo, pela sua insuficiência. Ou
seja, o afazer dos psicanalistas, voltado à condição subjetiva de quem os
procura, requer deles um passo a mais, próprio, a ser dado sem garantias
prévias ou alheias. Consideramos esse passo a mais, dado por intermediação
de imagem e de semelhança, como a apropriação de uma formação.
Essas imagens são as formas que ganham contornos definidos aos
olhos de outrem em posição de semelhante e de cuja desfiguração pode
advir a produção de um sentido. Os semelhantes são aqueles que não questionam a base incerta e unitária do posicionamento dos demais durante o
tempo da constituição de sua formação. Sobretudo porque cada semelhante
conta, em contexto instituído, tanto com a insuficiência do suporte unitário e
da posição individual dos demais, como com a incerteza dela decorrente,
para desencadear sua iniciativa própria.
Cabe às instituições, no caso das psicanalíticas, conter as hesitações e as possibilidades de antecipação da certeza dos que fazem parte
delas. Elas promovem, assim, as possibilidades de formação. Aos psicanalistas cabe, em sua prática, a responsabilidade de uma autoria, com o risco
próprio de quem deixa uma posição individual. Eles contam, para isso, com
as instituições.
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SEÇÃO TEMÁTICA
HOHENDORFF, C. M VON. Psicanálise e mídia...
PSICANÁLISE E MÍDIA: UMA RELAÇÃO IMPROVÁVEL?
psicanálise tem sido constantemente solicitada pela mídia para dar
seu parecer, leia-se explicar, sobre o comportamento humano nos
mais variados contextos e circunstâncias. Nos meios de comunicação, a presença da psicanálise tem sido expressiva e variada. Contudo, isso
não significa que a relação entre a psicanálise e a mídia seja harmoniosa e
que o discurso psicanalítico esteja sempre presente. A psicanálise perde
sua especificidade quando os analistas assumem a posição normativa, preventiva ou prescritiva que a mídia lhes pede reiteradamente. O que se pede
aos psicanalistas “não é que intervenham sobre o discurso do senso comum
fazendo surgir um efeito de estranhamento capaz de, como na clínica demover
as certezas tão caras ao neurótico. O que a mídia solicita é a legitimação de
um Freud explica que consolide, com o prestígio recém conquistado do saber
psicanalítico, as formas ideológicas do senso comum”. (Khel, 1996, p. 109).
Na mídia, certamente não se trata de trabalhar o “osso duro” dos conceitos psicanalíticos, para tal existem as instituições. Mas como fazer para
não abrir mão da subversão do discurso psicanalítico? “A apresentação da
psicanálise ao mundo é crucial, antes de mais nada, pelos efeitos possíveis
do discurso psicanalítico na polis, efeitos que constituem as condições sociais da sua prática.”(Ata de Fundação da APPOA, 1990) Será possível pensar numa difusão que não cobre o preço de uma deterioração da experiência
psicanalítica?
Lacan estabelece uma relação íntima entre a psicanálise em extensão e a psicanálise em intensão, onde o mais vivo da experiência psicanalítica é o sustentáculo de qualquer apresentação da psicanálise ao mundo
(Ata de fundação, 1990). Para pensarmos a relação da psicanálise com a
mídia é necessário situar as características dos meios de comunicação de
massa. A comunicação de massa é um tipo especial de comunicação que
pode ser qualificada de acordo com a experiência comunicadora e a natureza da audiência.
Na comunicação de massa, as mensagens não são endereçadas a
ninguém em particular. A audiência é heterogênea e anônima, tendo como
público pessoas de qualquer idade e de todas as camadas sociais. Ela é
rápida, sintética e objetiva porque as mensagens são feitas para atingir
grandes audiências em tempo relativamente curto. Também é transitória,
pois a intenção é de que as mensagens sejam consumidas imediatamente
(Beltrão e Quirino, 1986).
São identificadas como funções básicas da comunicação de massa
ações como: informar, transmitindo dados para o conhecimento dos indivíduos e propagando a cultura; persuadir, fornecendo argumentos capazes de
mudar a opinião e orientar a conduta do receptor; e divertir, oferecendo recursos para o entretenimento e a distração das pessoas (Beltrão e Quirino,
1986).
Como podemos ver, o anonimato da comunicação de massa vai na
contramão da experiência psicanalítica. A mídia tem o poder de impor seus
pressupostos e sua própria percepção aos mais crédulos. O “meio é a mensagem” (Macluham, 1969), porque é o meio que configura e controla a proporção e a forma das ações e associações humanas. Como o meio é a
mensagem, fazer uma palestra e dar uma entrevista na TV sobre o mesmo
assunto não são a mesma coisa e não tem o mesmo efeito de transmissão
e/ou difusão.
Barros (1996) trabalha as diferentes formas de transmissão e de difusão através de três exemplos bastante esclarecedores: a peste, a propaganda e a psicanálise.
A peste se transmite mas também se difunde. Os epidemiologistas
criam curvas de freqüência e mapas para conhecer os pontos de concentração e dispersão da doença. Esse conhecimento não ajuda quem transmite
a peste nem que é contaminado, mas ajuda a dar parâmetros simbólicos
dentro do discurso científico para a peste além das significações sociais que
uma peste pode ter.
A propaganda é um outro caso de difusão, onde o que importa é a
repetição exaustiva de uma afirmação ou slogan até funcionarem como meros signos que determinarão um comportamento quase automático de con-
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Clara Maria von Hohendorff
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SEÇÃO TEMÁTICA
HOHENDORFF, C. M VON. Psicanálise e mídia...
sumo, muito próximo da obediência hipnótica. Este é um outro caso da
exclusão do sujeito.
A psicanálise também se transmite e se difunde, mas exige a inclusão do sujeito, a tal ponto que podemos dizer que sua difusão é eticamente
dependente da sua transmissão, o que não é o caso nem da epidemia e nem
da propaganda: “na epidemia, a transmissão se dá no real e o saber capaz
de abordar a difusão é estranho ao sujeito, e, na propaganda, a transmissão
se dá por um mandato super egóico e a difusão tem a estrutura dos fenômenos de massa” (Barros, 1996, p.211).
A passagem do individual ao coletivo produzida pela mídia remete
facilmente a massificação. Quando o psicanalista está muito embuido do
furor explicativo, que tem como interlocutor o sujeito da consciência, ele se
afasta da possibilidade da difusão psicanalítica. Pois “difundir a psicanálise
é tocar nos problemas cruciais de uma determinada comunidade de linguagem, é tocar nos nós discursivos em que a subjetividade e o social se articulam em torno de um real inapreensível, delimitado por um consenso discursivo
mínimo necessário, sem o qual irrompe o caos.” (Betts, 2003, p.88)
Em 1974, a televisão francesa decidiu fazer um programa sobre Jacques
Lacan. Esta entrevista está transcrita no livro “Televisão”, (Jacques
Lacan,1993). No início da entrevista, Lacan faz um comentário que permite
pressupor que foi sugerido a ele que levasse em conta que estava falando na
televisão e que portanto adequasse sua fala ao vasto público telespectador.
Lacan deixa a entender que fracassou em tentar “falar para que idiotas me
compreendam”. Coloca esse fracasso como tendo sido bem-sucedido, “pois
não há diferença entre a televisão e o público diante do qual falo há algum
tempo, o que chamam de meu seminário.” (Lacan, 1993, p.11).
Na passagem ao meio de comunicação de massa, podemos constar
que Lacan não poupou o telespectador/interlocutor. Quem já teve acesso ao
livro “Televisão” sabe como o texto da entrevista é denso. “A experiência
prova, mesmo limitando-se ao tropel, prova que o que eu digo interessa a
bem mais gente do que aqueles que, com alguma razão suponho analistas.
Porque então, falaria eu aqui em um tom distinto do de meu seminário?”
(Lacan, 1993,p.12)
Penso que o que vale situar aqui é que Lacan optou por estabelecer/
pressupor uma interlocução, pois quem fala para todos, não fala para ninguém em particular. “O mais vivo da experiência psicanalítica se transmite
no ensino e na difusão quando a fala de quem transmite encontra um verdadeiro interlocutor, isto, é quando o passe do mais vivo da experiência analítica de quem fala encontra no outro uma escuta que interroga a ambos no
aprés-coup, produzindo efeitos de divisão subjetiva.” (Betts 2003, p. 89).
Nos primórdios, quando a psicanálise ainda não estava difundida na
cultura, cabia ao próprio Freud apresentá-la a seus pacientes antes de
iniciar o tratamento. Hoje em dia a difusão da psicanálise passa também
pela mídia, com as vantagens e mazelas inerentes a cada meio de comunicação. A mídia tem uma dinâmica própria de funcionamento que merece ser
um pouco mais conhecida nas suas possibilidades e limites. Salvo exceções, os psicanalistas estão pouco acostumados a lidar com ela. Constatamos que o que a psicanálise tem a dizer sobre o laços discursivos e seus
efeitos, muita vezes se perde ou se dilui na pressão dos sessenta segundos para resposta ou no número preestabelecido de linhas de uma coluna.
Barros (1996) propõe que a difusão da psicanálise não se limite ao
corpo teórico da doutrina, mas que seja uma difusão psicanalítica da psicanálise. “Uma difusão psicanalítica da psicanálise seria aquela que visa a não
reproduzir a estrutura dos grupos convencionais”(Barros, 1996, p.213) ou do
discurso do senso comum. Talvez possamos pensar que uma difusão psicanalítica da psicanálise seria a subversão do “Freud explica” pelo “Freud
implica”.
C. da APPOA, Porto Alegre, n. 132, jan. 2005
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
BOLETIM da Associação Psicanalítica de Porto Alegre. Ata de fundação, Porto
Alegre, ano I, n. 1, março de 1990.
BARROS, Romildo do Rego. Ética: a psicanálise e sua transmissão. In: Ètica,
psicanálise e sua transmissão/Maria Inês França(org.) Petrópolis, RJ: Vozes,1996.
BELTRÃO, Luiz; QUIRINO, Newton de Oliveira. Subsídios para uma teoria da
comunicação de massa. 2ed. São Paulo: Summus, 1986.
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SEÇÃO TEMÁTICA
FOGUEL, E. S. Da neurose de transferência...
DA NEUROSE DE TRANSFERÊNCIA
À TRANSFERÊNCIA DE TRABALHO*
BETTS, Jaime. A direção da transmissão em psicanálise passes e impasses na
formação do analista. In: Revista da Associação Psicanalítica de Porto Alegre.
Nº 25, 2003.
KEHL, Maria Rita. Psicanálise, ética e política. In: Ètica, psicanálise e sua transmissão/Maria Inês França(org.) Petrópolis, RJ:Vozes,1996.
LACAN, Jacques. Televisão. Rio de janeiro: Jorge Zahar Ed., 1993.
MCLUHAN, Marshall. Os meios de comunicação como extensões do homem.
São Paulo: Cultrix, 1969.
Elaine Starosta Foguel* *
“A partir do ano de 1902, certo número de jovens médicos reuniuse em torno de mim com a intenção expressa de aprender, praticar
e difundir o conhecimento da psicanálise. [...] O pequeno círculo
logo se ampliou e, no transcorrer dos cinco anos seguintes muitas
vezes mudou de composição. [...] Houve apenas duas circunstâncias inauspiciosas que terminaram por me afastar internamente do
grupo. Não consegui estabelecer entre os seus membros as relações amistosas que devem prevalecer entre os homens que se
acham empenhados no mesmo trabalho difícil, nem consegui evitar a competição pela prioridade a que dá margem, com tanta freqüência, esse tipo de trabalho em equipe. 1
O
folder deste congresso faz um forte alerta aos analistas ao apontar
da instituição analítica...o pior. Isso evidencia, além do desejo de
debater, a angústia em que vivem todos aqueles que cuidam, com
rigor e carinho, do campo psicanalítico. Angústia justificada, pois são tempos difíceis.
Nas instituições, as questões da transmissão da psicanálise e da
formação do analista se colocam num “campo contaminado”, o que já nos
adverte: é uma operação delicada, “infectada” pela neurose de transferência
das análises dos candidatos a psicanalistas.
Vejamos: no Seminário “Os escritos técnicos de Freud”2, Lacan propõe um esquema ótico onde, no lugar do espelho plano, há um vidro transparente. O que ocorre? Ele responde: “Vocês se vêem no vidro e vêem os
*
Trabalho apresentado na Jornada do Círculo Psicanalítico de Salvador.
Psicanalista, Salvador, Bahia.
1
Freud, 1914, p. 36.
2
Lacan, 1953-1954, p. 165.
**
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objetos além. Trata-se justamente disto – de uma coincidência entre certas
imagens e o real”, os objetos reais estão no mesmo lugar que o objeto imaginário, que foi libidinizado, que se tornou desejável.
Este esquema mostra três situações que Freud denominou de regressivas: 1) o sonho, com a satisfação alucinatória de desejo; 2) o apaixonamento,
que Freud compara a um enloquecimento, 3) a transferência, onde a mesma
captação narcísica ocorre na análise, de forma automática, [...] na medida
em que a sessão analítica liberta a palavra das amarras do ideal do eu,
levando o analisante a uma projeção “narcísica máxima”.
Lacan introduz aqui uma importante distinção: esta é a transferência
imaginária que faz agir o eu ideal. Só depois a transferência simbólica poderá se constituir, mas isto demanda um tempo de análise para cada um. As
operações de falta, a construção do fantasma, e a queda do sujeito suposto
saber no fim do tratamento estarão em jogo neste processo singular. E isso
é assim, em cada análise.
No entanto, o quadro descrito faz parte da estrutura da formação dos
analistas. Está no dia a dia das escolas. Vem do real que nos causa, um a
um. Uma parte do trabalho feito nos grupos deriva deste amor imaginário,
mas não é aconselhável que se ergam estruturas institucionais nestas bases: os efeitos que a regressão narcísica máxima de vários pode produzir
num grupo não são propícios à almejada construção de saber que é a causa
mesma da reunião institucional. Ler textos dificílimos, pesquisar, reler, resumir, reler, apresentar trabalhos, debater, reler; articular, escrever. Devemos
nos lembrar que, à dificuldade da teoria, soma-se a dor do texto, a angústia
que ele pode provocar no leitor.
Não é simples, e não é fácil conviver na instituição com os tempos de
projeção narcísica máxima de cada um, nem para os analisantes; nem para
os analistas; nem para os outros membros, que, por sua vez, estão em
algum ponto de suas análises, ou já as concluíram. E a questão não se
resolve na base da compreensão coletiva do fenômeno, mesmo porque a
compreensão é imaginária e instável.
Então, o que fazer com isso, que é real, que é cotidiano, que é estrutural, para que se preserve o trabalho da transmissão e a formação do psica-
nalista? Em outras palavras, como restringir ao máximo a neurose de transferência ao dispositivo analítico e esclarecer que a escola se faz em torno da
transferência de trabalho com a escritura psicanalítica? É legítimo que a
instituição almeje esta passagem, ou dependerá única e exclusivamente da
direção que o tratamento de cada um tomar?
Tomo a questão por um outro viés: não é possível calcular, pois isso
não está geralmente esclarecido de antemão, o que cada um deseja quando
demanda ingressar num grupo de estudos numa instituição de psicanálise;
se é para ler e estudar, se é para ouvir outros participantes, se é para contemplar o analista, se é para ser contemplado com o olhar do analista, se é
para observar a pessoa do analista, se é para gozar de sua própria inibição
em relação ao texto, se é para buscar uma completude imaginária de pertencer a um grupo, se é para ter o nome escrito numa lista, se é a soma de
algumas destas coisas ou, mesmo, todas juntas.
O panorama se complica, pois a idéia é que a instituição sustente o
trabalho de percurso de seus membros.
O longo trajeto do ensino de Lacan demonstrou, na crítica constante à
Associação Internacional de Psicanálise, que a prática da autorização do
psicanalista pela instituição não possui sustentação ética; na proposição de
9 de outubro de 1967 ele profere o que seria a pedra fundamental das instituições lacanianas de psicanálise: “Primeiro, um princípio: o psicanalista só se
autoriza por si mesmo.” Em seguida faz a ligação desta autorização com a
Escola: “Isto não exclui que a Escola garanta que um analista depende de
sua formação”. 3
É uma subversão que denuncia que nenhuma modalidade institucional,
nenhuma análise didática, pode garantir que alguém ocupe o lugar de analista ao final de sua análise.
O autorizar-se por si próprio, que devolve a cada um o enfrentamento
com seu desejo, também deu lugar a que se interpretasse rapidamente que
cada um faz percurso de acordo com seu próprio desejo, o que pode ser
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3
Lacan, 1967, p.29.
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problemático no que se refere ao acompanhamento da construção da obra
freudiana e lacaniana. Se, por um lado, a ética do desejo é tudo o que temos,
é o que nos move, por outro o desejo não é um conceito unívoco, e que tem
que ser qualificado.
O desejo, para Freud, é o que há de mais subversivo no humano: ele
é inconsciente, infantil, perverso, polimorfo, insatisfeito, divide o aparelho
psíquico, ultrapassa o eu, desconcerta.
O grafo do desejo desenvolvido por Lacan estabelece a estrutura alienada do desejo. A psicanálise afeta a relação do sujeito com o desejo no
sentido de implicá-lo em sua estrutura. Porém, haverá um tempo de estranha-mento, de recrudescimento do sintoma, de sintomas transitórios, de
angústia, enfim, justamente as situações nas quais Freud recomendava ao
analisante que não tomasse decisões importantes, isso é, o desejo estaria
comprometido, e deveria ser posto em suspensão.
Então, paradoxo: por um lado, a ética do desejo como verdade do
sujeito é o que dirige o fazer analítico e é o que legitima o analista no seu
percurso; por outro lado, a confrontação com a estrutura do desejo durante a
análise provoca angústia em vários graus. Então, qual o desejo que pode
mover o fazer institucional, isto é, um desejo que seja a verdade de cada um
e de mais de um ao mesmo tempo, e que funcione mais além e apesar dos
efeitos da neurose de transferência? Existe tal estrutura desejante?
No Seminário da Ética (1960), Lacan enuncia a idéia do desejo do
analista, onde o complemento nominal “do analista” vai introduzir na teoria a
dimensão de um desejo prevenido (désir averti): “O que o analista tem a dar,
contrariamente ao parceiro do amor, é o que a mais linda noiva do mundo não
pode ultrapassar, ou seja, o que ele tem. E, o que ele tem, nada mais é do
que seu desejo, como o analisado, com a diferença de que é um desejo
prevenido. O que pode ser tal desejo, propriamente falando, o desejo do
analista? Desde já, podemos no entanto dizer o que ele não pode ser. Ele
não pode desejar o impossível.”4
Dizer que no lugar do analista o desejo não pode tender ao impossível,
é dizer que a castração impede o psicanalista de gozar nesse lugar; pressupõe uma longa psicanálise por parte do psicanalista. Não deixa de ser uma
releitura da regra de abstinência que o gênio de Freud tão cedo sacou como
condição sine qua non no dispositivo analítico. “Advertido” pressupõe que o
analista pague com sua pessoa, “[...] pela transferência ele é literalmente
des-possuído dela. 5
Mas atenção, tanto a abstinência quanto o desejo do analista são
produtos do trabalho da psicanálise de cada um, não são deliberações da
vontade própria do ego.
A idéia “desejo do analista” será retomada em outros seminários. Na
aula final do seminário “Os quatro conceitos fundamentais da psicanálise”,
em 24 de junho de 1964, Lacan diz que a sustentação do desejo do analista
evita que o tratamento tome o caminho de uma identificação do analisante
com o analista; o desejo do analista é o desejo de obter uma diferença
absoluta, isto é, de poder sustentar uma cura visando a singularidade do
desejo do analisante. Na Proposição de 9 de outubro de 1967, o desejo do
analista se estrutura na destituição subjetiva do final de análise. Lacan o
descreve assim: “[...] o que se percebe é que a tomada do desejo não é mais
que a de um des-ser.” 6
De que maneira o desejo do analista pode se articular com o fazer
institucional? Através da posição ética que está implicada na instituição.
Para garantir a vigência do desejo prevenido também na instituição, Lacan
propõe três dispositivos: o cartel, o gradus e o passe.
O cartel é uma estrutura grupal de no máximo cinco pessoas que se
reúnem em torno de uma tarefa comum, cada um com seu próprio projeto,
um plano de trabalho de acordo com sua singularidade, e da qual cada membro dará para a instituição uma prova escrita do trabalho. Finda a tarefa, o
cartel se dissolve e os membros se reorganizam em outros grupos. O cartel
5
4
Lacan, 1960, p. 360.
28
6
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Idem, p.249.
Lacan, 1967, p. 38.
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é o modo de implicar cada um na sua formação, fazendo barra ao gozo
descrito acima e impedindo que a estrutura do sujeito suposto ao saber
paralise o trabalho de alguns.
Como dispositivo, o cartel não é apenas mais uma modalidade didática entre outras. Ele determina uma estrutura do funcionamento da instituição, independentemente de haver outras formas de estudo, como os seminários coordenados, a apresentação de casos clínicos, as jornadas em torno de um tema, os congressos. O resultado de cada grupo assim organizado é uma rede complexa de construção de saber e de escritura.
Como dispositivo, Lacan institui, em 1967, que o cartel tivesse um
caráter de obrigatoriedade apenas para os que pleiteiem ser membros da
escola; esta estrutura de funcionamento proporciona que cada um tenha um
plano de trabalho cuja responsabilidade lhe cabe. É muito provável que o
imperativo de produção de uma escritura neutralize o imperativo do G (A) que
inibe a aproximação ao texto. O cartel esclarece a função da instituição: um
compromisso com o significante, com a letra. A instituição seria então uma
sociedade científica? Não, pois a psicanálise não se inscreve no discurso do
mestre, e nem da universidade. Se assim fosse, não haveria tanta polêmica,
pois nestas não se lida com o impossível da relação sexual que dirige o
princípio de qualquer interpretação e separa o nosso campo do da religião. A
não existência do Outro do Outro nos coloca fora da garantia de nosso ato
de analistas. Porém, não ser uma sociedade científica não demite a escola
de psicanálise de seu compromisso.
O outro dispositivo, os gradus, na escola proposta por ele em 1967,
eram dois: Analista Membro da Escola e Analista da Escola e têm sido alvo
de críticas de alguns, e defesa de outros. Temos exemplos de escolas que
fizeram um mau uso deste dispositivo, outras que não adotaram este dispositivo, e outras ainda onde é aplicado sem que se transforme numa hierarquia sagrada, onde só os mesmos têm o título e todo poder ao longo dos
anos. O gradus não é descrito como uma hierarquia funcional, mas não se
sabe de grupos organizados sem hierarquia. E aí entra outro paradoxo: a não
utilização de algum dispositivo de gradus provoca a hierarquia centralizada
dentro da instituição, hierarquia determinada por duas vertentes: a neurose
de transferência ao sujeito suposto saber, e a necessidade imaginária de
líder. Questão aberta a ser pensada e deliberada em cada grupo.
Outro dispositivo que Lacan propõe é o passe, que resultou em desvios sérios da ética analítica na escola por ele fundada. Diante deste
significante, muitos analistas tremem, como se estivessem na presença do
demo personificado, talvez com razão. Será, então, que temos que recalcar
a proposta de Lacan? Ou temos que fazer uma análise e repensá-la? Ainda
há futuro para o passe?
Não é boa prática eliminarmos o demoníaco, condenando o passe e
fechando a questão, pois o diabo reaparece sob as mais belas formas, como
Cazotte descreveu no Diabo Amoroso. Ao rechaçarmos para fora do discurso o significante “passe”, estamos negando a questão do reconhecimento
do analista, que vai reaparecer no real, como já começou a ocorrer: na França, através dos órgãos governamentais da saúde e seguridade social. Em
nosso país, a regulamentação da psicanálise por poderes da União veio nos
surpreender a todos. Os seguros de saúde privados também querem saber
quem são os analistas e, no Brasil, nunca incluíram os analistas leigos;
além disso, as igrejas querem se incluir entre as instituições formadoras.
Isto revela que, por mais indignados que estejamos, devemos admitir que
estamos recebendo nossa mensagem do Outro sob forma invertida: a dificuldade de reconhecer quem é psicanalista é do campo psicanalítico. Desde o
início.
Se é certo que a autorização se faz com o verbo reflexivo, o reconhecimento, por sua vez, vem do Outro, vem da “civilização”, recolocando questões de mal estar que, por isso mesmo, devem ser avaliadas. Quando Lacan
disse que seu dispositivo do passe foi um fracasso, a praxis do reconhecimento ficou mais uma vez para ser discutida , o que a torna mais pesada. A
questão está longe de estar fechada.
Em síntese, na proposta de Lacan, os três dispositivos, cartel, gradus,
passe, que aparecem em textos diferentes, trabalham juntos na tentativa de
assegurar, respectivamente, o percurso através da transferência de trabalho, a estrutura de escola, e o reconhecimento. Enodam de forma borromeana
as questões da formação que devem ser regidas pela ética do desejo do
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SEÇÃO DEBATES
MARIANI, B. Imaginário lingüístico...
analista.
É claro e certo para os psicanalistas que não há tratamento analítico
sem o dispositivo psicanalítico inventado por Freud e suas analisantes. Da
mesma forma, as instituições não cumprem seu papel sem que haja dispositivos claros compartilhados pela comunidade de analistas que a integram,
e onde o desejo do analista possa trilhar um percurso, que aí sim, será de
cada um.
Não há ilusões de que os dispositivos, os de Lacan, ou outros que se
inventem, possam eliminar completamente o mal estar nos grupos e as
incidências do real de cada um na escola de psicanálise; não obstante,
como toda lei consentida, o dispositivo estruturado no desejo do analista e
na transferência de trabalho, é uma borda ao gozo do A.
BIBLIOGRAFIA
CAZOTTE, Jacques. O diabo amoroso. In: O Deus odioso: psicanálise e representação do mal, Marcio Peter de Souza Leite. São Paulo: Escuta, 1991.
FREUD, Sigmund. (1914) A história do movimento psicanalítico. In: Edição
Standard Brasileira das Obras completas psicológicas de S. Freud. Rio de
janeiro: Imago, 1974. Vol. XIV.
LACAN, Jacques. O seminário - livro 1: Os escritos técnicos de Freud.. Rio de
Janeiro: Jorge Zahar Editores, 1979.
LACAN, Jacques. O seminário - livro 5: As formações do inconsciente (1957 1958). Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editores, 1999.
LACAN, Jacques. O seminário - livro 7: A ética da psicanálise (1959 -1960). Rio
de Janeiro: Jorge Zahar Editores, 1988.
LACAN, Jacques. O seminário - livro 11: Os quatro conceitos fundamentais da
psicanálise (1964). Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editores, 1979.
LACAN, Jacques. Proposição de 9 de outubro de 1967. Letra Freudiana, Documentos para uma Escola. Rio de Janeiro, n.1.
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IMAGINÁRIO LINGÜÍSTICO:
ANÁLISE DO DISCURSO E PSICANÁLISE 1
Bethania Mariani2
O
bjetivo discutir um conceito usado por M. Pêcheux em Semântica e
Discurso (1988): “imaginário lingüístico (corpo verbal), ou seja, a
rede de paráfrases e reformulações características de uma formação discursiva”. Nesse corpo verbal, resultado do funcionamento do esquecimento número 2 encobrindo o esquecimento número 13, encontram-se os
efeitos do inconsciente e da ideologia na constituição do sujeito pelo simbólico. Para Pêcheux, um estudo que considere esta questão permitirá delimitar a enunciação de um ponto de vista ainda não considerado pela lingüística, ou seja, permitirá que se teorize “um correspondente lingüístico do imaginário e do ego freudianos.” ( Pêcheux, 1988, p. 175 a 177)
Em síntese, é no imaginário lingüístico que o sujeito encontra refúgio,
enquanto ilusão necessária de sua unidade.
1. SINGULARIDADES E CONEXÕES
Pêcheux estabelece o discurso como objeto de uma disciplina de
entremeio, cujo objetivo maior é estabelecer uma reflexão sobre sujeito e
sobre funcionamentos lingüístico-históricos, visando uma compreensão da
interpelação ideológica constitutiva da produção de sentidos nos sujeitos. O
conceito de sujeito em questão remete também para o sujeito dividido da
psicanálise, ou seja, um sujeito como efeito de linguagem, falado pelo in1
Por motivos alheios à nossa vontade esse texto não foi incluído no Correio da APPOA n°
131, “Psicanálise, lingüística e análise do discurso”.
2
Professora, pesquisadora da Universidade Federal Fluminense e CNPq.
3
Tais esquecimentos resultam de um tecido de “evidências subjetivas”: “evidências da
existência espontânea do sujeito como origem ou causa de si”. O esquecimento número 1
aponta para a ilusão do sujeito de ser origem do que diz; o esquecimento número 2 remete
para a ilusão do sujeito em controlar o que diz. Amabas apontam para uma autonomia do
sujeito, aspecto fundamental para as filosofias idealistas, porém bastante constestado por
Pêcheux, Lacan, Althusser e outros intelectuais do século XX. (Pêcheux, 1975, pg. 173)
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SEÇÃO DEBATES
MARIANI, B. Imaginário lingüístico...
consciente. Citando Lacan – “só há causa daquilo que falha” –, Pêcheux dirá
que a categoria de sujeito da análise do discurso deve considerar essa causa [do que falha], na medida em que ela se “manifesta” incessantemente e
sob mil formas (o lapso, o ato falho, etc.) no próprio sujeito, pois os traços
inconscientes do significante não são jamais “apagados” ou “esquecidos”,
mas trabalham, sem se deslocar, na pulsação sentido/non sens do sujeito
dividido.
Para a análise do discurso, inconsciente e ideologia encontram-se
materialmente ligados na ordem significante da língua. Pêcheux particulariza: “a ordem do inconsciente não coincide com a da ideologia, o recalque
não se identifica nem com o assujeitamento nem com a repressão, mas isso
não significa que a ideologia deva ser pensada sem referência ao registro
inconsciente.” (Pêcheux, 1988, pg 301)
Em seu retorno a Freud, Lacan mostrará que o inconsciente é a manifestação de um saber desconhecido e não familiar para o sujeito, “um sentido não antecipável, irredutível e irreconciliável”. Em suma, algo totalmente
sem substância, impensável, inabordável. “O inconsciente”, diz Lacan, “é
uma parte que falta à disposição do sujeito para restabelecer a continuidade
de seu discurso consciente”.(Lacan, 1988, pg. 260)
Lacan trabalha o sujeito como efeito de linguagem, enquanto que
Pêcheux, retomando Althusser, irá colocar, inicialmente, o efeito-sujeito como
questão central em seu trabalho, que incorpora o histórico-ideológico como
constitutivo da materialidade significante.
Pêcheux trabalha a história como lugar contraditório em que se materializam os equívocos, pontos que afetam a univocidade lingüística do sujeito, levando o sujeito ao encontro do real histórico. “A irrupção do equívoco”,
diz Pêcheux, “afeta o real da história (...) o equívoco aparece como o ponto
onde o impossível (lingüístico) vem se conjugar à contradição (histórica); o
ponto onde a língua toca a história.” (Pêcheux, 1981, pg 62). Para a Análise
do Discurso interessam as posições discursivas ocupadas pelo sujeito para
ter a ilusão de ser sujeito do que diz em condições histórico-ideológicas
determinadas. Um dizer inscrito nas representações imaginárias que os sujeitos constituem face às suas condições materiais de existência, represen-
tações essas que vão se naturalizando na história. Um dizer historicamente
circunscrito às redes de paráfrases, substituições metafóricas e encadeamentos constitutivos dos processos de produção dos sentidos inerentes às
formações discursivas e que garantem um efeito de literalidade para as representações imaginárias.
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2. SIGNIFICANTE E SENTIDO
Segundo Pêcheux, o sujeito, quando diz “eu” (“moi”), o faz a partir de
sua inscrição no simbólico e inserido em uma relação imaginária com a
“realidade” do que lhe é dado a ser, agir, pensar. Tal relação estabelecida
com a “realidade” é da ordem do imaginário, algo que se produz após a
entrada do sujeito no simbólico e impede que o sujeito perceba ou reconheça sua constituição pelo Outro, ou seja, o sujeito não percebe que se encontra convocado a se colocar no simbólico e partir do simbólico para dizer
“eu” e para se referir a um mundo já simbolizado. Ora, o que se tem aqui,
como já foi dito, é uma anterioridade do simbólico produzindo o assujeitamento do sujeito ao campo da linguagem, ou, dizendo de outra maneira, o
que se tem é uma dependência do sujeito ao significante. Importa realçar
nesse momento da reflexão que, tanto para a psicanálise quanto para a
análise do discurso, o sujeito não é um a priori: o que se coloca como ponto
de partida é o Outro, ou seja, a o Outro da linguagem e da historicidade
(memória).
Para Lacan, em função da importância concedida à inscrição do sujeito na linguagem, torna-se fundamental a retomada do que a lingüística
discerniu como objeto: a língua como sistema de (valores) signos constituídos por significados e significantes. Diz Lacan em sua releitura de
Saussure:
“... o significante, por sua natureza, sempre se antecipa ao sentido,
desdobrando como que adiante dele sua dimensão. (...) Donde se pode dizer
que é na cadeia do significante que o sentido insiste, mas que nenhum dos
elementos da cadeia consiste na significação de que ele é capaz nesse
momento. Impõe-se, portanto, a noção de um deslizamento incessante do
significado sob o significante...”( Lacan, op. cit., p. 505 e 506.)
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SEÇÃO DEBATES
MARIANI, B. Imaginário lingüístico...
Em outras palavras, sem significantes não há sujeito, e, ao mesmo
tempo, o sujeito advém representado nesses significantes que o constituem.
Para haver sujeito há que haver uma inscrição do significante.
O inconsciente é marcado pela inscrição do significante. E mais, o
assujeitamento à ordem significante aponta para o que a psicanálise lacaniana
insiste em afirmar: inconsciente e linguagem têm a mesma estrutura, ou
ainda, o inconsciente funciona como uma linguagem, à moda de uma linguagem. Nessa definição conjunta de sujeito e significante, compreende-se que
a entrada do sujeito no simbólico, na linguagem, se constitui simultaneamente à perda do objeto. Por outro lado, ao falar, ou melhor, ao usar das
palavras, dentre elas o “eu”, o sujeito se mostra em sua inserção na história
e, simultaneamente, em um percurso já feito na língua, nesse deslizar de
significados sob os significantes.
Para Pêcheux, o assujeitamente à linguagem não se realiza fora do
ideológico, ou, mais precisamente, fora da identificação sofrida pelo sujeito à
formação discursiva na qual ele se constitui, embora essa identificação-interpelação se encontre recalcada.
À psicanálise interessa o funcionamento inconsciente do sujeito, em
situação transferencial, que aponta para a estruturação da sua neurose. Para
a análise do discurso, porém, a supremacia do significante sobre o significado deve ser compreendida em referência a uma dada formação discursiva
“determinada por seu exterior específico”. Esse é um “processo radicalmente ocultado (recalcado) para o sujeito-falante que está sob a dominância
dessa formação discursiva.” (Pêcheux, op. Cit., pg. 168) Discursivamente,
supor que os significantes estão relacionados às formações discursivas é o
que permite operar metodologicamente a naturalização dos sentidos. São
significantes cujos sentidos estão vinculados a uma formação discursiva e
se mostram já-lá, como evidências para um sujeito.
No domínio discursivo, interessam tanto as falhas na ordem da língua
quanto o modo específico de construção de uma linearidade ‘narrativa’. É a
análise da(s) posição(ões) discursiva(s) inscrita(s) em uma produção textual
qualquer, com sua ordem, organização e falhas peculiares que interessa(m)
ao analista do discurso. O que o sujeito diz, seja lá como for, diz dentro da
História. O que falha na prática discursiva do sujeito, o que derrapa nessa
prática, também é algo que se dá dentro da História. E é por isso que produz
sentido. As falhas na ordem significante se realizam em condições de produção determinadas, são o resultado do funcionamento da língua em relação
ao inconsciente e à ideologia.
A produção de sentidos se dá na relação do funcionamento da língua
com o funcionamento do inconsciente e da história. O acesso à ordem da
língua, em sua materialidade, só é possível se concebemos essa materialidade sendo afetada pela materialidade da história. Os significantes estariam, assim, materialmente afetados pela história.
Interessa à Análise do Discurso compreender o processo de
assujeitamento ao Outro em termos do modo de inscrição da interpelação
pela ideologia (na história). Discursivamente, o sujeito é uma posição em
movimento histórico: os lugares de onde fala constituem o que diz, mas isso
não é transparente para o sujeito. O sujeito significa já afetado pelo Outro
sem se dar conta do processo de retomadas e mudanças das significações
no qual se encontra.
Em outras palavras, a análise do discurso quer compreender os gestos de interpretação: como alguns significantes “tomam corpo” na História,
prendem-se a sentidos e se tornam signos para uma dada posição-sujeito
de onde um sujeito enuncia em determinadas condições de produção, já
interpelado pela ideologia, já falado pelo Outro. É o que nos diz Pêcheux
sobre o sujeito:
“Podemos agora precisar que a interpelação do indivíduo em sujeito
de seu discurso se efetua pela identificação (do sujeito) com a formação
discursiva que o domina (isto é, na qual ele é constituído como sujeito): essa
identificação, fundadora da unidade (imaginária) do sujeito, apóia-se no fato
de que os elementos do interdiscurso (sob sua dupla forma, descrita mais
acima, enquanto “pré-construído” e “processo de sustentação”) que constituem, no discurso do sujeito, os traços daquilo que o determina, são re-inscritos no discurso do próprio sujeito.” (Pêcheux, 1988, p. 163)
Nessa formulação de Pêcheux, deve-se dizer que o “recalque inconsciente e o assujeitamento ideológico estão materialmente ligados, sem es-
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tar confundidos, no interior do que se poderia designar como processo do
Significante na interpelação e na identificação (…).” (Pêcheux, 1988, pg.
133) Isso não quer dizer, porém, que nos significantes que constituem o
sujeito já se encontrariam traços de um sociologismo ou de uma marca
cultural exterior e determinante ou qualquer coisa semelhante. O que se
pode depreender dessas formulações é que a instância ideológica, enquanto
processo histórico e lingüístico responsável pela naturalização dos sentidos,
se faz presente na produção discursiva do sujeito tanto quanto as marcas do
modo como tomou forma a sua estrutura neurótica.
3. SUJEITO E IMAGINÁRIO LINGÜÍSTICO
Ao enunciar “eu” (ou seu nome próprio) o sujeito já se encontra
assujeitado, mostra uma inserção na língua que é, também, uma inserção
na história enquanto processo de produção de sentidos. No domínio
discursivo, o processo de constituição do sujeito também supõe um
assujeitamento à ordem significante: a questão da significação não vem em
primeiro plano, mas vem sim junto com a possibilidade da inscrição da ordem significante numa dada formação discursiva, aquela em relação à qual o
sujeito se identificará.
Em termos discursivos, aquele que diz ‘eu’, como sujeito, não se
percebe preso em uma rede de linguagem, rede essa que o constituiu em
uma posição-sujeito antes de mais nada. O sujeito “sofre” os efeitos da interpelação-identificação ficando preso às evidências constituídas na própria linguagem: julga-se fonte dos próprios pensamentos, origem do próprio dizer,
julga-se capaz de dominar o seu dizer, julga-se livre para dizer o que quiser,
etc. Pêcheux, em sua filiação ao pensamento lacaniano de que um significante
representa o sujeito para outro significante, dirá: é no processo do significante
“que está a questão do sujeito como processo (de representação) interior do
não-sujeito constituído pela rede de significantes.” (Pêcheux, 1988, pg. 157)
O assujeitamento ao jogo dos significantes se faz na relação da língua com a história. E nesse caso, a produção de sentidos se encontra inscrita nessa rede de significantes “encarnados” historicamente, sofrendo os
efeitos da tensão constitutiva do funcionamento da linguagem entre a pará-
frase – as repetições do já dito antes e em outro lugar – e a polissemia – os
deslocamentos, os deslizamentos do dizer – ambas determinadas pelo inconsciente e pela ideologia. E aqui, a determinação dos sentidos em termos
históricos (e inconscientes) não deve ser entendida como uma cristalização
eterna. Por outro lado, a menção à história (e ao inconsciente) em relação ao
funcionamento da linguagem aponta justamente para o fato de que se há
repetição é porque também há (possibilidade de) mudança.
Encontra-se materialmente constituído na linguagem o vínculo do
sujeito à formação discursiva que o domina, vínculo esse concebido por
Pêcheux como “identificação simbólica”, ou seja, identificação a determinados significantes na linguagem, significantes constitutivos do sujeito como
efeito. Na identificação simbólica estão inscritas as representações verbais,
ou seja, o resultado do efeito do assujeitamento a uma dada formação
discursiva. As representações verbais vinculam-se entre si em função dos
processos de reformulação parafrástica inerentes às formações discursivas.
E, como efeito de haver sentido, essas representações verbais produzem
uma consistência imaginária para o sujeito, ou seja, ficam impregnadas de
evidências. Essa consistência imaginária só pode ser concebida porque já
há um remetimento ao simbólico, ao campo do Outro. Só é possível falar em
imaginário, na perspectiva discursiva, com recurso ao simbólico, ao inconsciente e à ideologia.
É nesse ponto de sua exposição que Pêcheux introduz duas questões: a enunciação e o imaginário lingüístico (corpo verbal). Há que se teorizar
sobre a enunciação levando em consideração “um correspondente lingüístico
do imaginário e do ego freudianos: o corpo verbal que toma posição em um
termo (modalidades, aspectos, etc.) e em um espaço (localização,
determinantes, etc.) que sejam o tempo e o espaço imaginários do sujeitofalante.” (Pêcheux, op. cit., pg 176)
Tal perspectiva se afasta do ponto de vista estritamente lingüístico, já
que para a lingüística, a partir de Benveniste, a enunciação porta apenas as
marcas da presença do sujeito na língua, as marcas do “eu’. Um sujeito “eu”/ moi-imaginário que, como já foi dito, se supõe indiviso e que pode desempenhar diferentes “papéis” lingüísticos.
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Criticando a lingüística e colocando a unidade do sujeito em questão,
Pêcheux retoma da psicanálise a diferença entre o sujeito (“je”) enquanto
efeito do inconsciente, representado pelo significante e o sujeito (“moi”) que
se perde no engano de se julgar como unidade. A cada falha, a cada lapso
cometido – marcas dessa divisão inconsciente – o sujeito imaginariamente
se reconstrói como unidade, e isso se marca na linguagem. Trata-se de algo
fugaz, não previsível, não controlável e que de algum modo mostra para o
sujeito (moi) a sua falta e a incompletude do simbólico. Algo que imediatamente é resgatado, imaginariamente consertado por essa instância do sujeito centrado (moi), que se representa (necessariamente) como unidade indivisa.
Essa instância do sujeito centrado, totalmente consciente, imerso na
ilusão de ser fonte ou origem, se sustenta, como nos lembra P. Henry, na
linearidade do discurso comum, na sintaxe enquanto nível de organização
das relações entre as frases. Ele se sustenta nessa linearidade que o reconstrói imaginariamente, mas é afetado pelo real da língua sem cessar.
O sujeito da enunciação está presente como falta, embora haja um
sujeito do enunciado marcado sintaticamente e extremamente preocupado
em ter êxito na sua tarefa “comunicativa. Ora, quanto mais assujeitado ao
Outro, mais o sujeito se empenha em ter êxito no domínio das posições
discursivas presentes nesse seu discurso comum. Ao dizer “eu” desse lugar
imaginário e identificado à formação discursiva que o domina, o sujeito materializa sua inserção na história, mostra um percurso de sentidos na língua e,
ao mesmo tempo, se coloca a mercê do jogo dos significantes.
Pensar o imaginário lingüístico é, então, considerar que o não dito
precede e domina o dizer, por um lado, e que a interpelação ideológica supõe
a inserção no Estado. Mas essa já é uma outra história.
ORLANDI, Eni P. Interpretação. Petrópolis: Vozes, 1996.
ORLANDI, Eni P. Língua e conhecimento lingüístico. São Paulo: Cortez Editora,
2002.
PÊCHEUX, Michel. Semântica e discurso; uma crítica à afirmação do óbvio. Campinas: editora da Unicamp, 1988.
PÊCHEUX, Michel. La langue introuvable. Pairs: Maspero, 1981.
Referências Bibliográficas
LACAN, Jaques. Escritos. Rio de Janeiro: Zahar, 1998.
LE GAUFEY, Guy. L’incomplétude du symbolique; de René Descartes à Jacques
Lacan. Paris: EPEL, 1996.
OLGIVIE, Bertrand. Lacan, a formação do conceito de sujeito. Rio de Janeiro:
Zahar, 1988.
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RESENHA
RESENHA
FRAGMENTOS DO OLHAR EM UM
NARRADOR INCERTO
PEREIRA, Lucia Serrano. Um narrador incerto: entre o
estranho e o familiar: a ficção machadiana na psicanálise. Rio de Janeiro: Companhia de Freud, 2004. 105p.
V
ivemos muitas contradições, mas num
ponto gostamos de fincar pé: precisamos
sempre de certezas, não importa o preço a pagar. E o elemento que mais provoca nossa dúvida é o olhar. Essa é uma das abordagens
de “Um narrador incerto: entre o estranho e o
familiar. A ficção machadiana na psicanálise”,
de Lucia Pereira. Poderia dizer que se trata de
um livro sobre “Dom Casmurro” – o clássico personagem de Machado de
Assis que muda de interpretação conforme se atravessam as décadas. A
clássica narrativa de Machado conta memórias do personagem Bento Santiago – o Bentinho – que se imaginava traído por sua mulher – Capitu – com
seu melhor amigo. No entanto – como a própria autora reconhece ao final –
seu livro tem por eixo condutor o tema do olhar: seus desvios, sua obliqüidade,
para tomar alguns de seus termos. Isso não está antecipado em seu projeto,
foi se constituindo na própria escrita. O olhar é um tema que merece o trato
sutil e preciso que lhe é dado ali. Essa sutileza permite transpor a onipresença
que ele adquire em nossa organização social. Pensamos dominar nossa
submissão ao olhar do outro nas constantes exposições a que nos submetemos (vide os espetáculos BB da TV). No entanto, isso somente encobre a
condição em que somos presas desse olhar. Para abordar essa captura
Lucia se vale dessa grande ficção de Machado de Assis.
O livro divide-se em três partes: na primeira, uma atenção especial à
psicanálise, em como Freud toma o tema do estranho da literatura, do conto
de Hoffmann O homem de areia. O estranho tem como peculiaridade os
momentos em que o olhar surge em sua face de angústia. Como quando
temos um estranhamento com a própria imagem no espelho. A literatura é
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pródiga em ficcionar essa faceta humana, sempre a abordando pelo tema do
“duplo”. Isso está bem explorado por Chico Buarque, em seu Budapeste,
onde o personagem encontra uma série de “duplos”: os textos que são escritos para outros, o seu duplo de outro país, a outra língua, outra mulher, etc.
Assim, com o estranho Lucia vai levando-nos pelas sutis diferenças que se
expressam pelo olhar: seja como jogo de posição (olhar/ ser olhado), seja
pelos jogos de linguagem. É por meio destes últimos que a autora vai tecendo um fio narrativo – uma “constelação”. Também é pela constelação que ela
faz dialogar Walter Benjamin e Machado. É assim que a narrativa nos carrega de detalhe a detalhe, sem que precisemos saber aonde vai nos levar.
Esse estilo vai ser justificado por Lucia em seu terceiro capítulo, no dizer de
que o pensamento não se dissocia da linguagem “que a obra inventa para se
pensar” (Rousset). É deste diálogo com a literatura que lhe vem o título
“narrador incerto”, como sendo aquele que faz duvidar, que transmite múltiplos olhares.
Lucia Pereira atualiza para nós a obra de Machado não somente como
referência literária. Ela acrescenta à psicanálise dois “detalhes” do olhar que
não são quaisquer: os olhos de ressaca e a obliqüidade do olhar. Do primeiro, temos o testemunho da devastação da paixão do personagem Bentinho,
tragado pelas ondas da ressaca do olhar de Capitu, numa das mais belas
narrativas da literatura. Na obliqüidade, o véu da fantasia: a roupagem que
relança o desejo sempre mais além. Nas duas referências, o olhar é o próprio objeto, subtraído de uma mulher que se perde. Aí o tema da narrativa,
feito sempre por aproximação. Nesse sentido Lucia procede como Machado, capturando-nos sem que percebamos.
Ana Costa
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AGENDA
JANEIRO – 2005
Dia
06, 13,
20 e 27
05 e 24
06, 13,
20 e 21
07 e 21
14
10
Hora
19h30min
Local
Sede da APPOA
Atividade
Reunião da Comissão de Eventos
20h30min
21h
Sede da APPOA
Sede da APPOA
Reunião da Comissão do Correio da APPOA
Reunião da Mesa Diretiva – FECHADA
8h30min
15h30min
20h30min
Sede da APPOA
Sede da APPOA
Sede da APPOA
Reunião da Comissão de Aperiódicos
Reunião da Comissão da Revista da APPOA
Reunião do Serviço de Atendimento Clínico
CALENDÁRIO DE EVENTOS – 2005
Dia
Hora
02 de
9h às 18h
abril
14 de
9h às 18h
maio
05 à 07 9h às 18h
de maio
03 à 05 9h às 14h
de junho
02 de
9h às18h
julho
21 e 22 9h às18h
de outubro
Local
Hotel Continental
Canela
Sede da APPOA
Atividade
Jornada de Abertura:
“Reinventar-se em análise”
Jornada Interna da Associação:
“Transmissão e formação”
Jornada da Convergência Lacaniana no Brasil: “Análise terminável e interminável”
Relendo Freud e Conversando sobre a
APPOA: “Construção em análise”
Jornada do Percurso de Escola VI
Novotel – POA
Jornada Clínica
Novotel – POA
Sede da APPOA
Salvador
PRÓXIMO NÚMERO
REINVENTAR-SE EM ANÁLISE
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NORMAS EDITORIAIS DO CORREIO DA APPOA
O Correio da APPOA é uma publicação mensal, o que exige não
apenas um trabalho de seleção temática – orientado tanto pelos eventos
promovidos pela Instituição, quanto pelas questões que constantemente se
apresentam na clínica –, mas também de obtenção dos textos a serem
publicados, além da árdua tarefa de programação editorial.
Tem sido nosso objetivo apresentar a cada mês um Correio mais elaborado, quer seja pela apresentação de textos que proporcionem uma leitura
interessante e possibilitem uma interlocução; quer pela preocupação com
os aspectos editoriais, como a remessa no início do mês e a composição
visual.
Frente à necessidade de uma programação editorial, solicitamos que
sejam respeitadas as seguintes normas:
1)
a formatação dos textos deverá obedecer às seguintes medidas: tamanho do papel A4
margem superior 3cm
margem inferior 3cm
margem esquerda 3cm
margem direita 3cm
fonte tamanho 12
linhas por página 48
toques por linha 70
notas de rodapé fonte em tamanho 10
entrelinha simples (inclusive entre parágrafos) cada texto da Seção Temática
e Seção Debates terá de obedecer ao máximo de 03 páginas de texto e os
de Resenha ao máximo 02 páginas, seguindo a formatação determinada no
item 2;
2)
os textos da Seção Temática, em conjunto, não poderão exceder o total de 18 páginas, conforme formatação determinada no item 2, nem
ser inferior a 15 páginas;
3)
as notas deverão ser incluídas sempre como notas de rodapé;
4)
a bibliografia ou referências bibliográficas deverão informar o(s)
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autor(es), título da obra, autor(es) e título do capítulo (se for o caso), cidade,
editora, ano, volume (se for o caso);
5)
as aspas serão utilizadas para identificar citações;
6)
o itálico somente deverá ser utilizado para expressões que se
queira grifar, para palavras estrangeiras que não sejam de uso corrente ou
títulos de livros;
7)
não utilizar negrito (bold), ou sublinhado (underline);
8)
figuras, desenhos, quadros e tabelas deverão ser apenas indicados no texto e gravados em arquivo separado, que também deverá ser
entregue impresso separadamente;
9)
o livro, sobre o qual for escrita uma Resenha, deverá ser entregue para que a capa possa ser reproduzida;
10)
as Notícias poderão ser entregues manuscritas (desde que legível) e deverá constar o título de apresentação;
11)
a data máxima de entrega de matéria (textos ou notícias), na
sede da APPOA, é até o dia 05, para publicação no mês seguinte;
12)
a Comissão do Correio se reserva o direito de sugerir alterações ao(s) autor(es) e de efetuar as correções gramaticais que forem necessárias para a clareza do texto, bem como se responsabilizará pela revisão
das provas gráficas;
a inclusão de matérias está sujeita à apreciação da Comissão do
Correio e à disponibilidade de espaço para publicação.
Comissão do Correio
Revista da APPOA
e Correio da APPOA
conecte-se com os temas e eventos
mais atuais em Psicanálise
Para receber a Revista e o Correio da APPOA, copie e preencha o
cupom abaixo e remeta-o para*:
ASSOCIAÇÃO PSICANALÍTICA DE PORTO ALEGRE
Rua Faria Santos, 258 - Bairro Petrópolis
90670-150 - Porto Alegre - RS
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( ) Assinatura anual da Revista da APPOA
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Data: ______/_____/2005
* O pagamento pode ser feito via depósito bancário no Banrisul, Bco. 041, Ag.
032, C/C 06.039893.0-4. O comprovante deve ser enviado por fax, juntamente
com o cupom, ou via correio, com cheque nominal à APPOA.
46
C. da APPOA, Porto Alegre, n. 132, jan. 2005
Capa: Manuscrito de Freud (The Diary of Sigmund Freud 1929-1939. A chronicle of events
in the last decade. London, Hogarth, 1992.)
Criação da capa: Flávio Wild - Macchina
ASSOCIAÇÃO PSICANALÍTICA DE PORTO ALEGRE
GESTÃO 2003/2004
Presidência: Maria Ângela C. Brasil
a
1 Vice-Presidência: Mario Corso
2a Vice-Presidência: Ligia Gomes Víctora
1a Secretária: Marieta Rodrigues
2a Secretária: Marianne Stolzmann
1a Tesoureira: Grasiela Kraemer
2a Tesoureira: Maria Lúcia Müller Stein
MESA DIRETIVA
Alfredo Néstor Jerusalinsky, Ana Maria Medeiros da Costa, Ângela Lângaro Becker,
Carmen Backes, Clara von Hohendorff, Edson Luiz André de Sousa,
Gladys Wechsler Carnos, Ieda Prates da Silva, Jaime Betts, Liliane Seide Froemming,
Lucia Serrano Pereira, Maria Auxiliadora Pastor Sudbrack,
Maria Beatriz Kallfelz, e Robson de Freitas Pereira
EXPEDIENTE
Órgão informativo da APPOA - Associação Psicanalítica de Porto Alegre
Rua Faria Santos, 258 CEP 90670-150 Porto Alegre - RS
Tel: (51) 3333 2140 - Fax: (51) 3333 7922
e-mail: [email protected] - home-page: www.appoa.com.br
Jornalista responsável: Jussara Porto - Reg. n0 3956
Impressão: Metrópole Indústria Gráfica Ltda.
Av. Eng. Ludolfo Boehl, 729 CEP 91720-150 Porto Alegre - RS - Tel: (51) 3318 6355
Comissão do Correio
Coordenação: Marcia Helena de Menezes Ribeiro e Robson de Freitas Pereira
Integrantes: Ana Laura Giongo, Fernanda Breda, Gerson Smiech Pinho,
Henriete Karam, Maria Lúcia Müller Stein, Norton Cezar
Dal Follo da Rosa Júnior e Rosane Palacci Santos
S U M Á R I O
EDITORIAL
1
NOTÍCIAS
2
SEÇÃO TEMÁTICA
4
O LUGAR DA SUPERVISÃO
NA FORMAÇÃO DO ANALISTA
Ieda Prates da Silva
5
SOBRE O PASSE
Urania Tourinho Peres
11
IMAGEM E SEMELHANÇA NA
FORMAÇÃO EM PSICANÁLISE
Luis Fernando Lofrano de Oliveira 17
PSICANÁLISE E MÍDIA:
UMA RELAÇÃO IMPROVÁVEL?
Clara Maria von Hohendorff
20
SEÇÃO DEBATES
25
DA NEUROSE DE TRANSFERÊNCIA
À TRANFERÊNCIA DE TRABALHO
Elaine Starosta Foguel
25
IMAGINÁRIO LINGÜÍSTICO: ANÁLISE
DO DISCURSO E PSICANÁLISE
Bethania Mariani
33
RESENHA
42
“FRAGMENTOS DO OLHAR EM UM
NARRADOR INCERTO ”
42
AGENDA
44
N° 132 – ANO XII
JANEIRO – 200 5
TRANSMISSÃO E FORMAÇÃO
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EDITORIAL Afinal, o que constitui o fascínio do novo, onde fazemos