INTRODUÇÃO
A criança cresce como um todo, sujeita aos efeitos da relação dinâmica entre
as suas capacidades pessoais que se prendem com as condições definidas
biologicamente e as condições ambientais em que vive, numa organização
permanente em que todos os fatores se influenciam mutuamente. Cabe à escola
decidir que abordagens devem ser utilizadas para melhorar a qualidade de
aprendizagem de cada criança.
De acordo com Vygotsky (1994), se a criança é excluída do contexto coletivo,
isso atrasará ou impedirá o desenvolvimento das suas funções psíquicas superiores
(PPS), pois o aprendizado ocorre à medida em que ela vai exercitando seu intelecto,
ou seja, quando suas estruturas físicas responsáveis por essa função são
estimuladas pelos fatores socioculturais.
A inconstância desses fatores pode afetar o desenvolvimento cognitivo. O
cérebro necessita se adaptar a este número incontável de variáveis e para tanto,
utiliza-se da plasticidade cerebral.
Para Vygotsky, os processos psicológicos superiores (PPS), tais como a
atenção, memória, imaginação, pensamento e linguagem são organizados em
sistemas funcionais, com finalidade de organizar adequadamente a vida mental de
um indivíduo em seu meio. Daí a necessidade das interações entre o sujeito e a
sociedade, a cultura e a sua história de vida, além das oportunidades e situações de
aprendizagem. Para o desenvolvimento do indivíduo, as interações com os outros
são, além de necessárias, fundamentais, visto que esses são portadores de
mensagens da própria cultura.
Nesta interação, desempenham um papel essencial os signos e os diferentes
sistemas semióticos que, do ponto de vista genético, possuem em primeiro lugar
uma função de comunicação e, posteriormente, uma função individual. Começam a
ser utilizados como instrumentos de organização e de controle do comportamento
individual, o que significa que os PPS não poderiam surgir e constituir-se no
processo do desenvolvimento sem a contribuição construtora das interações sociais
(VYGOTSKY, 1994).
O indivíduo integra em sua história e em sua cultura as histórias de seus
antepassados que se caracterizam como peças importantes na construção de seu
desenvolvimento por meio das experiências, situações, hábitos, atitudes, valores,
8
comportamentos e linguagem daqueles com quem interage. Este não é um processo
determinista, uma vez que o indivíduo participa ativamente da construção de seu
círculo de interações, modificando-o e provocando transformações neste contexto.
Ao depararmos com uma criança cujo cérebro foi lesionado, quanto mais
cedo houver estímulos externos, mais vias compensatórias se formarão substituindo
as lesionadas e assim aparecerão novas redes neurais. O cérebro é capaz de
realizar novas conexões entre os neurônios saudáveis, permitindo que o mesmo
passe a executar as mesmas atividades que deveriam ser realizadas pelas
conexões perdidas devido à lesão.
Vygotsky (1994) desenvolve estas idéias em seu trabalho Fundamentos da
Defectologia e conclui que os princípios fundamentais do desenvolvimento são os
mesmos para as crianças com paralisia cerebral, mas que as limitações impostas
pela deficiência funcionam como um elemento motivador que podem levar à
processos criativos, e estes, por sua vez, originarem novos caminhos na realização
de atividades.
A criança com paralisia cerebral, com ou sem dificuldades motoras ou de
comunicação, pode apresentar o mesmo nível de desenvolvimento cognitivo de uma
criança normal que tenha a mesma idade, apesar das dificuldades ou
impossibilidades de interação física com o seu meio ambiente.
O desenvolvimento de uma criança com paralisia cerebral não é inferior ao de
outra criança, mas é diferente e singular, pois ela aprende caminhos alternativos
para compensar, por exemplo, a falta de determinadas experiências motoras para
elaboração do seu pensamento. A experiência social é o alicerce dos processos
compensatórios.
9
1. AS VÁRIAS DEFINIÇÕES DA PARALISIA CEREBRAL
A expressão Paralisia Cerebral designa uma série de condições patológicas
ligadas a disfunções cerebrais que implicam em perdas de movimentos, sensações
e capacidade para realizar atividades físicas e mentais. Paralisia vem do grego
Paralysis, que significa fraqueza ou perda da função motora e/ou sensorial. Cerebral
denota que esta fraqueza ou perda está relacionada ao cérebro.
Apesar de ser freqüentemente utilizado, o termo Paralisia Cerebral (PC) é
considerado inadequado por muitos autores, uma vez que significaria a parada total
das atividades físicas e mentais. Atualmente, a Organização Mundial da Saúde
(1999) prefere nomear estas condições patológicas de Encefalopatia Crônica Não
Progressiva ou Não Evolutiva (ECINE) para deixar bem claro seu caráter persistente,
mas não evolutivo, apesar das manifestações clínicas poderem mudar com o
desenvolvimento da criança e com a plasticidade cerebral. O termo é útil também
para diferenciar a PC das Encefalopatias Crônicas Progressivas que decorrem de
patologias com degeneração contínua e evolutiva.
ECINE é uma condição causada por uma lesão no encéfalo imaturo, de
caráter não progressivo. Os sinais e sintomas dependem da área lesionada no
cérebro e da sua extensão, que se expressam em padrões anormais de posturas e
de movimentos.
A décima edição da Classificação Internacional de Doenças (CID.10)
considera a ECINE um Transtorno Específico do Desenvolvimento Motor (F 82) e
define como sua principal característica “(...) um comprometimento grave do
desenvolvimento da coordenação motora, não atribuível exclusivamente a um retrato
mental global ou a uma afecção neurológica específica, congênita ou adquirida”.
Mais uma alternativa para se designar tais condições é a utilização do termo
Distúrbios de Eficiência Física. Por trás da mudança dos termos utilizados para se
referir a esta patologia está a preocupação de se desvencilhar os portadores desse
distúrbio do rótulo de “deficientes” ou “paralíticos”.
Bobath (1978) define a PC como “uma desordem do movimento e da postura
devida a um defeito ou lesão do cérebro imaturo”. Esta terminologia é aceita pela
Sociedade Internacional de Paralisia Cerebral (LITTLE CLUB, 1959) e é
frequentemente utilizada para descrever a condição dos indivíduos portadores de
10
PC, de acordo com a sua distribuição, ou seja, a predominância da desordem
motora sobre certos segmentos do corpo.
A criança com Paralisia Cerebral apresenta uma alteração no controle da
postura e dos movimentos, com alteração tônica como consequência de uma lesão
do sistema nervoso central nos primeiros estágios do desenvolvimento. É um termo
antigo, porém não significa que o cérebro está paralisado. Significa que o cérebro
sofreu alguma forma de agressão, antes, durante ou após o parto (SALOMÃO
SCHWARTZMAN, 1993).
Segundo a Associação Brasileira de Paralisia Cerebral (ABPC) a “PC é o
termo usado para designar um grupo de desordens motoras, não progressivas,
porém sujeitas a mudanças, resultante de uma lesão no cérebro nos primeiros
estágios do desenvolvimento”. A definição aceita pela ABPC foi proposta por
Hagberg, em 1989, e também é a utilizada pela Sociedade Internacional de Paralisia
Cerebral.
Algumas crianças têm alterações leves, quase imperceptíveis, que as tornam
desajeitadas ao andar, falar ou a usar as mãos. Outras são gravemente afetadas em
sua capacidade motora, resultando em impossibilidade de andar, falar, escrever, e
muitas vezes com outros comprometimentos associados tais como déficits na área
cognitiva com prejuízos na aprendizagem, déficits sensoriais (visão, e/ou audição),
crises convulsivas, dentre outras características comportamentais e clínicas. Muitas
se tornam dependentes nas atividades funcionais da vida prática.
Entre estes dois extremos existem os mais variados casos. É importante
ressaltar que mesmo com as muitas convergem para as mesmas características que
são de fundamental importância para a compreensão dessa disfunção cerebral.
11
1.1 TIPOS MAIS COMUNS DE PARALISIA CEREBRAL
Para Bobath (1978), de acordo com a localização das lesões e áreas do
cérebro afetadas e tendo em conta três fatores (tono postural, tipo de alteração de
inervação recíproca e distribuição da condição) pode-se estabelecer três tipos
distintos de crianças com paralisia cerebral: a criança espástica, a criança atetóide e
a criança atáxica.
Figura 1. Classificação da Paralisia Cerebral
1. 1. 2. A criança espástica
É o tipo de paralisia mais freqüente na população. Ocorre como conseqüência
de uma lesão no sistema piramidal, caracterizando-se pelo aumento pronunciado
pelo tônus muscular (hipertonia), diminuição da força muscular (paresia) e
exacerbação da atividade reflexa (hiperreflexia). A função do sistema piramidal está
relacionada com a realização dos movimentos voluntários, de modo que uma lesão
12
nessa área resulta na presença da espasticidade, interferindo na execução dos
movimentos desejados.
O grau de severidade da espasticidade na criança com PC pode interferir de
forma variada: desde uma leve dificuldade até uma dificuldade máxima de
movimentar-se em qualquer posição.
O aumento da espasticidade, impedindo ou tornando o movimento lento, pode
ocorrer em respostas a certos estímulos, como ao esforço ou a emoção (ansiedade
ou medo), por exemplo, quando se surpreende com um ruído repentino, ou uma
ameaça, quando lhe perguntam algo difícil (BASIL, 2004).
Os esforços excessivos, necessários para a realização de um movimento
diante da espasticidade, associado ao receio de uma possível queda, é uma das
causas que contribuem para uma personalidade retraída, muitas vezes passiva e
pouco motivada para a exploração do meio envolvente (MUÑOZ, BLASCO E
SUÁREZ, 1997).
Foto 1. Criança com paralisia cerebral espástica/ Fonte: (Bobath, 1989)
1.1.3. A criança atetóide
Para Bobath (1989), as crianças atetóides estão sujeitas a movimentos
involuntários e variações na tonicidade muscular resultantes de lesões do sistema
extrapiramidal, o qual se origina no córtex cerebral e cerebelar, é responsável pelos
movimentos automáticos, regulação dos tônus e da postura.
13
Lesões nesse sistema se caracterizam pela presença de movimentos
irregulares, contínuos, lentos e involuntários, os quais são do tipo espasmódico e
incontrolado, podendo ser localizado apenas nas extremidades ou em todo corpo,
atingindo membros, cabeça, face e os músculos envolvidos com a fonação,
respiração e deglutição.
Autores como Muñoz, Blasco e Suárez (1997) e Basil (2004) ressaltam em
seus trabalhos que as crianças discinéticas (atetóide) são divididas em dois grupos:
aqueles ditos hipercinéticos ou coreoatetóides que apresentam movimentos
involuntários com a presença de movimentação associada (isto é, a movimentação
de um membro ou de parte dele que leva à movimentação de outros grupamentos
musculares, não interessados no movimento principal).
Foto 2. Criança com paralisia cerebral atetóide/ Fonte: (Bobath, 1989)
1.1.4. A criança atáxica
A criança atáxica, segundo Bobath (1978), sofre de uma lesão caracterizada
por diminuição da tonicidade muscular, não coordenação dos movimentos e
equilíbrio deficiente, devido a lesões no cerebelo ou nas vias cerebelosas. Outra
característica presente é a existência de um baixo tônus postural, que favorece a
instabilidade de tronco durante a marcha e a desorientação espacial, resultando em
14
insegurança no ato de caminhar e quedas freqüentes. É a criança “mole”, com o
equilíbrio perturbado por uma função postural acentuadamente defeituosa, a sua
distribuição afeta o tronco e as pernas enquanto os braços funcionam normalmente.
Na maioria dos casos a paralisia cerebral atáxica é provocada por lesão
cerebral e a mobilidade dos portadores deste distúrbio é condicionada pela
conjugação de um tom postural baixo, com distúrbio da inervação recíproca, o que
torna os seus movimentos impossíveis ou muito difíceis. Segundo Muñoz (1997), a
fala é freqüentemente retardada e indistinta, apresentando boca aberta e salivação.
Corresponde a 10% dos casos.
Foto 3. Criança com Diplegia/ Fonte: (Câmara arquivo; 2004)
15
Foto 4. Criança com Quadriplegia/ Fonte: (Câmara arquivo; 2004)
Foto 5. Criança com Hemiplegia/ Fonte: (Câmara arquivo; 2004)
16
1.1.5. CLASSIFICAÇÃO DA PC BASEADA NO GRAU DE GRAVIDADE
A criança com PC possui um atraso de desenvolvimento neuropsicomotor por
uma lesão no sistema nervoso central (SNC) e o grau de incapacidade ligado ao
transtorno neuromuscular pode ser leve, moderado e severo, conforme mostra a
tabela abaixo, podendo causar comprometimento na área motora, sensorial e/ou
cognitiva, implicando em alterações do tônus muscular, qualidade do movimento,
percepção, capacidade de apreender e interpretar os estímulos ambientais. Sabese, ainda, que muitas vezes as seqüelas da PC tornam-se agravadas pelas
dificuldades que estas crianças apresentam em explorar o meio e em se comunicar
com o mundo externo.
Tabela 1. Graus de Gravidade da PC
GLOBAL
(Grau de
incapacidade)
Motor Grosso
Motor Fino
Cognição
Fala
Social
Leve
Marcha
Independente
Sem Prejuízo
QI + 70
Mais de 2
palavras
Independente
Moderado c/
ajuda
Marcha Limitada
QI 50-70
Isoladas
Palavras
Assistido
Severo
Sem Locomoção
QI 50
Indistinta
Dependente
Função
Sem Função
Fonte: MINEAR, 1956
Os indivíduos com Paralisia Cerebral com comprometimento global leve
movimentam-se com independência, realizam atividades motoras finas, como
desenhar, encaixar, recortar, pintar, etc, constroem frases com mais de duas
palavras e demonstram uma boa adaptação social. Seu desempenho intelectual
favorece a aprendizagem acadêmica (SOUZA E FERRARETTO, 1998).
Na Paralisia Cerebral com quadro moderado os indivíduos apresentam
dificuldades na locomoção, sendo necessário suporte material e/ou humano. A
motricidade fina é limitada, executando atividades sem domínio do freio inibitório.
Utiliza palavras-frase na comunicação. Nas atividades da vida diária, necessitam de
manutenção e de assistência. Os aspectos cognitivos limitados parecem dificultar o
desempenho escolar (MINEAR, 1956).
17
Os casos severos de Paralisia Cerebral com dependência total ao nível da
motricidade grossa e fina, com linguagem e fala comprometida demonstram
capacidade intelectual severamente prejudicada. Por capacidade intelectual deve-se
entender a possibilidade de expressão da capacidade mental. Cabe ressaltar, como
afirma Minear (1956), que não existe uma relação direta em “quanto maior o
transtorno motor, maior déficit mental, auditivo ou visual”.
18
2. ETIOLOGIA E INCIDÊNCIA
Segundo Costa Vaz (2001), a etiologia da Paralisia Cerebral é variada.
Aproximadamente 90% das lesões ocorrem durante a gestação ou no nascimento.
Dentre os principais fatores de risco destacamos a asfixia, infecções congênitas,
condições metabólicas maternas, consumo de álcool, tabaco e/ou drogas, exposição
à radiação, fator Rh, icterícia e baixo peso ao nascer como sendo os principais
fatores de risco que predispõe o feto e/ou bebê à paralisia cerebral.
Um dos casos mais comuns é a asfixia perinatal, considerada como a
primeira causa mais importante e relevante da paralisia cerebral. A asfixia perinatal
refere-se a uma diminuição nutricional e metabólica da mãe para com o feto, o que
conseqüentemente leva a má perfusão dos órgãos vitais, com diminuição na oferta
de oxigênio para o cérebro. A asfixia pode ocorrer devido a varias situações: má
posição do cordão umbilical, desprendimento prematuro da placenta que dificulta a
troca gasosa, perfusão inadequada do lado placentário devido a uma hipotensão
materna, hipertensão materna ou contrações uterinas anormais, anemia da
gestante, hemorragia durante a gestação, causando risco de aborto, hipoventilação
durante a anestesia, além de cardiopatias congênitas da mãe.
Conforme Miller (2002), somente entre 10% a 26% dos casos de Paralisia
Cerebral ocorrem após o nascimento até os três anos de idade, por traumatismo
direto ao cérebro causado por acidentes ou violência infantil, infecções do cérebro
(encefalite, meningite), toxinas químicas (envenenamento do ar), falta de oxigênio
(também conhecida como causa da “morte súbita de berço”).
É importante salientar que embora a PC não seja progressiva, os sinais
clínicos se modificam à medida que o sistema nervoso central amadurece e a
criança cresce. Por esta razão, não é possível fazer um diagnóstico definitivo
durante a primeira infância. Como conseqüência disto, observamos diferentes graus
de comprometimento sensorial e motor, dando-nos a sugestão de piora à medida
que a criança se desenvolve. No entanto, o diagnóstico precoce é fundamental para
que possa ser prestado o serviço de reabilitação oral e motora, a fim de prevenir
maiores complicações futuras.
Segundo os autores Salomão e Berezovsky (2004), no Brasil não é fácil
determinar a incidência exata de pessoas com paralisia cerebral em função das
19
dificuldades em se estabelecer critérios diagnósticos uniformes, além do fato de não
ser uma doença considerada de notificação compulsória. Entretanto, o censo de
2000 demonstra que 24,5 milhões de brasileiros possuem algum tipo de deficiência.
Desta população, aproximadamente 30.000 a 40.000 são crianças que nasceram
com diagnóstico de paralisia cerebral.
Em países desenvolvidos como nos Estados Unidos, sua incidência tem-se
mantido constante nos últimos 15 anos, entre 1,5 a 2,5 /1000 crianças vivas. Em se
tratando de lactantes com peso ao nascer inferior a 1.500g, esse índice fica entre
5% e 15%. Isso ocorre devido ao avanço médico-tecnológico que proporciona a
sobrevida de prematuros extremos (COSTA, SALOMÃO, BEREZOVSKY, 2004).
20
3. APRENDIZAGEM E PARALISIA CEREBRAL
A criança nasce com habilidades para produzir numerosos padrões
interativos e sensório-motores, pré-programados para atingir a vinculação essencial
à sua sobrevivência e segurança gravitacional, isto é, controle sobre o corpo,
motricidade e simultaneamente sobre suas emoções. Assim, os mecanismos
cognitivos são baseados na atividade motora, que constituem os primeiros
substratos da cognição. Para Gerber (1996), a ação gera e inicia a cognição,
através das práxis, que tem por base uma planificação mental que regula, controle,
integra, elabora e executa a intenção da criança.
Considerando que a criança adquire o conhecimento através da exploração
do meio, da manipulação de objetos, da repetição de ações e do domínio do próprio
esquema corporal com relação a situações de perigo, ela necessita do controle
maturacional do sistema nervoso.
Segundo Piaget (apud ATKINSON et al, 2002), a criança no primeiro ano de
vida
apresenta
evolução
significativa
do
desenvolvimento
nos
aspectos
psicossociais, quando recebe grande influência da mãe e do ambiente, e
principalmente favorece a evolução de aquisições cognitivas movidas pelas ações
intencionais promovendo desta forma a aprendizagem.
Durante muitos anos o desenvolvimento motor foi descrito como uma tomada
de consciência progressiva pela criança, de seu sistema muscular, na mesma
medida da inibição dos atos reflexos, da progressão das habilidades e da repetição
das experiências motoras (COHEN, 2001).
Em Backlin (1992), as primeiras aquisições motoras do bebê foram descritas
como partindo de movimentos simples para movimentos cada vez mais complexos.
Respeitando as variações individuais relativas ao desenvolvimento a expectativa é
de que aos três meses a criança já tenha adquirido o controle cervical, aos seis
meses sente-se sem apoio e aos doze meses consiga marcha independente. Esta
fase é de grande importância, pois a criança pode explorar com independência seu
ambiente. Isto coincide com a grande evolução da maturação do sistema nervoso
central, observada como um salto no desenvolvimento cognitivo, afetivo e
comunicativo,
melhora
da
qualidade
das
informações
exteroceptivas
e
proprioceptivas e riqueza das experiências motoras em função do meio no qual elas
21
se desenvolvem. Todo este conjunto interage no contexto cultural e social onde vive
a criança devendo ser levado em conta na presença de atraso do desenvolvimento.
A criança com Paralisia Cerebral também passa por todas estas etapas
podendo ficar mais limitada ao pensamento e menos limitada à execução do
mesmo, perdendo oportunidades concretas de viabilizar ampliações no seu
repertório.
Geralmente
estas
crianças
apresentam
muitas
vezes
um
bom
desenvolvimento da cognição e da linguagem; entretanto a verbalização pode estar
restrita ou ausente, tanto em função de comprometimento do aparelho fonoarticulatório, quanto ao nível cortical (apraxias e afasias); outras apresentam
linguagem pobre, possivelmente associada a alterações cognitivas (retardo mental
em diversos graus), ou ainda relacionadas com aspectos emocionais. Em outras
palavras, é sob a estrutura da interação e da progressiva socialização que se
desenvolve a primeira aprendizagem sensorial, motora, lingüística, grafo-motriz,
perspectivas e conceituais. É com base nestas aprendizagens que a criança, numa
fase seguinte, poderá ascender para a leitura, escrita e cálculo.
Vale ressaltar que o desenvolvimento da linguagem destas crianças
dependerá muito das possibilidades que elas venham ter com o meio social e de
recursos tecnológicos existentes que possam viabilizar sua comunicação.
É interessante lembrar que Vygotsky (apud LEVY, 2002) admite que as leis
que fundamentam o desenvolvimento cognitivo são as mesmas, tanto para as
crianças ditas normais como para as crianças com qualquer deficiência. Para o
autor, as funções do desenvolvimento cognitivo da criança aparecem primeiramente
no plano social para, aparecerem no psicológico.
Nesse sentido, é necessário favorecer um ambiente estimulador para a
criança com paralisia cerebral interagir com o meio social. Desta forma, ela terá a
oportunidade de vivenciar as construções do período sensório-motor, o que
favorecerá o aparecimento e, conseqüentemente, o enriquecimento da linguagem.
A criança com paralisia cerebral pode ter inteligência normal ou até acima do
normal, mas também pode ter atraso intelectual. Este atraso pode não ser devido às
lesões cerebrais, mas também pela falta de experiência resultante das suas
deficiências.
Tanto os esquemas sensório-motor quanto os perceptivos estão ausentes ou
diminuídos, o que é fator predominante do atraso no desenvolvimento do
22
pensamento representativo e do simbolismo, afetando assim, o desenvolvimento da
linguagem (SHWARTZMAN, 1993).
A linguagem dessas crianças vai muito além da emissão da recepção. Ela
deve ser situada dentro do seu desenvolvimento cognitivo, percebendo como ocorre
à comunicação entre a criança e o meio, apesar do seu comprometimento sensóriomotor. É fundamental propiciar a interação da criança com o meio, favorecendo uma
troca ativa com o mesmo. Assim, ela terá a chance de vivenciar as construções do
período sensório-motor, o que levará ao enriquecimento da linguagem.
A relação estabelecida entre a criança com paralisia cerebral as pessoas com
boa capacidade motora, pode ser um elemento fundamental para o seu
desenvolvimento. A ação compartilhada estimularia a capacidade da criança de
estabelecer vínculos sociais e favoreceria o desempenho cognitivo. O futuro dessas
crianças dependerá muito das possibilidades que elas venham a ter na interação
com o meio (VYGOTSKY, 1994).
Braga (1995) acrescenta ainda que as relações sociais estabelecidas pelas
crianças se dão através de símbolos que fazem parte de um sistema cultural. No
caso do deficiente não é o tipo de instrumento utilizado ou o signo que é empregado,
mas o significado dele que tem maior importância. A função primordial é internalizar
a linguagem e desenvolver funções mentais que têm o símbolo como base.
23
4. A INFLUÊNCIA DA FAMÍLIA NO DESENVOLVIMENTO DA CRIANÇA COM
PARALISIA CEREBRAL
O nascimento de uma criança com deficiência implica em mudanças na
dinâmica familiar, que variam segundo a gravidade da deficiência e o significado que
esta adquire em cada família.
Para Mouros et al. (2004), os pais buscam ansiosamente por respostas para
seus questionamentos e, aos poucos, o choque inicial tende a ceder lugar à tristeza
e à desolação, iniciando assim um processo de luto pela perda das expectativas
criadas em torno de terem uma criança “normal”. Neste sentido, os autores
defendem que os pais devam construir um espaço emocional que os possibilite o
necessário entender o seu bebê e entender o seu desenvolvimento, mas antes disso
precisam conhecer mais sobre a deficiência.
Enquanto este doloroso processo prossegue em seu lento ajustamento à
perda do bebê que fora idealizado, “o bebê especial” necessita de cuidados
especiais. Diante desta situação espera-se que a paralisação advinda do luto inicial,
possa ser transformada em ação.
Reconhecemos que a família desempenha marcante papel no tratamento da
criança com paralisia cerebral e que repentinas mudanças acometem sua dinâmica
interna em decorrência do nascimento desse filho, gerando conflitos e bruscas
alterações na rotina familiar, ficando geralmente a mãe com uma sobrecarga maior.
É esperado que a mãe venha concentrar na criança com deficiência toda sua
atenção, excluindo de suas prioridades outros filhos, familiares ou amigos e inclusive
venha abdicar de seus interesses pessoais e profissionais.
A educação e o suporte familiar são os elementos mais benéficos para a
educação de uma criança incapacitada. Contudo, nem sempre a família é capaz de
oferecer este suporte de maneira adequada. Desde muito cedo, a criança com
deficiência necessita de orientação e acompanhamento de diversos profissionais da
área da saúde e da educação. Precisa ser estimulada, encorajada e aceita no
ambiente social do qual faz parte para atingir resultados progressivos no processo
ensino-aprendizagem. Para ser estimulada, faz-se necessário conhecer a deficiência
garantindo, assim, sucesso em sua trajetória futura.
As atitudes e sentimentos dos pais terão forte influência no desenvolvimento
da criança. Sendo assim, eles devem ser conscientizados de sua responsabilidade e
24
da importância da qualidade da relação que estabelecerão com o filho com
deficiência, a qual influenciará o bem-estar físico, mental, psicológico e social da
criança.
A compreensão da dinâmica psicossocial é imprescindível na medida que
possibilita a criação de uma estratégia de tratamento. É importante oferecer
informações que consciencializem sobre as vantagens no acompanhamento familiar
eficaz.
Os educadores/professores, devem procurar entender que na maior parte das
situações estas atitudes dos pais, são reflexo de uma situação difícil, da vontade em
resolvê-la, na busca da resposta mais adequada para o seu filho. O profissional
deve ser capaz de mostrar aos pais que os compreende, que os quer ajudar na
procura da resposta mais adequada para promover o desenvolvimento da criança.
25
5. MÉTODOLOGIA UTILIZADA
Esta pesquisa foi um estudo de caso, entendido como uma análise
aprofundada de uma unidade individual, a qual pode ser tomada como uma pessoa,
um grupo de pessoas, uma instituição, um evento cultural, etc. Os estudos de casos,
segundo Yin (1993), podem ser exploratórios, descritivos, ou explanatórios. Nesta
pesquisa em questão, decidiu-se proceder um estudo de caso descritivo, por meio
do qual se procurará tomar um sujeito e mostrar o quando ele é capaz de aprender
mesmo com as “limitações” impostas por sua deficiência.
A criança sujeito deste estudo é uma menina com 7 anos de idade, que
nasceu com 30 semanas de gestação, pesando 1.600 gramas, em um Hospital na
cidade de São Paulo. Durante o parto, a mãe teve eclampse e placenta de Acreta, o
que acarretou na necessidade da criança ser retirada rapidamente do ventre
materno, mas, apesar dos esforços, faltou-lhe oxigênio e foi acometida por asfixia
perinatal. Após nascer, ficou na isolete para ganhar peso e controlar a icterícia.
Aos nove meses os pais perceberam o atraso em seu desenvolvimento motor.
A criança ainda não conseguia sentar e nem tentava ficar de pé. Preocupados,
procuraram um neurologista que, após realizar exames, diagnosticou a Paralisia
Cerebral do tipo Coreoatetóides, além de variações na tonicidade muscular
resultantes de lesões do sistema extrapiramidal.
Nas crianças coréicas, doença que resulta de uma lesão na região do cérebro
chamada Núcleos da Base, o sintoma mais evidente é uma variação no grau de
tensão dos músculos das raízes dos membros. Isso leva a criança a produzir uma
sucessão de movimentos rápidos e indesejáveis, fazendo com que ela tenha
dificuldade de realizar qualquer movimento voluntário (MUÑOZ, BLASCO e
SUÁREZ, 1997 e BASIL, 2004).
A criança foi encaminhada para uma instituição especializada com a
finalidade de iniciar um tratamento através de atividades de estimulação indicadas
para o seu caso, realizadas por uma equipe multidisciplinar composta por
neurologista, fisioterapeuta, terapeuta ocupacional, fonoaudiólogo e pedagogo.
Coube a esta equipe de reabilitação avaliar e escolher o tipo de locomoção
adequado de acordo com a quantidade de movimentação involuntária da criança.
Nos casos em que a criança tem um maior controle dos movimentos
involuntários, ela pode andar com pouco auxílio ou com um andador. Se a
26
movimentação involuntária for muito forte, a criança pode precisar de cadeira de
rodas adaptada para se locomover. Apesar das necessidades especiais, nada
impede que estas crianças freqüentem a escola regular.
De acordo com Rodrigues (2002), se alguma deficiência acometer o indivíduo,
diminuindo as possibilidades do seu desenvolvimento, faz-se necessária a
intervenção de um profissional especializado, caso haja risco na aquisição de
habilidades motoras. Tal intervenção deve ser realizada o mais precocemente
possível, a fim de prevenir atrasos e/ou alterações, facilitando assim sua adaptação
ao meio. A autora acrescenta ainda que há evidências de que em mais de 50% dos
casos de crianças portadoras de risco em seu desenvolvimento, haveria meios de
evitá-los ou minimizá-los, se os conhecimentos já existentes sobre prevenção
fossem precocemente adotados.
Por ter sido estimulada logo após o diagnóstico, a criança alcançou muitos
progressos e desenvolveu habilidades necessárias para a leitura e a escrita.
Assim que a criança obteve alta da instituição que frequentava, os pais,
orientados pela equipe multidisciplinar, procuraram uma escola de ensino regular
para matriculá-la.
Os pais encontraram uma escola confessional, localizada na zona Norte da
cidade de São Paulo, e foram prontamente atendidos. Juntamente com a criança
conheceram o ambiente, os profissionais e a proposta pedagógica da escola e em
seguida efetuaram a matrícula.
Antes de iniciar o trabalho com a criança, a escola passou por um processo
de preparação dos professores, alunos e funcionários, pois um novo desafio se
anunciou: como trabalhar com uma criança deficiente?
A preocupação despertada na escola reflete um problema que a atualidade
coloca para as instituições de ensino que com a legislação vigente no Brasil desde
1996, Lei 9.394 (PCNs), devem estar aptas para receberem crianças especiais. Para
Mantoan (1997), o sistema educacional, o professor, a escola e o ensino vigente
ainda respiram ares conservadores e tradicionais de épocas passadas. A autora
atesta que:
27
reestruturar o conjunto de elementos que compõem o quadro
educacional deste fim de século, implica o reconhecimento do que
está sendo hoje o preâmbulo do futuro. Em outras palavras, o que
planejamos para amanhã, em educação, deverá considerar a
marcha incessante e implacável da evolução das ciências, das
artes, da tecnologia e, especialmente, da capacidade de extensão
da consciência humana. (MANTOAN, 1997, p.5)
Todos os profissionais envolvidos foram orientados pela escola com o objetivo
de promover o desenvolvimento físico, cognitivo, emocional e social da criança. O
espaço físico da escola já estava adaptado de acordo com as normas exigidas por
lei para receber pessoas com deficiência. Houve uma mobilização para a
reorganização do Projeto Político Pedagógico da escola, objetivando melhor
atender, estimular e encorajar essa criança para que ela pudesse alcançar
resultados progressivos em seu processo de ensino-aprendizagem.
A criança foi recebida com carinho pelos colegas, que já estavam preparados
para acolhê-la, apesar da expectativa da chegada de uma criança diferente. A
professora da sala de aula entrou em contato com os profissionais que a
acompanharam na instituição para obter mais informações a respeito do caso e
receber orientações sobre a melhor maneira de se trabalhar com ela.
Diante das orientações recebidas da instituição especializada que a aluna
frequentava, a escola reuniu todos que estavam atuando diretamente com a criança
e juntos buscaram aprimorar seus conhecimentos e colocá-los em prática para
propiciar condições e possibilidades para que a criança, dentro da sua limitação,
pudesse dar continuidade ao processo de aprendizagem.
A aprendizagem ocorre a partir de um processo de construção diária, pelo
qual todo indivíduo passa, independente de suas condições motoras e/ou cognitivas.
Para tanto, o grau de dificuldade de uma atividade deve ser similar ou antecipar as
vivências de uma criança. Não se devem preparar atividades de baixo nível
intelectual. Quando isso acontece, corre-se o risco do aluno ficar desestimulado,
perder o interesse e não avançar em seu desenvolvimento. Isto que é válido para
qualquer indivíduo sem deficiência também deve orientar um projeto de
aprendizagem para crianças portadoras de deficiências.
De acordo com Vygotsky (1984), a educação deve antecipar-se ao ritmo
evolutivo da criança e atuar junto às competências emergentes. Vygotsky (1984),
também afirma que
28
por meios de questionamentos, desafios e reflexões, sobre o que
está sendo produzido, os professores poderão interferir na zona
proximal do aluno, levando-o a evoluir no seu desenvolvimento real
(determinado pela capacidade de resolver problemas sozinho) para
seu nível de desenvolvimento potencial (determinado pela solução
de problemas com a orientação de outra pessoa), fazendo com que
as funções ainda não consolidadas venham a amadurecer
(VYGOTSKY, 1984, p.97).
O planejamento escolar da instituição de ensino em questão não foi
modificado em função da criança, mas sim as estratégias de aprendizagem. No
momento da realização de cada tarefa em sala de aula, a professora interferiu
individualmente quando a criança não conseguia realizá-las. Muitas vezes até um
colega da classe a ajudava na realização das atividades. Os colegas interagiam de
forma agradável e respeitando suas limitações.
A seguir, apresentamos algumas atividades realizadas pela criança em sala
de aula, no segundo semestre de 2008, que se encontra no primeiro ano do Ensino
Fundamental. Alguns registros foram feitos com máquina fotográfica especialmente
para este estudo de caso. Outros são atividades feitas pela própria criança que
permitem verificar o seu progresso. Comparamos as orientações fornecidas pela
instituição especializada com os progressos obtidos pela criança:
1) Que não andaria sozinha, necessitando de um andador. Porém a prática
tem contrariado o prognóstico. Mesmo com toda dificuldade de locomoção
que crianças coréicas apresentam, vem vencendo esta barreira. Já
consegue se locomover com ajuda, devido a todo estimulo recebido nas
sessões de fisioterapia.
29
Foto 6. A aluna descendo a escada com apoio da professora
2) Não conseguiria manusear tesoura para recorte. Esta informação também que
não condiz com a realidade. Hoje recorta com ajuda de alguém para segurar o
papel e com tesoura de destros. Apesar de ser canhota, não se adaptou à
tesoura para canhoto.
Foto 7. A aluna utiliza a mão destra para recortar embora seja canhota
30
Foto 8. Ela precisa de ajuda de outrem para realizar a atividade
Nas atividades de recortar, a aluna contou com a ajuda da professora para
segurar a figura. Na atividade abaixo, a aluna recortou, montou e colou todas as
figuras com a ajuda de um colega.
Foto 9. Não apenas a professora, mas colegas de sala de aula ajudam na montagem
31
Em outras atividades motoras, como com massinhas para modelar, utiliza as
duas mãos. Nestes exercícios ela adquire força muscular e flexibilidade articular
necessárias aos diferentes movimentos da escrita. Esse tipo de exercício deve
começar antes mesmo que a criança pegue um lápis na mão. Na imagem abaixo
(Foto 10), a aluna em atividade:
Foto 10. Atividade com massinha: aquisição de força muscular e flexibilidade
Ao acompanhar a aluna com paralisia cerebral em suas atividades diárias, a
professora refletiu sobre a questão da inclusão de pessoas com deficiência na
escola:
Olhar e acompanhar as atividades é acreditar que é
possível a inclusão, mas para ela ser possível é
preciso dar condições necessárias aos alunos com
paralisia cerebral e aos professores no contexto
escolar (Professora Norma, do primeiro ano do
Ensino Fundamental)
3) Segundo a instituição especializada, a criança só escreveria com letra
bastão, possivelmente não conseguiria passar para letra cursiva e que futuramente
precisaria de um laptop para escrever. Pode-se verificar nas atividades abaixo que a
32
aluna consegue escrever, primeiramente usando letra bastão e algumas vezes tenta
passar para letra cursiva.
Atividade 1
As atividades realizadas pela aluna apresentam em um primeiro momento
uma caligrafia em bastão, bem tremula, ultrapassando a linha (devido à sua
dificuldade motora), mas consegue chegar ao final da lição juntamente como os
demais alunos da classe.
33
O domínio do gesto, estruturação espacial e orientação temporal são os três
fundamentos necessários para a escrita. Na atividade abaixo de elaboração de
frases, apesar de ter uma letra tremula, a criança já apresenta uma direção gráfica
para escrever, adquiriu a percepção e a compreensão da imagem da escrita, ou
seja, sabe que para escrever uma palavra vem uma letra após a outra.
Atividade 2
34
Em relação à escrita de textos, a aluna mostra que além de desempenhar
bem a habilidade motora para a escrita, consegue compreender o que escreve. No
desenho abaixo do texto, ela reproduz na forma de desenho a mensagem escrita.
Atividade 3
35
4) Atividades de Matemática
Na reprodução da atividade abaixo, como pode-se verificar, a aluna utiliza forma
eficiente e precisa para que os pequenos músculos possam produzir movimentos
delicados e específicos para a escrita dos numerais.
Atividade 4
36
5) Atividade de língua estrangeira (inglês):
Nas atividades de língua estrangeira, a aluna consegue relacionar o código
lingüístico em inglês para a escrita e interpreta o seu significado. Apresenta
dificuldade na oralidade e ao pintar.
Atividade 5
37
Para amenizar essa dificuldade, a professora desta matéria utiliza outras formas
de atividades como:
a) na informática: jogos, softwares, onde a aluna interage com o programa,
b) na sala de multimídia: filmes infantis, com pequenas legendas, e também a
língua falada;
c) sala de aula: uso do gravador para que I. ouça a sua própria voz.
6) Atividades de expressão oral
A área da linguagem é alterada. Este aspecto pode estar relacionado à falta
de experiências de exploração da criança no meio e como a participação ativa é
diminuída, causa um descompasso na velocidade e compreensão dos aspectos
lingüísticos. Contudo, quando o tema é concretizado por meio de objetos, no qual a
aluna tenha a possibilidade de explorar e internalizar o conceito, a reprodução da
escrita se torna mais fácil e coerente.
A profissional de fonoaudiologia que trabalha com a aluna diz que: “esta
alteração revela atrasos marcantes. Para atingir a articulação próxima a de crianças
de sua idade são necessárias muitas horas de terapia reabilitadora da fala”.
O problema da linguagem em crianças coréicas - falta de controle oral-motor
e de boa postura, dificuldade de usar seus braços e pernas e posição incorreta da
cabeça - contribuem para o não desenvolvimento de uma articulação normal. Desta
forma, os erros de articulação que tais crianças cometem são fonéticos, causados
por movimentos musculares fora do alvo ou ausentes.
Apesar de apresentar dificuldade ao se expressar oralmente devido à sua fala
laboriosa1, de forma não tão nítida como as das demais crianças, a aluna deste
estudo de caso tem grande capacidade de expressar suas idéias. Durante as aulas
participa, expõe o que pensa, sempre de forma coerente e muito crítica.
1
Prestes (1998) e Jakubovicz & Cupello (1996) afirmam que a lesão decorrente na parte
inferior da terceira circunvolução frontal do hemisfério esquerdo é chamada de Afasia de
Broca, considerada como afasia não – fluente, na qual não há linguagem expressiva e o
paciente apresenta fala laboriosa, dentre outras manifestações lingüísticas.
38
O recurso pedagógico que as professoras utilizam pode funcionar como um
dos elementos facilitadores para que esta interação ocorra dentro da sala de aula. O
estar juntos, apenas, num ambiente escolar, muitas vezes não garante a criação de
vínculos afetivos, nem de amizades, mas sim de cooperação. É preciso criar
momentos de informação e sensibilidade para que se possa eliminar o preconceito e
barreiras
atitudinais,
promover
estratégias
que
potencializem
as
relações
interpessoais entre os alunos como um todo. A utilização de recursos pedagógicos é
um deles.
O material utilizado, poderá ser adaptado: lápis, carteiras e cadeiras com
inclinação adequada, quadro de giz com altura móvel (conforme a altura da criança),
etc. Quando a criança apresenta bom rendimento intelectual, mas tem pouca
habilidade ou destreza para a escrita, poder-se-á iniciar o uso de um laptop com
teclado e software adaptado, uma máquina de escrever adaptada, gravador.
Dessa forma, o saber do educador é imprescindível dentro do processo de
aprendizagem e formação da criança com deficiência, sendo apenas necessário
adaptar formas para entendê-la e lidar com ela. Para isso, buscar ajuda e
orientações com técnicos da saúde, ter criatividade e disposição para o novo são
requisitos necessários e que darão conta da grande maioria de dúvidas e incertezas
encontradas ao longo do processo.
A escola deverá proporcionar um maior número possível de oportunidades
para que a integração seja positiva e gratificante para a criança. Qualquer pessoa
portadora de uma deficiência tem direito a beneficiar-se do sistema educativo como
qualquer outro elemento da comunidade. Devem ser respeitadas as características
individuais do aluno tanto no que se refere à programação didática, às estratégias
metodológicas e no estabelecimento de uma avaliação flexível, contínua e
qualitativa.
A criança com paralisia cerebral deverá seguir um currículo adaptado às suas
necessidades e potencialidades, participando em todas as atividades escolares
possíveis. Normalmente precisa de um reforço pedagógico maior em certas áreas
nomeadamente a nível sócio-afectivo, de linguagem e de autonomia. Será
necessário e benéfico a existência de uma equipe multidisciplinar que a acompanhe
o percurso da sua escolaridade e esteja sempre em contato com a escola para
orientações sobre o seu desenvolvimento.
39
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente estudo permitiu mostrar que a criança com paralisia cerebral tipo
coreoatetóides não tem um “cérebro paralisado” como vulgarmente se acredita, mas
uma lesão em uma área específica do cérebro que resulta em alterações motoras. O
nível cognitivo destas crianças é preservado, seus movimentos é que foram
prejudicados. Criando-se meios, esses obstáculos são facilmente superados pela
criança e ela aprende com as demais crianças.
As condições do desenvolvimento não são as mesmas para todas as
crianças, com ou sem deficiências, porque todas constroem sua individualidade com
possibilidades (características genéticas e estruturas corporais) que são muito
diferentes e particulares a cada uma. Essa construção de sua individualidade e de
seu conhecimento sobre o mundo nada mais é do que uma autoorganização que o
meio, e especialmente as pessoas ao seu redor, podem facilitar ou não.
É muito importante lembrar que o desenvolvimento da criança com deficiência
dá-se como o da criança sem deficiência. Ambas passam pelas etapas da conquista
de autonomia e de conhecimento, seguindo a mesma ordem e motivadas pelas
mesmas razões. As divergências que poderão existir entre o desenvolvimento
dessas crianças se restringem às fases do desenvolvimento, sendo que na criança
comprometida pela deficiência poderão não ocorrer de acordo com a cronologia
estabelecida pelos teóricos que embasam a prática educacional. Elas poderão ter
um inicio mais tardio da aprendizagem, além de apresentarem uma maior lentidão
durante o processo porque o ritmo de interação social e de execução das suas
ações apresentarão formas diferentes de manipulação e experimentação com o
meio.
Constata-se que, se o meio oferece ao sujeito sentimentos de segurança, de
autonomia e confiança para poder agir, a criança com deficiência ou não, terá
condições de ter um desenvolvimento mais harmonioso. A única diferença é que a
criança denominada “normal” consegue encontrar soluções para construir sua
identidade com mais facilidade, mesmo que o contexto não seja facilitador (VAYER
& RONCIN, 1989).
40
A partir deste estudo de caso pode-se verificar que a experiência de conviver
com uma criança portadora de deficiências não traz benefícios apenas para o
portador de deficiência, mas para todas as pessoas envolvidas. Os adultos e os
colegas ganham com o aprendizado sobre a diferença, descobrindo que há lugar
para todos e que há formas diferentes de ver o mundo e de interagir com ele.
Os envolvidos aprendem que há diversas formas de ser e viver. Desenvolvem
uma maneira especial de escutar o deficiente, ampliam o olhar, e ao mesmo tempo,
passam a observar detalhes, que embora sejam pequenos, são de grande
importância, os quais anteriormente à experiência de conviver com uma criança
portadora de deficiência passavam despercebidos. Um olhar, um pequeno gesto ou
som adquirem a importância de um discurso, aumentando cada vez mais a
percepção e a compreensão da própria vida.
41
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TCC ROSA MARIA DE PAIVA