Personalidade
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José ribeiro Júnior
José Ribeiro Júnior
A história total
“Ter crescido com a
Universidade foi uma experiência
empolgante”, garante o
historiador, com quase meio
século dedicado ao magistério
e à pesquisa.
© Paulo Velloso
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esde o início, não houve dúvida. Já a militares. “O substituto, Florestan Fernandes,
partir da adolescência, José Ribeiro Jú- acabou por fazer um discurso memorável, em
nior sabia que seu objeto de estudo estaria, que traçava linhas de enfrentamento da ditadura
de alguma maneira, estreitamente ligado ao e que, logo depois, foi publicado pela Revista
homem. Restava a questão: que caminho tri- Civilização Brasileira e acabou tornando-se
lhar para melhor aproximar-se de fenômeno um clássico da resistência.”
Sobretudo para quem, como Ribeiro, amtão complexo como a trajetória da humanidade
sobre a Terra? Chegou a pensar em Biologia, bicionava empreender uma crônica da vida
logo descartada, e andou de namoro com a cotidiana do País, a atmosfera em São PauPsicologia – que acabou cedendo espaço, em lo, depreende-se, não era das melhores. Sob
incômoda vigilância, decidiu (julho de 1965)
definitivo, para a História.
Curioso, de temperamento inquieto, Ribeiro afivelar as malas e, com a mulher e os dois
Júnior buscava uma visão universal da vida. filhos – Josete, de um ano e meio, e Ricardo,
“Queria alguma coisa que fosse bem abran- com três meses –, rumou para a então Faculgente e que me desse a oportunidade de es- dade de Filosofia de Assis (Fafia), no interior
tudar o homem em sociedade”, lembra, hoje. de São Paulo, onde acabara de ser aprovado
“Imaginei que a História pudesse me oferecer em concurso.
A instituição vivia um grande momento, e
essa abordagem, e estava certo.” Se a opção
a cidade recebia de braços aberfoi certeira, a época da escolha
tos os novos docentes. “Já existia
inspirava cuidados.
lá, um espírito de estudo e crítica
Nascido e criado em São Paulo, Vetado pelos
literária de um Antônio Candido,
no bairro operário do Brás, Ribeiro militares, o
trabalhando num excelente curso de
Júnior formou-se na USP, em 1964, patrono da
Letras, criado por Antonio Soares
no que chama de “ano fatídico”. Já turma, Mario
Amora que teve continuidade com
na colação de grau, um sinal do Schenberg, foi
o espanhol Julio Garcia Morejon,
que viria pela frente: o patrono da impedido de
um literato de raro dinamismo”,
turma, o físico Mario Schenberg, discursar.
descreve. “Ter ido para Assis, nafoi impedido de falar, vetado pelos
Texto de Paulo Velloso
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Livros publicados por
José Ribeiro Júnior
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pesquisas históricas e de intensas
quele momento, foi o melhor passo O contato
atividades administrativas. Ribeique dei na minha vida.” Recém- com a capital
ro dirigiu por quatro anos a seção
formado, Ribeiro admite ter con- francesa
regional São Paulo da Associação
cluído na Fafia a sua formação: era tão
Nacional de História (Anphu) e
“Inexperiente, fui morrendo de grande que
por dois anos a Nacional, que remedo pela responsabilidade de se brincava:
úne, bienalmente, mais de cinco
responder pela disciplina História “De Paris para
mil associados em seus eventos,
do Brasil. Mas recebi total apoio Assis”.
e a Associação de Historiadores
dos colegas”. E que colegas: com
Latino-Americanos e do Caribe
Ribeiro, aportaram na faculdade
nomes como Nilo Odália, Heloísa e Manoel (Adhilac), com sede em Cuba. “Em meio a
Bellotto, Anna Maria Martinez Correa,Virgílio tudo isso, existia uma grande ebulição intelecNoya Pinto, Antonio Carlos Bernardo e Jaime tual, com estudos aprofundados da chamada
linha braudeliana’, e de ingleses como Eric
Pinsky, entre outros.
Outro grande momento de transformação viria Hobsbawm”, afirma.
A formação historiográfica tomada aos mesa seguir: uma temporada de estudos em Portugal,
com bolsa da Fundação Calouste Gulbenkian. tres franceses marcou Assis de tal forma que,
Durante seis meses, Ribeiro pesquisou o tema num período, usava-se a expressão “de Paris
Companhia de Pernambuco e Paraíba, no perí- para Assis” para designar o trânsito de docenodo compreendido entre 1750 e 1777. “Voltei ao tes que estudavam na França e vinham conBrasil com muito material e bastante motivado”, tratados pela Fafia.Essa base, mais os estudo
recorda. Com base nas informações recolhidas, do Materialismo Histórico, levaram essa prredigiu o mestrado e escreveu a tese de doutorado meira turma de docentes de História a buscar
Colonização e monopólio no Nordeste brasileiro, uma História Total, infensa a determinismos
depois publicada pela editora Hucitec em 1976 parciais, adotando-se uma História integradora. Não impressionava bem ao entrevistado a
e segunda edição em 2004.
Seguiu-se, então, um período de profundas “Nouvelle Histoire”. Houve evoluções poste-
José Ribeiro Junior (à
esq.), então ouvidor da
Unesp, em sessão do
Conselho Universitário
em 2012
© Daniel Patire
© Arquivo pessoal
José ribeiro Júnior
riores que integraram problemáticas isoladas às pesquisas sobre História de Pernambuco,
em estruturas mais amplas dando sentido à frequentando um excelente grupo de profesnova tendência.
sores e pesquisadores, a maioria da USP, que
Com a experiência administrativa adquirida estudava Estado e Nação no Brasil”.
em Assis – foi chefe de departamento e direEm 2004 aceitou o convite-desafio do reitor da Unidade (1987-1991), a essa altura já tor Marcos Macari para criar a Ouvidoria da
incorporada à Unesp com o nome de Facul- Unesp. “Estávamos bastante atrasados em redade de Ciências e Letras –, Ribeiro iniciou lação à USP e à Unicamp, que já tinham suas
sua aproximação com a Reitoria. “Convidado ouvidorias há algum tempo”, diz. “Montei a
pelo então reitor Arthur Roquete de Mace- estrutura, com todo o apoio reitoral e fiquei
do, assumi a Pró-Reitoria de Pós-Graduação e por lá até 2013, quando, mais uma vez, chePesquisa”, relata. Foi um trabalho árduo e de gou a hora de mudar.” Penso ter cumprido o
muitas conquistas para a Unesp. Em seguida, meu dever, como em outras funções
foi diretor para o Mercosul, por dois anos, da
Aos 75 anos, cinco netos, quase meio século
Asociación Universitária Iberoamericana de de Universidade, José Ribeiro Júnior garante
Posgrado (AUIP), com sede em Salamanca, que, passando a vida em retrospecto, não se
Espanha, até ser nomeado diretor-presidente arrepende de nada. “Não digo que faria tudo
da Vunesp – Fundação para o Vestibular da de novo, igualzinho, porque adoro mudar, mas
Unesp, onde ficou até 2001.
crescer com a Unesp foi uma exFiel à máxima do historiador
periência dignificante e, até hoje,
francês Lucien Febvre, para quem “Ao ter
empolgante”, diz. “Ter dedicado
“viver é mudar”, Ribeiro Júnior dedicado
minha vida ao magistério, pesquiaposentou-se em meados de 2001 minha vida ao
sa e organização do trabalho no
– mas não parou. “Aceitei convite magistério, vivi mundo universitário, vivenciando
muito honroso do estudioso Is- integralmente
integralmente a minha vocação,
tván Jancsó, que era Diretor do a minha
me dá a certeza de ter cumprido
IEB, USP, onde dei andamento vocação.”
a minha missão.”
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